Revista Brasileira de Direito Social - 2024
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Qualis
B2 | CAPES
PRESIDÊNCIA DO IEPREV CONSELHO CONSULTIVO
ROBERTO DE CARVALHO SANTOS ADRIANE MEDIANEIRA TOALDO, ULBRA/RS
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EDITORES-ADJUNTOS ANDRESSA FRACARO CAVALHEIRO, UNIOESTE/PR
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MARCELO BARROSO LIMA BRITO DE CAMPOS, UNI-BH SALAMANCA, ESPANHA
MARCUS ORIONE GONÇALVES CORREIA, USP/SP MARIA AUREA BARONI CECATO, UFPB/PB
MARIA HELENA CARREIRA ALVIM RIBEIRO, UFMG/MG MIGUEL HORVATH JÚNIOR, PUC-SP
OCÉLIO DE JESUS CARNEIRO DE MORAIS, UEL/PR MIRIAN APARECIDA CALDAS, UNIVERSIDADE ESTADUAL
PAULO RICARDO OPUSZKA, UFPR/PR DO CENTRO-OESTE, UNICENTRO/PR
TUFFI MESSIAS SALIBA, UNA/MG NADJA KARIN PELLEJERO, FURG/RS
VALMIR CÉSAR POZZETI, UFAM/AM PAULO AFONSO BRUM VAZ, UNISINOS/RS
YNÊS DA SILVA FÉLIX, UFMS/MS PEDRO AUGUSTO GRAVATÁ NICOLI, UFMG/MG
RAPHAEL SILVA RODRIGUES, UFMG/MG
RODRIGO GARCIA SCHWARZ, UNOESC/SC
RUBENS SOARES VELLINHO, UCPEL/RS
SAYONARA GRILLO COUTINHO LEONARDO DA SILVA, UFRJ/RJ
VALENA JACOB CHAVES MESQUITA, UFPA/PA
VERA QUEIROZ, PUC-SP
RBDS Belo Horizonte v. 7 n. 2 p. 1-188 2024
ARTIGO
A INCONSTITUCIONALIDADE DA DESCONSIDERAÇÃO DAS CONTRIBUI-
ÇÕES VERTIDAS EM VALOR ABAIXO DO MÍNIMO LEGAL (ARTIGO 19-E
DO DECRETO Nº 3.048/99) .............................................................................. 06-19
Eduardo Levin
A nova edição da RBDS – Revista Brasileira de Direito Social (v. 7, n. 2, 2024), que
pode ser acessada amplamente pelo público de modo gratuito pelas vias digitais, chega
permeada de trabalhos científicos de grande qualidade e abordando temas relevantes no
campo dos Direitos Sociais.
O tema impactante da contribuição previdenciária mínima foi objeto de pesquisa por
parte de Eduardo Levin em “A inconstitucionalidade da desconsideração das contribuições
vertidas em valor abaixo do mínimo legal (artigo 19-E do Decreto Nº 3.048/99)”.
A reforma previdenciária ainda é objeto de preocupação científica, e isso fica
evidenciado no texto “Acumulação de benefícios e a provável inconstitucionalidade da
aplicação dos redutores”, do professor Livre-Docente da PUC/SP Miguel Hovarth Júnior,
em coautoria com suas orientandas de Doutorado Vera Queiroz e Ester Moreno de
Miranda Vieira.
Deve ser sempre lembrado que a Seguridade Social não se compõe tão somente da
Previdência Social, abrangendo também a Assistência Social e a Saúde. E, preenchendo
essa lacuna, vemos o estudo “A saúde como direito social fundamental: o fornecimento
de medicamentos de alto custo pelo estado, não incorporados na lista de dispensação
do SUS, à luz da teoria da reserva do possível”, de autoria de Raphael Silva Rodrigues;
Lucas Pires Raydan e Thiago Penido Martins.
Da mesma forma que a Seguridade Social é mais ampla que a Previdência,
os Direitos Sociais compõem um guarda-chuva onde várias modalidades de direitos
humanos se encontram, inclusive o tema do direito à moradia, abordado por Éder Dion
de Paula e Rúbia Cristina da Silva Passos, ambos da FURG, em “Urbanização brasileira
e vulnerabilidade socioambiental: saúde e desenvolvimento como liberdade”.
Nesta edição da RBDS inauguramos algumas Seções Temáticas, listadas abaixo.
A Seção “Estudos de Caso e Pesquisa Empírica” abre com o texto “Requisitos do
benefício de prestação continuada e a busca por um mínimo de cidadania: um estudo de
caso com os beneficiários do município de Butiá/RS”, de Leonardo Montenegro.
Outro estudo empírico de caso, pensando em uma determinada comunidade
local, foi abordado também em “O enquadramento como segurado especial a partir da
autodeterminação dos povos de Faxinal/PR”, de autoria minha e de meu orientando
Gabriel Henrique Cintra.
A seção RPPS apresenta o artigo “Auditoria externa nos regimes próprios de
previdência social: análise acerca do alcance do controle dos tribunais de contas nos
registros de aposentadorias e pensões”, de autoria de Renata Raule Machado, traz à
tona esse importante aspecto sobre os RPPS.
A mesma Seção sobre RPPS também conta com “Regime Próprio de Previdência
Social: a importância dos instrumentos de parceria na promoção dos direitos dos
segurados frente a necessidade de garantia do equilíbrio financeiro e atuarial”, de
Cristovão de Souza Brito.
Inaugurando a Seção Processo Judicial Previdenciário, tema caro a esta revista,
o estudo “Poderes instrutórios do relator no processo judicial previdenciário: superando o
dogma da nulidade da sentença”, do Juiz Federal e professor da PUC/SP Renato Barth Pires.
Os temas processuais previdenciários foram objeto de estudo também de Carla
Caroline Lopes Andrade e Evelin de Lima Oliveira Lessa: “Limitação da prova da união
estável para fins previdenciários análise crítica a utilização do § 5º do art. 16, da Lei
8.213/1991 como fundamento para tarifação de prova pelo judiciário”.
Bruno Vilar Dugacsek e José Ricardo Caetano Costa, da FURG – Universidade
Federal do Rio Grande/RS, apresentam o estudo “A perícia biopsicossocial enquanto
técnica multidisciplinar adequada para a proteção do grupo familiar vulnerável”.
Na sequência, fechando essa Seção, temos “Os métodos extrajudiciais de solução
e controvérsias como garantia dos direitos da personalidade através do acesso à justiça”,
elaborado por Lucas Dornellos Gomes dos Santos e Andréa Carla de Moraes Pereira Lago.
Com todos estes trabalhos de fôlego em nosso sumário, franqueamos a todo o
público a leitura de mais essa edição da RBDS.
Professor da UFPR. Doutor e Mestre pela USP. Diretor Científico do IEPREV. Editor-
-Chefe da Editora IEPREV.
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[artigo]
Eduardo levin11
Resumo
O presente artigo trata dos efeitos jurídicos decorrentes do recolhimento de
contribuições previdenciárias em valor abaixo do mínimo legal. A Constituição Federal,
após a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019 (Reforma da Previdência),
passou a prever que tais contribuições devem ser desconsideradas para efeitos de
reconhecimento de tempo de contribuição ao RGPS. O Decreto nº 10.420/20 (que
incluiu o artigo 19-E no Regulamento da Previdência Social) foi além, dispondo que
elas serão desconsideradas também para outros efeitos, como os de manutenção da
qualidade de segurado e carência. A partir de considerações sobre as características
do poder regulamentar no Direito brasileiro, assim como sobre o conteúdo jurídico
dos princípios jurídicos que estão em conflito neste tema, o trabalho busca, através
de uma interpretação sistemática dos textos normativos em vigor, bem como
servindo-se da lição da doutrina mais abalizada, refletir sobre a validade de referido
Decreto, frente ao que dispõe a Constituição. Ao final, conclui-se tratar-se de norma
flagrantemente inconstitucional.
Palavras-chave: Desconsideração; Contribuições; Mínimo legal; Inconstitucionalidade.
Abstract
This article deals with the legal effects arising from the payment of social security
contributions in an amount below the legal minimum. The Federal Constitution, after
the enactment of Constitutional Amendment No. 103/2019 (Social Security Reform),
now provides that such contributions must be disregarded for the purposes of
recognition as contribution time to the RGPS. Decree No. 10,420/20 ((which included
Article 19-E in the Social Security Regulations) went further, providing that they will
also be disregarded for other purposes, such as maintaining the quality of insured
and grace period. From considerations about the characteristics of the regulatory
power in Brazilian Law, as well as about the legal content of the legal principles that
are in conflict in this subject, the work seeks, through a systematic interpretation of
11
Mestre em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Doutorando em
Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (início em 2022). Defensor
Público Federal.
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the normative texts in force, as well as using the lesson of the most authoritative
doctrine, to reflect on the validity of said Decree, in the face of the provisions of the
Constitution. In the end, it is concluded that this is a flagrantly unconstitutional rule.
Keywords: Disregard; Contributions; Legal minimum; Unconstitutionality.
1 INTRODUÇÃO
Os artigos 201 e 40, ambos da Constituição Federal, dispõem que tanto o sistema
de previdência dos trabalhadores em geral (Regime Geral de Previdência Social - RGPS)
quanto o sistema de previdência dos agentes públicos titulares de cargos efetivos e
vitalícios (os chamados “Regimes Próprios de Previdência”) terão caráter contributivo.22
22
“A primeira Emenda Constitucional que pretendeu alterar as disposições atinentes à proteção social foi
a de número 3, promulgada em 17.03.1993, e que estabelece, para os agentes públicos ocupantes de
cargos vitalícios e efetivos, a obrigatoriedade de contribuição para custeio de aposentadorias e pensões
concedidas a estes, modificando-se uma tradição do direito pátrio, qual seja, a de que tais concessões, no
âmbito do serviço público, eram graciosas, independentes de contribuição do ocupante do cargo” (Castro;
Lazzari, 2020, p. 894).
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Como muito bem observado por Wladimir Novaes Martinez, a obrigatoriedade, em matéria de seguro
social, toma feições especiais, na medida em que o mecanismo de sustentação securitário se funda
na continuidade de ingresso de novos contribuintes ao sistema. “Se, em um determinado momento,
a obrigatoriedade fosse extinta ou mesmo aliviada, a continuidade dos ingressos seria quebrada e,
assim, todo o sistema. É preciso existir e estar contribuindo, obrigatoriamente, uma maioria de pessoas,
sustentando a minoria protegida” (Martinez, 2022, p. 119).
44
O Supremo Tribunal Federal firmou orientação no sentido de que as contribuições para a seguridade
social possuem natureza jurídica de tributo, tal como os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria.
(Brasil. Supremo Tribunal Federal. 1999. Trata-se de prestação pecuniária compulsória estabelecida em lei
e cobrada por ente público arrecadador (cuja atuação é vinculada), com a finalidade de custear ações da
área da saúde, previdência e assistência social. Deve, portanto, obedecer ao regime tributário brasileiro,
notadamente aos princípios jurídicos que informam a tributação no Brasil (Machado Segundo, 2023,
E-book, p. 57).
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Evidentemente, se a admissão, a dispensa ou outro tipo de afastamento do trabalhador ocorrer no curso do
mês, o valor do salário de contribuição será proporcional ao número de dias efetivamente trabalhados, podendo
ser inferior ao valor legal mínimo do salário de contribuição (artigo 28, parágrafo 1º, da Lei nº 8.212/91).
66
A alíquota de contribuição dessas duas categorias de segurados, em regra, é de 20% sobre o respectivo
salário de contribuição (artigo 21, caput, da Lei nº 8.212/91), mas há exceções: será de 11% sobre o salário
mínimo, por exemplo, nos casos em que os segurados de tais categorias optem por abrir mão do direito
ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (o que só é permitido, no caso de contribuintes
individuais, se o trabalho não for prestado à empresa ou pessoa equiparada a empresa, e no caso de
facultativos, se a dedicação for exclusiva ao trabalho doméstico no âmbito da residência, e desde que o
segurado pertença a família de baixa renda, nos termos dos parágrafos 2º e 4º do artigo 21 da Lei 8.212/91).
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contribuírem mais do que o máximo legal, o valor a maior será “perdido”, isto é, ingressará
nos cofres públicos sem ensejar qualquer tipo de vantagem direta ao segurado em
eventual benefício futuro.77
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Ora, a norma de índole constitucional não fez menção aos temas “aquisição e
manutenção da qualidade de segurado”, “carência” e “cálculo do salário de benefício”. A
disposição do decreto regulamentar não somente extrapola o poder regulamentar, como
também afronta princípios fundamentais do ordenamento jurídico, gerando consequências
negativas tanto para os contribuintes quanto para o sistema previdenciário como um todo.
É de se perguntar: e quanto às pessoas que auferem renda inferior ao salário-
mínimo (como os aprendizes, os trabalhadores em tempo parcial, os intermitentes)?
Serão fulminadas em seus direitos previdenciários? Se pensarmos num trabalhador
nessas condições, que aufere R$ 500,00 por mês, e que após alguns meses de
trabalho se acidenta e fica inválido: é justo exigir de tal trabalhador que complemente
as contribuições à razão de 7,5% sobre o valor do salário-mínimo, mais multa e juros de
mora,1111para que possa usufruir de um benefício por incapacidade, sendo que não há
sequer lei formal que lhe imponha esse ônus?
E como fica a situação dos contribuintes individuais e facultativos de baixa renda
que vertem contribuições nos termos do artigo 21, da Lei nº 8.212/91, à razão de 11%
ou 5% do salário-mínimo vigente? Se cometerem algum erro e recolherem valor inferior
ficam sem qualquer direito a uma prestação previdenciária? Nem mesmo aos benefícios
por incapacidade teriam direito? Seus dependentes ficariam sem a pensão por morte?
As contribuições previdenciárias vertidas em valor abaixo do salário-mínimo serão
simplesmente desconsideradas?
Como se vê, as modificações restritivas de direito trazidas pela nova redação
do Decreto 3.048/99 (artigo 19-E), especialmente em relação à desconsideração das
reconhecimento do direito aos benefícios do RGPS e para fins de contagem recíproca, somente serão
consideradas as competências cujo salário de contribuição seja igual ou superior ao limite mínimo
mensal do salário de contribuição. § 1º Para fins do disposto no caput, ao segurado que, no somatório
de remunerações auferidas no período de um mês, receber remuneração inferior ao limite mínimo mensal
do salário de contribuição será assegurado: I - complementar a contribuição das competências, de
forma a alcançar o limite mínimo do salário de contribuição exigido; II - utilizar o excedente do salário
de contribuição superior ao limite mínimo de uma competência para completar o salário de contribuição
de outra competência até atingir o limite mínimo; ou III - agrupar os salários de contribuição inferiores ao
limite mínimo de diferentes competências para aproveitamento em uma ou mais competências até que
estas atinjam o limite mínimo. § 2º Os ajustes de complementação, utilização e agrupamento previstos no
§ 1º poderão ser efetivados, a qualquer tempo, por iniciativa do segurado, hipótese em que se tornarão
irreversíveis e irrenunciáveis após processados. § 3º A complementação de que trata o inciso I do § 1º
poderá ser recolhida até o dia quinze do mês subsequente ao da prestação do serviço e, a partir dessa
data, com os acréscimos previstos no art. 35 da Lei nº 8.212, de 1991. § 4º Os ajustes de que tratam
os incisos II e III do § 1º serão efetuados na forma indicada ou autorizada pelo segurado, desde que
utilizadas as competências do mesmo ano civil definido no art. 181-E, em conformidade com o disposto
nos § 27-A ao § 27-D do art. 216. § 5º A efetivação do ajuste previsto no inciso III do § 1º não impede o
recolhimento da contribuição referente à competência que tenha o salário de contribuição transferido, em
todo ou em parte, para agrupamento com outra competência a fim de atingir o limite mínimo mensal do
salário de contribuição. § 6º Para complementação ou recolhimento da competência que tenha o salário de
contribuição transferido, em todo ou em parte, na forma prevista no § 5º, será observado o disposto no § 3º.
§ 7º Na hipótese de falecimento do segurado, os ajustes previstos no § 1º poderão ser solicitados por seus
dependentes para fins de reconhecimento de direito para benefício a eles devidos até o dia quinze do mês
de janeiro subsequente ao do ano civil correspondente, observado o disposto no § 4º.”
1111
Nos termos do artigo 35, da Lei n. 8.212/91.
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1212
“O que, por lei, não está antecipadamente permitido à Administração está, ipso facto, proibido, de tal
sorte que a Administração, para agir, depende integralmente de uma anterior previsão legal que lhe faculte
ou imponha o dever de atuar” (Bandeira de Mello, 2021, p. 285).
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que deve ser levado a efeito para a elaboração das leis em geral, e que as normas
constitucionais são hierarquicamente superiores às demais normas do sistema
(supremacia da Constituição) (Martins, 2011, p. 29). Nesse sistema, a norma constitucional
sempre deve prevalecer em relação a uma norma infraconstitucional que com ela conflite,
cabendo ao Judiciário a tarefa de interpretar as leis e resolver esse tipo de conflito. A
nosso ver, no caso em tela, cabe ao Judiciário reconhecer a inconstitucionalidade da
cabeça do artigo 19-E, do Decreto nº 3.048/99, pois tal norma traz restrições a direitos
que não estão previstas em normas de hierarquia superior, sendo a inconstitucionalidade
de referido dispositivo manifesta.1313
1313
No mesmo sentido: Garcia (2024, p. 141).
1414
A acepção de princípio jurídico que adotamos no presente trabalho consiste naquela que os identifica
como espécie normas jurídicas em sentido estrito, ao lado das regras. Isto é, consideramos tratar-se
de normas jurídicas completas, estruturadas com antecedentes e consequentes, que objetivam regrar
comportamentos e fazer com que determinados valores sejam aplicados nos casos concretos. Os princípios
diferem das regras pois estas exigem um cumprimento pleno, configurando determinações que ou são
cumpridas ou são descumpridas, conforme as possibilidades fáticas e jurídicas existentes, e que fixam,
para isso, o comportamento a ser adotado para a realização de seu fim último; ao passo que os princípios
são entendidos como normas jurídicas que ordenam a realização de algo na maior medida possível,
conforme seja permitido pelas circunstâncias fáticas e jurídicas existentes, sem declinar qual deve ser o
comportamento a ser adotado para o atingimento de tal fim. Para mais distinções e aprofundamento do
tema, sugere-se, dentre outras obras: Dworkin (2010); Alexy (2011); Silva (2009); Martins (2010).
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1515
Trata-se da chamada, por Robert Alexy, de “lei do sopesamento”, segundo a qual “a medida permitida
de não-satisfação ou de afetação de um princípio depende do grau de importância da satisfação do outro”.
Ou seja, os pesos dos princípios são sempre relativos; aquilo que os princípios exigem deve ser sempre
analisado em relação àquilo que os princípios colidentes exigem. Quanto mais não se satisfaz ou se atinge
um princípio, tanto maior deverá ser a importância da satisfação do outro. Temos, de um lado, o grau de
não satisfação ou da afetação de um princípio, e de outro o grau de importância da satisfação do princípio
colidente. (Alexy, 2011, p. 168-171).
1616
A mesma distorção ocorre em relação a qualquer trabalhador que receba um salário-mínimo ou
mais. Pra quem recebe um salário-mínimo (R$ 1.412,00), por exemplo, o valor a ser recolhido a título de
contribuição previdenciária também é de R$ 105,90 (pois a alíquota é a mesma, 7,5%), o que representa
7,5% da sua renda total, valor proporcionalmente bem inferior aos 17,65% do exemplo dado.
