Leitura E Produção de Texto

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LEITURA E PRODUÇÃO DE TEXTO

SUMÁRIO

1. Apresentação 3
2. Objetivos da unidade 3
3. Coesão textual 4
3.1 Coesão Referencial 5
3.2 Coesão Sequencial 8
4. Coerência textual 13
5. Encerrando a discussão 16
Referências 16
Indicação de vídeo: 17
Leitura recomendada: 17
Podcast: 17

Fatores de textualidade: coesão e coerência


1. Apresentação

Para iniciarmos a discussão desta unidade, vamos voltar à definição de


texto. Como vimos, o texto consiste em qualquer passagem que forme um
todo significativo independente de sua extensão. Dessa forma, segundo
Fávero (2009, p. 7), trata-se “de um contínuo comunicativo contextual
caracterizado pelos fatores de textualidade: contextualização, coesão,
coerência, intencionalidade, informatividade, aceitabilidade,
situacionalidade, e intertextualidade.”
Nesta unidade, iremos nos debruçar sobre dois fatores de textualidade
mencionados por Fávero (2009), são eles: coesão e coerência. Veremos que
para que o texto alcance o sentido que tanto falamos nesta disciplina, é
primordial que ele seja coeso e coerente. Dessa forma, iremos discutir acerca
das questões básicas que envolvem esses fatores de textualidade, mostrando
como eles atuam na formação do sentido do texto materializado nos gêneros
textuais de nosso cotidiano.
No final desta apostila, você encontrará indicações de textos e vídeos
sobre o assunto. Não deixe de conferir.

Boa leitura!
Déreck F. Pereira

2. Objetivos da unidade

● Discutir sobre a coesão textual;


● Refletir sobre a importância de um texto coeso;
● Apresentar elementos coesivos e seus respectivos efeitos de sentido
dentro do texto;
● Discutir sobre a importância da coerência textual.
3. Coesão textual

A palavra “texto”, do latim textum, origina-se do verbo “tecer”. Assim, o


texto é, metaforicamente, um tecido de palavras, de frases, imagens, gestos
etc, e o gênero textual seria a peça formada por esse tecido linguístico. Nesse
sentido, como já mencionamos em unidade anterior, o autor de um texto
trabalha como uma rendeira que produz uma peça de vestuário. Para que
essa peça seja feita, é preciso que a rendeira faça uma perfeita união entre
os fios da lã que é usada, para que, no fim, ela tenha uma peça pronta para
ser utilizada. Com o texto, o escritor realiza o mesmo trabalho. Ele precisa
conectar todas as partes que compõem a sua obra, para que, no final, ele
tenha um texto pronto para ser utilizado. Vejamos o fragmento a seguir:

Quadro 1: Fragmento do texto Os urubus e sabiás, de Rúbens Alves (1984)

Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam...


Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes para o
canto, decidiram que, mesmo contra a natureza, eles haveriam de se tornar
grandes cantores. E para isto fundaram escolas e importaram professores,
gargarejaram dó-ré-mi-fá, mandaram imprimir diplomas, e fizeram
competições entre si, para ver quais deles seriam os mais importantes e
teriam a permissão para mandar nos outros. (...)

Fonte: KOCH (2012, p. 14)

O fragmento textual exposto acima, como todo bom texto, apresenta


uma perfeita ligação entre suas partes. Essas conexões são feitas por meio de
mecanismos linguísticos utilizados para construir o sentido entre as partes do
texto. No fragmento, esses elementos são os que estão em destaque (negrito
e itálico). É por intermédio de mecanismos como esses que o autor vai
tecendo o “tecido” do seu texto. A esse mecanismo damos o nome de
coesão. Nas palavras de Koch (2009, p. 35), “costuma-se designar por coesão
a forma como os elementos linguísticos presentes na superfície textual se
interligam, interconectam-se, por meio de recursos também linguísticos, de
modo a formar um “tecido” (tessitura)”.
A ligação entre as partes de um texto pode ser feita de diversas formas.
Para nossa discussão, iremos focar nas questões basilares de duas dessas
formas, a saber: a (coesão) referencial e (coesão) sequencial.

