Novena de Natal
Novena de Natal
Novena de Natal
16/12 a 24/12
Primeiro Dia - 16 de Dezembro
Jesus Menino consente em ser nosso Redentor
“Eu te estabeleci para luz das gentes, a fim de levares a minha salvação até
à última extremidade da terra” (Is 49, 6)
Referências: (1) Is 49, 6; (2) São Bernardo; (3) Jo 3, 16; (4) Sl 18, 6;
gria todas as dores e ignomínias que na terra teria de sofrer pro amor dos
homens.
Pondera aqui o Pai celestial, mandando seu Filho para ser nosso Redentor e
medianeiro entre Deus e os homens, se obrigou, por assim dizer, a perdoar-
-nos e a amar-nos, visto que prometeu receber-nos em sua graça, contan-
to que o Filho satisfizesse por nós à Justiça Divina. Por outra parte o Verbo
Divino, tendo aceitado a incumbência do Pai, que no-lo deu enviando-o
para nossa redenção, obrigou-se também a amar-nos, não em vista de
nossos merecimentos, mas para obedecer à vontade misericordiosa do Pai.
II. Meu amado Jesus, se é verdade, conforme reza a lei, que a doação faz
adquirir o domínio, Vós sois meu, visto que vosso Pai Vos deu a mim; por
mim é que nascestes, a mim é que fostes dado. Posso dizer, pois, com ver-
dade: Iesus meus et omnia – Meu Jesus e meu tudo! Já que sois meu, é
meu também tudo quanto é vosso. Assim m’o garante o vosso Apóstolo:
Quomodo non etiam cum illo omnia nobis donavit? (5) – Como não nos deu
também com ele todas as coisas? É meu o vosso sangue, são, meus os
vossos merecimentos, são minhas as vossas graças, é meu o vosso paraíso.
Se sois meu, quem jamais poderá separar-me de Vós? Assim dizia jubiloso
Santo Antão Abade. Assim também quero dizer para o futuro. Somente por
culpa minha posso perder-Vos e separar-me de Vós. Mas, ó meu Jesus, se
antigamente Vos deixei e perdi, agora pesa-me de toda a minha alma e
estou resolvido a antes perder a vida e tudo, do que a perder-Vos, ó Bem
infinito e único Amor da minha alma.
Graças Vos dou, Pai Eterno, por me haverdes dado vosso Filho, me dou
todo a Vós. Por amor desse mesmo Filho, aceita-me e prendei-me com
laços de amor ao meu Redentor; mas prendei-me de tal maneira que eu
também possa dizer: Quis me separabit a caritate Christi? (6) – Quem me
separará do amor de Cristo? Que bem terrestre será ainda capaz de sepa-
rar-me do meu Jesus? E Vós, meu Salvador, se sois todo meu, sabei que eu
também sou todo vosso. Disponde de mim, e de tudo o que é meu, como
quiserdes. Será possível que eu recuse alguma coisa a um Deus que não me
recusou seu sangue e sua vida?
“Não quiseste hóstia nem oblação, porém me formaste um corpo” (Hb 10,5)
Tudo quanto Jesus Cristo padeceu no correr da sua vida, foi-lhe posto
diante dos olhos quando ainda se achava no seio de sua Mãe; e Jesus acei-
tou tudo por nosso amor. Porém, naquela aceitação e na repressão da
repugnância natural, ó Deus, que aflição devia experimentar o seu Cora-
ção! Se Jesus, embora inocente, desde princípio da vida começou a sofrer
por nós, não é justo que nós, que somos pecadores, padeçamos alguma
coisa por seu amor e em desconto dos nossos pecados?