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7 CONCLUSÕES
1717
É de se destacar que o Supremo Tribunal Federal, ao tratar do princípio do não confisco no que
respeita às alíquotas das contribuições previdenciárias, deferiu, na ADI nº 2.010/DF, medida cautelar para
suspender o aumento promovido pela Lei nº 9.783/99 nas alíquotas das contribuições previdenciárias
devidas pelos servidores públicos federais, as quais, para aqueles que ganhavam acima de R$ 1.200,00,
até R$ 2.500,00, foi estabelecida por referida lei em 20%, a para aqueles que ganhavam acima de R$
2.500,00 em 25%. A Corte considerou que referida exação afetaria de maneira irrazoável os rendimentos
daqueles contribuintes, de modo a infringir o princípio no não confisco, lembrando que na época o salário-
mínimo no Brasil era de R$ 136,00, ou seja, o valor de R$ 1.200,00 correspondia a quase 9 vezes o valor
do mínimo (BRASIL. Supremo Tribunal Federal, 1999).
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ao sistema jurídico por meio de decreto do Poder Executivo, representam uma afronta
à Constituição Federal, que dispõe claramente sobre quais são os direitos dos quais os
segurados serão privados nos casos em que contribuam em valor inferior ao mínimo
legal, e não inclui as restrições acima citadas. Não é dado ao decreto inovar em termos
legislativos, conforme dispõem os artigos 84, inciso IV, e 5°, inciso II, da Constituição
Federal, mormente quando tal inovação se dá em prejuízo dos administrados.
A Constituição brasileira, assim como outras constituições editadas nas últimas
décadas, são compostas de regras e de princípios. Os princípios são mandamentos
de otimização, normas que prescrevem que algo seja realizado na maior medida
possível, dentro das possibilidades fáticas e jurídicas existentes.1818São aplicados por
sopesamento, isto é, com base em critérios que mensuram o peso dos princípios em
conflito numa dada situação concreta (nenhum deles ostenta, em abstrato, primazia).1919
No choque entre os princípios constitucionais mencionados ao longo do presente
trabalho, parece-nos que têm mais peso, no caso em tela, os princípios que se fundam
na ideia de proteção ao menos favorecido, considerando que a relação jurídica que se
estabelece entre o Estado e o indivíduo, no âmbito previdenciário, deve ter em conta
a proteção ao hipossuficiente. Isto é, é preciso interpretarmos o sistema normativo de
modo a atender da melhor forma possível a função social, de modo a proteger, com isso,
aqueles que dependem das políticas sociais para sua subsistência.
O artigo 19-E do Decreto nº 3.048/99 (trazido pelo Decreto nº 10.420/20)
é inconstitucional não somente do ponto de vista formal – por extrapolar o poder
regulamentar – como também do ponto de vista material, porque contraria os princípios
da universalidade da cobertura e do atendimento, da equidade da participação no custeio
e da vedação à tributação com caráter confiscatório, de maneira desproporcional em
relação aos princípios aos quais pretende dar efetividade (caráter contributivo e equilíbrio
financeiro e atuarial).
REFERÊNCIAS
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução: Virgílio Afonso da Silva.
2. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 25. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023,
E-book.
1818
As regras, diferentemente, ou são cumpridas ou são descumpridas. “Um conflito entre regras é
solucionado tomando-se uma das regras como cláusula de exceção da outra ou declarando-se que uma
delas não é válida” (Mendes; Branco, 2022, p. 36).
1919
Ao passo que as regras são aplicadas de maneira disjuntiva, de modo que ou a regra é válida e se
aplica ou não é válida e não se aplica (Mendes; Branco, 2022, p. 36).
17
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BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 35. ed. São
Paulo: Malheiros, 2021.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 33. ed. São
Paulo: Atlas, 2019.
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Direito previdenciário. 3.
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COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 18. ed. Rio de
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HORVATH JUNIOR, Miguel. Direito previdenciário. 11. ed. São Paulo: Quartier Latin,
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Revista Brasileira de Direito Social - RBDS, Belo horizonte, v. 7, n. 2, p. 20-39, 2024
[artigo]
Resumo
A discussão acerca da temática acumulação de benefícios previdenciários
ganhou ênfase com o advento da reforma previdenciária promovida pela Emenda
Constitucional n. 103, de 2019, em razão das restrições pecuniárias impostas aos
pensionistas e que impactam severamente a proteção social no âmbito do Regime
Geral de Previdência Social - RGPS ou dos Regimes Próprios de Previdência Social
– RPPS, ou ainda no Sistema de Proteção Social Militar – SPSM. O recebimento
conjunto dos benefícios de aposentadoria e pensão por morte não sofreu vedação,
mas tão somente a aplicabilidade de um redutor pelo recebimento conjunto
desses benefícios, quando a pensão por morte tem como instituidor o cônjuge ou
companheiro e companheira. Não houve preocupação do legislador derivado em
preservar os benefícios concedidos anteriormente à entrada em vigor da referida
Emenda Reformadora, os quais já haviam ingressado no patrimônio social do
beneficiário, segurado ou dependente, configurando ofensa ao princípio da dignidade
da pessoa humana, assim como à garantia constitucional do direito adquirido e da
irredutibilidade do valor dos benefícios. Não menos importante, a brutal redução
dos proventos desrespeitou o sistema contributivo, em detrimento das contribuições
vertidas e da regra da contrapartida.
Palavras-chave: Acumulação de benefícios; Emenda constitucional n. 103, de 2019;
Inconstitucionalidade da aplicação de redutores.
Abstract
The discussion regarding the accumulation of social security benefits gained emphasis
with the advent of the social security reform promoted by Constitutional Amendment
1
Livre-docente e Doutor em Direito Previdenciário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Mestre em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Coordenador
e Professor no Núcleo de Direito Previdenciário da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Procurador Federal – AGU.
2
Doutoranda e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, Brasil. Advogada, Coordenadora e Professora de Direito Previdenciário na Escola
Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional São Paulo, Ex-servidora do INSS.
3
Doutoranda e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, Brasil. Advogada e Professora de Direito Previdenciário.
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no. 103, of 2019, due to the pecuniary restrictions imposed on pensioners and which
severely impact social protection within the scope of the General Social Security
Regime - RGPS or the Special Social Security Regimes - RPPS, or even in the
Military Social Protection System - SPSM . The joint receipt of retirement benefits
and death pension was not prohibited, but only the applicability of a reduction for the
joint receipt of these benefits, when the death pension is established by the spouse
or partner. There was no concern on the part of the legislator to preserve the benefits
granted prior to the entry into force of the aforementioned Reform Amendment,
which had already entered the social assets of the beneficiary, insured or dependent,
constituting an offense against the principle of human dignity, as well as the guarantee
constitutional status of acquired rights and the irreducibility of the value of benefits. No
less important, the brutal reduction in earnings disrespected the contributory system,
to the detriment of the contributions made and the counterpart rule.
Keywords: Accumulation of benefits; Constitutional amendment n. 103, of 2019; Unconstitutionality
of the application of reducers.
1 INTRODUÇÃO
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recebidos cumulativamente.
Em uma análise com fulcro nos princípios constitucionais, busca-se o estudo
do impacto financeiro que a acumulação de benefícios produz, considerando-se a
aplicabilidade da segurança jurídica diante do princípio da pré-existência do custeio e da
regra da contrapartida.
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Art. 20. Filiação é o vínculo que se estabelece entre pessoas que contri-
buem para a previdência social e esta, do qual decorrem direitos e obri-
gações.
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Art. 24. É vedada a acumulação de mais de uma pensão por morte dei-
xada por cônjuge ou companheiro, no âmbito do mesmo regime de previ-
dência social, ressalvadas as pensões do mesmo instituidor decorrentes
do exercício de cargos acumuláveis na forma do art. 37 da Constituição
Federal.
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novembro de 2019, ainda que venham a ser concedidos após essa data;
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Para além das duas reduções aplicadas no cálculo do benefício de pensão por
morte, o fato de o dependente usufruir de mais de um benefício, o menos vantajoso
sofrerá a incidência dos redutores do § 2º do art. 24, pelo simples fato de recebimento
conjunto quando um desses benefícios é a pensão por morte. Se o art. 23 já estabelece
a limitação do valor recebido na pensão por morte, a incidência de uma segunda redução
representa uma dupla penalização, o que não é admitido em Direito.
No estudo dos princípios que se relacionam às ofensas traduzidas no § 2º do
art. 24, encontramos as palavras de Humberto Ávila (2003, p. 63), segundo o qual “os
princípios, ao estabelecerem fins a serem atingidos, exigem a promoção de um estado
de coisas – bem jurídicos – que impõem condutas necessárias à sua preservação ou
realização”.
Na análise das disposições trazidas pela Emenda Constitucional Previdenciária de
2019, no que tange à redução da percepção de benefício que já integrou o patrimônio
social do segurado, alinha-se a ofensa a inúmeros princípios e garantias constitucionais.
A percepção individual que envolve a segurança mínima que o indivíduo deve ter
é a confiança, que é proporcionada por um determinado ordenamento jurídico e que advém
exatamente da segurança jurídica.
O aspecto subjetivo do princípio da proteção da confiança determina que para que haja
uma confiança a ser protegida, é necessário restar comprovado que o indivíduo confiou na
continuidade do ato estatal, depositando racionalmente suas expectativas em tal ato (Souza,
2018, p. 145).
No entanto, não são raros os casos em que o STF reconhece a inconstitucionalidade de
leis ou atos normativos, porém, preserva sua vigência e aplicabilidade até um termo futuro, e o
faz com o escopo da segurança jurídica e de evidente interesse social.
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Conquanto não tenha sido inscrita no elenco inicial dos objetivos da se-
guridade social, temos considerado a diretriz estabelecida pelo art. 195,
§ 5º, que cognominamos regra da contrapartida, como sendo esse guide
que, a certa altura da evolução da proteção social brasileira, foi necessá-
rio explicitar.
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6 CONCLUSÃO
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[artigo]
Resumo
O direito fundamental à saúde constitui direito de todos e dever do Estado em assegurar
a sua concretização. Entretanto, o Estado é dotado de recursos orçamentários
limitados, tendo como objetivo/dever garantir o acesso às políticas públicas de saúde
a toda a população brasileira. Diante disso, fazem-se necessários certos parâmetros
para a concessão de medicamentos de alto custo; de forma que a efetivação do direito
à saúde sob a órbita individual não venha a obstar a efetivação desse direito para
toda a coletividade. Portanto, deve o Judiciário fazer certas ponderações quando de
suas decisões, levando-se em consideração a máxima efetividade possível do direito
fundamental à saúde.
Palavras-chave: Direito à saúde; Mínimo existencial; Reserva do possível.
Abstract
The fundamental right to health is everyone’s right and the state’s duty to ensure that it
is realized. However, the state has limited budgetary resources and its objective/duty
is to guarantee access to public health policies for the entire Brazilian population. In
view of this, certain parameters are necessary for the granting of high-cost medicines,
so that the realization of the right to health in the individual sphere does not hinder the
20
Pós-graduando em Direito Previdenciário – RGPS: Nova Previdência com ênfase em Prática Processual,
pelo Instituto de Estudos Previdenciários, Trabalhistas e Tributários – IEPREV. Pós-graduando em Direito
e Processo Tributário pela Faculdade CERS. Membro da Comissão de Direito Previdenciário da OAB/
MG. Graduado em Direito pelo Centro Universitário Unihorizontes. Advogado com atuação em Direito
Previdenciário, Tributário e Saúde Suplementar – contencioso e consultivo.
21
Doutor e Mestre em Direito pela UFMG. Professor Universitário. Membro de diversos conselhos editoriais
e consultivos (livros e periódicos) e parecerista. Membro integrante de bancas examinadoras de concursos
públicos. Autor e coautor de livros, capítulos e artigos de revistas científicas.
22
Doutor em Direito Privado pela PUC/MG. Mestre em Direito e Especialista em Direito pela FDMC/MG.
Procurador Autárquico do Município de Belo Horizonte/MG. Professor da Universidade do Estado de Minas
Gerais (UEMG) e do Programa de Mestrado Profissional em Segurança Pública e Cidadania (UEMG).
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realization of this right for the entire community. Therefore, the Judiciary must make
certain considerations when making its decisions, considering the maximum possible
effectiveness of the fundamental right to health.
Keywords: Right to health; Existential minimum; Reserve of the possible.
1 INTRODUÇÃO
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O Sistema Único de Saúde (SUS) encontra seu alicerce nos artigos 196 a 200 do
Texto Constitucional de 1988, por meio dos quais se define a saúde como direito de todos
e dever do Estado, a ser garantido por meio de políticas sociais e econômicas (BRASIL,
1988). Nestes dispositivos também é encontrado os fundamentos e organização do
presente sistema.
Não obstante, o SUS somente veio a ser regulamentado dois anos após a
promulgação da Constituição, através da Lei nº 8.080/90, comumente conhecida como
“Lei Orgânica da Saúde”, a qual discorre sobre as condições para a promoção, proteção
e recuperação da saúde, bem como a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes, consolidando o disposto no texto constitucional, e pela Lei nº 8.142/90
que discorre sobre a participação da comunidade na gestão do SUS (Araújo; López;
Junqueira, 2016).
Sarlet e Figueiredo (2009, p.11) caracteriza o SUS como uma garantia institucional
fundamental e, portanto:
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Previsto no artigo 198, II, da CR/1988 e no artigo 7º, II, da Lei 8.080/90 está o
princípio da integralidade, definido como o “conjunto articulado e contínuo das ações
e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em
todos os níveis de complexidade do sistema” (Brasil, 1990).
De acordo com Barros (2006), a integralidade busca garantir ao indivíduo uma
abrangência às ações e serviços de prevenção, promoção, tratamento e reabilitação, em
todos níveis de complexidade do SUS, dando-se ênfase não apenas ao indivíduo, mas
também na família e na comunidade.
Sarlet e Figueiredo (2009) atribuem duas facetas para o princípio da integralidade.
Primeiro, os doutrinadores explicitam que, a despeito de a cobertura oferecida pelo
SUS dever ser a mais ampla possível, é irrefutável a existência de determinados limites,
notadamente técnicos. Segundo, discorrem que a integralidade do atendimento reflete uma
noção de que as ações e os serviços de saúde precisam ser considerados como um todo, de
forma harmônica e contínua, simultaneamente articulados e integrados em todos os prismas
(individual e coletivo; preventivo, curativo e promocional; local, regional e nacional) e níveis
de complexidade do SUS, isto é, baixa, média e alta complexidade, característica que se
encontra vinculada à unidade do SUS, notadamente no que tange ao seu planejamento.
O conteúdo do princípio da integralidade não está a significar a oferta, de forma
incondicional/absoluta, de todo e qualquer medicamento ou tratamento que seja pleiteado
ao Poder Público. O referido princípio deve ser entendido como a obrigatoriedade do
Estado em elaborar políticas públicas para garantir o acesso às ações e serviços de
saúde ao maior número de pessoas possível.
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Trata-se, em resumo, da pessoa vista como fim em si, e não como mero
instrumento a serviço do Estado, da comunidade ou de terceiros; como
merecedora do mesmo respeito e consideração que todas as demais, e
não como parte de um estamento na hierarquia social; como agente au-
tônomo, e não como ovelha a ser conduzida por qualquer pastor; como
ser racional, mas que também tem corpo e sentimentos e, por isso, expe-
rimenta necessidades materiais e psíquicas; como ser social, imerso em
relações intersubjetivas fundamentais para a sua identidade, e não como
indivíduo atomizado e desenraizado (Sarmento, 2016, p. 92).
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Mas qual seria, de fato, o conceito de mínimo existencial? Para Sarmento (2016,
p. 212) o mínimo existencial:
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Sustenta Cunha Júnior (2006) que a teoria da reserva do possível, por ser originária
de um país desenvolvido, onde já existe um nível elevado de bem-estar social, com
realidade socioeconômica completamente distinta da realidade brasileira, não poderia
ser empregada no Estado brasileiro, que é considerado um país periférico, ainda em
desenvolvimento, que ainda não consegue garantir à grande parte das pessoas as
condições materiais básicas para uma existência digna.
Contudo, esse posicionamento não merece prosperar. Conforme preceitua
Sarmento (2010), é justamente em países periféricos e menos desenvolvidos (como
é o caso do Brasil) que a incidência da reserva do possível se justifica, tendo em vista
que a escassez de recursos, presente nestes países, torna ainda mais evidente a
impossibilidade de realização plena e concomitante de todas as prestações advindas
dos direitos sociais que lhes são exigidas.
É óbvio que a reserva do possível não pode ser invocada pelo Estado como forma
de eximir-se de concretizar toda e qualquer prestação social que lhe seja exigida. Até
porque, como já explicitado anteriormente, o fundamento principal do Estado é garantir
ao seu povo o metaprincípio da dignidade da pessoa humana através da promoção dos
direitos fundamentais. No entanto, no mundo prático, infelizmente, o Estado brasileiro não
consegue garantir à grande parcela de seus cidadãos, as condições materiais básicas
necessárias a uma existência digna, diante da limitação de recursos financeiros e de
outras questões politico-administrativas que escapam ao objeto do presente trabalho.
Dessa forma, no tocante ao direito fundamental à saúde, se torna imprescindível
a aplicação da reserva do possível frente a determinadas prestações exigidas ao Poder
Público (como é o caso dos medicamentos de alto custo), para que uma prestação que
venha a ser concedida a um ou a alguns não obste a efetivação das condições materiais
básicas de toda uma coletividade, haja vista que o Estado deve primar pelo bem comum,
ainda que para tanto seja necessário o sacrifício de um direito individual.
Por derradeiro, a reserva do possível, a despeito de acarretar uma limitação
jurídica e fática dos direitos fundamentais, ela também constitui, em certas circunstâncias,
garantia dos direitos fundamentais, na medida em que uma prestação concernente a
determinado direito fundamental não venha a impedir a concretização de tantos outros
direitos da mesma natureza (Sarlet; Figueiredo, 2008).
Para que um medicamento seja incorporado na lista de fármacos que são ofertados
pelo SUS, existe todo um procedimento técnico e sistematizado, através do qual são
analisados diversos aspectos sobre a viabilidade de sua incorporação ou não. Esse
procedimento é realizado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no
SUS (CONITEC), criada pela Lei nº 12.401/2011 e regulamentada através do Decreto nº
7.646/2011 (Capucho et al, 2012).
O Decreto nº 7.646/11, em seu artigo 2º, define a CONITEC como sendo um órgão
colegiado de caráter permanente, que compõe a estrutura regimental do Ministério da
Saúde (MS), desempenhando o papel de assessoramento ao Ministério da Saúde quanto
à incorporação, exclusão ou alteração de tecnologias em saúde, além da constituição ou
alteração de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas (Brasil, 2011).
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[...] o que o juiz sente, o que ele acha, a inspiração divina, mediúnica,
enfim, parece realmente não se apresentar como um critério racional a
ponto de justificar a decisão judicial. É preciso que ela se assente numa
compreensão de que desde e sempre existe e se encontra lançado (pré-
-compreensão a partir da finitude) e, possa, a partir daí, apontar para uma
solução hermeneuticamente correta para solucionar a questão, de modo
que a compreensão possa ser igualmente aferida por outros observado-
res ela concernidos (Tomaz, 2011, citado por Araújo; Martins, 2017, p.
12).
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7.1 A questão dos medicamentos de alto custo sob a ótica do supremo tribunal
federal
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O Estado não pode ser obrigado por decisão judicial a fornecer medica-
mento não incorporado pelo SUS, independentemente de custo, salvo
hipóteses excepcionais, em que preenchidos cinco requisitos: (i) a in-
capacidade financeira de arcar com o custo correspondente; (ii) a de-
monstração de que a não incorporação do medicamento não resultou de
decisão expressa dos órgãos competentes; (iii) a inexistência de substi-
tuto terapêutico incorporado pelo SUS; (iv) a comprovação de eficácia do
medicamento pleiteado à luz da medicina baseada em evidencias; e (v)
a propositura da demanda necessariamente em face da União, que é a
entidade estatal competente para a incorporação de novos medicamen-
tos ao sistema. Ademais, deve-se observar um parâmetro procedimental:
a realização de diálogo interinstitucional entre o Poder Judiciário e entes
ou pessoas com expertise técnica na área da saúde tanto para aferir
a presença dos requisitos de dispensação do medicamento, quanto, no
caso de deferimento judicial do fármaco, para determinar que os órgãos
competentes avaliem a possibilidade de sua incorporação no âmbito do
SUS (Barroso, 2016, p. 30-31).