3.1 Coesão Referencial

A coesão referencial, como o próprio nome já sugere, é vista como o


mecanismo linguístico que permite ao produtor do texto remeter, por meio de
uma elemento linguístico a outros elementos textuais, anteriores (anáfora) ou
posteriores (catáfora). Dessa forma, ela é dividida em duas: anáfora e
catáfora.
Entre os recursos que podem criar coesão referencial estão: pronomes
pessoais (retos e oblíquos), os demais pronomes (demonstrativos, possessivos,
indefinidos), advérbios de lugar (lá, ali, aqui), sinônimos, hiperônimos.

Figura 1: A presença coesão referencial anafórica na tirinha

Fonte: Levados da Breca (2018)

Na tirinha acima, encontramos o diálogo entre duas personagens: uma


secretária e a filha de seu patrão. Na segunda parte da tirinha, temos a
seguinte passagem: “ele me pediu para comprar seu presente de aniversário
(...)”. Lendo essa passagem, algumas perguntas surgem: ele? De quem a
secretária está falando? Após a leitura da tirinha, o leitor conseguirá
responder facilmente a pergunta feita: “o pai”. Segundo Koch (2012), se essas
perguntas podem ser facilmente respondidas pelos eventuais leitores, é
porque o termo em questão (o pronome pessoal “ele”) é um elemento da
língua que tem por função estabelecer relações textuais, ou seja, é um
recurso de coesão textual.
Assim, em “ele me pediu para comprar seu presente de aniversário
(...)”, o pronome pessoal ele remete a um elemento já mencionado na
primeira parte da tirinha, estabelecendo uma relação entre as partes do
texto. Na terceira parte da tira, temos: “Ah! A mesma coisa que eu pedi no
natal e no dia das crianças”. Que coisa é essa? A resposta para essa
indagação é: “o presente”, mencionado da segunda parte da tira. Perceba
como as partes do texto estão conectadas. Essa ligação mostra que a tirinha
está formando um todo de sentido, logo um texto, pois não existe nesse
gênero textual nenhum elemento solto, sem um motivo para estar ali.
Nesses casos, tanto o pronome pessoal ele, quanto o substantivo coisa
possuem a função de retomar algo que já conhecemos no texto, ou seja, algo
que já foi dito, a saber: o pai e o presente, respectivamente. Note que eles
fazem uma ação de retomada. Quando isso acontece, dizemos que estamos
diante de um elemento coesivo referencial anafórico. No primeiro caso, o
esse elemento é o pronome ele, no segundo, o nome coisa.
Vejamos outro exemplo em que temos a presença de um elemento
coesivo trabalhando na referência a determinados elementos linguísticos do
texto, na tentativa de construir sentido.

Quadro 2: observando alguns elementos coesivos referenciais no fragmento do texto


Os urubus e sabiás, de Rúbens Alves (1984)

Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam...


Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes para o
canto, decidiram que, mesmo contra a natureza, eles haveriam de se tornar
grandes cantores. E para isto fundaram escolas e importaram professores
(...)

Fonte: KOCH (2012, p. 14)

Quando lemos o trecho acima, encontramos novamente o pronome


eles atuando como elemento anafórico. De quem o texto está falando
quando o narrador diz que “eles haveriam de se tornar grandes cantores”? A
resposta é: “os urubus”, presente no início do período. Além desse pronome
pessoal, existe outro elemento trabalhando na coesão do texto, a saber: o
pronome demonstrativo isto. Mas, a qual elemento presente no texto, o
demonstrativo mencionado está se referindo? A resposta é: a todo o
enunciado que o antecede. Dessa forma, tanto eles, quanto isto são
elementos coesivos referenciais anafóricos.
No quadro 2, ainda conseguimos encontrar um terceiro elemento
coesivo referencial. Quando o narrador inicia o seu relato com “Tudo
aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam…”. O
pronome indefinido tudo também está fazendo referência a alguma parte do
texto, nesse caso a toda a sequência do texto, isto é, a todos os fatos que o
narrador contar após a introdução desse pronome indefinido. Nesse caso,
esse elemento não está retomando algo já conhecido, ou seja, mencionado
em um momento anterior; pelo contrário, ele está introduzindo uma
informação nova. Assim, o pronome indefinido tudo, nesse caso, é um
elemento coesivo referencial catafórico. Vejamos outro exemplo.