Pondera que tudo o que Jesus Cristo sofreu no correr da sua vida e em sua
Paixão, foi-lhe posto diante dos olhos quando ainda se achava no seio de
sua Mãe. Jesus aceitou tudo com amor. Mas naquela aceitação, e na
repressão de sua repugnância natural, ó Deus, que angústias e que aflição
não devia experimentar o Coração inocente de Jesus! Desde então com-
preenderia bem quanto teria de sofrer, primeiro nascendo numa gruta fria,
pousada de animais; em seguida, tendo de morar trinta anos desconhecido
na loja de um simples oficial. Já então viu que os homens haviam de tratá-
-lo de ignorante, de escravo, de sedutor, de réu de morte, digno da mais
infamante e dolorosa morte destinada aos celerados. Tudo isso o nosso
amante Redentor aceitou-o cada instante, mas cada vez que renovava a
II. Ó meu amado Redentor, quanto Vos custou, desde a vossa primeira en-
trada neste mundo, tirar-me da miséria que tinha atraído sobre mim pelos
meus pecados! Para me livrardes da escravidão do demônio, a quem de
livre vontade me tinha vendido, Vós sujeitastes a ser tratado como o mais
vil de todos os escravos. E eu, sabedor disso, tive ânimo de amargurar
tantas vezes o vosso amabilíssimo Coração, que tanto me amou! Mas, já
que Vós, que sois inocente e sois o meu Deus, aceitastes por meu amor
uma vida e uma morte tão penosas, aceito, por vosso amor, ó Jesus meu,
toda a pena que me vier das vossas mãos. Aceito-a e abraço-a por vir
daquelas mãos que um dia foram transpassadas, a fim de livrar-me do
inferno tantas vezes merecido pelos meus pecados. Ó meu Redentor, o
amor que mostrastes em oferecer-Vos a sofrer tanto por mim, constrange-
-me demais a aceitar por vosso amor toda a pena, todo o desprezo. Ó meu
Senhor, pelos vossos merecimentos dai-me o vosso santo amor; este tor-
nar-me-á suaves e amáveis todas as dores e todas as ignomínias. Amo-
-Vos sobre todas as coisas, amo-Vos de todo o meu coração, amo-Vos
mais que a mim mesmo.
Maria Santíssima, recomendai-me a vosso Filho, peço-o pelo amor que lhe
tendes. Lembrai-vos que sou uma daquelas ovelhas pelas quais vosso Filho
morreu.
Terceiro Dia - 18 de Dezembro
Expectação do Parto da Virgem Maria
Foi tão grande o desejo de Maria de ver em breve nascido seu divino Filho,
que em comparação com ele os suspiros mais ardentes dos Patriarcas e
dos Profetas pareciam frios. Todavia Jesus não quis antecipar seu nasci-
mento; quis ser semelhante aos outros e ficar oculto no seio materno em
recolhimento e em preparação de sua entrada no mundo. Oh! Que bela
lição para nós, se a soubermos aproveitar.
Ó divina Mãe, graças vos sejam dadas por terdes desejado tanto dar-nos o
vosso Jesus! Por piedade dai-m’o também a mim; fazei que, assim como
nasceu corporalmente de vossas puríssimas entranhas, assim renasça
espiritualmente pela graça em meu coração. Fazei que a minha alma abra-
sada no amor divino, procure comunicá-lo também ao próximo.
II. Mais ardente do que o desejo de Maria foi o de Jesus. Achando-se ainda
no seio de Maria ansiava pela hora de seu nascimento, a fim de realizar a
obra da Redenção do gênero humano e cumprir a sua missão conforme à
Desde o instante em que foi criada a alma de Jesus Cristo e unida com seu
pequenino corpo, viu diante de si todos os padecimentos que teria de sofrer
para a redenção dos homens. Por isso Jesus começou desde o primeiro
instante da sua vida a sofrer por nosso amor a tristeza mortal que depois
padeceu no horto de Getsemani. E como temos nós correspondido a tão
grande amor? Talvez com frieza e ingratidão.
Quando Abraão levava seu filho à morte, não quis contristá-lo comunican-
do-lhe a sorte com antecedência, nem no pouco de tempo de que precisa-
vam para chegarem ao monte. Mas o Pai Eterno quis que seu Filho encar-
nado, destinado a ser vítima da divina justiça pelos nossos pecados, sofres-
se já então todas as penas, às quais depois deveria submeter-se na vida e
na morte – Por esta razão, desde o instante em que baixou ao seio de sua
Mãe, Jesus sofreu sem interrupção a tristeza que o acabrunhou no horto, e
que era suficiente para tirar-lhe a vida, assim como ele mesmo disse: Tristis
est anima mea usque ad mortem (1) – A minha alma está triste até à
morte. De sorte que desde então ele sentiu vivamente e sofreu o peso todo
de todos os tormentos e opróbrios que o esperavam.
Ah, meu redentor, quão pouco são os que pensam nas vossas dores e no
vosso amor! Ó Deus! Quão poucos são os que Vos amam! Mas ai de mim!
Eu também tenho vivido muitos anos esquecido de Vós! Vós tanto padeces-
tes para ser de mim amado, e não Vos amei. Perdoai-me, ó Jesus meu,
perdoai-me; quero emendar-me e amar-Vos. Desgraçado de mim, Senhor,
se ainda resistisse à vossa graça, e com a minha resistência me condenas-
se! As grandes misericórdias de que tendes usado comigo, e especialmente
a vossa doce voz que agora me chama ao vosso amor, seriam o meu maior
castigo no inferno. Meu amado Jesus, tende piedade de mim, não permitais
que para o futuro eu viva ingrato ao vosso amor. Dai-me luz e dai-me força
para vencer tudo a fim de cumprir a vossa santa vontade. Atendei-me,
Vo-lo peço, pelos merecimentos de vossa Paixão. É nesta que confio, bem
como na vossa intercessão, ó Maria.
