D08 - Fundamentos e Princípios Da Educação Infantil
D08 - Fundamentos e Princípios Da Educação Infantil
D08 - Fundamentos e Princípios Da Educação Infantil
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PEDAGOGIA
PEDAGOGIA
Programa de Formação de Professores
em Exercício, para a Educação Infantil, para
as Séries Iniciais do Ensino Fundamental
e para a Gestão Educacional
Fundamentos e Princípios
da Educação Infantil
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PEDAGOGIA
Pró-Reitoria de Graduação
Rua Quirino de Andrade, 215 - CEP 01049-010 - São Paulo – SP
Tel. (11) 5627.0245
www.unesp.br
Revisão de conteúdo
Profa. Dra. Célia Maria Guimarães
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PEDAGOGIA
SUMÁRIO
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PEDAGOGIA
Para que os objetivos da disciplina fiquem bem claros para vocês, todos eles estão elencados
a seguir:
Bibliografia
BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais.
Educação Infantil: a creche, um bom começo. Em Aberto, Brasília, v. 18, n. 73, 2001.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial
curricular nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Parâmetros nacionais de
qualidade para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEB, 2006.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Critérios para um atendimento
em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças. 2. ed. Brasília: MEC/SEB, 2009.
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PEDAGOGIA
Bibliografia
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querem os sujeitos deste direito. São Paulo: Cortez, 2006.
CRAIDY, C.; KAERCHER, G. E. (org.). Educação Infantil: pra que te quero? Porto Alegre: Artmed,
2001.
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OLIVEIRA, Z. R. Educação Infantil: fundamentos e métodos. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2007.
(Coleção Docência em Formação).
OLIVEIRA, Z. M. (org.). Educação Infantil: muitos olhares. São Paulo: Cortez, 1994.
Leituras complementares
CRUZ, S. H. V. Ouvindo crianças: considerações sobre o desejo de captar a perspectiva da
criança acerca da sua experiência educativa. In: REUNIÃO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO
NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM EDUCAÇÃO, 27., 2004, Caxambu. Anais
[...]. Caxambu: ANPEd, 2004. Disponível em: http://27reuniao.anped.org.br/gt07/t078.pdf. Acesso
em: 17 ago. 2022.
DIDONET, V. Não há educação sem cuidado. Revista Pátio Educação Infantil, Porto Alegre, n. 1, p.
6-9, 2003.
EMERIQUE, P. S. Brincaprende: dicas lúdicas para pais e professores. Campinas: Papirus, 2003.
GOLDSCHMIED, E.; JACKSON, S. Educação de 0 a 3 anos. O atendimento em creche. Porto
Alegre: Artmed, 2006.
HADDAD, L. Um novo paradigma na integração do cuidar e do educar. Revista Pátio Educação
Infantil, Porto Alegre: Artmed, n. 1, p. 16-19, 2003.
KRAMER, S. et al. (org.). Infância e educação infantil. Campinas: Papirus, 1999.
NICOLAU, M. L. M.; DIAS, M. C. M. (org.). Oficinas de sonho e realidade na formação do educador
da infância. Campinas: Papirus, 2003.
ROSSETTI-FERREIRA, M. C. et al. Os fazeres na Educação Infantil. São Paulo: Cortez, 1998.
ROSSETTI-FERREIRA, M. C. A necessária associação entre educar e cuidar. Revista Pátio
Educação Infantil, Porto Alegre: Artmed, n. 1, p. 10-12, 2003.
Resumo
A finalidade será discorrer sobre a trajetória histórica de atendimento à criança e da infância com
objetivo de observar os progressos e anacronismos implicados no surgimento da creche e da pré-
escola no Brasil e no seu papel social, político e pedagógico. Observar o movimento não linear de
constituição das Instituições de Educação Infantil é o meio de compreendermos os seus desafios
atuais, sobretudo, de ligar as questões sociais, políticas e econômicas de cada período histórico
com as concepções e interesses que permeiam sua origem. As instituições de atendimento à criança
passaram pela caridade, filantropia, assistencialismo, custódia, pelo caráter compensatório, até a
função educativa, de tal modo que o adulto responsável pela atenção à criança teve seu perfil
profissional alterado pela exigência de ser capaz de acolher as peculiaridades da faixa etária com
vistas à garantia da educação e cuidado de forma integrada. Do ponto de vista histórico, houve um
avanço significativo da legislação e dos documentos oficiais do MEC a partir da Constituição Federal
de 1988, ocasião em que a criança de zero a seis anos é elevada à condição de cidadã, sujeito de
direitos, inclusive, o direito à educação desde o seu nascimento e a Educação Infantil é apontada
como fundamental ao seu desenvolvimento. A despeito das metas legais, ainda há descompasso
entre o que estas propõem e a condição vivida pelas crianças e adultos nas instituições.
DOI: 10.5965/1984723818382017081
http://dx.doi.org/10.5965/1984723818382017081
1 Artigo originalmente publicado na Revista Linhas em 2017. A reprodução que aqui fazemos leva em consideração
o uso gratuito, destinado a aplicações educacionais e não comerciais, como consta na seção Licença da Revista
Linhas. Licença Atribuição-NãoComercial-SemDerivativos 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0).
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PEDAGOGIA
INTRODUÇÃO
Kuhlmann Jr. (1998, p. 22) assegura que “[...] o Sentimento de infância não seria inexistente
em tempos antigos ou na Idade Média [...]”. Por isso, a importância de buscarmos diferentes
compreensões sobre como se exprime a infância em distintos momentos e espaços e considerar
que estas concepções se entrelaçam e se interpenetram nos períodos da história, além de deixarem
um legado para as compreensões atuais. KUHLMANN (1998) entende que:
É preciso considerar a infância como uma condição da criança. O conjunto das ex-
periências vividas por elas em diferentes lugares históricos, geográficos e sociais é
muito mais do que uma representação dos adultos sobre essa fase da vida. É preciso
conhecer as representações de infância e considerar as crianças concretas, localizá-
-las como produtoras da história. (KUHLMANN, 1998, p. 30)
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PEDAGOGIA
2 A classificação mencionada se encontra no livro Histórico da proteção à infância no Brasil, 1500-1922. Rio de Janeiro,
Emp. Graphica Ed., 1926.
3 A roda tem o formato de cilindro cuja superfície lateral é aberta em um dos lados e que gira em torno de um eixo
vertical. O lado fechado fica voltado para a rua. Uma espécie de campainha exterior era colocada nas proximidades
para que a pessoa que desejasse entregar um recém-nascido pudesse acioná-la avisando à pessoa de plantão. O
recém-nascido era levado para o interior da Santa Casa de Misericórdia pelo mecanismo de fazer o cilindro girar em
torno de si mesmo até virar para fora o seu lado aberto, e a criança ali ser depositada. Em seguida, continuando o
movimento até girar o cilindro até sua parte aberta se voltar pra dentro novamente. Para saber mais, consultar DEL
PRIORE, Mary. História das crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 2004.
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PEDAGOGIA
era um local público que legitimava o desamparo anônimo de crianças indesejadas, nomeadas de
“os expostos”, e onde eram colocadas, em vez de as pessoas as deixarem nas ruas, lixeiras, portas
de igrejas ou casas. (RIZZINI; RIZZINI, 2004)
Para a sociedade da época, a Roda dos Expostos, na opinião de Marcilio (1999, p. 72), teve
um papel importante no atendimento às crianças abandonadas por distintas razões:
A roda foi instituída para garantir o anonimato do expositor evitando-se na ausência
daquela instituição e na crença de todas as épocas, o mal maior, que seria o aborto
e o infanticídio. Além disso, a roda poderia servir para defender a honra das famílias
cujas filhas teriam engravidado fora do casamento. Alguns autores atuais estão con-
vencidos de que a roda serviu também de subterfúgio para se regular o tamanho das
famílias, dado que na época não havia métodos eficazes de controle da natalidade.
No entanto, no séc. XVIII era comum a morte de muitas crianças abandonadas na “roda”
devido à ausência de condições mínimas de higiene e saneamento na Santa Casa, sendo que as
sobreviventes eram entregues a “criadeiras externas”. Segundo Farias (2005), nesta época, as
Câmaras Municipais do Brasil designavam uma verba ao acolhimento de crianças negras, mestiças
ou brancas abandonadas, as chamadas crianças enjeitadas. O pagamento de amas-de-leite e
criadoras ocorria para que mulheres/famílias as criassem até os nove anos. As crianças indígenas
ainda eram alvo do projeto educativo de catequização, como forma de garantir a civilização dos
povos indígenas. Em suma, a essência da atenção dispensada à criança e à infância nesta etapa
da história se deu sob a forma de caridade, proveniente dos religiosos católicos e de grupos de
leigos filantrópicos. O Estado não teve participação na assistência, não criou instituições e nem
regulamentou as existentes (DEL PRIORI, 2004; KUHLMANN, 1998).
A partir do século XVIII, os asilos4 foram instalados no Brasil e atendiam às crianças nascidas
de relacionamentos ilegítimos entre senhores e escravas ou, aos filhos das escravas, para que
estas pudessem ser alugadas como mães de leite.
No século XIX, o mundo atravessava transformações significativas, principalmente nos
domínios econômicos e sociais que alteraram o cenário mundial. No mesmo período, o Brasil
4 Em 1826, na França, foram também criadas as salas de asilo (depois nomeadas de escolas maternais), cujas
finalidades de atendimento se organizavam em torno de cuidados, educação moral e intelectual às crianças de
três a seis anos de idade, ao passo que as creches passaram a existir para atender às crianças de até três anos.
(KUHLMANN, 2001). Já em Portugal, desde sua fundação, em 1834, as casas de asilo da infância funcionavam
com função pedagógica, no sentido instrucional, além de oferecer os cuidados com a alimentação e o corpo. Nas
repúblicas italianas e na Holanda, igualmente, há registros de instituições semelhantes para diferentes faixas etárias
no decorrer da primeira metade do século XIX. No entanto, as creches, as salas de asilo, depois chamadas escolas
maternais, e os jardins-de-infância de Froebel, foram os mais disseminados. No ano de 1848, surgiram na França as
chamadas escolas maternais com a intenção de substituir o termo sala de asilo e alterar o tipo de atendimento para as
crianças pobres, as quais eram expostas a um atendimento precário e a cansativos exercícios de escrita. A orientação
das escolas maternais era de caráter educativo e priorizava o desenvolvimento integral das crianças; contrariamente,
as salas de asilo existiam, predominantemente, para guardar um grande número de crianças (OLIVEIRA, 2011). A
escola maternal francesa deveria efetuar a proposta de Froebel por meio de um ambiente agradável e de ensino,
mas a tradição do termo sala de asilo continuou a ser do uso cotidiano e o modo de atendimento não mudou. O
preconceito do governo francês em relação às instituições que atendiam crianças pobres e abandonadas o motivou
a propor a alteração da denominação da sala de asilo. Seu objetivo foi tornar a escola maternal mais acolhedora e
bela repelindo a ideia de miséria e desamparo, com a adoção da nova designação (KISHIMOTO, 1988).
viveu importantes mudanças político-sociais, iniciadas com a vinda da Família Real para o Brasil
(1808), que promoveu a abertura dos portos às nações amigas e a criação de cursos destinados
à qualificação dos habitantes com base em necessidades brasileiras, provendo, de certo modo, o
processo de rompimento com o ensino jesuítico do Brasil colonial.