Figura 2: A presença coesão referencial catafórica

Fonte: entrepalavras.ufc.br

Na figura acima, temos o que seria uma conversa entre duas


personagens, a saber: Magali e Mônica. Nessa conversa, Mônica diz: “Aquele
não é o mesmo neném que chegou”. Quando a personagem fala “aquele”,
de quem ela está falando? Um leitor atento consegue responder a tal
questionamento sem nenhuma dificuldade, dizendo que Mônica está se
referindo ao neném. Perceba, então, que o elemento aquele está
introduzindo uma informação ainda desconhecida (que não havia sido
mencionada na fala anterior). Nesse caso, o movimento não é de retomada
(como acontece com os elementos anafóricos), mas sim de apresentação,
caracterizando esse elemento como catafórico.
Vale mencionarmos que, como falamos no início desta discussão,
existem várias formas de fazer referência (anafórica e catafórica) no texto. A
língua portuguesa dispõe de diversos elementos coesivos referenciais que vão
muito além dos que foram apresentados acima. Mas isso não é razão para se
preocupar. Todo falante da língua portuguesa é capaz, em maior ou menor
grau, de refletir sobre sua língua. Dessa forma, esse indivíduo, no momento do
contato com o texto, não encontrará muitas dificuldades para localizar os
elementos coesivos referenciais presentes no texto e, consequentemente, os
elementos aos quais eles se referem. Basta ter atenção.
A coesão referencial, no entanto, não é a única forma de auxiliar o
leitor na construção do sentido do texto. Como falamos no início deste
material, a coesão textual se divide em duas: a referencial, que conhecemos
nesta seção, e a sequencial, que iremos conhecer na seção seguinte.

3.2 Coesão Sequencial

A coesão sequencial, como o próprio nome já indica, está relacionada


com a sequência que irá construir a lógica presente no texto, com a ligação
entre as frases que constituem essa unidade de sentido. Trata-se, pois, de um
mecanismo textual que acontece por meio de conectivos os quais indicam a
progressão ao longo do texto. Dessa maneira, esse tipo de coesão colabora
com a tessitura textual, haja vista que auxilia no processo de articulação das
palavras e frases dentro de um gênero.
Para entendermos melhor esse processo, vejamos mais um fragmento
da fábula escrita por Rúbens Alves, utilizado por Koch (2012) e exposto no
início deste material.
Quadro 3: Fragmento do texto Os urubus e sabiás

A floresta foi invadida por bandos de pintassilgos tagarelas, que brincavam


com os canários e faziam serenatas para os sabiás... Os velhos urubus
entortaram o bico, o rancor encrespou a testa, e eles convocaram
pintassilgos, sabiás e canários para um inquérito. “- onde estão os
documentos dos seus concursos?” E as pobres aves se olharam perplexas,
porque nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem.

Fonte: KOCH (2012, p. 15)

Nesse segundo fragmento do texto de Rubens Alves, podemos


encontrar elementos coesivos referenciais, como os que estão destacados
em itálico, atuando na construção do sentido do texto. Todavia, eles não são
os únicos elementos coesivos presentes no trecho exposto acima. Em “e as
pobres aves se olharam perplexas, porque nunca haviam imaginado que tais
coisas houvessem.”, temos duas partes, a saber: “e as pobres aves se olharam
perplexas” e “nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem", sendo
ligadas não por um elemento referencial, mas por um elemento coesivo
sequencial que auxilia na progressão do texto: a conjunção porque.
Como podemos perceber, a conjunção em destaque não tem o
objetivo de retomar ou apresentar algum elemento no texto, como é o caso
de “as pobres aves” que retoma “pintassilgos, sabiás e canários”. A
conjunção porque está desempenhando a função de conectar, ligar as duas
partes do texto e, consequentemente, de auxiliar na construção do sentido
empregado ali, atuando como conectivo. Perceba que a oração “porque
nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem”, está explicando o
motivo pelo qual “as pobres aves se olharam perplexas”. Esse sentido
explicativo é, então, introduzido pela conjunção/conectivo que liga essas
duas partes, a saber: porque. Perceba que, geralmente, quando queremos
explicar alguma coisa, utilizamos o porque, antes do motivo (ex.: tirei nota 10,
porque estudei bastante).
A conjunção porque presente no fragmento acima é só um dentre uma
gama de conectivos existentes na língua portuguesa (além das conjunções,
as preposições, assim como advérbios e outros também atuam como
conectivos). Vamos ver outro exemplo.