Minha querida Mãe, socorrei-me; vós me impetrastes todas as graças que
tenho recebido de Deus; eu vo-lo agradeço; mas se não continuardes a
socorrer-me, eu continuarei a ser infiel, assim como o tenho sido nos anos
passados.
II. Ó meu Senhor, quereis que Vos diga como me tenho havido para convos-
co durante a minha vida? Desde o despontar da razão comecei a desprezar
a vossa graça e o vosso amor. Mas Vós o sabeis melhor do que eu mesmo;
não obstante suportastes-me, porque ainda me quereis bem. Eu andava
fugindo de Vós, e Vós viestes à minha procura chamando-me. Foi esse
mesmo amor que Vos fez baixar do céu, a fim de buscar as ovelhas perdi-
das, que Vos fez suportar-me e não me abandonar. Meu Jesus, agora Vós
me buscais e eu Vos busco. Sinto que a vossa graça me auxilia; auxilia-me
com o arrependimento de meus pecados, que detesto mais que qualquer
outro mal; auxilia-me inspirando-me um grande desejo de Vos amar e
dar-Vos gosto. Sim, meu Senhor, quero amar-Vos e agradar-Vos quanto
puder.
“Veio para o que era seu, e os seus não o receberam” (Jo 1, 11)
A ingratidão desagrada aos homens. Qual deve, pois, ter sido a tristeza de
Jesus Menino, ao prever que os seus benefícios seriam pagos pelo mundo
com injúrias, traições e tormentos! Mas ai de nós, que por ventura também
até hoje temos respondido aos benefícios do Senhor de um modo tão desu-
mano. Ou pelo menos temo-lo amado tão pouco, como se nenhum bem
nos tivesse feito, nem sofrido coisa alguma por nós. Quereremos ser tão
ingratos sempre?
I. Pelos dias do Santo Natal, São Francisco de Assis andava pelos caminhos
e bosques chorando e suspirando com gemidos inconsoláveis. Perguntando
pela razão de tanto sofrer respondeu:
Como não chorar, vendo que o amor não é amado? Vejo um Deus como
que perdido de amor ao homem, e o homem tão ingrato para com esse
Deus! Ora, se a ingratidão dos homens afligia tanto o coração de São Fran-
cisco, quanto mais não terá afligido o Coração de Jesus Cristo?
Parece que também hoje em dia Jesus Cristo se queixa: Tamquam extra-
neus factus sum fratribus meis (3) – Fiquei como que um estranho a meus
irmãos. Porquanto vê que de muitos não é amado, nem conhecido, como se
nenhum bem lhes tivesse feito, e nada por amor deles tivesse sofrido. Ó
Deus, que caso fazem também presentemente tantos cristãos do amor de
Jesus Cristo?
Meu amado Jesus, será verdade que Vós baixastes do céu para Vos fazer-
des amar de mim, que por meu amor viestes abraçar uma vida de traba-
lhos e a morte de cruz, a fim de que eu Vos faça boa acolhida em meu co-
ração, eu que tive a audácia de Vos repelir tantas vezes de mim, dizendo:
Recede a me, Domine – Afasta-te de mim, Senhor; não Vos quero? Ó meu
Deus, se não fosseis a bondade infinita e não tivesseis dado a vida para me
perdoardes, não me animaria a peidr-Vos perdão. Mas ouço que vós
mesmo me ofereceis a paz: Convertimini ad me, ait Dominus, et convertar
ad vos (5) – Convertei-vos a mim, diz o Senhor, e eu me converterei a vós.
Vós mesmo, ó Jesus, a quem tenho ofendido, quereis ser o meu advogado:
Ipse est propitiatio pro peccatis nostris (6) – Ele é a propiciação pelos
nossos pecados. Não Vos quero fazer nova injúria desconfiando da vossa
misericórdia. Pesa-me de toda a minha alma de Vos ter desprezado, ó Bem
supremo; pelo sangue que derramastes por mim, recebei-me em vossa
graça.