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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[artigo]
Resumo
Este artigo objetivou, através do emprego de revisão bibliográfica, discorrer sobre
as consequências decorrentes da urbanização no Brasil enquanto processo que
contribui para a ampliação de desigualdades e a vulnerabilidade de determinados
grupos sociais. Partindo das conclusões demonstradas no artigo “Vulnerabilidade
socioambiental à leptospirose humana no aglomerado urbano metropolitano de
Curitiba, Paraná, Brasil: proposta metodológica a partir da análise multicritério e
álgebra de mapas” redigido pela Profª Drª Elaiz Aparecida Mensch Buffon, pretende-
se apresentar a urbanização como fenômeno que frequentemente apresenta falhas,
sustentado primordialmente pelo capitalismo através da falácia da promessa de uma
vida mais digna por meio da migração para centros urbanos e alteração da paisagem
para corresponder às expectativas do que se concebe por “desenvolvimento”. Para
tanto, mostrou se oportuno dialogar, em especial, com a obra “Desenvolvimento
como Liberdade” de Amartya Sen, bem como “A Urbanização Brasileira” de Milton
Santos e, ainda, a “Sociedade de Risco” de Ulrich Beck.
Palavras-chave: Urbanização; Desenvolvimento; Vulnerabilidade Socioambiental.
Abstract
Through literature review, this article aimed to discuss the consequences arising from
urbanization in Brazil as a process that contributes to the expansion of inequalities and
the vulnerability of certain social groups. Based on the conclusions shown in the article
“Socio environmental vulnerability to human leptospirosis in the metropolitan urban
area of Curitiba, Paraná, Brazil: a methodological proposal based on multi-criteria
analysis and map algebra”, written by Professor Elaiz Aparecida Mensch Buffon, it is
intended to present the urbanization as a phenomenon that frequently presents flaws,
sustained primarily by capitalism through the fallacy of the promise of a more dignified
life through migration to urban centers and alteration of the landscape to correspond
to the expectations of what is conceived as “development”. To do so, it was opportune
to dialogue with the work “Development as Freedom” by Amartya Sen in particular, as
1
Mestranda em Direito do Trabalho pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Bacharela em Direito e
Justiça Social da Universidade Federal do Rio Grande (FURG).
2
Doutor em direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), professor do Programa de Pós-
Graduação em Direito e Justiça Social da Universidade Federal do Rio Grande (PPGDJS/FURG).
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1 INTRODUÇÃO
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dos resultados sob a ótica da teoria de Amartya Sen sobre desenvolvimento, trazendo,
também, as considerações de Milton Santos sobre o processo de urbanização no Brasil
para complementar as reflexões propostas.
A partir do estudo proposto, foi possível detectar que a urbanização foi um processo
que deslocou as pessoas do campo para cidade de modo não planejado, o que resultou
em uma acentuação da desigualdade social que, do ponto de vista de Amartya Sen, não
causará liberdade, logo, não pode ser atrelada a desenvolvimento. Portanto, existe uma
parcela considerável da população que vive à margem da sociedade, vulnerável a sofrer
os danos dos riscos ambientais assumidos por uma minoria beneficiada pelo Estado,
o mesmo Estado que protela a instituir políticas de reparo social. Resta claro, portanto,
que o processo de urbanização no Brasil serviu primordialmente para fomentar o sistema
capitalista organizado que necessita da desigualdade social para se manter fortalecido,
não servindo como ferramenta para ampliação das liberdades, como idealizado por Sen.
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adequado, Buffon (2018) descreve que “essas observações expressam uma interação
pertinente entre a expansão urbana desordenada e a formação de lugares vulneráveis
à problemática da leptospirose humana.” (p. 597). No mesmo sentido, relembrou estudo
semelhante realizado pela pesquisadora Marley Vanice Deschamps:
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a alta, alta e muito alta) uma fotografia representativa, indicando de qual local foi tirada
(Buffon, 2018, p. 599-600). A partir das imagens coletadas durante a pesquisa de campo,
a pesquisadora relatou:
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Em 1993, Milton Santos já acusava a crise fiscal da cidade e o fato de, nas cidades,
a população não ter acesso aos empregos necessários, bens e serviços essenciais, o
que, nas palavras do autor, “fomenta a crise urbana” (Santos, p. 10). Nesse ponto, frisa-
se que a pobreza se torna um modelo socioeconômico e espacial das cidades.
Interessante perceber que, no caso do Brasil, por ser um país agrário de viés
colonizador, o espaço rural, a priori, é o de principal desenvolvimento econômico,
totalizando, no século XVIII, “sessenta e três vilas e oito cidades” (Santos, 1993, p. 18,
apud Goulart, p. 79).
Nesse cenário, a organização colonial só permitia aos grandes proprietários
rurais terem propriedades urbanas, local em que se se restringia “ao comércio, ofícios,
mecânicos, funcionalismo, mineração” (Santos, 1993, p. 18). Realidade que, por si só,
restringia o acesso ao e permanência no espaço urbano de uma determinada classe.
Portanto, infere-se que tanto a agricultura comercial quanto a exploração mineral
foram responsáveis pelo povoamento e o estímulo de riquezas, afinal de contas,
não bastava ter empreendimentos na cidade, mas também era necessário contratar
empregados para sustentar as ideias capitalistas de mercado.
Ressalta-se que, apenas entre 1940 e 1980, ocorreu o êxodo rural, com a
significativa saída das pessoas da zona rural, com intuito de fixar residência nas cidades.
Nesse intervalo de quarenta anos, a população urbana brasileira se multiplicou por sete
vezes e meia (Santos, 1993, p. 29).
Esse aumento continuou a ocorrer, e, como observado no último censo do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE (2010), 84% da população brasileira vive na
zona urbana. Ocorre que a crítica mais severa de Milton Santos (2010) quanto ao processo
de urbanização brasileira, para além da buscar por melhores rendas e condições de vida,
está na rapidez com que urbanização aconteceu e sua falta de planejamento atrelada à
má distribuição de renda em virtude da ascensão do capitalismo, que apenas manteve
a ordem social de acumular capital no bolso de uma minoria que, nos primórdios de
urbanização, detinha a propriedade dos latifúndios e, consequentemente, dos comércios
nas vilas.
Nesse diapasão, Santos (1989) detalha de que modo foi construído o espaço
urbano brasileiro, e, a partir disso, assevera:
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Desta forma, essa definição mostra-se compatível com a realidade brasileira, haja
vista a carência de iniciativa estatal e/ou cumprimento da previsão constitucional no que
tange à política urbana para que forneça condições de vida dignas àqueles que sofrem de
forma direta ou indireta com o racismo ambiental, a fim de promover o desenvolvimento
como liberdade do ponto de vista de Amartya Sen.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Ainda, para além das dificuldades impostas pela elitização dos espaços urbanos
no quesito financeiro, a própria existência dos cidadãos também se mostra ameaçada em
função da violência e discriminação, meramente por não corresponderem à hegemonia
do grupo dominante, seja por sua cor, gênero, orientação sexual, posicionamento político
e/ou crenças religiosas.
Assim, o problema da urbanização dialoga com o conceito de Amartya Sen sobre o
desenvolvimento, vez que também se apresenta como uma falácia ou um entendimento
dúbio. Da mesma forma que Sen considera o conceito de desenvolvimento como mero
índice de produção industrial ou renda per capita insuficiente e inadequado, também
concluímos que o conceito de urbanização como algo necessariamente positivo é, no
mínimo, discutível. A ideia de urbanização como algo sempre associado a progresso,
evolução, futuro e melhora nas condições de vida passa a ser interpretada como uma
compreensão consideravelmente ingênua, a partir do momento em que são reconhecidas
as problemáticas decorrentes do inchaço urbano que, no caso concreto, representa
o lugar-comum das grandes cidades brasileiras, que, desde sua gênese, partiram de
uma lógica discriminatória, passando por impulsos higienistas de exclusão social e
marginalização dos grupos considerados indesejados pela classe detentora do poder.
Ante o exposto, é perceptível que, por trás da mancha urbana, superficialmente
percebida como mera consequência do êxodo rural, existe uma gritante problemática
político socioambiental responsável pela base de um sistema capitalista que exige uma
discrepância financeira/de poder acentuada para sua manutenção. Desta forma, através
do estudo realizado, foi possível compreender a vulnerabilidade socioambiental como
uma consequência do processo de urbanização, o qual, no Brasil, revela-se demasiado
longínquo do ideal descrito por Amartya Sen enquanto ferramenta de ampliação das
liberdades, e, portanto, não pode ser considerado genuíno indicador de desenvolvimento.
REFERÊNCIAS
BECK, Ulrich, Sociedade de risco: rumo a outra modernidade. São Paulo: Editora 34,
2011.
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Resumo
Este estudo tem como objetivo, verificar a existência ou não de obstáculos ocasionados
pela falta de ciência sobre os requisitos, no caminho percorrido pelas pessoas que
recebem o Benefício de Prestação Continuada - BPC ao acessá-lo e o quanto isso
impacta no rito deste direito. Propõe-se ainda, analisar o grau de conhecimento
prévio dos beneficiários do BPC quanto aos seus requisitos e identificar as formas
de acesso por eles utilizadas. Através de uma pesquisa qualitativa, realiza uma
revisão da literatura sobre o BPC e o contexto histórico da assistência social no
Brasil, abordando o sistema de proteção social e o percurso da cidadania no país,
além de discorrer sobre a conjuntura constitucional, as diferenças entre benefícios
previdenciários e assistenciais e os aspectos sociais do BPC. Também estuda seu
contexto infraconstitucional, revelando suas origens e seu histórico de alterações
legais, além da proposta de sua reformulação contida na reforma da previdência
de 2019. Apresenta ainda, um estudo de caso realizado com os beneficiários do
município de Butiá/RS, cujo objetivo foi entender o contexto em que se insere o
BPC num determinado município brasileiro e as variáveis que o influenciam, além de
permitir a medição do grau de conhecimento dos entrevistados acerca dos requisitos
e as dificuldades enfrentadas no acesso e manutenção deste direito. Os dados
colhidos no estudo revelam que a maioria das pessoas desconhece os requisitos
necessários para o acesso ao BPC e isso acaba tornando-se um obstáculo.
Palavras-Chave: Benefício de Prestação Continuada; Cidadania; Requisitos.
Abstract
This study aims to verify the existence or not of obstacles caused by the lack of
knowledge about the requirements, in the path taken by people who receive the
Benefit of Continuous Provision - BPC when accessing it and how much this impacts
on the rite of this right. It is also proposed to analyze the degree of prior knowledge of
BPC beneficiaries regarding its requirements and identify the forms of access used by
1
Mestrado em Estado, Governo e Políticas Públicas pela Fundação Latino-Americana de Ciências Sociais
- FLACSO. Pós-graduando em Direito e Processo Previdenciário pelo Gran Centro Universitário. Bacharel
em Direito pela Universidade Luterana do Brasil - ULBRA. Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. E-mail: leomonters@proton.me
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them. Through qualitative research, it carries out a literature review on the BPC and the
historical context of social assistance in Brazil, addressing the social protection system
and the course of citizenship in the country, in addition to discussing the constitutional
situation, the differences between benefits social security and assistance and the
social aspects of the BPC. It also studies its infraconstitutional context, revealing its
origins and its history of legal changes, in addition to the proposal for its reformulation
contained in the 2019 pension reform. It also presents a case study carried out with
beneficiaries of the municipality of Butiá/RS, whose objective was to understand the
context in which the BPC is inserted in a given Brazilian municipality and the variables
that influence it, in addition to allowing the measurement of the degree of knowledge
of the interviewees about the requirements and the difficulties faced in accessing
and maintaining this right. The data collected in the study reveal that most people
are unaware of the necessary requirements for accessing the BPC and this ends up
becoming an obstacle.
Keywords: Continuing Provision Benefit; Citizenship; Requirements.
1 INTRODUÇÃO
2
Importante destacar que o BPC também é conhecido e chamado popularmente pelo nome de “LOAS”,
referência ao seu fundamento legal.
3
A gestão do BPC é feita pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à
Fome, e a operacionalização é realizada pelo INSS.
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Ao longo de sua história, mesmo sendo considerado um país rico e tendo vivido
períodos de intenso desenvolvimento econômico, o Brasil jamais superou sua enorme
desigualdade social. A desproporcional distribuição de renda e riqueza nos níveis
existentes no país, corresponde à abertura de um verdadeiro abismo econômico, político
e social entre as classes.
Quando é abordada a proteção social no Brasil, é relevante considerar o período
posterior ao fim da escravidão, especialmente, o final do século XIX e início do XX.
Adorno (1990, p. 17) diz que na conjuntura de 1880 a 1920, a sociedade brasileira não
se encontrava preparada para a fundação de um verdadeiro Estado de bem-estar social
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4
Organizações Não Governamentais comprometidas com o enfrentamento da pobreza, como a ABONG
e o IBASE, assim como movimentos de segmentos específicos, como idosos e pessoas com deficiência.
5
A idade e o corte de renda proposto pelas assistentes sociais era menor do que fora aprovado.
6
Criado no primeiro governo do Presidente Lula pela Lei Federal Nº 10.836/2004, o Bolsa Família foi
chamado de Auxílio Brasil no período de novembro/2021 a dezembro/2022.
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3 A CIDADANIA CONCEDIDA
Carvalho afirma que a diferença entre a nossa cidadania e a dos ingleses está no
fato de que o tripé que compõe a cidadania: direitos civis, políticos e sociais foi conquistado
por eles, e a nós ele foi doado, segundo os interesses particulares dos governantes de
7
Disponível em https://www.gov.br/previdencia/pt-br/assuntos/previdencia-social/arquivos/beps122023_
final.pdf. Acesso em 06 abr 2024.
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plantão. A questão é que se não se segue a ordem inglesa, dificilmente se tem o povo
no comando de suas demandas políticas, ficando essa responsabilidade a cargo de
outras instituições, como no caso brasileiro, onde essa tarefa tem sido desenvolvida pelo
Estado.
Em sua obra, o autor demonstra a grande distância existente entre a cidadania
formal, aquela das leis, e a cidadania real, a que vivemos no dia a dia. Como consequência,
temos uma sociedade na qual a cidadania plena é um sonho distante para a maioria das
pessoas.
8
Na teoria Keynesiana, o Estado deveria intervir na economia sempre que fosse necessário, a fim de
evitar a retração econômica e garantir o pleno emprego.
78
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previdência social, enquanto para fazer jus aos benefícios do sistema assistencial, basta
que essa pessoa necessite dos benefícios cumprindo as exigências impostas legalmente.
A CF de 1988 elucida isso em seus artigos 201 - da Previdência Social (“de caráter
contributivo”) e 203 - da Assistência Social (“independentemente de contribuição”).
Resta claro assim que o BPC não é aposentadoria e por não ser um benefício
previdenciário, não gera abono anual (13º salário) e não é extensível aos herdeiros
(não deixa pensão por morte). Essa garantia constitucional permite hoje que milhões de
brasileiros e brasileiras em situação de vulnerabilidade social, tenham a garantia de um
salário-mínimo mensal para suprir suas necessidades básicas.
Segundo o Boletim Estatístico da Previdência Social (BEPS), em dezembro de
20239, existiam 5,7 milhões de beneficiários do BPC, dos quais 55% eram portadores
de deficiência e 45% idosos acima de 65 anos. Esse total equivale a 14,56% do total de
benefícios concedidos pelo INSS.
As informações sobre os requisitos do BPC tornam-se indispensáveis a medida
que a desinformação sobre isso pode acarretar no insucesso da busca pelo benefício,
assim como na sua manutenção10. Conforme a legislação em vigência, são requisitos
para a concessão e a manutenção do BPC:
a) Renda por pessoa do grupo familiar precisa ser igual ou menor que ¼ do salário-
mínimo. Em ambos os casos, exige-se a comprovação de que não possuem meios
para prover a própria manutenção e nem para tê-la provida por suas famílias;
b) Ser brasileiro, nato ou naturalizado. Pessoas de nacionalidade portuguesa,
desde que comprovem residência no Brasil. Estrangeiros de outras nacionalidades
também podem requerer o BPC, desde que morem no país (Ação Civil Pública -
ACP 0006972-83.2012.4.01.3400);
c) Estar inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para
Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
9
Ibidem, Nota 7.
10
O art. 21 da Lei 8.742/93 (LOAS), estabelece que o BPC deve ser revisto a cada dois anos para
avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
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pública. Segundo seus autores, em razão dos valores transferidos, o BPC é capaz de retirar
as famílias da indigência e da pobreza, enquanto os demais programas de transferência
de renda melhoram a situação das famílias sem, no entanto, serem suficientes para
retirar todas elas da pobreza (Soares; Sergei; Medeiros; Osório, 2006).
Embora todos os esforços e avanços, ainda persiste uma enorme lacuna entre
os direitos garantidos constitucionalmente, como é o caso do BPC por exemplo, e a sua
efetiva afirmação.
11
Meu INSS é uma solução multi-dispositivos para acesso aos serviços do INSS. A plataforma
online pode ser acessada pelo computador ou pelo telefone celular.
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relatados em pesquisas de opinião, tais como Vox Populi e textos avaliativos do benefício,
o grau de procura pelo requerimento do benefício pode estar aquém do que seja devido”
(Oliveira, 2013, p. 136).
O BPC tem suas origens antes mesmo da Carta Magna de 1988, tendo como
gênese o benefício previdenciário da renda mensal vitalícia – RMV, instituído pela Lei
6.179 de 11 de dezembro de 1974. Hoje pertencente ao sistema assistencial, o BPC
portanto, tem suas raízes no sistema previdenciário, aliás a proteção aos idosos e as
pessoas com deficiência também tem origem no sistema previdenciário.
A partir da CF de 1988, a União passou a exercer o papel de coordenador da
política de assistência social, enquanto os demais entes subnacionais passaram a
responder pela sua execução junto aos cidadãos. A forma como idosos e pessoas com
deficiência eram tratados passou por profundas transformações com a Carta Magna de
1988.
Entre as mudanças, uma das mais significativas foi a que os retirou do sistema
previdenciário para incluí-los na assistência social, pondo fim a exigência de contribuição,
ainda que mínima, ao sistema previdenciário. O inciso V do art. 203 da CF de 1988
disciplinou essa alteração e estabeleceu ainda, a necessidade de regulamentação
infraconstitucional.
No período entre a promulgação da Constituição e a referida regulamentação, foi
necessária a criação do art. 139 na Lei 8.213/91 (Lei da previdência social) para reduzir
os efeitos desta transição. Nele, é estabelecido que a RMV continuaria integrando o
elenco de benefícios da previdência social até que fosse regulamentado o inciso V do
artigo 203 da CF, o que ocorreu com a entrada em vigor da LOAS em 1993. A partir de
01/01/1996 o BPC iniciou a operar na prática e a RMV não mais poderia ser concedida.
A legislação sobre o BPC recebeu e continua recebendo sucessivas alterações,
especialmente adaptadas à conjuntura política e as suas respectivas diretrizes
governamentais. Previsto no art. 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), sua redação original foi
submetida a diversas Medidas Provisórias, sendo em 08 de dezembro de 1994 publicada
a primeira, a MP 754/1994. O Quadro 1 a seguir sintetiza o histórico das principais
alterações legais do BPC:
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Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
13
Têm direito ao auxílio-inclusão todas as pessoas com deficiência moderada ou grave, com 16 anos ou
mais que recebem o BPC ou já receberam o benefício durante qualquer período nos últimos 5 anos, e que
passem a exercer atividade no mercado formal de trabalho com remuneração do trabalho de até 2 salários
mínimos. Essas pessoas receberão, enquanto estiverem empregadas, o valor de meio salário-mínimo
como incentivo para que ingressem e permaneçam no mercado.
