Aquisição Da Herança
Aquisição Da Herança
Aquisição Da Herança
2021
I. AQUISIÇÃO DA HERANÇA
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O artigo 33 da LS dispõe que:
Se, por exemplo, a pessoa falece intestada e deixa filhos e cônjuge, não se pense que
estes, logo depois da morte, tornam-se sucessores. Depois da abertura da sucessão,
mesmo depois da vocação sucessória, os sucessíveis chamados não são, só por via do
chamamento, sucessores do falecido.
Daquela disposição legal, retira-se que o sucessível, ainda que seja o detentor dos
bens do falecido, não poderá, legalmente, ser considerado o proprietário ou
possuidor antes da aceitação.
É sabido que a Lei da Família, no seu artigo 124, admite a instituição de herdeiros e
nomeação de legatários feita em convenção antenupcial.
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Tratando-se de um negócio jurídico bilateral, o donatário, sendo qualquer dos
nubentes ou terceiro, ao celebrar ou intervir na convenção antenupcial, manifesta a
sua vontade de aceitar a herança ou o legado. Com a abertura da sucessão, não faria
sentido que se exigisse do donatário um novo acto de aceitação, como se a
disposição fosse unilateral. Porque estamos no domínio patrimonial, de direitos
disponíveis, nada obsta que o donatário renuncie a tais direitos, nos termos gerais do
Direito.
Não se pode dizer, neste caso, que a aceitação é dispensável. O que acontece é que
ela (a aceitação) ocorre no momento da celebração do pacto sucessório que, como é
próprio dos negócios jurídicos bilaterais, integra duas declarações de vontade. A
aceitação fica assim dependente duma condição suspensiva, que é a morte do autor
da sucessão. É neste momento, da morte, que aquisição opera de forma automática,
com a verificação da condição a que a aceitação estava sujeita.
Dispõe o artigo 135 da LS que “A aquisição da herança pelo Estado, como sucessível
legítimo, opera-se de direito, sem necessidade de aceitação, não podendo o Estado repudia-la”.
Como é sabido, o Estado ocupa a última classe dos sucessíveis legítimos. Assim, se o
falecido não dispõe dos seus bens por testamento ou contrato e não existirem
parentes, cônjuge sobrevivo ou companheiro sobrevivo da união de facto, o Estado,
que nunca falta, é chamado. Até podem existir herdeiros legais e voluntários
prioritários, mas todos eles repudiarem a herança, caso em que apenas restará o
Estado.
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do falecido e ficariam prejudicados eventuais credores da herança que, como se sabe,
não são herdeiros do devedor.
O Estado é como que obrigado a assumir a titularidade das relações do falecido, pois
não é legalmente permitido que repudie. Trata-se, portanto, dum ingresso nas
relações do falecido que opera ipso iure, isto é, por força da lei.
Não existindo sucessíveis que prefiram o Estado, sendo tal situação reconhecida
judicialmente, a herança é declarada vaga para o Estado, tal como resulta do artigo
135 da LS. O procedimento visando a declaração da herança vaga para o Estado vem
previsto nos artigos 1132º a 1134º, ambos do Código de Processo Civil. Será,
portanto, por sentença judicial que o Estado será investido na qualidade de herdeiro
do falecido.
Como foi visto acima, a nossa ordem jurídica, consagra, como regra, a aquisição
mediante aceitação.
Se nos atermos apenas ao momento da abertura da sucessão, podemos, tal como foi
referido acima, diferenciar os sistemas de aquisição mediante aceitação, de aquisição
automática e de aquisição investidura.
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III.1. Caracteres da aceitação
b) É individual
Havendo dois ou mais sucessíveis, que sejam instituídos conjuntamente ou não, cada
um deles pode aceitar a parte que lhe cabe, independentemente da posição do outro
ou dos demais (artigo 34 da LS)
Não pode a aceitação ser feita sob condição ou a termo (artigo 37, nº 1, da LS)
d) É indivisível
Sendo o sucessível chamado por testamento e por lei e aceita por um dos títulos,
entende-se que também aceita por outro título (primeira parte do nº 1 do artigo 38 da
LS).
Por exemplo, o autor da sucessão não tem descendentes nem ascendentes sobrevivos
mas deixa dois irmãos (Betinho e Carlos) e faz testamento destinando 40% da
herança a Carlos, se este aceita a sua parte na sucessão legítima, então considera-se
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que também aceita a deixa testamentária. A aceitação abrange todos os títulos do
chamamento.
e) É irrevogável
Nos temos do artigo 44 da LS, a aceitação é irrevogável. Tal significa que uma vez
aceite a herança, dá-se por findo, quanto ao aceitante, o fenómeno sucessório,
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assumindo ele a titularidade das relações do falecido, com efeito a partir da abertura
da sucessão.
f) É anulável
A aceitação é anulável se for obtida por dolo ou coação, mas não com fundamento
em simples erro (erro-vício) – nº 1 do artigo 43 da LS
A anulabilidade pode ser arguida por todos aqueles que tem interesse na
procedência do pedido, que podem ser os próprios herdeiros (incluindo o aceitante)
– nº 2 do artigo 43 da LS
Por força do nº 3 do artigo 43, o prazo para arguir a anulabilidade é de dois anos a
contar da cessação do vício que lhe serve de fundamento.
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da sucessão para o que falece antes de aceitar ou repudiar e deste para os seus
herdeiros).
Por serem dois fenómenos sucessórios, há que aferir se, em relação à cada um deles,
verificam-se os pressupostos da vocação sucessória.
