Osteomielite Crônica Com Periostite Proliferativa em Mandíbula: Relato de Caso

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89-92 (Jun - Ago 2018) Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research – BJSCR

OSTEOMIELITE CRÔNICA COM PERIOSTITE


PROLIFERATIVA EM MANDÍBULA: RELATO DE CASO
CHRONIC OSTEOMYELITIS WITH PROLIFERATIVE PERIOSTITIS IN THE MANDIBLE:
CASE REPORT

PEDRO THALLES BERNARDO DE CARVALHO NOGUEIRA1*, JOÃO PEDRO LISBOA DAMASCENO


PEREIRA2, LARISSA RAPOSO RODRIGUES3, VÂNIO SANTOS COSTA4, MARIANA ALENCAR
NEMEZIO5, ANDREIA APARECIDA DA SILVA6
1. Especialista e Mestre em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial pela FOP-UPE, Docente do curso de graduação de Odontologia do Centro
Universitário Ttiradentes; 2. Acadêmico do curso de graduação do curso de Odontologia do Centro Universitário Ttiradentes; 3. Acadêmica do curso
de graduação do curso de Odontologia do Centro Universitário Ttiradentes; 4. Mestre em Radiologia e Imaginologia Odontologica, docente do curso
de Odontologia do Centro Universitário Ttiradentes; 5. Doutora em odontopediatria pela Faculdade de Odontologia de Ribeirao Preto(FORP-USP),
Docente do curso de graduação de Odontologia do Centro Universitário Ttiradentes; 6. Mestre e Doutora em Estomatopatologia pela Universidade de
Campinas(UNICAMP), Docente no programa de doutorado em Biologia Oral da Universidade do Sagrado Coração(USC).

* Avenida Professor Sandoval Arroxelas, Edifício Oruam, 790, apartamento 202, Ponta Verde, Maceió, Alagoas, Brasil. CEP: 57036-420.
dr.pedrobmf@gmail.com

carious lesions in the first lower right molar, with satisfactory


RESUMO result according to the recommended treatment in the
literature.
A Osteomielite Crônica com Periostite Proliferativa
(OCPP) é uma doença caracterizada pela reação KEYWORDS: Osteomyelitis, dental caries, mandible.
periosteal exacerbada resultante de um estímulo
infeccioso de baixa intensidade, frequentemente causado
por lesão cariosa associada á patologia periapical.
Acomete principalmente crianças e jovens até vinte e 1. INTRODUÇÃO
cinco anos e tem incidência maior na região de molares
inferiores. O diagnóstico é essencialmente clínico e A Osteomielite Crônica com Periostite Proliferativa
radiográfico, clinicamente observa-se aumento de volume (OCPP) é uma doença de caráter crônico e
cortical intra e extra-oral, de consistência sólida. O exame inflamatório, na qual observa-se reação do periósteo
de imagem exibe várias camadas paralelas de exacerbada, o que acaba induzindo neoformação óssea
neoformação óssea dando o aspecto típico da lesão de
resultante de uma inflamação ou infecção leve.
“casca de cebola”. O tratamento concentra-se na remoção
do fator etiológico, antibioticoterapia e em alguns casos Acomete com maior frequência a tíbia, fêmur e ossos
remodelamento ósseo cirúrgico para restabelecimento da maxilares, o sítio com maior incidência na mandíbula é
assimetria facial. Este trabalho apresenta um caso de a região de molares e pré-molares. A doença não tem
OCPP em um paciente do sexo masculino, de 10 anos de predominância caracterizada por sexo e afeta,
idade, causada por lesão cariosa no primeiro molar geralmente, pessoas com até duas décadas de vida. No
inferior direito, com resultado satisfatório de acordo com final dessa faixa etária, a ocorrência é justificada pela
o tratamento recomendado na literatura. capacidade proliferativa de osteoblastos e também pela
PALAVRAS-CHAVE: Osteomielite, cárie dentária, alta taxa de cárie nesses indivíduos1.
mandíbula. Os padrões de Osteomielite foram citados pela
primeira vez por Carl Garré (1893), na tíbia;
posteriormente, foi descrita na literatura odontológica
ABSTRACT por Berger (1948), como ossificaçao Perimandibular;
pouco tempo depois PELL (1955) documentou um caso
Chronic Osteomyelitis with Proliferative Periostitis (COPP) na mandíbula. Alguns nomes foram utilizados no
is a disease characterized by the exacerbated periosteal
decorrer dos anos, tais como Ostemielite de Garré,
reaction resulting from a low-intensity infectious stimulus,
often caused by a carious lesion associated with the periapical Periostite Ossificante Não Supurativa e Osteomielite
pathology. It mainly affects children and young people up to Esclerosante de Garré. No entanto, atualmente, sabe-se
twenty-five years and has a higher incidence in the lower que o termo correto a ser utilizado para a lesão é
molars region. The diagnosis is essentially clinical and Osteomielite Crônica com Periostite Proliferativa²,³.
radiographic. Clinically, there is an increase in intra and Em sua etiologia, atinge com mais frequência o
extraoral cortical volume, with a solid consistency. The primeiro molar inferior com infecção periapical. Tal
imaging examination displays several parallel layers of bone fonte de infecção, provavelmente, estaria relacionada
neoformation giving the typical aspect of the lesion of "onion com o desenvolvimento de um germe dentário inferior,
peel". The treatment focuses on removing the etiological
com o alargamento do espaço folicular. Apesar de o
factor, antibiotic and in some cases surgical bone remodeling
to restore facial asymmetry. This paper presents a case of foco infeccioso ser o principal fator etiológico, a
COPP in a male patient, who is 10 years old, caused by literatura cita também a periodontite macia, cistos