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14
O Decreto nº 6.214/07 regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social.
15
Butiá: Principais atividades econômicas são a cadeia produtiva da mineração de carvão e da silvicultura.
Percentual das receitas oriundas de fontes externas: 85,3% (2015). PIB per capita (IBGE-2020): R$
20.873,56 (447º lugar entre os 497 municípios do RS). Índice de Desenvolvimento Humano - IDH (IBGE
2010): 0689 (350º lugar entre os 497). Taxa de analfabetismo de pessoas com 15 anos ou mais (2010): 8,46
%, expectativa de vida ao nascer (2010): 75,85 anos e mortalidade infantil (2020): 4,98 por mil nascidos
vivos. Dados disponíveis em www.cidades.ibge.gov.br.
16
Em razão de tratar-se de pesquisa de opinião pública sem identificação de participantes, este trabalho
não precisou ser submetido ou cadastrado no Comitê de Ética em Pesquisas ou na Plataforma Brasil,
conforme preceitua o art. 1º, Parágrafo único, inciso I, da Resolução do CNS nº 510, de 7 de abril de 2016.
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Mantido pela Controladoria-Geral da União (CGU) - endereço eletrônico: http://www.portaltransparencia.gov.br/
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Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais.
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7 CONCLUSÃO
As políticas de assistência social por parte do Estado passaram por uma evolução
com a CF de 1988, pois até então os governos “terceirizavam” às organizações da
sociedade civil, a prestação de serviços às pessoas mais pobres com base em ideais de
filantropia. Porém, é a partir de 1993 que a assistência social brasileira é regulamentada
como política social pública, sendo o antigo modelo caridoso sucedido por um referenciado
em direitos atraindo com clareza uma necessidade prestacional por parte do Estado.
Dentro da política de assistência social, a relevância do BPC restou clara não
só pela amplitude de seu alcance e de seus números (5,7 milhões de beneficiários),
mas também quando o estudo do IPEA revelou que este benefício é capaz de retirar as
famílias da indigência e da pobreza, ao contrário dos demais programas de transferência
de renda que apenas melhoram sua situação.
Verificou-se que o BPC teve suas raízes no sistema previdenciário, na Lei 6.179 de
1974 que previa a renda mensal vitalícia – RMV para idosos e pessoas com deficiência.
Mesmo antes da CF de 1988, o atendimento a idosos e pessoas com deficiência era
realizado conjuntamente pelo Estado brasileiro.
A assistência social e a previdência estão abrigadas num conceito mais amplo, o
da seguridade social, sendo a principal diferença entre um sistema e outro, a questão
da contribuição. Constatou-se que ainda existem muitas dúvidas em relação a esta
diferença, como revelou a pesquisa de campo em Butiá/RS.
Restou evidenciado ainda através da revisão bibliográfica, que os obstáculos que
as pessoas precisam transpor ao acessar o BPC são dificuldades que vão desde as
constantes mudanças nas leis que dificultam o acompanhamento, até o fato do benefício
ser operacionalizado pelo INSS, o qual somente é acessado através do atendimento
digital (Meu INSS), desconsiderando a realidade brasileira, o alto índice de analfabetismo
e o não acesso às mídias digitais.
O estudo de caso com os beneficiários de Butiá/RS possibilitou entender o contexto
em que se insere o BPC num determinado município brasileiro e as variáveis que o
influenciam, além de permitir a medição do grau de conhecimento dos entrevistados
acerca dos requisitos e as formas de acesso ao benefício.
Através da pesquisa foi constatado que 80% dos entrevistados não conhecem os
requisitos para o acesso e manutenção do benefício e 75% dos beneficiários disseram não
saber a diferença que existe entre benefícios assistenciais e benefícios previdenciários.
Os resultados quanto à forma como os entrevistados tomaram conhecimento da
existência do BPC, assim como da maneira como o acessaram, reforçam a importância
da rede de apoio na busca de alternativas de renda e no suporte para idosos e deficientes,
público-alvo do BPC: 70% dos beneficiários precisaram de auxílio de terceiros para
requerer o benefício e apenas 30% o acessaram pessoalmente.
Os dados colhidos no presente estudo respondem claramente ao problema de
pesquisa, ou seja, as pessoas em sua maioria desconhecem os requisitos necessários
para o acesso ao BPC e isso acaba se tornando um obstáculo no acesso ao benefício.
A busca por uma cidadania em sua plenitude, como nos ensina Carvalho, resultaria numa
sociedade mais consciente de seus direitos e deveres, mas enquanto isso não acontece continua
cabendo aos governos o aprimoramento de suas políticas públicas como é o caso do BPC.
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REFERÊNCIAS
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11.699, 13.240 e 13.846, para [...]. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 05 set. 2022.
Disponível em: planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Lei/L14441.htm. Acesso
em: 12 out. 2022.
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil. O longo Caminho. 3. ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
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SOARES, Fábio Veras; Sergei Suarez Dillon; MEDEIROS, Marcelo; OSÓRIO, Rafael
Guerreiro. Programa de Transferência de Renda no Brasil: Impactos Sobre a
Desigualdade. [s. l.]: Texto para Discussão, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA), 2006.
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Resumo
O presente artigo busca, por meio de explanações breves sobre a caracterização
dos segurados especiais perante o Instituto Nacional do Seguro Social, segundo a
Lei ordinária de matéria previdenciária que trata sobre o tema, em conjunto do que
são - tanto historicamente como juridicamente – os povos e comunidades tradicionais
dos faxinalenses, buscar dirigir à uma argumentação de que, com base no Decreto
nº. 6.040, de 2007, o qual dispõe planos de conferência e proteção dos direitos dos
povos e comunidades tradicionais brasileiros, somado com a Lei Estadual do Paraná
nº. 15.673, que reconhece formalmente as comunidades faxinais, sua cultura e modo
de viver como povo tradicional, seria possível, contando com a Certidão de Auto-
reconhecimento, o enquadramento inerente dos residentes desses conglomerados
campesinos faxinais como segurados especiais, sem que necessitassem das maiores
comprovações delimitadas na Instrução Normativa PRES/INSS nº. 128, de 2022, a
fim de que os direitos efetivamente resguardados e os desenhados pela Constituição
da República Federativa do Brasil, de 1988, fossem verdadeiramente cumpridos,
garantindo o direito à previdência social pelo Regime Geral da Previdência Social
à todos e todas que se identificam historicamente, territorialmente e culturalmente
como pertencente a esse conjunto social, primando pela equidade idealizada pelo
constituinte na feitura da Lei Maior.
Palavras-chave: Direito previdenciário; Povos faxinalenses; Segurado especial; Autodeterminação.
Abstract
The present article aims to, through brief explanations on the characterization of
special insured individuals before the Brazilian Nacional Institute of Social Security,
according to the Brazilian Ordinary Social Security Law that deals with the subject,
together with what – both historically and legally – tradicional people and communities
of the faxinais, seek to address an argument that, based on the Brazilin Decree no.
6.949, of 2007, which provides plans for checking and pretecting the rights of the
traditional communities and people of Brazil, in addition to the Paraná State Law
1
Acadêmico de Direito na UFPR – Universidade Federal do Paraná.
2
Professor na UFPR - Universidade Federal do Paraná. Doutor e Mestre em Direito pela USP – Universidade
de São Paulo. Diretor Científico do IEPREV.
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no. 15.673, of 2007, which formally recognizes the faxinais communities, with their
culture and way of living as traditional people, it would be possible, relying on the
Certificate of Self-recognition, to inherently classify the residents of these faxinais
conglomerates as special insureds, without requiring the further proof delimited in
the Brazilian Normative Instruction PRES/INSS no. 128, of 2022, so that the rights
effectively protected and those designed by the Constitution of the Federative
Republic of Brazil, of 1988, were truly fulfilled, guaranteeing the right to social security
under the General Social Security Regime for everyone who identifies themselves
historically, territorically and culturally as beloging to this social group, striving for the
equity idealized by the constituent in the creation of the Major Law.
Keywords: Social security law; Faxinalense people; Special insured; Self-declaration.
1 INTRODUÇÃO
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Para fins de melhor análise, nos atentemos especialmente à Lei nº. 8.213/91,
a qual dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social. Nela, o legislador
colocou por definir o segurado especial como a pessoa física residente no imóvel rural
ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime
de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros a título de mútua
colaboração, na condição de produtor, pescador artesanal e cônjuge ou companheiro,
bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade que trabalhem com o grupo
familiar3.
Importante para o caso em tela é justamente fazer a leitura do dispositivo conferido
pelo legislador como realmente um estilo de vida, compreender, mesmo que com pouca
verticalidade, o que se quis dizer ao enquadrar cada requisito no rol.
Compreendendo a dinâmica social que permeia toda essa questão é possível
verdadeiramente entender os seus objetivos, como já descrito, e ter melhor dimensão
sobre o cerne da questão que irá futuramente ser trazida no presente trabalho.
3
Vide artigo 11, inciso VII, alíneas “a”, “b” e “c”, da Lei nº. 8.213, de 24 de julho de 1991.
4
Art. 201, §7º, II, CRFB/88: 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de
idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de
economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.
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3 POVOS FAXINALENSES
5
Conforme inciso I, do art. 3º do Decreto nº. 6.040, de 2007.
94
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Entende-se, então, a PNPCT como uma ferramenta – ainda que juridicamente não
tão forte, justamente por ser um decreto (Milaré, 2021, p. 1149) – que tem como principal
objetivo a promoção, proteção e fortalecimento dos direitos seus direitos difusos, como
a territorialidade, os direitos sociais, ambientais, econômicos e culturais, assegurando o
reconhecimento de suas identidades e fiscalizando o cumprimento de suas normas.
Delimitado o objetivo principal, é importante centrarmos especialmente em uma
disposição que será de extrema importância para o restante do presente trabalho –
agindo como elemento de integração de toda a pesquisa –, sendo a gênese da tese do
presente trabalho: o inciso VIII, do art. 2º do anexo do referido decreto6.
Com ele, podemos a partir daqui buscar entender o que está claramente
acontecendo, com base no breve diagnóstico feito tópicos acima, e porque esses
verdadeiros gargalos não poderiam, em teoria, existir.
A partir da leitura da normativa como um todo, denota-se uma tentativa de conferir
uma efetivação dos direitos fundamentais e demais direitos trazidos pela Lei Maior,
dirigindo uma atenção especial à questão da previdência social aos povos e comunidades
tradicionais – que, em vista do texto trazido pela Constituição Federal, acaba dando
maior atenção às comunidades e povos indígenas e quilombolas, conforme o inciso II,
do art. 3º do Decreto nº 6.040/07, que faz menção aos arts. 231 da CRFB/88 e 68 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias.
6
VIII - garantir no sistema público previdenciário a adequação às especificidades dos povos e comunidades
tradicionais, no que diz respeito às suas atividades ocupacionais e religiosas e às doenças decorrentes
destas atividades;
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Contudo, foi apenas no ano de 2007, por força da Lei Estadual do Paraná nº.
15.673, que as comunidades faxinais foram formalmente reconhecidas, elencando-
se um rol de atividades típicas desempenhadas pelas comunidades logo nas alíneas
do seu primeiro artigo, descrevendo, assim, a produção extensiva de animais, o uso
comum de terras para produção agrícola de base alimentar, utilizando-se de policulturas,
o extrativismo florestal de baixo impacto e a cultura própria, laços de solidariedade
comunitária e preservação de suas tradições e práticas sociais7.
Além do reconhecimento, as demais disposições determinam a identidade
faxinalense como
Por fim, cumpre iluminar que, pelo que diz o art. 3º da mesma lei, o reconhecimento
da identidade faxinalense fazer-se-á por Certidão de Auto-reconhecimento, emitida pelo
órgão estadual que trata de assuntos fundiários. A dita certidão ainda servirá para a
comunicação do reconhecimento da identidade faxinalense à Comissão Nacional de
Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, conforme dita o
Parágrafo Único do mesmo artigo.
Conclui-se, à luz de todo o exposto, que, conforme toda a sua história de formação,
e por força conferida por legislação estadual, que o engloba a dispositivo de ato executivo
federal, os povos e comunidades faxinalenses são, pelo sentido jurídico do termo, povos
tradicionais do Brasil, sendo elegíveis aos direitos resguardados pela nomenclatura.
7
Vide alíneas “a”, “b”, “c” e “d” da Lei Estadual do Paraná nº. 15.673 de 2007.
8
Parágrafo único do art. 2º da Lei Estadual do Paraná nº 15.673/2007.
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somados com a certa distância de centros urbanos –, pode se ter situações em que muitas
vezes exista uma falta de documentação oficial, até mesmo pela sua desnecessidade,
que acaba acarretando numa dificuldade de comprovação de segurado especial.
A falta de documentos - como ficha de associado em cooperativa, notas fiscais
de mercadoria, entre outros listados no art. 116 da Instrução Normativa PRES/INSS
nº. 128, de 28 de março de 2022 -, justamente como dito, está relacionada à frequente
desnecessidade do uso destes, ou até à incongruência com o estilo de vida daquela
população, resultando no não conhecimento do caráter de segurado especial em sede
de Processo Administrativo Previdenciário – PAP.
Por isso, considerando que a grande maioria das pessoas residentes nessas
comunidades tradicionais abordadas não constituem muitos vínculos formais
empregatícios – com o devido registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social –,
muitos indivíduos acabam por restar impedidos de gozarem de seus benefícios previstos
por lei da Previdência Social.
Negados de terem a concessão do benefício de aposentadoria por idade do
trabalhador rural por não conseguirem o enquadramento, não lhes resta nenhuma
possibilidade de concessão de benefício previdenciário em quaisquer das modalidades
de aposentadoria.
Apresenta-se dessa forma uma grave violação dos direitos fundamentais
consagrados pela nossa Constituição Federal de 1988, como o direito à seguridade
social como um todo, ou a resguarda conferida às pessoas do campo e às comunidades
e povos tradicionais brasileiros, tendo em mente ainda a antinomia criada pelo não
reconhecimento, à luz de todo o já exposto.
5 CONCLUSÃO
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REFERÊNCIAS
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de 1988.
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previdenciário. - 26. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2023.
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MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2021
SILVA. Fabrícia Alves da; LIMA. Elcicléia de Oliveira; BRAGA. Clarice Rodrigues.
AS DIFICULDADES DO SEGURADO ESPECIAL FRENTE À NECESSIDADE DE
DOCUMENTOS CONTEMPORÂNEOS COMO PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE
RURAL. Revista Multidisciplinar do Nordeste Mineiro, [S. l.], v. 4, n. 1, 2024. DOI:
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SOUZA, Roberto Martins. “Mapeamento social dos faxinais do Paraná” In: ALMEIDA,
Alfredo Wagner Berno de. Terras de Faxinais. Manaus: Edições da Universidade do
Estado do Amazonas – UEA, 2009, p. 29-88.
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Resumo
O presente artigo busca analisar o alcance e as consequências da auditoria externa
obtemperada pelos Tribunais de Contas dos Estados nos Regimes Próprios de
Previdência Estaduais e Municipais, a partir de uma decisão recente do Supremo
Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1426306, com
Repercussão Geral, onde foi decidido que os servidores estáveis nos termos do
artigo 19 do ADCT não estão sujeitos aos Regimes Próprios de Previdência Social,
mas deverão ser aposentados pelo Regime Geral de Previdência Social. Para tanto,
o método hipotético-dedutivo foi aplicado em duas etapas: identificando a formação
de valores e aspecto cultural que tolera interesses contraditórios entre indivíduo/
segurado/beneficiário e Estado. Para a pesquisa, foram utilizadas legislações pátrias,
históricas e vigentes, obtida na plataforma do site do planalto e em livros compilados.
O enfoque teórico será valorativo com ênfase em sóciocrítica, pois a análise da
aparente contradição de valores entre os objetivos de proteção aos direitos humanos
e a garantia de uma previdência social profícua, deve ser feita com observância
à formação histórica da previdência, seus objetivos e seus efeitos na sociedade.
Insta destacar que o presente artigo é apresentado como uma das exigências para
pontuação no curso de Mestrado em Direitos Humanos da Universidade Federal
de Mato Grosso do Sul - UFMS. Dito isto e, de todo o exposto, considerando
que os Tribunais de Contas não são órgãos judiciais, poderão ser registradas as
aposentadorias em dissonância com a decisão do Pretório Excelso?
Palavras-chave: Tribunais de Contas. Controle Externo. Regimes Próprios de Previdência Social.
Abstract
The present work seeks to analyze the scope and consequences of the external
audit obtained by the State Audit Courts in the State and Municipal Pension Regimes,
based on a recent decision of the Federal Supreme Court, which decided, in the
General Repercussion, that permanent servants under the terms of article 19 of the
ADCT are not subject to the Special Social Security Regimes, but must be retired by
the General Social Security Regime. To this end, the hypothetical-deductive method
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Procuradora Autárquica do Governo do Estado do Mato Grosso do Sul. Mestranda em Direitos Humanos
pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
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was applied in two stages: identifying the formation of values and cultural aspect
that tolerates contradictory interests between the individual/insured/beneficiary and
the State. For the research, historical and current national legislation was used,
obtained from the plateau website platform and in compiled books. The theoretical
focus will be evaluative with an emphasis on socio-criticism, as the analysis of the
apparent contradiction of values between the objectives of protecting human rights
and guaranteeing a fruitful social security must be carried out in compliance with
the historical formation of social security, its objectives and its effects on society. It
is important to highlight that this article is presented as one of the requirements for
scoring in the Master’s in Human Rights course at the Federal University of Mato
Grosso do Sul - UFMS. Having said that and, in light of all the above, considering that
the Audit Courts are not judicial bodies, can retirements be registered in disagreement
with the decision of the Praetorian Excellency?
Keywords: Courts of Accounts. External Control. Own Social Security Regimes.
1 INTRODUÇÃO
2 BREVE HISTÓRICO
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da pessoa humana, visto que, conforme leciona a mesma Declaração “Art. I. Todos os
seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, senão vejamos:
Artigo XXV
Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-
-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuá-
rio, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis,
e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez,
viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência
em circunstâncias fora de seu controle.” (grifo nosso)
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medidas que aproximam cada vez mais os RPPS do RGPS. Mas até o atingimento do
tão almejado equilíbrio há um longo caminho a ser percorrido, tempo este em que a
sociedade continuará custeando a previdência dos servidores públicos.
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Por seu turno, na Constituição Estadual do Mato Grosso do Sul assim preleciona:
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22
Art. 9º Compete à União, por intermédio da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do
Ministério da Economia, em relação aos regimes próprios de previdência social e aos seus fundos
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renovado a cada 180 (cento e oitenta) dias, caso o Regime cumpra todos os requisitos
exigidos legalmente.
Ademais, a última reforma da Previdência, ocorrida através da Emenda
Constitucional nº 103/2019, concedeu “status” constitucional ao referido certificado,
impedindo judicializações para a renovação do certificado mesmo sem o preenchimento
de todos os requisitos exigidos.
Não podemos olvidar acerca da dificuldade que a Emenda Constitucional
nº 103/2019 trouxe aos Tribunais de Contas, no sentido da análise dos benefícios
previdenciários para o fim de registro, visto que foi a primeira emenda que não trouxe
obrigatoriedade de observância aos Estados e Municípios; assim, para cada RPPS há
uma legislação, que deve ser analisada uma a uma pelos Tribunais de Contas, para o
fim de registro.