Albatul tem apenas o filho Perdigão e este tem uma filha Gracinda. Albatul falece no
dia 10 de Março de 2021 e dois dias depois falece Perdigão, sem se pronunciar
relativamente à herança a que tinha direito por morte da mãe Albatul. Albatul deixa
5 imóveis avaliados em 90 milhões de meticais e Perdigão era duma vivenda e um
barco de pesca, bens avaliados em 30 milhões de meticais.
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O nº 2 do artigo 41 da LS vem estabelecer que o direito de aceitar ou repudiar só se
transmite de Perdigão para Gracinda, se esta aceitar a herança (o património dos 30
milhões) de Perdigão. Mas Gracinda pode aceitar o património de 30 milhões
(herança do falecido Perdigão) e repudiar o património de 90 milhões a que teria
direito por transmissão do direito de aceitar ou repudiar. Gracinda não pode
repudiar a herança do seu pai Perdigão, mas aceitar apenas a parte dos 90 milhões
que lhe adviriam por transmissão do direito de aceitar ou repudiar.
O artigo 39 da LS, no seu nº 1, prevê que aceitação pode ser expressa ou tácita. Nos
termos do nº 2 do mesmo artigo, a aceitação é havida como expressa quando:
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na eventualidade de repúdio. Mas já quando, sendo vários os que poderiam ter
direito em caso de repúdio, o sucessível chamado renuncia apenas a favor de algum
ou alguns, com exclusão de outros; nesse caso, por força do 2 do artigo 40, considera-
se que o renunciante aceitou e alienou.
Os casos em que a aceitação só pode ser feita em inventário judicial vêm previstos no
nº 1 do artigo 36 da LS (herança deferida a menor, interdito, inabilitado ou pessoa
colectiva).
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estabelece que “Sendo a herança aceita extrajudicialmente, a responsabilidade pelos
encargos também não excede o valor dos bens herdados, mas incumbe, neste caso, ao herdeiro
provar que na herança não existem valores suficientes para o cumprimento dos encargos.”
Apesar daquele princípio, o ónus de provar que o património hereditário pode recair
nos próprios sucessíveis (se a aceitação for extrajudicial) ou nos legatários ou
credores (se a aceitação for mediante inventário judicial).
Diz-se que o sucessível repudia a herança quando declara que não aceita.
Com o repúdio, tudo se passa como se o repudiante não tivesse sido chamado, e são
chamados os sucessíveis subsequentes (directamente ou por direito de
representação) ou opera o direito de acrescer.
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a) Caracteres do repúdio
Tal como sucede com a aceitação, o repúdio é um acto voluntário e livre, puro e
simples (nº 1 do artigo 47 da LS), indivisível, salvo nos casos do artigo 38 da LS (nº 2
do artigo 47 da LS), é anulável por dolo ou coação (artigo 48 da LS) é irrevogável
(artigo 49 LS).
Embora a lei não trate especificamente dum prazo para a caducidade do repúdio,
pelo facto do direito de aceitar caducar passados 10 anos, será este o prazo para a
caducidade do direito de repudiar (como acto juridicamente útil). É que, decorridos
os 10 anos previstos no artigo 42 da LS, o direito de aceitar caduca, assumindo-se,
como consequência, que o sucessível não quer. A ter que repudiar depois daquele
prazo, estaria a praticar um acto inútil, pois a lei já trataria o silêncio dos 10 anos
como repúdio.
b) Formas do repúdio
Vimos que a aceitação pode ser expressa ou tácita, o repúdio é um negócio jurídico
formal, pois, deve constar de documento. Tal documento deverá ser a escritura
pública, se houver bens imóveis que integram a herança (nº 1 do artigo 46 da LS).
Nos demais casos, ou seja, não havendo bens imóveis a integrar a herança, deve ser
feita, pelo menos, por documento particular (nº 2 do artigo 46 da LS).
Na lei anterior, o artigo 2063º do Código Civil de 1966 remetia, quanto à forma do
repúdio, à forma exigida para a alienação da herança. Assim, porque o artigo 2126º
do CC previa a exigência de escritura pública para a alienação da herança ou
quinhão hereditário de que fizessem parte bens cuja alienação devesse ser feita por
esse forma, e documento particular para os demais casos, essas, conforme os casos,
deviam ser as formas do repúdio. Deveria, deste modo, ser feito por escritura
pública o repúdio da herança de que fizessem parte bens imóveis, capital social das
sociedades por quotas, estabelecimentos comerciais etc.
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casos em que da herança fazem parte bens imóveis. Mas não alterou as formas da
alienação da herança, tal como se retira do artigo 111 da LS.
c) Sub-rogação do credores
“1. Os credores do repudiante podem aceitar a herança em nome dele, nos termos do artigo
606º do Código Civil.
3. Pagos os credores do repudiante, o remanescente da herança não aproveita a estes, mas aos
herdeiros imediatos”
O artigo 232 da LS, torna extensivo aos legados, no que for aplicável e com as
necessárias adaptações, o disposto sobre aceitação e repúdio da herança.
Vemos, pois, que a aceitação e repúdio têm os mesmos caracteres, tanto no que
respeita à herança, como no que tange ao legado, designadamente, quanto ao
carácter voluntária e livre, anulabilidade, irrevogabilidade, caducidade e
transmissibilidade.
Tal como sucede na herança, a aceitação do legado é indivisível, mas com algumas
especificidades que importa realçar.
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Na primeira parte do nº 1 do artigo 233 da LS, está prevista a regra da
indivisibilidade. Na segunda parte da mesma disposição abre-se uma excepção, nos
seguintes termos: “mas pode aceitar um legado e repudiar outro, contanto que este último
não seja onerado por encargos impostos pelo testador.”
Do que está previsto na segunda parte do n.º 1 do artigo 233 da LS, retiramos as
seguintes ilações:
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