Figura 3: Exemplo de conjunção condicional


Fonte: http://veredasdalingua.blogspot.com/2013/01/oracoes-subordinadas-
adverbiais.html

Na tirinha acima, mais especificamente na segunda parte,


encontramos um elemento coesivo sequencial trazendo um efeito de
condição, ou seja, o autor tem o objetivo comunicativo de mostrar que existe
uma condição para que algo aconteça. No trecho: “se você não parar, eu
te dou um pescoção”, a conjunção se estabelece um sentido condicional.
Perceba que a condição para que o personagem do criador dê, como forma
de castigo, um pescoção (um pescoço grande, longo) ao outro personagem
é a de que ele não pare com a sua atitude irritante. Caso semelhante
acontece quando falamos: “Eu irei ao parque amanhã se não estiver
chovendo”. Nesse segundo exemplo, a condição para que o falante vá ao
parque é a de que não esteja chovendo no momento.
A conjunção se, no exemplo acima, poderia ser substituída por outra
conjunção ou locução conjuntiva que trouxesse o mesmo sentido para a
frase, como, por exemplo, caso ou contanto que. Perceba que, mesmo
trocando a conjunção, o sentido é o mesmo: “Caso você não pare, eu te dou
um pescoção”, “Eu irei ao parque amanhã caso não chova”.
Perceba que essa troca só é possível devido ao fato de estarmos
substituindo uma conjunção condicional por outra com o mesmo valor de
sentido. É importante lembrarmos que o sentido de uma frase pode ser
alterado ou, até mesmo, perdido a depender da conjunção que é utilizada
para conectar as partes do texto. Veja o exemplo abaixo em (1) e (2):

(1) Os atletas não compareceram ao jogo. Portanto, foram


desclassificados.
(2) Os atletas não compareceram ao jogo, uma vez que foram
desclassificados.

Os exemplos apresentados acima são perfeitos no português. Mas


perceba que o sentido construído em (1) é diferente daquele construído em
(2). Enquanto que no exemplo em (1), temos um sentido conclusivo, na
segunda, o sentido é causativo ou explicativo (alguns autores não realizam
distinção entre os dois sentidos, uma vez que ao explicar algo, o indivíduo
estar, de certa forma, indicando a causa do ocorrido). Esses sentido, como já
falamos, são introduzidos pelas conjunções que ligam as partes do texto. A
conjunção portanto, em (1), possui um valor conclusivo, logo traz a ideia de
conclusão para o texto (conclui-se que os atletas foram desclassificados,
devido ao não comparecimento). Já a conjunção uma vez que, em (2), é
causativa, ou seja, traz a ideia de causa/explicação (o não comparecimento
ao jogo foi a causa pela qual os atletas foram desclassificados). Nesse caso,
a mudança da conjunção acabou por modificar o sentido do texto. Mas
existem casos em que o uso da conjunção inadequada compromete o
entendimento do texto, tornando-o sem sentido. Vejamos:

(3) Os atletas não compareceram ao jogo. Segundo foram


desclassificados.

