Notas de Aulas Parte 13 (Mec. Solos I)

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Notas de aulas de Mecânica dos Solos I (parte 13)

Helio Marcos Fernandes Viana

Tema:

Permeabilidade dos solos e fluxo unidimensional


(2.o Parte)

Conteúdo da parte 13
1 Classificação do solo de acordo com seu coeficiente de permeabilidade

2 Fatores que interferem na permeabilidade dos solos

3 Força de percolação

4 Areia movediça

5 Filtros de proteção
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1 Classificação do solo de acordo com seu coeficiente de permeabilidade

Segundo Terzaghi e Peck (1967), o solo pode ser classificado de acordo


com o coeficiente de permeabilidade em 5 (cinco) tipos de solos.

A Tabela 1.1 ilustra a classificação do solo de acordo com o coeficiente de


permeabilidade (K), a qual foi apresentada por Terzaghi e Peck (1967).

Tabela 1.1 - Classificação do solo de acordo com o coeficiente de


permeabilidade (K) (Fonte: Modificada de Terzaghi e Peck,
1967)

Grau de
Tipo de solo Valor de K (cm/s)
permeabilidade
Solo de permeabilidade alta Alta Acima de 10-1
Solo de permeabilidade média Média 10-1 a 10-3
Solo permeabilidade baixa Baixa 10-3 a 10-5
Solo de permeabilidade muito baixa Muito baixa 10-5 a 10-7
Praticamente
Solo praticamente impermeável
impermeável Menor que 10-7

2 Fatores que interferem na permeabilidade dos solos

Os fatores (ou variáveis) que influenciam na permeabilidade do solo têm


duas origens distintas; Assim sendo, os fatores (ou variáveis) que influenciam na
permeabilidade do solo tem as seguintes origens:

a) Tem origem nas características do fluido, que está percolando (ou movimentando)
através do solo; e
b) Tem origem no tipo de solo.

2.1 As propriedades do fluido e o coeficiente de permeabilidade

i) Propriedades do fluido que influenciam no coeficiente de permeabilidade do


solo (K)

As propriedades de um fluido que influenciam no coeficiente de


permeabilidade de forma significativa são:

a) O peso específico do fluido; e


b) A viscosidade do fluido.
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OBS. Viscosidade é o atrito interno do fluido, o qual pode ser compreendido como
RESISTÊNCIA, que o fluido oferece ao movimento.

ii) Coeficiente de permeabilidade padrão ou na temperatura padrão

Quando se determina o coeficiente de permeabilidade do solo, costuma-se


apresentá-lo na temperatura padrão de 20o C.

Para se obter o coeficiente de permeabilidade do solo na temperatura


padrão de 20º C (K20), utiliza-se a seguinte equação:

µT
K 20 = .K T (2.1)
µ 20
em que:
K20 = coeficiente de permeabilidade do solo padrão, ou na temperatura padrão;
KT = coeficiente de permeabilidade do solo na temperatura To C, em que é realizado
o ensaio;
µT = viscosidade da água na temperatura To C; e
µ20 = viscosidade da água na temperatura de 20o C.

OBS. O símbolo µ é a letra grega “mi”

2.2 As características do solo e o coeficiente de permeabilidade do solo

As principais características (ou variáveis) do solo que influenciam na


permeabilidade do solo são:

a) O tamanho das partículas do solo;


b) O índice de vazios do solo (e);
c) O grau de saturação do solo (Sr); e
d) A estrutura do solo.

As características (ou variáveis) do solo que influenciam na permeabilidade


são descritas como se segue:

a) Influência do tamanho das partículas na permeabilidade dos solos

De acordo com a lei de Poiseuille, a permeabilidade do solo varia


grosseiramente com o quadrado do diâmetro das partículas de solo. Ou seja, o
coeficiente de permeabilidade do solo (K) é função do quadrado do diâmetro do solo;
Assim sendo, pela lei de Poiseuille, tem-se a seguinte relação:

K = f (D2 ) (2.2)

em que:
K = coeficiente de permeabilidade do solo; e
D = diâmetro do solo.
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OBS. De acordo com a lei de Poiseuille, eq.(2.2), percebe-se que o solo tem um
diâmetro uniforme ou invariável igual a D, o que raramente ocorre na prática.

A relação existente entre o diâmetro do solo e a permeabilidade do solo,


também é mostrada pela relação de Hazen, que é usada para areias e corresponde
à seguinte equação:

K = 100.De 2 (2.3)

em que:
K = coeficiente de permeabilidade do solo (cm/s); e
De = D10 = diâmetro efetivo do solo = diâmetro tal que 10% do solo, em peso, tem
diâmetros menores que ele.