Referências: (2) Sl 108, 5; (3) Sl 68, 9; (4) Jó 22, 17; (5) Zc 1, 3; (6) Jo 2, 2;
Pater, non sum dignus vocari filius tuus (7) – Meu Pai e meu Redentor, não
sou mais digno de ser vosso Filho, depois de ter renunciado tantas vezes ao
vosso amor; mas fazei-me digno com os vossos merecimentos. Graças Vos
dou, meu Pai, graças Vos dou e Vos amo. Ah, só a lembrança da paciência
com que me tendes suportado tantos anos, e das graças que me tendes
dispensado, depois de tantas injúrias que vos causei, deveria fazer-me
viver sempre abrasado em vosso amor. Vinde, pois, meu Jesus, não quero
mais repulsar-Vos, vinde morar em meu pobre coração. Amo-VOs e quero
amar-Vos sempre. Abrasai-me sempre mais, lembrando-me o amor que
me mostrastes.
Minha Rainha e Mãe, Maria, ajudai-me, rogai a Jesus por mim; fazei com
que, no tempo de vida qeu ainda me resta, me mostre grato a Deus, que
me amou tanto, ainda depois de eu o ter ofendido tão gravemente.
“Subiu também José, para se alistar com a sua esposa Maria, que estava
grávida” (Lc 2, 4)
Tendo Deus decretado que seu Filho nascesse do modo mais pobre e mais
penoso, numa estribaria, dispôs que Cesar lançasse um decreto de recen-
seamento universal. Sabedor disso, perturbou-se São José na dúvida se
levaria, ou não, Maria consigo. A Virgem, porém, animou-o, e com ele se
pôs a caminho. Tomemos estes santos personagens como companheiros
em nossa viagem para a eternidade.
I. Havia Deus decretado que seu Filho nascesse, não na casa de José, senão
numa gruta que servia de estrebaria, do modo mais pobre e mais penoso,
por que uma criança pode nascer. Por isso dispôs que Cesar lançasse um
edito por meio do qual cada um deveria alistar-se na cidade própria donde
trazia a sua origem. Quando José teve conhecimento do mando, pertur-
bou-se na dúvida se deveria deixar a Virgem Maria em casa ou levá-la
consigo, visto que estava próxima a dar à luz.
II. Meu caro Redentor, sei que nesta viagem Vos acompanham legiões de
anjos do céu; mas quem Vos acompanha na terra? Ninguém senão José e
Maria que Vos traz consigo. Permiti, ó meu Jesus, que eu também Vos
acompanhe. Tenho sido um miserável ingrato, mas agora reconheço a injú-
ria que tenho feito. Vós baixastes do céu para fazer-Vos meu companheiro
na terra, e eu ingrato tantas vezes afastei-me de Vós pelos meus pecados.
Ó meu Senhor, quando penso que tão repetidas me apartei de Vós para
satisfazer aos meus detestáveis apetites, renunciando assim à vossa ami-
zade, quisera morrer de dor. Mas Vós viestes para me perdoar; perdoai-me
sem demora, visto que me pesa de toda a minha alma de Vos ter abando-
nado e virado as costas tantas vezes. Proponho e com a vossa graça
espero nunca mais Vos deixar e nunca mais me aparta de Vós, meu único
amor.
“Veio para o que era seu, e os seus não o receberam” (Jo 1, 11)
A cidade de Belém, que recusa dar abrigo a Jesus Menino, foi figura daque-
les muitos corações ingratos que dão acolhida a tantas miseráveis criaturas
e não a Deus. Reflitamos, porém, no que a Virgem Maria disse a uma alma
devota: Foi uma disposição divina que a mim e a meu Filho nos faltasse
abrigo entre os homens, a fim de que as almas, cativadas pelo amor de
Jesus, se oferecessem a si próprias para o acolherem.
I. Quando um rei faz a primeira entrada numa cidade do seu reino, que
manifestações de veneração se lhe preparam! Que pompas! Quantos arcos
de triunfo! Prepara-te, pois, ó Belém venturosa, para receberes dignamente
Rei do céu; fica sabedoria que entre todas as cidades és tu a ditosa que ele
escolheu para nela nascer em terra, a fim de reinar depois no coração dos
homens. Ex te enim egredietur qui sit dominator in Israel (1) – De ti sairá
aquele que há de reinar em Israel.
Eis que já entram em Belém esses dois excelsos viajantes, José e Maria, que
traz no seio o Salvador do mundo. Entram na cidade, dirigem-se para a
casa do ministro imperial, a fim de pagarem o tributo e serem alistados nos
registros dos súbitos do Cesar. Mas quem os reconhece? Quem lhes vai ao
encontro? Quem lhes oferece agasalho? In propria venit, et sui cum non
recepernunt – Ele veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Eles
são pobres, e como pobres são desprezados; são tratados ainda pior do
que os outros pobres, e até repulsos.
