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Meire Cristina Andrade Cassimiro da Silva

(organizadora)

CANA-DE-AÇÚCAR:
MANEJO, ECOLOGIA E BIOMASSA
Meire Cristina Andrade Cassimiro da Silva

(Organizadora)

CANA-DE-AÇÚCAR:

MANEJO, ECOLOGIA E BIOMASSA

Autores

Alessandro Aparecido Felice


Alex dos Santos
Alex Rodrigo Aguilera
Antonio Bestana Neto
Bruno Novaes Menezes Martins
Carla Gheler-Costa
Carlos Alves de Oliveira
Daniele Scudeletti
Diego Antônio Biondo
Dile Pontarolo Stremel
Elisa Fidêncio de Oliveira
Erilene Romeiro Alves
Fábio Henrique Comin
Gilberto Sabino dos Santos Junior
Ivan Leandro Coletti
Junior Cesar Souza e Silva
Letícia Galhardo Jorge
Luciano Martins Verdade
Luiz Vitor Crepaldi Sanches
Marcio Gonçalves Campos
Meire Cristina Andrade Cassimiro da Silva
Natália Oliveira Totti de Lara
Olívia Gomes Martins
Victor Gonçalves Cremonez
Vinícius Fernandes Canassa

2021
1ª EDIÇÃO – 2021

Todos os direitos reservados

Editor: Ricardo Zanetta Spessotto

Capa: Thiago Rubio


Imagem da capa: Freepik.com.
(essa capa foi desenhada usando recursos do Freepik.com)

C212 Cana-de-açúcar : manejo, ecologia e biomassa /


Organizado por Meire Cristina Andrade
Cassimiro da Silva – Bauru, SP : Spessotto,
2021. E-book.
208 p.
ISBN 978-85-5973-190-3

1.Cana-de-açucar – Irrigação 2. Cultivo do solo


3. Resíduo Solido I. Silva, Meire Cristina Andrade
Cassimiro da (Org.) II. Título

CDD 338.17361

Ficha catalográfica elaborada por Fatima Aparecida Anselmo CRB/8 10250

Livraria e Editora Spessotto

Rua Araújo Leite, 25-72 – Santa Tereza

Bauru/SP

www.livrariaspessotto.com.br
APRESENTAÇÃO

A Universidade, desde os seus primórdios, tem como função, além


do ensino, desenvolver a pesquisa através de seus docentes e discentes,
assim como a extensão acadêmica, oferecendo atendimento e serviços para
a comunidade. Essa tríade e tripé-base das Instituições de Ensino Superior
(IES) é o alicerce da qualidade mister à formação dos alunos de graduação
no Brasil.
A literatura bibliográfica tem, neste contexto, um papel fundamental
na formação dos graduandos e, associada às publicações de artigos,
resumos e resenhas, é a fonte de conhecimento para a consolidação e
atualização dos diversos profissionais de nível superior.
O agronegócio é uma das riquezas brasileiras e deve representar,
segundo os dados do CEPEA (Centro de Estudos Avançados em
Economia Aplicada da Esalq/USP) de 2021, 30% do PIB nacional e 14%
do PIB paulista, sendo que, desde último percentual, 80% é a fatia
representativa da agricultura paulista.
No cenário agrícola brasileiro e, especificamente, no paulista, temos
a produção de cana-de-açúcar como parte da história do desenvolvimento
econômico nacional.
Este e-book é uma conquista das Faculdades Fatec-PR, Galileu e
Gran Tietê e, com certeza, uma obra de referência para especialistas,
docentes, alunos e demais interessados nesta temática. Versando sobre
diversos aspectos da produção de cana-de-açúcar desde o cultivo até a
obtenção de seus produtos, a obra foi desenvolvida de forma
transdisciplinar, cujos autores/colaboradores em sua maioria são docentes
e alunos dos cursos de Engenharia Agronômica de nossas IES.
Através da coordenação dos trabalhos e organização do e-book por
parte da Profa. Dra. Meire Cristina Andrade Cassimiro da Silva e da
participação de doutores, mestres e especialistas em seus capítulos, esta
publicação nasce coroando o esforço, competência e dedicação de todos
os seus colaboradores.
4 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Parabenizo os autores, as faculdades Fatec-PR, Galileu e Gran Tiête


e demais envolvidos neste trabalho e apresento à comunidade o e-book
"Cana-de-açúcar: Manejo, Ecologia e Biomassa", com a certeza do
sucesso desta publicação por sua relevância no cenário do agronegócio
nacional, sua qualidade acadêmica e científica, sua contemporaneidade e
sua contribuição para a formação de alunos, pesquisadores e profissionais
deste importantíssimo setor produtivo e econômico mundial.

Fico honrado e orgulhoso pela gentileza dos autores ao me confiarem


a apresentação desta obra literária.

Prof. Jefferson Capeletti


Vice-diretor geral das Faculdades Galileu e Gran Tietê
SUMÁRIO

01 - CORREÇÃO E ADUBAÇÃO DO SOLO PARA A CULTURA


DA CANA-DE AÇÚCAR ........................................................................7
(Bruno Novaes Menezes Martins e Letícia Galhardo Jorge)

02 - MÉTODOS DE IRRIGAÇÃO/FERTIRRIGAÇÃO NA
CULTURA DA CANA-DE-AÇUCAR .................................................35
(Luiz Vitor Crepaldi Sanches)

03 - RESPOSTAS MORFOANATÔMICAS E FISIOLÓGICAS DA


CANA-DE-AÇÚCAR SOB DIFERENTES CONDIÇÕES HÍDRICAS
..................................................................................................................55
(Natália Oliveira Totti de Lara)

04 - ROTAÇÃO DE CULTURA COM PLANTIO DE SOJA EM


REFORMA DE CANAVIAL ................................................................75
(Antonio Bestana Neto)

05 - GANHOS COM A SISTEMATIZAÇÃO EM ÁREAS DE


PRODUÇÃO DE CANA-DE-AÇUCAR ..............................................91
(Alessandro Aparecido Felice, Ivan Leandro Coletti, Junior Cesar Souza e
Silva, Diego Antônio Biondo, Alex Rodrigo Aguilera. Alex dos Santos e
Marcio Gonçalves Campos)
6 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

06 - FAUNA E CONSERVAÇÃO NA PAISAGEM AGRÍCOLA


PAULISTA ............................................................................................. 99
(Carla Gheler-Costa, Fábio Henrique Comin, Gilberto Sabino dos Santos
Junior e Luciano Martins Verdade)

07 - INSETOS-PRAGA NA CULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR


............................................................................................................... 123
(Vinícius Fernandes Canassa)

08 - MICRORGANISMOS NA CULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR


............................................................................................................... 143
(Daniele Scudeletti, Elisa Fidêncio de Oliveira e Erilene Romeiro Alves)

09 - BIOETANOL A PARTIR DA BIOMASSA DE CANA-DE-


AÇUCAR .............................................................................................. 161
(Carlos Alves de Oliveira, Dile Pontarolo Stremel e Victor Gonçalves
Cremonez)

10 - APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS DA AGROINDÚSTRIA


SUCROALCOOLEIRA EM SISTEMAS DE COMPOSTAGEM . 185
(Olívia Gomes Martins e Meire Cristina Andrade Cassimiro da Silva)
CORREÇÃO E ADUBAÇÃO DO SOLO PARA A
CULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR

Bruno Novaes Menezes Martins1


Letícia Galhardo Jorge2

Para obtenção e manutenção de altas produtividades, um dos fatores


fundamentais é o manejo adequado da adubação. Os métodos de utilização
da adubação orgânica e mineral podem ser aperfeiçoados, com o objetivo
de maximizar o potencial produtivo da cultura. Esta prática se resume em
satisfazer as necessidades nutricionais da planta, em todos os estádios de
desenvolvimento. A recomendação de adubação tem por objetivo elevar
os teores de nutrientes no solo a níveis considerados adequados para cada
cultura.
Segundo Rosseto et al. (2008a), a adubação é um importante fator
para aumentar a produtividade. Além disso, é responsável por entre 17% e
25% de todos os custos do plantio da cana. Para o estudo da adubação, as
exigências nutricionais da cultura e as quantidades de nutrientes removidos
pela planta são considerados de suma importância para se indicar as
quantidades de nutrientes a serem fornecidas (COLETTI et al., 2002).
Vale destacar que, quando o teor foliar está abaixo do nível crítico,
normalmente ocorre uma deficiência nutricional, que poderá ser
manifestada por sintomas visuais. Quando os sintomas aparecem,
comumente a produtividade já foi afetada (LUZ et al., 2017).
De acordo com Vitti et al. (2016), para o dimensionamento da
adubação, é necessário o conhecimento das exigências nutricionais para
determinado nível de produtividade, respondendo as seguintes questões:

1
Engenheiro Agrônomo, Dr, Docente das Faculdades Galileu e Gran Tietê,
brunovaesagrope@gmail.com
2
Bióloga, M. Sc, Doutoranda em Botânica (Fisiologia vegetal) – IBB/ UNESP,
leticia.g.jorge@unesp.br
8 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

1. O que aplicar? (fontes e nutrientes a serem aplicados).


2. Quanto aplicar? (quantidade necessária de acordo com o nível de
produtividade).
3. Quando aplicar? (época de maior exigência da cultura e interação
do nutriente com o solo).
4. Como aplicar? (os nutrientes podem ser aplicados via solo, folha,
tolete ou tratamento fitossanitário).
Além disso, existe o fator de eficiência do fertilizante, definido como
a interação entre o sistema solo-planta-atmosfera e a cultura na qual o
fertilizante foi aplicado. Perdas nessa interação podem ocorrer por erosão
(arraste de nutrientes), lixiviação (percolação de nutrientes no perfil do
solo), fixação (adsorção ou precipitação de ânion e de cátions metálicos)
ou volatilização (perda do nutriente para a atmosfera) (VITTI et al., 2016;
LUZ et al., 2017).
De acordo com Vitti et al. (2016), o manejo e uso de fertilizantes na
cultura da cana tem início com o diagnóstico da fertilidade do solo e as
práticas corretivas (calagem, gessagem e fosfatagem), práticas
conservacionistas (adubação verde e orgânica) e finaliza com a aplicação
do adubo mineral. Vale destacar que as práticas corretivas e
conservacionistas têm o objetivo de aumentar a eficiência do fertilizante
mineral, promovendo maior desenvolvimento radicular, ocasionando
maior absorção de água e de nutrientes.
Práticas corretivas
Calagem
Em sua maioria, os solos brasileiros se apresentam sob condições de
elevados graus de intemperismo e acidez. Segundo Quaggio (2000), cerca
de 70% dos solos são considerados ácidos, causando redução da
produtividade em até 40%.
De acordo com Raij (2017), o solo será tanto mais ácido quanto
menor for a parte da CTC (capacidade de troca de cátions) ocupada por
cátions (Ca, Mg, K e Na). Desta forma, subtende-se que a remoção desses
cátions do ponto de troca catiônica, substituindo-se por Al+3 e H+,
contribuirá para o aumento da acidificação do solo.
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 9

Vários são os fatores que contribuem para a acidificação do solo,


como a pobreza de materiais de origem desprovidos de bases, condições
de intensificação de agentes de intemperismos (pedogênese), água da
chuva (em decorrência de sua reação com o gás carbônico da atmosfera –
dissociação do ácido carbônico), decomposição da matéria orgânica com
liberação de íons de hidrogênio para a solução do solo, remoções de
cátions básicos (Ca, Mg, K e Na) em regiões de altos índices
pluviométricos (lixiviação) e utilização de fertilizantes de caráter ácido
(RAIJ, 2017; KORNDÖRFER et al., 2017).

A disponibilidade de nutrientes para a cultura está relacionada ao pH


do solo. Valores inadequados de pH podem causar desequilíbrios
fisiológicos nas plantas. Um pH abaixo de 5,5 resulta em menor
disponibilidade de N, P, Ca e Mg, além do aumento comum da toxidez de
alumínio (KORNDÖRFER et al., 2017). Esses efeitos tendem a contribuir
na restrição do crescimento radicular, limitando o desenvolvimento das
plantas e resultando em perdas significativas na produção.

Portanto, o pH serve como referência e indicador direto da acidez do


solo, o qual consiste na avaliação da concentração de íons hidrogênio na
solução do solo. Tais problemas de acidez e disponibilidade de nutrientes
podem ser amenizados com a elevação do pH, através da aplicação de
produtos que liberam ânions capazes de neutralizar os prótons (H+) e o íon
alumínio (Al+3), resultando em ganhos de produtividade.

O calcário é o material mais indicado para a realização dessa


atividade, por possuir componentes básicos que geram ânions que são
capazes de promover a neutralização da acidez. A correção ocorre com a
substituição do alumínio e do hidrogênio pelo cálcio e magnésio no ponto
de troca catiônica. Deste modo, além da eliminação da acidez do solo, o
resultado também será o fornecimento de cálcio e magnésio para as
plantas, contribuindo para a promoção da fertilidade do solo. A velocidade
da reação irá depender grandemente do grau de acidez do solo, da
granulometria do corretivo e do grau de interação entre o calcário e o solo
(RAIJ, 2017).
10 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Contribuição do calcário no desenvolvimento da cultura


Após a absorção pelas raízes, o cálcio é levado pelo xilema até a
parte área, através da corrente transpiratória. Desta forma, maiores
quantidades de Ca serão assimiladas por órgãos que apresentam maiores
taxas de transpiração. No caso de folhas novas, que transpiram pouco,
poderá ocorrer uma deficiência do elemento. Diante do exposto, torna-se
necessário prevenir eventual desordem, através do favorecimento de um
maior fluxo de Ca (PRADO, 2008).
O cálcio participa do desenvolvimento e formação do sistema
radicular da cana, estando presente na forma de pectatos de cálcio,
constituindo a lamela média das paredes celulares e incrementando a
resistência mecânica dos tecidos. Na busca do benefício, é necessário que
o Ca ocupe todo o volume de solo, na qual se concentra a maior parte das
raízes (MALAVOLTA, 2006; PRADO, 2008).
Sob deficiência, inicialmente os sintomas ocorrerão em regiões
meristemáticas. Na cultura, é possível identificar que os cartuchos se
tornam necróticos nas pontas e ao longo das margens. Já os colmos se
tornam mais moles e mais finos, principalmente em direção ao ponto de
crescimento, devido à redução do efeito “protetor” do cálcio, que ocorre
em decorrência da sua ação na inibição da atividade das enzimas
lipoxigenase, que atua na degradação das membranas, e poligacturonase,
que é responsável pela degradação da parede celular (PRADO, 2008).
Apesar da importância, os acréscimos na produtividade da cana-de-
açúcar em resposta à calagem nem sempre são comuns, fato que pode ser
explicado pela tolerância à acidez do solo. Contudo, trata-se de uma planta
bastante exigente em Ca e Mg. Normalmente, quando ocorrem respostas à
calagem, elas são, na maioria, correlacionadas a teores inadequados de Ca
e Mg (ORLANDO FILHO et al., 1994; ROSSETO et al., 2004).
Oliveira et al. (2010), ao avaliarem a extração e exportação de
nutrientes por variedades de cana-de-açúcar cultivadas sob irrigação plena,
constataram que a quantidade média de Ca extraída pela cana (226 kg ha-
1
de Ca) foi superior à do nitrogênio (179 kg ha-1 de N).
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 11

Já o magnésio participa da molécula de clorofila. Cerca de 20% do


Mg total foliar se encontra nos cloroplastos. Desta forma, sob deficiência,
ocorrerá diminuição da síntese de clorofila e, consequentemente, redução
da taxa de fotossíntese. Vale destacar também que o elemento é
responsável pela ativação de diversas enzimas ligadas ao metabolismo
energético.
Da mesma forma que o Ca, o Mg também é movido pela transpiração
da planta. Entretanto, o magnésio apresenta mobilidade no floema,
facilitando a redistribuição na planta. Sob situação de deficiência, no início
os sintomas aparecem nas folhas mais velhas, por meio de uma clorose
entre as nervuras, começando nas pontas e ao longo das margens com
pequenas pontuações necróticas, que também atingem a bainha
(ORLANDO FILHO et al., 1994; PRADO, 2008; KORNDÖRFER et al.,
2017).
Além disso, a calagem pode também aumentar a disponibilidade de
fósforo e molibdênio, melhorar a agregação do solo através da adição de
cátions floculantes (cálcio e magnésio) aos coloides do solo, auxiliar na
fixação simbiótica do nitrogênio, favorecer a nitrificação da matéria
orgânica e estimular o desenvolvimento das raízes, contribuindo para um
melhor aproveitamento de água e nutrientes presentes no solo (VITTI;
MAZZA, 2002; RAIJ, 2017).
Métodos de calagem na cana-de-açúcar
Segundo o critério de recomendação, a quantidade de corretivo pode
variar bastante. Deve-se considerar o nível de tecnologia empregado pelos
agricultores e seus custos em curto e médio prazo. Sabe-se que quantidades
elevadas tendem a encarecer a produção. Entretanto, o efeito residual do
corretivo será mais prolongado (KORNDÖRFER et al., 2017).
Há dois critérios utilizados para se proceder o cálculo da necessidade
de calagem. O Instituto Agronômico de Campinas (IAC), por meio de Raij
et al. (1996), recomenda a calagem baseada na saturação de bases. De
acordo com Raij (2017), a grande vantagem da determinação da
necessidade de calagem para a elevação da saturação por bases está na
12 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

facilidade dos cálculos e na flexibilidade de adaptação para diferentes


culturas, de acordo com suas exigências. Neste cálculo, são considerados
parâmetros referentes ao solo, ao corretivo e à cultura. Para a cultura da
cana, recomenda-se elevação da saturação de bases do solo para 60%, que
pode ser traduzida pela fórmula:

Em que:
NC = necessidade de calagem, t ha-1;
V% = saturação por bases encontrada na análise de solo;
CTC = capacidade de troca de cátions (cmolc dm-3) do solo a pH 7,0.
Já Copersucar, por meio de Benedini (1988), sugere a necessidade
de calagem para a cultura utilizando a seguinte fórmula:

Para se atingir o sucesso desta prática, recomenda-se aplicar o


calcário em uma profundidade média de 40 cm na implantação do canavial.
Deve-se atentar para a uniformidade em toda extensão do terreno, para que
haja um contato bem próximo entre as partículas do solo. Além disso, a
antecedência da aplicação é de suma importância, devendo ser realizada
três meses antes, aplicando-se metade do corretivo antes e a outra metade
após a aração por meio da gradagem (SANTOS; BORÉM, 2016; RAIJ,
2017).
No caso de soqueira, deve-se realizar a calagem logo após o segundo
e quarto cortes, com base nas análises de solo realizadas após o primeiro e
terceiro cortes, caso a saturação por bases (V%) seja menor do que 50,
levando em consideração somente a camada de 0-20 ou 0-25 cm
(SANTOS; BORÉM, 2016).
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 13

Outro ponto importante a ser considerado é o PRNT (Poder Relativo


de Neutralização Total), que pode ser definido como o conteúdo de
neutralizantes contidos no corretivo que reagirá com o solo no período de
três meses. Um calcário que apresenta PRNT mais baixo terá um poder
residual de neutralização da acidez que ocorre de forma mais lenta,
podendo ser vantajoso para a cana-de-açúcar. Por outro lado, um calcário
com PRNT mais elevado terá uma reação mais rápida no solo, ou seja,
maior será a quantidade de ácidos neutralizados. Vale ressaltar que a
velocidade de reação no solo será influenciada pelas condições do clima e
do solo, da natureza química do corretivo e, principalmente, da sua
granulometria (PRIMAVESI; PRIMAVESI, 2004; SANTIAGO;
ROSSETO, 2021).
Além do PRNT, deverá ser considerado também o teor de magnésio,
devendo-se dar preferência aos materiais que contenham uma grande
quantidade deste nutriente, como é o caso do calcário dolomítico, que
apresenta teor de óxido de magnésio superior a 12% (PRIMAVESI;
PRIMAVESI, 2004).
Gessagem
Outro produto que pode ser utilizado na melhoria do ambiente
radicular em profundidade é o gesso agrícola (CaSO4.2H2O), que é um
subproduto da produção de ácido fosfórico e contém aproximadamente
26% de CaO e 15% de enxofre (KORNDÖRFER et al., 2017).
O gesso, quando aplicado superficialmente no solo, tende a dissolver
de maneira gradual. Devido à sua rápida mobilidade, o gesso lixivia para
as camadas mais profundas, sem precisar de incorporação. Este fato
contribui para o aprofundamento das raízes favorecendo a absorção de
água e nutrientes com maior eficiência, além de se tornarem mais
tolerantes a veranicos. Além disso, a aplicação deste insumo tende a
aumentar o teor de Ca e ajuda na redução da saturação de Al em
profundidade, reduzindo os efeitos do Al sobre o crescimento das raízes,
sem necessariamente atuar como corretivo de pH (DEMATÊ, 2004).
14 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

O gesso também é importante fornecedor de enxofre para as plantas.


Conforme Raij (2017), o enxofre participa de dois aminoácidos essenciais
(cistina e metionina). Esses aminoácidos entram na composição de todas
as proteínas, tendo função estrutural. O enxofre atua também como
ativador enzimático e participa de todos os processos metabólicos da
planta (fotossíntese, respiração, síntese de gorduras e proteínas e fixação
simbiótica de nitrogênio) (MALAVOLTA, 2006; PRADO, 2008).
Quanto à determinação da dose de gesso, deve-se considerar o
resultado de análise da camada de 20-40 ou 25-50 cm (VITTI et al., 2016).

Em que:
NG = necessidade de gesso, t ha-1;
V1 = saturação por bases encontrada na análise de solo;
CTC = capacidade de troca de cátions (mmolc dm-3).
Uma outra forma de recomendar o gesso agrícola é através do
conhecimento do teor médio de argila do solo. Com posse dos dados de
análise química do solo, deve-se multiplicar o fator de 60 pelo teor médio
de argila para culturas anuais e perenes em geral, critério que é utilizado
no Estado de São Paulo (RAIJ et al., 1996). Como exemplo, para a cultura
da cana-de-açúcar, a recomendação resulta em dose de 900 kg ha-1 de
gesso para um solo ácido com 15% de argila.
Segundo Sousa et al. (2005), se a saturação de alumínio for maior
que 20% ou o teor de cálcio for menor que 0,5 cmolc/dm3, existe a
possibilidade de resposta ao gesso, justificando-se a utilização deste
insumo. A aplicação deve ser realizada a lanço depois da calagem ou
imediatamente antes, caso seja necessário.
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 15

Fosfatagem
Um dos problemas que mais afetam a eficiência na produção
agrícola é a baixa concentração de fósforo disponível e o alto potencial de
fixação do P aplicado via fertilizante (PRADO, 2008).
Embora o elemento seja exigido em menores quantidades do que o
nitrogênio e o potássio, exerce função-chave no metabolismo da cultura,
particularmente na transferência e armazenamento de energia, absorção
iônica, fotossíntese, síntese de proteínas, processo de divisão celular,
herança e fixação biológica de N (MALAVOLTA, 2006).
Devido à sua baixa disponibilidade natural e à alta interação do
elemento com a fração mineral do solo, o fósforo é aplicado em grandes
quantidades nos solos brasileiros. A fosfatagem é uma prática corretiva
que tem como objetivo elevar o teor de fósforo do solo, tornando o
elemento disponível para a cultura ao longo do ciclo.
De acordo com Rein et al. (2015), esta prática é baseada na aplicação
de altas doses de P2O5 (até 180 kg/ha) no fundo do sulco, exclusivamente
no plantio. Entretanto, a fosfatagem também pode ser realizada a lanço
com incorporação em profundidade (em torno de 15 cm), onde a densidade
de raízes da cana-de-açúcar é bastante alta. A disponibilidade de fósforo
em grande quantidade faz com que se atinja aproximadamente 80% do
potencial produtivo no ano, sem outra complementação de fertilizante
fosfatado.
Para que ocorra uma adequada absorção do fósforo, é necessário um
contato próximo do nutriente com as raízes. Vale destacar que o
movimento do nutriente no solo é governado pela difusão, ou seja, a
movimentação ocorrerá a favor de um gradiente de concentração,
percorrendo pequenas distâncias, fato que justifica a aplicação localizada,
a qual irá favorecer o processo de absorção (MALAVOLTA, 2006;
PRADO, 2008; RAIJ, 2017).
De acordo com Korndörfer et al. (2004), a adubação fosfatada
contribui para o aumento o teor de P2O5 no caldo, o que melhora
sobremaneira o processo de clarificação do caldo para a produção de
16 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

açúcar. O nutriente funciona como um agente floculante, fazendo com que


as impurezas contidas no caldo sejam carreadas para o fundo do
decantador, apresentando, assim, relevância no processo industrial.
Práticas conservacionistas
Adubação verde
A adubação verde é entendida como a incorporação de massa vegetal
ao solo, produzida no local ou adicionada, com a finalidade de preservar
e/ou restaurar os teores de matéria orgânica e nutrientes do solo,
proporcionando melhorias nas suas propriedades físicas, químicas e
biológicas, sendo uma alternativa viável na busca da sustentabilidade dos
solos agrícolas (ABBOUD, 1986). Igue (1984) destaca que a prática da
adubação verde contribui para o aumento da capacidade de troca catiônica,
formação e estabilização dos agregados, melhoria na infiltração de água e
aeração, controle de nematoides e incorporação de nitrogênio no solo,
efetuado através da fixação biológica.
Para que ocorra a absorção dos nutrientes advindos da mineralização
dos adubos verdes, a planta depende, em grande parte, da sincronia entre
a decomposição e a mineralização dos resíduos vegetais e a época de maior
exigência nutricional da cultura (LINHARES et al., 2010). Se a
mineralização dos nutrientes ocorrer fora do período de maior demanda
nutricional da cultura de interesse econômico, a planta não será
beneficiada (CREWS; PEOPLES, 2005). Lembrando que a adição de
adubo verde ao solo trará benefícios não só ao primeiro cultivo, mas
também a cultivos sucessivos que se caracterizam pela viabilidade no
emprego desse insumo.
O tempo de decomposição dos resíduos depende das condições
edafoclimáticas da região, da relação entre as quantidades de carbono e
nitrogênio (relação C/N) e do teor de lignina dos resíduos vegetais
(TORRES et al., 2005; XU; HIRATA, 2005).
Segundo Vale et al. (2004), a mineralização do N é muito
influenciada pela relação C:N do material em decomposição. Quanto
maior for a C:N do material orgânico adicionado ao solo, tanto maior será
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 17

o período de imobilização. De acordo com esses autores, quando são


adicionados ao solo resíduos orgânicos com relação C:N maior que 30:1,
há o predomínio da imobilização de N. Com a adição de resíduos com
relação C:N menor que 20:1, há predominância de mineralização de N no
início de sua decomposição, o que pode acarretar numa maior perda do
elemento. À medida que os microorganismos decompõem um resíduo
orgânico, ocorre a mineralização, processo pelo qual os nutrientes são
convertidos da sua forma orgânica para sua forma inorgânica, tornando-os
disponíveis para as plantas.
De acordo com Espindola et al. (2006), vários critérios devem ser
adotados na escolha da espécie a ser adotada como adubo verde. Entre eles
destacamos: adaptação das espécies às condições de clima e solo do local;
tolerância ao Al; eficiência na extração e ciclagem de nutrientes; elevada
fixação de N2 atmosférico; rusticidade; crescimento inicial rápido, de
modo a cobrir o solo e dificultar a presença de plantas espontâneas; sistema
radicular bem desenvolvido; elevada produção de fitomassa verde; baixa
suscetibilidade ao ataque de pragas e doenças, relação C/N baixa e livres
de dormência.
Em áreas de reforma da cana-de-açúcar, os adubos verdes são
caracterizados como uma importante alternativa para a reciclagem de
nutrientes, com economia da adubação nitrogenada e geração de renda
(MASCARENHAS et al., 1994; AMBROSANO et al., 2010, 2011).
Conforme Bolonhezi et al. (2014), a prática da adubação verde em cana-
de-açúcar supre os requerimentos de N na cana-planta, gerando aumentos
acima de 20 t ha-1 na produtividade de colmos. Abrosano et al. (2011)
afirmam que esses aumentos significativos nas produções de cana-de-
açúcar podem chegar até o quinto corte, sendo um custo relativamente
baixo.
Atualmente, a família das leguminosas é mais utilizada como adubo
verde. De acordo com Miyasaka et al. (1984), o principal motivo para essa
prioridade está em sua capacidade de fixar o N atmosférico mediante a
simbiose, com bactérias do gênero Rhyzobium/Bradyrhyzobium nas raízes.
Essa característica é importante, uma vez que possibilita maior rapidez na
18 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

decomposição dos restos vegetais, além de proporcionar um sistema


radicular geralmente bem profundo e ramificado, capaz de extrair
nutrientes das camadas mais profundas do solo.
Além disso, Ambrosano et al. (2017) destacam também a proteção
oferecida pela cobertura vegetal, as menores amplitudes diuturnas da
variação térmica do solo, a proteção ao impacto das gotas da chuva e ao
escorrimento superficial, a manutenção de uma temperatura mais
estabilizada no solo e a proteção contra possíveis perdas de nutrientes e de
água, contribuindo para a conservação do solo.
Adubação orgânica
Atualmente, existem vários tipos de adubos orgânicos, tanto de
origem animal quanto vegetal e agroindustrial, indicados para a utilização
no plantio de diversas culturas, devendo-se atentar para a origem e a
qualidade dos mesmos (SOUZA; RESENDE, 2012).
A matéria orgânica conserva, em suas estruturas, elementos contidos
em compostos químicos remanescentes das estruturas dos seres vivos que
os utilizaram. Esses elementos formam a estrutura básica da matéria
orgânica, representados por cadeias e anéis de carbono contendo
hidrogênio e oxigênio, além de grupamentos funcionais diversos, entre os
quais se destacam nitrogênio, enxofre e fósforo (RAIJ, 2017). Além disso,
a matéria orgânica funciona como fonte de energia para os microrganismos
que conduzirão a disponibilização dos nutrientes para as plantas,
proporciona aumento na capacidade de retenção de umidade, melhora a
estrutura e o arejamento (formação de macroporos), melhora a taxa de
infiltração de água, regula a temperatura do solo, evitando grandes
oscilações, aumenta a capacidade de retenção de cátions, fornece
nutrientes e retarda a fixação do fósforo, uma vez que os radicais orgânicos
bloqueiam os sítios de fixação. Alguns produtos da decomposição da
matéria orgânica têm efeito hormonal ou estimulante para o
desenvolvimento das raízes (MALAVOLTA et al., 2002; VITTI et al.,
2016).
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 19

Diante da variabilidade na composição dos resíduos orgânicos, seu


uso como adubo requer conhecimento da dinâmica de mineralização de
nutrientes, com o objetivo de otimizar a sincronização da disponibilidade
de nutrientes no solo com a demanda nutricional das plantas, de modo que
possa ser evitada a imobilização ou a rápida mineralização de nutrientes
durante os períodos de alta e baixa demanda (MYRES et al., 1994;
HANDAYANTO et al., 1997; GABRIELLE et al., 2004; BENITO et al.,
2005).
Como alternativa, a utilização de subprodutos tornou-se grande
redutor de custos para a usina, tendo em vista que esses materiais cada vez
mais substituem ou complementam a adubação mineral. Os subprodutos
mais utilizados são a torta de filtro, vinhaça, fuligem e a cinza. Quanto ao
processo para o uso desses subprodutos, existem as seguintes opções: “in
natura”, utilizando-se torta de filtro com cerca de 70 a 75% de umidade
no plantio de cana de inverno, no sulco; “condicionada”, com o uso da
torta de filtro submetida a um processo de secagem e, por fim, a “torta de
filtro enriquecida”, a qual, além de sofrer o processo de condicionamento,
passa por compostagem aeróbica, sendo misturada com outras matérias-
primas (bagaço, cinza, serragem, cama de frango, esterco bovino, dejeto
de suíno, fosfatos naturais, gesso agrícola, etc.), visando elevar o padrão
da concentração de nutrientes e diminuir a umidade (VITTI et al., 2016).
Adubação mineral
Adubação nitrogenada
No sistema solo-planta, o nitrogênio (N) passa por reações de
oxirredução, sendo absorvido pelas raízes na forma oxidada NO3- (nitrato)
ou na forma reduzida NO4+ (amônio). Cerca de 95% do N no solo está na
forma de NO3-, que é lixiviada para fora da zona de absorção das raízes,
fato que está relacionado com a textura do solo e com o regime
pluviométrico da região de cultivo. O N é um nutriente móvel no solo e na
planta, normalmente assimilado na forma de aminoácidos. É encontrado
em componentes celulares como proteínas, ácidos nucleicos e clorofilas,
além de ser requerido para a síntese de transporte de citocininas,
constituindo-se na forma de N inorgânico para as células (FAGAN et al.,
2016; CASTRO, 2016).
20 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