OBS. A fórmula de Hazen, eq.(2.3), é válida para areias com Cu < 5, onde Cu é o
coeficiente de não uniformidade do solo.

b) Influência do índice de vazios (e) do solo na permeabilidade dos solos (K)

Constatações experimentais parecem mostrar que o coeficiente de


permeabilidade do solo (K) pode ser colocado em função do índice de vazios do solo
(e); Tem-se notado, que para quase todos os tipos de solo, que a relação índice de
vazios (e) e o logaritmo de K (ou log K) se aproxima bastante de uma reta; Onde, K
é o coeficiente de permeabilidade do solo.

A Figura 2.1 mostra para vários tipos de solos, que o coeficiente de


permeabilidade do solo (K) varia linearmente com o índice de vazios do solo (e);
Ainda, a Figura 2.1, também mostra que o coeficiente de permeabilidade do solo
tende a diminuir com a diminuição do índice de vazios.

OBS. e = Volume de vazios do solo (VV) / Volume de sólidos do solo (VS); Se o solo
é compactado o índice de vazios do solo (e) diminui.

c) Influência do grau de saturação (Sr) na permeabilidade dos solos

Quanto maior o grau de saturação do solo, que está sendo ensaiado, maior
será a sua permeabilidade: Pois, a presença de ar nos vazios do solo tende a
impedir a passagem da água.

A Figura 2.2 ilustra a variação do coeficiente de permeabilidade do solo com


o grau de saturação para 2 (dois) solos arenosos. Observe, na Figura 2.2, que
quanto maior o grau de saturação do solo maior é seu coeficiente de
permeabilidade.
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Figura 2.1 - Variação do coeficiente de permeabilidade do solo com o índice de


vazios, para vários tipos de solo (Fonte: Modificada de Lambe e
Whitman, 1979)
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Areia da Union Falls Areia do Fort Peck

0,009

Coeficiente de permeabilidade (cm/s) 0,008

0,007

0,006

0,005

0,004

0,003

0,002

0,001

0
70 75 80 85 90 95 100
Grau de saturação (%)

Figura 2.2 - Variação do coeficiente de permeabilidade do solo com o grau de


saturação para 2 (dois) solos arenosos (Fonte: Modificada de
Wallace, 1948)

d) Influência da estrutura do solo na permeabilidade do solo

Amostras de um mesmo tipo de solo, com o mesmo índice de vazios (e)


tenderão a apresentar permeabilidade diferentes, em função da estrutura dos solos.

OBS. Estrutura dos solos é a forma como estão dispostas as partículas do solo.

Uma amostra de solo com uma estrutura dispersa terá uma permeabilidade
menor que uma amostra de solo com uma estrutura floculada.

A Figura 2.3 ilustra algumas estruturas de solo possíveis de ocorrer em solos


argilosos, onde estão presentes as estruturas dispersa e floculada.

Observe, na Figura 2.3, que a estrutura dispersa e a estrutura floculada


ocorrem em argilas. Além disso, destaca-se que, também é possível de encontrar
partículas de silte em estruturas de solos argilosos, como é o caso da estrutura de
argila natural (Figura 2.3 e).

OBS. Embora, a literatura pesquisada não registre, possivelmente as estruturas de


solo descritas por Craig (2007), somente são observadas por meio de microscópios.
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Figura 2.3 - Estruturas de solo possíveis de ocorrer em solos argilosos (Fonte:


Craig, 2007)

A influência da estrutura do solo na permeabilidade do solo fica evidente em


maciços compactados de barragens de terra; Onde, o arranjo das partículas de solo
na horizontal é diferente do arranjo das partículas de solo na vertical. Assim sendo,
verifica-se que a permeabilidade, nas barragens de terra, é maior na direção
horizontal do que na direção vertical.

OBS. O arranjo das partículas de solo pode ser compreendido como sedo a
estrutura do solo

3 Força de percolação

i) Origem e direção da força de percolação

Havendo movimento de água através de um solo, ocorre uma transferência


de carga (ou energia) da água para as partículas de solo, por causa do atrito entre a
água e as partículas de solo. A energia transferida pelo movimento da água para as
partículas de solo é medida pela perda de carga (ou energia) durante a percolação
(movimentação) da água pelo solo. Assim sendo, a força correspondente a perda de
carga (ou de energia) da água durante sua percolação (ou movimentação) pelo solo
é chamada FORÇA DE PERCOLAÇÃO.