Em que pese a atuação do Ministério da Previdência, as auditorias procedidas
pelo mesmo geralmente são remotas. Daí a importância de auditorias permanentes por
parte dos Tribunais de Contas, com o fito de não permitir o pagamento de benefícios
indevidos, e consequente lesão aos cofres públicos – e à população.
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Desta feita, os empregados que estavam em exercício há, pelo menos, 05 (cinco)
anos continuados na data da promulgação da Constituição de 1988, têm somente o
direito de permanecer nos cargos em que foram admitidos, mas não são detentores das
vantagens privativas dos ocupantes de cargo efetivo, o que afasta a possibilidade de
participação no regime próprio de previdência social.
Ainda de acordo com o entendimento da Corte, a partir da Emenda Constitucional
EC nº 20/1998, que deu nova redação ao artigo 40 da Constituição, o vínculo no RPPS
é exclusividade dos servidores públicos civis investidos em cargo efetivo.
Ocorre que muitos entes subnacionais incluíram em seus regimes próprios de
previdência social os servidores beneficiados com a estabilidade excepcional do artigo 19
do ADCT e, ainda, alguns estenderam a excepcionalidade aos que ingressaram no serviço
públicos até a data da promulgação da Constituição Federal e assim permaneceram
durante 05 (cinco) anos ininterruptos, ou seja, até 05 de outubro de 1993!
Com a decisão do Supremo Tribunal Federal, temos alguns imbróglios:
- A decisão é tema de Repercussão Geral, ou seja, de observância obrigatória
pelos Tribunais, mas não vincula imediatamente a administração pública, que possuem
os servidores excepcionalmente estáveis como segurados dos RPPS(s);
- As leis dos entes subnacionais que possuem referida previsão deveriam ser
objeto de alteração; mas diante da medida deveras antipática e, sobretudo, em véspera
de eleições municipais, nenhum chefe do poder executivo municipal desejará proceder
a referida alteração;
- Sob o aspecto do servidor, é uma expectativa que se frustra, vez que através do
RPPS pode-se auferir benefício acima do teto do Regime Geral de Previdência, hoje no
patamar de R$ 7.507,49 (sete mil quinhentos e sete reais e quarenta e nove centavos) –
e um problema social que se instalará;
- Ainda, o servidor que recebe acima do teto do RGPS, em caso de migração para
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o INSS, como proceder com o valor das contribuições que excederam ao teto?
- Com relação às contribuições, considerando que a Certidão de Tempo de
Contribuição só pode ser emitida para ex-servidor33, o ente deverá repassar todos os
recolhimentos ao INSS?
- Se o questionamento anterior for positivo, o repasse deverá ser só dos últimos 05
(cinco) anos – e o INSS arcará com todo o benefício somente com essas contribuições –
ou deverá ser de todo o período contributivo, acrescido de juros e correções monetárias?
- Não se pode olvidar que muitos entes subnacionais possuem Regimes Próprios
deficitários, administrados sob o regime de repartição simples, ou seja, arrecadam dos
servidores ativos para pagamento dos inativos, não possuindo, portanto, valores em
caixa;
- Respeitada a prescrição, as aposentadorias já concedidas nestas condições, se
perpetuarão? E as pensões por morte?
- E o ponto nevrálgico a ser questionado: como será a atuação dos Tribunais de
Contas, nestes casos, a partir da decisão do STF?
O fato é que a “transferência” desses servidores para o Regime Geral de Previdência
Social seria financeira e atuarialmente positiva para os Regimes Próprios de Previdência,
sobretudo para os entes que possuem regimes deficitários e necessitam aportar valores
mensalmente para a cobertura da folha de pagamento de benefícios previdenciários.
Ainda, impactaria positivamente tanto no déficit financeiro quanto no déficit atuarial,
este último um dos maiores problemas dos RPPS(s).
Dito isto, é cedido que o Tribunal de Contas não é um órgão judicante, mas
pertencente ao Poder Legislativo, com o fito de fiscalizar as contas públicas. Nesse
sentido, sabemos que ao Tribunal de Contas não compete proceder ao controle de
constitucionalidade das leis, mas pode questionar uma aposentadoria concedida de
forma ilegal, inclusive negando-lhe o competente registro.
O fato é que a Repercussão Geral faz coisa julgada somente no processo que a
ensejou e vincula tão somente os Tribunais a julgarem no mesmo sentido, mas não a
administração pública.
Outro fato que não pode ser esquecido é a lesão financeira que pode ser causada
para os servidores que estão nas condições da decisão do STF, sobretudo a expectativa
de se aposentarem com paridade e integralidade de vencimentos, sem falar nos
aposentados nos últimos 05 (cinco) anos.
Mas também não podemos esquecer que na medida que são mantidos custeios
indevidos pelo Poder Público, sobretudo em áreas deficitárias, deixa-se de investir em
outras áreas sensíveis, onde quem é prejudicada é a sociedade, que é a real mantenedora
do Poder Público e é o fim deste último.
Nessa toada, talvez há de se questionar se apenas a auditoria contábil, financeira
e de registro de aposentadorias e pensões, dentro dos Regimes Próprios de Previdência,
são suficientes para avaliar a regularidade destes regimes.
Diante de todas estas questões, ao fim e ao cabo, enquanto não houver mudança
33
Art. 196. A CTC só poderá ser emitida para ex-segurado do RPPS ou ex-militar do SPSM e relativamente
a períodos em que tenha havido, por parte deles, a prestação de serviço ou a correspondente contribuição.
(Portaria MTP nº 1.467, de 02 de junho de 2022)
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legislativa nos entes subnacionais quanto à inclusão dos excepcionalmente estáveis nos
termos do artigo 19 do ADCT para cumprimento da decisão do STF ou uma Emenda
Constitucional para resolver tal situação, ficará a cargo dos Tribunais de Contas tomarem
posicionamento acerca do registro ou não das aposentadorias destes servidores
custeadas pelos Regimes Próprios de Previdência Social.
4 CONCLUSÃO
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Resumo
O presente artigo pretende desenvolver estudos sobre a importância dos instrumentos
de parceria entre os regimes próprios de previdência social e entes federativos
ou entre aqueles e as diversas organizações sociais, como forma de promover o
exercício de direitos fundamentais pelo segurado, mas sem desatender o princípio
constitucional do equilíbrio financeiro e atuarial. Partindo-se desta problemática inicial,
o ensaio foi orientado metodologicamente por revisão bibliográfica de livros e artigos
científicos, assim como levantamento de dados junto a órgãos oficiais. O percurso
tomará em conta conceitos de equilíbrio financeiro e atuarial dos RPPS e sua relação
com os direitos fundamentais, instrumentos de parceria e prévia definição acerca
dos contratos e outros ajustes bilaterais, perspectivas após a emenda constitucional
nº 103/2019, taxa administrativa e suas possibilidades de utilização pela gestão
previdenciária, e ao final, o debate sobre os resultados da pesquisa.
Palavras-chave: Regime próprio de previdência social. Equilíbrio financeiro e atuarial. Segurado.
Direitos fundamentais
Abstract
This article aims to develop studies on the importance of partnership instruments
between social security systems and federal entities or between those and various
social organizations, as a way of promoting the exercise of fundamental rights by the
insured, but without disregarding the constitutional principle financial and actuarial
balance. Starting from this initial problem, the essay was methodologically guided by
a bibliographical review of books and scientific articles, as well as data collection from
official bodies. The route will take into account concepts of financial and actuarial balance
of the RPPS and its relationship with fundamental rights, partnership instruments
and prior definition of contracts and other bilateral adjustments, perspectives after
1
Graduação em Curso de Direito pelo Centro de Ensino Superior Arcanjo Mikael de Arapiraca (2012).
Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Estácio de Sá. Mestrando em Direito
Público pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Professor de direito penal e processual penal da
Faculdade São Vicente de Pão de Açúcar/AL - FASVIPA e coordenador do curso de direito desta Instituição.
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1 INTRODUÇÃO
2
O autor afirma, ainda, que a Constituição Federal de 1988 foi a primeira a reunir a “saúde, a assistência
social e a previdência em um único sistema de proteção social de caráter tridimensional”, p. 47.
3
Art. 24, XII: Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;
4
Vide art. 10, § 7º Aplicam-se às aposentadorias dos servidores dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios as normas constitucionais e infraconstitucionais anteriores à data de entrada em vigor
desta Emenda Constitucional, enquanto não promovidas alterações na legislação interna relacionada ao
respectivo regime próprio de previdência social.
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5
Destaque-se que tal emenda resultou da transformação da PEC 33/1995, a qual trazia em sua redação
original o termo “equilíbrio financeiro e atuarial” no parágrafo 1º do art. 40, a saber: “O custeio dos
benefícios do regime previdenciário referido neste artigo será feito mediante contribuições dos servidores
públicos ativos e Inativos, bem como dos pensionistas e do respectivo ente estatal, observados critérios
que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial”.
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6
§ 13 - Ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação
e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público, aplica-se o regime geral de
previdência social.
7
Em análise de dados concessivos de benefícios pelos RPPS, assevera, ainda que: “Esses resultados
observados no período de 2004 a 2009, ainda que não de todo satisfatórios, foram certamente favorecidos
pelas reformas constitucionais ocorridas em 1998 e 2003, que eliminaram algumas distorções nos critérios
de concessão dos benefícios e reduziram o ritmo das novas aposentadorias, evitando um crescimento mais
acelerado das despesas, além de permitir uma maior arrecadação das contribuições, reduzindo assim o
desequilíbrio financeiro”. (p. 194) Logicamente, há de se ter em mente que existem outros fatores que
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Percebe-se que o nível o qual foi alçado, resultou aos RPPS maior vigilância e
comprovação de suas respectivas estabilidades financeiras em garantir o pagamento dos
benefícios previdenciários, sob pena de incidir nas sanções previstas na lei n. 9.717/98 e
não obterem, consequentemente, o CRP – Certificado de Regularidade Previdenciária.
Esta delicada relação entre equilíbrio e promoção de direitos é que trataremos a seguir.
contribuíram para o déficit financeiro e atuarial de vários RPPS, tais como atraso dos repasses, retiradas
ilegais dos Fundos, como veremos adiante.
8 Não é foco de nossa abordagem diferenciar direitos fundamentais e direitos humanos, de maior
abrangência e indiscutível importância na consecução dos direitos dos homens pelo Estado. Mas, para
maiores aprofundamentos, remetemos o leitor ao capítulo 1, p. 27-35, onde o autor aborda de maneira
elogiável e conclui que ambos os termos não são “reciprocamente excludentes ou incompatíveis, mas,
sim, de dimensões intimas e cada vez mais inter-relacionadas” (p. 35)
9
Para maior aprofundamento sobre o conceito de princípio, assim como a distinção entre princípios e
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regras, remetemos o leitor à obra de Alexy, capítulo 2 e especialmente 3, quando o autor compreende
princípios como mandados de otimização, ao pontuar que “O ponto decisivo na distinção entre regras e
princ1p1os é que princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível
dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Princípios são, por conseguinte, mandamentos
de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que
a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das
possibilidades jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras
colidentes” (Alexy, 2015, p. 90).
10
Art. 1º: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão
e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.
11
Constituição do Brasil, art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são
iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; II - ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
12
Assevera o autor: La primera respuesta es la que ofrece la teoría del derecho. En el plano teórico-jurídico
la definición más fecunda de los “derechos fundamentales” es desde mi punto de vista la que los identifica
con los derechos que están adscritos universalmente a todos en cuanto personas, o en cuanto ciudadanos
o personas con capacidad de obrar, y que son por tanto indisponibles e inalienables. [...] La segunda
respuesta es la que ofrece el derecho positivo, es decir la dogmática constitucional o internacional. [...] La
tercera respuesta, que intentaré formular en las páginas que siguen, es la que ofrece la filosofia política, y
se refiere a la pregunta de “cuáles derechos deben ser garantizados como fundamentales”.
Se trata de una respuesta de tipo no asertivo sino normativo. Por esto debemos formular, para fundarla
racionalmente, los criterios meta-éticos y meta-políticos idóneos para identificarlos. Sumariamente,
me parece, pueden ser indicados tres criterios axiológicos, sugeridos por la experiencia histórica del
constitucionalismo, tanto estatal como internacional.
El primero de estos criterios es el del nexo entre derechos humanos y paz instituido en el preámbulo de
la Declaración Universal de 1948. Deben estar garantizados como derechos fundamentales todos los
derechos vitales cuya garantía es condición necesaria para la paz: el derecho a la vida y a la integridade
personal, los derechos civiles y políticos, los derechos de libertad, pero también, en un mundo en el que
sobrevivir es siempre menos un hecho natural y cada vez más un hecho artificial, los derechos Sociales
para la supervivencia.
El segundo criterio, particularmente relevante para el tema de los derechos de las minorías, es el del
nexo entre derechos e igualdad. La igualdad es en primer lugar igualdad en los derechos de libertad, que
garantizan el igual valor de todas las diferencias personales —de nacionalidad, de sexo, de lengua, de
religión, de opiniones políticas, de condiciones personales y sociales, como dice el artículo 3 párrafo
primero de la Constitución italiana— que hacen de cada persona un individuo diferente a todos los demás
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y de cada individuo una persona igual a todas las otras; y es en segundo lugar igualdad en los derechos
sociales, que garantizan la reducción de las desigualdades económicas y sociales.
El tercer criterio es el papel de los derechos fundamentales como leyes del más débil. Todos los derechos
fundamentales son leyes del más débil en alternativa a la ley del más fuerte que regiría en su ausencia: en
primer lugar el derecho a la vida, contra la ley de quien es más fuerte físicamente; em segundo lugar los
derechos de inmunidad y de libertad, contra el arbitrio de quien es más fuerte políticamente; en tercer lugar
los derechos sociales, que son derechos a la supervivencia contra la ley de quien es más fuerte social y
económicamente.
13
Ainda sobre o negócio jurídico, o mestre conclui a definição como “fato jurídico cujo elemento nuclear
do suporte fáctico consiste em manifestação ou declaração consciente de vontade, em relação a qual o
sistema jurídico faculta às pessoas, dentro de limites predeterminados e de amplitude vária, o poder de
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as partes que se reúnem com interesses mútuos de criar uma relação jurídica, podem
estipular cláusulas, criando obrigações e direitos recíprocos.
No entanto, tratando-se de relações jurídicas, cuja parte integrante da relação
contratual é o Estado, deve haver o formalismo necessário a fim de “dar maior proteção
ao interesse público que sempre deve estar no âmago das condutas administrativas”,
lembra José Carvalho dos Santos Filho (2022, p. 149). Nesta linha, o autor considera
como gênero contratos da Administração Pública “todos aqueles ajustes em que o Estado
está presente como parte contratante” (2022, p. 150), seja com pessoa física ou jurídica,
para “a consecução de fins públicos, segundo regime jurídico de direito público”. (Di
Pietro, 2022, p. 556)
Não obstante o regime de direito público ou de direito privado que permear o
contrato envolvendo a Administração Pública, fato é que adentrar a temática dos
contratos requer a delimitação de certos conceitos, a fim de evitar confusões sintáticas e
semânticas. Por exemplo, se o contrato traz em sua gênese obrigações e direitos mútuos,
seria apropriado falar em contrato de convênio ou ambos os termos são contraditórios?14
E qual a fonte jurídica apta a albergar os regimes próprios de previdência social e a
promoção de direitos fundamentais do segurado, fontes de nosso estudo? É o que
veremos a seguir.
escolha de categoria jurídica e de estruturação do conteúdo eficacial das relações jurídicas respectivas,
quanto ao seu surgimento, permanência e intensidade no mundo jurídico”. (p. 233)
14
Importante a delimitação porque há autores que sustentam não existir contrato administrativo quando
realizado o ajuste com o particular. Sobre esta corrente (defendida, entre outros, por Oswaldo Aranha
Bandeira de Mello), Maria Sylvia Zanella Di Pietro assevera “que o contrato administrativo não observa
o princípio da igualdade entre as partes, o da autonomia da vontade e o da força obrigatória das
convenções, caracterizadores de todos os contratos. Com relação ao primeiro, afirma-se não estar
presente porque a Administração ocupa posição de supremacia em relação ao particular. Quanto à
autonomia da vontade, alega-se que não existe quer do lado da Administração, quer do lado do particular
que com ela contrata: a autoridade administrativa só faz aquilo que a lei manda (princípio da legalidade)
e o particular submete-se a cláusulas regulamentares ou de serviço, fixadas unilateralmente pela
Administração, em obediência ao que decorre da lei. Mesmo com relação às cláusulas financeiras, que
estabelecem o equilíbrio econômico no contrato, alegam os adeptos dessa teoria que não haveria, nesse
aspecto, distinção entre os contratos firmados pela Administração e os celebrados por particulares entre
si”. (2019, p. 557)
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decorre do art. 37, XXI, da Constituição Federal, em que obras, serviços, compras e
alienações serão contratados mediante licitação. Aos regimes próprios de previdência
social, por existirem especialmente como autarquias (administração pública indireta),15
a autonomia administrativa não lhes retira a obrigação de contratar mediante licitação, o
que ocorrerá normalmente com as assessorias jurídicas, técnicas, contábeis e de gestão,
por exemplo ou construção de imóvel sede de funcionamento para o próprio RPPS. No
entanto, tais serviços e obras ainda não atingem a finalidade para além da estrutura
mínima que deve ter o Instituto de Previdência, ainda não gerando impactos positivos
adicionais na vida dos segurados.
Em outra categoria, encontram-se os convênios, os quais não constituem
modalidade de contrato, mas “avença ou ajuste entre entidades de direito público de
natureza e nível diversos ou entidade públicas ou privadas para a realização de objetivos
de interesse comum, mediante mútua colaboração”. (Cunha Jr, 2015, p. 543)
Para Di Pietro (2019, p. 698):
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art. 38, parágrafo único, exigia a análise e aprovação pela assessoria jurídica.
18
Art. 184. Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber e na ausência de norma específica, aos
convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da
Administração Pública, na forma estabelecida em regulamento do Poder Executivo federal.
19
O objetivo é ter “o cuidado em não se utilizar o significante “termo de cooperação”, de modo a evitar
que fosse confundido com o congênere então disciplinado no Decreto nº 6.170/2007, que apresentava
contornos de onerosidade. Com isso, convênios e contratos de repasse passaram a ser utilizados no
âmbito federal apenas quando há transferências de recursos entre os participantes”. Disponível em: bit.
ly/3VUkpbD. Acesso em 27 fev. 2024.
20
Aqui aplicamos o termo “exclusivo” porque o próprio corpo técnico contratado pelo RPPS também traz
benefícios aos segurados. Porém, consideramos benefícios obrigacionais básicos, ausentes da categoria
“promocionais”.
21
Veremos de forma mais específica no capítulo 4.
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22
Não focamos em nosso artigo as espécies termo de cooperação e de fomento, introduzidas pela lei nº
13.019/2014, e cujos requisitos para elaboração se apresentam no art. 35 da citada lei.
23
Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se:
VIII-A - acordo de cooperação: instrumento por meio do qual são formalizadas as parcerias estabelecidas
pela administração pública com organizações da sociedade civil para a consecução de finalidades de
interesse público e recíproco que não envolvam a transferência de recursos financeiros;
24
§ 2º O rol de benefícios dos regimes próprios de previdência social fica limitado às aposentadorias e à
pensão por morte.
25
Disponível em: https://encurtador.com.br/O6U61. Acesso em 18 fev. 2024.
26
Para conferir a situação de cada Estado, acessar o link do Ministério da Previdência Social: https://
encurtador.com.br/8iOCl. Acesso em 18 fev. 2024.