A cana-de-açúcar é uma Poaceae, de metabolismo de carbono C4,


conhecida por ser bastante eficiente em condições de clima tropical, uma
vez que praticamente anula a fotorrespiração, apresentando altas taxas de
fotossíntese líquida e alta eficiência na utilização do N e da energia solar,
fato este que revela grande importância do N para essa espécie. Por fazer
parte da constituição dos aminoácidos, proteínas e ácidos nucleicos, o N
tem participação direta e indireta em processos bioquímicos e sua carência
acarreta na diminuição da síntese de clorofila e aminoácidos essenciais,
além de diminuir a energia necessária para produção de carboidratos e
esqueletos carbônicos, refletindo no desenvolvimento e rendimento da
cultura (MALAVOLTA et al., 1997; DA SILVA et al., 2015).
O N é o nutriente que mais gera dúvidas quanto à recomendação
técnica e econômica. O N disponível para as plantas no solo é suprido pela
fixação biológica, mineralização da matéria orgânica e adição de
fertilizantes nitrogenados. Nesse contexto, pensando-se na cana-de-
açúcar, podemos citar algumas práticas como fontes alternativas que
favorecem o desenvolvimento radicular e, consequentemente, maior
absorção de N e fixação biológica: N mineralizado dos restos de cultura da
própria cana, N mineralizado da matéria orgânica do solo e N armazenado
no tolete de plantio (LUZ et al., 2017).
Raij et al. (1996) recomendam, para cana planta no estado de São
Paulo, 30 kg ha-1 de N no sulco de plantio e 30 kg ha-1 a 60 kg ha-1 de N
em cobertura, no final do período de chuvas, dependendo da meta de
produção. Porém, ainda há dúvidas quanto ao parcelamento da adubação
nitrogenada em cana planta. O parcelamento da adubação justifica-se, uma
vez que altas doses de fertilizante nitrogenado solúvel no sulco de plantio,
quando as plantas possuem poucas raízes e em um período de precipitação
alta, podem resultar em baixa eficiência do seu uso. Vale ressaltar que a
viabilidade de parcelamento com N em cana planta vai depender da época
de plantio, textura do solo e regime pluviométrico (LUZ et al., 2017).
Em relação às fontes nitrogenadas, emprega-se a fonte que
apresentar menor custo por unidade de N, sendo utilizadas geralmente a
aquamônia (líquida) e a ureia (sólida), sendo a ureia o fertilizante
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 21

nitrogenado mais utilizado no mercado brasileiro e de menor custo por


unidade de N. Em situações em que a incorporação da ureia ao solo não é
possível, outras fontes como o nitrato de amônio e o sulfato de amônio
podem ser boas alternativas (LUZ et al., 2017).
Adubação fosfatada
Depois do nitrogênio, o fósforo é o elemento que mais limita o
crescimento dos vegetais, fato que pode ser explicado pela participação na
formação inicial e pelo desenvolvimento das raízes. O fósforo atua em
inúmeros processos metabólicos da planta, com destaque para o
fornecimento e armazenamento de energia.
Vale destacar que a eficiência na utilização do P como fertilizante é
baixa, o que implica em aplicações de doses elevadas. De acordo com
Rosseto et al. (2008b), um dos fatores responsáveis pela baixa eficiência
da adubação com fósforo nos solos brasileiros é o alto teor de óxidos de
ferro e alumínio, que tendem a promover a sua fixação e,
consequentemente, indisponibiliza o elemento para a planta.
Luz et al. (2017) afirmam que, em solos com teores muito baixos de
P (P em resina < 10 mg dm-3), são indicadas aplicações em área total, uma
prática conhecida como fosfatagem. Esta prática é realizada
principalmente em solos arenosos ou com teor de argila menor do que
30%, a qual tende a diminuir a fixação do elemento. A fosfatagem deverá
ser feita logo após a calagem e a gessagem. Vários benefícios são advindos
da aplicação do P, tais como maior quantidade de P em contato com o solo,
maior volume de solo explorado pelo sistema radicular e maior absorção
de água e outros nutrientes (ROSSETO et al., 2008b).
Outro ponto importante é a questão da solubilidade. As fontes de P
diferem quanto à sua eficiência e, consequentemente, promovem
diferentes respostas na produtividade da cana. As fontes de P parcialmente
solúveis apresentam um bom desempenho na cultura, uma vez que o
fósforo é liberado de maneira gradual ao longo do tempo, gerando um
maior aproveitamento pela planta ao longo do seu desenvolvimento (LUZ
et al., 2017).
22 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Segundo Vitti et al. (2016), com o adequado fornecimento de P 2O5


na implantação da cultura, tanto em área total como no sulco, não se faz
necessária a utilização de P2O5 na soqueira. A grande maioria dos
experimentos demonstram que há maior resposta ao fósforo quando este é
aplicado em dose completa no plantio, não havendo a necessidade
posterior de adubação fosfatada nas soqueiras (RAIJ et al., 1996).
Considerando o teor de fósforo no solo e a produtividade, encontra-se na
Tabela 1 a recomendação de adubação fosfatada. Entretanto, de acordo
com o IAC, em áreas onde o teor P no solo seja menor que 15 mg dm -3
(extrator de resina), aplica-se nas soqueiras 30 kg ha-1 de P2O5.
Tabela1 - Recomendação de adubação fosfatada P2O5 para plantio de
cana-de-açúcar.

Fósforo (mmolc dm-3)


Produtividade esperada 0-6 7-15 16-40 >40
(TCH) -1
P2O5 (kg ha )
< 100 180 100 60 40
100-150 180 120 80 60
> 150 - 140 100 80
Fonte: Raij et al. (1996).
Adubação potássica
O potássio é o macronutriente mais extraído pela cana-de-açúcar. A
maior parte do elemento absorvido tende a se concentrar nos colmos e
cerca de 45% permanece nas folhas (ROSSETO et al., 2008c).
Ao contrário do nitrogênio, o potássio não faz parte de nenhum
composto orgânico na planta, ou seja, não tem função estrutural. Sua
principal função é o de ativador enzimático, participando de muitos
processos metabólicos. Além disso, o potássio apresenta grande
importância na expansão celular, formando de um grande vacúolo central
que ocupa cerca de 80% a 90% do volume da célula (PRADO, 2008).
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 23

Segundo Malavolta et al. (1997), o potássio atua na abertura e


fechamento de estômatos. O elemento influencia o ótimo turgor das
células-guarda, pois eleva o potencial osmótico dessas células, resultando
em absorção de água e, consequentemente, em maior turgor e abertura dos
estômatos. A abertura e fechamento dos estômatos é importante na taxa de
fotossíntese, pois em plantas que estão deficientes em K, a abertura dos
estômatos não ocorre de maneira adequada, diminuindo a entrada de CO2
(PRADO, 2008).
De acordo com Silveira e Malavolta (2000), as plantas bem supridas
com potássio são mais resistentes a secas e geadas, em razão da maior
eficiência no uso da água, ou seja, mantêm maior quantidade de água nos
tecidos em relação às plantas sob deficiência nutricional. Com maior teor
de água nas células, o potássio irá favorecer as reações metabólicas e
também a orientação das folhas, fazendo com que ocorra maior
interceptação da luz (MALAVOLTA, 1980).
De acordo com o IAC, a recomendação de adubação potássica, tanto
na cana planta como nas soqueiras, é baseada na análise de solo e na
expectativa de produtividade. Quanto maior for a expectativa da
produtividade, maiores serão as doses de K. Espera-se maior resposta à
aplicação de K em solos que apresentem cerca de < 1,5 mmolc dm-3 de K
(PRADO, 2008; LUZ et al., 2017). A Tabela 2 mostra, a seguir, a
recomendação de adubação potássica no sulco de plantio da cana-de-
açúcar (Tabela 2).
Tabela 2 - Recomendação de adubação potássica (K2O, em kg ha-1) para
plantio de cana-de-açúcar.

Fósforo (mmolc dm-3)


Produtividade esperada 0,0-0,7 0,8-1,5 1,6-3,0 3,1-6,0
(TCH) K2O (kg ha ) -1

< 100 100 80 40 40


100-150 100-150 120 80 60
> 150 >150 160 120 80
Fonte: Raij et al. (1996).
24 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Adubação com enxofre


Apesar do enxofre ser um nutriente essencial para as plantas,
provavelmente é o macronutriente menos empregado nas adubações. A sua
deficiência em extensas áreas do Brasil é fator limitante da produção
agrícola. Na agricultura brasileira, as fontes mais comuns de enxofre são
o superfosfato simples (12% S-sulfato), sulfato de amônio (24% de S-
sulfato), sulfato de potássio (18% de S-sulfato) e também o gesso, um
subproduto da fabricação de ácido fosfórico (CUNHA et al., 2001;
HOROWITZ; MEURER, 2006; RAIJ, 2017). De acordo com Luz et al.
(2017), as necessidades de S dos canaviais estão sendo satisfeitas por meio
de gessagens e uso de resíduos orgânicos, como torta de filtro, vinhaça e
fertilizantes oragnominerais.
A concentração de enxofre nos solos varia de 0,1% em solos
minerais até 1% em solos orgânicos. A proporção de enxofre no solo varia
de acordo com o tipo de solo e sua profundidade. Entretanto, grande parte
desse elemento está na forma orgânica (60% - 90% do total como S-
aminoácidos, S-fenóis, S-carboidratos, S-lipídeos, S-húmus) e necessita
passar pelo processo de mineralização para se tornar disponível às plantas
(SO42-). Portanto, a matéria orgânica é considerada como um reservatório
de S do solo. Solos arenosos e com baixo teor de matéria orgânica (<20 g
kh-1) podem apresentar pouca capacidade de suprir as necessidades
nutricionais da planta em relação a esse elemento (RAIJ et al., 1997;
HOROWITZ; MEURER, 2006; PRADO, 2008; RAIJ, 2017).
Conforme Malavolta (1981), os compostos orgânicos de enxofre no
solo estão sob a forma de aminoácidos livres, sulfatos orgânicos, derivados
de quinomas e aminoácidos com enxofre. A mineralização do enxofre
depende da relação entre carbono e enxofre (C/S) no solo ou substrato.
Segundo Luz et al. (2017), quando a palhada é mantida sobre o solo
em sistema de colheita de cana crua, grande parte do S contido no resíduo
vegetal pode retornar ao solo. Em resíduo contendo relação C:S abaixo de
200 e acima de 400, predominará, respectivamente, a mineralização e
imobilização do S pelos microrganismos presentes do solo.
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 25

Nas plantas, os compostos de enxofre atuam nas reações fisiológicas


e bioquímicas, participando de dois aminoácidos essenciais (cistina e
metionina). Esses aminoácidos fazem parte da composição de todas as
proteínas. Além disso, o enxofre participa diretamente na redução do
nitrato na fixação biológica do nitrogênio e na síntese de proteínas nos
tecidos vegetais e reprodutivos da planta (VITTI et al., 2006; PRADO,
2008; RAIJ, 2017).
Os sintomas de deficiência de S são semelhantes aos da deficiência
de nitrogênio: início nas folhas mais novas e as plantas se apresentam
uniformemente cloróticas. A deficiência deste nutriente interrompe a
síntese de proteínas, por estar relacionado com a atividade da nitrato
redutase, diminuindo, assim, o aproveitamento do N pela planta; diminui
a fotossíntese e a atividade respiratória; reduz o teor de gorduras e diminui
a fixação livre e simbiótica do N2 atmosférico (VITTI et al., 2006).
Adubação com micronutrientes
Quando se trata de adubação com micronutrientes em cana-de-
açúcar, as pesquisas apresentam muitos resultados contraditórios (LUZ et
al., 2017). Além disso, a cana-de-açúcar pode apresentar o fenômeno de
fome oculta em relação aos micronutrientes, ou seja, a deficiência existe e
limita economicamente a produtividade, porém a planta não manifesta
sintomas visuais (MELLIS et al., 2008). No processo de produção da cana,
é possível nutrir o canavial com micronutrientes em diferentes fases do
desenvolvimento vegetativo (Figura 1).
26 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Figura 1 - Esquema do fornecimento de macro e micronutrientes ao longo


do desenvolvimento vegetativo da cultura.

Fonte: Luz e Quitino (2013). Forplant.


Com base na pesquisa de Luz e Quitino (2013), segue uma sugestão
de recomendação de aplicação de micronutrientes, levando em
consideração a quantidade exigida pela cultura para a produtividade de
cana-de-açúcar na faixa de 120 t ha-1 a 130 t ha-1 (Tabela 3).
Correção e adubação do solo para a cultura da cana de açúcar | 27
28 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

A indicação de adubação deve ser precedida da análise de solo e


folhas, acompanhada da observação das lavouras no campo. O conjunto
dessas práticas, quando aplicadas de forma correta, podem gerar aumento
significativo de produção, com posterior redução no custo, com agregação
de valor ao produto final.
Considerações finais
A avaliação da fertilidade do solo é uma atividade de suma
importância na agricultura, devendo-se levar em conta as condições do
solo e os fatores que afetam a produtividade e a necessidade de nutrientes.
Diversos recursos são utilizados para a avaliação da fertilidade do
solo, destacando-se a análise do solo, ferramenta essencial para estabelecer
quantidades de corretivos, e os fertilizantes a serem aplicados na área
agrícola, objetivando não somente elevar ou manter os teores dos
elementos no solo em faixas ideais, mas também diagnosticar problemas
de toxidez de alguns elementos, de forma que possa gerar retorno
econômico o mais favorável possível. Portanto, cabe ao responsável
técnico interpretar os resultados e indicar a melhor forma e momento para
aplicação dos insumos.
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MÉTODOS DE IRRIGAÇÃO/FERTIRRIGAÇÃO NA
CULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR

Luiz Vitor Crepaldi Sanches3

Introdução
Ao transitarmos pelas rodovias do Estado de São Paulo, é comum
nos depararmos com imensas áreas de cultivo de cana-de-açúcar. Muitos
acreditam que a cultura é rústica e resistente à falta de água, não sendo
necessário o incremento via irrigação. Entretanto, existem duas vertentes
sobre esta afirmação.
De fato, a cana-de-açúcar consegue se manter viva sob estresse
hídrico. Contudo, nessa condição, apresenta baixa produtividade e má
qualidade, sendo fundamental a suplementação hídrica para seu
crescimento e desenvolvimento e, assim, ter sua produtividade
maximizada.
A suplementação hídrica da cultura da cana é fundamental para o
fornecimento de água em períodos de estiagem, pois, na atualidade, os
regimes pluviométricos já não mais ocorrem de forma distribuída pelas
estações climáticas durante o ano. Após a colheita, a cultura necessita de
suprimento de água para favorecer a rebrota das soqueiras, o que tem
impacto direto na safra do ano seguinte.
Nesse contexto, a cana é a cultura com maior área irrigada no Brasil.
Na safra 2018/2019, dos 11,2 milhões de hectares cultivados com cana-de-
açúcar no país, 3,66 milhões foram irrigados (AGROSATÉLITE, 2019).
Segundo a Agência Nacional das Águas – ANA (2019), a área
irrigada no Brasil é dividida em dois segmentos, sendo um deles com a
aplicação de águas captadas em mananciais (irrigação) e o outro, com a

3
Engenheiro Agrônomo, Dr., Docente das Faculdades Galileu e Gran Tietê,
luizvitorsanches@hotmail.com
36 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

aplicação de águas residuárias e vinhaça (fertirrigação) originária do


processo industrial de produção de etanol e açúcar. Dos 2,1 bilhões de m³
de água aplicados nos canaviais brasileiros, 27,7% foram aplicados na
forma de fertirrigação e 72,3% na forma de irrigação. Entretanto, a área
irrigada no Brasil foi de 748,9 mil hectares, enquanto que a fertirrigada foi
de 2,9 milhões, o que demonstra que uma menor proporção de área
necessita de um grande volume de água para êxito no cultivo da cultura da
cana.
Grande parte da área irrigada com água dos mananciais está
localizada na região norte-nordeste (38,5%), o que representa 456,4 mil
hectares, e apenas 2,9% no centro-sul.
A aplicação de vinhaça e águas residuárias via sistemas de irrigação
é fundamental para as indústrias de etanol, açúcar e biomassa, pois o
volume gerado diariamente é imenso, sendo inviável economicamente a
sua estocagem. Segundo a Agência Nacional das Águas –ANA (2009), a
indústria gera de 40 a 80 litros de etanol, 70 a 120 kg de açúcar e 70 a 100
Kwh/t para cada tonelada de cana processada, ao passo que se gera de 0,5
a 10 m³ de vinhaça e água residuárias por tonelada processada, sendo a
média, na região centro-sul, de 1 m³/t.
Segundo o Agrosatélite (2019), o Estado de São Paulo é líder no
segmento, com 52,7% da área cultivada, cerca de 5,9 milhões de hectares,
processando anualmente cerca de 345 milhões de toneladas de cana, o que
corresponde à geração de 345 milhões de m³ de vinhaça e água residuárias,
o que se compara a 138 mil piscinas olímpicas ou mesmo 1.150 navios
petroleiros carregados com vinhaça. Segundo a Novacana (2019), a
moagem da cana ocorre, em média, por 234 dias no ano, o que corresponde
à geração diária média de 1,5 milhões de m³ de vinhaça, demonstrando a
importância da aplicação deste resíduo industrial nas lavouras de cana-de-
açúcar.
Objetivos da irrigação/fertirrigação
Segundo a Agência Nacional das Águas – ANA (2019), há três tipos
de irrigação ou fertirrigação em canaviais: salvamento, déficit e plena.
Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 37

A irrigação de salvamento é aquela praticada com o intuito de


garantir o mínimo de umidade no solo em períodos de seca, reduzindo,
desta maneira, o estresse hídrico e favorecendo a rebrota das soqueiras ou
mesmo novos plantios (ANA, 2019). São consideradas irrigações de baixo
volume (uma lâmina de 20 a 100 mm/ano), quando comparadas à
necessidade hídrica para cada ciclo vegetativo da cana, que é de 1.500 a
2.500 mm de água por ano.
A irrigação do tipo déficit tem o intuito de suprir, em média, 50% da
necessidade hídrica da cultura em estresse hídrico, aplicando-se lâminas
dentre 200 e 400 mm/m²/ano. Tal variação depende do tipo de solo,
topografia, clima da região, cultivar e eficiência do sistema de irrigação
utilizado.
A irrigação plena constitui-se pela aplicação de quase toda a
necessidade hídrica da cultura em estresse hídrico, com lâminas que
variam de 400 a 1.000 mm/ano, podendo chegar a quase 50% de toda a
necessidade hídrica da cultura durante cada ciclo de produção.
É importante o conhecimento dos objetivos da aplicação da
irrigação, pois dos 11,2 milhões de hectares cultivados com cana-de-
açúcar, cerca de 9,6 milhões de hectares estão localizados em regiões com
déficit hídrico inferior a 800 mm por ano, o que torna economicamente
viável a sua condução, com menor necessidade de aplicação de lâmina de
irrigação. Entretanto, 1,6 milhões de hectares se encontram em regiões
com déficit hídrico maior que 800 mm/ano, o que exige suplementação
hídrica com frequência via irrigação.
A utilização de vinhaça na forma de fertirrigação visa reciclar os
nutrientes extraídos pela cultura da cana durante o seu desenvolvimento e
que estão disponíveis no resíduo. A aplicação de vinhaça faz com que os
teores de nutrientes no solo e a umidade se elevem, favorecendo o
desenvolvimento da cultura, além de propiciar economia na aquisição de
adubos e fertilizantes.
38 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Utilização de águas residuárias e vinhaça da indústria sucroalcooleira


na cultura da cana
A legislação brasileira sobre o uso e aplicação de vinhaça em solo
agrícola é regida pelas Portarias nº 323, de 29 de novembro de 1978, e nº
158, de 03 de novembro de 1980, emitidas pelo extinto Ministério do
Interior, as quais dispõem sobre a proibição do lançamento direto ou
indireto da vinhaça em qual seja o corpo hídrico (CETESB, 2015; ANA,
2019).
De acordo com a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo
(CETESB, 2015), a Norma Técnica P 4.231/2005, regulamenta a
disposição da vinhaça em uso agrícola no Estado de São Paulo,
estabelecendo formas e métodos para o armazenamento, transporte e
aplicação da vinhaça. A referida norma impede a aplicação de vinhaça em
áreas de preservação permanente, bem como em distâncias menores que
100 metros de poços de abastecimento de água e, pelo menos, 1 km de
distância de núcleos populacionais. Outras medidas normativas
estabelecem ainda que, no momento de aplicação de vinhaça, o aquífero
livre deve estar, no mínimo, a 1,5 m de profundidade e que, em áreas com
declive acima de 15%, deve-se realizar barreiras de contenção para evitar
erosão. A incorporação da vinhaça ao solo só é permitida com autorização
da CETESB.
Para se determinar o volume de vinhaça a ser aplicado em uma área,
será necessária uma análise de solo que contemple pH, teores de potássio,
capacidade de troca catiônica (CTC) e análise da vinhaça principalmente
quanto ao teor de potássio. Com as análises concluídas, faz-se o cálculo
aplicando-se a seguinte fórmula:

Onde:
V = volume de vinhaça a ser aplicada em m³;
Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 39

0,05 = 5% da CTC em pH 7,0;


CTC = valor da CTC em pH 7,0;
Ksolo = teor de potássio no solo a uma profundidade de 80 cm;
3744 = constante de transformação de cmolc K/dm³ para kg K/ha;
185 = quilos de K2O extraído pela cultura da cana-de-açúcar por corte por
hectare;
Kvinhaça = teor de potássio na vinhaça (kg de K2O por m³).
Podem existir situações em que o cálculo demostrará que não será
possível a aplicação de vinhaça em determinado local, como, por exemplo,
em um solo com baixa CTC (3 cmolc/dm³) e alto teor de potássio (0,45
cmolc/dm³) em relação à CTC, correspondendo a 15% da CTC ocupada
pelo potássio, podendo resultar em salinização do solo.
Por outro lado, solos com CTC média (10 cmolc/dm³) e baixo teor
de potássio (0,45 cmolc/dm³) na relação com a CTC, correspondendo a
4,5% da CTC ocupada pelo potássio, o que possibilita uma aplicação de
cerca de 190 m³ de vinhaça por hectare. Em solos com alta CTC (15,1 a
50 cmolc/dm³), os volumes a serem aplicados ultrapassam facilmente os
1.000 m³ de vinhaça por hectare, devendo-se ter o cuidado para que não
haja escoamento superficial e, assim, contaminação de corpos hídricos.
Este é um fato de grande importância no Estado de São Paulo, tendo
em vista que na região centro-oeste estão localizados os principais polos
industriais sucroalcooleiros, como a Raizen Energia, uma das maiores
indústrias de açúcar, etanol e bioenergia do mundo, localizada no
município de Barra Bonita, onde os solos, em sua maioria, apresentam
CTC de média a alta, o que favorece a aplicação da vinhaça com maiores
lâminas. Entretanto, nessa região esbarramos em um entrave: a
declividade. Locais com baixa declividade são passíveis da aplicação de
maiores volumes; porém, em declividades acima de 15% não se deve
realizar a aplicação volumosa, sob risco de um escoamento superficial, que
pode resultar em erosão ou um grande acúmulo de vinhaça nas curvas de
nível, podendo levar à infiltração de vinhaça em profundidades maiores
40 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

que 80 cm e a uma consequentemente contaminação do solo e até mesmo


do lençol freático.
Reservatórios para acúmulo de vinhaça
A Portaria MINTER nº 124, de 20 de agosto de 1980, descreve as
formas de armazenamento de substâncias capazes de causar poluição
hídrica, como é o caso da vinhaça.
Os reservatórios de vinhaça não podem ser escavados, devendo
conter revestimento para evitar a sua infiltração de água no solo. Os
materiais mais utilizados para o revestimento de reservatórios de
contenção de vinhaça são a vinilona, a manta asfáltica e a manta de PEAD
(polietileno de alta densidade).
A vinilona e a manta de PEAD são geomembranas insolúveis em
solventes orgânicos e químicos, além de serem resistentes às reações
químicas de soluções de bases, ácidas e contendo sais. São materiais de
alto custo, porém com garantia prolongada, a qual, dependendo do
fabricante, pode chegar a 20 anos. As emendas são realizadas com produto
próprio que faz a fusão das mantas, evitando que ocorram vazamentos.
A manta asfáltica é um dos métodos de impermeabilização mais
utilizados no Brasil, pois é um material flexível, resistente a rachaduras,
de menor custo e maior durabilidade. Entretanto, na prática, o que se
observa é um grande número de emendas, sendo uma a cada 90 cm, as
quais, no momento da instalação, devem ser feitas com cuidado, pois a
manta sofre dilatação em altas temperaturas (verão), o que pode fazer com
que emendas malfeitas se rompam e permitam a infiltração da vinhaça pelo
perfil do solo, gerando contaminação do lençol freático.
Formas de transporte da vinhaça para realização da fertirrigação
Antes dos anos 80, era comum a utilização de canais abertos. As
escavações eram simples (sem nenhum tipo de revestimento) e com baixo
custo de implantação. Como resultado, a infiltração da vinhaça no solo
levava a perdas elevadas, salinização do solo e contaminação do lençol
freático.
Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 41

Hoje existem basicamente três formas de transporte da vinhaça até


os locais de aplicação no campo, podendo ser rodoviário (caminhões), por
canais abertos ou por redes adutoras.
Transporte rodoviário
O transporte rodoviário é realizado por caminhões-tanques de fibra
de vidro. Como pode ser observado na Figura 1, alguns modelos, além de
transportar, podem aplicar a vinhaça de forma pressurizada por uma barra
na parte traseira da carroceria, com orifícios que despejam o líquido
diretamente na linha de plantio ou soqueira, ou mesmo serem acoplados
ao carretel irrigador para promover a fertirrigação.

Figura 1 – Caminhão irrigador de vinhaça localizada. Fonte: Nonino


(2021).
É comumente utilizado no início da safra para transportar a vinhaça
em distâncias que não ultrapassem os 100 km da usina (distância
econômica), podendo atender áreas dispersas. Para que o transporte seja
viável, é comum concentrar a vinhaça. Períodos chuvosos inviabilizam a
aplicação devido às condições do solo e do sistema viário precário.
42 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Os caminhões são capazes de aplicar entre 7 e 40 m³ de vinhaça por


hectare. Existem equipamentos que podem ser instalados nos caminhões
para aplicações de baixo volume (entre 0,3 e 1,5 m³ por hectare).
Canais abertos
Os canais abertos são uma das formas mais utilizadas para o
transporte da vinhaça das usinas até boa parte das áreas de cultivo, devido
ao baixo custo de implantação, além de atuarem por força gravitacional.
Entretanto, dependem da altimetria da região, promovem a perda da área
agricultável e podem gerar a necessidade de transposição de sistemas
viários, além da existência dos riscos de perdas por infiltração. Outro ponto
negativo é que animais silvestres, no período noturno, podem cair nos
canais e não conseguir sair, acarretando prejuízos na fauna local.
Ainda de acordo com a Portaria MINTER nº 124/1980, os canais de
transporte de vinhaça também devem ser revestidos para se evitar danos
ambientais. Neste sentido, as opções para impermeabilização são a
aplicação de manta asfáltica, PEAD ou até mesmo concreto.
Como visto anteriormente, a manta asfáltica sofre dilatação com
temperaturas elevadas, é de fácil perfuração e de difícil ancoragem, além
de possuir muitas emendas (mais de 1.200 por km). Por não ser resistente
ao fogo, é comum deixar um carreador de cada lado do canal para evitar
danos à sua estrutura, em caso de incêndio. Entretanto, isso acarreta
grandes perdas de área cultivada.
Da mesma forma que a manta asfáltica, a manta de PEAD não resiste
ao fogo, porém é altamente resistente à corrosão e é de difícil perfuração.
Na Figura 2 se pode observar uma instalação com manta de PEAD, onde
se deve deixar carreadores em ambos os lados para evitar que incêndios
nos canaviais danifiquem a sua estrutura. Deve-se realizar a manutenção
periódica de plantas daninhas em torno do canal e efetuar a limpeza da
vinhaça remanescente.
Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 43

Figura 2 – Canal de vinhaça em PEAD. Usina Guaíra – SP. Fonte: B&B


Soluções Ambientais (2021).
A utilização de concreto como forma de impermeabilização de
canais vem ganhando espaço no Brasil, pois, mesmo com maior custo de
implantação, apresenta maior relação custo-benefício, uma vez que é
altamente resistente ao fogo, podendo-se cultivar a cana-de-açúcar bem
próxima a ele, sem perda considerável de áreas agrícolas. Possuem fácil
manutenção e vida útil de mais de 10 anos. Na Figura 3 se pode observar
um canal de vinhaça impermeabilizado no município de Lençóis
Paulista/SP, com passagem para pedestres.
44 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Figura 3 – Canal de vinhaça impermeabilizado com concreto. Lençóis


Paulista - SP, 2021. Fonte: arquivo pessoal.
Devido à porosidade natural do concreto, é indicada a aplicação de
polímeros impermeabilizantes que irão auxiliar na vedação dos poros,
evitando a infiltração de vinhaça no solo e prolongando a vida útil da
estrutura de concreto.
Redes adutoras gravitacionais e pressurizadas (fixas e móveis)
As redes adutoras podem ser implantadas utilizando-se
simplesmente apenas a força da gravidade ou conjuntos de motobombas.
Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 45

As redes adutoras que atuam por força gravitacional dependem da


altimetria da região onde está inserida a usina geradora de vinhaça, atuando
com metade da sua capacidade de condução (raio hidráulico) e utilizando
materiais de baixo custo, como o PVC. Possui a vantagem de serem
enterradas, não acarretando perdas de áreas agrícolas.
Na adutora gravitacional também podem ser acoplados motores a
diesel que irão promover a fertirrigação nos canaviais por meio de
diferentes sistemas de irrigação. A maior desvantagem deste sistema é que,
devido à força gravitacional, a vazão de escoamento é limitada,
permitindo-se acionar simultaneamente poucos pontos de fertirrigação ao
longo da adutora.
Já as adutoras pressurizadas possuem toda a sua tubulação
preenchida e com alta pressão, impulsionadas por motobombas elétricas
de grande potência. Isso faz com que um grande volume de vinhaça seja
transportado de forma rápida e eficiente, podendo-se acoplar ao sistema
inúmeros equipamentos de irrigação, como carretéis irrigadores ou mesmo
pivôs centrais, de forma simultânea. Mesmo com o alto custo de instalação
por hectare, algumas usinas têm substituído os seus sistemas de transporte
de vinhaça por adutoras pressurizadas fixas com pivôs centrais, que podem
trabalhar de forma automatizada e escoar o grande volume de vinhaça
gerado pela usina.
As adutoras pressurizadas (Figura 4) têm sido instaladas utilizando-
se materiais resistentes a alta pressão e a corrosão, como é o caso do RPVC
e do PEAD, fácil instalação e manutenção.
46 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Figura 4 – Instalação de adutora de vinhaça pressurizada em tubulação de


RPVC. Fonte: Irriga Engenharia (2021).
A utilização de adutoras pressurizadas móveis reduz o custo de
instalação por hectare, pois a linha pressurizada fica enterrada e, a partir
dela, faz-se a montagem de linhas secundárias de forma superficial no solo,
utilizando-se tubos de alumínio leves com alta pressão de serviço (170
mca) e de simples montagem e desmontagem, podendo-se aproveitar a
mesma rede em diferentes áreas.
Sistemas de irrigação
Para a cultura da cana-de-açúcar, é comum à utilização de sistemas
de aspersão, como carretel enrolador com canhão ou barra de irrigação,
pivô central e pivô rebocável, além da utilização de caminhões irrigadores
que aplicam vinhaça na linha de cultivo.
Os sistemas por aspersão possuem a vantagem de trabalhar com
bocais que propiciam a saída de partículas de até 2 cm em média,
facilitando a aplicação de efluentes como a vinhaça, cujas partículas
podem causar graves entupimentos em sistemas de irrigação por
gotejamento, gerando prejuízos por baixa eficiência do sistema ou mesmo
a sua completa inativação. Entretanto, países como Estados Unidos e Índia
Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 47

vêm estudando a utilização deste método de irrigação com vinhaça diluída,


que tem promovido maior produtividade e maior longevidade do canavial,
porém com alto investimento por área.
Na Figura 5 pode-se observar um carretel irrigador em operação
aplicando vinhaça. É o equipamento mais utilizado para promover a
irrigação ou mesmo a fertirrigação em canaviais brasileiros, pois são
versáteis, de fácil manuseio, podem operar em diferentes topografias e
conseguem ultrapassar curvas de níveis graças ao seu canhão móvel, que
pode ser puxado até a base fixa do carretel. Outra vantagem é a fácil
regulagem da lâmina de aplicação, que pode ser ajustada de forma robusta,
variando de modelo e fabricante.