No contexto político e econômico do início do século XIX, o Brasil começou a viver um
período de impasse em relação à educação das crianças menores de sete anos, assinalado por
acontecimentos em dois campos: um deles tem a ver com a partida da Família Real para Portugal,
seguida da regência do Brasil e pela Proclamação da Independência da coroa portuguesa, por D.
Pedro, em 1822. O outro campo apresentava vários aspectos: o momento econômico do início do
século, de expansão da lavoura cafeeira e o crescimento capitalista interno localizado nas cidades;
a criação da primeira escola oficial do Rio de Janeiro (1880); a chegada de imigrantes aos milhares
à procura de trabalho assalariado, a assinatura pela Princesa Isabel da lei que aboliu o sistema
escravo no país em 1888. No entanto, com a lei do ventre livre e a pobreza das famílias, muitas
abandonavam seus recém-nascidos ou os deixavam na “Roda dos Expostos”. Cabe lembrar que,
nesta época, as crianças menores de sete anos eram cuidadas e ensinadas pela mãe.
Assim, a partir da metade do século XIX, o índice de mortalidade das crianças desamparadas
era elevado, fato que incitou os abolicionistas e higienistas a desaprovarem a prática da roda e as
amas. O atendimento educacional ainda não existia para os filhos dos pobres. Seu destino era se
tornarem cidadãos úteis e produtivos na lavoura, enquanto os filhos da elite eram instruídos por
professores particulares. É interessante assinalar que, para as mães das classes abastadas, era
desde esta época exaltado o direito à maternidade, sendo que, para as mulheres pobres, cabia o
mundo do trabalho e a incerteza sobre onde e com quem deixar seus filhos, fossem elas escravas
ou não (RIZZINI; RIZZINI, 2004; KUHLMANN JUNIOR, 1998). A apologia pelo médico dos expostos
e por alguns grupos para adoção das creches nos moldes franceses para abrigar crianças pobres
e abandonadas tomavam corpo nesse período no bojo de um sentimento de urgência em criar
espaços para a “guarda” destas crianças. O projeto político de construção de um Brasil moderno
vicejava no âmbito das ideias liberais do final do século XIX. Nesse contexto, os princípios do
movimento da Escola Nova foram acolhidos pelos intelectuais, sob a ideia de que o moderno
significaria progresso. Nesta perspectiva, as instituições de Educação Infantil surgiam como uma
proposta moderna. Kuhlmann (1998, p. 78) afirma que em relação às crianças pobres,
[...] a creche, para as crianças de zero a três anos, foi vista como muito mais do que
um aperfeiçoamento das Casas de Expostos, que recebiam as crianças abandona-
das; pelo contrário, foi apresentada em substituição ou oposição a estas, para que
as mães não abandonassem suas crianças.
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PEDAGOGIA
O jardim de infância, criado por Froebel, seria a instituição educativa por excelência,
enquanto a creche e as escolas maternais – ou qualquer outro nome dado à institui-
ção com características semelhantes às Salles d’ asile francesa – seriam assistên-
cias e não educariam para a emancipação, mas à subordinação.
Em algumas cidades do país, as primeiras creches substituíram a Casa dos Expostos, com
seu caráter assistencial e de guarda voltado ao atendimento das crianças e famílias empobrecidas.
Apresentavam elementos que marcaram por longos anos a história da creche na sociedade,
como o seu caráter caridoso, a especificidade da faixa etária, a qualidade das mães como pobres
e trabalhadoras, conforme apresentado no relato do jornal A mãi de família. As instituições de
assistência à infância eram vistas com preconceitos, pois eram lugares de crianças pobres e
carentes marcados pelo cuidado com o corpo, saúde e alimentação.
Na vigésima sessão pública da Sociedade de Creche em Paris, em 13 de maio de 1877,
o imperador e a imperatriz do Brasil estavam presentes. O Statut des Crèches traz no seu artigo
primeiro a definição de onde foi tirada a versão brasileira: “Uma associação caritativa é constituída
entre indivíduos caridosos que almejam instituir uma creche para crianças pobres menores de
dois anos, cujas mães trabalham fora do seu domicílio e tenham uma boa conduta.” É assim que é
reproduzida, do regulamento da creche francesa para o Brasil, a intenção de ofertar assistência por
pessoas caridosas ou da filantropia às mães de boa conduta com filhos menores de dois anos de
idade que trabalhavam fora do seu contexto doméstico.
No Brasil, o periódico A Mãi de Família, jornal científico, literário e ilustrado publicou, a partir
de janeiro de 1879, uma sequência de cinco artigos sobre creche (o primeiro deles teve o título
A creche - asilo para a primeira infância), escritos pelo médico dos expostos, o Dr. K. Vinelli. No
artigo, o médico fez referência à creche para resolver o problema das senhoras burguesas, as
quais tinham em suas casas mães escravas. A originalidade de sua ideia foi separar as crianças
escravas de suas mães e levá-las para as creches. Assim o Dr. Vinelli explicou a visão e finalidade
da creche: “A creche é um estabelecimento de beneficência que tem por fim receber todos os dias
úteis e durante as horas de trabalho, as crianças de dois anos de idade para baixo, cujas mães são
pobres, de boa conduta e trabalham fora de seu domicilio.” (VINELLI, 1879 apud CIVILETTI, 1991,
p. 36).
Nesse período, encontra-se a gênese das concepções iniciais sobre a creche no Brasil que
adota da França (sua primeira crèche foi implantada por Marbeau em 1844) a finalidade e o modo
de funcionamento da creche, bem como a terminologia salle d’asile e creche, esta última com
sentido de manjedoura. Observe que o sentido atribuído à creche institui uma separação entre
classes sociais, na medida em que se propõe espaço de atenção, exclusivamente, às crianças
pobres com a finalidade de liberar a mão de obra feminina (KUHLMANN JUNIOR, 1998; KRAMER,
1995). De acordo com Didonet (2001, p. 12):
Os primeiros nomes dessa instituição são reveladores do seu propósito: garderie,
na França; asili, na Itália; écoles gardiennes, na Bélgica. Até hoje, guardería é a ex-
pressão usada em vários países latino-americanos para referir-se à instituição que
atende às crianças menos de 3 anos. “Guarda da criança” também foi a expressão
que traduzia a intenção nos primórdios dessa instituição no Brasil.
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PEDAGOGIA
uma profissão, além de música, desenho e estudo (BRASIL, 1861). Na verdade, o Instituto de
Menores tinha a finalidade de disciplinar os corpos por meio do uso de castigos corporais, a fim de
tornar a mente obediente. O Estado tutelava a criança pobre como se fosse delinquente e passava
a ensinar-lhe ofícios. Com o passar do tempo, eram encaminhadas a essa instituição todas as
crianças em situação de rua, sendo elas infratoras ou não.
5 Partes do presente texto compõem a dissertação de mestrado de minha autoria: GUIMARÃES, Célia Maria. Leitura
e escrita na pré-escola - o processo de ensino da leitura e escrita: idéias, concepções e influências na prática
educacional dos professores da pré-escola municipal de Presidente Prudente, SP. 1995 (Mestrado em Educação)
– Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Filosofia e Ciências - Universidade Estadual Paulista -
Presidente Prudente.
6 Marie Pape-Carpantier (1815-1878) foi professora das primeiras salas de asilo, na França. Criou a caixa de Lições
de Coisas - um instrumento para as lições sobre origem, a história e fabricação das principais coisas de uso geral
na vida cotidiana.
Segundo Kramer (1995, p. 50) “[...] faltava, de maneira geral, interesse da administração
pública pelas condições da criança brasileira, principalmente a pobre.” Por isso, somente a partir
de 1874, há registros em documentos brasileiros propondo ações para o cuidado da criança.
Voltados para as elites da época, são fundados em 1877, a Escola Americana e, em 1896, embora
público, o Jardim de Infância da Escola Caetano de Campos, em São Paulo, que atendia aos filhos
da burguesia paulistana. Os dois espaços eram reservados às famílias ricas. A alta sociedade
diferenciava os jardins de infância dos asilos e das creches das classes pobres, lançando mão, para
este fim, de propostas pedagógicas inspiradas no ideário de Froebel (KRAMER, 2003; KUHLMANN
JUNIOR, 1991; 1998).
Kishimoto (1988) adverte que nos documentos da criação dos jardins de infância, estes
espaços foram considerados lugares da pedagogia voltada às brincadeiras; o objetivo era o de forjar
o desenvolvimento integral das crianças (físico, moral e intelectual), além de realizar a transição da
família para a escola, atendendo crianças de quatro a seis ou sete anos durante meio período. Por
isso, não competiria ao Estado financiar um local de brincadeiras para a infância rica, o que explica
que inicialmente os jardins de infância eram considerados por diversos educadores e políticos um
luxo. Kishimoto (1988, p. 33) refere que nos documentos do Colégio Menezes Vieira, por exemplo,
não era oferecido o ensino da leitura e da escrita, mas se propunha a “aproveitar as variadas
e expressivas manifestações da atividade infantil”, embora as tarefas voltadas para instrução e
dirigidas pela professora fossem constantes. Essa prática educativa deixava de lado a proposta
original de Froebel no lugar de um suposto trabalho para o desenvolvimento do intelecto infantil.
Kuhlmann Junior (2001) esclarece que os chamados jardins de infância, direcionados às
crianças da classe burguesa, já apresentavam característica mais educacional, o que os diferenciava
da função primordial de guarda reservada às creches para as classes populares. O termo asilo para
crianças designava as instituições com a função de guarda da criança pobre no período diurno,
com o objetivo de evitar o seu abandono. Havia ainda uma diferença entre os asilos e as Casas de
Expostos e as Escolas de Aprendizes de Marinheiros, pois estas instituições tinham a função de
abrigo, destinadas às crianças já abandonadas.