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27
Art. 1º Os regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, dos militares dos Estados e do Distrito Federal deverão ser organizados,
baseados em normas gerais de contabilidade e atuária, de modo a garantir o seu equilíbrio financeiro e
atuarial, observados os seguintes critérios:
III - as contribuições e os recursos vinculados ao Fundo Previdenciário da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios e as contribuições do pessoal civil e militar, ativo, inativo, e dos pensionistas,
somente poderão ser utilizadas para pagamento de benefícios previdenciários dos respectivos regimes,
ressalvadas as despesas administrativas estabelecidas no art. 6º, inciso VIII, desta Lei, observado os
limites de gastos estabelecidos em parâmetros gerais;
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Art. 6º Fica facultada à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, a constituição de
fundos integrados de bens, direitos e ativos, com finalidade previdenciária, desde que observados os
critérios de que trata o artigo 1º e, adicionalmente, os seguintes preceitos:
VIII - estabelecimento de limites para a taxa de administração, conforme parâmetros gerais;
29
O Autor considerada a despesa pública um fenômeno complexo para ser definido unicamente como
gasto público. É preciso singularizar a aplicação pelo ente estatal. Assim, classifica as despesas públicas
em três critérios, a partir das lições de Ferreiro Lapatza: econômico, pilar do funcionamento do Estado;
funcional, quando se perquire a “finalidade do Estado que o gasto atende”; e orgânico, o mais importante,
ao indicar quem pode realizar o gasto. (p. 71-72)
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5 CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
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30
Para consulta ao Manual do Pró-Gestão, acessar: http://sa.previdencia.gov.br/site/2018/08/MANUAL-
DO-PRO-GESTAO-RPPS-VERSAO-FINAL-2018-03-21-COM-ANEXO-5-ALTERADO-ATUAL_v2.pdf.
Acesso em 27.02.2024.
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BRASIL. Lei nº 9.717, de 27 de novembro de 1998. Dispõe sobre regras gerais para a
organização e o funcionamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores
públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos militares dos
Estados e do Distrito Federal e dá outras providências. Brasília, DF: Presidente da
República, [1998]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9717.htm.
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BRASIL. Portaria MTP nº 1.467, de 02 junho de 2022 (atualizada até 12/12/2023). Disciplina
os parâmetros e as diretrizes gerais para organização e funcionamento dos regimes próprios
de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios, em cumprimento à Lei nº 9.717, de 1998, aos arts. 1º e 2º da Lei nº 10.887,
de 2004 e à Emenda Constitucional nº 103, de 2019. Brasília, DF: Presidência da República,
[2023]. Disponível em: https://encurtador.com.br/uCgEl. Acesso em: 27 fev. 2024.
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CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito
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Resumo
O artigo aborda o tema dos poderes instrutórios do relator no processo judicial
previdenciário, a partir da interpretação da regra do artigo 938, § 3º, do Código de
Processo Civil. Trata da instrumentalidade do processo, da efetividade da jurisdição
e do princípio da primazia da decisão de mérito. O artigo discute os males da
“interpretação retrospectiva”, técnica que busca desvendar o sentido e o alcance
do Código de 2015 fazendo uso de critérios válidos para o CPC de 1973. Conclui
pela necessidade de atribuir efetividade à regra do artigo 938, § 3º, do CPC/2015,
superando uma cultura judiciária que insiste em reafirmar o dogma da nulidade
da sentença. Não cabe mais determinar a anulação das sentenças em casos de
deficiência ou insuficiência probatória. Caberá ao Tribunal determinar a conversão do
julgamento em diligência para produzir a prova faltante, prosseguindo-se em seguida
com o julgamento do mérito do recurso. Não há limitação quanto ao tipo de prova que
pode ser produzido, podendo o relator deliberar se a prova será produzida no próprio
Tribunal ou em primeiro grau de jurisdição, caso em que será expedida uma carta de
ordem. A metodologia empregada no artigo é a pesquisa teórico-dogmática, além da
pesquisa jurisprudencial essencial para a solução do problema proposto.
Palavras-chave: Direito Processual Civil; Direito Previdenciário; Instrumentalidade; Efetividade.
Primazia da decisão de mérito; Poderes instrutórios do relator.
Abstract
The article investigates the instructive powers of the presiding judge in the social
security judicial cases, based on the interpretation of the rule of article 938, paragraph
3, of the Code of Civil Procedure (CPC/2015). It deals with the instrumentality of
the process, the effectiveness of the jurisdiction and the principle of primacy of the
decision on the merits. The article also discusses the “retrospective interpretation”,
a technique that seeks to unravel the meaning and scope of the 2015 Code using
valid criteria for the 1973 CPC. It concludes by the need to attribute effectiveness to
the rule of article 938, paragraph 3, of CPC/2015, overcoming a judicial culture that
insists on reaffirming the dogma of nullity of the sentence. It is no longer possible
to determine the annulment of sentences in cases of deficiency or insufficiency of
1
Graduado, Mestre e Doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/
SP). Professor da Faculdade de Direito da PUC/SP. Juiz Federal na Seção Judiciária de São Paulo. São
José dos Campos/SP, Brasil. E-mail: renatobp@uol.com.br.
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evidence. It will be up to the presiding judge in the Court (or the competent collegiate
organ), to determine the conversion of the judgment into a diligence to produce the
evidence, proceeding then with the judgment of the merits of the appeal. There is
no limitation on the kind of evidence that can be produced in this procedure, and the
presiding judge can decide whether the evidence will be produced in the Court itself
or in the first degree of jurisdiction. The methodology used in the article is theoretical-
dogmatic research, in addition to essential jurisprudential research for the solution of
the proposed problem.
Keywords: Procedural Civil Law; Social Security Law; Instrumentality of the judicial process;
Effectiveness of jurisdiction; Principle of primacy of the decision on the merits; Presiding judge’s
instructional powers.
1 INTRODUÇÃO
2
A garantia de proteção judicial efetiva está prevista na Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigos
8º e 10), no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (promulgado pelo Decreto nº 592/1992 –
artigos 2º, número 3, e 14, número 1) e também na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto
de San José da Costa Rica – promulgado pelo Decreto nº 678/1992 – artigos 8 e 25).
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3
Cássio Scarpinella Bueno (2022) descarta tal expressão, aduzindo que “Não há tal primazia, que reside,
isto sim, na atividade, verdadeiro dever-poder do magistrado de estimular os sujeitos do processo para
superar o vício para prosseguimento do processo em direção ao ‘julgamento de mérito’, isto é, à definição
de quem faz jus à tutela jurisdicional. O proferimento de um tal julgamento é a razão de ser do Estado-juiz
e, em última análise, de todo o sistema processual civil; a higidez do processo (e do exercício do direito
de ação) é meio para chegar a ele. Aqui também importa lembrar que não há como confundir causa com
consequência; prius com posterius”.
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(artigo 282, § 2º). Trata-se de uma completa quebra de paradigmas: uma nulidade que
faria o procedimento retroceder não será reconhecida se o juiz já tiver elementos para
decidir favoravelmente àquela parte. A mesma ideia vem contemplada no artigo 488: o
juiz não deverá decidir sem resolução de mérito se tiver elementos para julgar o mérito
em favor daquele a quem aproveitaria aquela extinção. O Código também determina que,
antes de proferir decisão sem resolução de mérito, o juiz deva dar à parte oportunidade
para corrigir o vício (se isso for possível) – artigo 317. Estabelece, além disso, que o
relator deverá conceder um prazo de cinco dias para sanar vício ou complementar a
documentação, antes de proferir decisão considerando inadmissível o recurso (artigo
932, parágrafo único), etc.
Há, assim, um conjunto de regras inspiradas pela mesma principiologia: interessa
ao “modelo constitucional do direito processo civil” o acertamento da relação jurídica de
direito material, em prazo razoável. Cabe ao juiz adotar as medidas que estiverem a seu
alcance para que tal finalidade seja alcançada, o que exige, inclusive, que se desvista
de concepções pré-Código, em particular daquelas que estão arraigadas a uma cultura
judiciária que foi (e precisa ser) superada pela alteração da lei.
Deve-se afastar, portanto, aquilo que vem sendo chamado pela doutrina
constitucional de interpretação retrospectiva, isto é, a tentativa de interpretar a
Constituição atual com os mesmos olhares que se dirigiam à Constituição revogada. A
respeito deste tema, ensina Luís Roberto Barroso:
4
Com interessantes observações a respeito da interpretação retrospectiva quanto às atribuições do
Ministério Público no processo civil, Godinho (2015). Também sobre o tema da interpretação retrospectiva
do CPC/2015 (Zaneti JR., 2021).
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1.696.396, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 19.11.2018). Embora o CPC tenha incorporado
com clareza a taxatividade das decisões impugnáveis por agravo de instrumento (como
decorre dos artigos 1.015 e 1.009), o Tribunal entendeu que “o rol do art. 1.015 do CPC é
de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando
verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de
apelação”. Como já observamos anteriormente, as imperfeições ou a insuficiência do
regime legal do agravo de instrumento, estabelecidas pelo CPC de 2015, devem ser
corrigidas por meio de uma alteração legislativa. Há, de fato, decisões interlocutórias que
precisam ser imediatamente recorríveis, como as que envolvem declínio de competência,
sob pena de causar às partes um prejuízo de difícil reparação. Mas a correção desses
equívocos do CPC deve ser feita por meio de lei, não por interpretação judicial (PIRES,
2023).
Esta interpretação retrospectiva também tem ocorrido, em causas previdenciárias,
quanto à aplicação da Súmula 111 do STJ (“Os honorários advocatícios, nas ações
previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença”). A
orientação da referida Súmula é incompatível com o CPC de 2015, que instituiu um
regramento totalmente novo para o arbitramento de honorários de advogado nas causas
em que a Fazenda Pública é parte. As disposições contidas no artigo 85, § 3º impedem
que se possa tomar as prestações vencidas até a sentença como base de cálculo dos
honorários. Os honorários devem tomar em conta, nos termos do CPC, a “condenação”
ou o “proveito econômico” decorrente da sentença. O tema é de típico de overruling (ou
overriding), na medida em que, alterada a regra processual que deu origem à súmula,
o entendimento ali fixado deve ser também superado (artigo 489, § 1º, VI, do CPC)5.
A despeito disso, encontram-se na jurisprudência inúmeros julgados que mantêm a
aplicação da Súmula, mesmo depois da vigência do CPC/20156.
A interpretação retrospectiva também é resultado de certo descontentamento ou
inconformismo dos julgadores com as soluções fixadas pelo legislador, como também
ocorreu no caso dos honorários de advogado fixados por equidade nas causas em que
a Fazenda Pública é parte. A questão já tinha sido resolvida pela Corte Especial do STJ,
também na sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1.076)7. Poucos meses
5
Sobre o tema da superação de precedentes judiciais, Figueiredo (2020).
6
No STJ, AgInt no RESP 1.935.142/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 07.10.2021;
AgInt nos EDcl no RESP 1.913.756/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 20/8/2021; AgInt
no RESP 1.899.889/PR, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 15.6.2021. TRF 3ª Região,
ApCiv 5032754-26.2021.4.03.9999, Rel. Des. Federal Toru Yamamoto, DJe 13.10.2022; ApelRemNec
5040464-63.2022.4.03.9999, Rel. Des. Federal Leila Paiva Morrison, DJe 10.10.2022; TRF 5ª Região,
ApelReex 0001383-80.2018.4.05.9999, Rel. Des. Federal Élio Wanderley de Siqueira Filho, DJ 28.11.2018;
AC 0002218-68.2018.4.05.9999, Rel. Des. Federal Edilson Nobre, DJ 08.02.2019. O STJ, reexaminado
essa questão na sistemática dos recursos especiais repetitivos, fixou a seguinte tese: “Continua eficaz e
aplicável o conteúdo da Súmula 111/STJ (com a redação modificada em 2006), mesmo após a vigência
do CPC/2015, no que tange à fixação de honorários advocatícios” (Tema 1.105, RESPs 1.883.715 e
1.883.722/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 27.3.2023). Persiste, portanto, com os efeitos previstos no
artigo 927, III, do CPC, a citada “interpretação retrospectiva”.
7
As teses fixadas foram as seguintes: “i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida
quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É
obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a
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depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre
o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii)
Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a)
o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito
baixo” (STJ, RESPs 1.850.512, 1.877.883, 1.906.623, 1.906,618, Corte Especial, DJe 31.5.2022).
8
“Art. 927 [...] § 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese
adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e
específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia”. A
nova afetação foi determinada em 13.12.2022 nos RESPs 1.824.564 e 1.743.330, ambos de relatoria do
Ministro Moura Ribeiro.
9
Como ensina FERNANDEZ (1983) “a finalidade do processo é, precipuamente, assecuratória de uma
liberdade de atuação e do resguardo contra o arbítrio do Estado. Nenhuma interpretação de lei processual
será possível sem este ponto de referência básico, decorrente de princípio constitucional. Se existe um
preceito ou dispositivo de lei permitindo uma atuação da parte (interpor um recurso) e mesmo se, para
argumentar, esse preceito se afigura incompatível com uma interpretação sistemática da legislação
processual, não caberá nunca optar-se por interpretação ab-rogante, pois, no caso, estar-se-á diante de
regra de índole pública. Poder-se-á apontar a norma como inconveniente, eivada de atecnia, desatualizada
etc., sugerir sua modificação de lege ferenda, mas jamais furtar-se à sua aplicação”.
10
A tese firmada foi a seguinte: “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme
determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido
do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários
à tal iniciativa”. Os artigos citados são do CPC/1973 e correspondem aos artigos 320, 485, IV e 486 do
CPC/2015. Cremos que a admissibilidade da nova ação pressupõe a apresentação de provas novas, ou
da produção em juízo dessas novas provas.
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O artigo 938, § 3º, do CPC, objeto deste estudo, estabelece que “reconhecida a
necessidade de produção de prova, o relator converterá o julgamento em diligência, que
se realizará no tribunal ou em primeiro grau de jurisdição, decidindo-se o recurso após a
conclusão da instrução”.
Como lembra Cássio Scarpinella Bueno (2017), trata-se de uma inovação
importante, dado que, na vigência do CPC/1973, a jurisprudência havia se consolidado
no sentido de que os tribunais não poderiam praticar atos de instrução processual. O
processo no tribunal seria, assim, “estritamente documental”.
O CPC de 2015 quebra esse paradigma do “processo documental” e dá aos relatores
poderes instrutórios, ou, se preferirmos, competências instrutórias, admitindo a
produção de provas mesmo em grau de recurso. Não por acaso o artigo 932, I, diz que é
de competência do relator “dirigir e ordenar o processo no tribunal, inclusive em relação
à produção de prova”. Portanto, o Código reafirma as competências do relator quanto à
produção de provas, quer se trate de uma ação de competência originária, quer se trate
de ação em grau de recurso.
Quatro observações são importantes a respeito desse preceito do artigo 938, §
3º, do CPC: a primeira delas é que a lei não restringe quais espécies de provas poderão
ser produzidas. Assim, deve-se admitir a possibilidade de produção de quaisquer das
provas típicas ou atípicas, isto é, tanto das provas expressamente previstas no CPC
(ata notarial, depoimento pessoal, confissão, exibição de documento ou coisa, prova
documental, prova testemunhal, prova pericial e inspeção judicial), como daquelas que,
ainda que não previstas de forma expressa, sejam “moralmente legítimas” (artigo 369 do
CPC).
A segunda observação diz respeito à forma pela qual tais provas serão colhidas:
diretamente no Tribunal ou em primeiro grau de jurisdição, determinando-se, neste
último caso, a expedição de carta de ordem (artigos 236, § 2º e 237 do CPC). Aqui, cabe
uma avaliação discricionária do relator, analisando a conveniência de adotar uma dessas
possibilidades, considerando as particularidades do caso concreto. Assim, por exemplo,
em processo judicial em que se pretenda um benefício previdenciário por incapacidade
(auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade permanente), é
razoável supor que uma prova pericial médica se realizará com mais rapidez e eficiência
na cidade de domicílio do periciando. Por outro lado, se a perícia exigir conhecimentos
de uma área médica muito específica ou incomum (por exemplo, uma perícia com um
geneticista para avaliar a presença ou o grau de uma deficiência), poderá ser muito difícil
encontrar naquela localidade um perito habilitado à produção dessa prova. Já uma prova
testemunhal, destinada à demonstração de tempo de atividade rural, de união estável ou
dependência econômica para fins previdenciários, poderá ser colhida tanto no domicílio
da testemunha como diretamente pelo Tribunal, com o uso dos recursos eletrônicos
(artigo 236, § 3º, do CPC), a critério do próprio Relator. A praxe forense recomenda
que tais aspectos sejam previamente avaliados, antes mesmo da prolação da decisão
determinando a realização da prova.
A terceira observação deriva de uma interpretação sistemática do CPC. O artigo
138
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938 está inserido no Livro III, Título I, Capítulo II, este denominado “da ordem dos
processos no Tribunal”. Dada a generalidade da regra, cremos que poderá ser adotada
em quaisquer instâncias recursais, inclusive pelos Tribunais Superiores. É certo que o
STF e o STJ estão vocacionados a resolver questões de direito, relativos à interpretação
da Constituição Federal e das leis federais, respectivamente. Mas diante da principiologia
legal que enfatiza a necessidade da solução de mérito, a produção da prova faltante,
mesmo naquelas instâncias extraordinárias, é fato que observa a mesma teleologia
normativa já citada11.
A quarta (e mais importante) observação diz respeito ao próprio conteúdo da
norma do artigo 938, § 3º, do CPC: como se vê, o Código fixa uma regra de conduta
imperativa (“o relator converterá”) e, nestes termos, não se trata de faculdade atribuída
ao relator12. Com isso, deve-se sepultar, definitivamente, aquela praxe forense arraigada
de anular a sentença, baixando os autos à instância de origem para a produção da prova
faltante e prolação de nova sentença.
É claro que o Relator poderá fazer um juízo a respeito da necessidade ou da
desnecessidade de produção de novas provas. Mas se entender que é necessária a
complementação do acervo probatório, não resta alternativa: deve determinar a produção
da prova (e não anular a sentença).
A falta de observância dessa regra do CPC é quase um lugar-comum nas causas
previdenciárias. A jurisprudência em causas previdenciárias e assistenciais reitera, já na
vigência do CPC/2015, o dogma da nulidade da sentença e a baixa dos autos para a
realização da prova faltante13.
Examinada à distância, tal solução parece ser correta e, ademais, é um
entendimento que leva a uma ideia de saneamento do processo, de correção de
nulidades e de preservação da integridade do procedimento. Aliás, tais julgamentos
invocam razões a que se pode aderir sem muito esforço. Afinal, fala-se em “restabelecer
a ordem processual e assegurar os direitos e garantias constitucionalmente previstos”,
concluindo que “os fins de justiça do processo restaram malferidos”, ou mesmo que a
“debilidade do conjunto probatório” deve ser afastada de molde a “preservar o valor da
justiça da prestação jurisdicional”14. É difícil discordar dessas premissas e conclusões.
11
O STJ tem entendido, em diversos julgados, que tal determinação envolveria o revolvimento de fatos
e provas, o que não seria admissível em recurso especial, por injunção da Súmula nº 7 (por exemplo,
AgInt no RESP 1.727.424/DF, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 12.5.2022; RESP
1.818.454/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 27.11.2019).
12
Em sentido contrário, aduzindo que se trata de faculdade do relator: STJ, RESP 1.845.542/PR, Rel.
Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 14.5.2021.