Figura 5. Aplicação de vinhaça com carretel autopropelido com canhão.


Lençóis Paulista/SP, 2021. Fonte: arquivo pessoal.
Um exemplo é o carretel irrigador da empresa Krebs, modelo 75, que
pode aplicar uma vazão de 27 a 45m³/h e irrigar até 20 há. Já o modelo
Krebs 140 possui vazão de 119 a 160 m³/h e irrigar até 80 ha.
O manuseio é feito de forma simples: o trator reboca o carretel
irrigador até o local a ser irrigado, faz a desacoplagem e fixa o carretel ao
solo. Em seguida, é feita a acoplagem do carretel ao sistema pressurizado
48 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

de distribuição de água ou vinhaça. Então o trator acopla o canhão e o puxa


até todo o carretel ser desenrolado, permitindo o acionamento do sistema.
A pressão do fluido ao passar pelo carretel irrigador aciona o pistão,
que faz o recolhimento da mangueira e, consequentemente, puxa o canhão
irrigador e promove a irrigação. A velocidade de recolhimento determina
a lâmina de rega a ser aplicada.
O carretel irrigador é considerado um sistema de irrigação de baixo
custo por hectares, pois, por ser rebocável, é versátil e permite a irrigação
de grandes áreas.
Entretanto, o caminho por onde o trator realiza o reboque do canhão
de aspersão se torna uma área não agricultável, além do fato de ventos
fortes poderem impedir a sobreposição de molhamento, reduzindo a
uniformidade da aplicação.
Disponível no mercado, o carretel irrigador com barra de irrigação
(Figura 6) possui a vantagem de maior uniformidade e eficiência, além de
trabalhar com menor pressão (20 a 35 mca). Entretanto, devido ao seu
porte, é de difícil transporte e suas barras podem se chocar com o solo ao
passarem por curvas de nível, podendo danificar os aspersores ou mesmo
a estrutura física da barra irrigadora. Existem modelos com 18, 30, 42 e 54
metros de largura, acoplados ao carro irrigador de quatro rodas.

Figura 6 – Barra irrigadora acoplada a carretel. Fonte: IrrigaBrasil (2021).


Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 49

Outro sistema de irrigação com grande aplicação em canaviais são


os pivôs centrais que operam de forma circular, podendo irrigar até 200
hectares por vez, dependendo da estrutura adquirida e do relevo da região.
Devido ao trajeto circular, podem trabalhar de forma intermitente,
conseguindo escoar boa parte dos efluentes gerados na indústria. A maioria
dos pivôs centrais instalados em cana-de-açúcar operam, em média, com
tamanhos de 100 ha irrigados. A empresa brasileira Irriga Engenharia
(2021) instalou o maior pivô central do mundo (Figura 7) no município de
Pedro Afonso, no Estado de Tocantins. Com um raio irrigado de 1.300
metros e 26 torres, o equipamento irriga 530 hectares com vazão de 506
m³/h e tempo de 44 horas para completar o ciclo de rega.

Figura 7 – Pivô central em Pedro Afonso – TO. Fonte: Irriga Engenharia


(2021).
Segundo Fuzaro (2017), um alto investimento na aquisição de pivô
central para a cultura da cana-de-açúcar com 100 ha irrigados é
economicamente viável, pois, com a utilização do pivô, faz-se 6 cortes na
área, ou seja, 6 anos de cultivo antes da reforma, com retorno financeiro
(payback) em 2 anos e lucro líquido a partir do terceiro ano de colheita.
Outro ponto importante relatado por Fuzaro (2017) é o tempo de vida útil
do pivô central, que varia de 10 a 20 anos, além de ser um sistema de
irrigação importante para a cultura da cana em regiões com baixas
precipitações.
50 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Nota-se na Figura 8 um pivô central da empresa Valley em operação,


onde se percebe a excelente uniformidade de aplicação de irrigação ao
longo do pivô.

Figura 8 – Pivô central série 7000 da Valley em operação. Fonte: Valley


Irrigation (2021a).
Deve-se utilizar reguladores de pressão em cada aspersor, com a
finalidade de se manter a pressão constante ao longo da tubulação. Os
aspersores devem aplicar a lâmina adequada em cada trecho do sistema.
Os aspersores próximos à base fixa devem jogar um pequeno volume de
água, por moverem-se lentamente. Já os aspersores que estão longe do
ponto fixo – por exemplo, a 1 km de distância – necessitam jogar um
grande volume de água, por se moverem em maior velocidade para
completar uma volta completa de 360º, cumprindo um trajeto muito maior
do que os aspersores próximos a base.
Os pivôs rebocáveis podem ser levados de um local para outro
(Figura 9) e irrigarem de 2 a 120 ha por vez. Os pivôs fixos acabam
promovendo a rega em maiores áreas, porém, por não serem móveis,
podem impossibilitar a irrigação de áreas que possam estar passando por
déficits hídricos. Os pivôs rebocáveis acabam reduzindo o custo fixo e de
mão-de-obra por hectare, mas existe a necessidade de adequação da
adutora para os inúmeros pontos de acoplagem do equipamento.
Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 51

Figura 9 – Pivô rebocável acoplado ao trator para deslocamento entre


áreas. Fonte: Valley Irrigation (2021b).
Considerações finais
A irrigação – ou mesmo a fertirrigação – é fundamental para o
suprimento hídrico da cana-de-açúcar durante períodos de estresse hídrico.
A aplicação da vinhaça como fonte de nutrientes é importante, pois
reduz os custos com a aquisição de adubos e fertilizantes.
Para as indústrias sucroalcooleiras é fundamental o transporte e a
aplicação da vinhaça em áreas agrícolas, pois o volume gerado é elevado,
sendo inviável economicamente a sua estocagem.
As características físicas e químicas do solo e características
químicas da vinhaça irão determinar o volume máximo em m³ a ser
aplicado.
Deve-se realizar um estudo de viabilidade para a instalação dos
diferentes tipos de transporte da vinhaça e sua aplicação pelos diferentes
sistemas de irrigação existentes.
52 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Conclusão
A aplicação de irrigação/fertirrigação na cultura da cana-de-açúcar é
uma atividade fundamental para suprir suas necessidades hídricas e
nutricionais. Além disso, a estocagem do principal efluente das usinas, a
vinhaça, é inviável sob o ponto de vista econômico, sendo a sua aplicação
em áreas agrícolas a melhor solução, com a vantagem de incremento de
produtividade e ciclagem de nutrientes.
Referências
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imagens de satélites de sensoriamento remoto da cana-de-açúcar no
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2019.
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e reuso de água na agroindústria sucroenergética. Brasília: ANA, 2009.
294 p.
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de-açúcar irrigada e fertirrigada no Brasil. 2. ed. Brasília: ANA, 2019.
31 p.
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agrícola. Norma Técnica P4.231. 3. ed. São Paulo: Companhia Ambiental
do Estado de São Paulo, 2015. 15 p.
FUZARO, A.M. Viabilidade financeira do pivô central no cultivo de
cana-de-açúcar no sudoeste goiano. 2017. 45 p. Tese (Pós graduação em
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IRRIGABRASIL. Barra Irrigadora. 2021. Disponível em:
https://www.irrigabrasil. com/produto/barra-irrigadora/#. Acesso em: 30
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Métodos de irrigação/fertirrigação na cultura da cana de açúcar | 53

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http://www.irrigaengenharia.com.br/projeto/adutora-enterrada-rpvcprfv/
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NONINO. Conheça o caminhão aplicador de vinhaça. Nonino indústria
e comercio de implementos agrícolas. Bebedouro - SP, 2021. Disponível
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Safra e moagem. 2019. Disponível em: https://www.novacana.com/n/
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Disponível em: https://www.valleyirrigation.com.br/piv%C3%B4s-
reboc%C3%A1veis. Acesso em: 24 ago 2021.
RESPOSTAS MORFOANATÔMICAS E FISIOLÓGICAS
DA CANA-DE-AÇÚCAR SOB DIFERENTES CONDIÇÕES
HÍDRICAS

Natália Oliveira Totti de Lara4

Introdução
Os estudos que envolvem Anatomia e Morfologia Vegetal merecem
destaque na área agronômica, já que se trata de uma ciência que estuda a
organização e a estrutura do corpo vegetal, sendo a planta, portanto, a
matéria-prima da Agronomia. Entender como as plantas são organizadas e
como é a resposta dessas plantas frente ao ambiente em que se encontram
é primordial para trabalhar em áreas como Fitotecnia, Produção Vegetal,
Produção de Mudas, Nutrição Mineral de Plantas e tantas outras. O
trabalho de Silva et al. (2005) mostra algumas interrelações da Anatomia
com algumas dessas áreas importantes na Agronomia.
Quando pensamos em entender o corpo das plantas é necessário
também incluir nessa temática os estudos em Fisiologia Vegetal, já que a
estrutura interna das plantas tem total ligação com a sua fisiologia; isto é,
suas células e tecidos fazem parte de uma arquitetura muito rica e
intimamente ligada com seus processos fisiológicos, como fotossíntese,
transpiração, transporte e translocação de solutos nas plantas.
Dessa forma, este capítulo de revisão bibliográfica visa trazer
informações relevantes e atuais sob o ponto de vista morfológico,
anatômico e fisiológico em uma monocultura, a cana-de-açúcar, em uma
situação particular: a condição hídrica. O papel da água na planta é de vital
importância e, por isso, justificam-se os trabalhos que tratam dessa
temática para a cana-de-açúcar. A água na célula contribui para a
turgescência celular, ou pressão de turgescência, que ocorre em resposta

4
Bióloga, Dra., Docente das Faculdades Galileu, Gran Tietê e Faculdade de Tecnologia
de Curitiba, natotti@gmail.com
56 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

ao aumento de volume da célula devido à resistência imposta pela parede


celular a esse volume (KRAMER; BOYER, 1995). Por outro lado, a
diminuição da turgescência causa uma diferença de potencial hídrico, que
leva ao movimento da água em direção às células e tecidos mais secos. A
regulação dessa turgescência é a chave para a resposta da planta às
mudanças ambientais (PRITCHARD, 2001).
Nos primeiros dois tópicos deste capítulo são contempladas
informações que, embora elementares do ponto de vista técnico, são de
suma importância para que o leitor tenha uma ampla visão da cana-de-
açúcar. Após uma explanação mais geral da planta, serão contempladas as
informações referentes às respostas do corpo da planta a diferentes
condições hídricas e, então, as considerações finais.
Características botânicas
A cana-de-açúcar (Saccharum officinarum L.) é uma espécie
pertencente a família Poaceae, ordem Poales (APG et al., 2016), assim
como a aveia (Avena sativa L.), o centeio (Secale cereale L.), o sorgo
(Sorghum bicolor (L.) Moench), o milho (Zea mays L.), o arroz (Oryza
sativa L.), a cevada (Hordeum vulgare L.), entre outras gramíneas.
A ordem Poales pertence ao clado das Comelinídeas, juntamente
com outras três ordens (Arecales, Comelinales e Zingiberales) e é
considerado o clado com as mais derivadas das onze ordens de
monocotiledôneas (APG et al., 2016). Poales apresenta plantas
majoritariamente herbáceas, folhas gramináceas e flores geralmente
anemófilas, pequenas e sem nectários (APG et al., 2016).
Em Poaceae encontram-se ervas geralmente rizomatosas, perenes ou
anuais, com folhas alternas e presença de lígula entre a bainha e o limbo;
inflorescência do tipo espigueta e fruto do tipo cariopse (SOUZA;
LORENZI, 2012). Do ponto de vista econômico, Poaceae é uma das
principais famílias botânicas em angiospermas, pois observa-se que, das
plantas citadas acima, todas fazem parte da alimentação de diversas
populações mundo afora.
Respostas morfoanatômicas e fisiológicas da cana de açúcar sob diferentes... | 57

A cana-de-açúcar, por ser uma planta de alto interesse econômico,


vem passando por modificações com relação ao melhoramento vegetal,
resultando em um híbrido multiespecífico que pode receber a designação
somente de Saccharum spp. (ASSIS, 2014).
Aspectos gerais sobre morfologia, anatomia e fisiologia da cana-de-
açúcar
Alguns trabalhos mais antigos já descreveram a morfologia externa
da cana-de-açúcar (VAN DILLEWIJN, 1952; BACCHI, 1983). As plantas
de cana-de-açúcar são formadas por raízes e rizomas na parte subterrânea,
por colmo e folhas na parte aérea vegetativa e inflorescências em fase
reprodutiva.
A descrição morfológica mais referenciada para a cana-de-açúcar é
a de Bacchi (1983). Aqui optou-se por uma breve descrição
morfoanatômica apenas das partes vegetativas, pois são as partes da planta
que mais são estudadas nos trabalhos que objetivam apresentar os efeitos
do manejo hídrico para a cana-de-açúcar.
Raiz: a cana-de-açúcar tem raízes fasciculadas, típicas das
gramíneas. Essas raízes são finas por natureza, ramificadas e pouco
profundas e permanecem ativas por um período específico. A principal
função dessas raízes é fornecer água e nutrientes para o caule primário. Em
trabalho realizado por Faroni (2004), foi verificado que o sistema
radicular, após o corte da cana planta, mantém-se ainda em atividade,
dependendo da variedade de Saccharum, e depois é substituído pelas raízes
dos novos perfilhos da soqueira. “As raízes da soqueira são mais
superficiais do que as da cana planta pelo fato dos perfilhos das soqueiras
brotarem mais próximo da superfície do que os da cana planta” (FARONI
2004, p. 21).
A estrutura anatômica das raízes das variedades é similar,
apresentando três regiões distintas: a epiderme, o córtex e o cilindro
vascular (QUEIROZ-VOLTAN et al., 1998; DA CRUZ MACIEL et al.,
2015). A epiderme possui uma única camada de células (que podem variar
no formato) e a presença de tricomas em algumas variedades (DA CRUZ
MACIEL et al., 2015). O córtex é formado por células parenquimáticas e
58 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

apresenta uma exoderme estratificada que pode ser suberizada em algumas


variedades (QUEIROZ-VOLTAN et al., 1998; DA CRUZ MACIEL et al.,
2015). O cilindro vascular é limitado internamente por uma medula bem
desenvolvida em raízes jovens e, externamente, pela endoderme
(QUEIROZ-VOLTAN et al., 1998). A endoderme é unisseriada e formada
por células isodiamétricas com espessamento nas paredes anticlinais e
espessamento em U nas paredes periclinais (DA CRUZ MACIEL et al.,
2015). Os trabalhos de Queiroz-Voltan et al. (1998) e da Cruz Maciel et
al. (2015) descrevem com detalhes a estrutura anatômica radicular de
plantas de cana-de-açúcar.
Caule: o caule em cana-de-açúcar é denominado colmo (material de
maior interesse econômico na planta). Colmo é um termo botânico
designado para uma estrutura caulinar que seja dividida em nós e entrenós
(internódios) (Figura 1a) (SOUZA; LORENZI, 2012). No colmo, há a
presença de gemas (Figura 1b), que posteriormente ao seu
desenvolvimento darão origem a brotos ou colmos primários, dos quais
originarão os perfilhos. Esses colmos, ao serem plantados, darão origem
também a novas raízes de cada perfilho, na região da zona radicular
(Figura 1b). As gemas são protegidas pela bainha das folhas, que é
firmemente presa ao internódio quando a planta é jovem.

Figura 1. Morfologia do colmo da cana-de-açúcar. A. Colmo da planta. B.


Detalhe para uma gema presente disposta alternadamente no colmo. G = gema;
Zr = zona radicular. Fotos: autoria própria.
Respostas morfoanatômicas e fisiológicas da cana de açúcar sob diferentes... | 59

Com relação à anatomia dos colmos, há uma descrição realizada por


Metcalfe (1960) em seu livro “Anatomy of Monocotyledons” para algumas
espécies de Saccharum. Para S. officinarum, o autor descreve o colmo com
centro sólido de parênquima de reserva, epiderme composta por células
pequenas e com paredes espessas. O caule é composto por tecido
parenquimático de reserva permeado por numerosos feixes vasculares
(METCALFE, 1960; JACOBSEN et al., 1992; SANTOS et al., 2015). As
células parenquimáticas aumentam gradualmente de diâmetro em direção
ao centro do colmo (METCALFE, 1960). Possui feixes vasculares
numerosos, espalhados por todo o tecido parenquimático, circundados por
esclerênquima associado com fibras (METCALFE, 1960). Os feixes
vasculares são circundados por uma bainha de duas ou mais camadas de
células de esclerênquima lignificadas com paredes espessas (JACOBSEN
et al., 1992).
Folhas: as folhas da cana-de-açúcar são alternas e firmemente presas
aos nós dos colmos pela parte inferior da folha, denominada bainha foliar
(Figura 2a). A parte superior é denominada lâmina ou limbo foliar. A
lâmina é relativamente plana e alongada, com comprimento que varia de
0,5 a 1,5 m e largura entre 2,5 e 10 cm, quando totalmente expandida
(MARAFON, 2012). Nas folhas é possível observar as nervuras foliares e
entre a lâmina e a bainha encontra-se a lígula (Figura 2b), estrutura laminar
em forma de colher que normalmente ocorre como um prolongamento
adaxial da bainha, típica de gramíneas (SOUZA; LORENZI, 2012).

Figura 2. Morfologia da folha da cana-de-açúcar. A. Filotaxia alterna. Seta


aponta para a bainha, porção foliar que envolve o colmo. B. Detalhe de uma folha.
Seta aponta para nervuras foliares e o asterisco indica a posição da lígula. Fotos:
autoria própria.
60 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

A estrutura anatômica da folha foi descrita no livro de Metcalfe


(1960) para S. officinarum. O autor descreve o limbo em secção transversal
com feixes vasculares, em sua maioria, pequenos e discretamente
angulados em seu contorno, cada um com uma única bainha ao redor.
Também relata a presença de esclerênquima em alguns desses feixes
vasculares, opostos às células buliformes, mais na periferia, e mesófilo
com presença de colênquima radiado imediatamente ao redor de cada feixe
vascular.
O trabalho de Ferreira et al. (2007) traz diversas informações a
respeito da anatomia foliar, contemplando estudos pioneiros, como os de
Artschawager (1925) e Van Dillewijn (1952). Ferreira descreve a
epiderme de folhas de cana-de-açúcar apresentando células buliformes,
que são células epidérmicas volumosas ocorrendo em fileiras longitudinais
nas folhas das gramíneas (APEZZATO-DA-GLORIA; CARMELLO-
GUERREIRO, 2012), estômatos do tipo paracítico, conteúdo de sílica e
tricomas.
Outra característica importante na epiderme foliar é a presença de
cutícula. A cutícula é uma camada de material de natureza graxa que cobre
as paredes periclinais externas das células epidérmicas, sendo pouco
permeável à água (FERREIRA et al., 2005; APEZZATO-DA-GLORIA;
CARMELLO-GUERREIRO, 2012). É sobre a cutícula propriamente dita
que se encontra um revestimento também de natureza graxa, a cera
epicuticular. Características como espessura de cutícula e presença de
ceras epicuticulares influenciam na resposta à seca (ZHANG et al., 2015).
No mesófilo foliar da cana-de-açúcar, uma característica marcante é
a anatomia Kranz (JOARDER et al., 2010), em que células do mesófilo se
dispõem de maneira radiada em torno da bainha do feixe vascular,
constituindo uma coroa. Daí o nome de “anatomia Kranz” (kranz = coroa
em alemão) (MENEZES et al., 2012).
Respostas morfoanatômicas e fisiológicas da cana de açúcar sob diferentes... | 61

A cana-de-açúcar é uma planta C4, o que significa afirmar que, na


fotossíntese, são produzidos compostos orgânicos estáveis de quatro
carbonos. Em plantas C4, as células do mesofilo estão, no máximo, a duas
ou três células da bainha mais próxima.
Segundo Marafon (2012),
A cana apresenta alta taxa fotossintética e eficiência na
utilização e resgate de CO2 (gás carbônico) e é adaptada
à alta intensidade luminosa, altas temperaturas e
relativa escassez de água, já que a cultura necessita de
grandes quantidades de água para suprir suas
necessidades hídricas (MARAFON, 2012, p. 10).

O fato de a cana-de-açúcar ser uma planta C4 influencia diretamente


em sua eficiência fotossintética no sítio de carboxilação da enzima
RUBISCO (ribulose-1,5-bisfosfato carboxilase/oxigenase). Há duas
consequências fisiológicas importantes para a cana-de-açúcar devido à
bioquímica da via C4: primeiro, o CO2 pode ser concentrado nas células
da bainha do feixe, com reduzidas perdas por difusão, o que aumenta a
eficiência de uso do CO2 pela planta; segundo, a maioria das células do
mesófilo situa-se muito próxima ou adjacente às células da bainha do feixe,
o que garante uma cooperação dinâmica entre essas células, também
auxiliando no aumento da eficiência fotossintética (MAJEROWICZ,
2008; SAGE et al., 2014).
Adaptações morfoanatômicas e fisiológicas da cana-de-açúcar sob
diferentes condições hídricas
Os trabalhos que tratam das respostas morfoanatômicas e
fisiológicas da cana-de-açúcar mediante diferentes condições hídricas são,
em sua maioria, experimentais, testando tratamentos hídricos que induzem
a condição de seca ou alagamento (Tabela 1).
62 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa
Respostas morfoanatômicas e fisiológicas da cana de açúcar sob diferentes... | 63
64 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Observa-se nesses trabalhos que todos os órgãos vegetativos da


cana-de-açúcar podem ser passíveis de modificações em decorrência do
conteúdo de água e são objetos de interesse para estudos morfoanatômicos
e fisiológicos. Porém, nota-se que a parte da planta mais utilizada é a folha.
Respostas funcionais dependentes de fatores ambientais, como é o caso do
regime hídrico, são, em sua maioria, mais evidentes nas folhas (CABRAL
et al., 2018). A folha é um órgão vegetal considerado como uma unidade
de alto nível de adequação às diferentes condições ambientais às quais as
plantas estão submetidas. Essa adequação pode ser referida como
plasticidade morfoanatômica ou plasticidade fenotípica (GRATANI et al.,
2006; CABRAL et al., 2018).
As plantas de cana-de-açúcar sob estresse hídrico apresentam folhas
murchas, amareladas e número reduzido de folhas verdes (SANTOS et al.,
2015; ZHANG et al., 2015; 2020). As folhas verdes são indispensáveis
para manter a fotossíntese normal e as atividades de vida sob estresse
hídrico (ZHANG et al., 2015).
A restrição hídrica afeta progressiva e negativamente os parâmetros
morfológicos da cana-de-açúcar, afetando, dessa forma, o crescimento da
planta (SANTOS et al., 2015; ZHANG et al., 2015; 2020). No trabalho de
Zhang et al. (2015), na seca severa o cultivar resistente mostrou
enrolamento das folhas e o susceptível apresentou a ponta da folha seca.
Sob seca moderada, houve enrolamento da folha e menos de um terço da
folha permaneceu verde sob seca severa. O enrolamento das folhas é uma
resposta benéfica, pois reduz a perda de água, deixando de expor toda a
lâmina foliar ao ambiente, reduzindo a transpiração. A redução do número
de folhas e da senescência foliar em cana-de-açúcar durante o déficit
hídrico pode indicar uma estratégia para diminuir a superfície de
transpiração, mitigando o gasto energético e garantindo o metabolismo
tecidual basal (SANTOS et al., 2015).
O encurtamento do entrenó também foi observado nos cultivares em
condição de seca (SANTOS et al., 2015), embora as plantas tenham sido
afetadas de maneiras diferentes. A média de impacto negativo no
crescimento das plantas de cana-de-açúcar foi estimado pelos autores em
mais de 35% (SANTOS et al., 2015).
Respostas morfoanatômicas e fisiológicas da cana de açúcar sob diferentes... | 65

Os parâmetros anatômicos que apresentam maior alteração em


condições de estresse hídrico em folhas foram: redução da área foliar,
redução do diâmetro dos vasos do metaxilema, aumento da espessura da
parede em células esclerenquimáticas, aumento da espessura da epiderme
e aumento da espessura da cutícula (ZHANG et al., 2015; TARATIMA et
al., 2019; 2020).
A redução da área foliar ocorre quando o conteúdo de água nas
células vegetais é reduzido, pois as células e as paredes celulares são
enfraquecidas pela diminuição do volume celular e da pressão de turgor
(TARATIMA et al., 2019). Se a deficiência de água ocorre continuamente,
as células tornam-se mais compactadas, com concentrações mais altas de
soluto. Este fenômeno desencadeia a sensibilidade do crescimento da
planta sob estresse hídrico.
As respostas anatômicas frente ao estresse hídrico em cana-de-
açúcar variam conforme o cultivar e a intensidade dessas respostas
depende do genótipo (SMIT; SINGELS, 2006; MACHADO et al., 2009).
O trabalho de Santos et al. (2015) mostrou que a deficiência hídrica teve
impacto na produção de biomassa das duas variedades, mas
principalmente na mais resistente à seca, o que os autores explicaram ser
possivelmente devido à severidade do estresse ou maior suscetibilidade
desse genótipo durante a fase de alongamento do caule. O teor de lignina,
principal parâmetro testado pelos autores, mostrou-se alterado quando
comparado com os internódios maduros e jovens das plantas submetidas a
deficiência hídrica severa. Os internódios jovens de plantas sob deficiência
hídrica tiveram maior expressão gênica para lignina, mostrando uma
deposição precoce desse polímero nas paredes celulares, ao contrário de
plantas controle, que tendem a apresentar níveis mais elevados de
expressão gênica da biossíntese de lignina em internódios maduros
(SANTOS et al., 2015).
As respostas morfoanatômicas para a condição de alagamento
podem ser vistas no trabalho de Jain et al. (2019). Os autores observaram
que as plantas submetidas a saturação hídrica mostraram maior número de
raízes novas, o que pode ser explicado pelo fato de a planta necessitar de
66 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

mais raízes para explorar regiões que possam estar com maior quantidade
de oxigênio. Presença de aerênquima, células epidérmicas irregulares e
danificadas, distorção celular e perda de uniformidade nas regiões da
endoderme e periciclo foram modificações anatômicas observadas. Sabe-
se que a formação do aerênquima é essencial para a sobrevivência e
funcionamento das plantas submetidas ao alagamento devido às condições
anóxicas da raiz (JAIN et al., 2019). O aerênquima contribui com o
suprimento de oxigênio da parte aérea às raízes e para a ventilação dos
gases. Dos trabalhos que observam o efeito do manejo hídrico para cana-
de-açúcar (Tabela 1), o trabalho de Jain et. (2019) foi o único que estudou
o efeito do alagamento para essas plantas.
Com relação às respostas fisiológicas, sabe-se que a deficiência
hídrica pode afetar diretamente parâmetros como condutância estomática,
uso eficiente de água pela planta, conteúdo de clorofila e taxas de
transpiração. A concentração de solutos na célula leva a uma diminuição
do potencial hídrico e a continuidade da deficiência pode ocasionar o
fechamento estomático. O menor potencial hídrico foliar, além de levar à
redução interna de CO2, também reduz a eficiência da carboxilação
instantânea, indicando que o aparato de fotossíntese também é afetado
(ENDRES et al., 2010).
A transpiração é regulada principalmente pela abertura estomática e,
de acordo com Endres et al. (2010), é o processo fisiológico mais sensível
ao estresse hídrico na maioria das plantas. Embora os estômatos fechem
em resposta à seca antes de qualquer alteração no potencial hídrico ou no
teor de água das folhas, há também o fechamento estomático quando o
déficit de pressão de vapor entre a folha e o ar aumenta (SOCIAS et al.,
1997; ENDRES et al., 2010). Há que se considerar também a atividade do
ácido abscísico, uma vez que este hormônio está relacionado ao
fechamento estomático (SOCIAS et al., 1997).
O trabalho de Zhang et al. (2015) estudou o efeito do conteúdo de
clorofila para parâmetros fisiológicos e seus dados indicaram que os
conteúdos de clorofila a e clorofila a/b diminuíram sob estresse hídrico
leve. Sob condições de seca moderada e severa, a clorofila a, a clorofila b
Respostas morfoanatômicas e fisiológicas da cana de açúcar sob diferentes... | 67

e clorofila a/b foram todas significativamente reduzidas para ambos os


cultivares de cana-de-açúcar estudadas. Considera-se que maior conteúdo
de clorofila é benéfico para melhorar a fotossíntese e aumentar o número
de grana nos cloroplastos (ZHANG et al., 2015). Com conteúdo diminuído
de clorofila, há menor empilhamento de granum nos cloroplastos, levando
a mudanças na ultraestrutura da organela (ZHANG et al., 2015) e, em
última instância, na eficiência fotossintética.
Outra resposta fisiológica geralmente estudada é o conteúdo de
prolina. Prolina é um aminoácido osmorregulador que pode ter sua
concentração aumentada em plantas sob deficiência hídrica. Quando as
plantas são submetidas à restrição hídrica, um aumento na concentração
de solutos compatíveis evita a perda de água, diminuindo o potencial
osmótico e, portanto, mantendo o potencial hídrico em níveis ótimos
(GUIMARÃES et al., 2008). O trabalho de Zhang et al. (2020) mostrou
que, em seca moderada e em seca severa, os níveis de prolina aumentaram
na folha em comparação com o tratamento controle, porém sem diferença
estatisticamente significativa entre os tratamentos. Já no trabalho de
Santos et al. (2015), os níveis de prolina para o caule não diferiram entre
os tratamentos sob deficiência hídrica e controle. Os autores argumentam
que, no caso da cana-de-açúcar, os teores desse aminoácido podem variar
de acordo com a severidade e/ou tempo de exposição ao estresse, bem
como a fase de desenvolvimento da planta.
O acúmulo de solutos orgânicos como açúcares solúveis e prolina
nas plantas é instigado pelo déficit hídrico para manter o equilíbrio
osmótico (ZHANG et al., 2020). Além de seu papel no ajuste osmótico,
solutos compatíveis também melhoram o sistema de defesa das plantas
contra danos oxidativos induzidos por espécies reativas de oxigênio
(ASHRAF; FOOLAD, 2013), o que, consequentemente, melhora a
capacidade das plantas de resistir ao ambiente estressado.
Considerações finais
Ao longo deste capítulo foi possível observar que alguns trabalhos
foram e outros estão sendo realizados na temática das respostas
morfológicas, anatômicas e fisiológicas mediante diferentes condições
68 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

hídricas. Observou-se que os trabalhos que objetivam conhecer essas


respostas realizam experimentos, seja em campo ou em laboratório – casas
de vegetação – para melhor aplicar diferentes técnicas.
Embora a área de Anatomia e Morfologia seja uma ciência básica,
nota-se que o interesse por entender como o corpo vegetal responde aos
experimentos de manejo hídrico vem aumentando ao longo do tempo, visto
que existem trabalhos tanto antigos quanto bem recentes disponíveis na
literatura.
Assim, observou-se que:
• para se trabalhar com manejo hídrico em plantas de cana-de-
açúcar é necessário realizar experimentos práticos;
• a maioria dos experimentos encontrados na literatura são para
investigar a condição de deficiência hídrica comparada ao
tratamento controle e não a condição de saturação hídrica;
• o órgão da planta mais utilizado para esse fim é a folha.
Observou-se que as respostas morfológicas mediadas pela falta de
água foram redução da altura da planta, encurtamento do entrenó,
murchamento e amarelecimento foliar. As respostas anatômicas mediadas
por deficiência hídrica foram redução da área foliar, redução do diâmetro
dos vasos, aumento da espessura da parede em células esclerenquimáticas
e aumento da espessura da epiderme e da cutícula. Já as respostas
fisiológicas ressaltam diminuição do conteúdo de clorofila, acúmulo de
prolina e altas taxas de transpiração em condições de seca.
Todos esses parâmetros merecem atenção em trabalhos futuros que
envolvam conhecer as respostas da cana-de-açúcar frente à deficiência
hídrica. São poucos os estudos que visam estudar as três áreas –
morfologia, anatomia e fisiologia – no mesmo trabalho, o que seria o
cenário ideal para entender as adaptações por completo. A área de manejo
hídrico em plantas de cana-de-açúcar sob o aspecto do corpo da planta
(morfológica, anatômica e fisiologicamente) é muito rica e ainda possui
muitas perguntas a serem respondidas, levando o pesquisador interessado
nesta área a caminhos futuros muito promissores.
Respostas morfoanatômicas e fisiológicas da cana de açúcar sob diferentes... | 69

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ROTAÇÃO DE CULTURA COM PLANTIO DE SOJA EM
REFORMA DE CANAVIAL

Antonio Bestana Neto5

1. Introdução
A cultura da cana-de-açúcar tem uma grande importância para a
economia brasileira, pois trata-se da matéria-prima estratégica na produção
do açúcar e álcool, além de que seus subprodutos como bagaço, torta de
filtro, vinhaça, palha, os quais são utilizados como adubos, fertirrigação e
combustíveis, gerando também eletricidade. O volume da produção de
cana-de-açúcar no ciclo 2020/21 totalizou 654,8 milhões de toneladas,
1,8% superior ao da safra 2019/20(Conab-Maio 2021). O crescimento não
acompanhou o aumento na área colhida devido às condições climáticas
adversas em algumas regiões produtoras. A área colhida ficou em 8,62
milhões de hectares, aumento de 2,1% se comparada a 2019/20. A região
Sudeste, principal região produtora do país, manteve seu alto padrão de
produção, alcançando 428,6 milhões de toneladas colhidas, indicando
acréscimo de 3,3% em comparação a 2019/20. Os Estados de São Paulo e
Minas Gerais são os grandes destaques da região Sudeste, o Estado de São
Paulo é o maior produtor brasileiro do setor sucroalcooleiro com produção
de 354 milhões de toneladas na safra 2020/2021.
A reforma dos canaviais é importante para manter elevada a média
de produtividade agrícola de uma usina (SOARES et al., 2011). Sistemas
que adotam a diversificação de culturas promovem vários benefícios, já
que os resíduos vegetais das culturas, ao se decomporem, alteram os
atributos do solo e, como consequência pode influenciar o desempenho da
cultura em sucessão (MARCELO et al., 2009).

