Acordao-2010 1021688
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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
JBMT
Nº 70025157975
2008/CRIME
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda
Câmara Criminal - Regime de Exceção do Tribunal de Justiça do Estado, à
unanimidade, em rejeitar as preliminares contrarrecursais e conhecer
parcialmente do recurso do Ministério Público, negando provimento à
inconformidade e alterando o fundamento da absolvição para o artigo 386,
inciso VII, do Código de Processo Penal.
Custas na forma da lei.
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RELATÓRIO
DES. JOÃO BATISTA MARQUES TOVO (RELATOR)
Adoto o relatório da sentença, transcrevendo-o:
(...)
O órgão do Ministério Público provocou este Estado-Juiz através de uma
ação penal movida contra HERMES MOREIRA MELO, dando-o como incurso
nas sanções dos arts. 147 do Código Penal, e 14 da Lei nº 10.826/03, c/c art.
61, inciso I do Código Penal, e na forma do art. 69 do CP, pela prática dos
seguintes fatos: “Fato I: no dia 03 de agosto de 2006, por volta das 13
horas, na Superquadra 03, Quadra 10, casa 21, Santa Marta, nesta cidade,
o denunciado ameaçou a vítima Ilíbio da Rocha Pereira, por palavras e
gestos, de causar-lhe mal injusto e grava, afirmando que irá matá-la. Na
ocasião, o denunciado foi até a residência da vítima, pedindo que Sandra
Maria Horbach, companheira da vítima, retornasse a trabalhar com ele.
Diante de sua negativa, ameaçou a vítima de morte, caso ela aparecesse
em sua lancheria, mostrando-lhe uma espingarda, calibre 20, marca
Bereta, nº 10245 (apreendida – auto de apreensão da fl. 10/IP). O
denunciado é reincidente, conforme certidão de fls. Fato II: nas mesmas
circunstâncias de tempo e local acima descritas, o denunciado portava
arma de fogo, qual seja, uma espingarda, calibre 20, marca Bereta, nº
10245, e cinco cartuchos calibre 20, de uso permitido, sem autorização e
em desacordo com determinação legal ou regular. Na ocasião, o
denunciado portava, em via pública, a referida arma de fogo em sua
cintura. A arma foi apreendida em poder do denunciado (auto de
apreensão da fl. 10/IP), sendo submetida à perícia, constatando-se sua
potencialidade lesiva (auto de constatação de eficácia em arma de fogo
da fl. 20/IP)”.
É o que narra a denúncia, recebida em 10 de outubro de 2006 (fl. 02), na
qual foi arrolada apenas uma testemunha.
Citado (fl. 38v), o acusado foi interrogado (fls. 40/42) e, acompanhado
por Defensor Técnico, este apresentou defesa preliminar (fls. 48/49).
Durante a instrução criminal foi ouvida a vítima e uma testemunha (fl.
77/80).
Os antecedentes judiciais do acusado foram certificados às fls. 32/35.
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VOTOS
DES. JOÃO BATISTA MARQUES TOVO (RELATOR)
A decisão hostilizada1 está assim fundamentada:
(...)
Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público, baseada em
Inquérito Policial, imputando ao acusado a prática dos delitos de porte ilegal de
arma de fogo de uso permitido e ameaça, neste caso, a vítima representada
pelo órgão do MP, conforme condição de procedimento.
Como a prova se identifica, passo a analisar simultaneamente os delitos.
Com referência à análise da materialidade delitiva, quanto ao delito de
porte a arma de fogo, esta encontra respaldo nos autos através das
ocorrências policiais das fls. 08 e 14, pelo auto de apreensão (fl. 16), e pelo
auto de constatação de eficácia de arma de fogo (fl. 25).
Quanto ao delito de ameaça, entretanto, não há que se falar em
materialidade, visto não haver testemunhas do referido ilícito, aliado ao fato de
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(f. 98)
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que a mesma sequer teria sido realizada diretamente contra a vítima – o que,
desde já, determina a absolvição do acusado por tal crime.
O acusado, ao ser interrogado, afirma: “eu tenho uma arma há mais de
20 anos mais ou menos, ganhei de herança essa arma e essa arma estava
guardada no guarda-roupas, sempre tive comigo essa arma, a polícia foi fazer
busca de um revólver, perguntou o meu nome, ele disse que era da polícia e
disse que eu tinha ameaçado uma pessoa e disse que se eu tivesse revólver
era pra eu entregar porque se eu não entregasse eles iam fazer busca na
minha casa e levar o meu revólver se achassem, eu disse 'eu não tenho
revólver, eu tenho uma espingarda muito antiga que eu ganhei de herança', eu
peguei no armário e entreguei para a polícia, mas nunca ameacei (...)”.
A testemunha, durante o interrogatório, afirma não ter visto arma alguma
com o acusado, o que vem ao encontro do depoimento do próprio acusado, o
qual alega não estar armado em momento algum.
A autoria, da mesma forma, encontra amparo probatório nos autos, já
que o acusado, ao ser interrogado, confessou possuir uma antiga espingarda,
herdada de seu pai, em casa, sendo que a mesma não possui o devido
registro.
Entretanto, deve-se salientar que o crime de porte ilegal de arma de fogo
de uso permitido, de acordo com a doutrina, bem como a construção
jurisprudencial, necessita haja real ofensividade ao bem jurídico penalmente
tutelado pela norma penal, vale dizer, a segurança pública.
Ocorre que o réu possuía no interior de sua residência arma de fogo, a
qual fora ganha de herança, o que não demonstra intenção de possuir arma
para causar dano a outrem. Deste modo, o perigo, meramente abstrato gerado
por este fato, não demonstra potencial para gerar dano a alguém, o que,
mesmo incidindo no tipo penal do art. 14 da Lei 10.826/03 não é
suficientemente ofensivo a ponto de ferir o bem jurídico penalmente tutelado.
Destarte, deve-se afastar a alegação, pois a conduta deve ser analisada
sob o prisma da ofensividade, e esta deve ser entendida como a efetiva lesão
ao bem jurídico tutelado, assim como alude o doutrinador Luis Flávio Gomes,
na obra “O Princípio da Ofensividade no Direito Penal”, visto que há a
exigência, em todos os crimes, do resultado, e este sempre será expresso pelo
resultado jurídico do delito.
Relativo a todas estas circunstâncias, já decidiu o TJRS:
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É o que decido.
EX POSITIS, julgo IMPROCEDENTE a denúncia, para o fim de
ABSOLVER o acusado HERMES MOREIRA MELO, já qualificado nos autos,
fulcro no art. 386, I e III do Diploma Processual Penal.2
(...)
2
Sentença extraída do site TJ/RS.
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(f. 104)
4
(f. 02)
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(f. 114)
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A portaria de nomeação de peritos de f. 24 refere que os cidadãos NILTON CESAR
FRANCO SIQUEIRA e ELISABETH TEREZINHA BINOTTO, efetivamente são policiais civis.
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(f. 40)
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(f. 77)
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(f. 78)
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proclama com base no que não está (nos autos) ou sem considerar o que
está nos autos é infundada, arbitrária e injusta, tanto quanto a dúvida
infundada – ou seja, aquela que contraria a evidência dos autos.