A preocupação daqueles que se vinculavam às instituições pré-escolares privadas
brasileiras era com o desenvolvimento de suas próprias escolas. Nota-se, entre eles,
a utilização do termo pedagógico como uma estratégia de propaganda mercadoló-
gica para atrair as famílias abastadas, como uma contribuição do jardim-de-infância
para os ricos, que não poderia ser confundido com os asilos e creches para pobres.
(KUHLMANN JUNIOR, 2001, p. 83-84)
Segundo o autor, o que distingue as diferentes instituições é a sua destinação social, pois
“O filho da senhora estudava no “jardim”; o da serviçal, na creche”. A proveniência social e não a
institucional das instituições é a responsável pela origem dos diferentes objetivos educacionais
presentes nas propostas de instituições e na história do atendimento da infância. No entanto,
Kuhlman Jr. (1998) observa que historicamente todas as instituições dedicadas à infância possuem
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PEDAGOGIA
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PEDAGOGIA
jurídicos que passaram a apoiar as instituições com uma abordagem predominantemente médico-
jurídica por intermédio do Poder Judiciário.
Em 1897, foi inaugurado, em São Paulo, o edifício do Jardim da Infância, com o propósito de
educar as crianças da classe dominante, entre quatro e sete anos de idade. O Jardim da Infância
ou Kindergarten7 se inspirava nas ideias do filósofo alemão Friedrich Wilhem August Froebel e tinha
como objetivo e prática educar os sentidos das crianças e despertar o divino existente na essência
da alma humana. Com esse intuito, as professoras, que eram nomeadas como “jardineiras”,
deveriam ser especialistas para saberem empregar jogos, cantos, danças, marchas e pinturas
como estímulos à aprendizagem infantil. A prática escolar do século XIX recebeu muita influência
do método froebeliano para a primeira infância e com isso fixou a imagem da criança como idade
criativa. O evento da chegada dos jardins de Infância no Brasil com este caráter institui duas
modalidades de atendimento às crianças de zero a seis anos no Brasil: os jardins-de-infância para
crianças da elite e as creches ou escolas maternais que ofereciam assistência e educavam as
crianças com menos recursos financeiros.
[...] o que se pode notar, do que foi dito até aqui, é que as creches e pré- escolas
surgiram a partir de mudanças econômicas, políticas e sociais que ocorreram na
sociedade: pela incorporação das mulheres à força de trabalho assalariado, na orga-
nização das famílias, num novo papel da mulher, numa nova relação entre os sexos,
para citar apenas as mais evidentes. Mas, também, por razões que se identificam
com um conjunto de ideias novas sobre a infância, sobre o papel da criança na so-
ciedade e de como torná-la, através da educação, um indivíduo produtivo e ajustado
às exigências desse conjunto social. (BUJES, 2001, p. 15)
7 Este termo tem origem nos ideais de Froebel que compara o crescimento das crianças ao das plantas e o papel das
professoras ao de jardineiras.
de operários. Kuhlmann Jr. (1996) considera 1899 como o ano do surgimento de creches que
passaram a ocupar o cenário da assistência à infância brasileira. Nos congressos em que se
abordava a assistência à infância, as recomendações para a criação de creches junto às indústrias
e de entidades assistenciais tomavam vulto (KUHLMANN JUNIOR, 1991). De outro lado, nesta
época, os jardins de infância eram considerados educativos e tornaram-se a forma de atendimento
aos pobres.
Sendo assim, por volta do final do século XIX, no lugar de uma política educacional, havia
uma política jurídico-assistencial de atenção à criança. O Estado se preocupava com as crianças
consideradas perigosas para a coletividade e, aquelas que tinham casa e família, permaneciam sob
os cuidados da própria família.
O início do século XX no Brasil apresentava um panorama de problemas originados pela
expansão caótica das cidades. A chamada medicina social fazia a intervenção médica por meio
de movimentos higienistas com a intenção de desempenhar uma maior vigilância e maior controle
sobre a população, particularmente as crianças, intervindo para o seu bem-estar físico e moral.
Contudo, não havia conhecimentos sobre particularidades infantis como alimentação, forma de
pensar específica etc. Foi um período caracterizado pelo extraordinário aumento das entidades
assistenciais, a maioria ligada à Igreja Católica para o atendimento de crianças órfãs, para a atenção
aos abandonados e aos delinquentes. Deste modo, a atenção à criança aconteceu de um lado, com
base no ensinamento moral e, de outro, com a preparação para o trabalho.
Durante as duas décadas iniciais do século XX, implantaram-se as primeiras instituições
pré-escolares assistencialistas no Brasil e as entidades assistenciais fundaram creches. Em 1908,
é fundada a “primeira creche popular cientificamente dirigida”, para crianças de até dois anos de
idade, filhas de operários, mas a maior parte das práticas dedicadas às crianças de zero a seis
anos era de caráter médico.
Neste contexto, foi criada, em 1908, a primeira escola maternal pela educadora Anália
Franco, em São Paulo, para atender os filhos de operárias das fábricas paulistanas. As crianças
ingressavam nessas instituições com dois anos de idade e permaneciam até os cinco anos, dilatado
posteriormente até os 12 anos de idade. Essas escolas deveriam ser diferentes dos asilos e das
creches, pois em seus documentos definiam objetivos pedagógicos e assistenciais de alimentação
e proteção. Nas propostas descreviam a aliança entre a assistência e o trabalho pedagógico. Na
prática, os trabalhos eram muitas vezes conduzidos por leigos, pois havia falta de professores
capacitados. Por isso, neste caso, prevaleceu o mesmo atendimento dos asilos e as crianças ainda
tinham que enfrentar o ensino mnemônico de conteúdos de Gramática, Aritmética e Geometria
(KISHIMOTO, 1988).
Em 1909, após 30 anos de promulgação do decreto n. 7247, de 1879, foi inaugurado no Rio
de Janeiro o primeiro jardim de infância público, o Jardim de Infância Campos Salles, voltado para
escolarização de meninos e meninas entre quatro e sete anos.
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PEDAGOGIA
No ano de 1918, em decorrência das pressões dos movimentos operários, foi criada a
primeira creche no estado de São Paulo, numa vila operária da Companhia Nacional de Tecidos
e Jutas. Neste período, a expansão industrial é uma realidade paulistana com consequente au-
mento da utilização da mão de obra feminina nas fábricas. As creches e albergues proliferam nas
redondezas das fábricas, favorecidas pela falta de fiscalização e pela necessidade de pais e mães
“depositarem” seus filhos a um baixo pagamento em lugares...
[...] sem as mínimas condições para atendimento à criança em idade pré- escolar
[com menos de cinco anos]. Conhecidas por absorver apenas funções de guarda
de crianças não merecem a atenção do governo, que se nega a fiscalizar estabele-
cimentos mantidos pela caridade ou por indivíduos dispostos a explorar comercial-
mente tais casas. (KISHIMOTO, 1988, p. 26)
maternais para os filhos dos operários em cidades como Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais”
(OLIVEIRA, 2005, p. 96).
O crescimento da industrialização no país, a constituição de uma nova elite burguesa no lu-
gar da cafeeira, o agravamento do estado de miséria de um grande número de pessoas, a inserção
da mulher nas fábricas, o operário imigrante europeu e o início dos conflitos nas relações patrões-
-operariado deflagraram um processo de protestos sociais por creches. Embora fosse insuficiente a
ampliação do atendimento em creches nesse período, ela se vinculava ao “poder” da crescente or-
ganização popular na reivindicação dos direitos sociais, o que terá uma dimensão maior na década
de 1980. Kuhlmann Jr. (1998) explica que a concessão das creches pelos patrões em resposta às
reivindicações dos operários por melhores condições de vida se dava como favor, distanciando-se
do caráter de dever social.
Em 1923, houve a primeira regulamentação do trabalho da mulher com a proposta de ins-
talação de creches e salas de amamentação próximas aos postos de trabalho. Nesse período, a
função de guarda das crianças caracterizava todos os tipos existentes de creche para pobres. Seu
funcionamento seguia o modelo hospitalar, geralmente sob os cuidados de profissionais da área da
saúde conforme a palavras de Kuhlmann Jr. (2001, p. 60):
[...] criaram-se leis e propagaram-se instituições sociais nas áreas da saúde pública,
do direito da família, das relações de trabalho, da educação. [...] são iniciativas que
expressam uma concepção assistencial a que denominamos “assistência científica”
por se sustentar na fé, no progresso e na ciência característica daquela época.
Podemos dizer que desde o final do século XIX até o início do século XX, o atendimento
nas creches permanecia vinculado ao campo médico-sanitarista e ambicionava nutrir as crianças,
promover a saúde e disseminar normas rígidas de higiene. Esta visão associou a pobreza à falta de
conhecimentos de puericultura e mascarou qualquer relação com as questões econômicas e políti-
cas do país naquele período. Nos anos que antecederam a década de 1920, a iniciativa particular
oferecia a atenção à infância sob o apoio do Estado, sem que existisse, de sua parte, a proposição
de ações políticas.
Em 1922, no âmbito do 1º Congresso de Proteção à infância, houve a solicitação para a
ação das autoridades governamentais. Em 19 de novembro de 1930, o Decreto n. 10.402 criou o
Ministério da Educação e de Saúde Pública. Deste modo, naquele ano, o atendimento pré-escolar
já contava com a participação direta da esfera pública. Assim ocorreu em consequência de refor-
mas jurídico-educacionais que pretendiam atender à nova ordem legal da educação: pública, gra-
tuita, e para todos, tanto quanto acatar à crescente pressão por direitos trabalhistas em decorrência
das lutas sindicais da então nova classe trabalhista brasileira. Ainda em 1922, no Rio de Janeiro,
houve o Primeiro Congresso Brasileiro de Proteção à Infância.
O Congresso representou, no caso brasileiro, a consagração de propostas que vi-
nham sendo desenvolvidas aqui desde o início do século. Seu objetivo era tratar de
todos os assuntos que direta ou indiretamente se referiam à criança, tanto no ponto
27
PEDAGOGIA
Mário de Andrade, ambientes destinados às crianças das classes populares, continuaram com pro-
postas de trabalhos educacionais diferenciados do que havia sido proposto pelos escolanovistas.
Neste contexto, foram criados novos jardins de infância e proposto curso de formação de professo-
res, para o atendimento das classes burguesas. No entanto, nas palavras de Oliveira (2005, p. 92).
A ideia de jardim-de-infância, todavia, gerou muitos debates entre políticos da época.
Muitos criticavam por identificá-lo com as salas de asilo francesas, entendidos como
locais de mera guarda das crianças. Outros defendiam por acreditarem que trariam
vantagens para o desenvolvimento infantil, sob influência dos escolanovistas.