5
Engenheiro Agrônomo, Engenheiro de Segurança do Trabalho, Esp., Docente das
Faculdades Gran Tietê e Faculdade de Tecnologia de Curitiba, nbestana@gmail.com
76 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Desde o final da década de 80, a rotação de culturas tem sido uma


opção sustentável, sobretudo com adubos verdes e culturas de leguminosas
(SOARES, 2014). Dentre os benefícios do emprego da rotação de culturas,
pode-se destacar; aumento em produtividade, auxílio no controle de
pragas, doenças e plantas daninhas, melhoria na fertilidade e nas
características físicas do solo, eficiência no uso da água e nutrientes,
otimização do uso de máquinas na propriedade, promovendo
diversificação e redução do risco da cultura (CHRISTOFFOLETI et al.,
2007).
Atualmente com a colheita mecanizada da Cana de açúcar, em
praticamente 90% dos canaviais, os trabalhos de cultivo e preparo de solo
se intensificaram, voltados principalmente na descompactação e
fertilização. Outro fator importante é a vida útil do canavial que hoje está
próximo de 4 até 5 anos em média, além de fatores financeiros inibindo
investimentos em curto prazo. Dentre esses problemas observados, o uso
eficiente do solo, vem ganhando destaque nos trabalhos de pesquisa no
setor sucro-energético, o qual pode ser alcançado com a rotação de cultura
utilizando espécies para adubação verde ou as oleaginosas, como a Soja,
nas áreas de reforma de canavial, prática eficiente e com bons resultados
na reposição dos nutrientes do solo e na melhoria da produtividade da
cultura.
A região Centro-oeste do estado de São Paulo, municípios de Jaú,
Barra Bonita, Igaraçú do Tietê e Lençóis Paulista, a prática de rotação de
cultura está em plena expansão. Na região situam-se as Usinas com as
maiores produção de Cana-de-açúcar do estado, condições de fertilidade
de solo excelente, predominando solos do tipo LV1 e NV1 caracterizados
como Latossolo e Nitossolo Vermelho, a maioria dos
parceiros/fornecedores são produtores rurais independentes e com boa
aceitação na prática de manejo cultural como é a rotação de cultura.
Esse capítulo vem trazer informações atualizadas de pesquisas,
resultados, bem como dados recentes coletados em campo dos benefícios
e vantagem oferecida pelo método de cultivo, uma vez que requer
planejamento e novos investimentos no setor.
Rotação de cultura com plantio de soja em reforma de canavial | 77

2. Cultivo de leguminosas em reforma de canaviais


A utilização de plantas na reciclagem dos nutrientes e manutenção
da fertilidade do solo, associadas às técnicas do plantio direto e do cultivo
mínimo são opções para a obtenção de eficiência produtiva e conservação
do solo e da água (Ambrosano et al., 1999). Em função de seu potencial
de fixação de nitrogênio e recuperação da fertilidade do solo, as
leguminosas (Fabaceae) representam uma alternativa ao suprimento,
substituição ou complementação da adubação mineral e recomposição da
fertilidade do solo (Scivittaro et al., 2000).
A utilização da adubação verde com leguminosas na cana-de-açúcar
é recomendada quando se reforma o canavial. Essa prática não interfere na
brotação da cana. Seu custo é relativamente baixo e promovem aumentos
significativos nas produções de cana e de açúcar em pelo menos dois
cortes. Adicionalmente, protege o solo contra a erosão e evita
multiplicação de plantas espontâneas (Ambrosano et al.,2005). Com a
prática da adubação verde, é possível recuperar a fertilidade do solo
proporcionando aumento da capacidade de troca de cátions e da
disponibilidade de macro e micronutrientes; formação e estabilização de
agregados; melhoria da infiltração de água e aeração; diminuição diuturna
da amplitude de variação térmica; controle dos nematoides e, no caso das
leguminosas, incorporação ao solo do nutriente nitrogênio, efetuada
através da fixação biológica (Igue, 1984). O aumento da Matéria orgânica
no solo proporcionará ainda uma permeabilidade no solo, facilidade de
crescimento das raízes, resistência a stress hídricos, menor toxidez por
amônio e a exploração do solo em diferentes profundidades.
Os sistemas de rotação de cultura proporcionam ainda uma quebra
de sequência em vários aspectos importantes no ciclo da cultura, entre eles
o de pragas, principalmente as de solo, e plantas daninhas que são
persistentes e até resistentes ao cultivo de Cana-de-açúcar. Analisando
dados econômico-financeiros, a rotação de cultura em área de reforma de
canavial, de acordo com Lima Filho et al (1987), registrou um aumento de
aproximadamente 50% na renda líquida de pequenos agricultores que
plantaram as culturas de milho e amendoim, respectivamente
78 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

(RODRIGUES, 1987; ALLEONI; BEAUCLAIR, 1995). Fica evidenciado


que a adoção da prática da rotação de culturas com grãos como soja,
girassol e amendoim em áreas de reforma do canavial, é economicamente
vantajosa além de grandes ganhos ambientais (LIMA FILHO et al., 1987,
LOMBARDI et al., 1982).
3. Cultivo de Soja em áreas de reforma de Canaviais
A reforma do canavial é praticamente obrigatória após um ciclo de
produção, que atualmente varia de 4 a 5 cortes, em virtude da ampla
extração de nutrientes e da compactação do solo causado pela circulação
de máquinas e equipamento.
A produção de culturas oleaginosas, especialmente a soja, traz uma
nova oportunidade no aumento da produtividade além de benefícios para
o cultivo da cana-de-açúcar, como o controle de pragas, doenças e ervas
daninhas com a quebra dos ciclos, fixação de nitrogênio e ciclagem dos
nutrientes, bem como reduzir os custos de produção da cana-de-açúcar,
possibilitando ainda receitas que diminuem o impacto financeiro na
implantação de uma nova área. Objetivando essas receitas, a Empresa
Brasileira de Agropecuária (EMBRAPA) vem estudando comportamento
físico do solo-água, zoneamento climático e a seleção de áreas favoráveis
para reforma de canaviais, a fim de fornecer subsídios para gerenciamento
na produção das usinas e produtores rurais em cultivo de culturas anuais
na reforma de canaviais.
O plantio direto de soja na reforma de canaviais já é uma realidade
ajudando a reduzir a compactação do solo e degradação, as áreas de
reforma de cana sofrem uma intensiva preparação do solo e correção da
fertilidade, especialmente com calcário e gesso. Desse modo, é indicado
que o cultivar recomendado, tenha um bom desempenho agronômico, seja
adaptado às condições de fertilidade do solo, em geral com PH mais ácido,
tenha um bom desenvolvimento a fim de facilitar sua colheita e também
ciclos irregulares compatíveis com a janela de plantio da cana-de-açúcar
que geralmente gira em torno de 120 dias. A soja contribui para incorporar
nitrogênio no solo, o que reduziria o uso de fertilizantes principalmente o
N nas formulações, sendo uma boa opção, pois os fertilizantes químicos
Rotação de cultura com plantio de soja em reforma de canavial | 79

estão associados às altas taxas de emissão de gases (MACEDO; SEABRA,


2008). O plantio da soja nas áreas de reforma de canaviais também reduz
os processos erosivos, provocados pela exposição do solo, causados
principalmente, pelas chuvas. A rotação é efetuada após o final da colheita
de cana, nos meses de outubro e novembro, e a colheita da soja nos meses
de janeiro e fevereiro, período ideal ao início do plantio de cana-de-açúcar
que ocorre nos meses de março e abril (ciclo de 18 meses). Essa
programação é muito importante pois o produtor deve estar atento e
priorizar o plantio de cana de açúcar. Conforme já destacado, a rotação de
cultura com a cana de açúcar pode conferir uma certa longevidade do
canavial e aumento na produtividade. Alguns estudos anteriores atestam
para os ganhos, como Salome et al. (2007), o qual mostra um aumento na
produtividade da cana-de-açúcar até o terceiro corte. Segundo Luz et al
(2005), uma das vantagens no uso de leguminosas, como a soja, está na
capacidade da planta de fixar o N atmosférico através da simbiose com as
bactérias do gênero Rhyzobium presentes nas raízes, além de proporcionar
um alto teor de compostos orgânicos nitrogenados e do sistema radicular
bem profundo e ramificado, capaz de extrair nutrientes e água das camadas
mais profundas do solo. Ainda, é capaz de disponibilizar produtos
agrícolas e alimentos, como a soja, utilizada à produção de ração animal,
produtos de consumo humano e insumo para a produção de biodiesel. Em
resumo, a rotação de culturas promove melhorias importantes nos aspectos
agronômicos e reduções nos custos da cultura da cana-de-açúcar, dentre
eles a redução no uso de fertilizantes e melhor uso dos demais insumos.
Além desses ganhos agronômicos, possibilita ao agricultor um maior
volume de capital e conforto econômico financeiro. Por outro lado, o
sistema de reforma é uma atividade complexa que requer conhecimentos
técnicos, operacionais e financeiros das empresas e produtores, uma vez
que altera o planejamento produtivo em diferentes modos, além de
requerer mais investimentos em capital fixo, trabalho e tecnologia.
80 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

4. Imagens Fotográficas de campo


Fotografia 01 - Preparo solo convencional.
Fonte: Antonio Bestana Neto, 2021

Fotografia 02 - Plantio cultivo mínimo


Fonte: José Sahade Filho, 2021

v
Rotação de cultura com plantio de soja em reforma de canavial | 81

Fotografia 03 - Avaliação de plantio.


Fonte: José Sahade Filho, 2021

Fotografia 04 - Visão de área de soja com estádio vegetativo V4.


Fonte: Cristiano Donizete Cecolin, 2020
82 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Fotografia 05 e 06 - Estádio reprodutivo R2 (início florescimento).


Fonte: Antonio Bestana Neto, 2021

Fotografias 07 e 08 - Estádio reprodutivo R3(início formação vagens).


Fonte: Antonio Bestana Neto, 2021
Rotação de cultura com plantio de soja em reforma de canavial | 83

Fotografia 09 - Estágio de desenvolvimento R4/R5(Início


amadurecimento).
Fonte: José Sahade Filho, 2021

Fotografia 10 - Área pronta para colheita


Fonte: Cristiano Donizete Cecolin, 2020
84 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Fotografia 11 - Carregamento de grãos.


Fonte: José Sahade Filho, 2020

Fotografia 12 - Análise sementes.


Fonte: José Sahade Filho, 2020
Rotação de cultura com plantio de soja em reforma de canavial | 85

Fotografia 13 - Infraestrutura regional.


Fonte: José Sahade Filho, 2021

Fotografia 14 - Infraestrutura de armazenamento.


Fonte: José Sahade Filho, 2020
86 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Fotografia 15 - Investimento em tecnologias.


Fonte: José Sahade Filho, 2020

5. Conclusões finais
A rotação de culturas na reforma de cana de açúcar tem vários
benefícios econômicos e agronômicos para a indústria da cana, uma vez
que melhora os aspectos físicos do solo através de ciclagem de nutrientes,
ao passo que aumenta a fonte de renda do produtor no período de culturas
de pousio. Dentre as Vantagens podemos destacar o ganho nas condições
físicas e biológicas no solo, promovendo o aumento no ciclo da cultura
com aumento de safras, controle de pragas e plantas daninhas através de
utilização de práticas de cultivo diferenciadas bem como a ocupação da
área com cultura alternativa. Ganho em economia de fertilizantes e preparo
do solo para a implantação do canavial e finalmente o retorno financeiro
com a produção de grãos.
Entendo que alguns ajustes ainda tem que ser efetuados para
implantação do sistema em áreas de pequenos e médios produtores, através
da sistematização das áreas adequando época de colheita e variedades de
Cana-de-açúcar, proporcionando viabilidade nas práticas de preparo
Rotação de cultura com plantio de soja em reforma de canavial | 87

necessárias no plantio da soja em rotação de cultura. Os entraves para a


cultura da soja se consolidar em áreas de agricultores canavieiros são os
investimentos em equipamentos de plantio e colheita e uma logística
favorável para transporte, armazenamento e comercialização.
A seguir alguns depoimentos de produtores rurais da região que
fazem a rotação de cultura em canaviais com a Soja:
“Tenho efetuado o plantio de soja em reforma de canavial desde
2019 e os resultados estão sendo satisfatórios, conseguindo uma
produtividade de 50 sacos por hectare, além dos ganhos em preparo
do solo para plantio da Cana-de-açúcar. O trabalho de colheita é
terceirizado e os custos giram em torno de 19 sacos de soja”
Wagner Boso, Produtor Rural e Engenheiro Agrônomo da Casa da
Agricultura de Lençóis Paulista-SP;

“Estamos plantando Soja desde 2019 em propriedade localizada no


município de Jaú-SP e em Igaraçú da Tietê-SP e estamos
entusiasmados com os resultados, não só pelo preço da Soja, mas
pelos benefícios na implantação do canavial. Fizemos um
investimento em maquinas e implementos e o plantio, colheita e
armazenamento são realizado com recursos próprios, com plantio
de 90ha, variedade de soja precoce com produção em média de
45sacos/ha e o custo em torno de 19 sacos. Previsão de plantio de
250ha para o ano de 2021. A avaliação de produção do Canavial
em que fizemos a rotação com soja, teve uma produção de
190ton/ha.” José Sahade Filho, Engenheiro Agrônomo e Produtor
Rural.

“O que mais chama atenção na rotação de cultura com a Soja é a


longevidade maior do canavial e em canaviais com 4 a 5 cortes eu
consigo até 6 a 7 cortes, outro benefício é o controle de pragas e
plantas daninhas com o plantio da soja você consegue quebrar o
ciclo. Ganho com a cana planta tem sido em torno de 10 a 15% na
produção” Produtor rural, Fazenda Bela Vista, Jaú-SP.
88 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

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GANHOS COM A SISTEMATIZAÇÃO EM ÁREAS DE
PRODUÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR

Alessandro Aparecido Felice6


Ivan Leandro Coletti7
Junior Cesar Souza e Silva8
Diego Antônio Biondo9
Alex Rodrigo Aguilera10
Alex dos Santos11
Marcio Gonçalves Campos12

1. INTRODUÇÃO
A cana-de-açúcar é uma planta da família Poaceae, pertencente ao
gênero Saccharum L., ordem Gramineae, classe Monocotyledones, tendo
recebido a designação Saccharum spp (SANTANA, 2018).
As espécies que deram origem às cultivares atuais de cana-de-açúcar
são oriundas do sudeste asiático. Acredita-se que a espécie Saccharum
officinarum tenha sido cultivada desde a pré-história na região da
Melanésia (Oceania), onde foi domesticada em torno de 6.000 A.C. e
depois disseminada pelo homem por todo o sudeste asiático. A região
tornou-se centro de diversidade, tendo como núcleo Papua Nova Guiné e
Indonésia (MACHADO, 2003).

6
Estudante de Engenharia Agronômica, Faculdade Gran Tietê,
lecoelhofelice@gmail.com
7
Estudante de Engenharia Agronômica, Faculdade Gran Tietê, ivancoletti9@gmail.com
8
Estudante de Engenharia Agronômica, Faculdade Gran Tietê,
junior_helo_bia@outlook.com
9
Estudante de Engenharia Agronômica, Faculdade Gran Tietê,
biondo.diego@hotmail.com
10
Estudante de Engenharia Agronômica, Faculdade Gran Tietê,
alexaguilera.31@hotmail.com
11
Estudante de Engenharia Agronômica, Faculdade Gran Tietê, alex-
santoss1@hotmail.com
12
Engenheiro Agrônomo, Graduando em Pedagogia. Dr, Docente das Faculdades Galileu
e Gran Tietê, marciocamposagronomo@gmail.com
92 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

A cana-de-açúcar é uma cultura semi-perene. Seu ciclo produtivo é


de, em média, seis anos, com cinco cortes; a propagação ocorre por meio
de colmos, que são tipos de caules onde os nós e entrenós são bem visíveis;
a gema axilar é a responsável por formar uma nova planta (TRONQUIN,
2013).
2. PANORAMA DA CANA-DE-AÇÚCAR NO BRASIL
Atualmente, a maior parte dos canaviais do país localiza-se no
interior do Estado de São Paulo. O etanol é o principal produto extraído
desse vegetal, destacando-se economicamente como combustível
alternativo, contribuindo de forma significativa para o desenvolvimento
sustentável (SANTANA, 2018).
Com a expansão do setor sucroenergético, houve um significativo
aumento da área cultivada com cana-de-açúcar e uma consequente
escassez de mão-de-obra. O rigor das leis ambientais que proíbem a
queima da palha tornou inviável o corte manual da cultura, o que levou o
setor a buscar novas tecnologias, principalmente na mecanização do
plantio e da colheita, por ocasião da necessidade de agilidade no processo.
Com o aumento significativo de equipamentos e máquinas com
tecnologias avançadas, foi possível um entendimento diferente a respeito
do cultivo da cana-de-açúcar. A chegada do sistema de piloto automático
fez com que os produtores e as usinas tivessem que se adequar às
mudanças cada vez mais frequentes.
Para auxiliar nessas demandas, veio o processo de sistematização da
lavoura, que consiste em um conjunto de melhorias realizadas nas áreas
que favorecem o desempenho das operações de plantio, tratos culturais e
colheita, maximizando a eficiência operacional (maior rendimento com
menor custo) e preservando a integridade do solo e a saúde do canavial.
Com isso é possível produzir mais na mesma área, reduzir os custos com
mecanização e aumentar a rentabilidade da lavoura.
Adaptando-se a todas essas mudanças, o Brasil é hoje o maior
produtor mundial de cana-de-açúcar, sendo também líder na produção e
exportação de açúcar e o segundo maior produtor e exportador de etanol,
Ganhos com a sistematização em áreas de produção de cana de açúcar | 93

que, por ser considerado um combustível limpo, possui ótima aceitação no


mercado internacional.
3. SOLO
3.1 Conservação
Entende-se por manejo de solo toda atividade aplicada ao sistema
solo-planta, com o intuito de aumentar a produtividade agrícola e evitar
possível degradação ambiental. Todavia, as práticas de manejo dependem
de níveis tecnológicos resultantes de conhecimento e de investimento. Para
manejar adequadamente uma área são necessários conhecimentos sobre a
cultura e o clima (ALFONSI, 2005).
Deste modo, a conservação do solo é de grande importância para o
cultivo da cana-de-açúcar, pois ele permanece exposto por certo período,
o que leva à necessidade da adoção de práticas conservacionistas que
evitem corredeiras de água no talhão, deslocamento de solo e fertilizantes
para os rios e assoreamentos de rios e áreas produtivas no talhão,
resultando em menor produtividade e erosões, além do risco de o
proprietário da área ser responsabilizado legalmente por danos ambientais.
A fim de evitar esses danos, a aplicação de técnicas de terraceamento e o
levantamento de curvas de nível e posição nos sulcos de plantio devem ser
planejadas com antecedência, para serem implantadas antes do preparo de
solo.
3.2 Preparo de solo convencional
É importante utilizar corretamente as técnicas de preparo do terreno
para se evitar sua progressiva degradação física, química e biológica. O
preparo do solo tem por objetivo básico otimizar as condições de
brotamento, emergência e estabelecimento das plantas. O sistema deve,
ainda, aumentar a infiltração de água, reduzindo a enxurrada e, por
consequência, a erosão (ROSSETTO; SANTIAGO, 2005).
O plantio de cana-de-açúcar segue as mesmas orientações
agronômicas de décadas atrás, as quais se baseavam no rompimento da
camada mais profunda do solo, em torno de 50 cm abaixo da superfície,
94 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

com arados ou subsoladores e, em seguida, uma sequência de gradagens,


com a finalidade de incorporar toda a matéria vegetal seca e quebrar os
torrões oriundos da operação anterior. O sistema de gradagem possui a
seguinte ordem pré-estabelecida:

• Grade aradora ou “pesada”: possui a função de


incorporação mais profunda e destruição da matéria vegetal
seca;
• Grade intermediária: proporciona a “quebra” dos torrões;
• Grade niveladora: torna o solo bem homogêneo para
receber a nova cultura, promove incorporação de corretivos e
proporciona uma futura boa aplicação de herbicidas.
3.3 Preparo mínimo
A técnica de cultivo mínimo consiste em um preparo mínimo do
solo: a soqueira da cana-de-açúcar é eliminada com o uso de herbicida e,
em seguida, é feita a sulcação do solo para o novo plantio, nas entrelinhas
e linhas antigas. Para a cana-de-açúcar, que permanece no mesmo local
por vários anos sem que haja movimentação do solo (cana-planta e
soqueiras), é praticamente imprescindível que se faça a subsolagem
(ROSSETO; SANTIAGO, 2005).
4. CONTEXTUALIZAÇÃO ATUAL DA PRODUÇÃO E
SISTEMATIZAÇÃO
Devido à crise que afeta o setor sucroenergético há vários anos,
elevação nos custos de produção, incertezas comerciais e oscilações
climáticas, o setor canavieiro busca alternativas que possibilitem aumento
na produtividade, longevidade do canavial, conservação do solo e redução
de custos. A sistematização possibilita a otimização na mecanização e
conservação do solo com reflexos na produtividade, possibilitando:

• Otimização das operações de máquinas, diminuindo


manobras e aumentando sua eficiência com consequência
redução de custos;
• Aumento de linhas de plantio;
Ganhos com a sistematização em áreas de produção de cana de açúcar | 95

• Diminuição de pisoteio na lavoura;


• Conservação do solo;
• Melhoria dos aspectos físicos do solo;
• Aumento na produtividade.
O aumento da produtividade agrícola e a diminuição dos custos
produtivos passaram a ser fundamentais após a globalização da economia.
Dentre os diversos sistemas de produção, aquele que viabiliza
potencializar a relação custo-benefício torna-se o de maior interesse.
A identificação das deficiências é importante para o planejamento
das medidas técnicas, no sentido de aumentar o rendimento operacional
sem prejudicar a conservação do solo na área. Todavia, rendimento e
segurança têm importância econômica, tanto na ciência básica quanto na
ciência aplicada.
No sentido de melhorar a execução das atividades na cadeia
produtiva da cana-de-açúcar, a adoção de técnicas permite estabelecer um
equilíbrio entre o uso eficiente das operações e a identificação das
desordens no custo-benefício, em função de perdas na qualidade
operacional. Neste contexto, tecnologia de sistematização é a prática mais
sustentável da produção e preservação do solo, promovendo redução no
tempo operacional de máquinas e implementos nas atividades ligadas à
produção, além de possibilitar a retenção de água no sol e aumentar a
segurança e a ergometria do operador.
Diante da importância da permanência do setor sucroenergético para
o desenvolvimento rural regional, da influência e contribuição da cana-de
açúcar na economia estadual e federal e frente ao imperativo da gestão
ambiental, são necessários sistemas produtivos mais sustentáveis do ponto
de vista energético, socioambiental e econômico para a região centro oeste
paulista.
Neste cenário, a sistematização representa o conjunto de soluções
práticas ao segmento pertinente de ampliação na região. Além disso, a
redução do ônus ambiental por meio da conservação e preservação de
recursos hídricos no solo representa uma justificativa plausível a
96 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

problemas enfrentados na produção de cana-de-açúcar no país. Deste


modo, encontramos nos sistemas de produção mecanizados segurança,
rendimento operacional e preservação do solo.
Em um estudo que realizamos em uma área de uma fazenda no
município de São Manuel/SP, com clima característico pela estação
chuvosa no verão e tempo seco no inverno, a sistematização proporcionou
um aumento de 1,7% na área produtiva. Antes da sistematização, a área
produtiva era de 122 ha e, após, passou para 124,2 ha.

Figura 01: Layout do monitor do piloto automático


Devido à sistematização na área, o número de sulcos de maior
comprimento aumentou, resultando em um maior rendimento operacional
durante a realização das operações mecanizadas.
A sistematização evidenciou ainda um maior rendimento
operacional para os sulcos de menor tamanho, em função do aumento em
seu comprimento. Esse melhor desempenho no rendimento das operações
mecanizadas em função de uma maior velocidade no deslocamento e/ou
menor tempo nas manobras contribuiu com a redução no consumo de
combustível, resultando também em menor custo operacional.
Ganhos com a sistematização em áreas de produção de cana de açúcar | 97

A sistematização também aumentou a área útil e otimizou todas as


manobras executadas, levando ao aumento no rendimento e à redução de
custos no sistema operacional ao comprimento da linha de plantio.

Figura 02: plantio sendo realizado com tecnologia “RTK” com sulcos
otimizados
O espaçamento em função do uso de terraços passantes, além de
proporcionar segurança às operações, potencializou o layout no talhão
também. Supõe-se que isso tenha contribuído com a manutenção da palha
no solo, possibilitando obter maior relação custo-benefício no sistema de
produção nas colheitas subsequentes.
A utilização de terraços passantes (técnica de conservação do solo)
possibilita que as operações mecanizadas possam passar os terraços sem
impactar em pisoteio na planta, colaborando em uma melhor drenagem na
distribuição e infiltração das águas da chuva e em um tempo maior tempo
para infiltração.
Onde a declividade ficou acima de 9 a 12% ou mais, preferiu-se usar
terraços embutidos de 5 em 5 metros. Também é importante destacar a
eficiência dos terraços passantes trabalhando no controle da velocidade das
águas da chuva e colaborando no tempo de infiltração.
98 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

A sistematização, portanto, proporciona aumento na segurança e no


rendimento das operações mecanizadas, melhora o layout da área com
uniformidade das quadras, reduz e/ou substitui terraços, reduz manobras e
sulcos mortos, aumenta a capacidade operacional e promove ganho de área
produtiva.
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FAUNA E CONSERVAÇÃO NA PAISAGEM
AGRÍCOLA PAULISTA

Carla Gheler-Costa13
Fábio H. Comin14
Gilberto Sabino-Santos Jr15
Luciano M. Verdade16

Histórico da cultura da cana-de-açúcar no Brasil


A cana-de-açúcar foi descrita pela primeira vez por Linnaeus, em
1753, com o gênero Saccharum, como sendo uma planta da família das
gramíneas de regiões tropicais, com origem em ilhas da Polinésia ou na
Indonésia. Estima-se que a planta seja usada pelo homem há cerca de
20.000 anos (D’AGOSTINI et al., 2009). Ela chegou na Europa por meio
dos gregos e árabes a distribuíram por todo o Mediterrâneo, da Pérsia à
Península Ibérica, de onde foi levada para a ilha da Madeira. De lá ela foi
trazida ao Brasil em 1532, e chega no povoamento recém fundado de São
Vicente (SP), onde os primeiros plantios foram estabelecidos e o primeiro
engenho de açúcar local foi construído. No entanto, as condições
climáticas, hidrológicas, geológicas e geográficas da ilha de São Vicente
não foram favoráveis para o desenvolvimento da cultura na região. A
escolha das áreas para o desenvolvimento da cultura canavieira era
condicionada também pela proximidade de corpos d'água para facilitar o
transporte, mover os moinhos, prover o abastecimento de água para os
animais e todas as demais atividades do engenho. Um fato importante e
fundamental para o bom funcionamento do engenho era a presença de
vegetação florestal nas proximidades, pois muita madeira era necessária

13
Bióloga, Pedagoga, Dra., Assessora Técnica, Câmara dos Deputados, Brasília,
cgheler@gmail.com
14
Biólogo, Dr., Pesquisador Sênior – Ecologia Aplicada, fhc.eco@gmail.com
15
Virologista e Ecólogo Viral, Dr., Pesquisador Associado naTulane University School
of Public Health and Tropical Medicine, gsabino@tulane.edu
16
Engenheiro Agrônomo, Dr., Docente na Universidade de São Paulo,
lmverdade@usp.br
100 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

para as edificações e para suprir as fornalhas dos engenhos como lenha. À


época, não havia o conceito e nem a preocupação com a conservação
ambiental.
A partir daí a cultura da canavieira chegou à região Nordeste do
Brasil, principalmente na Zona da Mata, por esta apresentar condições
climáticas favoráveis, solos férteis e abundância hídrica (ANDRADE,
2005), o que fez com que a área ficasse conhecida, na época, como
“Nordeste Açucareiro”. Segundo Melo (1962), a Zona da Mata
compreendia a faixa úmida no baixo vale do rio Ceará-Mirim (Rio Grande
do Norte), indo para o sul no Baixo Rio São Francisco e se alongando pelo
Estado de Sergipe e norte da Bahia até o recôncavo da Baía de Todos os
Santos. Essa faixa de terra tinha sua largura muito variável (50 a 120 km).
Entre os séculos XVI e XIX, as capitanias de Pernambuco e da Baía de
Todos os Santos (atual Estado da Bahia) foram as que mais se destacaram
na produção do açúcar. Desta forma, por volta de 1535, são instalados os
primeiros plantios e engenhos na capitania de Pernambuco, que, devido a
um clima favorável e maior proximidade com a Europa, acabou por
superar a produção de São Vicente (RODRIGUES; ROSS, 2020).
Durante as próximas décadas, o negócio açucareiro alcançou muito
sucesso, incentivando uma migração de colonos para a região, sendo que,
em 1585, a capitania de Pernambuco contava com 66 engenhos e com o
principal porto para exportação da produção de açúcar, o Porto de Recife
(ANDRADE, 1994). A capitania da Baía de Todos os Santos também
apresentou um grande sucesso na produção açucareira, sendo que 75% da
produção, na época, se concentrava nestas duas capitanias (SCHWARTZ,
1988). Essa região concentrou por anos a maior produção de cana-de-
açúcar no Brasil, representada principalmente por açúcar, melaço,
rapadura e aguardente (D’AGOSTINI et al., 2009). Desta forma, a cana-
de-açúcar torna-se o produto a ser cultivado em terras brasileiras
(FURTADO, 1969).
A produção canavieira na ilha de São Vicente (SP) entrou em crise
em meados de 1568, devido às dificuldades de solo e geográficas que
impediam sua expansão e também devido à Guerra dos 80 Anos (1568-
Fauna e conservação na paisagem agrícola paulista | 101