Diferentemente das frases em (1) e (2), a frase em (3) não é considerada


boa no português. Isso porque o conectivo utilizado, ou seja, a conjunção
segundo não apresenta um valor de sentido adequado para a estrutura
linguística exposta no exemplo. Essa conjunção é conformativa, ou seja,
expressa uma conformidade entre as ideias expostas no texto, como em
“Segundo a OMS, o uso de máscara é algo primordial no combate ao COVID-
19”.
Diante disso, existe uma conjunção adequada para cada objetivo
sociocomunicativo que será expresso no texto. Se o autor almeja explicar
algo, ele deve unir as partes do seu texto por meio de uma
conjunção/conectivo explicativo. Da mesma forma, se ele objetiva comparar
dois objetos em seu texto, como em “A seleção brasileira de futebol feminino
é tão bom quanto a masculina”, ele deve fazer uso de um conectivo de valor
comparativo etc.
Nesse sentido, é de suma importância que conheçamos as conjunções
que servem de conectivos na língua portuguesa e os efeitos de sentido que
os seus usos trazem para o texto. As tabelas abaixo expõem algumas das
conjunções presentes na língua portuguesa..

Quadro 4: Conjunção

Fonte: https://www.portugues.com.br/gramatica/conjuncoes.html

Quadro 4: Conjunção
Fonte: https://www.portugues.com.br/gramatica/conjuncoes.html

Como falamos, o uso inadequado de uma conjunção inadequada pode


comprometer o entendimento do texto, tornando-o sem sentido, ou seja,
incoerente. Na seção que segue, iremos discutir um pouco sobre a coerência.

4. Coerência textual

A coerência está associada ao efeito de sentido que o texto pode


trazer. Ela não está focada nos elementos estruturais que podem compor o
texto, mas na relação lógica entre as ideias empregadas na produção
textual. “Juntamente com a coesão, apresenta uma relação lógica e sem
contradições que trazem significação ao conjunto de palavras” (SANTOS,
2020, p. 1).
Certamente, em algum momento, já ouvimos alguém, em uma
discussão, falar algo do tipo: “Suas palavras não tem coerência”, “Falta
coerência nas ideias de seu texto”. Quando alguém nos fala isso, esse alguém
está sugerindo que o que falamos ou escrevemos não faz sentido ou que
estamos nos contradizendo.
A coerência textual é formada de acordo com três princípios basilares:

● Princípio da não contradição: o texto deve apresentar ideias lógicas e


interligadas de maneira clara, evitando assim a falta de nexo entre as
informações expostas.
● Princípio da não tautologia: devemos evitar a repetição excessiva da
mesma palavra/termo, pois esse ato acaba prejudicando a progressão
do texto.
● Princípio da relevância: as informações precisam apresentar uma
conexão lógico-semântica em cada um dos parágrafos. Quando um
texto possui ideias fragmentadas, sem ordenamento e relação entre si,
torna-se incoerente, mesmo que os trechos tragam algum tipo de
significado isolado.

Vejamos a passagem a seguir, extraída de Koch (2013, p. 9):

(4) Maria tinha lavado a roupa quando chegamos, mas ainda estava
lavando a roupa.

Segundo a autora, a passagem em (4) é incoerente. A incoerência


presente advém do fato de “o produtor da sequência apresentar o mesmo
processo verbal em duas fases distintas de sua realização: como acabado e
não acabado ao mesmo tempo, o que não é aceitável” (KOCH, 2013, p. 9).
Se Maria tinha lavado a roupa, ou seja, concluído essa ação, como ela ainda
estava lavando a roupa quando alguém chegou? Afinal, Maria terminou ou
não terminou de lavar a roupa. Perceba que o princípio da não contradição
está sendo violado nessa passagem, causando a falta de coerência, de
lógica textual. Note que é, até mesmo, impossível interpretar a informação
dada em (4), ou seja, não conseguimos entender o que está exposto.
Vejamos mais um exemplo.