29
PEDAGOGIA
Unidas para a Criança (UNICEF), criado em 1946. O UNICEF inseria-se nas políticas assistenciais
brasileiras agindo por meio de acordos com os vários domínios públicos. As deliberações interna-
cionais desencadearam no Brasil um período de preocupações com a infância e, por conseguinte,
o imperativo de constituir políticas educacionais ajustadas às crianças. Assim é que, na década de
40, se alargaram os empreendimentos governamentais para o atendimento às crianças, por meio
de programas assistenciais, com ênfase no higienismo, na filantropia e na puericultura.
[...] a UNESCO, através do UNICEF, começa a prestar assessoria aos especialistas
de educação pré-escolar de diversos países. Recomenda-se então a busca de novas
alternativas para atender aos menores de 7 anos, uma vez que os países subdesen-
volvidos não dispõem dos recursos financeiros necessários para um atendimento à
infância dentro dos padrões idealmente concebidos. (KRAMER, 1991, p. 37)
31
PEDAGOGIA
Deste modo, o atendimento pré-escolar no Brasil voltado para o aspecto educacional des-
pontou sob dois contornos no contexto da primeira iniciativa de educação infantil de massa propos-
ta pela LBA no país. Um deles, de caráter privado e de atuação reduzida, conduzido pela Organi-
zação Mundial de Educação Pré-Escolar (OMEP). A OMEP, fundada em 1948, almejava atender
crianças de todas as classes sociais, de zero a sete anos, com destaque na psicologia da criança,
dando atenção aos aspectos metodológicos e didáticos do processo educativo e da alfabetização.
O outro, de caráter público federal, realizado pela Coordenação de Educação Pré-Escolar (COE-
PRE), sobre o qual discutiremos mais adiante.
Até metade da década de 1950, foram criadas poucas creches fora das indústrias. Todas
filantrópicas, com seu foco no cuidado do corpo, entendimento arraigado por décadas nas institui-
ções de educação infantil do país e que tem influenciado a representação da sociedade sobre a
creche até hoje. Tempos depois, o governo destinou ajuda para estas instituições realizarem seus
trabalhos, além de receberem auxílio financeiro das famílias ricas como forma de “caridade”. Oli-
veira (2005) discute sobre o caráter assistencialista-protetoral destas creches, para observar que o
atendimento se fundamentava na alimentação, cuidados da higiene e da segurança física. O traba-
lho orientado à educação e ao desenvolvimento intelectual e afetivo das crianças era pouco valo-
rizado, reforçando a dicotomia entre cuidados e educação. Além do enfoque nos cuidados físicos,
algumas instituições foram criadas como forma de evitar a marginalidade de crianças carentes e
prevenir a criminalidade. Com este fim, em 1942, foi criada a “Casa da Criança”, pelo Departamento
Nacional da Criança.
A partir da década de 1950, as creches em funcionamento fora das indústrias pretendiam
suprir as carências da miséria por meio do trabalho de entidades filantrópicas, laicas e de caráter
religioso. O atendimento se comprometia com os cuidados de higiene, alimentação e segurança
física, sendo que o trabalho pedagógico para o desenvolvimento intelectual e afetivo das crianças
continuava secundarizado.
As diferenças entre suas origens e seu desenvolvimento, do ponto de vista de Oliveira
(1992, p. 21), esboçam a diferença entre creche e pré-escola nos anos 1950:
[...] crianças dos diferentes grupos sociais eram submetidas a contextos de desen-
volvimento diferentes e desiguais nas famílias, nas creches e pré-escolas. Enquanto
que as crianças pobres eram atendidas em creches com propostas que partiam de
uma ideia de carência e deficiência, as crianças mais ricas eram colocadas em am-
bientes estimuladores e consideradas como tendo um processo dinâmico de viver e
desenvolver- se.
Em 1950, foi criado, em São Paulo, o Serviço de Educação Pré-Primária com a finalidade
de oferecer assistência psicológica, pedagógica, atividades expressivas, recreativas e criativas,
assim como, assistir as famílias no sentido de orientar a escolarização dos filhos, pois já havia pre-
ocupação com os índices de repetência na escola primária. As classes pré-escolares funcionavam
precariamente junto a estabelecimentos escolares primários, sem recursos humanos e materiais
adequados, e sem uma política educacional definida. Na mesma década, o Departamento Nacional
da Criança foi transformado em Coordenação de Proteção Materno-Infantil, cujo principal objetivo
era reduzir a mortalidade materna e infantil. Nos anos da década de 1960, esta Coordenação mo-
difica-se em Divisão Nacional de Proteção Materno-Infantil.
Em 1953, foi fundado o Comitê Nacional Brasileiro da Organização Mundial para Educação
Pré-Escolar (OMEP). Tratava-se de uma organização educativa internacional não governamental
cuja finalidade era o atendimento às crianças de zero a sete anos de diferentes classes sociais. Os
trabalhos da OMEP no Brasil conservavam uma postura filantrópica, porém demonstravam cuidado
com o preparo das pessoas que trabalhariam com as crianças e com o enfoque metodológico do
procedimento educativo, além de ser considerada a primeira instituição a defender políticas públi-
cas voltadas à qualidade da Educação Infantil.
Até este momento, as políticas propostas no país e o atendimento à infância mantiveram
a tutela da criança órfã e pobre pelo Estado, além da tutela de crianças infratoras e não infratoras
na mesma instituição (SAM). A singularidade da atenção à infância no período ficou por conta da
influência nazifascista e do tipo de cuidado prestado pelo Serviço de Assistência ao Menor (SAM).
Comparece ainda alguma tendência em estabelecer atendimento educacional e políticas educacio-
nais adequadas à criança, engendradas por organismos internacionais.
Os debates ocorridos no decorrer do 9º Congresso Panamericano da Criança, realizado em
Caracas, em 1948, ampliaram a importância dispensada aos direitos do “menor”.
Em 1959, os direitos da criança e o cuidado social com a população infantil ilustraram as
inquietações basilares no início do século XX, cujo marco foi a promulgação, em 1959, da Decla-
ração Universal dos Direitos da Criança, pela Organização das Nações Unidas (ONU). A criança é,
então, afirmada como um sujeito de direitos, atribuindo ao Estado e à Sociedade o dever de garantir
esses direitos, quais sejam: direito à saúde, educação, profissionalização, lazer e segurança social.
Logo era o ano de 1964, e o governo da Ditadura Militar precisava tomar alguma atitude
perante o conteúdo dessa Declaração, já que a infância passou a ser valorizada e a criança inter-
nacionalmente considerada como sujeito de direitos pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Sendo assim, o leitor poderá constatar que no ano de 1961, a aprovação da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (Lei 4024/61) propôs a inclusão dos jardins de infância no sistema de
ensino por meio dos seus artigos 23 e 24, porém, a generalidade da Lei não permitiu que ações efe-
tivas fossem realizadas, apesar do aumento da demanda por creches e pré-escolas. Observe ainda
que a educação infantil será novamente mencionada na Lei 5692, aprovada em 1971, retrocedendo
ao que já se lia no artigo 24, da Lei 4024. A nova menção no parágrafo 2º, do art. 19, assegura que
“os sistemas valerão para as crianças de idade inferior a 7 anos que recebam conveniente educa-
ção em escolas maternais, jardins-de-infância ou instituições equivalentes” (LDB 5692/71).
Cabe lembrar que em abril de 1964, iniciou-se a ditadura militar no Brasil (1964-1985) após
um golpe das forças armadas ao governo de João Goulart. Um dos principais motivos para o golpe
33
PEDAGOGIA
foi o receio da implantação de reformas, especialmente a reforma agrária, que traria como conse-
quência direta a divisão das grandes propriedades de terra, reivindicada por políticos e intelectuais
desde a abolição (1888), levando a diminuição do poder dos “coronéis” (proprietários de terras no
Nordeste) que mantinham os trabalhadores do campo sob seus domínios, inclusive manipulando-
-os nas campanhas eleitorais.
O Governo adotou o modelo desenvolvimentista para recuperar o crescimento econômico
com o fortalecimento do empresariado industrial por acreditar ser este segmento capaz de fa-
vorecer o progresso almejado. Esse objetivo governamental acelerou a demanda por educação
que, por sua vez, abonou os acordos do MEC com a Agency for International Development (AID),
conhecidos como “Acordos MEC-Usaid”. O texto do acordo MEC-Usaid sobre o desenvolvimento
do atendimento à primeira infância era genérico e com significados duplos, como na já comentada
LDB de 1961. Mais uma vez, o Estado mostrou sua desconsideração para com a criança.
A rede particular de educação para a criança pequena, segundo Rosemberg (1999), se
espalhou e o atendimento das crianças pobres na rede pública ocorria por meio de programas de
massa, com o baixo custo e de educação compensatória. A UNESCO e o UNICEF divulgaram este
modelo como alternativa para países do Terceiro Mundo, sem condições de financiar, simultanea-
mente, os ensinos de 1º e 2º graus e a educação pré-escolar. De acordo com Rosemberg (2002),
entre os anos de 1960 e 1965, a UNESCO, além de operar como formadora de opiniões, foi res-
ponsável por 1% dos investimentos educacionais, o UNICEF por 1,6% e a Usaid 73%, o que realça
a atuação dos organismos internacionais no Brasil.
Os modelos de Educação Infantil de baixo custo, no entendimento de Kramer (1995, p. 11),
foram concebidos “[...] como solução para os problemas tanto educacionais como sociais que a so-
ciedade brasileira enfrenta.” Os programas de atendimento à infância que precederam a década de
1960 foram de caráter assistencialista, uma educação destinada às crianças carentes para assistir
suas necessidades físicas e biológicas e adentram pela década de 1970, propondo atendimento
em creches para crianças menores. Ao mesmo tempo, as políticas educacionais se voltam para a
pré-escola com programas educacionais compensatórios e de assistência à educação de crianças
de zero a seis anos. Neste período, as políticas governamentais incentivavam programas emer-
genciais para entidades filantrópicas, assistenciais ou de iniciativas comunitárias, nos quais mães
cuidavam de turmas com mais de cem crianças na pré-escola.
No final da década de 1960, devido a mudanças no modelo econômico brasileiro e suas
consequentes exigências, os governos voltaram sua atenção para a educação das classes popu-
lares com objetivo de qualificar a força de trabalho para maior produtividade, a fim de solidificar o
modelo de internacionalização do mercado interno.