1648) para a independência das províncias dos Países Baixos em relação à


Coroa Espanhola. As desavenças entre espanhóis e holandeses
prejudicaram em grande escala o comércio e distribuição do açúcar na
Europa, afetando, consequentemente, as relações comerciais entre
Portugal e Espanha. Como consequência disso, os holandeses fundaram,
em 1621, a Companhia das Índias Ocidentais, com o principal objetivo de
romper o bloqueio espanhol e retomar os negócios com o açúcar
nordestino do Brasil. Com a chegada do Conde de Nassau em 1637, os
holandeses conseguem, então, expandir e recuperar a produção açucareira
na capitania de Pernambuco, com a ajuda de mão-de-obra escrava
(MELLO, 2012). Por cerca de duas décadas, os holandeses dominaram a
produção de açúcar no Nordeste e implantaram um sistema semelhante em
suas colônias no Caribe. Anos depois, a produção caribenha superou a
brasileira e se impôs no mercado internacional, levando o Brasil a perder
o monopólio açucareiro no final do século XVII e quase ao colapso no
século XVIII (FURTADO, 1969).
Com a perda do monopólio do açúcar, a coroa Portuguesa se voltou
à busca por metais, principalmente na região Centro-Sul do Brasil. No
entanto, as propriedades rurais açucareiras continuaram produtivas,
sobretudo no Nordeste. Segundo Schwartz (1988), em 1730 a produção de
açúcar no país era de cerca de 2,5 milhões de arrobas (aproximadamente
36.700 toneladas) e, em 1776, a produção foi reduzida para cerca de 1,4
milhões de arrobas (aproximadamente 20.600 toneladas). Essa quantidade
supria, à época, apenas 10% da necessidade do mercado internacional. Na
segunda metade do século XVIII, o Brasil já era o principal produtor de
açúcar novamente e os senhores de engenho tinham grande domínio e
força regional, adaptando os engenhos para a produção de aguardente
(moeda de troca na compra de escravos africanos), principalmente na
região litorânea do Sudeste (RJ e SP). A cana-de-açúcar passa, então, a ser
cultivada não apenas na região litorânea, avançando sobre a Mata Atlântica
do interior e atendendo uma demanda por açúcar mascavo, melaço e
aguardente (DEAN, 1996). Mesmo assim, os problemas econômicos, a
negativa indígena de trabalho e questões de solo e clima resultam por
acarretar a descontinuidade da produção canavieira no país, com exceção
102 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

das propriedades localizadas nas capitanias de São Vicente, Pernambuco e


Baía de Todos os Santos (SCHWARTZ, 1988).
No final do século XVIII e século XIX, mudanças no país e no
exterior, como a independência do Haiti, as guerras napoleônicas na
Europa, a Revolução Francesa, o crescimento demográfico e a urbanização
consequentes da Revolução Industrial, a queda na produção minerária no
Brasil e o aumento na demanda por açúcar na Europa e demais países
elevaram o valor do açúcar como produto e alavancaram novamente o
setor açucareiro no Brasil (SIMONSEN, 2005). Desta forma, em meados
de 1750 o açúcar passa a ser um produto importante para São Paulo,
ocorrendo a expansão dos plantios e surgimento de mais e maiores
engenhos e de grandes e importantes núcleos de produção de açúcar e
aguardente, principalmente no Planalto Paulista. Durante a década de
1830, devido à qualidade do solo, relevo e clima do interior paulista, a
cultura canavieira teve seu apogeu (RODRIGUES; ROSS, 2020). A partir
do século XVIII, o Estado de São Paulo passa a ser um grande polo
produtor de cana-de-açúcar, tanto que em meados do século XIX é criado
o "quadrilátero do açúcar", área que ficava entre os municípios de
Piracicaba, Sorocaba, Mogi Guaçu e Jundiaí. Nessa região há o
predomínio de solos do tipo latossolo vermelho e argissolos (ROSS, 2006).
Atualmente o plantio de cana-de-açúcar no Brasil possui, ao todo,
cerca de 10.063.739 ha, com maior concentração na região Centro-Sul do
país (9.131.832 ha), com destaque para o Estado de São Paulo, que possui
uma área de cerca de 5.555.502 ha de plantações. Em 2019/2020, o Brasil
produziu 642.677 mil toneladas de cana-de-açúcar, sendo 29.606 mil
toneladas de açúcar e 35.595 mil m3 de etanol, representando mais de 50%
da produção de cana-de-açúcar brasileira (UNICA, 2021). Durante todo o
processo de avanço da cultura canavieira, assim como em outros setores
da agricultura, a fragmentação e redução dos habitats naturais também
avançou, resultando hoje em paisagens que formam um mosaico onde
temos as áreas naturais imersas em uma matriz agropecuária, com graus
de isolamento e degradação bastante variados. E é nesse sentido que este
capítulo aborda os aspectos e as perspectivas para conservação ambiental
em áreas agrícolas no Estado de São Paulo.
Fauna e conservação na paisagem agrícola paulista | 103

Diversidade da fauna na paisagem agrícola


A fragmentação tem três grandes componentes: a perda de habitat
original, a redução da área de habitat e o aumento do grau de isolamento
entre os remanescentes, contribuindo, assim, para a queda da diversidade
quando comparada com o habitat original (METZGER, 2000). O arranjo
espacial dos remanescentes de vegetação nativa e a complexidade da
matriz onde estão inseridos podem ser mais importantes do que a área e o
isolamento do fragmento na sobrevivência de algumas espécies de animais
e vegetais (METZGER; DECAMPS, 1997; GASCON et al., 1999). Em
São Paulo, por meio do protocolo assinado entre os produtores de cana-de-
açúcar e o Governo do Estado em 2017, desde então é proibido o uso do
fogo no manejo do plantio. A suspensão do fogo trouxe muitos avanços
positivos sobre a paisagem agrícola canavieira, principalmente no que
tange à fauna e à flora nativas, uma vez que o fogo dos canaviais
frequentemente acabava atingindo os remanescentes de vegetação nativa.
A vegetação que circunda os fragmentos é muito importante para a
sobrevivência de uma metapopulação de fauna em uma paisagem
fragmentada (METZGER; DECAMPS, 1997). Essa vegetação é chamada
de matriz e, dependendo de suas características e qualidade, pode facilitar
ou impedir a movimentação de certas espécies e servir de habitat
alternativo para aquelas que originalmente ocupavam a vegetação nativa
(MEDELLIN; EQUIHUA, 1998, GHELER-COSTA et al, 2012, 2013).
Um outro aspecto é que a invasão de espécies exóticas ou não-florestais
acelera as mudanças na estrutura das comunidades e é, muitas vezes, a
causa do declínio das espécies nativas e tipicamente florestais de fauna e
flora (RAMANAMANJATO; GANZHBORN, 2001).
Algumas espécies de vertebrados acabam se beneficiando e
ocupando também a matriz agrícola, mostrando que o uso da paisagem
varia dentro dos grupos animais e entre os grupos (DOTTA; VERDADE,
2011, MARTIN et al., 2012, GHELER-COSTA et al., 2012, 2013,
VERDADE et al., 2014a, PENTEADO et al., 2016, GERHARD;
VERDADE, 2016). A paisagem agrícola acaba por abrigar e manter uma
importante diversidade de espécies e sua ecologia funcional (relações
104 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

ecológicas e tróficas). A permeabilidade da matriz agrícola varia entre as


culturas agrícolas e entre as espécies. No entanto, mesmo que a matriz
facilite a locomoção das espécies, a presença de corredores florestais
ligando os remanescentes nativos deve ser priorizada, pois são um
importante veículo para o movimento de indivíduos, favorecendo o fluxo
gênico entre sub-populações (BOLGER et al., 2001; MECH; HALLETT,
2001) e o aumento em tamanho das populações (PARDINI et al., 2005;
GHELER-COSTA et al., 2012, 2013).
A avifauna apresenta espécies mais dependentes de áreas nativas e
espécies menos dependentes e mais plásticas com relação à estrutura e
complexidade dessas áreas. Penteado et al. (2016), analisando uma
paisagem agrícola composta por um mosaico de ambientes naturais e
antrópicos no interior do Estado de São Paulo, detectou 3.679 indivíduos
pertencentes a 224 espécies (181 gêneros e 44 famílias). Os remanescentes
de floresta nativa foram os ambientes com maior riqueza e diversidade de
espécies e apresentaram 70% do total das espécies registradas na paisagem
agrícola. Nos canaviais analisados foram detectadas 52 espécies, o que
representa 21% do total, sendo Notiochelidon cyanoleuca, Phaeprogne
tapera, Zonotrichia capensis, Volatinia jacarina e Pseudoleistes
guirahuro as mais de maior ocorrência, todas comumente encontradas em
ambientes abertos. Embora os autores tenham encontrado riqueza e
abundância diferentes entre os remanescentes de vegetação nativa e os
canaviais, não foi detectada diferença significativa entre os ambientes
quanto ao número de categorias tróficas. Alexandrino et al. (2019),
analisando canaviais em áreas próximas às analisadas por Penteado et al
(2016), registraram 72 espécies de aves. Ambos os autores consideram que
a comunidade de aves utiliza a paisagem agrícola como um todo, com
padrões específicos e diferentes de frequência de uso dos ambientes
presentes na paisagem.
Como já sabemos, a paisagem agrícola, em especial a composta por
uma matriz monocultural, acaba sendo homogênea em relação aos
ambientes disponíveis para a fauna silvestre. No entanto, algumas culturas,
como a cana-de-açúcar, devido a seu manejo, acabam criando um mosaico
de ambientes com estágios de crescimento diferentes ao longo do ano e da
Fauna e conservação na paisagem agrícola paulista | 105

paisagem. Lukhele et al. (2021), analisando as mudanças da comunidade


de aves entre quatro diferentes estágios do plantio de cana-de-açúcar
(emergente, pequeno, médio e grande) e áreas-controle de savana nativa
prioritárias típicas do Nordeste de Eswatini (África do Sul), detectaram
124 espécies de aves pertencentes a 58 famílias. Os resultados corroboram
os encontrados por Penteado et al (2016), no qual a riqueza e diversidade
de espécies foi maior em áreas de vegetação nativa, quando comparada às
áreas de vegetação nativa. Contudo, segundo Lukhele et al. (2021), a
diversidade funcional foi maior nas áreas de cana-de-açúcar do que nas
áreas de savana. Os autores também observaram uma alta variabilidade
temporal e espacial entre as comunidades de aves nos diferentes estágios
de crescimento dos plantios analisados, promovendo a ocorrência de
diferentes espécies e com funções tróficas diferentes.
Rivera-Pedroza et al. (2019), comparando a diversidade de formigas
e aves na Colômbia, detectaram diferenças entre a riqueza de espécies de
formigas e aves em diferentes faixas de distância entre vegetação nativa e
cana-de-açúcar. Segundo os autores, a riqueza de espécies diminui à
medida que a distância entre a vegetação nativa e a cana-de-açúcar
aumenta. Entretanto, existe um grande compartilhamento de espécies entre
os ambientes, o que mostra que a matriz de cana-de-açúcar pode ser
favorável para uma grande parte das espécies de formigas e outros insetos
generalistas e, consequentemente, para espécies de aves insetívoras e
generalistas que forrageiam pela vegetação herbácea e que podem,
portanto, sobreviver e se adaptar na matriz (LANG-OVALLE et al., 2011).
O grupo dos mamíferos é um dos mais diversos em relação ao uso e
ocupação de habitats, uma vez que podemos encontrar mamíferos
terrestres, dulcícolas, marinhos, escansoriais e voadores. Os mamíferos
também apresentam uma variada ecologia trófica, já que podemos
encontrar animais estritamente carnívoros, onívoros, frugívoros,
nectarívoros, insetívoros, piscívoros, herbívoros, folívoros e muitas outras
interações entre essas principais categorias. Assim, essas espécies
possuem um importante papel na manutenção, restauração e sucessão
ecológica nos ambientes naturais, pois apresentam funções ecológicas
essenciais e podem ser consideradas espécies-chave na estruturação de
106 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

muitas comunidades (DOTTA; VERDADE, 2011). A comunidade de


mamíferos de médio e grande porte em paisagens agrícolas, em sua grande
maioria, foi alterada com a perda e/ou declínio nas populações de
predadores de topo, como a onça-pintada, a onça-parda e o lobo-guará. E
quando essas espécies estão presentes, muitas vezes podem estar
associadas a conflitos com proprietários rurais devido à predação de
animais domésticos como bovinos, caprinos, ovinos e aves. Estudos
relatam que a comunidade de mamíferos de grande e médio porte em
paisagens agrícolas, de forma geral, é composta por espécies generalistas
capazes de utilizar diversos tipos de habitats e itens alimentares
disponíveis.
Dotta e Verdade (2011), estudando uma paisagem agrícola com
matriz de cana-de-açúcar, registraram 25 espécies de mamíferos de médio
e grande porte nativas e duas espécies exóticas, além de 6 espécies
domésticas. Das 25 espécies de mamíferos nativas registradas em toda a
paisagem, 20 foram registradas em canaviais, sendo o cachorro-do-mato
(Cerdocyon thous) e a lebre europeia (Lepus europaeus) as de maior
ocorrência, ambas com hábitos generalistas. Soares e Peña (2015),
estudando uma paisagem também com matriz de canaviais no Estado de
Goiás, registraram 36 espécies de mamíferos, com predomínio de espécies
onívoras. Esses resultados corroboram os encontrados por Dotta e Verdade
(2011), demonstrando que algumas espécies têm maior plasticidade e
capacidade adaptativa quanto ao uso e ocupação de ambientes
diversificados e alterados na paisagem agrícola. Muitas espécies de
mamíferos de médio e grande porte usam os canaviais para forragear e até
se reproduzir, pois ali há uma grande quantidade de recursos alimentares
(insetos e pequenos vertebrados).
Com relação a pequenos mamíferos, estudos conduzidos em
paisagens agrícolas têm constatado que, embora os remanescentes de
vegetação nativa sejam, em algumas situações, estruturalmente alterados,
a abundância total e a riqueza de espécies de pequenos mamíferos são
significativas e meritórias de estudos, monitoramento e ações de
conservação (PARDINI et al., 2005; GHELER-COSTA et al., 2012, 2013,
MARTIN et al., 2012, ROSALINO et al, 2013, 2014). Gheler-Costa et al.
Fauna e conservação na paisagem agrícola paulista | 107

(2012) registraram 8 espécies de pequenos mamíferos em uma paisagem


agrícola sob domínio de canaviais, sendo 4 espécies de roedores silvestres
registradas em canaviais e com grandes populações. Gheler-Costa et al.
(2013), estudando apenas plantios de cana-de-açúcar com diferentes
manejos (com e sem uso do fogo), registraram 399 indivíduos pertencentes
a 6 espécies de roedores e uma de marsupial. Apesar de algumas espécies
de pequenos mamíferos serem beneficiadas com as alterações ambientais
(GHELER-COSTA et al., 2012, 2013, MARTIN et al., 2012, ROSALINO
et al, 2013, 2014), a maioria das espécies tem uma relação clara com a
floresta, desempenhando papel importante nesses ambientes por meio da
predação e dispersão de sementes (VIEIRA et al., 2003; PARDINI et al.,
2005). De forma geral, os canaviais são ambientes utilizados para
residência, abrigo, reprodução e forrageamento por diversas espécies de
aves e mamíferos mais generalistas e menos exigentes quanto à estrutura
e composição do ambiente (DOTTA; VERDADE, 2011, GHELER-
COSTA et al., 2012, 2013, SOARES; PEÑA, 2015, PENTEADO et al.,
2016, ALEXANDRINO et al., 2019).
No caso das paisagens agrícolas, esses animais podem estar se
beneficiando das atividades antrópicas da agrossilvicultura, onde
encontram abrigo e oferta de alimento em abundância. Diante desse
cenário, podemos concluir que os canaviais podem fornecer fonte
complementar de alimento para diversas espécies de mamíferos e aves. Os
estudos referentes à abundância de determinadas espécies de roedores
silvestres podem nos levar a responder não somente questões ecológicas,
mas também questões pertinentes na área da saúde pública e
epidemiologia.
Saúde Única em paisagens dominadas por canaviais
Descrever os processos de Saúde Única em paisagens agrícolas pode
trazer à tona diversos temas. Neste tópico abordaremos doenças zoonóticas
em face das rápidas mudanças da paisagem realizadas pela ação humana
em nosso mundo moderno. A Saúde Única é a área da pesquisa que
conceitua a saúde como um processo transdisciplinar que conecta a saúde
das pessoas e dos animais ao contexto do meio ambiente. A Saúde Única
108 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

postula que alcançar resultados ideais de saúde depende da interconexão


entre pessoas, animais e seu ambiente compartilhado (KELLY et al.,
2017). Zoonoses consistem em microrganismos que podem ser
transmitidos aos seres humanos e possuem sua origem no mundo animal.
A transmissão de doenças zoonóticas pelos animais silvestres ocorre
principalmente por contato direto, mordidas, contato indireto com objetos
contaminados, ingestão oral ou inalação de partículas do patógeno em
aerossóis, fezes e urina (TAYLOR et al., 2013; AYRAL et al., 2015).
A perda acelerada da diversidade biológica é um processo com
consequências profundas, pois inviabiliza os ecossistemas com notável
prejuízo para a sociedade humana. Os benefícios dos ecossistemas ao
homem são diversos e incluem, principalmente, o fornecimento de
alimentos e a prevenção de inundações por drenagem de água das chuvas.
Contudo, tais benefícios são reduzidos, tornando-se quase inexistentes,
com a acelerada mudança da paisagem natural prestes a ser convertida em
áreas fragmentadas (DEARING; DIZNEY, 2010; MILHOLLAND et al.,
2017, 2018). Essas mudanças da paisagem natural e a degradação
ambiental estão associadas ao risco elevado de doenças zoonóticas ao
homem, pois influenciam negativamente a diversidade de roedores
(STREICKER et al., 2016; JOHNSON et al., 2020). Um importante
atributo da paisagem que pode influenciar a incidência de um patógeno é
a composição e arranjo das áreas de contato entre hospedeiros e humanos,
uma vez que pode modular a intensidade com que os hospedeiros usam e
se movem através da matriz agrícola (WILKINSON et al., 2018). A
estrutura da paisagem pode ser avaliada de maneiras diferentes, por meio
da cobertura florestal, densidade de borda, isolamento e conectividade. A
fragmentação, por sua vez, tende a separar populações pequenas em
fragmentos isolados, acarretando uma maior susceptibilidade a doenças
pela redução da variabilidade genética (KEESING et al., 2010;
STEPHENS et al., 2016) e aumentando o “efeito de borda”, que promove
maior interação entre patógenos, vetores e hospedeiros, incluindo os seres
humanos (GUBLER et al., 2001; LUIS et al., 2013).
Fauna e conservação na paisagem agrícola paulista | 109

A cana-de-açúcar é uma dessas paisagens modificadas que favorece


a fragmentação e a paisagem de mosaicos com perda da diversidade de
espécies (GHELER-COSTA et al., 2013). A expansão da cana-de-açúcar
tem sido relacionada com uma maior abundância de roedores hospedeiros
infectados com microrganismos potencialmente patogênicos (PRIST et al.,
2017a, 2017b; MUYLAERT et al., 2019a, 2019b). No Brasil muitas
espécies de roedores silvestres são reservatórios naturais de
microrganismos causadores de várias doenças humanas. Roedores da
família Cricetidae, subfamília Sigmodontinae, habitam intensamente esses
ambientes modificados e possuem uma plasticidade que os permite
adaptar-se facilmente aos ambientes agrícolas. Akodon montensis, A.
serrensis, A. azarae, A. paranaenses, Calomys tener, C. callosus, C.
laucha, Holochilus sciureus, Necromys lasiurus, Oligoryzomys nigripes,
O. fornesi, O. utiaritensis, O. moojeni, O. flasvescens, Oxymycterus
nasutus e O. dasytrichus são hospedeiros de diversas espécies de
hantavírus (MUYLAERT et al., 2019a, 2019b). Da mesma forma, os
roedores C. tener, N. lasiurus e Rhipidomys mastacalis são hospedeiros de
arenavírus (BISORDI et al., 2015; SABINO-SANTOS et al., 2016). Os
hantavírus nas Américas podem causar síndrome pulmonar e
cardiovascular com taxa de mortalidade de até 50%. Por outro lado, os
arenavírus causam febre hemorrágica letal. Ambos os vírus não possuem
ainda tratamento eficaz e a possibilidade de cura é praticamente inexistente
(CHUNG et al., 2007; BISORDI et al., 2015; SABINO-SANTOS et al.,
2016). Esses roedores que habitam a cana-de-açúcar também podem
transmitir doenças bacterianas como salmonelose, infecções patogênicas
por E. coli, campilobacteriose e leptospirose (MARKOTIC et al., 2002).
Doenças por protozoários que podem ser transmitidas por esses roedores
incluem a giardíase e a amebíase. Ainda, o contato com pulgas e carrapatos
desses animais pode transmitir outras doenças, como a peste bubônica e a
febre maculosa (MATHISON; PRITT, 2014).
Os roedores hospedeiros desses patógenos parecem ser
influenciados de uma maneira negativa pela percentagem de cobertura
florestal nativa, como os roedores generalistas A. montensis, C. tener, N.
lasiurus, e O. nigripes, que se favorecem da degradação ambiental e se
110 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

adaptam rapidamente em matrizes agrícolas (PRIST et al., 2017a;


MUYLAERT et al., 2019a). Níveis intermediários de diversidade da
paisagem podem refletir uma combinação de diferentes habitats que
podem fornecer áreas adequadas para nidificação e alimentação,
principalmente para espécies que não residem estritamente na floresta. Por
exemplo, esses roedores generalistas utilizam plantações de cana-de-
açúcar para nidificação, forrageamento e corredores, onde o risco de
transmissão por patógenos pode aumentar para quem trabalha ou passa por
esses locais (GOTTDENKER et al., 2014; MUYLAERT et al., 2019a). A
expansão de monoculturas como a cana-de-açúcar pode ser um fator de
risco para a infecção por hantavírus em humanos (PRIST et al., 2017b;
MUYLAERT et al., 2019b). Gheler-Costa et al. (2021) sugerem que a
prevalência de hantavírus em roedores da cana-de-açúcar está mais
relacionada com o crescimento populacional de roedores do que com a
densidade desses roedores.
Diante disso, entender a relação ecológica entre fragmentação
florestal, desenvolvimento agrícola sustentável, perda de biodiversidade e
prevalência de patógenos é importante para a compreensão integral do elo
entre as mudanças antrópicas do ambiente e a saúde das populações como
um todo. Para tal, mostra-se necessária a visão transdisciplinar da Saúde
Única para o desenvolvimento sustentável. Dessa forma, é necessário criar
medidas que favoreçam o manejo e o uso da terra e que possibilitem mais
cobertura florestal, com conectividade entre os fragmentos florestais e a
utilização de técnicas que sejam “amigáveis” para a vida selvagem, com o
intuito de mitigar a mortalidade dos predadores desses roedores
hospedeiros de microrganismos patogênicos.
Gestão da fauna em paisagens dominadas por canaviais
Paisagens agrícolas passaram a ocupar áreas comparáveis ou mesmo
maiores do que os biomas que as antecederam. Essa expansão agrícola
resultou na extinção local de uma parcela expressiva da fauna e flora. No
entanto, parte delas tem conseguido adaptar-se a tais ambientes novos.
Considerando que não há em nenhum país do mundo sistemas de unidades
de conservação (ex.: parques nacionais, reservas biológicas, etc.) que
Fauna e conservação na paisagem agrícola paulista | 111

consigam prover conservação na íntegra das espécies silvestres, paisagens


agrícolas paradoxalmente ganharam um papel não apenas ligado à
produção biológica, mas também à sua conservação (VERDADE et al.,
2016). Tal papel pode ser aprimorado em paisagens agrícolas
multifuncionais que, além da missão primária ligada à produção agrícola
(i.e., agricultura, pecuária e silvicultura), têm também a missão secundária,
mas não menos importante, de prover conservação biológica
(MARTINELLI et al., 2010).
A divisão do uso da terra entre produção agrícola e conservação
biológica está no cerne do debate não tão recente chamado em inglês de
“land sharing versus land sparing” (GREEN et al., 2005). Ele trata da
disposição espacial entre áreas agrícolas e áreas de conservação, qual seja
imbricada (i.e., land sharing) ou apartada (i.e., land sparing). A origem
desse debate é um debate anterior quanto ao papel da distribuição espacial
de áreas de conservação na efetiva conservação das espécies silvestres. Sua
sigla em inglês era SLOSS (i.e., single large or several small) (TJØRVE,
2010). Nesse contexto, a manutenção de pequenas áreas de conservação
em meio a uma matriz formada por plantações agrícolas (i.e., land sharing)
teria derivado da ideia de pequenas áreas múltiplas de conservação (i.e.,
several small), em contraposição ao estabelecimento de áreas grandes e
isoladas de conservação (i.e., single large) apartadas de paisagens
dominadas por monoculturas. Na verdade, a diferença entre ambas é uma
questão de escala. Por exemplo, uma propriedade pode estar inserida em
uma paisagem land sharing (VERDADE et al., 2014a). Além disso, em
uma abordagem prática vale mais a pena conservar, sempre que possível,
áreas de vegetação nativa já existentes, sejam elas grandes ou pequenas,
isoladas ou não (SOULE; SIMBERLOFF, 1986). Surpreendentemente ou
não, essa abordagem prática é que norteou a elaboração do Código
Florestal Brasileiro (CFB) décadas antes desse debate (STICKLER et al,
2013). No entanto, a pressão histórica de setores agrícolas – e agora dos
setores agroindustriais – sobre o CFB foi no sentido de mudar sua
abordagem land sharing para land sparing, com o argumento de desonerar
os setores produtivos (METZGER et al., 2010). O setor canavieiro não foi
exceção (JOLY et al., 2015).
112 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Em complemento à recuperação de áreas de proteção permanente


(APP) e reserva legal (RL), exigidas pelo CFB, mas nem sempre
cumpridas pelo setor canavieiro (VERDADE et al., 2012), o uso de
práticas agrícolas amigáveis à fauna pode ser decisivo à sua conservação
(VERDADE et al., 2015). O plantio direto e o uso racional de
agroquímicos têm-se ampliado no setor com a consequente redução da
perda de solo e contaminação ambiental (KARP et al., 2015). Além disso,
a suspensão da queima pré-colheita tende a reduzir a mortalidade de
mesopredadores (GHELER-COSTA et al., 2013) e a consequente
prevalência de hantavírus em pequenos roedores (GHELER-COSTA et al.
no prelo) e em seres humanos (PRIST et al., 2016).
Em paisagens agrícolas multifuncionais, o processo de tomada de
decisões, tanto quanto ao uso da terra quanto ao de práticas agrícolas
amigáveis à fauna, deve basear-se no monitoramento do sistema, incluindo
sua fauna e flora (VERDADE et al., 2014b). Tal programa deve levar em
conta, de um lado, os valores históricos culturais e socioeconômicos
ligados à agricultura e, de outro, os processos ecológicos e evolutivos que
determinem os padrões de diversidade biológica presentes em paisagens
agrícolas (Figura 1). O programa de monitoramento da fauna e flora em
paisagens agrícolas, incluindo aquelas dominadas por canaviais, deve ser
de longa duração e escala espacial cruzada, a fim de permitir a detecção de
impactos antrópicos da escala local à regional (VERDADE et al. 2014b).
Para isso, é necessário o estabelecimento de uma rede de sítios de estudos
de campo com um banco único de dados que sejam interoperáveis (i.e.,
compatíveis e comparáveis) (MAGNUSSON et al., 2013, 2014). Dessa
forma, será possível assegurar os valores tangíveis e intangíveis ligados às
paisagens agrícolas dominadas por canaviais, tanto do ponto de vista da
produção agrícola quanto da conservação biológica.
Fauna e conservação na paisagem agrícola paulista | 113

Figura 1. Estrutura de monitoramento de paisagens agrícolas


multifuncionais.
A evolução e expansão da cultura canavieira no país e,
principalmente, em terras paulistas nos faz reconhecer os avanços
tecnológicos e econômicos, bem como refletir sobre a conservação da
biodiversidade na matriz agrícola e suas consequências para a própria
produção e saúde humana. De modo geral, há um avanço significativo no
sistema de produção, com o fim das queimadas, a adequação ambiental e
cumprimento do código florestal, além de monitoramentos de fauna já
realizados por muitos grupos na indústria canavieira, em sua maioria
devido a pressões externas e/ou por exigência de selos ambientais, como o
Bonsucro. São inegáveis os benefícios dos serviços ecossistêmicos que a
paisagem agrícola produz para toda a sociedade. Torna-se necessário,
portanto, que se mude o paradigma e a visão sobre essas paisagens,
incluindo-as nas tomadas de decisões conservacionistas, seja na
conservação da fauna ou pelo aspecto de Saúde Única. Observar as
questões aqui apresentadas reforçam ainda mais a ideia de modelos
sustentáveis para conservação da fauna silvestre e de toda a biodiversidade
brasileira.
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INSETOS-PRAGA NA CULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR

Vinícius Fernandes Canassa17


1. Introdução
O setor sucroalcooleiro brasileiro desempenha um papel importante
na economia do país, com destaque para produção de açúcar e fontes de
bioenergia, especialmente o etanol. A cana-de-açúcar é considerada uma
das alternativas para a produção de biocombustíveis e, atualmente, o
aumento da demanda mundial por combustíveis provenientes de fontes
renováveis, como o etanol, vem aumentando (OLIVEIRA, 2016). As
condições edafoclimáticas favoráveis à cana-de-açúcar, aliadas às áreas
cultiváveis, fizeram do Brasil o maior produtor mundial dessa commodity
e o segundo em produção de etanol (CONAB, 2020).
Com o aumento de investimentos em novas usinas sucroalcooleiras
para atender ao crescente uso de etanol em veículos flex fuel, a crescente
demanda de açúcar por parte do mercado internacional e,
consequentemente, o crescente aumento em áreas cultivadas
(CORDELLINI, 2018), torna-se mais comum a presença de patógenos e
insetos-pragas nas lavouras de cana-de-açúcar, causando redução na
quantidade e qualidade da produção de açúcar e etanol produzidos, sendo
os insetos-praga como a broca-da-cana-de-açúcar (Diatraea saccharalis)
(Fabricius, 1794) (Lepidoptera: Crambidae), bicudo-da-cana-de-açúcar
(Sphenophorus levis) (Vaurie, 1978) (Coleoptera: Curculionidae) e
cigarrinha-das-raízes (Mahanarva spp.). (Hemiptera: Cercopidae) os
grandes responsáveis pelas perdas no campo.
Diante do exposto, este capítulo tem como objetivo demonstrar,
através de descrições e imagens, as principais características biológicas de
três dos principais insetos-pragas presentes na cultura da cana-de-açúcar,
bem como os principais danos ocasionados durante a alimentação de cada
inseto.

17
Engenheiro Agrônomo, Dr., Docente da Faculdade Gran Tietê, vf.canassa@unesp.br
124 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

2. Principais insetos-praga na cultura da cana-de-açúcar


2.1. Broca-da-cana-de-açúcar, Diatraea saccharalis (Fabricius, 1794)
(Lepidoptera: Crambidae)
2.1.1. Bioecologia
A broca-da-cana-de-açúcar, Diatraea saccharalis (Fabricius, 1794)
(Lepidoptera: Crambidae) é uma das pragas-chaves da cana-de-açúcar nas
Américas (BOTELHO, 1992). No Brasil, o inseto ocorre em todas as
regiões onde a planta é cultivada, alimentando-se não apenas da cana-de-
açúcar, mas também do milho (Zea mays L.), do sorgo (Sorghum bicolor
L. Moench) e do arroz (Oryza sativa L.), causando prejuízos
economicamente significativos (SOLIS; METZ, 2016).
O desenvolvimento de D. saccharalis é do tipo holometabólico,
passando pelas fases de ovo, lagarta, pupa e adulto. Seu ciclo biológico
depende da temperatura e pode variar de 4 a 12 dias na fase de ovo, de 20
a 90 dias no estágio larval, de 7 a 14 dias no pupal e de 3 a 15 dias no
estágio adulto (PINTO et al., 2009). O ciclo completo do inseto varia de
53 a 60 dias, dependendo das condições climáticas. Esses insetos podem
ter, ao longo do ano, de 4 a 5 gerações (PINTO et al., 2018) (Figura 1).

Figura 1. Ciclo de vida da broca-da-cana-de-açúcar, Diatraea saccharalis.