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odontogênicos, fraturas e infecções não odontogênicas computadorizada de feixe cônico (CTFC) que
como causas da doença4. evidenciou em corte coronal (Figura 2) e axial (figura
Clinicamente, pode-se observar o aumento 3) aumento de volume ósseo para vestibular com várias
volumétrico regional, com consistência óssea, camadas, caracterizando aspecto típico de “casca de
assimetria facial e ausência de movimento. Há cebola”, além de rarefação óssea periapical do
possibilidade de o paciente desenvolver trismo e elemento dental.
linfonodos infartados. Seu diagnóstico é baseado,
primordialmente, em achados clínicos e radiográficos,
sendo imprescindível a análise radiográfica para
determinar o diagnóstico da patologia. Será observada
a presença de lesão radiolúcida difusa periapical
associada a um dente cariado com envolvimento
pulpar. Pode-se observar, também, a presença de
crescimento ósseo periostial em camadas na superfície
externa da cortical, possuindo semelhança a camadas
de “casca de cebola”5.
A fisiopatologia da OCPP envolve a disseminação
da infecção até ocorrer perfuração da cortical óssea,
que estimula a formação de tecido ósseo por parte do
perióste. Há períodos alternados de exacerbação e
remissão da infecção, causando danos repetitivos no
novo tecido gerado, o que resulta em várias camadas de Figura 1. Aspecto inicial com aumento de volume em região de
estrutura óssea. Histologicamente, apresenta fileiras corpo mandibular direito.
paralelas de osso trabécular reacional e altamente
celular com discreto infiltrado linfocitário, o sequestro
ósseo apresenta características típicas de necrose6,7.
O tratamento dessa doença baseia-se na remoção da
fonte de infeção ou fator etiológico, por meio de
exodontia ou tratamento endodôntico e
antibioticoterapia, o resultado, geralmente, é
satisfatório. Uma vez que a causa é removida o tecido
ósseo sofre remodelação gradual, restaurando a
simetria óssea. Entretanto, se a lesão for extensa, a
remodelação cirúrgica é indicada apresentando a
vantagem de entregar uma amostra para análise
Figura 2. CTFC corte coronal no pré-operatório.
histopatológica. Se uma reação periosteal semelhante
aparecer na ausência de uma fonte de inflamação
evidente, ou houver dúvida sobre o diagnóstico, a
biopsia é recomendada, pois diversas condições
neoplásicas podem resultar em um padrão semelhante,
tais como: Displasia Fibrosa, Sarcoma Osteogênico,
Sarcoma de Ewing, Exostose, Osteoma8,9.

2. CASO CLÍNICO
Paciente do sexo masculino, 10 anos de idade,
procurou a clínica odontológica do Centro
Universitário Tiradentes (UNIT) com sintomatologia
dolorosa no elemento 46, apresentou edema extra-oral
e relatou, também, episódios de febre. No exame extra-
oral, observou-se assimetria facial devido ao aumento
de volume na região de corpo de mandíbula no lado
direito, de consistência endurecida e limites bem
definidos, sem linfoadenopatia (Figura 1).
No exame intra-oral, apresentou restauração
insatisfatória com infiltração no elemento 46, mucosa
sem alterações de volume e cor. Foi realizada Figura 3. CTFC corte axial no pré-operatório.
radiografia periapical e notou-se lesão radiolúcida
apical sem delimitações. Para melhor avaliação da Com base nos achados clínicos e radiográficos, o
lesão e sua extensão foi realizada tomografia diagnóstico foi OCPP. O tratamento realizado foi a
exodontia do elemento 46 e antibióticoterapia com

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amoxicilina 250mg/5ml, 5ml de 8 em 8 horas, por um rarefação óssea e remodelação óssea local. Não
período de sete dias. apresentando mais aspecto de ‘’casca de cebola’’.
É possível observar, também, melhora no quadro de
assimetria facial, sanando a queixa de estética do
paciente.