Nos anos de 1960 e 1970, incide uma proliferação da assistência social sob a influência
da teoria da “privação cultural” difundida nos Estados Unidos que, por sua vez, passa a influenciar
as políticas desenvolvidas nas instituições de atendimento à criança pequena brasileira, de modo
que tais instituições passam a ser vistas como resposta para compensar as carências das crian-
ças e principalmente prevenir o fracasso escolar (KRAMER, 1995). Neste período, a LBA oferecia
subsídios financeiros e ajuda técnica às instituições de atendimento à criança, com objetivo de in-
fluenciar suas diretrizes, além de incentivar o atendimento como ascensão social à criança carente.
Diante desta nova perspectiva, os indicadores de pobreza, e não mais a condição da mãe trabalha-
dora, passaram a ser o critério de seletividade e inclusão aos programas de creche ou pré-escola
no país.
A partir da década de 1970, a importância da educação infantil passa a ser reconhecida
pelo Estado no plano ideológico, uma vez que a legislação não havia determinado sobre o direi-
to da criança e dever do Estado. No entanto, as políticas governamentais começam a ampliar o
atendimento, em especial às crianças de quatro a seis anos, unicamente por causa da crescente
evasão escolar e da repetência das crianças das classes pobres no ensino primário. Perante esta
conjuntura, a educação pré-escolar é apontada como solução das carências culturais destas crian-
ças para que consigam sucesso no ensino escolar. Constitui-se, então, no Brasil, uma política de
atendimento à infância pautada na preparação, na educação compensatória para a inserção da
criança no ensino escolar; um modelo de atendimento em massa, com menor custo possível, a fim
de atender um maior número de crianças das camadas populares, o que denota a presença dos
interesses neoliberais dos organismos internacionais.
No período de transição dos anos 60 para os primeiros anos da década de 70 do século
XX, a evasão, a reprovação e a repetência evidenciaram o fracasso da escola primária, apesar das
tentativas de superação. Este foi o contexto causador das discussões da necessidade da educação
pré-escolar em um período em que se viu a inovação de políticas sociais nas áreas de educação,
saúde, assistência social, previdência, etc. O lema da era militar – 1964 a 1985 – era a segurança
e o desenvolvimento do país. Ambos seriam alcançados conforme as desigualdades e conflitos se
enfraquecessem. Portanto, o Projeto Casulo, dentre outros, eram estratégias preventivas junto ao
segmento social empobrecido para diminuir as diferenças e desigualdades e, com isso, diminuir
as possibilidades de conflitos. Rosemberg (2003) confirma essa finalidade de assistir à infância e
prevenir a luta de classes. Após vinte anos de atuação da LBA no país como órgão de assistência
social com extenso empreendimento na infância brasileira, a mudança do regime político do país
provoca uma crise financeira, uma vez que o governo da ditadura militar reduz seus recursos. Com
o decreto assinado pelo Presidente da República implantando a Loteria Esportiva Federal, a LBA
passou a receber parte da renda líquida deste jogo (KRAMER, 1995). As ações de apoio à creche
e pré-escola continuaram sendo realizadas, destacadamente o Projeto Casulo, com início em mea-
dos de 1976, em meio ao dualismo entre o preceito assistencialista e o educacional na pré-escola e
em prol da liberação das mães para o mercado de trabalho. Este projeto foi uma consequência da
aliança entre o governo e organismos internacionais, principalmente o UNICEF, o qual pretendia a
implantação de programas para as crianças pobres desde o decorrer da década de 1960.
35
PEDAGOGIA
37
PEDAGOGIA
suporte a educação tecnicista desenvolvida na época, a qual acaba influenciando os trabalhos edu-
cativos proporcionados nos parques infantis e escolas maternais. Essa educação era considerada
uma “educação sistematizada”, uma educação que prepararia para o ensino fundamental.
O Ministério da Educação e Cultura - MEC cria, em 1975, outro tipo de atendimento pré-
-escolar no Brasil, desta vez de caráter público federal que foi efetivado pela Coordenação de Edu-
cação Pré-Escolar (COEPRE). Em consequência, os documentos oficiais indicam que a educação
pré-escolar deve utilizar métodos de baixo custo e atender a um extenso número de crianças com o
papel e a função de redimir todos os problemas sociais. O atendimento às crianças se constitui para
mascarar as contradições sociais que separam as crianças conforme sua condição econômica: as
creches passam a existir para “abrigar” crianças pobres, de até seis anos; enquanto os jardins de
infância surgem para acolher crianças ricas, acima de três anos, assegurando seu desenvolvimen-
to e sua educação.
Rosenberg (2002) assevera que a adoção de modelos de larga escala para a Educação
Infantil com baixo investimento público trouxe, juntamente com o aumento rápido do atendimento
às crianças, o número crescente de professores sem formação adequada e a retenção de crianças
em idade escolar na pré-escola. Estas medidas, segundo a autora, deram procedência a novos
processos de exclusão social e a um atraso no processo “de construção nacional de um modelo
de educação infantil democrático, de qualidade, centrado na criança” (ROSENBERG, 2002, p. 39).
Inversamente, Rossetti-Ferreira, Ramon e Silva (2002, p. 90) argumentam sobre o tipo de política
educacional que atenderia aos diretos da criança:
[...] As principais políticas para a educação e cuidado infantil não podem, porém ser
reduzidas a uma ajuda aos que necessitam, a uma educação para a submissão e
exclusão, pois essas políticas podem colaborar para a construção de uma cidadania
assistida e tutelada. Elas devem ter como objetivo a promoção da autonomia e o
exercício da cidadania, para que esta seja responsável e competente. Uma educação
de qualidade como um direito é o instrumento básico para alcançar esses objetivos.
A educação e o cuidado infantil devem ser propostos como meio de inclusão social,
oferecendo condições que permitam a construção de uma cidadania emancipada.
8 O conceito de educação compensatória como antídoto à privação cultural teve origem no pensamento de Pestalozzi,
Froebel, Montessori e McMillan. Esses estudiosos postulavam que a criança “[...] precisa ser recuperada ou
construída ou, ainda, reconstruída para a sociedade através de processos pedagógicos” (REDIN, 1988, p. 27). De
acordo com esta concepção de criança, os pesquisadores citados desenvolveram seus trabalhos na Europa com
crianças dos meios menos favorecidos, gerando a ideia de pré-escola “[...] como uma forma de suprir a miséria, a
pobreza, a negligência das famílias” (KRAMER, 1995, p. 26). O conceito da educação compensatória baseia-se na
abordagem da privação cultural que, por sua vez, apoia-se na concepção de que as crianças das classes populares
apresentam carência ou desvantagens de ordem social, sob a forma de perturbações intelectuais, linguísticas e
afetivas. Através de métodos pedagógicos adequados e da intervenção precoce, pretende-se reduzir ou eliminar, ou
seja, compensar as deficiências do desempenho destas crianças nas situações escolares de aprendizagem. O padrão
de comparação do desempenho é aquele da criança da classe média. A educação compensatória deveria garantir as
mesmas oportunidades de sucesso escolar e ascensão social às crianças das classes populares, desconsiderando
que a igualdade de oportunidades supõe uma concreta igualdade de condições. A educação pré-escolar, assim
vista, produz desigualdades e se propõe uma tarefa que extrapola suas possibilidades de resolver problemas de
desigualdades escolares e sociais.
9 COEPRE – Coordenação de Educação Pré-Escolar, órgão oficial responsável por dinamizar e centralizar as atividades
desenvolvidas pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Educação neste período.
39
PEDAGOGIA
de classe média, vinculadas ao processo de redemocratização do país, sendo que durante as dé-
cadas de 1970 e 1980, a ação era na direção do imperativo de se tornar direito a Educação Infantil.
O final da década de 1980 foi demarcado pela ação dos movimentos sociais em prol da Constituin-
te, dentre eles, o Movimento Criança Pró-constituinte e o Movimento de Mulheres/Feminista.
A combinação destes fatores às questões sociais, políticas e econômicas do período, en-
sejou um movimento da sociedade civil e de órgãos governamentais para que o atendimento às
crianças de zero a seis anos fosse amplamente reconhecido na Constituição de 1988, culminando
no reconhecimento da Educação Infantil como um direito da criança, e não mais da mãe ou do pai
trabalhadores.
Em 1988, a Constituição Federal define o atendimento institucionalizado às crianças como
direito social, conforme dispõe artigo 208, inciso lV: “O dever do Estado com a educação será efe-
tivado mediante a garantia de [...] atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis
anos de idade” (BRASIL, 1988). O artigo 227 dispõe sobre os direitos da infância brasileira de forma
abrangente:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a sobre-
vivência familiar comunitária. (BRASIL, 1988)
41
PEDAGOGIA
infantil com qualidade. Em 1993, foi elaborado o documento “Políticas para a Educação Infantil”,
com a finalidade de colocar essas ideias em prática. Entretanto, tais propostas foram interrompidas
durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso (ROSEMBERG, 2002).
Prosseguindo, em 1994, o MEC guiado pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Crian-
ça e do Adolescente, formulou a Política Nacional de Educação Infantil, em que são propostas as
diretrizes gerais para uma Política de Educação Infantil e as ações que o ministério coordenaria nos
anos seguintes com relação à educação de crianças de zero aos seis anos de idade. Nas diretri-
43
PEDAGOGIA
zes gerais, a proposta traz como princípios para a Educação Infantil o objetivo de complementar a
ação familiar, proporcionar condições adequadas de desenvolvimento físico, emocional, cognitivo e
social para a criança, ampliar suas experiências e conhecimentos, estimulando seu interesse pelo
processo de transformação da natureza e pela convivência em sociedade.
As ações educativas da creche e da pré-escola deveriam ser completadas pelas de saúde
e de assistência, realizadas de forma articulada com os setores competentes. O currículo deveria
trazer em sua concepção e administração, a consideração do grau de desenvolvimento da criança,
a diversidade social e cultural das populações infantis e o conhecimento que se pretendia univer-
salizar. Pedagogicamente, as diretrizes concebiam a criança como um ser completo, ativo, capaz,
motivado pela necessidade de ampliar seus conhecimentos e experiências e de alcançar autono-
mia progressiva frente às condições de seu meio. A criança comparece no documento como sujeito
social e histórico, pertencente a uma família que está inserida numa sociedade, numa determinada
cultura, num determinado momento histórico, sendo marcada pelo seu meio social e marcando-o.
As diretrizes concebem ainda que o desenvolvimento psicológico acontece a partir das
interações estabelecidas entre a criança e o seu meio físico e social. A interação exerceria papel
preponderante no desenvolvimento infantil e na construção do conhecimento, tornando-se efetiva
quando ocorresse de forma lúdica e afetiva. O documento propõe duas funções complementares
à educação infantil: cuidar e educar segundo os princípios acima. A contribuição deste documento
é representada pela propositura de que este nível tenha objetivos próprios, tanto em termos de
desenvolvimento como de conhecimento; dimensiona o jogo, a atividade cooperativa, a interação
social e interpessoal, o papel do adulto, a importância da criança vivenciar plenamente este perío-
do, a consideração da diversidade cultural a que a criança deve ter acesso e a criança como sujeito
que age organizando informações para construir seus conhecimentos.