Imagens: Centro de Tecnologia Canavieira (editadas pelo autor).
Insetos-praga na cultura da cana de açúcar | 125

Após emergirem, as fêmeas levam de um até dois dias para começar


a ovipositar (MELO; PARRA, 1988). Ao longo da vida de adulto, cada
fêmea deposita entre 300 e 780 ovos, colocando-os de forma agrupada (5
a 50 ovos por postura) (PARRA et al., 1999) nas folhas verdes, tanto na
face superior como inferior do limbo foliar (HAMM et al., 2012). Baixas
umidades causam ressecamento dos ovos, comprometendo, dessa forma, a
sua sobrevivência (PINTO et al., 2006).
As lagartas, quando recém-eclodidas, alimentam-se do parênquima
das folhas, convergindo, a seguir, para a bainha foliar, onde sofrem uma
primeira ecdise e procuram a região mais tenra do colmo, onde penetram
abrindo galerias transversais e longitudinais no interior dos colmos.
Durante a fase larval, a lagarta passa por cinco a seis ínstares (MELO;
PARRA, 1988; BOTELHO; MACEDO, 2002), medindo, no final dessa
fase, aproximadamente 25 mm e possui coloração amarelo-pálida e
cápsula cefálica marrom (Figura 2). Ao se aproximar a fase de pupação, as
larvas fazem um orifício para o exterior do colmo, fechando-o com fios de
seda e serragem provinda de restos de sua alimentação. Entram, então, na
fase de pupa, ainda no interior de sua planta hospedeira, e completam sua
metamorfose (PINTO et. al, 2006).

Figura 2. Lagartas de Diatraea saccharalis (L2) iniciando alimentação no


local de entrada no colmo da cana-de-açúcar (esquerda); orifício de entrada
da broca-da-cana-de-açúcar (direita). Imagens: Centro de Tecnologia
Canavieira.
126 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Os adultos apresentam uma longevidade média de aproximadamente


cinco a sete dias. A principal característica do adulto desta espécie é a
coloração amarelo-parda das asas anteriores, com cerca de 25 mm de
envergadura. As asas posteriores são esbranquiçadas. Apresentam
dimorfismo sexual à medida que os machos são geralmente menores que
as fêmeas, e possuem maior pigmentação nas asas e cerdas no último par
de pernas (BOTELHO; MACEDO, 2002). Machos e fêmeas emergem em
momentos distintos, sendo que os machos saem da fase pupal entre 2 e 5
dias antes das fêmeas. A longevidade dos adultos é de 8 a 16 dias, sendo
as fêmeas mais longevas do que os machos (PINTO et al., 2018).
A D. saccharalis passa por quatro a cinco gerações por ano (MELO;
PARRA, 1988), sendo a sua densidade populacional maior durante os
meses de verão (CARBOGNIN, 2016), principalmente em virtude das
condições climáticas mais favoráveis ao desenvolvimento da praga
(PINTO et al., 2018). Os primeiros ataques ocorrem na fase de
perfilhamento, após a formação dos primeiros entrenós basais,
aproximadamente a partir do terceiro mês após o plantio ou corte da cana-
de-açúcar.
A maior parte dos inseticidas químicos não tem apresentado
resultados satisfatórios no controle desse inseto, pois o comportamento
críptico dessa praga, que passa a maior parte da sua fase larval no interior
do colmo, torna-a um alvo difícil para a maioria dos inseticidas (PAULI et
al., 2018). Atualmente, 62 inseticidas são registrados para o controle de D.
saccharalis em cana-de-açúcar no Brasil, dos quais 21 são oriundos de
agentes biológicos (AGROFIT, 2020).
2.1.2. Danos causados pela broca-da-cana-de-açúcar
A D. saccharalis causa danos diretos e indiretos na cana-de-açúcar,
sendo os primeiros caracterizados pelas construções de galerias no interior
dos colmos, perda de peso do colmo, perfilhamento lateral, enraizamento
aéreo e “coração-morto”, caracterizado pela morte da gema apical
(DINARDO-MIRANDA et al., 2013). Os danos indiretos são
provocados por fungos dos gêneros Colletotrichum sp. (Glomerellales:
Insetos-praga na cultura da cana de açúcar | 127

Glomerellaceae) e Fusarium sp. (Hypocreales: Nectriaceae) que penetram


os entrenós pelos orifícios abertos pela lagarta, causando infecções
fúngicas, popularmente chamadas de podridão-vermelha e fusariose,
respectivamente (DINARDO-MIRANDA et al., 2013). A infecção
patogênica causa inversão de sacarose armazenada na planta, o que resulta
em perda de produção no processo industrial, devido à contaminação do
caldo que compromete a fermentação alcoólica e à dificuldade de
cristalização do açúcar (DINARDO-MIRANDA et al., 2012) (Figura 3).

Figura 3. Detalhe da Diatraea saccharalis alimentando-se no interior do


colmo de cana-de-açúcar e presença da podridão-vermelha na galeria de
alimentação (esquerda); sintoma de coração morto em touceiras jovens de
cana-de-açúcar após alimentação da Diatraea saccharalis (direita).
Imagens: Centro de Tecnologia Canavieira.
Estima-se os danos causados pela praga através do índice de
intensidade de infestação (I.I.I.), coletando-se 20 colmos por unidade
amostral e abrindo-os longitudinalmente para contagem do número total
de entrenós, assim como os entrenós brocados. O I.I.I. representa a
porcentagem dos entrenós brocados em relação ao total de entrenós
(PINTO, 2019). Dependendo da variedade da cana-de-açúcar, a média de
perdas a cada 1% de I.I.I. é de 1,14% na produção agrícola, adicionando
as perdas no processamento industrial de 0,42% na produção de açúcar e
0,21% na produção de etanol.
128 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

2.2. Bicudo-da-cana-de-açúcar (Sphenophorus levis) (Vaurie, 1978)


(Coleoptera: Curculionidae)
2.2.1. Bioecologia
O gênero Sphenophorus está presente em vários continentes e
compreende diferentes espécies que causam danos em diversas culturas de
importância agrícola, especialmente gramíneas. Na América do Norte e na
Ásia estão descritas 75 espécies, na África e Pacífico, 26 espécies, e na
América do Sul, 18 espécies, dentre essas, 14 no Brasil (LEITE et al.,
2005).
No Brasil, o bicudo-da-cana-de-açúcar (Sphenophorus levis -
Coleoptera: Curculionidae) (Vaurie, 1978) foi detectado em 1977, sendo
descrito como uma nova espécie em 1978 (VANIN, 1988) e inicialmente
restrito à região de Piracicaba-SP. Entretanto, em 2010 constatou-se a
presença do inseto em outros 124 municípios do estado de São Paulo, além
de Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso do Sul (MORAES; ÁVILA,
2013).
No Brasil ocorrem duas gerações anuais da praga em épocas bem
definidas (PRECETTI; ARRIGONI, 1990). Os adultos apresentam dois
picos populacionais no ano, sendo o principal nos meses de fevereiro e
março, enquanto o pico menor ocorre entre os meses de outubro e
novembro. As larvas ocorrem em maior intensidade nos meses de junho e
julho e, em menor número, em dezembro (DEGASPARI et al., 1987). Em
razão das larvas serem as responsáveis pelos danos à cultura, os maiores
ataques às plantas ocorrem de maio a novembro (ALMEIDA; STINGEL
2005). O bicudo-da-cana-de-açúcar tem capacidade restrita de voo, com
duração de duas horas, tendo baixa capacidade de dispersão. Desse modo,
seu deslocamento realiza-se por caminhamento, caracterizando a presença
do inseto e os danos às plantas em reboleiras (LEITE et al., 2005).
Os adultos apresentam coloração castanho-escura, com manchas
pretas no dorso do tórax e listras longitudinais nos élitros. Machos (7,70 a
11,20 mm) e fêmeas (10,50 a 13,30 mm) podem ser diferenciados pelo
tamanho (PRECETTI; ARRIGONI, 1990). Em ambientes controlados (T=
Insetos-praga na cultura da cana de açúcar | 129

27 a 30°C e fotofase de 12 horas), o ciclo biológico de S. levis varia de 50


a 307 dias, sendo a média de 173,2 dias (DEGASPARI et al., 1987). Os
adultos apresentam hábito noturno, são pouco ágeis e, quando
manipulados, simulam estar mortos (PINTO et al., 2006). O acasalamento
ocorre em qualquer horário do dia e o período ótimo para reprodução e
acasalamento é de 21 a 35 dias após a emergência (BARRETO-TRIANA,
2009).
As fêmeas perfuram as cascas dos colmos e os perfilhos com as
mandíbulas e, em seguida, depositam os ovos próximos ao nível do solo.
Ao longo do ciclo, as fêmeas ovipositam de 40 a 70 ovos (DEGASPARI
et al., 1987; PRECETTI; ARRIGONI, 1990). Os ovos apresentam
coloração branco-leitosa no momento da postura e escurecem à medida
que a eclosão das larvas se aproxima. O período de incubação varia de 7 a
14 dias e a viabilidade é de 47,16% (DEGASPARI et al., 1987).
As larvas recém-eclodidas possuem coloração branco-leitosa e se
tornam amareladas conforme seu desenvolvimento. A coloração da cabeça
é castanho-avermelhada e as mandíbulas são bem desenvolvidas, além de
apresentarem espiráculos visíveis no abdome (PRECETTI; ARRIGONI,
1990). São ápodas e se locomovem apoiando-se nas paredes das galerias
abertas durante a alimentação (DEGASPARI et al., 1987). O estágio larval
varia de 30 a 60 dias (PRECETTI; ARRIGONI, 1990), com viabilidade de
93,5% (DEGASPARI et al., 1987). As larvas, ao se aproximarem do
completo desenvolvimento, ampliam a galeria, a fim de preparar a câmara
pupal, e cessam seus movimentos e alimentação, passando ao estágio
pupal (DEGASPARI et al., 1987).
A coloração das pupas no início do estágio é branco-leitosa e,
conforme a emergência do adulto vai se aproximando, adquirem coloração
castanha. As pupas podem ser encontradas dentro de casulos feitos com
serragem fina. O período pupal, em condições de laboratório varia de 5 a
13 dias, sendo a média de 10,5 dias (DEGASPARI et al., 1987) (Figura 4).
130 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Figura 4. Ciclo de vida do bicudo-da-cana-de-açúcar (Sphenophorus


levis). Imagens: autor e Centro de Tecnologia Canavieira (editadas pelo
autor).
2.2.2. Danos causados pelo bicudo-da-cana-de-açúcar
Os danos podem ser verificados abaixo do nível do solo e na base
das brotações. São causados pelas larvas, que atacam a porção basal das
plantas, onde iniciam a construção de galerias nos colmos, causando a
morte das touceiras (DINARDO-MIRANDO et al., 2006). As galerias
podem ser circulares ou longitudinais, a altura média das galerias no
interior dos colmos é de 7,5 cm de comprimento e a altura máxima
observada acima do nível do solo é de 21 cm de comprimento (Figura 5).
Insetos-praga na cultura da cana de açúcar | 131

Figura 5. Detalhe da touceira de cana-de-açúcar com sintoma de ataque


de Sphenophorus levis em área comercial (esquerda). Detalhe da touceira
de cana-de-açúcar morta após alimentação de larvas de Sphenophorus levis
(direita). Imagens do autor.
Os danos diretos causados pelas larvas aos tecidos dos colmos
ocorrem principalmente nas épocas mais secas do ano (junho a agosto),
levando à morte das touceiras e, consequentemente, falhas na rebrota, o
que promove, ainda, danos indiretos, como o aumento no número de
plantas invasoras que competem com a cultura (DINARDO-MIRANDA
et al., 2006). O ataque dos perfilhos acarreta o secamento progressivo das
folhas externas, que pode ser confundido com fitotoxicidade causada por
herbicidas, efeito da seca prolongada, dano mecânico por ferramentas ou
aplicação excessiva de vinhaça (Figura 6).

Figura 6. Detalhe da larva de Sphenophorus levis alimentando-se no


interior do colmo da cana-de-açúcar (esquerda); detalhe do dano causado
pela larva Sphenophorus levis na região do colo da touceira (direita).
Imagens do autor.
Os danos diretos e indiretos do ataque das larvas de S. levis podem
causar a diminuição da produtividade e longevidade do canavial,
resultando, consequentemente, na redução da produção em tonelada de
132 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

cana-de-açúcar por hectare, chegando a atingir 50 a 60% dos perfilhos


ainda na cana-planta e ocasionando perdas de 20 a 30 ton ha ano-1
(DEGASPARI et al., 1987; DINARDO-MIRANDA et al., 2006).
2.3. Cigarrinha-das-raízes, Mahanarva spp. (Hemiptera:
Cercopidae)
2.3.1. Bioecologia
A cigarrinhas-das-raízes (Mahanarva spp. - Hemiptera: Cercopidae)
representa uma importante praga agrícola da cultura da cana-de-açúcar
(DINARDO-MIRANDA, 2014). O gênero foi relatado desde os Estados
Unidos até o sudeste do Brasil (PECK et al., 2004) e pode ser responsável
por perdas de até 44,8% na produtividade agrícola (DINARDO-
MIRANDA et al., 2001) e na qualidade da matéria-prima, com reduções
de até 30% no teor de sacarose (DINARDO-MIRANDA et al., 2000).
A mudança do sistema de colheita da cana-de-açúcar manual com a
queima da palha para o mecanizado favoreceu o inseto, permitindo a não
eliminação. A palha contribui para a manutenção da umidade do solo, para
a sobrevivência de ovos em diapausa no inverno e, consequente, para o
aumento populacional (DINARDO-MIRANDA, 2003; DINARDO-
MIRANDA, 2004). Em decorrência do aumento da colheita mecanizada
nas áreas de cultivo de cana-de-açúcar, a quantidade de matéria seca
depositada na superfície do solo aumentou consideravelmente, alterando o
perfil de insetos-praga da cultura, principalmente na composição das
diferentes espécies e densidades populacionais (DINARDO-MIRANDA,
2002). Dessa maneira, em um curto espaço de tempo, a cigarrinha-das-
raízes tornou-se praga-chave da cultura (MACEDO et al., 1997). O
principal fator que beneficiou o inseto nesse novo ambiente foi a maior
quantidade de raízes superficiais, que proporcionou mais locais de
alimentação para as ninfas. A palha, além de conferir maior proteção das
formas imaturas contra o ressecamento, também mantém a temperatura
mais estável e eleva a umidade do solo, o que favorece o desenvolvimento
deste inseto (DINARDO-MIRANDA, 2003).
Insetos-praga na cultura da cana de açúcar | 133

A principal espécie de cigarrinha-da-raiz relatada na região centro-


sul do país é M. fimbriolata (DINARDO-MIRANDA, 2014) e foi relatada
com este único nome até recentemente. Entretanto, já existem relatos da
ocorrência de espécies de M. spectabilis (Distant, 1909) e M. litura (Le
Peletier e Serville, 1825) em estados da mesma região (ALVES;
CARVALHO, 2014; DINARDO-MIRANDA, 2014).
Nos últimos 10 anos, verifica-se que a espécie M. fimbriolata é a
menos comum nos canaviais brasileiros e muitos trabalhos científicos a
citam como única espécie de cigarrinha-das-raízes como praga da cana-
de-açúcar (ALVES; CARVALHO, 2014; DINARDO-MIRANDA, 2014),
No entanto, a confirmação da espécie deve ser feita através do teste de
Proteína C-Reativa (PCR) nas populações de cigarrinha-das-raízes em
estudo ou tratá-las como complexo de espécies.
A cigarrinha-das-raízes passa por três estágios biológicos,
apresentando desenvolvimento hemimetabólico (TERÁN, 1987). Os ovos
são pouco visíveis a campo, pois são diminutos e ovipositados em locais
protegidos no solo. São de coloração amarela e medem aproximadamente
1 mm de comprimento (TERÁN, 1987). O período de incubação quando
os ovos não estão em diapausa varia de 15 a 25 dias.
As ninfas, ao eclodirem, deslocam-se para as raízes e radicelas da
planta para se alimentar e permanecem assim durante todo o período de
desenvolvimento, que pode durar 20 a 70 dias, dependendo das condições
microclimáticas do ambiente do solo e da espécie de cigarrinha
(STINGEL, 2005). As ninfas medem 1 mm de comprimento ao eclodirem
e atingem cerca de 10 mm de comprimento, após passarem por cinco
instares (TERÁN, 1987). A ninfa das cigarrinhas-das-raízes fica envolta
por uma espuma formada pelos líquidos eliminados pelo ânus e por
substâncias expelidas pelas glândulas hipodérmicas localizadas nos 7° e 8°
urômeros, denominadas de glândulas de “Bateli”. Esse aspecto de espuma
é devido às bolhas de ar formadas pelo canal respiratório localizado na
região ventral da ninfa e se espalha por todo o corpo do inseto por
movimentos circulares na extremidade do abdome (FEWKES, 1969)
(Figura 7). A espuma deixa de ser produzida pouco antes da última ecdise
134 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

e forma uma cavidade no interior em função da evaporação do líquido,


quando a ninfa passa para a fase adulta (GUAGLIUMI, 1973). A espuma
é citada como proteção das ninfas contra dessecação e contra inimigos
naturais (GUAGLIUMI, 1973).

Figura 7. Touceira de cana-de-açúcar com presença de espuma de


Mahanarva spp. removida do campo (esquerda). Ninfas de Mahanarva
spp. alimentando-se das raízes da cana-de-açúcar (direita). Imagens do
autor.
Os adultos podem variar de 11 a 13 mm de comprimento, sendo as
fêmeas maiores que os machos (GUAGLIUMI, 1973), e apresentam
pernas posteriores adaptadas para saltar, utilizando esse recurso para o
deslocamento entre plantas. Os adultos são encontrados na parte aérea das
plantas e se alimentam da seiva das folhas e das partes verdes do colmo
(GUAGLIUMI, 1973). O acasalamento ocorre a qualquer hora do dia
(FEWKES, 1969) e se inicia poucas horas após a emergência dos adultos
(FREIRE et al., 1968). Na época úmida do ano, as fêmeas têm as touceiras
das plantas, bainhas secas e até o solo próximo aos colmos como substratos
para oviposição, podendo uma fêmea colocar de 120 a 147 ovos (FREIRE
et al., 1968; GUAGLIUMI, 1973). A longevidade média dos adultos varia
de 8 a 23 dias (FREIRE et al., 1968; GARCIA, 2002) (Figura 8).
Insetos-praga na cultura da cana de açúcar | 135

Figura 8. Ciclo de vida da cigarrinha-das-raízes (Mahanarva spp.).


Imagens: Centro de Tecnologia Canavieira (editada pelo autor).
2.3.2. Danos causados pelo bicudo-da-cana-de-açúcar
Os adultos das cigarrinhas-das-raízes têm preferência por introduzir
o estilete através dos estômatos e assim atingir o xilema nos feixes
vasculares (GARCIA, 2002). No momento da sucção de seiva ocorre a
injeção de enzimas e aminoácidos juntamente com a saliva, o que facilita
a quebra da estrutura da seiva e, consequentemente, a assimilação dos
nutrientes pelo inseto (MENDONÇA et al., 1996). Estas substâncias
destroem os cloroplastos, entopem vasos do xilema e causam a morte dos
tecidos (GUAGLIUMI, 1973). Desta forma, os sintomas são
caracterizados pela necrose do local da alimentação e pela formação de
manchas longitudinais cloróticas, que podem provocar morte das folhas
(Figura 9). Com isso há redução da área foliar com interrupção do fluxo
de seiva, levando à diminuição do armazenamento da sacarose no colmo
(GUAGLIUMI, 1973).
136 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Figura 9. Folhas de cana-de-açúcar com sintoma de estrias cloróticas após


a alimentação do adulto de Mahanarva spp. (esquerda). Detalhe da folha
de cana-de-açúcar com sintomas mais severos (estrias avermelhadas e
necrose) após a alimentação do adulto de Mahanarva spp. Imagens: Centro
de Tecnologia Canavieira – CTC.
As ninfas se alimentam por meio da sucção de seiva do floema
(GARCIA, 2002). Desta forma, há uma destruição dos tecidos dos vasos
condutores e morte das raízes. O fluxo de água e nutrientes do solo que
deveria ir para a parte aérea das plantas é bloqueado. Assim, as plantas
apresentam desidratação, folhas amareladas e secas, entrenós mais curtos
e os colmos finos, ocos e enrugados (DINARDO-MIRANDA, 2014).
Os danos causados pela cigarrinha-das-raízes podem afetar tanto a
produtividade agrícola como a qualidade da matéria prima que chega na
indústria. A menor produtividade é decorrente do murchamento de colmos,
entrenós mais curtos e brotação de gemas laterais, além da morte de
perfilhos e colmos (DINARDO-MIRANDA, 2014) (Figura 10). Na
qualidade da matéria prima, reduzem, por exemplo, a quantidade e
qualidade do açúcar recuperável, além de elevar o teor de fibras e
impurezas (MACEDO et al., 1997). Na produtividade agrícola, as
reduções variam de 23,6 a 72%. A qualidade da matéria prima também é
afetada, com reduções de até 30% da sacarose (DINARDO-MIRANDA et
al., 2000).
Insetos-praga na cultura da cana de açúcar | 137

Figura 10. Detalhe de colmos de cana-de-açúcar sadios e com sintoma de


murchamento ocasionado após a alimentação de ninfas da cigarrinha-das-
raízes. Imagens do autor.
3. Considerações finais
A correta identificação das espécies de insetos-praga é um dos
pilares preconizados do Manejo Integrado de Pragas (MIP), que, através
do reconhecimento de seus danos às plantas, pode auxiliar produtores e
acadêmicos em seu reconhecimento. Por meio da identificação e
monitoramento desses insetos a campo, podemos recomendar um método
de controle adequado, baseado nos níveis de ação avaliados. Apesar de
serem encontrados outros insetos-pragas de importância econômica na
cultura da cana-de-açúcar, tais como Telchin licus (Drury, 1773)
(Lepidoptera: Castniidae) e Migdolus fryanus (Westwood, 1863)
(Coleoptera: Cerambycidae), este capítulo traz informações relevantes
sobre biologia e danos de D. saccharalis, S. levis e Mahanarva spp. que
podem ser consultados através de meios eletrônicos por produtores,
acadêmicos e pesquisadores.
138 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

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MICRORGANISMOS NA CULTURA DA
CANA-DE-AÇÚCAR

Daniele Scudeletti18
Elisa Fidêncio de Oliveira19
Erilene Romeiro Alves20

1. Introdução
O Brasil é um dos principais produtores mundiais de cana-de-açúcar,
cultura com importância para o agronegócio brasileiro, devido à produção
de açúcar, etanol e bioeletricidade. É considerada uma das grandes
alternativas para o setor de biocombustíveis, graças aos seus subprodutos,
que auxiliam na redução dos custos de produção e contribuem para a
sustentabilidade da atividade (CONAB, 2017).
A primeira estimativa da safra 2021/22 da área cultivada com cana-
de-açúcar é de cerca de 8.422,8 mil hectares colhidos neste ciclo,
indicando diminuição percentual de 2,2% (193,3 mil hectares) em relação
à safra passada (2020/21). O mesmo ocorre para a produção de cana-de-
açúcar, cuja estimativa é de que sejam colhidos 628,1 milhões de
toneladas, representando um volume 4% menor (CONAB, 2021).
A perspectiva de redução é devido à grande concorrência de cultivos
anuais, como soja e milho, que adquiriram ótima rentabilidade e podem
influenciar diretamente na destinação da área para cana-de-açúcar. Além
disso, as condições climáticas não favoráveis, principalmente no que se
refere às precipitações e à regularidade de distribuição das chuvas e
oscilações durante o ciclo, impactam o potencial produtivo em
consequência do déficit hídrico em algumas localidades, prejudicando os
potenciais produtivos. Com isso, espera-se que haja redução na
produtividade média de colmos em uma comparação com a safra anterior,
podendo ficar em torno de 74 t ha-1 (diminuição de 1,8%) (CONAB, 2021).

18
Engenheira Agrônoma, Dra., Desenvolvimento Técnico de Mercado – BIOTROP,
daniele.scudeletti@hotmail.com
19
Engenheira Agrônoma, Dra., elisa_oliveiraagro@hotmail.com
20
Engenheira Agrônoma, Dra., erilene.romeiro@hotmail.com
144 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Contudo, há uma grande demanda pelo aumento da produção


agrícola em consequência do crescimento populacional acelerado e
contínuo nas próximas décadas, o que deve elevar o consumo de alimentos
em geral. De acordo com a ONU (2012), a população mundial em 2024
será superior a 8 bilhões de pessoas e, em 2050, superior a 9,5 bilhões.
Esse aumento representa um crescimento de 34,90% entre 2012 e 2050.
Além do aumento populacional e da consequente necessidade de aumento
da produção de alimentos, existe a preocupação de como esses alimentos
serão produzidos, principalmente no que se refere ao uso de fertilizantes e
pesticidas sintéticos, sendo este um grande desafio na atualidade.
O uso de novas tecnologias e a grande demanda por tecnologias
sustentáveis, como o uso de microrganismos na produção, tem-se
destacado nos últimos anos. O mercado de biofertilizantes, por exemplo,
tem aumentado ano após ano. Em uma estimativa realizada pelos Estados
Unidos, a demanda do mercado de biofertilizantes em 2016 foi de 162.5
kg ton-1, em 2017 o valor chegou a 224.7 kg ton-1 e estima-se que, para o
ano de 2027, esse mercado praticamente dobre de tamanho
(BIOFERTILIZERS MARKET SIZE, 2020).
As interações entre plantas e microrganismos são conhecidas há
muito tempo, principalmente no que se refere ao conceito da formação de
lesões nos tecidos vegetais. No entanto, estudos têm mostrado que esse
conceito depende dos microrganismos e sua interação, com aspectos
positivos em relação ao seu uso, abrindo novas perspectivas para o estudo
da interação planta/microrganismo (EMBRAPA, 2020).
A utilização de microrganismos tem diversos efeitos e mecanismos
de ação na planta, como: regulação do produção de hormônios
(BHARDWAJ et al., 2014; XIE et al., 2016), solubilização de nutrientes
na solução do solo (SINGH et al., 2015; RASHID et al., 2016; SANTOYO
et al., 2016; SHAMEER; PRASAD, 2018), indução de resistência contra
patógenos (DINARDO-MIRANDA et al., 2003; BARROS et al., 2000),
resistência a estresse hídrico (GOWTHAM et al., 2020; SCUDELETTI et
al., 2021; TIWARI et al., 2018; SINGH et al., 2019) e promoção de
crescimento vegetal (MORETTI et al., 2020; SCUDELETTI et al., 2021),
Microrganismos na cultura da cana de açúcar | 145

podendo reduzir os custos de produção, aumentando a produtividade e a


rentabilidade no agronegócio (MORETTI et al., 2020, OLIVEIRA et al.,
2006; SCHULTZ et al., 2012, 2014, MENDES et al., 2011; COLEMAN-
DERR; TRINGE, 2014; COMPANT et al., 2010; SANTI FERRARA et
al., 2012).
Com a crescente preocupação com a segurança alimentar e a busca
por uma produção mais sustentável, o uso de microrganismos em práticas
de manejo das culturas tem mostrado grandes resultados, o que deve
impulsionar ainda mais o mercado de microrganismos no mundo todo.
2. Efeitos da utilização dos microrganismos em cana-de-açúcar e seu
modo de ação
Nas últimas décadas, diversas pesquisas se voltaram para o potencial
de microrganismos, como fungos e bactérias, na promoção do crescimento
e desenvolvimento de plantas. Neste contexto, a importância do
desenvolvimento de novas tecnologias e a utilização de microrganismos
benéficos à agricultura se apresentam como alternativas eficientes,
sustentáveis e financeiramente viáveis (KHAN et al., 1997).
Para a agricultura, os microrganismos considerados benéficos são
aqueles capazes de fixar o nitrogênio atmosférico, decompor resíduos
culturais favorecendo a ciclagem de nutrientes, suprimir doenças de
plantas e patógenos transmitidos pelo solo e produzir compostos bioativos,
como hormônios e os solubilizadores de fosfatos (SINGH et al., 2008).
Diversos microrganismos vêm sendo estudados e aplicado nas
culturas. Com base nisso, a tabela abaixo mostra os microrganismos mais
utilizados em cana-de-açúcar.
146 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Tabela 1. Microrganismos mais utilizados em cana-de-açúcar.


