Ricardo Antunes - Os Comunistas No Brasil...
Ricardo Antunes - Os Comunistas No Brasil...
Ricardo Antunes - Os Comunistas No Brasil...
AS REPERCUSSÕES DO VI CONGRESSO DA
INTERNACIONAL COMUNISTA E A PRIMEIRA INFLEXÃO
STALINISTA NO PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PCB)
RICARDO ANTUNES
Os Comunistas no Brasil
INTRODUÇÃO:
Nota do autor
Agradeço ao Professor João Quartim de Moraes pela Leitura e comentários ao
texto.
1
Lukács, G., Ontologia Dell’Essere Sociale I, Editori Riuniti, Roma, 1976, p. 361.
13
Ricardo Antunes
2
de Hegel e a Ideologia Alemã , a tese do "socialismo num só país"
ganhava, frente às derrotas das revoluções no Ocidente, o estatuto taticista
de fundamentação teórica. Marx, Engels e especialmente Lenin passaram
a ser usados como elaboradores ou coonestadores da tese do "socialismo
num só país".
Esta dupla formulação - a do caráter universal e clássico da
Revolução Russa e aquela que valida a possibilidade do socialismo num
só país - penetrou inicialmente no interior do PC soviético. Derrotado
Trotsky, esta tese penetra no interior da Internacional Comunista e, de
forma avassaladora, para o conjunto do movimento comunista
internacional3.
Claudin sintetiza precisamente este processo: "A teoria do
socialismo num só país se converte em doutrina oficial da IC ( uma vez
que o trotskismo foi posto para fora da lei na União Soviética e nos
partidos comunistas de todos os países) e passa a ser o princípio diretor
da concepção da revolução mundial formulada no programa aprovado
no VI Congresso (1928). A desigualdade do desenvolvimento econômico
e político é uma lei absoluta do capitalismo. Esta desigualdade se agrava
e acentua na época imperialista. Disto resulta que a revolução proletária
internacional não pode ser considerada uma ação única, simultânea e
universal. A vitória do socialismo é possível, no início, em alguns países
4
capitalistas, inclusive num só país tomado isoladamente" .
Era a vitória do taticismo de Stalin frente à formulação teórica de
Trotsky. Já "um ano e meio antes do VI Congresso, o Comitê Executivo
da IC adotara plenamente a posição de Stalin. Na resolução aprovada
2
A título de ilustração: "Empiricamente, o comunismo é apenas possível como ato dos povos
dominantes, 'súbita' e simultaneamente, o que pressupõe o desenvolvimento universal da
força produtiva e o intercâmbio mundial conectado com o comunismo". Em A Ideologia
Alemã, Grijalbo, SP, p. 51. Esta dimensão tem sido enfatizada com muita pertinência por
István Mészáros: "A revolução social vitoriosa não poderá ser local ou nacional...Deverá ser
global/universal, o que implica a necessária superação do Estado em escala global". Ver "Il
Rinnovamento del Marxismo e L'attualità storica dell'ofensiva socialista", em Problemi del
Socialismo, jan/fev/1982, Milão, Itália, p. 60.
3
Desde 1905 Trotsky apontava para a impossibilidade de êxito, posterior às revoluções, do
socialismo nos países atrasados, tese que fica ainda mais consistente em seu pensamento ao
longo dos anos 20.
4
Claudin, F., A Crise do Movimento Comunista, vol. I, Global Editora, SP, p. 73
14
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
5
Idem, p. 98/99, nota 56.
6
Idem, p. 75.
7
Carr, E., "El V Congresso da La Internacional Comunista", Cuadernos de Pasado y Presente
55, 1975, p. 28.
8
Fragmento do discurso de Treint, cit. por Carr, op. cit., p. 28. Ver também Milos Hájek, "A
Bolchevização dos Partidos Comunistas", em Hobsbawm, E., História do Marxismo, VI,
Paz e Terra.