II. A estalagem de Belém foi figura daqueles corações ingratos que dão aco-
lhida a tantas criaturas miseráveis e não a Deus. Quantos há que amam os
parentes, os amigos, até os animais, mas não amam Jesus Cristo e
nenhum caso fazem de sua graça e de seu amor. Maria Santíssima disse a
uma alma devota: Foi uma disposição divina que a mim e a meu Filho nos
faltasse agasalho da parte dos homens, a fim de que as almas cativadas
pelo amor de Jesus se oferecessem a si próprias para o acolherem e o con-
vidassem amorosamente a tomar morada em seus corações.
Ó Maria, minha Mãe, vós podeis tudo com as vossas súplicas; eis ai o que
unicamente vos peço: rogai a Jesus por mim, e obtende-me a graça de
amá-lo com todas as minhas forças, a fim de desagravá-lo assim de tantas
ofensas, que em outro tempo lhe tenho feito. Ó minha Mãe amantíssima,
rogo-vos, exatamente pela vossa maternidade divina, tomai o meu coração
e aconchegai-o ao vosso; aconchegai-o também ao de vosso divino Filho, e
fazei que seja todo consumido nas belas chamas do amor a vós e a Jesus.
“Ela reclinou-o em uma manjedoura; porque não havia lugar para eles na
estalagem” (Lc 2, 7)
Que terão dito os anjos vendo a divina Mãe entrar na gruta de Belém, a fim
de dar à luz o Filho de Deus? Os filhos dos príncipes nascem em quartos
adornados de ouro; e ao Rei do céu prepara-se para nascer uma estrebaria
fria, para cobri-lo uns pobres paninhos, para cama um pouco de palha e
para colocar uma vil manjedoura? Oh, ingratidão dos homens! Oh, confu-
são para nosso orgulho que sempre ambiciona comodidades e honras!
Ah! Que terão dito os anjos vendo a divina Mãe entrar naquela gruta para
dar à luz! Os filhos dos príncipes nascem em quartos adornados de ouro;
preparam-se-lhes berços incrustados com pedras preciosas, e mantilhas
preciosas; e fazem-lhe cortejo os primeiros senhores do reino. E ao Rei do
céu prepara-se uma gruta fria e sem lume para nela nascer, uns pobres
paninhos para cobri-lo, um pouco de palha para leito, e uma vil manjedou-
ra para o colocar? Ubi aula, ubi thronus? Meu Deus, assim pergunta São
Bernardo, onde está a corte, onde está o trono real deste Rei do céu, por-
quanto não vejo senão dois animais para lhe fazerem companhia, e uma
manjedoura de irracionais, na qual deve ser posto?
Ó Gruta ditosa, que tiveste a ventura de ver o Verbo divino nascido dentro
de ti! Ó presépio ditoso, que tiveste a honra de receber em ti o Senhor do
céu! Ó palha ditosa, que serviste de leito àquele cujo trono é sustentado
pelos serafins! Sim, fostes ditosos, ó Gruta, ó presépio, ó palha; mais dito-
sos, porém, são os corações que tenra e fervorosamente amam esse ama-
bilíssimo Senhor, e que abrasados em amor o recebem na santa Comu-
nhão. Oh, com que alegria e satisfação vai Jesus Cristo pousar no coração
que o ama!
II. Um Deus que quer começar a sua infância num estábulo, confunde o
nosso orgulho, e, segundo a reflexão de São Bernardo, já prega com exem-
plo o que mais tarde havia de pregar à viva voz: Aprendei de mim que sou
manso e humilde de coração. Eis porque ao contemplarmos o nascimento
de Jesus Cristo e ao ouvirmos falar em gruta, em manjedoura, em palha,
em leite, em vagidos, estas palavras deveriam ser para nós como que
chamas de amor, e como que setas que nos ferissem os corações e nos
fizessem amantes da santa humildade.
É verdade, ó meu Jesus, Vós, tão desprezado por nosso amor, com o vosso
exemplo fizestes os desprezos excessivamente caros e amáveis aos que
Vos amam. Mas como então é possível que eu, em vez de os abraçar, como
Vós os abraçastes, ao receber algum desprezo da parte dos homens, me
tenha mostrado tão orgulhoso, e tenha ainda chegado a ofender-Vos, ó
Majestade infinita? Pecador e orgulhoso!
“E Vós, ó Pai Eterno, que cada ano nos alegais com a esperança de nossa
Redenção, concedei-me que com confiança possa esperar a vinda do vosso
Filho unigênito como Juiz, a quem agora recebo alegremente como Salva-
dor (1)”. Fazei-o pelo amor do mesmo Jesus Cristo e de Maria Santíssima.