13
TRF 3ª Região: TRF 3ª Região, ApCiv 5001589-25.2017.4.03.6143, Rel. Des. Federal Therezinha Astolphi
Cazerta, DJe 16.12.2022; ApCiv 0005069-03.2019.4.03.9999, Rel. Des. Federal Carlos Eduardo Delgado,
DJe 16.12.2022, ApCiv 5000584-03.2021.4.03.6183, Rel. Des. Federal Gilberto Rodrigues Jordan, DJe
15.12.2022, ApCiv 5011385-12.2020.4.03.6183, Rel. Des. Federal Newton de Lucca, DJe 15.12.2022;
TRF 1ª Região, AC 0001352-49.2015.4.01.3606, Rel. Des. Federal Rafael Paulo, DJe 05.9.2022, AC
0002067-72.2012.4.01.4002, Rel. Des. Federal Morais da Rocha, DJe 31.8.2022; TRF 4ª Região, AC
5010472-41.2020.4.04.7205, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJe 11.10.2021.
14
TRF 3ª Região, ApCiv 0004950-96.2015.4.03.6114, Rel. Des. Federal Nelson de Freitas Porfírio Junior,
DJe 29.4.2022; ApCiv 5030672-85.2022.4.03.9999, Rel. Des. Federal Daldice Maria Santana de Almeida,
DJe 20.4.2022; ApCiv 5003955-07.2020.4.03.6119, Rel. Desembargadora Federal Leila Paiva Morrison,
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DJe 09.12.2022.
15
“O juiz indeferirá a perícia quando a verificação for impraticável”.
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16
Nesse sentido, TRF 3ª Região, AI 5022266-36.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal Luiz Paulo
Cotrim Guimarães, DJe 16.02.2022, AI 5010679-17.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal Luiz
de Lima Stefanini, DJe 18.11.2021; TRF 5ª Região, AC 0003869-77.2014.4.05.9999, Rel. Des. Federal
Roberto Machado, DJe 24.8.2017; TRF 1ª Região, AC 0062374-48.2009.4.01.3500, Rel. Des. Federal
Olindo Menezes, DJe 08.02.2017.
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em diligência para produção de provas pode ser determinada pelo “órgão competente
para julgamento do recurso”. Assim, mesmo se o Relator propuser solução distinta,
a conversão em diligência poderá ser adotada pelo órgão fracionário que irá julgar o
recurso, inclusive em eventual agravo interno. Lembre-se que o artigo 932, VIII, do CPC,
contém uma cláusula de abertura, permitindo aos regimentos internos dos Tribunais
estabelecerem outras atribuições ao relator dos recursos. Contra tais decisões caberá o
agravo interno (artigo 1.021 do CPC).
Alguns julgados dos Tribunais Regionais Federais têm, acertadamente, determinado
a conversão do julgamento em diligência para a colheita de prova faltante, em particular
(mas não só) no processo judicial previdenciário17. Espera-se que tais julgados façam
incorporar à realidade forense a principiologia instituída pelo CPC/2015, tão (ou mais)
relevante quando da condução das causas previdenciárias.
4 CONCLUSÕES
17
TRF 3ª Região, AI 5019345-41.2020.4.03.0000, Rel. Vanessa Vieira de Mello, DJe 18.12.2023; AI 5019305-
88.2022.4.03.0000, Rel. Des. Therezinha Cazerta, DJe 10.10.2023, ApCiv 6076946-95.2019.4.03.9999,
Rel. Des. Federal Sergio do Nascimento, DJe 05.3.2021; ApCiv 5001101-76.2019.4.03.6183, Rel. Des.
Federal João Batista Gonçalves, DJe 08.9.2021. TRF 1ª Região, AC 0005162-58.2013.4.01.3814, Rel.
Grigório Carlos dos Santos, DJe 19.4.2022. TRF 5ª Região, APELREEX 0000746-66.2017.4.05.9999,
Rel. Des. Federal Leonardo Resende Martins, DJe 05.10.2017; AC 0003869-77.2014.4.05.9999, Rel. Des.
Federal Roberto Machado, DJe 24.8.2017, AC 2009.81.02.000395-9, Rel. Des. Federal Edílson Nobre,
DJe 26.8.2016.
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e o alcance do CPC atual fazendo uso de critérios válidos apenas para o CPC revogado.
A mesma vedação se impõe quando da interpretação inflexível das regras do CPC,
dissociada da natureza específica dos direitos à saúde, previdência e assistência social.
O artigo 938, § 3º, do CPC, ao tratar dos “poderes instrutórios” do relator (ou
“competências instrutórias”), instituiu verdadeiro dever processual. Trata-se de conduta
impositiva que não dá margem a que se persista na antiga prática de anular a sentença,
determinando outra fosse proferida. A norma processual vigente determina que se
converta o julgamento em diligência, que se produza a prova faltante e que se conclua o
julgamento definitivo da causa.
Tanto o acórdão que anula a sentença como a decisão que converte o julgamento
em diligência fazem às vezes da “decisão de saneamento do processo”, exigindo que
delimitem os fatos sobre os quais recairá a atividade probatória. Deverão também respeitar
as restrições às perícias nas ações previdenciárias quanto ao custeio dos honorários
periciais (artigo 1º, § 1º, da Lei nº 13.876/2019, com a redação da Lei nº 14.331/2022).
Em conclusão, a solução imposta pelo CPC é a que decorre da regra clara do artigo
938, § 3º, do CPC. Esta norma é expressão de uma opção de política legislativa que o
Poder Judiciário deve observar, em favor da celeridade do processo e da efetividade da
jurisdição.
REFERÊNCIAS
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Resumo
A Medida Provisória (MP) 871, posteriormente convertida na Lei 13.846/2019,
introduziu novas regras para a produção de provas contidas no § 5º do art. 16 da
Lei 8.213/91. Embora a constitucionalidade tenha sido discutida pela Supremo
Tribunal Federal (STF) no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)
6.096, há uma lacuna significativa entre a decisão do STF e a interpretação pelo
judiciário. Esta lacuna revela a necessidade de um entendimento mais profundo das
implicações dessa regra processual e seu impacto na prática jurídica e na proteção
social no Brasil. Este estudo tem como objetivos: (1) compreender o julgamento da
ADI 6.096 e seu efeito vinculante; (2) avaliar o impacto da utilização do § 5º do art.
16 da Lei 8.213/91 como regra para a produção de provas na esfera processual; (3)
mensurar o impacto da regra do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais
no livre convencimento motivado; e (4) compreender a relação entre a interpretação
dada à ADI 6.096 e a Agenda 2023 da ONU. Utilizando uma metodologia indutiva, a
pesquisa foi realizada por meio de revisão bibliográfica, jurisprudencial e documental.
Os resultados indicam que há uma divergência significativa entre a decisão do STF
na ADI 6.096 e a forma como os tribunais inferiores estão interpretando e aplicando
essa decisão. Este estudo contribui significativamente para a literatura ao esclarecer
as divergências entre a decisão do STF e sua aplicação prática no judiciário, visando
fortalecer a proteção dos direitos sociais e assegurar a conformidade com a Agenda
2030 da ONU.
Palavras-chave: Pensão por morte; União estável; Meios probatórios; Prova testemunhal.
1
Mestranda em Direito Previdenciário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
Especialista em Direito Previdenciário pela Faculdade Legale. Especialista em Direito Processual Civil na
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Bacharela em Direito pela Universidade Paulista
- UNIP. E-mail: carlaandradeadvogada@gmail.com
2
Mestranda em Direito Previdenciário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
Especialista em Direito Previdenciário pela Universidade Candido Mendes. MBA em Direito Previdenciário
pela Faculdade Legale. Bacharela em Direito Pela Universidade Iguaçu – UNIG. E-mail: contato@
evelinlessa.com.br
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Abstract
Provisional Measure (MP) 871, later converted into Law 13.846/2019, introduced new
rules for the production of evidence contained in § 5 of Art. 16 of Law 8.213/91.
Although the constitutionality was discussed by the Supreme Federal Court (STF) in
the judgment of Direct Action of Unconstitutionality (ADI) 6.096, there is a significant
gap between the STF decision and its interpretation by the judiciary. This gap reveals
the need for a deeper understanding of the implications of this procedural rule and
its impact on legal practice and social protection in Brazil. This study aims to: (1)
understand the judgment of ADI 6.096 and its binding effect; (2) assess the impact
of the use of § 5 of Art. 16 of Law 8.213/91 as a rule for the production of evidence
in the procedural sphere; (3) measure the impact of the rule of the National Forum
of Federal Special Courts on free motivated conviction; and (4) understand the
relationship between the interpretation given to ADI 6.096 and the UN Agenda 2030.
Using an inductive methodology, the research was conducted through a bibliographic,
jurisprudential, and documentary review. The results indicate that there is a significant
discrepancy between the STF’s decision in ADI 6.096 and the way lower courts are
interpreting and applying this decision. This study significantly contributes to the
literature by clarifying the divergences between the STF’s decision and its practical
application in the judiciary, aiming to strengthen the protection of social rights and
ensure compliance with the UN Agenda 2030.
Keywords: Pension for death; Common-law marriage; Evidence means; Testimonial evidence
1INTRODUÇÃO
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Art. 16 [...]
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado,
de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que
tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte
e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou
deficiência grave (Brasil, 1991).
A doutrina constitucional se atenta nos pontos que o direito a prova precisa se ater:
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econômica, conforme o caso, devem ser apresentados no mínimo três dos seguintes
documentos” (Brasil, 1999).
Instaurado o processo administrativo previdenciário, assegurado o exercício da
cooperação e do contraditório, ensejará uma decisão do órgão administrativo de primeira
instância, que seguirá, além de outros princípios, o da legalidade (Savaris, 2022).
Ocorre que, devido às uniões estáveis serem muito informais no contexto atual
brasileiro, muitas vezes a pessoa viúva encontra óbices na via administrativas, devido
à falta de documentos que comprovem essa união, culminando no indeferimento
administrativo do benefício previdenciário (Serau Jr., 2019, p. 85).
Assim, uma das saídas para esse dependente que detém poucos elementos
materiais para comprovar a união estável na seara administrativa, é o ingresso da ação
judicial em face da Autarquia Previdenciária, pois o Código de Processo Civil (CPC/2015)
amplia a produção de provas, além de que, o entendimento jurisprudencial dominante é
no sentido de sequer haver necessidade de provas materiais, bastando somente a prova
testemunhal, tornando mais simples o acesso ao benefício.
Demonstra-se que é o entendimento firmado tanto pela Turma Nacional de
Uniformização (TNU) na súmula nº 63, “A comprovação de união estável para efeito de
concessão de pensão por morte prescinde de início de prova material” (Brasil, 2012).
Assim como no Superior Tribunal de Justiça - STJ (REsp. 1824663/SP) até então,
sobre a desnecessidade de prova material para comprovação da união estável, podendo
inclusive a prova ser somente através de prova testemunhal:
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4.1 Análise da aplicação judicial das limitações probatórias da união estável para
fins previdenciários acrescidos pelo § 5º, do art. 16, da lei 8.213/91
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Como visto no trecho da decisão acima, o STF entendeu que a norma não
possuía natureza de direito processual, pois, para a Corte Superior este dispositivo não
são comandos voltados para o Poder Judiciário, mas sim, destinados para o âmbito
administrativo.
A decisão do STF sobre o tema tem efeito vinculante, visto tratar-se de decisão
em controle concentrado de constitucionalidade, conforme art. 927, inc. I do CPC/2015.
Entretanto, há decisões em diversos tribunais, interpretando a alteração trazida
pela MP 871/2019, convertida na Lei 13.846/2019 introduzida como tarifação dos meios
de prova para união estável previdenciária, como a abaixo colacionada, onde a 10ª Turma
do Tribunal Regional Federal da Terceira Região (TRF-3) de São Paulo e Mato Grosso
do Sul na Apelação Cível 50041979220224039999/MS extinguiu um processo sem
resolução de mérito, fundamentando que não havia sido cumprido o requisito necessário
de provas não superior a 24 meses da união estável:
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que caso a mulher não disponha de documentos comprobatório de sua condição, que
sejam considerados o de seu companheiro. E, cita a antiga redação da súmula 63 da
Turma Nacional de Uniformização, que afastava a necessidade de início de prova material
para a comprovação de união estável para concessão de pensão por morte (BRASIL.
Conselho Nacional de Justiça. Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero.
Brasília: CNJ, 2021. p.79)
De acordo com dados da previdência social, em 2022 a concessão de pensão por
morte a mulheres, representa 73,10% do total. Assim, ao tratar de alteração na aceitação
ou tarifação de provas, principalmente as mulheres são afetadas. No modelo proposto
pela MP 871 o início de prova material passa a ser exigido sem qualquer análise social
sobre gênero, raça, grau de instrução, e como a interseccionalidade de fatores teria
influenciado as relações sociais a ponto de a companheira não ter acesso a início de
prova material.
Portanto, apesar de o protocolo almejar uma igualdade de gênero que ainda não
ocorreu na sociedade, sua efetividade resta esvaziada ante a utilização da MP 871 pelo
judiciário lhe imputando na prática, valor de lei processual.
Uma medida provisória tratando de matéria que repetidamente vem sendo utilizada
como regra de direito processual, despreza o controle de poder proposto por Montesquieu
vez que se apropria do poder legislativo, já que não se trata de uma questão urgente e,
mesmo que fosse, exigiria o debate apropriado (BALERA, 2009, p. 13).
5 CONCLUSÃO
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6.096 do STF, podendo gerar redução sensível do alcance ao benefício às pessoas que
vivam em união estável.
Este artigo se limitou a análise das alterações na produção de prova trazida pela MP
871/2019, convertida na Lei 13.846/2019 e o efeito vinculante conferido com o julgamento
da ADI 6.096 do STF. A premissa para a elaboração da Medida Provisória 871/2019
foi a necessidade de reduzir fraudes nos pedidos de pensão por morte, entretanto, é
necessária uma análise aprofundada com o cruzamento dos dados de concessão de
pensão por morte através de prova exclusivamente testemunhal pelo judiciário e dos
benefícios alvo de suspeita de concessão mediante fraude, para que se tenha evidências
concretas e capazes de ensejarem soluções adequadas.
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Forense, 2022.
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LEIS/2002/L10406compilada.htm. Acesso em: 20 maio 2024.
BRASIL. Lei 13.846, de 18 de junho de 2019. Institui o Programa Especial para Análise
de Benefícios com Indícios de Irregularidade, o Programa de Revisão de Benefícios
por Incapacidade, o Bônus de Desempenho Institucional por Análise de Benefícios com
Indícios de Irregularidade do Monitoramento Operacional de Benefícios e o Bônus de
Desempenho Institucional por Perícia Médica em Benefícios por Incapacidade. Brasília,
DF: Presidência da República, [2019]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/
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BRASIL. Tribunal Regional Federal da Terceira Região (10ª Turma). Apelação Cível
50041979220224039999/MS. Relator: Desembargadora Federal Leila Paiva Morrison,
28de setembro de 2022. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trf-
3/1717528581. Acesso em: 20 maio 2024.
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de Janeiro: Forense, 2022.
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Resumo
Este artigo explora a relação entre a renda per capita e a miséria, destacando a
importância da perícia biopsicossocial como uma técnica multidisciplinar eficaz na
proteção de grupos familiares vulneráveis. Analisa-se como a renda per capita impacta
diretamente nas condições de vida e bem-estar, contribuindo para a compreensão
da miséria como um fenômeno complexo. A perícia biopsicossocial é apresentada
como uma abordagem holística, considerando aspectos biológicos, psicológicos e
sociais, oferecendo uma visão abrangente das necessidades e desafios enfrentados
por famílias vulneráveis. Destaca-se a importância dessa técnica na formulação de
políticas públicas e intervenções sociais destinadas a melhorar as condições de vida
desses grupos, promovendo a proteção e o desenvolvimento sustentável.
Palavras-chave: Benefício Assistencial; Renda Familiar Mensal Per Capita; Perícia
Biopsicossocial; Grupo familiar; Miséria.
Abstract
This article explores the relationship between per capita income and poverty,
highlighting the importance of biopsychosocial expertise as an effective multidisciplinary
technique in protecting vulnerable family groups. It analyzes how per capita income
directly impacts living conditions and well-being, contributing to the understanding
of poverty as a complex phenomenon. Biopsychosocial expertise is presented as a
holistic approach, considering biological, psychological and social aspects, offering
a comprehensive view of the needs and challenges faced by vulnerable families.
The importance of this technique is highlighted in the formulation of public policies
and social interventions aimed at improving the living conditions of these groups,
promoting protection and sustainable development.
1
Mestrando(a) do Programa de Pós-graduação em Direito e Justiça Social (PPGDJS) da Universidade
Federal de Rio Grande (FURG). Especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário pela UNIRITTER.
Especialista em Benefícios e Prática Previdenciária pela Verbo Jurídico. Email: bvdadvocacia@gmail.com
2
Doutor em Serviço Social (PUCRS) e Mestre em Direito (UNISINOS). Professor Adjunto da Faculdade de
Direito e do Mestrado em Direito e Justiça Social da FADIR/FURG. Coordenador do Programa CIDIJUS/
FADIR/FURG. Email: jcc.pel@gmail.com
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Keywords: Assistance benefit; Monthly family income per capita; Biopsychosocial expertise;
Family group; Misery.
1 INTRODUÇÃO
2.1 Renda Per Capita e Miséria: O Paradoxo para (in)acessibilidade ao BPC Assistencial
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semianalfabetos, sem qualquer nível cultural, difícil acesso a saúde, falta de créditos etc.
Se fossemos considerar apenas a renda de R$ 1.500,00, a esposa sequer teria direito
ao BPC Assistencial, uma vez que a renda per capita ultrapassaria ¼ do salário-mínimo.
Agora, vejam o absurdo. No exemplo acima citado, impossível não levar em
consideração outros aspectos que não somente a renda, tais como aspectos morais,
econômicos, sociais, culturais e políticos. É o que denominamos de “critério psicossocial
multidimensional” onde se busca a análise não apenas da renda, mas também de
outras dimensões tais como: condições de saúde e deficiência, o qual deverá avaliar
não apenas a existência de uma deficiência, mas também o impacto dessas condições
na vida do indivíduo e suas barreiras para participar da sociedade; o acesso à educação,
emprego e suas oportunidades, reconhecendo que a inclusão econômica é uma parte
fundamental da inclusão do sujeito em sociedade; inclusão social e qualidade de vida, a
qual deverá medir o grau de inclusão social do indivíduo, incluindo seu acesso a serviços
de saúde, moradia adequada e participação na comunidade; apoio familiar e comunitário,
considerando o papel da família e da comunidade no apoio ao indivíduo com deficiência
ou idoso em situação de vulnerabilidade.
Com efeito, o BPC é devido hoje aos que estão em situação de miserabilidade,
fazendo jus, portanto aqueles que se encontram em pobreza absoluta, o que contraria e
viola a Carta Constitucional, bem como vai ao desencontro dos objetivos da Assistência
Social, em especial em seu artigo 2º, parágrafo único, verbis:
Art. 2º. A assistência social tem por objetivos: (Redação dada pela Lei nº
12.435, de 2011) I - a proteção social, que visa à garantia da vida, à redu-
ção de danos e à prevenção da incidência de riscos, especialmente: (Re-
dação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) a) a proteção à família, à mater-
nidade, à infância, à adolescência e à velhice; (Incluído pela Lei nº 12.435,
de 2011) b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes; (Incluído
pela Lei nº 12.435, de 2011) c) a promoção da integração ao mercado de
trabalho; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) d) a habilitação e reabilita-
ção das pessoas com deficiência e a promoção de sua integração à vida
comunitária; e (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) e) a garantia de 1
(um) salário-mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção
ou de tê-la provida por sua família; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
II - a vigilância socioassistencial, que visa a analisar territorialmente a ca-
pacidade protetiva das famílias e nela a ocorrência de vulnerabilidades,
de ameaças, de vitimizações e danos; (Redação dada pela Lei nº 12.435,
de 2011) III - a defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso
aos direitos no conjunto das provisões socioassistenciais. (Redação dada
pela Lei nº 12.435, de 2011) Parágrafo único. Para o enfrentamento da
pobreza, a assistência social realiza-se de forma integrada às políticas
setoriais, garantindo mínimos sociais e provimento de condições para
atender contingências sociais e promovendo a universalização dos direi-
tos sociais. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) (grifo nosso).