A FORÇA DE PERCOLAÇÃO tem o mesmo sentido do fluxo de água, e


transfere-se de grão a grão de solo.
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ii) Importância do conhecimento da força de percolação da água

A determinação da força de percolação da água é de fundamental


importância para a Engenharia Civil, pelos seguintes motivos:

a) A força de percolação é responsável pela instabilidade de cortes;


b) A força de percolação é responsável pela instabilidade de aterros de barragens;
c) A força de percolação é responsável pelo fenômeno areia movediça;
d) A força de percolação é responsável pela instabilidade do fundo das escavações
em areia; e
e) Etc.

iii) Dedução da fórmula da força de percolação que atua no solo

Considerando-se o esquema, de um sistema em um equilíbrio


hidrodinâmico, que é apresentado na Figura 3.1, onde um corpo-de-prova de solo é
submetido a uma força de percolação. Então, é possível calcular a força de
percolação da água que atua no solo, e na direção do escoamento da água.

Figura 3.1 - Esquema de um sistema em equilíbrio hidrodinâmico, que é


utilizado para dedução da força de percolação, que atua na
direção do fluxo de água
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Bem, com base na Figura 3.1, tem-se que a força de percolação (Fp), que é
resultante da percolação (ou movimentação) da água no solo do corpo-de-prova,
corresponde à seguinte equação:

Fp = P1 − P2 (3.1)

em que:
Fp = força de percolação da água atuante no solo do corpo-de-prova;
P1 = força hidrostática atuante no corpo-de-prova devido à carga de água h1; e
P2 = força hidrostática atuante no corpo-de-prova devido à carga de água h2.

sendo:
P1 = γ W .h1.A (3.2)

e
P2 = γ W .h2 .A (3.3)

em que:
P1 = força hidrostática atuante no corpo-de-prova devido à carga de água h1; e
P2 = força hidrostática atuante no corpo-de-prova devido à carga de água h2;
h1 = carga de água do reservatório da esquerda;
h2 = carga de água do reservatório da direita;
γW = peso específico da água; e
A = seção transversal do corpo-de-prova.

OBS. O símbolo γ é a letra grega “gama”.

Substituindo-se as eq.(3.2) e eq.(3.3) na eq.(3.1), tem-se que:

Fp = P1 − P2 = ( γ W .h1.A ) − ( γ W .h2 .A ) = γ W .A.(h1 − h2 ) = γ W .A.∆h


(3.4)

em que:
Fp = força de percolação da água atuante no solo do corpo-de-prova na direção do
escoamento;
P1 = força hidrostática atuante no corpo-de-prova devido à carga de água h1;
P2 = força hidrostática atuante no corpo-de-prova devido à carga de água h2;
h1 = carga de água do reservatório da esquerda;
h2 = carga de água do reservatório da direita;
γW = peso específico da água
A = seção transversal do corpo-de-prova; e
∆h = perda de carga devido à percolação da água pelo corpo-de-prova.
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Sabe-se que o gradiente hidráulico atuante no solo é definido pela seguinte


equação:

∆h
i= (3.5)
L
em que:
i = gradiente hidráulico atuante no solo do corpo-de-prova;
∆h = perda de carga devido à percolação da água pelo corpo-de-prova; e
L = comprimento do corpo-de-prova.

Bem, da eq.(3.5) e da eq.(3.4), mostradas anteriormente, pode-se obter a


seguinte equação para o cálculo da força de percolação da água atuante no solo do
corpo-de-prova.

Fp = γ W .A.L.i (3.6)

em que:
Fp = força de percolação atuante no solo do corpo-de-prova na direção do
escoamento;
γW = peso específico da água;
A = seção transversal do corpo-de-prova;
i = gradiente hidráulico atuante no solo do corpo-de-prova; e
L = comprimento do corpo-de-prova.

Por definição, sabe-se que o volume do corpo-de-prova corresponde à


seguinte equação:

V = A.L (3.7)

em que:
V = volume do corpo-de-prova;
A = área da seção transversal do corpo-de-prova; e
L = comprimento do corpo-de-prova.

Diante do exposto, substituindo-se a eq.(3.7) na eq.(3.6), tem-se que a força


de percolação da água atuante no corpo-de-prova será:

Fp = γ W .i.V (3.8)

em que:
Fp = força de percolação atuante no solo do corpo-de-prova na direção do
escoamento;
γW = peso específico da água;
i = gradiente hidráulico atuante no solo do corpo-de-prova; e
V = volume do corpo-de-prova de solo; ou volume de solo submetido à força de
percolação Fp.
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Finalmente, como a força Fp é aplicada uniformemente em um volume de


solo V; Então, a força de percolação Fp aplicada por unidade de volume de solo
será:
Fp γ W .i.V
Fpu = = = i.γ W (3.9)
V V
em que:
Fpu = força de percolação atuante por unidade de volume de solo;
Fp = força de percolação atuante no solo do corpo-de-prova na direção do
escoamento;
i = gradiente hidráulico atuante no solo;
γW = peso específico da água; e
V = volume do corpo-de-prova.

iv) Formas de se combater a força de percolação

Há, pelo menos, 2 (duas) formas de se combater (ou diminuir) a força de


percolação da água atuante no solo, as quais são:

a) Diminuir a carga de água (∆h) atuante sobre o solo; e


b) Adição de mais camadas de solo, de modo que aumente o comprimento L do solo
do local onde a água percola; Contudo, permitindo o escoamento da água
percolada.