Figura 4: exemplo de texto com falta de lógica

Fonte:https://www.diariodocentrodomundo-foi-dormir-e-quando-cordou-estava-
morto-enquanto-isso-na-camara-de-vereadores-de-caruaru
O título da notícia acima traz a frase de um vereador da cidade
pernambucana de Caruaru, durante uma audiência na câmara dos
vereadores. O vídeo, que poderia ter sido apenas mais um registro do
encontro, tornou-se um verdadeiro viral. O motivo? A frase proferida pelo
vereador caruaruense. Ao falar sobre o falecimento de um cidadão do
município, o político disse: “foi dormir e, quando acordou, estava morto”,
levando todos os presentes ali às gargalhadas. Perceba que não há sentido
no texto oral produzido pelo cidadão. Como alguém que morreu tem a
capacidade de acordar? Não há, nesse caso, ligação lógica entre as ideias
do texto, causando uma incoerência textual.
Incoerência parecida acontece na frase “Um cadáver foi encontrado
morto boiando no canal” (Folha de São Paulo, 1990). Nesse caso, a
redundância (pleonasmo) entre as ideias prejudica a lógica do texto. Se um
cadáver já é algo que não tem vida, ou seja, morto, não há necessidade da
repetição dessa ideia.
Mas nem tudo está perdido. Facilmente podemos recuperar a lógica
dessa frase, veja: “um cadáver foi encontrado boiando no canal”. Perceba
que, agora, quando fazemos a leitura do texto, não encontramos nenhum
elemento que possa causar estranheza, trazendo um sentido lógico para o
texto.
A tirinha de Charles Schulz, publicada pelo Jornal da Tarde, em 2002,
apresenta uma situação em que podemos encontrar incoerência textual,
Vejamos:

Figura 4: Observando a coerência textual na tirinha

Fonte: Jornal da Tarde (2002).

Na tirinha, o personagem de Charlie Brown conta para seu amigo, Linus,


algo bem específico. Quando estamos conversando com alguém,
esperamos que exista um diálogo em que ambas as partes troquem
informações pertinentes ao tema, ou seja, que não fujam do assunto. Isso, no
entanto, não foi o que aconteceu na situação exposta na tirinha, causando
um problema de comunicação entre os envolvidos. O problema é: a
incoerência na resposta dada por Linus. Não existe uma relação lógica entre
o que estava sendo dito por Charlie Brown e o comentário do seu amigo.
Nesse caso, a fala de Linus não tem relevância para a comunicação
estabelecida ali.
Um texto coerente, então, é aquele em que as partes que o compõem
estão relacionadas, auxiliando na construção de um sentido lógico. A
coerência textual é, segundo Koch e Travaglia (2013, p. 23), “um princípio de
interpretabilidade, ligada à inteligibilidade do texto numa situação de
comunicação e à capacidade que o receptor tem para calcular o sentido
deste texto”. Assim, para que um texto seja coerente, é preciso que ele faça
sentido.

5. Encerrando a discussão

Como vimos, a coesão e a coerência são fatores de textualidades que


auxiliam na construção do sentido do texto. No entanto, apesar de terem o
mesmo objetivo, esses fatores não trabalham da mesma forma. Enquanto a
coesão está ligada às questões estruturais do texto, a coerência está
relacionada à relação lógica entre as ideias empregadas. Assim, um texto
bem construído é uma unidade coesa e coerente.

Referências

FÁVERO, Leonor Lopes. Coesão e coerência textuais. 11.ed. São Paulo: Ática,
2009.
KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Princípios de construção textual do sentido.
In: KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça (org.). Introdução à linguística textual:
trajetória e grandes temas. 2ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009.
KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. A coesão textual. São Paulo: Contexto,
2012.
KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça; TRAVAGLIA, Luiz Carlos. A coerência textual.
São Paulo: Contexto, 2013.
SANTOS, Thamires. Coerência textual. Educa+ Brasil, 2020. Disponível em:
https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/lingua-portuguesa/coerencia-
textual. Acesso em: 16/07/2021.

Indicação de vídeo:

Coesão e coerência textual. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=tar8ZPEgAZM

Leitura recomendada:

MACHADO, Aurea Maria Bezerra; VILAÇA, Márcio Luiz Corrêa. A importância


da coesão e coerência textual em nosso texto. Disponível em:
http://www.filologia.org.br/xvi_cnlf/tomo_1/006.pdf

Podcast:

Coesão e coerência textual. Disponível em:


https://open.spotify.com/episode/1zt8sJZgWS1secwiGlsZCC

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