Outra contribuição diz respeito à definição do papel do educador como um organizador do
ambiente, como o planejador das experiências de aprendizagem, o mediador que propõe ativida-
des, lança desafios, avalia as crianças. Redin (1988) elucida o que seria função pedagógica da
pré-escola:
Quando dizemos que a pré-escola tem uma função pedagógica, estamos nos referin-
do, portanto, a um trabalho que toma a realidade e os conhecimentos infantis como
ponto de partida e os amplia, através de atividades que têm um significado concreto,
para a vida das crianças e que, simultaneamente, asseguram a aquisição de novos
conhecimentos. (REDIN, 1988, p. 38)
Nos textos dos documentos oficiais, a Educação Infantil passa a ser legalmente concebida e reco-
nhecida como a etapa inicial da educação básica; a criança é conceituada como cidadã de direitos,
com necessidades próprias e capacidades a serem desenvolvidas através da educação em todos
os seus aspectos, com a ação complementar da família e da comunidade, conforme artigo 29 da
LDB 9394/96:
A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o de-
senvolvimento integral da criança até os seis anos de idade, em seus aspectos físico,
psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunida-
de. (BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA, 1996)
Este ponto de vista sobre o atendimento até os seis anos de idade retira imediatamente
da creche, ao menos na letra da Lei, seu caráter de assistencialismo para juntamente com a pré-
-escola, se identificar como instituição de atendimento à criança de zero a seis anos. Atualmente,
a subdivisão desfaz o formato antigo, porque são consideradas como instituições de Educação
Infantil a creche para as crianças entre zero e três anos e a pré-escola designada àquelas na faixa
etária entre quatro e seis anos de idade; ambos os segmentos devem cuidar e educar as crianças,
observando as especificidades etárias, sem descuidar da qualidade do atendimento nos sistemas
municipais de ensino. Neste sentido, conforme a LDBEN/96, artigo 62 e o Parecer do CNE/CEB
04/2000, a formação de professores para atuar na Educação Infantil, poderá ser feita em curso de
Licenciatura de Graduação Plena, em Universidades e Institutos Superiores de Educação, admitida
como formação mínima a modalidade Normal.
O afastamento do Estado como provedor de bens e serviços e o caráter da formação de
professores preconizada na LDBEN/96 figura entre os delineamentos do ponto de vista neolibe-
ral, a exemplo da indicação da formação em nível superior, seguido do aceite do nível médio. O
consentimento pela Lei da formação de professores em institutos superiores de educação des-
vinculados dos centros de pesquisa, segundo Cerisara (2002), tende a reduzi-los à condição de
executores de técnicas, mediante uma formação deficiente, na qual não há espaço para o debate e
para a reflexão, especialmente devido ao aligeiramento dos cursos e do caráter tecnicista prepon-
derante destes. O neoliberalismo, desde sua inserção no Brasil, acarretou várias consequências
para a educação em geral, dentre elas, desdobramentos perversos na Educação Infantil, como a
formação sem a especificidade da área, cursos rápidos e a baixo custo que significam limitação de
conhecimento específico e inabilidade de compreender o contexto social das crianças.
Em relação à lei 4.024, de 1961, e à lei 5.692, de 1971 (BRASIL, 1971), a atual LDBEN/96
avança ao reconhecer a Educação Infantil como a primeira etapa da educação básica, o que suge-
re que a educação é um processo contínuo. Outro aspecto novo é a finalidade da etapa que define
o desenvolvimento integral da criança em seus aspectos físicos, psicológicos, intelectuais, sociais
e culturais; além disso, apresentou diretrizes para a avaliação, sublinhando a dimensão pedagógica
do atendimento; indicou a formação de seus profissionais, fundamentalmente de nível superior, e
marcou prazos para que os sistemas municipais de ensino regularizem a situação de suas creches
45
PEDAGOGIA
e escolas de Educação Infantil. Contudo, a nova LDBEN/96 que influenciará leis e políticas educa-
cionais nos anos seguintes, é aprovada num momento histórico de forte ação do modelo neoliberal
representado pelo BM.
Desta forma, desde 1996, a educação brasileira vem sendo regulamentada pela LDB
9394/96, de inspiração absolutamente neoliberal, privatista, quantitativa (sob a égi-
de de ser qualitativa) e acrítica. Mesmo após dois mandatos de Luís Inácio Lula da
Silva (2003/06 e 2007/10), o modelo de educação brasileira não sofreu qualquer tipo
de mudança profunda e/ou significativa. Ao contrário, as instituições de ensino con-
tinuam sujeitas a índices de avaliação de desempenho, em troca de investimentos.
(ALVES, 2011, p. 11)
sobre o direito das crianças em instituições de Educação Infantil. A Emenda Constitucional nº 53,
de 19/12/2006, modifica o artigo 7º da Constituição Federal, estabelecendo o direito às crianças do
nascimento até cinco anos de idade, em creches e pré-escolas.
A partir de janeiro de 2009, a educação passou a assumir integralmente o financiamento
das instituições de educação infantil, no lugar da Assistência Social. Desse modo, como parte da
Educação Básica, a Educação Infantil deve estar sob a direção política administrativa e pedagógica
das secretarias municipais de educação em todo território nacional. As creches e pré-escolas de-
vem exercer a função de cuidar e educar de forma indissociável, superando a concepção de aten-
dimento caritativo para os pobres (CERISARA, 2002). Ainda se encontra em construção o direito
das crianças brasileiras na realidade social capitalista, visto que as crianças de zero a cinco anos
não são todas atendidas. E ainda temos professores formados em nível médio, há projetos peda-
gógicos e formas de atendimento que ignoram a criança como cidadã (CAMPOS, 2013; CAMPOS
et al., 2011).
A partir da Constituição de 1988 e da LDBEN/1996, vários documentos foram elaborados
buscando-se regulamentar e criar as condições para o direito da criança à educação: Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
(BRASIL, 1998), Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 1998; 2009a),
Subsídios para o Credenciamento e Funcionamento das Instituições de Educação Infantil (BRASIL,
1998),) Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil (BRASIL, 2006a), Parâmetros
Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006b), Política Nacional
de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis anos à Educação (BRASIL, 2006c),
Indicadores da Qualidade na Educação Infantil (BRASIL, 2009b), Critérios para um atendimento em
creches que respeite os direitos fundamentais das crianças (BRASIL, 2009c), e outros.
O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) (BRASIL, 1998) foi di-
vulgado pelo MEC com o objetivo de oferecer uma base nacional comum para os currículos, apesar
de não ser obrigatório. A integração entre educar e cuidar como função da educação infantil pôde
ser considerada um avanço, bem como o conceito de educação no qual aprendizagem e desen-
volvimento são processos interligados e dependentes. Até então não havia algo parecido para a
Educação Infantil em âmbito federal, todavia Kuhlmann Jr. (2003, p. 52) censura as reais intenções
das ações do MEC e da proposta veiculada pelo RCNEI:
A ampla distribuição de centenas de milhares de exemplares às pessoas que traba-
lham com esse nível educacional mostra o poder econômico do Ministério da Educa-
ção e seus interesses políticos, muito mais voltados para futuros resultados eleitorais
do que preocupados com a triste realidade das nossas crianças e instituições. Com
isso, a expressão no singular – referencial – significa, de fato, a concretização de
uma proposta que se torna hegemônica, como se fosse única.
47
PEDAGOGIA
de novos parâmetros para o financiamento educacional nem com a promulgação das leis que obri-
gam tal oferta universal, [...] como também não se percebeu relação direta entre maior cobertura e
melhores indicadores de qualidade” (ESTEVES, 2017, p. 1).
Destaca-se no PNE 2014-2024 a ausência de metas sobre as condições mínimas de infra-
estrutura das instituições dedicadas ao ensino infantil e médio, presentes no PNE 2001-2010), e,
igualmente, frustradas neste (CONCEIÇÃO, 2016).
As DCNEI (BRASIL, 1999; 2009a), assim com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
não são o currículo, são referência de caráter normativo do trabalho educacional com as crianças
em instituições educativas porque pretendem fornecer diretrizes teóricas e práticas a serem obser-
vadas no atendimento à criança. Esse aspecto continua imperioso à Educação Infantil para que sua
identidade educativa se estabeleça.
Em 2016, a Plataforma do Letramento10 publicou entrevista com a professora Zilma de
Moraes Ramos de Oliveira sobre a BNCC. Entre outras coisas, a professora afirma que a partir da
concepção da criança como protagonista de suas aprendizagens, a proposta é colocar o foco do
trabalho educacional na criança em sua atividade. No âmbito de experiências repletas dos objetos
culturais a serem conhecidos (linguagem matemática ou a alfabética, por exemplo) e em interação
com pares e adultos, a criança poderá atribuir sentido a estes objetos. Por meio da exploração,
do brincar, da expressão em suas várias formas, a curiosidade seria instigada no âmbito destas
experiências. Neste sentido, o arranjo curricular definido na BNCC para a Educação Infantil está
fundamentado em experiências organizadas a partir de cinco campos de experiências (o eu, o outro
e o nós; corpo, gestos e movimentos; escuta, fala, pensamento e imaginação; traços, sons, cores e
imagens; espaços, tempos, quantidades, relações e transformações). Cada um dos campos de ex-
periências conta com objetivos de aprendizagem próprios que não têm relação com as disciplinas
escolares. As experiências seriam preparadas e realizadas com as crianças, de forma a garantir
seu direito de aprender, conforme suas especificidades e modos de compreender.
Algumas das iniciativas mencionadas e políticas públicas confirmam que as legislações e
documentos oficiais do MEC que consideram a proteção da infância evoluíram de forma expressiva
nas últimas décadas. Contudo, ainda revelam-se insuficientes para suplantar o histórico de des-
caso e abandono que estabeleceram o cenário atual de disparidades de condições das crianças.