OBS. No caso do corpo-de-prova da Figura 3.1, uma forma de diminuir ou combater


a força de percolação da água é aumentar o comprimento L do corpo-de-prova.

4 Areia movediça

4.1 Conceitos iniciais para explicação do fenômeno de areia movediça

4.1.1 Conceito de tensão efetiva

A tensão efetiva é a tensão que realmente controla todas as características


de deformação e resistência do solo. Assim sendo, a tensão efetiva atuante em um
ponto a qualquer, no interior de um solo, corresponde à seguinte equação:

σ'a = σa − ua (4.1)
em que:
σ’a = tensão efetiva atuante em um ponto a qualquer do solo;
σa = tensão total atuante em um ponto a qualquer do solo; e
ua = pressão neutra ou poropressão no ponto a qualquer do solo.

OBS(s).
a) Pressão neutra é a pressão que atua na água intersticial do solo, geralmente a
pressão neutra é igual à pressão piezométrica no ponto;
b) Interstícios são os pequenos vazios existentes entre os grãos dos solos;
c) Piezômetro é um instrumento utilizado para medir a pressão atuante em um fluido;
d) Quando a pressão neutra (u) é zero, caso comum em areias não saturadas,
tensão efetiva atuante no solo (σ’) é igual à tensão total (σ) atuante no solo;
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e) O solo está saturado quando seu grau de saturação (Sr) é igual 100%, ou seja,
quando todos os vazios do solo estão preenchidos com água; e
f) O tema tensões atuantes no solo será abordado com profundidade na disciplina
Mecânica dos Solos II.

4.1.2 Resistência ao cisalhamento das areias

A resistência ao cisalhamento das areias (s) é igual ao produto do


coeficiente de atrito da areia (tg φ’) pela tensão normal efetiva atuante no plano de
ruptura do solo (ou corpo-de-prova). A resistência ao cisalhamento das areias é
representada pela seguinte equação:

s = σ'.tg(φ' ) = (σ − u).tg(φ' ) (4.2)


em que:
s = resistência ao cisalhamento da areia;
σ’ = tensão normal efetiva atuante no plano de ruptura do solo;
φ’ = ângulo de atrito do solo arenoso, em termos de tensões efetivas;
σ = tensão normal total atuante no plano de ruptura do solo; e
u = pressão neutra ou poropressão atuante no solo, ou no corpo-de-prova durante o
ensaio de compressão triaxial.

OBS(s).
a) Compreende-se como tensão normal total atuante no plano de ruptura do solo (σ),
a tensão total que atua a 90º no plano de ruptura do corpo-de-prova no ensaio de
compressão triaxial; e
b) O ângulo de atrito efetivo da areia (φ’) pode ser determinado por meio do ensaio
de compressão triaxial, o qual será visto em Mecânica dos Solos II.

4.2 Descrição do fenômeno de areia movediça

O fenômeno areia movediça ocorre quando há existência dos seguintes


acontecimentos simultâneos:

a) A areia (solo) está submetida a um fluxo ascendente de água; e


b) A força de percolação gerada pelo fluxo ascendente de água iguala ou supera a
força efetiva vertical do solo (areia).

No fenômeno areia movediça a areia perde a sua resistência ao


cisalhamento, ou seja, o solo (areia) passa a apresentar propriedades de um fluído.
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4.3 Apresentação da formulação envolvida no fenômeno areia movediça

i) Considere o esquema experimental de laboratório apresentado na Figura 4.1,


o qual é útil para explicar o fenômeno de areia movediça

Na Figura 4.1, observe que o corpo-de-prova de areia está submetido a um


fluxo ascendente de água.

Figura 4.1 - Esquema experimental de laboratório, o qual é útil para explicar o


fenômeno de areia movediça

A partir da Figura 4.1, pode-se concluir que:

a) A areia do corpo-de-prova está submetida a um fluxo ascendente de água; Ou


seja, a água percola do ramo da esquerda para a direita, em virtude da altura de
carga h, a qual é dissipada pelo atrito com a areia;
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b) A definição da tensão normal total no ponto A da Figura 4.1

A tensão normal total atuante no ponto A, é considerada atuante no plano de


ruptura da areia, e corresponde à seguinte equação:

σ A = γ W .h1 + γ SAT .L (4.3)


em que:
σA = tensão normal total atuante no plano de ruptura da areia, ou no ponto A;
h1 = altura do nível de água sobre a areia saturada;
L = comprimento do corpo-de-prova;
γW = peso específico da água; e
γSAT = peso específico saturado do solo (ou da areia do corpo-de-prova).

c) A definição da pressão neutra no ponto A da Figura 4.1

A pressão neutra atuante no ponto A corresponde à seguinte equação:

u A = γ W .hP = γ W .(h + h1 + L ) (4.4)


em que:
uA = pressão neutra atuante no ponto A;
γW = peso específico da água;
hP = altura piezométrica no ponto A;
h = altura de carga ou energia, que promove a percolação da água pelo corpo-de-
prova;
h1 = altura do nível de água sobre a areia saturada do corpo-de-prova; e
L = comprimento do corpo-de-prova.