15
Ricardo Antunes
10
Lukács, G., L'Uomo e la Democrazia, Ed. Lucarini, 1987, Roma, p. 79.
9
Carr, op. cit., p. 28.
16
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
11
Claudin, F., La Crise del Movimiento Comunista, Ed. Ruedo Ibérico, 1970, p. 203. Data
desta época a criação do Bureau Latino-americano da IC, funcionando o Partido Comunista
Argentino como ponto de contato para os PCs deste continente. Pouco antes, em 1922, o
suiço Alfred Stiner havia sido designado como responsável da IC para assuntos latino-
americanos.
12
"O VI Congresso da Internacional Comunista, Informe y Discusiones", Cuadernos de Pasado
y Presente 67, 1978, p. 82.
17
Ricardo Antunes
13
americana na América Latina, frente ao declínio inglês . Este Congresso
contou com a representação latino-americana composta pelos PCs da
Argentina, Brasil, Uruguai, Cuba, Paraguai, Equador e Colômbia, muitos
dos quais eram partidos recém constituídos.
Além do Relatório de Kuusinen, sobre o mundo colonial, coube a
Humbert-Droz , secretário da IC e chefe do seu Secretariado para a
América Latina, a apresentação de um co-relatório voltado para o Novo
Continente. Representando o PCB estavam os militantes Paulo Lacerda,
Leôncio Basbaum e Heitor Ferreira Lima14.
As Teses sobre o Movimento Revolucionário nas Colônias e Semi-
colônias começavam enfatizando que "...o enorme mundo das colônias
e semi-colônias converteu-se15
em um foco inextinguível do movimento
revolucionário de massas" . Partindo de referências à China, Índia e
Indonésia - onde particularmente nos dois últimos países a situação era
entendida como favorável às possibilidades revolucionárias - o VI
Congresso voltou sua atenção para o mundo latino-americano,
acentuando-se que nesta região o imperialismo norte-americano já
relegava o inglês a um plano de inferioridade. Constatou-se a existência
de insurreições camponesas, greves operárias, que estampariam o
aprofundamento dos processos revolucionários no mundo latino-
americano, contrários à dominação imperialista. A acentuação da
contradição entre a política imperialista no mundo colonial e a busca de
um desenvolvimento autônomo dos povos coloniais encontraria suas
possibilidades de ação através das massas trabalhadoras. Frente ao
catastrofismo capitalista, a inevitabilidade da crise permitia "...a
13
Ver Antunes, R., Classe Operária, Sindicatos e Partido no Brasil, Ed. Cortez, Cap. V,
utilizado como referência de pesquisa neste texto .Ver também Del Roio, M., A Classe
Operária na Revolução Burguesa, Oficina de Livros, SP, p. 96 e segs e Pinheiro, Paulo
Sergio, Estratégias da Ilusão, Cia. das Letras, SP, especialmente item III.
14
Veja-se Lima, Heitor F., Caminhos Percorridos, Ed. Brasiliense, a mais sugestiva e
documentada das memórias de militantes, no que se refere às relações PCB e IC na viragem
dos anos 20/30. E também Prado Jr., Caio, A Revolução Brasileira, Ed. Brasiliense, pioneira
análise crítica dos equívocos da IC para a América Latina.Ver especialmente cap. II.
15
"O VI Congresso..., Teses, Manifiestos y Resoluciones", op. cit., p. 188.
18
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
16
Idem, p. 192/194.
17
Idem, p. 198.
18
Idem, p. 199.
19
Ricardo Antunes
19
Idem, p. 205.
20
Idem, p. 205.
20
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
21
22
Cadernos AEL nº 2
Ricardo Antunes
Fundadores do PCB (1922). De pé (da esquerda para a direita): Manoel Cendón, Joaquim Barbosa, Astrojildo Pereira,
João da Costa Pimenta, Luiz Pérez e José Elias da Silva. Sentados: Hermogênio Silva, Abílio de Nequete e Cristiano
Cordeiro.