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Como podemos perceber os fatores que levam o sujeito a sequer ter condições
mínimas de sobrevivência é muito mais amplo do que a própria renda, destacando-
se por exemplo a discriminação pela sociedade por diversas razões, o que impede o
cidadão de auferir renda capaz de manter-se com uma vida digna e a de sua família.
Oportuno ainda, trazer os ensinamentos de Walquíria Rego e Alessandro Pinzani
ao adentrar que a pobreza não deve ser avaliada apenas pelo critério da renda:
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Com efeito, as políticas públicas de Assistência Social são muito mais extensas e
seu rol é muito mais amplo do que apenas o olhar sobre a renda do indivíduo, cabendo
ao Estado o enfrentamento de políticas eficientes para reparar distorções, desigualdades
sociais e garantir ao cidadão necessitado, os mínimos sociais para viver com dignidade.
Infelizmente não é o que temos hoje.
Entender a pobreza como uma privação de capacidades básicas implica reconhecer
que a falta de acesso à educação, saúde, habitação adequada, segurança alimentar e
outros elementos essenciais pode ser tão crucial quanto a baixa renda. Dessa forma,
as políticas de combate à pobreza podem ser mais eficazes se forem concebidas para
abordar diversas dimensões da privação humana, proporcionando oportunidades para o
desenvolvimento integral das pessoas.
Assim, imperioso se faz pensar e refletir sobre políticas assistenciais eficientes e
eficazes ao mesmo tempo em que necessário repensar a miserabilidade ou pobreza absoluta
como mecanismo referencial para concessão do benefício assistencial da LOAS. Forçoso
e triste reconhecer discriminação do Estado para com o cidadão em situação de fragilidade
para que assim possamos repensar a miserabilidade como critério para concessão de
benefícios sugerindo uma possível crítica à rigidez desse critério. Pode indicar a necessidade
de considerar outros fatores além da renda absoluta, como condições de vida, acesso a
serviços básicos, entre outros, para uma avaliação mais abrangente da vulnerabilidade social.
A propósito, importante salientar a abordagem trazida por Maria Ozanira da Silva
e Silva em sua obra ao trazer a abordagem da pobreza com viés das necessidades
básicas: Ela refere o seguinte:
[...] ganha evidência nos anos 1970 a partir da crítica ao enfoque da sub-
sistência. Propôe-se superar a unidimesionalidade da pobreza de “sub-
sistência”, centrada na renda per capita e no Produto Interno Bruto, até
então utilizados para dimensionar o desenvolvimento. Então, a pobreza
passa a ser vista numa acepção multifacetada, incluindo um mínimo de
requerimentos para o consumo de uma família: comida, abrigo, roupas,
mobílias e equipamentos, sendo ainda acrescentado um grupo de neces-
sidades referente a serviços essenciais: água potável, serviços sanitários,
transporte público, saúde, educação e acesso a cultura. Nesse sentido, a
ideia de necessidades básicas situa-se no contexto do desenvolvimento
econômico social de uma nação (Silva, 2013, p. 20-21).
Parece-nos evidente, dessa forma, que a pobreza pode ser entendida como a
privação das capacidades básicas de um indivíduo e não como uma renda inferior ao
limite pré-determinado. Não obstante, tem-se que o cidadão para viver com mínimo
de dignidade necessita ter atendida as suas necessidades mais básicas a luz da
própria Constituição Federal e, nesse contexto, terá a intervenção estatal por meio da
Assistência Social para suprir essas necessidades básicas. Até quando a miserabilidade
vai predominar sobre as necessidades básicas do indivíduo?
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2.2 Grupo familiar e relevância de “mesmo teto” para fins de Benefício de Prestação
Continuada (BPC): Análise crítica dos critérios auferidos para (não) ter direito ao BPC
Assistencial
Por óbvio que é a família e depois o Estado que tem o dever de amparar pessoas
idosas, deficientes ou com dificuldades. Isso não se discute. Aliás, a própria Constituição
estabelece o dever da família no cuidado e alimentação para com as pessoas idosas,
sempre observando o binômio necessidade x possibilidade. Somente nos casos em que
a família não puder auxiliar, o Estado deve intervir. Vejamos o teor do artigo 230 do texto
constitucional: "Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar
as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua
dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida".
Pois bem. Mas o que seriam família e grupo familiar para fins de Benefício
Assistencial? A Carta de 88 não trouxe, em especial no artigo 203, V, qualquer menção do
conceito de família tampouco quem compunha o grupo familiar para fazer jus a prestação
assistencial, somente faz menção “ou de tê-la provido por sua família, conforme dispuser
a Lei”. Apenas com a Promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social – Lei 8.742/93
– e suas diversas alterações é que veio regulamentado, em especial no artigo 20, §1º
quem de fato compõe a família/núcleo familiar para fins de BPC, verbis:]
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Ora, percebe-se pelo rol taxativo do artigo acima transcrito que o dever de prover
e suprir as necessidades básicas do sujeito são da família, esta composta única e
exclusivamente pela composição do referido artigo, não estendida a outros membros do
núcleo familiar. Por sua vez, a Portaria Conjunta nº 3 de 20183 que “dispõe sobre regras
e procedimentos de requerimento, concessão, manutenção e revisão do Benefício de
Prestação Continuada da Assistência Social – BPC” corrobora no entendimento do rol
taxativo da composição familiar ao trazer, em seu artigo 8º, §1º, quem não compõe o
grupo familiar para efeito de cálculo da renda mensal familiar per capita, verbis:
Percebe-se, assim, que a renda mensal per capita para fins de BPC - embora
não concordemos a renda como único critério - deve ser auferida pela família composta
exclusivamente pelo núcleo estabelecido no artigo 20, §1º da Lei 8.742/93, pois entendeu
o legislador pela ideia de proteção e relação de apoio mútuo entre pessoas do mesmo
grupo, estabelecendo assim um elo de apoio e base familiar no que concerne aos deveres
e obrigações com a prestação de alimentos e suporte em caso de necessidade. Em
último e, somente em último caso, o Estado deve intervir.
A situação se torna catastrófica na medida em que, por um lado, o Estado deve
intervir em situação de necessidade não amparado pelo núcleo familiar, mas por outro,
não o faz. Grande parte dos Benefícios de Prestação Continuada são indeferidos na
esfera administrativa, em sua grande maioria, por não preencher os requisitos de
miserabilidade de ¼ do salário-mínimo. Por sua vez, o Poder Judiciário que, em tese,
teria de cumprir o que seria papel do Estado, acaba por restringir ainda mais os sujeitos
elegíveis ao BPC Assistencial, seja por entender extensivo o grupo familiar previsto na
legislação da LOAS, seja por não respeitar “desde que vivam sob o mesmo teto”.
Por falar em mesmo teto e a contrário sensu do que determina a legislação,
vejamos um caso prático e real:
Em certo caso, a Turma Recursal do Rio Grande do Sul confirmou a sentença
3
Disponível em https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/41971503/do1-
2018-09-24-portaria-conjunta-n-3-de-21-de-setembro-de-2018-41971236
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Percebe-se que o grande avanço que tivemos, em especial a partir do novo CPC,
a partir de um novo modelo de perícia a ser adotada na análise conjunta dos indivíduos
que buscam proteção do estado e estão em situação de extrema vulnerabilidade social.
José Ricardo Caetano Costa entende que:
[...] Se a perícia médica, por si só, não é suficiente para avaliar os demais
componentes que extrapolam o mero aspecto fisiológico e patológico,
somente uma avaliação social poderá permitir o conhecimento das outras
condições que circundam o indivíduo. Estas condições, que na CIF-2001,
como vimos, é melhor detalhada, a jurisprudência vem simplificando na
expressão “condições pessoais e sociais”. Por certo que os peritos médi-
cos não possuem habilidades e competências, muito menos disposição,
para enfrentar a realidade social, in locu, e fazer um detalhado estudo
da realidade concreta dos segurados/autores, em sua mediação com o
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O BPC assistencial não é apenas um direito social, mas também um direito humano,
que visa garantir que todas as pessoas, independentemente de sua condição de saúde
ou deficiência, tenham direito a uma vida digna e ao acesso a recursos básicos. Por esse
motivo, entendemos que a perícia biopsicossocial é fundamental para que o BPC seja
concedido de forma justa e que atenda às necessidades em condição de vulnerabilidade
no Brasil, contribuindo para a promoção da dignidade, dos direitos humanos e da inclusão
social desses indivíduos.
4 CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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TELLES, Rodrigo. Manual do BPC LOAS. 2. ed. São Paulo: Edição do Autor, 2023.
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Resumo
Este artigo propõe uma análise abrangente dos direitos da personalidade, examinando
suas evoluções históricas, princípios fundamentais e categorias específicas. Os
direitos da personalidade são elementos essenciais na proteção da dignidade
humana, abrangendo aspectos íntimos da vida de um indivíduo, como sua integridade
física, privacidade e imagem. Além disso, o estudo destaca os desafios relacionados
ao acesso à justiça na busca por proteger esses direitos. A via tradicional de justiça
frequentemente apresenta morosidade e custos substanciais, tornando-se inacessível
para uma parcela significativa da população. Nesse contexto, o artigo explora os
métodos extrajudiciais de solução de conflitos (MESC’s) como uma alternativa
eficaz e acessível para a proteção dos direitos da personalidade. A mediação e a
arbitragem são destacadas como meios que promovem a resolução de disputas
de forma ágil e respeitosa, permitindo que as partes envolvidas desempenhem um
papel ativo na busca por soluções. Foi utilizado como metodologia a abordagem
dedutiva, por procedimentos comparativos e de revisões históricas, fundamentando-
se na bibliografia nacional e estrangeira. Ao final do artigo espera-se constatar os
MESC’s enquanto instrumento de efetividade dos direitos da personalidade por sua
característica de facilitadora do acesso à justiça.
Palavras-chave: Direitos da Personalidade. MESC’s. Acesso à Justiça.
Abstract
This article proposes a comprehensive analysis of personality rights, examining their
1
Possui graduação em Direito pela Faculdade Maringá (2015), Pós-Graduação em Direito Penal e
Direito Processual Penal pelo Instituto Paranaense de Ensino Superior (2017) e Mestrado em direitos
da Personalidade pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas (PPGCJ) da Universidade
Cesumar (UNICESUMAR), com enfoque nos instrumentos de efetivação dos direitos da personalidade. É
advogado particular - Dornellos e Santos Advocacia e Coordenador do de PROCON Sarandi/PR.
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Possui Graduação em Direito pela Universidade Estadual de Maringá (1992); Pós-Graduação “Lato Sensu”
em Direito Civil e Processual Civil pelo Instituto Brasileiro de Estudos e Pesquisas Sócio-Econômicos
(1998); Mestrado em Ciências Jurídicas pelo Centro Universitário de Maringá (2011); Doutorado em
Ciências Jurídicas pela Universidade do Minho, Portugal (2019); É Professora Permanente do programa
de Mestrado e Doutorado em Ciências Jurídicas da universidade Unicesumar (2021); Docente do curso de
graduação em Direito da universidade UNICESUMAR (2008).
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1 INTRODUÇÃO
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Esses direitos são inalienáveis e imprescritíveis, ou seja, não podem ser vendidos ou
perdidos com o tempo, sendo essenciais para a preservação da dignidade e dos valores
humanos.
Os Direitos da Personalidade têm suas raízes na perspectiva dos jusnaturalistas
franceses e alemães, que os consideram inerentes à condição humana, independentemente
do reconhecimento estatal. De acordo com De Plácido e Silva, a personalidade é definida
como um “conjunto de elementos próprios ou inerentes à pessoa, que a diferencia
morfológica, fisiológica e psicologicamente de qualquer outro” (Silva, 2007, p.1035). Isso
implica que a personalidade, como um atributo intrínseco, confere à pessoa a capacidade
de ser reconhecida como sujeito de direitos e deveres, ou seja, a personalidade jurídica.
Sob a perspectiva dos direitos da personalidade, a capacidade de ser titular de
direitos e deveres é o aspecto subjetivo, enquanto o aspecto objetivo abrange o conjunto
de características e atributos da pessoa, que merecem proteção legal. A Constituição
Federal, ao consagrar a dignidade da pessoa humana como um de seus princípios
fundamentais, eleva a personalidade (inerente) à mesma dignidade, conferindo, por
consequência, aos direitos da personalidade um status inalienável e inerente à condição
humana.
Elimar Szaniawski também enfatiza a natureza intrínseca da personalidade,
descrevendo-a como “o conjunto de características próprias do indivíduo” (Szaniawski,
2005, p. 70). Ele identifica alguns dos direitos da personalidade, como a vida, a liberdade
e a honra, destacando a estreita conexão entre a dignidade da pessoa humana e os
direitos da personalidade.
Os direitos da personalidade encontram-se respaldados na Constituição Federal,
que estabelece a dignidade da pessoa humana como um dos princípios fundamentais
do país (Artigo 1º, III/CF). Além disso, a Constituição garante a inviolabilidade de direitos
como vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade (Artigo 5º, caput/CF) (Cortiano
Junior, 1998, p. 47). A Constituição também antecipou possíveis formas de violação
dos direitos da personalidade, como o direito à informação e à escolha, indicando a
necessidade de criar um código para proteger os indivíduos contra tais agressões.
Ao reconhecer na Constituição o direito do ser humano à preservação de sua
dignidade e à livre expansão de sua personalidade, o direito geral da personalidade deve
ser considerado como um dos direitos fundamentais estabelecidos pela Constituição.
Além da cláusula geral que resguarda a personalidade, derivada do princípio da
dignidade da pessoa humana, o sistema jurídico brasileiro também assegura outros
direitos específicos da personalidade que são explicitados na própria Constituição e
na legislação que a complementa. Todos esses direitos coexistem e operam de forma
harmoniosa. (Szaniawski, 2005. p. 31).
Compreendendo a importância fundamental dos direitos da personalidade, torna-
se imperativo que sua proteção seja constante e prioritária. A evolução necessária desses
direitos e sua garantia plena só podem ser alcançadas por meio do contínuo trabalho e
do desenvolvimento da jurisprudência. A jurisprudência, ao utilizar analogia e princípios
gerais do Direito, desempenha um papel essencial na proteção dos direitos inerentes
à pessoa humana, independentemente de sua tipificação pelo legislativo ou de sua
classificação pelos estudiosos do Direito. Este processo dinâmico de desenvolvimento
legal garante que os direitos da personalidade permaneçam eficazes e relevantes,
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e regulamentada pelo Código de Processo Civil (CPC), que estabelece a sua utilização
no âmbito judicial, especialmente nos Juizados Especiais e na Justiça do Trabalho.
A mediação é outro método alternativo de resolução de conflitos que envolve a
atuação de um mediador imparcial. O mediador facilita a comunicação entre as partes em
disputa e as ajuda a identificar suas necessidades e interesses subjacentes. O mediador
não toma decisões, mas auxilia as partes na busca de uma solução consensual. A
mediação é um processo voluntário e confidencial. No Brasil, a mediação é regulamentada
pela Lei de Mediação (Lei 13.140/2015) e também é incentivada como meio de resolução
de conflitos em diversas áreas, incluindo a judicial, a escolar e a comunitária.
A arbitragem é um método alternativo de resolução de disputas em que as partes
envolvidas concordam em submeter a controvérsia a um árbitro ou a um painel de árbitros.
O árbitro emite uma decisão, chamada de sentença arbitral, que é vinculativa e tem força de
lei. A arbitragem é considerada um processo mais formal do que a conciliação e a mediação,
e as partes renunciam ao acesso ao Poder Judiciário para resolver o litígio. No Brasil, a
arbitragem é regulamentada pela Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996) e é frequentemente
utilizada em disputas comerciais e contratuais. A arbitragem, assim como no sistema judicial
tradicional, é reconhecida como um mecanismo de heterocomposição, onde um terceiro ou
um painel de árbitros assume a responsabilidade de resolver o litígio apresentado pelas
partes por meio de sua vontade, conforme afirmado por Cahali (2012, 38). Nesse processo,
a decisão do árbitro prevalecerá sobre as partes envolvidas na disputa.
É inegável que, por um longo período, a heterocomposição e a autocomposição
eram vistos como métodos típicos de sociedades primitivas e tribais, enquanto o sistema
jurisdicional tradicional era considerado uma conquista inegável da civilização. Contudo,
atualmente, observamos um renovado interesse por alternativas ao processo judicial,
que têm a capacidade de evitar ou acelerar o processo, embora não necessariamente o
excluam. (Grinover, 2008).
Portanto, é correto afirmar que na autocomposição, as próprias partes assumem o
papel de juízes em sua contenda, uma vez que detêm o poder de decisão sobre o conflito
em questão. Mesmo quando há a participação de um terceiro imparcial, sua função é a
de um facilitador na resolução das divergências, agindo como um mediador neutro. Esse
terceiro não emite julgamentos, mas desempenha um papel de assistência, propondo
opções e soluções para a celebração de um acordo. Sua intervenção é pautada pela
imparcialidade, não envolvendo qualquer tomada de decisão que afete o resultado final
da disputa, permitindo assim que as partes mantenham o controle sobre o processo de
resolução.
A desjudicialização de disputas é uma tendência presente no sistema legal brasileiro.
Isso se traduz em uma tentativa de tornar mais ágil o sistema judiciário nacional, visando
remover do âmbito da burocracia judicial certos conflitos que podem ser resolvidos por
meio de acordos consensuais. Com a promoção da mediação, conciliação e outros
métodos extrajudiciais de resolução de disputas, o sistema jurídico almeja oferecer às
partes envolvidas uma alternativa viável e menos onerosa para a resolução de suas
controvérsias. Dessa forma, não apenas se agiliza o processo de solução de disputas,
mas também se fortalece a cultura da busca por acordos e consensos, contribuindo para
a redução do congestionamento dos tribunais e para uma administração de justiça mais
eficaz. (Cappelletti, 2015).
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CONCLUSÃO
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substanciais ao tentar acessar a justiça através desse meio, devido à lentidão dos
procedimentos judiciais e aos custos envolvidos.
A morosidade e os custos associados à via tradicional de justiça resultam em
obstáculos substanciais para a efetivação dos direitos da personalidade. Essa situação
cria uma disparidade injusta, impedindo muitos indivíduos de proteger seus bens mais
essenciais, como a integridade física, a privacidade e a imagem.
Diante desses desafios, surge os métodos extrajudiciais de solução de conflitos
(MESCs). Estes se apresentam como um meio inovador e eficaz de acesso à justiça,
oferecendo uma abordagem mais ágil e acessível para a resolução de disputas
relacionadas aos direitos da personalidade. A mediação, por exemplo, promove a
comunicação direta entre as partes, facilitando o entendimento mútuo e a busca por
acordos consensuais. A arbitragem, por outro lado, proporciona um processo mais
rápido e adaptável, com a possibilidade de escolher árbitros especializados no tema em
questão.
Em suma, os métodos extrajudiciais de solução de conflitos emergem como um
meio alternativo e efetivo de acesso à justiça, que atende às necessidades das partes
envolvidas e contribui para a proteção dos bens da personalidade. Dessa forma, eles se
destacam como um elemento crucial na busca por uma sociedade mais justa e equitativa,
onde todos possam efetivamente resguardar seus direitos fundamentais de maneira
eficaz e acessível, superando as barreiras representadas pela morosidade e custos da
via tradicional de justiça.
REFERÊNCIAS
AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. São Paulo: Renovar, 2003, p. 248
BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2002.
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio
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CAHALI, Franscisco José. Curso de Arbitragem. 2. ed. São Paulo: RT, 2012.
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Saraiva, 2010. v. 1.
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da Personalidade e sua tutela. 2. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2005.
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