3. DISCUSSÃO
A Osteomielite Crônica com Periostite Proliferativa
(OCPP) é uma resposta do periósteo causada por uma
inflamação ou infecção de baixa virulência. Afeta,
geralmente, pessoas de até vinte e cinco anos de idade,
com maior predileção na mandíbula, sendo o primeiro
molar inferior infectado por cárie o dente associado a
Figura 4. (a) - Aspecto alveolar imediato pós-exodontia; (b)- casos de OCPP. A maxila é um sítio raro de
Elemento 46 removido. acometimento, sendo descrito apenas um caso em
maxila adulta6,10. O caso clínico relatado ocorreu em
paciente pediátrico, em concordância com a literatura
consultada. A alta atividade periostial mais exacerbada
em crianças, perante uma infecção de baixa
intensidade, justifica o aparecimento da lesão em
indivíduos jovens11. Quanto à localização, a alta
incidência no primeiro molar inferior é explicada por
ser um dos primeiros dentes a irromper na cavidade
oral e ficaria mais tempo exposto à atividade
cariogênica6,12.
Geralmente a análise clínica aliada a exames
complementares é suficiente para o diagnóstico da
lesão, sem necessidade de análise histopatológica. As
Figura 5. TCFC corte coronal no pós-operatório. radiografias oclusais e panorâmicas são descritas na
literatura como exames complementares mais
utilizados para o diagnóstico, no entanto, a tomografia
computadorizada de feixe cônico (TCFC) supera em
qualidade as radiografias bidimensionais5,7. No caso
descrito foi utilizada a TCFC, uma vez que ela
apresenta maior qualidade de imagem em três
dimensões. Utilizada em conjunto com o exame
clínico, ela supriu as necessidades do diagnóstico. Se
uma reação periosteal for identificada sem uma fonte
de inflamação evidente, a biópsia é recomendada para
diagnóstico diferencial1,5,6. A presença do primeiro
molar inferior cariado e com comprometimento pulpar
Figura 6. (a) . TCFC no pré-operatorio; (b) TCFC pós-operatório.
permitiu descartar a análise histopatológica.
Clinicamente, o diagnóstico de OCPP caracteriza-se
pela presença de dor, desconforto, edema de
consistência endurecida, linfoadenopatia regional,
assimetria facial, mucosa e pele de coloração normal,
associado à lesão inflamatória periapical, geralmente
oriunda de um dente desvitalizado6,11. Pode-se
observar, no caso apresentado, a doença em sua forma
mais comum, com todos esses sinais e sintomas
presentes.
O tratamento é direcionado à remoção da fonte de
infecção, podendo ser realizada através de exodontia ou
tratamento endodôntico, seguido de antibioticoterapia
Figura 7. Aspecto final do paciente, 150 dias após o tratamento. e, em alguns casos, remodelação óssea cirúrgica,
Após o tratamento, houve regressão da lesão, o quando necessário. Existe, também, a opção de terapia
paciente não relatou sintomas e foi possível observar, com oxigênio hiperbárico, utilizado em algumas
em novos exames de imagem (tomografia osteomielites dos maxilares, pois melhora a resposta
computadorizada de feixe cônico), a regressão da imunológica do paciente e produz angiogênese

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microvascular por perfusão. Esse tipo de tratamento, no [10] Suma R, Vinay C, Shashikanth MC, Subba RVV.
entanto, tem um alto custo e há poucos aparelhos no Garre's sclerosing osteomyelitis. J Indian Soc Pedod
mercado para realizá-lo, fatores que tornam o Prev Dent. 2007; 25(5):30-33.
procedimento pouco viável7,9,11. A terapêutica [11] Singh D, Subramaniam P, Bhayya PD. Periostitis
ossificans (Garrè's osteomyelitis): An unusual case. J
empregada nesse caso foi a recomendada pela literatura Indian Soc Pedod Prev Dent. 2015; 33(4):344-6
com a exodontia do elemento dental cariado e
antibióticoterapia. O paciente não relatou mais [12] Tong ACK, Irene OL, Yeung KM. Osteomyelitis with
sintomas nem sinais de recidiva da lesão após o proliferative periostitis: an unusual case. 2006;
102(5):14–19.
tratamento, também não houve queixa em relação à
estética.

4. CONCLUSÃO
O diagnóstico da OCPP é primordialmente clínico e
radiográfico. A confirmação histológica será necessária
apenas em casos duvidosos em que não haja associação
de lesão periapical com necrose pulpar e o exame
radiográfico não indique de forma clara a expansão
cortical em camadas. Essa lesão está bem
fundamentada na literatura, geralmente os casos
correspondentes a ela são de fácil resolução e
apresentam bom prognóstico quando removida a causa,
seja por exodontia ou tratamento endodôntico em
conjunto da terapia antibiótica auxiliar, como
discorrido no caso clínico.

REFERÊNCIAS
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Osteomielite de Garré. Atualização do tema e relato de
dois novos casos clínicos. Rev. bras. odontol. 2009;
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Oral Maxillofac Surg. 2016; 42:215-220.

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