Microrganismo Classificação Modo de ação Referências
Okon et al., 1983; Matoso et al., 2021;
FBN
Martins et al., 2020
Azospirillum sp Bactéria Estresse hídrico Moutia et al., 2010
Tien et al., 1979; Bashan; Levanony, 1990;
Hormonal
Spaepen; Vanderleyden 2015
FBN Araújo et al., 2005
Controle Ali et al., 2014; Hanif et al., 2015; Oslizlo et
biológico al., 2015
Bacillus sp Bactéria Hormonal – ácido
indolbutírico Araújo et al., 2005
(AIB)
Estresse hídrico Suman et al., 2016
Trichoderma sp Fungo Estresse hídrico Scudeletti et al., 2021

2.1 Fixação Biológica do Nitrogênio (FBN) e ação hormonal


O nitrogênio é constituinte indispensável para a adequada nutrição
das plantas, pois está presente na composição das mais importantes
biomoléculas (ATP, NADH, NADPH, clorofila, proteínas e inúmeras
enzimas) (MIFLIN; LEA, 1976; HARPER, 1994). Na agricultura, esse
elemento é determinante na produção das culturas, sendo um dos
nutrientes que mais participa do sistema de produção agrícola. O
suprimento do N ao solo se faz necessário para aumentar a absorção e
utilização do nutriente, levando, consequentemente, à obtenção de maiores
produtividades.
Na cana-de-açúcar, o nitrogênio é o segundo macronutriente exigido
em maior quantidade, depois do potássio (SPIRONELLO et al., 1996).
Grandes quantidades de nitrogênio são demandadas anualmente, via
fertilização artificial. Uma alternativa ao uso de adubos químicos é o uso
de microrganismos, como bactérias fixadoras de nitrogênio (FBN). Esses
microrganismos são normalmente utilizados como inoculantes ou
biofertilizantes. Os únicos seres vivos capazes de converter o N-
atmosférico em N-combinado são as bactérias conhecidas como
diazotróficas (MOREIRA; SIQUEIRA, 2006). O metabolismo dessas
Microrganismos na cultura da cana de açúcar | 147

bactérias produz um complexo enzimático denominado nitrogenase, que


atua na redução do N atmosférico em amônio assimilável pelas plantas
(VITOUSEK et al., 2013).
As rizobactérias têm como característica a correlação com a
produção de auxinas (PRINSEN et al., 1993; SPAEPEN;
VANDERLEYDEN, 2015), citocininas (TIEN et al., 1979), giberelinas
(BOTTINI et al., 1989), etileno (STRZELCZYK et al., 1994) e outros
reguladores de crescimento de plantas, como o ácido abscísico (COHEN
et al., 2008; COHEN et al., 2015), o óxido nítrico (CREUS et al., 2005) e
as poliaminas, como a espermidina, a espermina e a diamina cadaverina
(CASSAN et al., 2009). Os microrganismos também apresentam papel
importante na mineralização da matéria orgânica (MOREIRA;
SIQUEIRA, 2006) e na solubilização de fosfatos (MASSENSSINI et al.,
2015), favorecendo a liberação dos nutrientes ao solo e a assimilação
destes pelas raízes das plantas.
Azospirillum sp. é um dos gêneros de bactérias mais estudados
quando se refere ao crescimento vegetal. Este microrganismo é capaz de
colonizar mais de cem espécies de plantas, com efeito no crescimento,
desenvolvimento e, principalmente, no aumento da produtividade no
campo (BASHAN; DE-BASHAN, 2010). O primeiro mecanismo
proposto para explicar a capacidade do Azospirillum sp. de promover o
crescimento da planta foi a fixação do nitrogênio biológico (OKON et al.,
1983). Outro mecanismo tem sido relacionado à sua capacidade de
produzir e metabolizar vários fitormônios e outras moléculas reguladoras
do crescimento das plantas (TIEN et al., 1979; BASHAN; LEVANONY,
1990).
Estima-se que a contribuição da FBN para a nutrição nitrogenada da
cana-de-açúcar no Brasil pode contribuir com pelo menos 40 kg ha-1 de N
(URQUIAGA et al., 2012). Os autores conduziram experimento utilizando
o método de diluição isotópica de 15N e balanço de N para quantificar a
contribuição da FBN em dez variedades de cana-de-açúcar, e obtiveram
valores superiores a 60% de N, absorvido pela planta, proveniente das
bactérias. Essa variação pode estar relacionada com o genótipo da planta
148 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

e, principalmente, com as condições da fertilidade do solo. Porém,


tratando-se de uma cultura que ocupa milhões de hectares, o suprimento
de cerca de 30% da demanda de N pela FBN certamente trará benefícios
ambientais e econômicos para essa cultura.
Estudos como o de Martins et al. (2020) deixam poucas dúvidas de
que alguns cultivares de cana-de-açúcar foram capazes de obter grandes
contribuições de N através da FBN. Após 18 meses de crescimento, o
nitrogênio fixado totalizou o equivalente de 139 a 166 kg N ha− 1 em
plantas não inoculadas, enquanto nas plantas inoculadas com uma mistura
de cinco bactérias diazotróficas, esse valor totalizou entre 205 a 215 kg N
ha− 1.
Os efeitos da interação entre variedades de Azospirillum inoculadas
e o substrato usado na produção de mudas de cana-de-açúcar indicaram
que o uso das bactérias promoveu aumento no acúmulo de nitrogênio, o
que resultou em maior diâmetro do caule, além de aumentar o índice de
velocidade de germinação, altura, comprimento da raiz, peso fresco e seco.
No entanto, as respostas à inoculação diferem de variedade para variedade
e dependem do substrato utilizado, com melhores resultados observados
no substrato comercial e nas misturas de substratos com maior proporção
de composto orgânico. Compreender a interação entre a variedade e o
substrato com a inoculação bacteriana é essencial para o sucesso da
produção de mudas de cana-de-açúcar inoculadas (MATOSO et al., 2021).
O mesmo foi observado por Oliveira et al. (2006), em decorrência das
características genéticas das variedades utilizadas. Fatores como
temperatura e umidade também podem influenciar na inoculação dessas
bactérias (COMPAGNON et al., 2017).
Outro microrganismo que também afeta diretamente a promoção do
crescimento da planta é Bacillus e seus isolados, especialmente Bacillus
subtilis, com potencial para ser usado como promotor de crescimento de
plantas, principalmente por meio de mecanismos como a FBN (ARAÚJO
et al., 2005). Esse microrganismo inoculado pode promover o crescimento
e o desenvolvimento de mudas de cana-de-açúcar inoculadas com
bactérias endofíticas, podendo produzir auxina, secretar sideróforo e
Microrganismos na cultura da cana de açúcar | 149

solubilizar fósforo (WANG et al., 2019). Vários isolados de Bacillus,


especialmente Bacillus subtilis, afetam diretamente a produção de ácido
indolbutírico (AIB) (ARAÚJO et al., 2005).
A associação de Bacillus subtilis e Bacillus pumilus, combinados
com fertilização mineral e açúcar e subprodutos da indústria do álcool,
inoculados em mudas de cana, permitiu observar-se resultados até 23%
maiores no crescimento de raiz e de matéria seca total, em comparação
com o controle, na fase de crescimento das mudas de cana-de-açúcar.
Já na segunda fase de avaliação, com a cana-de-açúcar já em fase de
maturação (colheita), o uso da inoculação de B. pumilus, combinado com
fertilização mineral, aumentou a matéria seca total em 13%, o número de
perfilhos em 37% e o diâmetro dos perfilhos, em 48%. Foi observado
também o aumento no teor de fósforo em 13%, com a inoculação de
combinada de B. subtilis e B. pumilus em solo tratado com fertilizante e
torta de filtro. A utilização de B. subtilis e B. pumilus, bem como o uso de
subprodutos da cana-de-açúcar, podem melhorar a fertilidade do solo,
reduzir os efeitos adversos associados à fertilização com vinhaça e
melhorar o rendimento da produção de cana-de-açúcar, com benefícios
ambientais (SANTOS et al., 2018).
2.2 Controle biológico
O termo “controle biológico” consiste em reduzir a população de um
organismo alvo por outro organismo vivo. Este apresenta uma série de
vantagens em relação ao controle químico, pois não contamina o solo, não
desequilibra o meio ambiente e nem deixa resíduos, além de ser barato e
de fácil aplicação (STIRLING, 1991).
Métodos alternativos no controle de pragas e insetos têm sido
adotados por vários laboratórios ao redor do mundo, em vista da
necessidade de uma agricultura mais sustentável, no que o Brasil se
destaca. Microrganismos endofíticos têm mostrado resultados positivos a
esse controle (LANNA-FILHO et al., 2017; SHAHZAD et al., 2017;
WANG et al., 2019). As bactérias endofiticas têm grande contribuição para
o controle de pragas (BENSIDHOUM et al., 2016; SCHELLENBERGER
150 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

et al., 2016). Bacillus é uma das bactérias mais utilizadas no controle


biológico de pragas (BRAVO et al., 2017), respondendo por 53% do
mercado de biopesticidas (POLANCZYK et al., 2017). Vários isolados de
Bacillus, especialmente Bacillus subtilis, têm efeitos direto no biocontrole
(ALI et al., 2014; HANIF et al., 2015; OSLIZLO et al., 2015).
Vários microrganismos também se têm mostrado promissores no
controle biológico de nematoides. Esses organismos são capazes de
repelir, inibir ou mesmo levar à morte os fitonematoides. Mais de 200
inimigos naturais de fitonematoides têm sido reportados, tais como fungos,
bactérias, nematoides predadores e ácaros, sendo que os de maior potencial
como agentes de controle biológico são as bactérias e os fungos
(STIRLING, 1991). Dentre eles, podemos citar Trichoderma,
Paecilomyces, Penicillium, Pythium, Bacillus, Pseudomonas,
Agrobacterium e Streptomyces como os gêneros mais estudados (MELO;
AZEVEDO, 1998).
Cerca de 75% dos antagonistas de nematoides identificados são
fungos que habitam normalmente o solo, podendo ser parasitas de ovos,
predadores de juvenis, adultos ou cistos, ou ainda produzirem metabólitos
tóxicos aos nematoides (JATALA, 1986). Alguns fungos nematófagos
também podem ser capazes de colonizar endofiticamente raízes de plantas
e, além disso, controlar doenças causadas por fungos de solo (MONFORT
et al., 2005).
2.3 Ação Antiestresse
O estresse hídrico também é outro assunto que tem preocupado o
mundo todo, pois afeta diretamente a produtividade. Diversos
microrganismos vêm sendo estudados como indutores de tolerância ao
estresse hídrico, como Trichoderma (SCUDELETTI et al., 2021),
Azospirillum (NADEEM et al., 2015; NGUMBI; KLOEPPER, 2016) e
Bacillus (GOWTHAM et al., 2020).
Em um trabalho realizado por Scudeletti et al. (2021), a inoculação
de Trichoderma asperellum em cana-de-açúcar em casa de vegetação na
presença de estresse hídrico não apenas melhorou as condições da planta,
como também alterou a nutrição da cultura e as concentrações de clorofila
Microrganismos na cultura da cana de açúcar | 151

e carotenoide, resultando em aumento da taxa de fotossíntese, da


condutância estomática e da eficiência do uso de água, em comparação
com as plantas não inoculadas. Houve melhorias também no metabolismo
antioxidante, aumentando as atividades das enzimas superóxido dismutase
e peroxidase e a concentração de prolina e açúcares na planta.
Consequentemente, melhorou o desenvolvimento radicular e do colmo,
comprovando os benefícios de seu uso, diminuindo os efeitos de estresse
hídrico em cana-de-açúcar.
3. Considerações finais
A utilização de microrganismos é uma situação atual que a cada dia
vem sendo mais aceita e adotada por produtores na busca pelo aumento da
produtividade através do controle biológico de pragas e resistência das
plantas por fatores ambientais.
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BIOETANOL A PARTIR DA BIOMASSA DE
CANA-DE-AÇÚCAR

Carlos Alves de Oliveira21


Dile Pontarolo Stremel22
Victor Gonçalves Cremonez23

1 PERSPECTIVAS DO BIOETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO


O Bioetanol de segunda geração, também conhecido como etanol
celulósico, apresenta-se como uma tecnologia promissora e sustentável
com vantagens sobre os biocombustíveis de primeira geração, tanto em
termos de eficiência do uso da terra quanto ao desempenho ambiental.
Devido ao desenvolvimento tecnológico, o desempenho ambiental dos
combustíveis de segunda geração pode beneficiar o emprego de elevadas
quantidades de resíduos e rejeitos lignocelulósicos que estão atualmente
disponíveis (RODRIGUES, 2011). No Brasil, a cana-de-açúcar é o insumo
amplamente utilizado para produção de bioetanol empregando os resíduos
bagaço ou palha que são descartados no processo de primeira geração.
Uma desvantagem da produção de bioetanol de primeira geração, é
a concorrência com a questão da produção de alimentos. A produção de
bioetanol através do caldo de cana extraído diretamente da moagem, por
exemplo, pode impactar diretamente o mercado do açúcar, especialmente
em tempos de pandemia com a elevada demanda por alimentos. Com a
perspectiva de recuperação econômica advinda do relaxamento das
restrições sociais em importantes países consumidores e o avanço da
vacinação contra a doença, a tendência é um aumento nas exportações da

21
Engenheiro químico, M. Sc., Docente da Faculdade de Tecnologia de Curitiba,
carlos.fatecpr@gmail.com
22
Engenheiro químico, Dr., Docente da Universidade Federal do Paraná,
dile.stremel@gmail.com
23
Engenheiro Industrial Madeireiro, Dr., Docente da Faculdade de Tecnologia de
Curitiba, victor.cremonez@gmail.com
162 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

commodity e atendimento a demanda interna mais alta. Por conta disso,


muitas vezes, os produtores são incentivados a maximizar a produção de
açúcar ao invés de bioetanol, resultando em uma alteração na
disponibilidade e no consequente aumento no preço do biocombustível,
podendo acarretar impacto na economia.
Com base em questões econômicas globais como estas apresentadas,
inclusive desvalorização da moeda local em relação ao dólar americano, a
obtenção de bioetanol de segunda geração, principalmente a partir dos
resíduos da biomassa da cana é uma visão estratégica e deve ser prioridade,
visando diminuir os impactos do petróleo e concorrência dos
biocombustíveis pelos alimentos, além de contribuir significativamente
com a redução emissões de gases de efeito estufa. O Renovabio que
representa a Política Nacional dos Biocombustíveis (Lei nº 13.546/2017),
surgiu para resolver uma parte deste problema e tem como objetivo
amparar o governo brasileiro diante do compromisso assumido na
assinatura do Acordo de Paris em 2016 (MME, 2021). Neste acordo, o
Brasil se comprometeu a aumentar a participação dos biocombustíveis na
matriz energética brasileira, e reduzir em 37% as emissões de carbono até
2025, baseadas em dados de 2005. Com base neste aspecto é visível a
expectativa de oportunidades na produção de biocombustíveis no Brasil,
principalmente nas tecnologias de segunda geração a partir da cana-de-
açúcar no Brasil
2 PRODUÇÃO DE BIOETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO A
PARTIR DA BIOMASSA CANA-DE-AÇUCAR
O bagaço da cana-de-açúcar é, do ponto de vista técnico-econômico,
uma das mais promissoras matérias-primas para a produção de etanol de
segunda geração (E2G), pois já foi coletado no campo, estando disponível
na indústria para processamento (FURLAN et al., 2012).
Isto traz uma grande possibilidade de ganho para as indústrias de
etanol, já que um subproduto do processo original se torna matéria-prima
para a fabricação do produto final. Dessa maneira, pode-se chegar a
aumentar a produção de etanol por hectare de área plantada em até 26%
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 163

(GALDOS et al., 2013), diminuindo-se a pressão sobre a produção de


alimentos conforme já comentado anteriormente.
A rede do etanol de segunda geração no Brasil envolve diversos
setores (parte do setor sucroenergético, fornecedores de equipamentos,
instituições governamentais de financiamento e pesquisa, empresas de
tecnologia e melhoramento genético, etc.), além de fornecedores de
material, equipamentos e tecnologias de outros países (LORENZI; DE
ANDRADE, 2019).
Do ponto de vista industrial, as empresas GranBio, Raízen e o CTC
são as aquelas que atualmente se destacam em plantas de bioetanol de
segunda geração no Brasil. Juntas, possuem plantas com uma capacidade
instalada de 125 milhões de litros de E2G por ano, o que torna o Brasil o
quarto país do mundo em capacidade instalada de segunda geração, atrás
somente dos Estados Unidos, China e Canadá. Entretanto, apenas uma
pequena fração (cerca de 10% ou menos) desse potencial anual foi
produzido até agora, pois o maior problema para a operação dessas plantas
ainda são as dificuldades na etapa de pré-tratamento. (LORENZI; DE
ANDRADE, 2019)
3 BIOMASSA LIGNOCELULÓSICA PARA PRODUÇÃO DE
BIOETANOL
A biomassa lignocelulósica constitui a maior fonte de carboidratos
do mundo. A dificuldade de converter a biomassa lignocelulósica em
bioetnol é atribuída às suas características químicas e morfológicas. Esses
materiais lignocelulósicos são constituídos de fibras de celulose
envolvidas em uma matriz amorfa de polioses e lignina (SANTOS et al.,
2012). A Tabela 1 mostra o percentual dos componentes químicos
presentes na palha e bagaço de cana. Nas plantas, as cadeias lineares de
celulose promovem a rigidez, a lignina atua como barreira física contra o
ataque dos microrganismos, e a hemicelulase proporciona a ligação entre
a celulose e a lignina formando uma complexa rede fibrosa (Figura 1).
Assim, os dois maiores obstáculos à hidrólise da celulose dos materiais
lignocelulósicos, etapas limitantes na produção de etanol, são a
recalcitrância da celulose cristalina (proveniente da estrutura linear das
164 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

cadeias de celulose compactadas em microfibrilas) e a alta proteção que a


lignina oferece à estrutura celulósica, servindo de defesa ao ataque das
enzimas hidrolíticas.
Tabela 1 – Biomassa Lignocelulósica da cana-de-açúcar

Biomassa % % % Lignina
Lignocelulósica Celulose Hemicelulose

Palha de cana 40-44 30-32 22-25

Bagaço de cana 32-48 19-24 23-32

Fonte: Modificado de Santos (2012)


Figura 1 – Estrutura recalcitrante da celulose presente na cana-de-açucar.

Fonte: Modificado de Santos (2012)


3.1 CELULOSE
A celulose, pode ser classificada em três níveis organizacionais
(Figura 2). O primeiro é definido pela sequência de resíduos β-D-
glicopiranosídicos unidos por ligações covalentes, formando o
homopolímero de anidroglicose com ligações β-D (1→4) glicosídicas, de
fórmula geral (C6H10O5)n. O segundo nível descreve a conformação
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 165

molecular, isto é, a organização espacial das unidades repetitivas, e é


caracterizado pelas distâncias das ligações e respectivos ângulos e pelas
ligações de hidrogênio intramoleculares. O terceiro nível define a
associação das moléculas, formando agregados com uma determinada
estrutura cristalina. Estes agregados conferem elevada resistência à tensão,
tornando a celulose insolúvel em água e em um grande número de outros
solventes (SANTOS et al., 2012)
Figura 2 – Estrutura da celulose.

Fonte: Modificado de Santos (2012)


3.2 HEMICELULOSE
Hemicelulose é o segundo material orgânico renovável mais
abundante na terra depois da celulose. As hemiceluloses são
heteropolissacarídeos complexos compostos por D-glucose, D-galactose,
D-manose, D-xilose, L-arabinose, ácido D-glucurônico e ácido 4-O-metil-
glucurônico (Figura 3). São estruturalmente mais semelhantes à celulose
do que a lignina. A estrutura apresenta ramificações que interagem
facilmente com a celulose, dando estabilidade e flexibilidade ao agregado.
Comparadas com a celulose, as hemiceluloses apresentam maior
susceptibilidade à hidrólise ácida, pois oferecem uma maior acessibilidade
aos ácidos minerais comumente utilizados como catalisadores (SANTOS
et al., 2012).
Figura 3 – Estrutura da Hemicelulose.

Fonte: Santos (2012)


166 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

3.3 LIGNINA
A lignina é uma macromolécula orgânica mais complexa e menos
caracterizada na biomassa lignocelulósica e é também um “gargalo” na
produção de bioetanol por hidrólise enzimatica. Depois da celulose, é a
macromolécula mais abundante dentre as biomassas lignocelulósicas
(Figura 4). É um heteropolímero amorfo que consiste em três diferentes
unidades de fenilpropanos: álcool p-cumarílico, álcool coferílico e álcool
sinapílico. A estrutura da lignina não é homogênea, possui regiões amorfas
e estruturas globulares. A composição e a organização dos constituintes da
lignina variam de uma espécie para outra, dependendo da matriz de
celulose-hemicelulose. No processo de hidrólise enzimática dos materiais
lignocelulósicos, a lignina atua como uma barreira física para as enzimas
que podem ser irreversivelmente capturadas pela lignina e,
consequentemente, influenciar na quantidade de enzima requerida para a
hidrólise, assim como dificultar a recuperação da enzima após a hidrólise
(SANTOS et al., 2012).
Figura 4 – Estrutura da Lignina

Fonte: Maestrovirtuale(2021)
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 167

4 ETAPAS NA PRODUÇÃO DE BIOETANOL DE SEGUNDA


GERAÇÃO
Um dos principais gargalos que envolvem a produção de etanol
celulósico é “desmontar” a parede celular liberando os polissacarídeos
como fonte de açúcares fermentescíveis (glicose) de forma eficiente e
economicamente viável. A Figura 5 ilustra de forma resumida as etapas,
sendo as mais críticas o pré-tratamento da biomassa e a hidrólise da
celulose.
Figura 5- Representação esquemática da produção de etanol a partir de
biomassa lignocelulósica

Fonte Modificado de Santos (2012).


168 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Considerando o levantamento realizado por Santos et al. (2012), no


caso da cana-de-açúcar no Brasil, a produtividade é de 85 toneladas por
hectare, sendo que para cada tonelada de cana processada são gerados
cerca de 140 kg de palha e 140 kg de bagaço em base seca, ou seja, 12
toneladas de palha e 12 toneladas de bagaço. Considerando que toda
glicose vai ser convertida em bioetanol, o aproveitamento integral da cana-
de-açúcar (colmo, palha e bagaço) poderá aumentar significativamente a
produção de bioetanol por hectare, passando dos atuais 7.000 L para
aproximadamente 14.000 L, sem necessidade de expansão da área
cultivada. A Figura 6 mostra as etapas do balanço de massa para 1 tonelada
de biomassa de cana-de-açúcar.
Figura 6- Rendimento teórico da produção de bioetanol

Fonte Modificado de Santos (2012).


Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 169

4.1 PRÉ-TRATAMENTO DA BIOMASSA LIGNOCELULÓSICA


O pré-tratamento visa remover a lignina e a hemicelulose da
biomassa, reduzir a cristalinidade da celulose e aumentar a porosidade do
material para melhorar o acesso das enzimas à celulose e, assim aumentar
a conversão dos polissacarídeos em açúcares fermentáveis (MOSIER et
al., 2005). Na Figura 7 é possível observar um esquema do pré tratamento.
A eficiência de remoção de lignina depende do tipo empregado e das
condições ideais mantidas durante o procedimento. Os processos de pré-
tratamento, que são os mais onerosos na conversão da biomassa à açucares
fermentescíveis, podem ser físicos, químicos, biológicos ou podem ser
uma combinação desses métodos. Na Tabela 2 pode-se observar os
diferentes pré tratamentos possíveis para a biomassa. Embora diferentes
métodos estejam disponíveis, o desenvolvimento desta etapa com menos
formação de inibidores é um desafio na produção de bioetanol. (MOSIER
et al., 2005; RABELO et al., 2011; NIJU; SWATHIKA, 2019).
Um pré-tratamento efetivo deve obedecer a uma série de
características, tais como resultar em uma elevada recuperação de todos os
carboidratos, e elevada digestibilidade da celulose na hidrólise enzimática
subsequente, elevada concentração de sólidos e elevada concentração de
açúcares livres na fração líquida. Além disso, deve possuir uma baixa
demanda energética, evitar a formação de subprodutos e ter investimento
e custo operacional baixos.
Figura 7- Esquema do complexo celulose-hemicelulose-lignina no pré-
tratamento.

Fonte Modificado de Mosier (2004)


170 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Tabela 2 – Pré Tratamentos

Fonte: Santos et al. (2013)

Os pré-tratamentos químicos e combinados têm recebido uma maior


atenção, já que removem a lignina sem degradar a cadeia celulósica. Pelo
fato da lignina estar quimicamente ligada às hemiceluloses, uma
degradação parcial das hemiceluloses ocorre no processo de pré-
tratamento químico. Dentre estas técnicas de pré-tratamento da biomassa
lignocelulósica, pode-se destacar a explosão a vapor, expansão da fibra de
amônia (AFEX) e utilização de ácido diluído como os métodos mais
estudados e promissores no processo de obtenção de etanol a partir da
biomassa lignocelulósica (SANTOS et al., 2012).
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 171

A Figura 8 ilustra a representação do dos pré-tratamentos: (1)


explosão a vapor: vapor saturado (160-240 oC) no tempo (2-30 min); (2)
ácido: solução com ácido (sulfúrico, clorídrico, fosfórico ou nítrico),
temperatura (140-200 oC), tempo (10-60 min) e pressão (9-17 bar); (3)
AFEX: amônia líquida, temperatura (100-180 oC), tempo (10-60 min) e
pressão (9-17 bar). (SANTOS et al., 2012).
Figura 8- Esquema do pré tratamento

Fonte Modificado de Santos (2012)


Atualmente, várias metodologias de pré-tratamento estão sendo
investigadas, no entanto, cada uma tem suas vantagens e desvantagens,
uma vez que as mesmas dependem da natureza do material lignocelulósico
e sua posterior aplicação. São vários fatores a serem analisados como
rendimento, consumo de energia, formação de inibidores tóxicos,
corrosão, custo de reagentes e enzimas, recuperação do solvente, etc. A
escolha deve ser baseada em critérios tanto técnicos quanto econômicos já
que o pré-tratamento é uma das etapas mais custosas na produção de
bioetanol de segunda geração.
172 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

4.2 HIDRÓLISE
A hidrólise propriamente dita, ocorre após a etapa de pré tratamento
e tem como objetivo converter a celulose em glucose, após quebrar as
ligações glicosídicas, ou seja, produzir açúcares diretamente
fermentescíveis. É a rota com maior potencial de promover o incremento
da produção de bioetanol (sem expandir a fronteira agrícola), bem como
aumentar a eficiência de conversão de energia primária da cana-de-açúcar
(SANTOS et al., 2013). Nesta etapa a hidrólise pode ser catalisada por
ácidos ou enzimas. A hidrólise ácida, utiliza um ácido como catalisador,
pode ser ácido diluído ou concentrado, já a hidrólise enzimática é feita com
um complexo enzimático. A hidrólise enzimática apresenta algumas
vantagens em comparação à ácida como, maior especificidade do
biocatalisador e menores taxas de degradação da glicose, também
apresenta um custo menor, pois é conduzida em condições moderadas (pH
4,8 e Temperaturas de 45 - 50 ° C), além de não ter problemas de corrosão
(SUN; CHENG, 2002).
4.2.1 Hidrólise Ácida
Os processos de hidrólise ácida podem envolver duas situações:
aqueles que utilizam ácidos concentrados e os que utilizam ácidos diluídos.
A hidrólise ácida, feita com catalisadores ácidos, tem o ácido sulfúrico
como o ácido mais utilizado. Porém, há casos onde pode ser encontrada a
utilização de outros ácidos inorgânicos, como o ácido clorídrico, o ácido
nítrico e o fosfórico. Problemas com a hidrólise ácida consistem no fato da
necessidade de recuperação ou neutralização dos ácidos antes de efetuar-
se a fermentação e também na grande quantidade de resíduos produzidos
(ZABED et al., 2016).
O processo com ácido diluído é o mais antigo. Este processo envolve
duas reações de hidrólise; na primeira a fração de hemicelulose é
convertida em açúcares e outros coprodutos por meio da utilização de
ácido diluído e vapor. A temperatura do processo está na faixa de 130 -
190 ºC, com tempo de 10-30 min. O segundo estágio de hidrólise também
é realizado com ácido diluído e vapor, mas as temperaturas são mais
severas, entre 190 e 265 ºC, e com tempo de residência muito curto, só
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 173

alguns segundos. Os açúcares no segundo estágio são tratados com


hidróxido de cálcio e, algumas vezes, com uma pequena adição de sulfato
de sódio antes da fermentação. Esse tratamento neutraliza os hidrolisados
e remove as substâncias inibidoras. Em média, os rendimentos são de 89%
para manose, 82% para galactose, mas apenas 50 % para glicose
(HAMELINCK; VAN HOOIJDONK; FAAIJ, 2005).
O processo com ácido concentrado requer, primeiramente, um pré-
tratamento com um ácido (diluído ou concentrado), a fim de liberar os
açúcares da hemicelulose. Em seguida, é requerida uma segunda etapa,
com a adição de ácido sulfúrico concentrado (70-90%). A segunda etapa
tem como objetivo converter a celulose em glicose, e é feita a temperaturas
moderadas, levando a pouca degradação (HAYES, 2009). A hidrólise com
ácido concentrado tem um alto rendimento (90%) e o procedimento dura,
por volta de 10 a 12 horas no total (HAMELINCK; VAN HOOIJDONK;
FAAIJ, 2005).
4.2.2 Hidrólise Enzimática
A hidrólise enzimática da celulose utiliza enzimas denominadas
celulases, as quais são altamente especificas. Consiste em um complexo
enzimático representado pelas endoglucanases. exoglucanases e -
glicosidades.
As endoglucanases hidrolisam randomicamente as regiões internas
da estrutura amorfa da celulose, liberando oligossacarídeo menores. Essas
enzimas são responsáveis pela rápida solubilização da fibra de celulose.
Os produtos gerados pelas endoglucanases, tornam-se então substrato para
as exoglucanases as quais clivam os oligossacarídeos, liberando
principalmente celobiose. As principais representantes das exoglucanases
são as celobiohidrolases, que podem atuar tanto na extremidade redutora
quanto na não redutora da celulose. As -glicosidades impedem a
acumulação da celobiose, realizando a quebra dela em glicose. A celobiose
é um inibidor mais forte do que a glicose, sendo interessante que ela seja
rapidamente hidrolisada em glicose pelas -glicosidades (SUN; CHENG,
2002).
174 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Os fatores que afetam a hidrólise enzimática da celulose incluem


substratos (concentração e características estruturais), concentração de
celulase e condições de reação (temperatura e pH). Com base na
complexidade da hidrólise enzimática, busca-se sempre melhorar o
rendimento e a taxa de hidrólise, mas para isto, são necessários extensos
estudos de otimização do processo, o que resultará em um aumento da
atividade da celulase e consequentemente na produção de açúcares
fermentescíveis.

4.3 FERMENTAÇÃO

A fermentação alcoólica inicia-se com a glicólise, também chamada


de via Embden-Meyerhof, na qual ocorre a oxidação da glicose em dois
ácidos pirúvicos em duas etapas, podendo ocorrer na presença de oxigênio
ou não. Na primeira etapa, duas moléculas de ATP são utilizadas enquanto
uma molécula de glicose é fosforilada, reestruturada e quebrada em dois
compostos de três carbonos: gliceraldeído 3-fosfato (GP) e diidroxiacetona
fosfato (DHAP), que é imediatamente convertida em GP. Na segunda
etapa, as duas moléculas de GP são oxidadas, em muitos passos, em duas
moléculas de ácido pirúvico. Nessas reações, duas moléculas de NAD +
são reduzidas a NADH e quatro moléculas de ATP (adenosina trifosfato)
são formadas pela fosforilação em nível de substrato, com saldo final
positivo de duas moléculas de ATP para cada molécula de glicose que é
oxidada. Após a glicólise, as duas moléculas de ácido pirúvico são
convertidas em duas moléculas de acetaldeído e duas moléculas de CO2.
As moléculas de acetaldeído são então reduzidas por duas moléculas de
NADH para formar duas moléculas de bioetanol (Figura 9).
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 175

Figura 9- Fermentação alcóolica

Fonte: Modificado de Tortora; Funke; Case (2013)


Na fermentação os microrganismos empregados são suscetíveis ao
hidrolisado lignocelulósico. O processo vai depender da cepa e condições
de fermentação (temperatura, pH, aeração e suplementação com
nutrientes). A fermentação apresenta condições indesejadas, como
acúmulo de bioetanol, diminuições graduais do pH, mudança para um
crescimento aeróbio e limitação de nutrientes. O estresse osmótico,
causado pelos íons e açúcares no hidrolisado, e o acúmulo de álcool são
conhecidos por inibir o crescimento e a viabilidade da levedura, afetando
o desempenho da fermentação do bioetanol (ROBAK; BALCEREK,
2018).
176 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Na produção industrial de bioetanol utilizando biomassa


lignocelulósica, os microrganismos devem apresentar termotolerância e
alta atividade fermentativa para carboidratos simples, como glicose e
xilose (um padrão de utilização de açúcar adequado). Eles também devem
fornecer alto rendimento em etanol (acima de 90% do rendimento teórico),
alta tolerância ao etanol (acima de 40 g/L), baixa necessidade de
crescimento no meio, alta resistência a estressores do meio, como
inibidores gerados durante o processo industrial (especificamente, furfural
e 5-hidroximetil furfural) e resistência a pH ácido e temperaturas mais
altas, o que evita a contaminação microbiológica (ROBAK; BALCEREK,
2018). Outros requisitos são a capacidade de crescer em diferentes meios
(frequentemente substratos lignocelulósicos, como resíduos de colheitas
ou resíduos florestais), taxa de crescimento rápida e adequação para
modificação genética.
Pesquisas tem se concentrado no isolamento, identificação e
avaliação de cepas de leveduras que apresentam potencial para produção
de etanol a partir de glicose e xilose. O fato é que os microrganismos
possuem uma preferência natural pelo consumo de certos açúcares, muitas
vezes a glicose ao invés da xilose. Cepas promissoras para fermentação
são selecionadas com base em seu comportamento na presença de
inibidores em meios de fermentação e após a aplicação de diferentes
métodos de pré-tratamento. Cepas isoladas de Saccharomyces cerevisiae
JRC6 e Candida tropicalis JRC1 são recomendadas para fermentação de
hidrolisados lignocelulósicos após pré-tratamento alcalino e pré-
tratamento ácido, respectivamente (CHOUDHARY et al., 2017). Certas
cepas, como Saccharomyces cerevisiae e Zymomonas mobilis, são
adequadas para a produção de bioetanol, mas seu uso com hidrolisados
lignocelulósicos não é viável (ROBAK; BALCEREK, 2018)
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 177

4.4 DESTILAÇÃO E PURIFICAÇÃO


O projeto conceitual da biorrefinaria de E2G é mostrado na Figura
10 e que consiste em cinco seções principais: pré-tratamento,
sacarificação, fermentação, destilação e purificação. O caldo de
fermentação é enviado para a seção de destilação, onde duas colunas são
usadas para concentrar o etanol próximo ao seu ponto azeotrópico. A
primeira coluna separa o caldo de fermentação em duas correntes
principais: a corrente do destilado que é composta principalmente de
etanol diluído e o fluxo de fundo que contém biomassa não convertida,
impurezas inorgânicas e água. O fluxo de fundo é centrifugado, para que
os sólidos sejam enviados para a seção de cogeração (onde o calor e
eletricidade são produzidos pela combustão sólida) e o líquido
centrifugado é enviado para o efluente na seção de tratamento (onde a água
recuperada é reciclada de volta ao processo). O fluxo de destilado é então
enviado para a segunda coluna (retificadora), onde o condensado de topo
contém bioetanol concentrado (cerca de 90% p/p). Finalmente, o produto
destilado da coluna retificadora é enviado para a seção de purificação para
a desidratação do etanol, para atingir a categoria de grau de combustível
(99,98% p/p). O fluxo de fundo da coluna retificadora contém água pura
que também é reciclada no processo.
Figura 10- Processo produtivo de bioetanol 2G incluindo Destilação e
Purificação

Fonte: Modificado de Gonzalez-Contreras et al., (2020)


