Maria Alves - Entre o Provisódio e o Incerto
Maria Alves - Entre o Provisódio e o Incerto
Maria Alves - Entre o Provisódio e o Incerto
Entre o provisório e
o incerto: modos de
trabalho em uma agência
de publicidade colaborativa1
1 Uma primeira versão deste artigo foi apresentada versão atualizada do texto apresentado no
41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, revisto e com acréscimos decorrentes da
pesquisa de pós-doutorado.
Introdução
Ao pesquisar os processos de trabalho nas agências de publicidade bra-
sileiras, buscamos acrescentar ao olhar da pesquisadora as inquietações
que acompanharam a profissional durante as décadas de trabalho como
redatora publicitária e diretora de criação. Pela vivência das alterações nos
modos de fazer da área de criação das agências, na qual o ideário da cria-
tividade artística, que acompanha a profissão, tem esvanecido desde o fim
da primeira década do século XXI.
2 Uma agência de modelo tradicional, dedicada prioritariamente à mídia off-line; uma digital,
voltada às mídias digitais e redes e, por fim, uma colaborativa, modelo híbrido de prestação
de serviços, com trabalhos de comunicação publicitária, relações públicas, live marketing e de
tecnologia.
3 Utilizamos o gênero masculino nos descritivos de cargos/pessoas não por um juízo de valor, mas pela
presença maciça (ainda) de homens na criação.
4 Documento com o pedido do trabalho detalhado: informações do cliente, mercado, objetivos e
resultados esperados, entre outros.
Como este texto é um recorte da tese, trazemos parte das discussões teóricas
e análises das agências pesquisadas, na especificidade do modelo colaborativo,
seguidas da descrição de um dos trabalhos realizados e respectivo processo.
Na sequência, elencamos as principais peculiaridades da agência, resultado
das observações e das entrevistas e, inclusive, dois quadros que sintetizam
as características que a constituem e o fluxo de trabalho mais comum e, final-
mente, as considerações em movimento, que sinalizam a imprevisibilidade e
as incertezas de um modelo de negócio em constante transformação.
5 Devido à confidencialidade, não podemos informar nomes, cargos e dados que revelem as agên-
cias e os respectivos profissionais. As pesquisas in loco foram autorizadas pelos presidentes/
sócios, depois de contato pessoal, e todos os entrevistados assinaram o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido, que garante o anonimato e a não citação de qualquer dado. Nessa agência
colaborativa, a pesquisadora ainda assinou um termo de responsabilidade e sigilo, assegurando
o compromisso de envio da tese para leitura do presidente antes da entrega.
6 Um modelo estrutural de trabalho.
Sobre ambos os conceitos, Bastos (2012, p. 60) relembra que medium e media
são “objetos empíricos de uma realidade” tanto no Brasil como na tradição
norte-americana. No entanto, os estudos germânicos consideram a mídia
uma instituição independente, com regras próprias e, portanto, o uso do
termo midiatização se volta para as relações entre as mudanças da mídia
e a comunicação, bem como para as mudanças da cultura e da sociedade
(HASEBRINK; HEPP, 2013). Outro autor que aproxima ambos os conceitos é
Barros (2012), para quem as mediações comunicativas da cultura são vol-
tadas para as interações sociais que ocorrem na mídia; já a midiatização
da cultura se volta para as práticas sociais decorrentes da lógica da mídia.
A agência faz parte de uma holding com uma estrutura organizacional híbrida:
várias empresas que funcionam conjuntamente (ou não) dividem um mesmo
espaço físico com diferentes áreas. São três grandes ambientes contíguos,
cada qual com várias ilhas de trabalho, nem todas ocupadas, devido à redu-
ção de profissionais no momento da pesquisa. Atualmente, o grupo ocupa
outro espaço, com muitos profissionais em sistema home office.
Todos os subsídios, bem como a demanda pela experiência (ou seja, o evento
a ser criado), estavam contidos no briefing: expor o consumidor a novas pos-
sibilidades e oferecer condições para sensibilizá-lo, associando interação
mediada e presencial, ainda que não especificados os meios. O produto tem
um alinhamento internacional, com posicionamento definido, manifesto, e
uma embaixadora para a marca, por isso, não havia a necessidade de criar
um conceito criativo, apenas utilizar o slogan em inglês e materializá-lo em
uma campanha brasileira.
9 Cargo similar a um gerente, abaixo do diretor e, nesse caso, voltado especificamente para a dire-
ção de arte.
10 A valorização da criação também aparece nas demais agências e na pesquisa de pós-doutorado.
11 Depois de elaborar e aprovar a síntese da ideia, o planejador criativo/conceituador passa o tra-
balho de roteirização para os redatores.
A gente não tem área de criação, aqui, né, meu time, teo-
ricamente, seria o grupo de criação, mas é uma área que
Desse modo, ainda que a agência tente escapar dos modelos tradicionais do
negócio publicitário, essa atualidade acomoda outro dispositivo de controle,
vis-à-vis aos sistemas informacionais de trabalho, que possibilita o monito-
ramento dos profissionais, ainda que não haja relatórios de timesheet, como
acontece nos demais modelos.
Considerações em movimento
As agências vivenciam um momento de transição no qual profissionais se
reinventam em busca da atualização de práticas e de novas capacidades,
para dar conta de multicompetências para a manutenção de postos de
trabalho. Não apenas os sujeitos, mas também os sistemas internos e os
softwares são aperfeiçoados constantemente, assim como os modos de gerir
o negócio e de monitorar os pontos de contato com consumidores ubíquos.
crisdays@gmail.com
Referências
AGAMBEN, G. O que é o contemporâneo e outros ensaios. Chapecó: Argos, 2009.
______. Da big idea ao big data: processos criativos das agências de publicidade na era
do pós-tudo. Relatório de pesquisa pós-doutoral. Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo, ECA/USP, 2021.
______. Circuitos versus campos sociais. In: MATTOS, M. et al. (org.). Mediação & midiati-
zação, p. 31-52, 2012. Salvador: EDUFBA, 2012.
COULDRY, N. MEJIAS, U. A. Data Colonialism: Rethinking Big Data’s Relation to the Con-
temporary Subject. In: Television & New Media, v. 20, n. 4, p. 336–349, 2019. Disponível
em: <https://doi.org/10.1177/1527476418796632>. Acesso em: jan. 2023.
HASEBRINK, U.; HEPP, A.; Human interaction and communicative figurations. The trans-
formation of mediatized cultures and societies. Communicative Figurations. Working
Paper, n. 2, 2013. Disponível em: <https://bit.ly/3fSWWqa>. Acesso em: jan. 2023.