OBS(s).
a) Pressão neutra é a pressão que atua na água intersticial do solo, geralmente a
pressão neutra é igual a pressão piezométrica no ponto; e
b) Interstícios são os pequenos vazios existentes entre os grãos dos solos.

ii) Condição para que ocorra o fenômeno de areia movediça

Para que ocorra o fenômeno de areia movediça é necessário que a pressão


neutra no ponto A (uA) se iguale à tensão normal total atuante no plano de ruptura da
areia, ou no ponto A (σA). Pois assim, a resistência ao cisalhamento do solo (areia)
seria igual a 0 (zero), e a areia teria características de um fluido.

Matematicamente falando, tem-se que a resistência ao cisalhamento da


areia no ponto A (ou ponto do corpo-de-prova mais pesado), da Figura 4.1, é dada
pela seguinte equação:
s A = σ' A .tg(φ' ) = (σ A − u A ).tg(φ' )
(4.5)
em que:
sA = resistência ao cisalhamento do solo (ou areia) no ponto A;
σ’A = tensão normal efetiva atuante no plano de ruptura da areia, ou no ponto A;
σA = tensão normal total no plano de ruptura da areia, ou no ponto A;
uA = pressão neutra no ponto A; e
φ’ = ângulo de atrito do solo arenoso, em termos de tensões efetivas.
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Bem, para ocorrer o fenômeno de areia movediça na areia do corpo-de-


prova, da Figura 4.1, é necessário que:

σ A = uA (4.6)

em que:
σA = tensão normal total atuante no plano de ruptura da areia, ou no ponto A; e
uA = pressão neutra no ponto A.

Pois, assim sendo, a resistência ao cisalhamento da areia do corpo-de-


prova, da Figura 4.1, seria igual a 0 (zero), como mostra a eq.(4.7).

s A = σ' A .tg(φ' ) = (σ A − u A ).tg(φ' ) = (u A − u A ).tg(φ' ) = 0 (4.7)

em que:
sA = resistência ao cisalhamento do solo (areia) no ponto A;
σ’A = tensão normal efetiva atuante no plano de ruptura da areia, ou no ponto A;
σA = tensão normal total no plano de ruptura da areia, ou no ponto A;
uA = pressão neutra no ponto A; e
φ’ = ângulo de atrito do solo arenoso, em termos de tensões efetivas.

iii) Determinação da altura de carga crítica (hC), a partir da qual ocorre o


fenômeno de areia movediça

Para obter a altura de carga crítica (hC), a partir da qual ocorre o fenômeno
de areia movediça; Basta igualar a tensão normal total atuante no plano de ruptura
da areia, ou no ponto A (σA) à pressão neutra no ponto A (uA), e fazer h (altura de
carga) = hC (altura de carga crítica); Assim sendo, tem-se que:

σ A = uA (4.8)

Como: σ A = γ W .h1 + γ SAT .L; e u A = γ W .(h + h1 + L )

em que:
σA = tensão normal total atuante no plano de ruptura da areia, ou no ponto A;
uA = pressão neutra atuante no ponto A;
h1 = altura do nível de água sobre a areia saturada, ou sobre o corpo-de-prova;
L = comprimento do corpo-de-prova;
γW = peso específico da água;
γSAT = peso específico saturado do solo (ou da areia do corpo-de-prova); e
h = altura de carga ou energia, que promove a percolação da água pelo corpo-de-
prova.
16

Com base na Figura 4.1, fazendo h (altura de carga) = hC (altura de carga


crítica), e desenvolvendo a eq.(4.8), tem-se que:

σ A = uA
γ W .h1 + γ SAT .L = γ W .(hC + h1 + L )
γ W .h1 + γ SAT .L − γ W .h1 − γ W .L = γ W .hC
L.γ SAT − L.γ W = γ W .hC
L.( γ SAT − γ W ) = γ W .hC
L.( γ SAT − γ W )
hC =
γW (4.9)

em que:
hC = altura de carga crítica, a partir da qual ocorre o fenômeno de areia movediça;
L = comprimento do corpo-de-prova;
γSAT = peso específico saturado do solo (ou da areia do corpo-de-prova); e
γW = peso específico da água.