178 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Com relação à seção de purificação, é importante lembrar que a


obtenção do bioetanol anidro não é um processo simples, pois requer a
separação da mistura azeotrópica de bioetanol-água. Para isso, existem
diferentes processos de desidratação, entre os quais estão: destilação a
vácuo, destilação azeotrópica, destilação extrativa, adsorção com peneiras
moleculares, pervaporação e processos híbridos. Foi relatado que um
menor consumo de energia foi alcançado com a peneira molecular e
tecnologias de destilação extrativa (GIL et al., 2008; GONZALEZ-
CONTRERAS et al., 2020).
5 CONFIGURAÇÕES DE PROCESSO PARA A PRODUÇÃO DE
BIOETANOL
A integração do processo com diferentes configurações reduz o
custo de capital e torna a produção de biocombustíveis mais eficiente e
economicamente viável (DEVARAPALLI; ATIYEH, 2015).
Após o pré-tratamento eficiente do material lignocelulósico, podem
ser empregadas várias configurações ou métodos ou estratégias de
processamento. Devido à presença de vários açúcares no meio reacional,
muitas vezes o multiprocessamento, ou seja, o emprego simultâneo de
enzimas e de microrganismos fermentadores mostra-se como uma
alternativa recomendável. A Figura 11 ilustra quatro formas de realizar-se
a etapa de fermentação, sendo elas: Hidrólise e Fermentação Separadas
(SHF), Sacarificação e Fermentação Simultâneas (SSF), Sacarificação e
Co-fermentação Simultâneas (SSCF) e Bioprocesso Consolidado (CPB)
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 179

Figura 11- Esquema de configurações para fermentação

Modificado de Beig et al., (2020)


5.1 HIDRÓLISE E FERMENTAÇÃO SEPARADAS (SHF)
Quando as etapas de hidrólise e fermentação são realizadas
separadamente, a configuração é dita Hidrólise e Fermentação
Simultâneas. Pode ser feita por meios químicos ou enzimáticos. A
principal vantagem da configuração SHF é o fato de que, uma vez
otimizados o pH e a temperatura de operação de cada uma das etapas,
pode-se operá-la nas condições ótimas tanto da hidrólise quanto da
fermentação. Alguns problemas deste método podem ocorrer, como
contaminação e perda de açúcares durante a separação de sólidos e líquidos
após a realização da hidrólise da celulose. Na etapa de sacarificação do
processo SHF, as enzimas são mais propensas a serem inibidas devido aos
inibidores presentes no hidrolisado e o processo torna-se mais complicado
quanto mais longo o processo reacional (BEIG et al., 2020).
180 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

5.2 SACARIFICAÇÃO E FERMENTAÇÃO SIMULTÂNEAS (SSF)


O SSF é um método de fermentação de uma etapa, realizado em um
único equipamento, é mais simples de executar e utiliza menos energia
(BEIG et al., 2020).
No SSF, a taxa de produção de enzima afeta a taxa de produção de
álcool. Além disso, as celulases usadas para hidrólise e os microrganismos
em fermentação geralmente têm diferentes condições ótimas de pH e
temperatura. É importante que existam condições compatíveis tanto para a
enzima quanto para o microrganismo. Outro problema com SSF é que a
maioria dos microorganismos usados para fermentação de glicose não
pode utilizar xilose, um produto de hidrólise da hemicelulose
(DEVARAPALLI; ATIYEH, 2015).
5.3 SACARIFICAÇÃO E CO-FERMENTAÇÃO SIMULTÂNEAS
(SSCF)
No processo de Sacarificação e Co-fermentação Simultânea (SSCF),
glicose e xilose são co-fermentadas no mesmo reator. As cepas de
Saccharomyces cerevisiae e Zymomonas mobilis são geneticamente
modificadas para co-fermentar glicose e xilose. (DEVARAPALLI;
ATIYEH, 2015).
5.4 BIOPROCESSO CONSOLIDADO (CPB)
Outro método de integração de processos é o Bioprocessamento
Consolidado (CBP), em que um único microrganismo é usado para as
etapas de hidrólise e fermentação. Isso potencialmente reduz os custos de
capital e aumenta a eficiência do processo. No entanto, os microrganismos
que podem produzir enzimas para hidrólise da biomassa e fermentar os
açúcares liberados ainda estão no estágio inicial de desenvolvimento.
(DEVARAPALLI; ATIYEH, 2015).
Bioetanol a partir da biomassa de cana de açúcar | 181

REFERÊNCIAS
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APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS DA
AGROINDÚSTRIA SUCROALCOOLEIRA EM
SISTEMAS DE COMPOSTAGEM

Olívia Gomes Martins24


Meire Cristina Andrade Cassimiro da Silva25

1. Fundamentos do processo de compostagem aplicado ao


aproveitamento de resíduos
1.1. Compostagem e resíduos: definição e benefícios
A compostagem orgânica é um processo biológico, termofílico e
controlado, no qual ocorre a biotransformação da matéria orgânica em
material humificado, conhecido como composto orgânico. É possível
utilizar esse material como fertilizante em diversas culturas agrícolas. Por
se tratar de um processo ambientalmente sustentável, esta técnica de gestão
de resíduos sólidos tem ganhado contínuo destaque (LOPES; VIDOTTI;
MARTINS, 2017).
Na compostagem, microrganismos realizam decomposição aeróbia
controlada da matéria orgânica, com geração de calor. O resultado desse
processo é um material estável, humificado, sanitizado e que pode ser
utilizado no solo sem causar danos ao meio ambiente (VALENTE et al.,
2009).
Diversos resíduos sólidos urbanos e agroindustriais podem ser
submetidos ao processo de compostagem, como restos de alimentos,
palhas, frutos, folhas, estercos, entre outros (SOUZA et al., 2020). É
possível também realizar este processo com resíduos orgânicos líquidos,
porém é necessário acrescentar a este tipo de resíduo um agente

24
Bióloga, M. Sc., Doutoranda em Agronomia (Energia na Agricultura), FCA/UNESP,
oliviagmartins@gmail.com
25
Engenheira Agrônoma, Bióloga, Dra., Docente das Faculdades Galileu, Gran Tietê e
Faculdade de Tecnologia de Curitiba, mcnandrade@hotmail.com
186 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

estruturante, como casca de arroz e serragem, para alterar suas


características físicas de modo a otimizar a sua compostagem. Para ambos
os tipos de resíduos, o processo é similar e depende da ação de
microrganismos em condições fisico-químicas adequadas (VALENTE et
al., 2009).
Em função da compostagem ocorrer de forma aeróbia, formam-se,
além da biomassa, CO2 e H2O como subprodutos, não ocorrendo a
formação do CH4, ou metano, que é 23 vezes mais poluente que o gás
carbônico. Este método de reciclagem de matéria orgânica, além de
valorizar os resíduos, evita a disposição destes em aterros, promove a
ciclagem de nutrientes, elimina patógenos do material e proporciona
economia no tratamento de efluentes, sendo uma alternativa
ambientalmente segura de gestão de resíduos (LACERDA et al., 2020).
1.2. O problema dos resíduos e a alternativa de compostagem
O Brasil está entre os dez países que mais desperdiçam alimentos no
mundo, com uma estimativa de que 35% da produção agrícola não é
aproveitada. Além da alta geração, os resíduos não são tratados e são
depositados diretamente em aterros sanitários ou lixões, juntamente com
outros tipos de lixo, resultando em impactos ao meio ambiente (SENA et
al., 2019).
No gerenciamento integrado e sustentável de resíduos sólidos,
objetiva-se, a princípio, evitar a geração de resíduos. Todavia, na
impossibilidade de se evitar a geração destes, deve-se, então, priorizar a
reutilização, a reciclagem e o tratamento dos resíduos antes da disposição.
Deste modo, só devem ser dispostos em aterros sanitários os resíduos que
não puderem ser contemplados em nenhuma das etapas anteriores
(LACERDA et al., 2020).
A Lei Federal nº 12.305, regulamentada pelo Decreto nº 7.404,
institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que, dentre outras
providências, também aponta a compostagem como uma destinação final
ambientalmente correta, além da reutilização, reciclagem, recuperação e
reaproveitamento energético (BRASIL, 2010a; 2010b).
Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 187

Estima-se que 60% dos resíduos gerados no Brasil são matéria


orgânica que pode ser reciclada por compostagem, um processo simples e
acessível de tratamento de resíduos. Por esta técnica, gera-se biomassa
reaproveitada da matéria orgânica, evitando-se o descarte dessa matéria
em aterros, além de outros benefícios ambientais (LACERDA et al., 2020).
1.3. Parâmetros físico-químicos do processo de compostagem
Para a compostagem de resíduos orgânicos, deve-se considerar
fatores físico-químicos como temperatura, umidade, pH, granulometria,
aeração, relação entre carbono e nitrogênio (C/N), entre outros. Em função
destes parâmetros se interrelacionarem e cada material a ser compostado
poder apresentar particularidades, estabelecer parâmetros ótimos para a
compostagem é desafiador (VALENTE et al., 2009).
1.3.1. Relação C/N
A relação C/N é um índice utilizado para avaliar a
biodegradabilidade ou os níveis de maturação de substâncias orgânicas e
seus efeitos no crescimento microbiológico, pois a atividade dos
microrganismos envolvidos no processo depende principalmente destes
dois nutrientes. Deve-se determinar a relação C/N da matéria orgânica a
ser compostada para balanço de nutrientes e, do composto, ao fim do
processo, para avaliar sua qualidade. O carbono, obtido geralmente dos
resíduos palhosos (vegetais secos) é a principal fonte de energia dos
microrganismos, enquanto o nitrogênio, oriundo de legumes e folhas
(frescos), é importante para a síntese de proteínas (SOUZA et al., 2020).
O excesso de nitrogênio pode ocasionar a morte de microrganismos
importantes para o processo de compostagem, bem como levar à
volatização deste nutriente na forma de amônia, resultando em mau odor.
A sua falta, porém, dificulta a síntese proteica e, consequentemente, o
desenvolvimento da microbiota necessária, fazendo com que o processo
demore mais (SILVA; DUARTE; ANSELMO, 2017).
Os microrganismos consomem de 15 a 30 vezes mais carbono do
que nitrogênio, de modo que se recomenda que a relação C/N fique entre
25-35/1. Ao longo do processo de compostagem, parte do carbono é
188 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

liberada na forma de CO2 e o restante se combina com o nitrogênio para o


desenvolvimento microbiano. Em função disso, a relação C/N cai durante
o processo, atingindo valores próximos a 18/1 durante a fase de
bioestabilização, e valor em torno de 10/1 no composto curado, que é o
produto final (BRIETZKE, 2016).
1.3.2. Umidade
A umidade é um dos fatores mais importantes para o metabolismo
microbiano e consequente degradação da matéria orgânica na
compostagem. Recomenda-se que o teor de umidade do material fique
entre 50 e 60%, pois a falta de água (abaixo de 30%) resulta na inibição da
atividade microbiana e o excesso (acima de 65%) gera anaerobiose,
fazendo com que a decomposição seja mais demorada, além de resultar na
perda de nutrientes por lixiviação. Como a matéria orgânica decomposta é
hidrófila, o excesso de água satura os micro e os macroporos das partículas,
reduzindo a penetração de oxigênio. Além disso, a temperatura do
processo de compostagem também pode ser afetada pelo nível de umidade,
em consequência do metabolismo microbiano (VALENTE et al., 2009).
Durante a compostagem, o teor de umidade tende a cair, o que pode
ser corrigido com irrigação conforme necessidade. O excesso de umidade
pode ser corrigido por meio da adição de matéria orgânica estruturante,
como palha de trigo, raspas ou serragem de madeira, casca de arroz, palhas,
gramas, folhas, entre outros (SILVA; DUARTE; ANSELMO, 2017).
1.3.3. pH
A faixa ideal de pH para o desenvolvimento da microbiota da
compostagem é entre 5,5 e 8,5, na qual ocorre a ativação da maioria das
enzimas necessárias para o processo, embora a compostagem também
possa ocorrer entre 4,5 e 9,5. Valores extremos são autorregulados por
meio da produção de subprodutos ácidos ou alcalinos pela microbiota
(VALENTE et al., 2009).
O pH elevado causa diminuição da atividade microbiana, resultando
em um maior período de latência, enquanto o pH baixo, embora não
impeça o processo, retarda o aumento da temperatura, em função da
Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 189

inibinção de microrganismos termófilos (SOUZA et al., 2020). Todavia,


durante a compostagem, ocorrem reações químicas do tipo ácido-base e de
óxido-redução, regulando a acidez e gerando um composto com pH entre
7,0 e 8,5 (VALENTE et al., 2009).
1.3.4. Temperatura
No início da compostagem, microrganismos mesófilos consomem os
componentes solúveis e facilmente assimiláveis do material, causando
aumento da temperatura no interior da leira, em função do metabolismo
exotérmico desses microrganismos. Nesta etapa, a temperatura do
composto eleva-se de 25 °C para 40-45 °C entre 48 e 72 horas. A partir de
45 °C, os microrganismos mesófilos são suprimidos e se inicia a fase
termófila, onde ocorre a maior decomposição dos compostos orgânicos
pela microbiota termófila. Conforme esses compostos são consumidos, a
temperatura cai novamente até a temperatura ambiente, onde a atividade
da microbiota mesófila é restaurada e o composto é humificado a partir da
degradação dos compostos mais resistentes (Figura 1) (VALENTE et al.,
2009).
Figura 1. Curva padrão da temperatura durante a compostagem

Fonte: SOUZA et al. (2020).


190 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

A temperatura é apontada como um parâmetro de eficiência do


processo de compostagem, refletindo a dinâmica da microbiota e seu
metabolismo. Entretanto, a temperatura pode ser afetada por diversos
fatores, como umidade, disponibilidade de nutrientes e tamanho da leira,
de modo que a temperatura ambiente do composto não é suficiente para se
afirmar que ele está maduro, sendo necessário avaliar a qualidade do
material final (SILVA; DUARTE; ANSELMO, 2017).
A temperatura acima de 50°C proporciona a eliminação de
microrganismos patogênicos, resultando na sanitização do composto.
Todavia, a manutenção de temperaturas acima de 70°C por muito tempo
pode causar a insolubilização de proteínas e o desprendimento de amônia,
bem como restringir a microbiota do material (VALENTE et al., 2009).
1.3.5. Aeração
A aeração é necessária para a manutenção da decomposição aeróbia,
sendo que níveis de oxigênio em torno de 10% já são suficientes para essa
condição. Além de manter a aerobiose, a aeração é um mecanismo
importante para se evitar temperaturas muito altas, aumentar a oxidação
da matéria orgânica, diminuir a liberação de odores e controlar o excesso
de água (SILVA; DUARTE; ANSELMO, 2017).
A decomposição aeróbia tem como subprodutos CO2 e H2O. Já na
decomposição anaeróbia, ou seja, na ausência de oxigênio, gera-se, além
de CO2, CH4 e ácidos orgânicos de baixo peso molecular. As leiras de
compostagem podem ser revolvidas de maneira manual ou mecânica para
manutenção da aeração. Entretanto, deve-se evitar a aeração excessiva,
pois pode resultar em perda de calor no interior da leira mais rapidamente
do que a microbiota é capaz de gerar, além de aumentar a emissão de
amônia e óxido nitroso (VALENTE et al., 2009).
1.3.6. Granulometria
A granulometria, ou seja, o tamanho das partículas, impacta
diretamente o processo de compostagem, pois quanto menor a
granulometria do material, maior será a área para que os microrganismos
realizem a digestão e decomposição do material (SOUZA et al., 2020). Por
Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 191

outro lado, partículas muito finas aumentam a densidade e compactação


do material, dificultando a difusão do oxigênio no interior da leira, gerando
zonas anaeróbicas, além de dificultar a distribuição dos microrganismos,
suas enzimas e metabólitos, diminuindo a eficiência do processo
(VALENTE et al., 2009).
Partículas muito grandes, embora ajudem a manter a aeração da leira,
reduzem a disponibilidade de carbono para os microrganismos,
dificultando a decomposição. Recomenda-se que as partículas do material
tenham tamanho entre 20 e 50 mm (VALENTE et al., 2009). O material
deve ser triturado e peneirado para se assegurar a homogeneidade e
proporcionar melhor aeração e distribuição da temperatura (SILVA;
DUARTE; ANSELMO, 2017).
1.3.7. Outros aspectos importantes
As dimensões da leira são um importante fator para assegurar a
eficiência do processo de compostagem, pois leiras muito baixas perdem
calor e umidade, enquanto leiras muito altas resultam em compactação da
base. Recomenda-se que as leiras tenham entre 0,8 e 1,8 m de altura e entre
2,5 e 3,5 m de largura, em formato triangular, para que a aeração seja
mantida sem perda excessiva de temperatura e umidade (SOUZA et al.,
2020).
Para comercialização do composto, o teor de matéria orgânica
exigido é de, no mínimo, 40%. Outro aspecto importante a se considerar é
a presença de metais pesados, como arsênio, cádmio, cromo, cobalto,
cobre, chumbo, mercúrio, níquel e zinco, sobretudo se o composto for
utilizado para atividade agrícola de produção de alimentos (SOUZA et al.,
2020).
2. Tipos de biomassas
Com a cultura da cana-de-açúcar, objetiva-se a produção de etanol e
açúcar por meio de processos industriais. Em decorrência desse
processamento, geram-se subprodutos como a palha e o bagaço
(MERCANTE, 2020).
192 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Estima-se que, para cada tonelada de cana-de-açúcar processada, há


a geração de 12 toneladas de palha e 12 toneladas de bagaço, biomassas
lignocelulósicas de alto poder calorífico (SANTOS et al., 2012).
2.1. Bagaço de cana-de-açúcar
O bagaço é um subproduto obtido após a moagem da cana-de-açúcar
para a produção de açúcar e etanol e que pode ser utilizado para a produção
de bioenergia por meio da queima em caldeiras (MERCANTE, 2020).
A composição deste material é de cerca de 50% de umidade, 45% de
fibras lignocelulósicas, 2-3% de sólidos insolúveis e 2-3% de sólidos
solúveis, sendo um material de alto valor energético (MERCANTE, 2020).
Dessa biomassa lignocelulósica, 32-48% correspondem à celulose, 19-
24% à hemicelulose e 23-32% à lignina (SANTOS et al., 2012).
2.2. Palha de cana-de-açúcar
A palha é um subproduto gerado na colheita da cana-de-açúcar,
sendo composta de folhas verdes, secas e pontas da cana. Normalmente,
fica depositada no solo, trazendo benefícios como proteção à erosão,
preservação da funcionalidade e formação de microbiota, porém alguns
lugares ainda realizam a queimada, que resulta na emissão de poluentes ao
meio ambiente (MERCANTE, 2020). Além dos benefícios ao solo, este
material também pode ser utilizado para a produção de etanol de segunda
geração (OLIVEIRA et al., 2020).
A composição química deste material varia em função da parte
analisada, sendo que, em relação à umidade, as folhas secas apresentam
cerca de 13,5%, as folhas verdes, 67,7% e as pontas, 82,3% (MERCANTE,
2020). Quanto ao teor de celulose, pode variar entre 40 e 44%, além de 30-
32% de hemicelulose e 22-25% de lignina (SANTOS et al., 2012).
3. Sistemas de compostagem
A decomposição aeróbia da compostagem necessita de aeração, que
pode ser obtida por meio de três sistemas principais: o revolvimento
mecânico ou manual das leiras, aeração forçada ou aeração passiva
(SOUZA, 2015).
Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 193

3.1. Sistema de leiras revolvidas


Neste sistema, o material é disposto em leiras e revolvido de forma
manual ou mecânica (Figura 2), de modo a promover a aeração e fazer com
que os microrganismos colonizem todo o material (MANYAPU et al.,
2017).
Figura 2. Sistema de leiras revolvidas

Fonte: MANYAPU et al. (2017).


3.2. Sistema de leiras estáticas aeradas
Neste sistema, a aeração pode ser de forma passiva (Figura 3) ou
forçada (Figura 4).
194 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Figura 3. Sistema de leiras estáticas com aeração passiva

v
Fonte: SEYEDBAGHERI (2010).
Figura 4. Sistema de leiras estáticas com aeração forçada

Fonte: Adaptado de Manyapu et al. (2017).


Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 195

Na aeração passiva, o material é homogeneizado e disposto por cima


de canos perfurados, que irão proporcionar aeração por convecção pela
leira. Acrescenta-se uma camada externa de composto pronto. Na aeração
forçada, sopradores de ar são colocados nas extremidades dos canos, de
modo que a frequência e duração da aeração pode ser controlada,
normalmente acionada quando a temperatura atinge 65°C (MANYAPU et
al., 2017).
3.3. Vantagens e desvantagens dos sistemas
Para decidir qual sistema de compostagem é mais adequado para
cada caso, deve-se levar em consideração as particularidades da área e do
sistema. No sistema de leiras revolvidas, tem-se como principais vantagens
a flexibilidade de se processar volumes variáveis de resíduos e o uso de
equipamentos de fácil utilização no revolvimento. Além disso, o teor de
umidade pode ser rapidamente controlado no caso de liberação de vapor
de água durante o revolvimento, além da geração de um composto
homogêneo e de alta qualidade (REIS, 2005). Em contrapartida, esse
sistema é altamente trabalhoso, sobretudo se realizado de forma manual; o
controle da temperatura pode ser difícil pela liberação de calor, vapor e
gases no revolvimento (MANYAPU et al., 2017), o que também pode
ocasionar a geração de odores. Ademais, o sistema de leiras revolvidas
requer grandes áreas, pois é necessário espaço entre as leiras para a
realização do revolvimento, e o monitoramento da aeração deve ser
cuidadoso para garantir a elevação da temperatura (REIS, 2005).
No sistema de leiras estáticas, não há a necessidade de grandes áreas,
de modo que a área disponível é otimizada, o investimento é baixo por não
necessitar de equipamentos de revolvimento (SOUZA, 2015) e os odores
são mais facilmente controlados (REIS, 2005). Todavia, neste sistema o
tempo para obtenção do composto pronto é maior, podem ser encontrados
materiais heterogêneos no composto e é de difícil controle de umidade e
temperatura, uma vez que estas variáveis se estabeleçam (MANYAPU et
al., 2017), tornando necessário um bom dimensionamento do sistema de
aeração e controle dos aeradores durante a compostagem (REIS, 2005).
196 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

4. Microbiota da compostagem
4.1. Principais grupos
Na compostagem, tem-se a atuação de fungos, arqueas e,
principalmente, bactérias. A dinâmica da microbiota da compostagem é
complexa, dependendo tanto dos parâmetros da compostagem quanto das
relações ecológicas entre os grupos de microrganismos presentes no
composto. Na compostagem, um grupo de microrganismos modifica o
ambiente, possibilitando o desenvolvimento de outro grupo. Por exemplo,
a degradação inicial por microrganismos mesófilos causa um aumento na
temperatura da leira, possibilitando o surgimento de microrganismos
termófilos, que novamente são substituídos por mesófilos quando a
atividade microbiana e a temperatura são reduzidas (ANTUNES, 2016).
De maneira geral, bactérias da ordem Lactobacillales estão presentes
no início do processo, em temperaturas mesofílicas, enquanto que, na fase
termofílica, encontra-se majoritariamente microrganismos das ordens
Bacillales, Clostridiales e Actinomycetales, sobretudo os gêneros Bacillus,
Clostridium, Thermus, Thermobispora e Streptomyces. Embora o estudo
da dinâmica da sucessão da compostagem seja difícil, constatou-se que os
filos mais comuns são Actinobacteria, Firmicutes, Bacteroidetes e
Proteobacteria (ANTUNES, 2016).
4.2. Formas de atuação
Inicialmente, microrganismos mesófilos convertem o nitrogênio
orgânico em nitrogênio amoniacal, parte do qual parte é perdida por
volatização e parte é convertida em nitratos, acidificando o composto. Em
condições anaeróbias, o nitrato é desnitrificado, alcalinizando o composto.
Ainda, durante a fase inicial, bactérias e fungos mesófilos irão decompor,
por ação enzimática, a fração mais prontamente assimilável da matéria
orgânica, como açúcares, amidos e proteínas de fácil digestão. A quebra
inicial da matéria orgânica causa aumento da temperatura, levando à fase
termofílica (DELGADO, 2017).
Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 197

Na fase termofílica, a microbiota mesófila é suprimida e tem-se o


desenvolvimento de actinomicetos, bactérias e fungos termófilos. Nesta
fase, os lipídeos e frações de hemicelulose são degradados por bactérias.
Já a celulose e a lignina são degradados por actinomicetos e fungos
(DELGADO, 2017), por meio da ação de enzimas, sobretudo celulases,
hemicelulases, ligninases e pectinases (ANTUNES, 2016).
5. Possibilidade de uso do composto
5.1. Horticultura
Na horticultura tradicional, o solo é revolvido rotineiramente com
enxadas, sendo desestruturado. Neste sentido, a horticultura orgânica
proporciona um manejo menos intensivo do solo, com a utilização de
fertilizantes orgânicos, como o composto orgânico (SCHWENGBER,
2017).
O composto pode ser aplicado de diversas formas. Pode ser utilizado
como cobertura superficial, espalhando-o sobre o solo e realizando o
plantio; incorporado no solo em uma profundidade de 2 a 10 cm, de forma
manual ou com maquinário; utilizado em sulcos, depositando-se o
composto nas linhas ao lado onde será feito o plantio; ou em covas,
misturando-o com o solo para realizar o plantio ou transplantio (SENAR,
2009).
As vantagens da utilização do composto na horticultura são o
aumento do rendimento da planta, redução do uso de fertilizantes, melhor
utilização da irrigação, aumento da resistência da planta contra pragas e
doenças, maiores teores de matéria orgânica no solo, maior disponibilidade
de água e nutrientes para as plantas, melhor estruturação do solo e redução
de fitopatógenos e pragas no solo (PAULIN; O’MALLEY, 2008).
5.2. Silvicultura
A utilização do composto na silvicultura pode superar os benefícios
da utilização de fertilizantes comuns. Dentre os benefícios, destacam-se a
melhoria na qualidade do solo, fornecimento de macro e micronutrientes,
adição de matéria orgânica, fornecimento de microrganismos benéficos ao
198 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

solo, estabilização do pH, capacidade de imobilização ou degradação de


alguns poluentes e melhoria da qualidade da água, o que irá proporcionar
melhores condições para o estabelecimento e crescimento das plantas,
tanto de árvores quanto de vegetação rasteira (HENRY, BERGERON,
2005). A Figura 5 exemplifica a atuação do composto no solo para
silvicultura.
Figura 5. Benefícios da utilização de composto na silvicultura

Fonte: Adaptado de Henry e Bergeron (2005).


É possível utilizar o composto para reflorestamento de áreas
desmatadas e erodidas, como beiras de estradas, locais de mineração,
locais campestres e áreas queimadas. Deve-se levar em consideração o
declive da área a ser restaurada, de modo que áreas muito íngremes podem
não reter o composto eficientemente. A aplicação pode ser em uma ou
várias camadas, a depender da necessidade, com utilização de maquinário
adequado (HENRY; BERGERON, 2005).
5.3. Fungicultura
Para o cultivo de cogumelos, deve-se escolher corretamente o
substrato, levando-se em consideração os seus teores de carbono e
nitrogênio. Comumente, são utilizadas palhas, capins e outros resíduos
agrícolas, com ou sem suplementação de nitrogênio (ALQUATI, 2015). A
Tabela 1 contém a composição do substrato tradicional para compostagem
para o cultivo do cogumelo Pleurotus ostreatus (shimeji branco).
Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 199
200 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Este material pode ser compostado seguindo as etapas descritas na


Figura 6. Recomenda-se a realização deste processo em barracão aberto,
com cobertura em chapa galvanizada e piso de concreto. Antes de formar
as leiras, na fase de pré-compostagem, deve-se umedecer as palhas a
aproximadamente 75%, revirando-as a cada 2 dias (Figura 7A). Após essa
fase, montam-se as leiras de compostagem (Figura 7B), que deverão ser
reviradas também a cada 2 dias. Pode-se acrescentar mais água na Fase I,
durante as reviradas, conforme a necessidade, para se manter a umidade
média de 75%. Este processo pode ser realizado manualmente com
mangueira. Para a Fase II, o substrato deve ser pasteurizado por 8 horas a
62º C ± 2º C e condicionado por 4 dias a 48º C ± 2º C, em pasteurizador
ou câmara climatizada, seguido de resfriamento natural por 3 dias até
atingir temperatura ambiente (SIQUEIRA, 2015).
Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 201
202 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

Figura 7. (A) Pré-umedecimento da palha de cana-de-açúcar. (B)


Montagem das leiras de compostagem

Fonte: SIQUEIRA (2015).


Em seguida, o composto deve ser ensacado e inoculado com a
linhagem fúngica desejada. Recomenda-se uma proporção de inóculo de
40g Kg-1 de massa fresca do composto. Este procedimento deve ser
realizado em condições assépticas para se evitar contaminação,
higienizando-se os utensílios com álcool 70%. Após inoculados, os
pacotes devem ser incubados (Figura 8A) por 30 dias a uma temperatura
média de 25° C e umidade relativa de 55% a 70%. O período de
frutificação (Figura 8B) e colheita é de cerca de 60 dias. A colheita deve
ser feita segurando-se a base do cacho de cogumelos e torcendo-o
gentilmente, destacando-o do pacote (SIQUEIRA, 2015).
Figura 8. (A) Incubação (B) Início da frutificação

Fonte: SIQUEIRA (2015).


Aproveitamentos de resíduos da agroindústria sucroalcooleira em sistemas... | 203

6. Aspectos legais, institucionais e mercadológicos


6.1. Normas a serem observadas
A Instrução Normativa nº 25 de 23/07/2009, da Secretaria de Defesa
Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento,
instrui sobre fertilizantes orgânicos simples, mistos, compostos,
organominerais e biofertilizantes destinados à agricultura. Os fertilizantes
orgânicos cuja matéria prima é de origem vegetal, animal ou da
agroindústria, sem a utilização de metais pesados, tóxicos e elementos ou
compostos orgânicos sintéticos potencialmente tóxicos, cujo resultado seja
um produto seguro para utilização na agricultura, são classificados como
Classe “A”. Para esta classificação, deve-se observar os seguintes
parâmetros: umidade máxima de 50%, nitrogênio total mínimo de 0,5%,
carbono orgânico mínimo de 15%, pH mínimo de 6,0 e relação C/N
máxima de 20/1 (BRASIL, 2009).
6.2. Responsabilidade da empresa de compostagem
O composto a ser comercializado é de total responsabilidade da
empresa de compostagem, cabendo à empresa atender os parâmetros
técnicos especificados pela legislação vigente. Deste modo, mesmo que o
processo de compostagem para obtenção do produto final seja terceirizado,
a empresa que irá comercializar o composto deve manter controle sobre o
procedimento, adotando diferentes estratégias, fixando padrões
operacionais, obtendo dados analíticos e verificando a qualidade do
produto (FERNANDES; SILVA, 1999). Portanto, deve-se atentar à
origem do material, presença ou não de metais pesados e elementos
potencialmente tóxicos, bem como a conformidade aos parâmetros
técnicos.
6.3. Aspectos mercadológicos
Embora não haja parâmetros fixos de preço de venda do composto,
esse valor deve ao menos suprir os custos de operação da empresa que o
comercializa. Deste modo, o preço pode variar em função da qualidade do
produto, da infraestrutura, do maquinário necessário para produzi-lo e da
demanda do mercado. Recomenda-se adotar estratégias de marketing para
204 | Cana-de-açúcar: manejo, ecologia e biomassa

se expor os benefícios agronômicos, a segurança e as vantagens financeiras


da utilização do composto para os consumidores. Neste sentido, uma
possibilidade de divulgação é a realização de palestras e cursos práticos
com a aplicação do composto, com dias de campo para que o público possa
averiguar os resultados de sua utilização. É importante a figura do
engenheiro agrônomo, que presta apoio técnico à empresa e aos
agricultores. Ademais, é possível adotar convênios com órgãos estaduais
ou federais de extensão rural, objetivando-se a introdução do produto e
orientações sobre seu uso (FERNANDES; SILVA, 1999).
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Oficial da União. Brasília, DF, 23 dez. 2010b.
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Autores
Alessandro Aparecido Felice
Alex dos Santos
Alex Rodrigo Aguilera
Antonio Bestana Neto
Bruno Novaes Menezes Martins
Carla Gheler-Costa
Carlos Alves de Oliveira
Daniele Scudeletti
Diego Antônio Biondo
Dile Pontarolo Stremel
Elisa Fidêncio de Oliveira
Erilene Romeiro Alves
Fábio Henrique Comin
Gilberto Sabino dos Santos Junior
Ivan Leandro Coletti
Junior Cesar Souza e Silva
Letícia Galhardo Jorge
Luciano Martins Verdade
Luiz Vitor Crepaldi Sanches
Marcio Gonçalves Campos
Meire Cristina Andrade Cassimiro da Silva
Natália Oliveira Totti de Lara
Olívia Gomes Martins
Victor Gonçalves Cremonez
Vinícius Fernandes Canassa

ISBN 978-85-5973-190-3

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