Essa realidade social evidencia que o fato de a criança ter direitos proclamados em legislações não
é garantia de efetivação dos direitos assegurados, como assinalam os estudos de Campos (2013);
Campos et al. (2011) e Campos, Füllgraf e Wiggers. (2006). Não obstante, conforme Rocha (1999),
o trabalho em creches, dentre outras questões, ainda revela a presença de políticas públicas foca-
lizadas, seletivas e compensatórias, expressas pelo número insuficiente de creches mantidas pelo
49
PEDAGOGIA
Considerações
No Brasil e no mundo, vimos acontecer ao longo da história o atendimento institucional à
criança pequena a partir de concepção bem divergente sobre sua finalidade social. Muitas des-
sas instituições surgiram com o objetivo de receber somente crianças de baixa renda. Em vários
momentos do percurso histórico de atendimento à infância, creches e programas de pré-escolas
foram propostos como estratégia para combater a pobreza e resolver os problemas sociais ligados
à sobrevivência das crianças; justificativa usada para implantação de atendimento de baixo custo
nos moldes da ideologia do Banco Mundial e de outros organismos internacionais no campo da
política neoliberal, com aplicações orçamentárias insuficientes, escassez de recursos materiais,
instalações físicas impróprias, formações aligeiradas de profissionais e elevadas proporções de
crianças por adultos.
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55
PEDAGOGIA
A pesquisadora Maria Isabel Edelweiss Bujes (2001), no capítulo Escola Infantil: Pra que te
Quero?, faz uma análise da educação da criança ao longo dos tempos e esclarece que, durante
muitos anos, essa educação foi considerada como sendo de responsabilidade das famílias ou do
grupo social ao qual ela pertencia. Não houve, por longo tempo, uma instituição encarregada de
compartilhar com as famílias a educação e o cuidado das crianças pequenas.
Para Bujes (2001), a escola infantil surge ao lado de mudanças na sociedade a respeito
das maneiras de se pensar o que é ser criança e de se compreender a importância da infância em
nossas vidas.
O excerto a seguir, extraído do capítulo escrito pela pesquisadora, ajuda-nos a compreender
as relações entre as modificações nas formas de se enxergar a criança e a função que as creches
e pré-escolas assumem, hoje, em nossa sociedade:
Ao considerarmos que vivemos em contextos culturais e históricos em permanente
transformação, podemos incluir aí também a ideia de que as crianças participam
igualmente desta transformação e, neste processo, acabam também transformadas
pelas experiências que vivem neste mundo extremamente dinâmico. Portanto, penso
que é de extrema importância nos darmos conta de que as mudanças que ocorrem
com as crianças, ao longo da infância, são muito importantes e que algumas delas
jamais se repetirão. [...] Continuo pensando que a criança nos desafia porque ela
tem uma lógica que é toda sua, porque ela encontra maneiras peculiares e muito
originais de se expressar, porque ela é capaz através do brinquedo, do sonho e da
fantasia de viver num mundo que é apenas seu. Outro desafio que as crianças nos
fazem enfrentar é o de perceber o quanto são diferentes e que esta diferença não
deve ser desprezada nem levar-nos a tratá-las como desiguais. Tudo isso leva-me a
pensar que a experiência da educação infantil precisa ser muito mais qualificada. Ela
deve incluir o acolhimento, a segurança, o lugar para a emoção, para o gosto, para
o desenvolvimento da sensibilidade; não pode deixar de lado o desenvolvimento das
habilidades sociais, nem o domínio do espaço e do corpo e das modalidades expres-
sivas; deve privilegiar o lugar para a curiosidade e o desafio e a oportunidade para
a investigação. Por tais razões, as instituições de Educação Infantil são hoje indis-
pensáveis na sociedade. Elas tanto constituem o resultado de uma forma moderna
de ver o sujeito infantil quanto solução para um problema de administração social,
criado a partir de novas formas de organização da família e de participação das mu-
lheres na sociedade e no mundo do trabalho. (BUJES, 2001, p. 21).
No documento Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis
anos à Educação (BRASIL, 2006), também encontramos, como é possível observar no excerto a
57
PEDAGOGIA
seguir, relações entre as mudanças nas formas de ver as crianças e as funções assumidas pelas
escolas de Educação Infantil:
A trajetória da educação das crianças de 0 a 6 anos assumiu e assume ainda hoje, no
âmbito da atuação do Estado, diferentes funções, muitas vezes concomitantemente.
Dessa maneira, ora assume uma função predominantemente assistencialista, ora
um caráter compensatório e ora um caráter educacional nas ações desenvolvidas.
Contudo, as formas de ver as crianças vêm, aos poucos, se modificando, e atual-
mente emerge uma nova concepção de criança como criadora, capaz de estabelecer
múltiplas relações, sujeito de direitos, um ser sócio-histórico, produtor de cultura e
nela inserido. Na construção dessa concepção, as novas descobertas sobre a crian-
ça, trazidas por estudos realizados nas universidades e nos centros de pesquisa
do Brasil e de outros países, tiveram um papel fundamental. Essa visão contribuiu
para que fosse definida, também, uma nova função para as ações desenvolvidas
com as crianças, envolvendo dois aspectos indissociáveis: educar e cuidar. Tendo
esta função, o trabalho pedagógico visa atender às necessidades determinadas pela
especificidade da faixa etária, superando a visão adultocêntrica em que a criança
é concebida apenas como um vir a ser e, portanto, necessita ser “preparada para”.
(BRASIL, 2006, p. 8).
A criança como todo ser humano, é um sujeito social e histórico e faz parte de uma
organização familiar que está inserida em uma sociedade, com uma determinada
cultura, em um determinado momento histórico. É profundamente marcada pelo
meio social em que se desenvolve, mas também o marca. A criança tem na família,
biológica ou não, um ponto de referência fundamental, apesar da multiplicidade de
interações sociais que estabelece com outras instituições sociais.
As crianças possuem uma natureza singular, que as caracteriza como seres que
sentem e pensam o mundo de um jeito muito próprio. Nas interações que estabele-
cem desde cedo com as pessoas que lhe são próximas e com o meio que as circun-
da, as crianças revelam seu esforço para compreender o mundo em que vivem, as
Dessa forma, vemos que as concepções de criança, creche e pré-escola vão sendo
modificadas ao longo do tempo. Se, hoje, as escolas de educação infantil devem cumprir sua
função sociopolítica e pedagógica, conforme determinam as Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Educação Infantil, conforme Resolução n. 5, de 17 de dezembro de 2009 (CNE, 2009), é porque
estamos diante de uma concepção de criança como sujeito histórico e de direitos.
Como citar e referenciar este texto
Originalmente publicado em:
NONO, Maévi Anabel. Concepções de criança, creche e pré-escola. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL
PAULISTA [UNESP]; UNIVERSIDADE VIRTUAL DO ESTADO DE SÃO PAULO [UNIVESP] (org.).
Caderno de formação: formação de professores: educação infantil: princípios e fundamentos. São
Paulo: Cultura Acadêmica: Universidade Estadual Paulista, Pró-Reitoria de Graduação, 2010. v.
1. p. 125-128. ISBN 978-85-7983-069-3. Disponível em: https://acervodigital.unesp.br/bitstream/
unesp/337946/1/caderno-formacao-pedagogia_6.pdf. Acesso em: 19 ago. 2022. (Psicologia do
Desenvolvimento, Caderno de formação n. 6, bloco 1, módulo 3, disciplina 12).
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BUJES, M. I. E. Escola Infantil: Pra que te Quero? In: CRAIDY, M.; KAERCHER, G. E. P. S. Educação
Infantil: Pra que te quero? Porto Alegre: Artmed, 2001, p. 13-22.
59
PEDAGOGIA
Para tratarmos da importância do papel com dupla função que as creches e pré-escolas
precisam assumir – cuidar das crianças que atendem e educá-las –, vamos, inicialmente, valer-nos
do relato feito por Maria Clotilde Rossetti-Ferreira (2003) de uma situação que revela como cuidado
e educação podem – e devem! – caminhar juntos na Educação Infantil.
No excerto logo a seguir, a pesquisadora – que se tem dedicado aos estudos sobre Educação
Infantil e publicado muitos livros importantes na área – apresenta a descrição de uma situação de
banho que proporciona às crianças determinado tipo de cuidado e de educação. Vejamos:
Duas educadoras compunham a situação, com um grupo de 15 crianças de 2 a 3
anos. O ritmo de umas e de outras era bem diferenciado. Enquanto as educadoras,
automática e rapidamente, desempenhavam as tarefas de despir, lavar, secar e ves-
tir uma criança após a outra, as crianças eram submetidas a um contínuo e longo
tempo de espera. De início, permaneciam em penicos encostadas à parede. Quando
chegava sua vez, eram pegas, esfregadas, enxaguadas e deixadas, ainda pingando,
no estrado, para esperar a vez de serem vestidas e penteadas pela outra educadora.
Terminada essa rotina, as crianças ficavam à espera da rotina seguinte, sendo repre-
endidas se não ficassem quietas e silenciosas. Pouca ou nenhuma oportunidade era
propiciada a elas de ter alguma autonomia na situação, desfrutar o prazer da água no
corpo, interagindo e brincando umas com as outras. A organização dessa situação
de cuidado estava claramente educando as crianças a serem submissas e passivas,
sem iniciativa e autonomia. (ROSSETTI-FERREIRA, 2003, p. 10-11).
No trecho seguinte, a pesquisadora esclarece como a rotina do banho, presente nas creches
e pré-escolas, pode possibilitar outro tipo de cuidado, no caso, mais humano, e de educação.
Percebam, durante a leitura do trecho, a necessidade de formação do professor de Educação
Infantil para lidar com um momento fundamental para o desenvolvimento das crianças: o banho.
Imaginem quantos conhecimentos são necessários ao professor para proporcionar aos meninos e
meninas práticas de cuidado que favoreçam a educação, pois voltadas para o seu desenvolvimento
integral:
Essa mesma rotina do banho pode ser trabalhada de forma completamente diversa.
O ambiente e a rotina podem ser organizados de maneira a oportunizar às crianças
o desenvolvimento autônomo de uma série de habilidades, como despir, lavar, en-
xugar, vestir e calçar a si próprias e às outras. Podem ter ocasião de experimentar
a textura e outras qualidades da água, do sabão e das esponjas. Podem ajudar os
outros ou cuidar deles, ou serem cuidadas por eles... Com isso, estaremos exercen-
do um cuidado/uma educação que as coloca em uma posição mais ativa, de alguém
competente para interagir, aprender e exercer uma série de funções. (ROSSETTI-
-FERREIRA, 2003, p. 11)
Percebem como uma mesma situação pode ser conduzida de diferentes formas?
Falar de cuidado e educação na Educação Infantil significa tratar de todas as situações
presentes neste espaço, como possibilidades de desenvolvimento para as crianças. Momentos
como banho, sono, alimentação, troca de fraldas representam tempos e espaços privilegiados
de contato das crianças com os adultos presentes nas creches e pré-escolas e também com as
outras crianças. Não se trata de atender de forma mecânica às necessidades básicas dos meninos
e meninas, cuidando para que fiquem sempre limpos e saciados. Trata-se, sim, de aproveitar
cada situação para proporcionar o desenvolvimento integral das crianças. Significa considerar
cada situação como um meio para observar as particularidades de cada criança, oferecendo-lhe,
inclusive, momentos de atenção individual, mesmo nas situações coletivas.