Finalmente, se atuar na areia uma altura de carga de água igual ou superior


a altura de carga crítica (hC), então ocorrerá o fenômeno de areia movediça.

iv) Determinação do gradiente hidráulico crítico, a partir do qual ocorre o


fenômeno de areia movediça

Por definição o gradiente hidráulico atuante no solo corresponde à seguinte


equação:

h
i=
L (4.10)

em que:
i = gradiente hidráulico atuante no solo;
h = perda de carga que ocorre devido à percolação da água pelo solo; e
L = comprimento de solo, através do qual percola a água.

Para se obter o gradiente hidráulico crítico (iC), a partir do qual ocorre o


fenômeno de areia movediça; Basta igualar a altura de perada de carga, que ocorre
devido à percolação da água (h), à altura de carga crítica (hC); Assim sendo, a partir
da eq.(4.9) e eq.(4.10), tem-se que:

L.( γ SAT − γ W )
h γW (γ − γW )
iC = C = = SAT (4.11)
L L γW
em que:
iC = gradiente hidráulico crítico atuante no solo;
hC = altura de carga crítica, a partir da qual ocorre o fenômeno de areia movediça;
L = comprimento do corpo-de-prova;
γSAT = peso específico saturado do solo (ou da areia do corpo-de-prova); e
γW = peso específico da água.
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Finalmente, se atuar na areia um gradiente hidráulico igual ou superior ao


gradiente hidráulico crítico (iC), então ocorrerá o fenômeno de areia movediça.

v) Força de percolação crítica

A força de percolação crítica (FpC) corresponde à força de percolação, a


partir da qual ocorre o fenômeno de areia movediça.

Por definição, a força de percolação atuante no solo na direção do fluxo de


água corresponde a seguinte equação:

Fp = γ W .i.V (4.12)

em que:
Fp = força de percolação atuante no solo do corpo-de-prova na direção do
escoamento;
γW = peso específico da água;
i = gradiente hidráulico atuante no solo do corpo-de-prova; e
V = volume do corpo-de-prova de solo; ou volume de solo submetido à força de
percolação Fp.

Substituindo-se na eq.(4.12), da força de percolação, o gradiente hidráulico


(i) pelo gradiente hidráulico crítico (iC); Então, obtém-se a força de percolação crítica
que corresponde à seguinte equação:

FpC = γ W .iC .V (4.13)

em que:
FpC = força de percolação crítica, a partir da qual ocorre o fenômeno de areia
movediça;
γW = peso específico da água;
iC = gradiente hidráulico crítico atuante no solo do corpo-de-prova; e
V = volume do corpo-de-prova de areia; ou volume de solo submetido à força de
percolação crítica FpC.

Finalmente, se atuar na areia uma força de percolação igual ou superior à


força de percolação crítica (FpC), então ocorrerá o fenômeno de areia movediça.

OBS(s).
a) O fenômeno de areia movediça não ocorre em argilas e em outros solos coesivos,
pois estes solos apresentam a coesão (c) na sua equação de resistência ao
cisalhamento; Por exemplo: para um solo argiloso, a resistência ao cisalhamento do
solo é dada pela seguinte equação:

s = c + (σ − u).tg(φ' ) (4.14)

em que:
s = resistência ao cisalhamento do solo argiloso;
c = coesão do solo argiloso;
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σ = tensão normal total atuante no plano de ruptura do corpo-de-prova em ensaio de


compressão triaxial;
u = pressão neutra atuante no corpo-de-prova; e
φ’ = ângulo de atrito do solo, em termos de tensões efetivas.

b) Nos solos argilosos ou coesivos, se o gradiente hidráulico atuante solo for muito
alto, o que pode ocorrer é o fenômeno de levantamento de fundo da escavação.

vi) Elementos usados para combater o fenômeno da areia movediça

A ocorrência de areia movediça pode ser evitada através da construção dos


filtros, os quais apresentam as seguintes características:

a) Os filtros são camadas de solos granulares (ou grossos) construídas acima da


camada de areia de onde percola a água;
b) Os filtros mantêm as partículas da camada de areia de onde percola a água em
sua posição original, ou seja, não ocorre erosão na camada de areia de onde
percola a água; e
c) Os filtros promovem o aumento da tensão efetiva atuante sobre o solo sem causar
o aumento da pressão neutra, ou seja, os filtros aumentam a tensão normal total
sobre o solo, o que evita o fenômeno da areia movediça.

OBS. O tema filtros será abordado, mais profundamente, no tópico a seguir.

5 Filtros de proteção

5.1 Introdução

Sabe-se que as forças geradas pela percolação (ou movimentação) da água


pelo solo são fontes de sérios problemas para a Engenharia; Portanto, há
necessidade de drenar a água, que percola através do solo, por meio de filtros.