Os Comunistas no Brasil
21
Há um fragmento das "Teses de Blum" publicado na revista Temas 7, Ed. Ciências Huma-
nas. Ver também Trotsky, Revolução e Contra-Revolução na Alemanha, Ed. Ciências Hu-
manas, 1979.
22
O VI Congresso..., op. cit., p. 238.
23
Ricardo Antunes
23
Idem, pp. 238/9.
24
Idem, p. 241.
25
Bukharin, N., "La Situación Internacional y las Tarefas de la Internacional Comunista", VI
Congresso, Informes y Discusiones, op. cit., 9/11,29 e 153. Ver também Schlesinger, Rudolf,
"La Internacional Comunista y el Problema Colonial", Cuadernos de Pasado y Presente
52, p. 106.
24
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
26
O VI Congresso..., "Informe de la Delegacion Latino-americana sobre el Programa da
Internacional Comunista", Ricardo Paredes, op. cit., p. 176.
27
Idem, p. 178/9.
25
Ricardo Antunes
28
Humbert-Droz, "Sobre los Países de América Latina", VI Congresso..., op., cit., p. 301.
29
Idem, p. 302.
26
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
30
Ver, entre outros, Hecker, Alexandre, Um Socialismo Possível (A Atuação de Antonio
Piccarolo em São Paulo), T.A.Q. Editor, SP.
31
Pereira, A., A Formação do PCB, Ed. Vitória, 1962, p. 66.
32
Conforme documento "Os Congressos do PCB", p. 3.
27
Ricardo Antunes
33
Pereira, A., op. cit., 144 e seg. e "Os Congressos...", op. cit., p. 5.
34
III Congresso, em Pereira, A., op. cit., p. 120.
28
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
35
Congressos do PCB”, op. cit., pp. 5/6.
36
Idem, p. 5.
29
Ricardo Antunes
37
O Trabalhador Latino-Americano, Revista Quinzenal de Informação Sindical, Orgão Oficial
do Comitê Pró-Confederação Sindical Latino-Americana, Ano I, nº 1 a 5, 15 de novembro
de 1928 (grifos meus).
38
Pereira, op. cit., pp. 102/3.
30
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
39
Veja-se o Informe de Humbert-Droz, em "O VI Congresso...", op. cit., p. 319, com agudas
críticas ao BOC.
40
Ver Lima, Heitor, F., op. cit., pp. 103 e segs.
41
Pereira, A., "O PCB e sua Ação", La Correspondência Sudamericana, Buenos Aires,
15/09/1928.
42
Humbert-Droz, "O Movimento Revolucionário na América Latina", Buenos Aires, 30/09/
1928.
31
Ricardo Antunes
43
Brandão, O., "A Sucessão Presidencial", Diário Carioca, 30/01/1929, em Carone, E., O
Movimento Operário no Brasil (1877/1944), Difel, p. 517.
32
Cadernos AEL nº 2
Os Comunistas no Brasil
44
A Classe Operária, 17/04/1930. As citações seguintes referem-se a este documento.
45
Idem, p. 3. Ver argumentação similar em Borodine, Saul, "La Situation Politique et le
Mouviment Ouvrier Revolutionnaire au Brésil", La Correspondance Internationale, nº 66,
1930, p. 872.
33
Ricardo Antunes
46
Sobre a relação Prestes e o PCB neste período ver Antunes, R., op. cit., pp. 156 e 159.
47
Par un Latino-americain, "A Propos des Evénements du Brésil", La Correspondance
Internationale, nº 86, 1930, p. 1110.
48
"El P. Comunista del Brasil frente a los Proximos Combates", Revista Comunista, Orgão
Teórico del Secretariado de la Internacinal Comunista, anõ 1, nº 2 e 3, enero y febrero/
1931, p. 21.
34
Cadernos AEL nº 2