É fundamental que as práticas de cuidado estejam interligadas às práticas em que se educa,
em que se proporciona a conquista da linguagem, a exploração do próprio corpo e dos movimentos,
o desenvolvimento da autonomia, a percepção do mundo e a atuação sobre ele.
Vejam no trecho a seguir que Bujes, no capítulo intitulado “Escola Infantil: pra que te quero?”,
publicado no livro Educação Infantil: pra que te quero?, organizado por Carmem Craidy e Gládis
E. Kaercher(2001), trata da necessidade de que educar e cuidar sejam compreendidos como
processos complementares e indissociáveis no trabalho com as crianças pequenas:
A educação da criança pequena envolve simultaneamente dois processos comple-
mentares e indissociáveis: educar e cuidar. As crianças desta faixa etária, como sa-
bemos, têm necessidades de atenção, carinho, segurança, sem as quais elas difi-
cilmente poderiam sobreviver. Simultaneamente, nesta etapa, as crianças tomam
contato com o mundo que as cerca, através das experiências diretas com as pesso-
as e as coisas deste mundo e com as formas de expressão que nele ocorrem. Esta
inserção das crianças no mundo não seria possível sem que atividades voltadas si-
multaneamente para cuidar e educar estivessem presentes. O que se tem verificado,
na prática, é que tanto os cuidados como a educação têm sido entendidos de forma
muito estreita. (BUJES, 2001, p. 16).
Os educadores Ana Isabel Lima Ramos e Alberto da Motta Porto Alegre, em um artigo publicado
na Revista Pátio Educação Infantil, em 2003, revelam como lidam com a indissociabilidade do
cuidado e educação no trabalho que realizam com bebês que têm em torno de 14 meses de idade.
Observem como eles percebem as dimensões do cuidar e educar nas práticas que desenvolvem
com os pequenos:
Quando começamos a trabalhar com bebês, já acreditávamos que tudo o que fazía-
mos com eles era importante; o cuidar e o educar estavam unidos pelas ações das
crianças e dos educadores. Quando trocavam as fraldas, tocavam-se, choravam,
brincavam com os pés. Quando se alimentavam, tocavam nos alimentos, juntavam
pequenos grãos de arroz com os dedinhos em forma de pinça e observavam o mo-
vimento dos líquidos na mamadeira. Ao dormir, emitiam sons ou se aninhavam nos
seus “cheirinhos”. Saber que essas ações contêm em si mesmas aspectos do cuida-
do e da educação é tarefa fundamental dos formadores em educação, dos coorde-
61
PEDAGOGIA
Como professores e gestores de creches e pré-escolas, devemos estar atentos para oferecer
para as crianças pequenas situações que envolvam ações educativas e de cuidados. As instituições
infantis devem ser espaços nos quais as crianças possam aprender, crescer, desenvolver-se,
sempre sob o olhar atento dos adultos. A associação entre educar e cuidar irá permitir que as
crianças possam, de fato, desenvolver-se em seus múltiplos aspectos.
NONO, Maévi Anabel. Educar e cuidar nas creches e pré-escolas. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL
PAULISTA [UNESP]; UNIVERSIDADE VIRTUAL DO ESTADO DE SÃO PAULO [UNIVESP] (Org.).
Caderno de formação: formação de professores: educação infantil: princípios e fundamentos. São
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Desenvolvimento, Caderno de formação n. 6, bloco 1, módulo 3, disciplina 12).
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Educação Infantil: pra que te quero? Porto Alegre: Artmed, 2001, p. 13-22.
Diversas pesquisas vêm sendo realizadas com o objetivo de investigar e subsidiar políticas
de formação do profissional de Educação Infantil diante das novas exigências para esta etapa da
Educação Básica (KRAMER, 2005; MICARELLO, 2006).
Conforme afirma Lanter, no capítulo A política de formação do profissional de Educação
Infantil: os anos 90 e as diretrizes do MEC diante da questão, da obra de Kramer (1999, p. 137), “A
questão da formação dos professores representa para a educação infantil, dentre outros aspectos,
questão fundamental para o reconhecimento desse segmento como instância educativa e também
para sua qualidade”, o que sugere a necessidade do investimento em pesquisas na área.
Em sua tese de doutorado Professores da pré-escola: trabalho, saberes e processos de
construção, defendida em 2006, a pesquisadora, Hilda Aparecida Linhares da Silva Micarello,
procura compreender o amálgama de saberes que os profissionais da Educação Infantil mobilizam
em suas atividades de docência, considerando os sentidos que esses profissionais produzem para
essa docência e as condições em que ela se dá.
Na investigação que realiza, Micarello (2006) destaca a precariedade da formação do
professor e da professora de Educação Infantil e a própria indefinição do papel do profissional
que trabalha com as crianças pequenas. Ela considera que, até mesmo nos documentos oficiais
relativos à Educação Infantil, existe pouca clareza com relação ao perfil profissional dos professores
da educação infantil.
Apesar disso tudo, Micarello afirma que:
[...] a despeito das lacunas, seja na formação inicial, seja na formação continuada ou
em serviço e a despeito, ainda, do grande número de profissionais que não dispõem
sequer da formação mínima exigida por lei e que atuam nas instituições que atendem
à criança pequena, a educação infantil tem uma história e um perfil que seus profis-
sionais têm contribuído para construir. Os professores da educação infantil, assim
como outros profissionais, constroem, no dia-a-dia das instituições onde atuam, uma
prática que se fundamenta em alguns saberes. Meu convívio com profissionais da
educação infantil em seu campo de atuação profissional e em um dos locus de sua
formação inicial (o curso de Pedagogia), assim como a participação na pesquisa
acadêmica, tem mostrado que a prática desses profissionais junto à criança peque-
na é orientada por um amálgama de saberes em que se misturam as experiências
anteriores, advindas da vida privada, familiar, os saberes adquiridos nos cursos de
formação e aqueles advindos da prática, da interação com outros profissionais mais
experientes, com os alunos e suas famílias. (MICARELLO, 2006, p. 12-13).
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PEDAGOGIA
Pelas constatações das autoras, nota-se que o professor da Educação Básica deve participar
da elaboração da proposta pedagógica da escola de Educação Infantil em que atua. Além disto,
ele precisa possuir uma formação, que inclua o exame dos conhecimentos e valores que possui
acerca da criança, e da função da creche e da pré-escola, e que lhe garanta a apropriação de um
conhecimento técnico e o desenvolvimento de habilidades, para interagir com crianças pequenas,
auxiliando-as a interagir com outras crianças (OLIVEIRA, 2007).
As pesquisadoras Heloisa Helena Azevedo e Roseli Pacheco Schnetzler, no trabalho
Necessidades Formativas de Profissionais de Educação Infantil, apresentado na 24ª Reunião
Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação (ANPEd), em 2001, relatam
uma investigação por elas realizada na tentativa de identificar as necessidades formativas de
profissionais de Educação Infantil. Elas entendem o termo necessidades formativas, como lacunas
de conhecimentos dos professores relativas à área de atuação no desenvolvimento de sua prática
pedagógica.
Para essas pesquisadoras (2001) é fundamental que as lacunas na formação dos professores
e professoras de Educação Infantil sejam identificadas, a fim de se organizar atividades de formação
para esses profissionais.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia, conforme Resolução CNE/
CP n. 1, de 15 de maio de 2006, em seu artigo 7, parágrafo II (CNE, 2006), apontam a necessidade
da formação do aluno deste curso para atuar na gestão e no ensino na Educação Infantil, e indicam
a obrigatoriedade da realização de 300 horas de Estágio Curricular Supervisionado prioritariamente
em Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
De acordo com Oliveira (2007), as reuniões de supervisão de estágio são um ponto
fundamental na formação adequada do profissional de Educação Infantil. Segundo a pesquisadora,
“Nelas devem ser trabalhadas, de forma integrada e crítica, tanto a percepção do papel de professor
quanto o desempenho dele, cuidando ainda para garantir o exame das dimensões éticas da atuação
docente” (OLIVEIRA, 2007, p. 32).
O estágio curricular tem como finalidade “[...] integrar o processo de formação do aluno, futuro
profissional, de modo a considerar o campo de atuação como objeto de análise, de investigação
e de interpretação crítica, a partir dos nexos com as disciplinas do curso” (PIMENTA; LIMA, 2004,
p. 24). Deve constituir-se como “[...] oportunidade de aprendizagem da profissão docente e de
construção da identidade profissional” (PIMENTA; LIMA, 2004, p. 99-100). Estudos têm investigado
o potencial do estágio como espaço e momento de formação docente (BARBOSA, 2006; GUERRA,
2000; OSTETTO, 2006).
Como citar e referenciar este texto
Originalmente publicado em:
NONO, Maévi Anabel. Identidade do professor de educação infantil. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL
PAULISTA [UNESP]; UNIVERSIDADE VIRTUAL DO ESTADO DE SÃO PAULO [UNIVESP] (Org.).
Caderno de formação: formação de professores: educação infantil: princípios e fundamentos. São
Paulo: Cultura Acadêmica: Universidade Estadual Paulista, Pró-Reitoria de Graduação, 2010. v.
1. p. 146-149. ISBN 978-85-7983-069-3. Disponível em: https://acervodigital.unesp.br/bitstream/
unesp/337946/1/caderno-formacao-pedagogia_6.pdf. Acesso em: 19 ago. 2022. (Psicologia do
Desenvolvimento, Caderno de formação n. 6, bloco 1, módulo 3, disciplina 12).
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PEDAGOGIA
Referências
AZEVEDO, H. H.; SCHNETZLER, R. P. Necessidades formativas de profissionais de Educação
Infantil. In: REUNIÃO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
EDUCAÇÃO, 24., 2001, Caxambu. Anais... Caxambu: ANPEd, 2001. Disponível em: http://24reuniao.
anped.org.br/T0707185822605.doc. Acesso em: 19 ago. 2022.
CAMPOS, M. M.; CRUZ, S. H. V. Consulta sobre Qualidade na Educação Infantil: o que pensam e
querem os sujeitos deste direito. São Paulo: Cortez, 2006.
KRAMER, S. (org.). Profissionais de Educação Infantil: gestão e formação. São Paulo: Ática, 2005.
OLIVEIRA, Z. R. Educação Infantil: fundamentos e métodos. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2007.
(Coleção Docência em Formação).