Os filtros são camadas de solo de proteção, que permitem a livre drenagem


da água percolada; Porém, mantendo em suas posições as partículas do solo que
sofre a percolação, o qual deve ser protegido.

5.2 Exemplo de problemas causados pela percolação da água e pela


inexistência de filtros proteção do solo

Como exemplo de problemas causados pela percolação da água e pela


inexistência de filtros de proteção do solo, têm-se:

i) O piping (ou erosão interna) em barragens de terra; e


ii) A areia movediça em cortinas de estacas prancha.
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i) O piping ou erosão progressiva em barragens de terra

O piping (ou entubamento) é um fenômeno de erosão interna, que ocorre em


barragens de terra. O piping é um fenômeno, onde ocorre a concentração do fluxo
de água percolada em um ponto da barragem de terra, e também o aumento
gradiente hidráulico neste mesmo ponto. Como consequência, do aumento do fluxo
de água e do aumento do gradiente hidráulico em um ponto da barragem, ocorre o
surgimento de erosão e de um furo que progride para o interior da barragem.

OBS(s).
a) Erosão é o carreamento (ou transporte) de partículas de solo pela água; e
b) O piping é uma das causas mais frequentes de ruptura de barragens.

A Figura 5.1 ilustra uma barragem de terra com um filtro horizontal, cujo
objetivo é proteger a barragem contra o fenômeno de erosão progressiva ou “piping”.

Figura 5.1 - Barragem de terra com um filtro horizontal

OBS. Os temas linhas de fluxo e linhas equipotenciais serão abordados em aulas


futuras, pode-se adiantar que:
a) Linhas de fluxos são linhas (ou curvas) que indicam ou representam a trajetória
das partículas (ou moléculas) da água no maciço de terra;
b) As linhas equipotenciais são linhas (ou curvas) que possuem a mesma carga
hidráulica para cada curva; e
c) As linhas de fluxo e as linhas equipotenciais juntas formam as redes de fluxo de
água, as quais se localizam no interior dos maciços de terra sujeitos à percolação da
água. O tema redes de fluxo será abordado em aula futura.
20

ii) A areia movediça em cortinas de estacas prancha

A areia movediça é um fenômeno causado pelo fluxo ascendente de água,


que faz com que o solo arenoso perca a sua resistência ao cisalhamento, e assim
adquira características de um líquido. Como consequência do fenômeno de areia
movediça pode ocorrer a ruptura de uma cortina de estacas prancha usadas para
contenção de água.

A Figura 5.2 ilustra uma cortina de estacas prancha, onde foi usado um filtro
de proteção, o qual apresenta as seguintes vantagens:

a) O filtro permite a drenagem da água percolada; e


b) O filtro aumenta o peso efetivo do solo combatendo a força de percolação, que
causa o fenômeno de areia movediça e pode causar a ruptura da cortina de estacas
prancha.

Figura 5.2 - Cortina de estacas prancha, onde foi usado um filtro de proteção
21

5.3 Materiais usados nos filtros, e dimensionamento dos filtros

5.3.1 Materiais usados nos filtros

As camadas de um filtro de proteção devem ser construídas com materiais


granulares, que são areia e pedregulho. Os materiais granulares (areia e
pedregulhos) usados na construção de filtros de proteção devem satisfazer as
seguintes condições:

a) Os vazios do material do filtro de proteção devem ser suficientemente pequenos,


de forma que impeça a passagem das partículas do solo a ser protegido; e
b) Os vazios do material do filtro de proteção devem ser suficientemente grandes, de
forma que:

-> Os vazios do filtro proporcione a livre drenagem da água; e


-> Os vazios do filtro impeçam o desenvolvimento de altas forças de percolação, que
causam problemas como: o piping e o fenômeno da areia movediça.

5.3.2 Dimensionamento dos filtros de proteção

Para atender as duas condições anteriores, que um material de filtro de


proteção deve apresentar; Terzaghi estipulou duas condições, que são bastantes
empregadas para a escolha de um material de filtro, as quais são:

a) 1.O (primeira) condição que o material de filtro deve apresentar segundo


Terzaghi:

D15 ( DO FILTRO ) < 5.D85 ( DO SOLO ) (5.1)

em que:
D15 (DO FILTRO) = diâmetro tal que 15% do solo usado para filtro, em peso, têm
diâmetros menores que ele; e
D85 (DO SOLO) = diâmetro tal que 85% do solo que receberá o filtro, em peso, tem
diâmetros menores que ele.

b) 2.O (segunda) condição que o material de filtro deve apresentar segundo


Terzaghi:

D15 ( DO FILTRO ) > 5.D15 ( DO SOLO )


(5.2)

em que:
D15 (DO FILTRO) = diâmetro tal que 15% do solo usado para filtro, em peso, têm
diâmetros menores que ele; e
D15 (DO SOLO) = diâmetro tal que 15% do solo que receberá o filtro, em peso, tem
diâmetros menores que ele.
22

Uma vez definidos os limites para os D15 (DO FILTRO) devem-se desenhar as
curvas granulométricas, que correspondem aos limites material de filtro; Sabendo-se
que o coeficiente de não uniformidade (Cu) do material de filtro é aproximadamente
igual ao Cu do solo a ser protegido. Assim sendo, as curvas granulométricas limites
do material do filtro têm um aspecto similar ao do solo a ser protegido.

OBS. O coeficiente de não uniformidade (Cu) de um solo é definido pela seguinte


equação:

D60
Cu =
D10 (5.3)

em que:
Cu = coeficiente de não uniformidade do solo;
D60 = diâmetro tal que 60% do solo, em peso, têm diâmetros menores que ele; e
D10 = diâmetro tal que 10% do solo, em peso, têm diâmetros menores que ele.

A Figura 5.3 ilustra a faixa de variação granulométrica de um material que


pode ser usado como filtro, a qual foi construída a partir dos dados da curva
granulométrica do solo a ser protegido pelo filtro, cuja curva granulométrica é
mostrada na mesma Figura 5.3. Observe na Figura 5.3 que a parte hanchurada
corresponde à faixa granulométrica dos materiais granulares, que podem ser usados
como filtro para o solo que deve receber o filtro.

Figura 5.3 - Faixa de variação granulométrica de um material que pode ser


usado como filtro
23

OBS(s).
a) Uma vez definido o material a ser usado como filtro, para estabelecer as
dimensões do filtro deve-se atentar para as condições hidráulicas do problema; Por
exemplo: determinar a vazão que escoará pelo filtro; e
b) Um método de se determinar a vazão através dos maciços de terra é o método
das redes de fluxo, que será apresentado em aulas futuras.

5.4 Utilização de mantas sintéticas em filtros ou drenos

Atualmente, tem crescido a utilização de mantas sintéticas como material de


filtros, principalmente em drenos (ou filtros) longitudinais em estradas. A Figura 5.4
ilustra a utilização de um dreno (ou filtro) longitudinal em uma estrada, o qual é
usado para rebaixar o nível de água e evitar que a água penetre no pavimento.

OBS. A água penetrando no pavimento pode diminuir a resistência da base do


pavimento, e facilitar o surgimento de trincas na superfície de rolamento (ou camada
de asfalto).

Pode-se observar, na Figura 5.4, uma seção transversal típica de um dreno


(ou filtro) longitudinal, onde é usada uma manta sintética para filtrar a água e evitar
que partículas de solo fino penetrem no dreno (ou filtro).

Figura 5.4 - Utilização de um dreno (ou filtro) longitudinal em uma estrada


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OBS(s).
a) Sabe-se que a manta sintética, que é usada para filtrar a água nos drenos (ou
filtros) longitudinais de estradas é conhecida como geotêxtil; e
b) Se as partículas de solo fino penetrarem no dreno (ou filtro) podem fazer com que
o dreno (ou filtro) colmate (ou tenha seus vazios preenchidos por solo fino); Assim
sendo, o filtro fica colmatado ou entupido e perde sua função de drenar a água, o
que é prejudicial para o pavimento.

Referências Bibliográficas

BUENO, B. S.; VILAR, O. M. Mecânica dos solos. Apostila 69. Viçosa - MG:
Universidade Federal de Viçosa, 1980. 131p.

CAPUTO, H. P. Mecânica dos solos e suas aplicações (fundamentos). Vol. 1. 6.


ed., Rio de Janeiro - RJ: Livros Técnicos e Científicos Editora S. A., 2007. 234p.
(Bibliografia Principal)

CRAIG, R. F. Mecânica dos solos. 7. ed., Rio de Janeiro - RJ: LTC - Livros
Técnicos e Científicos Editora S. A., 2007. 365p.

FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. Rio de


Janeiro - RJ: Nova Fronteira, 1986. 1838p.

LAMBE, T. W.; WHITMAN, R. V. Soil mechanics, SI version. New York: John Wiley
& Sons, 1979. 553p.

PINTO, C. S. Curso básico de mecânica dos solos. 3. ed., São Paulo - SP: Oficina
de Textos, 2006. 355p.

TERZAGHI, K.; PECK, R. B. Soil mechanics in engineering practice. 2. ed. New


York: Jonh Wiley & Sons, 1967.

WALLACE, M. I. Experimental investigation of the effect of saturation on


permeability of sand. Thesis, Dept. of Civil Engineering, MIT (Massachusetts
Institute Technology), Cambridge. 1948.

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