Cartas para Paulo Freire, bell hooks e Frantz Fanon
Cartas para Paulo Freire, bell hooks e Frantz Fanon
Cartas para Paulo Freire, bell hooks e Frantz Fanon
C322
Livro em PDF
ISBN 978-85-7221-220-5
DOI 10.31560/pimentacultural/978-85-7221-220-5
CDD 370.866
PIMENTA CULTURAL
São Paulo • SP
+55 (11) 96766 2200
livro@pimentacultural.com
www.pimentacultural.com 2 0 2 4
CONSELHO EDITORIAL CIENTÍFICO
Doutores e Doutoras
Carta-prefácio............................................................................................19
Eliana Ayoub
Carta para celebrar a esperança......................................................... 37
Olivia Rochadel
(Des)envidraçamento no contexto universitário:
a prática libertária de renovação dos instrumentos
de ensino-aprendizagem.....................................................................................71
Tainara lima
Amor além da leitura............................................................................. 144
Adilma Vilela
Carta a Paulo Freire...............................................................................252
Paula Machava
Tributo a Fanon:
emancipação e consciência em Moçambique......................................................476
1 Esta obra foi financiada com recurso da Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação do
Instituto Federal da Bahia (Edital n. 10/2024/PRPGI/IFBA).
2 bell hooks assina seu nome com letras minúsculas para sugerir movimento e, também, para se
distanciar da identidade que mais se apega, que é Gloria Watkins (nome verdadeiro), criando um
outro eu (Hooks, 2013).
SUMÁRIO 17
Docentes da educação básica e do ensino superior, profis-
sionais da educação, pesquisadoras/es e estudantes da graduação
e da pós-graduação produziram as cartas reflexivas que compõem
esta obra. Por meio das cartas reflexivas, as pessoas autoras con-
tam para Paulo Freire, bell hooks e Frantz Fanon, suas experiências
pessoais, profissionais e acadêmicas, focalizando a produção de
inéditos viáveis, a construção dos processos de descolonização de
conhecimentos em diferentes contextos, os movimentos e as ações
contra diferentes formas de discriminação e opressão, e o estabele-
cimento do amor e da esperança como elementos centrais e sulea-
dores da vida social.
3 Esta obra também apresenta textos resultantes do projeto de pesquisa Práticas discursivas para
o bem viver, cadastrado e homologado na PRPGI/IFBA, no módulo Pesquisa da Plataforma SUAP,
em conformidade com Edital nº 16/2021/PRPGI, de 14 de outubro de 2021 (Edital de Pesquisa/
Inovação Contínuo).
SUMÁRIO 18
CARTA-PREFÁCIO
Lleida, 9 de mayo 2024
Querid@ lector@,
SUMÁRIO 19
Déjate llevar por este periplo epistolar, intelectual y emocional,
que, cobrando vida a través de papel, te hará descubrir y recorrer trayec-
torias personales y profesionales militantes, cotidianas y perseverantes.
Al embarcarte en esta aventura, te invito a que te conviertas en parte
de esta conversación, haciéndonos llegar tus cartas para perpetuar
la magia de la epistolaridad.
Meritxell Simon-Martin
SUMÁRIO 20
CARTAS PARA
PAULO FREIRE
Atauan Soares de Queiroz
SUMÁRIO 23
Nosso diálogo se manteve franco e honesto ao longo dos
anos. Às vezes mais intenso, às vezes mais tímido. Sempre havia
também, aqui e acolá, alguma colega de trabalho ou profissional
da educação que dialogava com suas obras, em reuniões pedagó-
gicas, encontros de sindicato, conversas no corredor da escola ou
comentários em eventos. Trazer suas ideias para esses encontros
dialógicos era uma espécie de convite para dar continuidade à lei-
turas de seus textos.
SUMÁRIO 24
diversos cantos do mundo. Surpreendemente, o capitalismo neo-
liberal tem, na atualidade, sustentado um casamento trágico com
forças reacionárias e conservadoras. Isso mostra, também, que o
capitalismo é tanto um projeto econômico de destruição do planeta
e de precarização da existência, quanto um barco que fica à deriva e,
de repente, estaciona em portos inóspitos. Não vou esmiuçar esses
processos violentos que, em última instância, capturam até mesmo
nossas forças vitais. Fiz somente para circunstanciar minha escrita e
para situá-lo um pouco sobre o atual estado das coisas. Nessas pou-
cas linhas, acho melhor falar de como você nos incentiva a pensar,
mesmo em tempos difíceis, em práticas de resistência, reexistência
e em decolonização4.
Sua obra, caro Paulo, tem sido uma fonte de inspiração para
mim, como professor, pesquisador e cidadão, subsidiando-me a
aprofundar a compreensão sobre debates sociais e culturais mais
amplos, de forma crítica e emancipatória. Atualmente, tenho investi-
gado e escrito sobre o pensamento decolonial, sobretudo no campo
da Educação. Colonialidade tornou-se uma palavra-chave para
entendermos melhor o modo como o capitalismo se apresenta hoje e
como a modernidade se constitui. Toda vez que explano sobre o pen-
samento decolonial, trago suas obras como leituras indispensáveis.
4 Utilizo a forma decolonial, sem a letra “s”, conforme reflexão de Catherine Walsh (2013, p. 25),
em Pedagogías Decoloniales: prácticas insurgentes de resistir, (re)existir e (re)vivir: “coloco em
evidência que não existe um estado nulo da colonialidade, mas posturas, posicionamentos,
horizontes e projetos de resistir, transgredir, intervir, insurgir, criar e incidir. O decolonial denota,
então, um caminho de luta contínua na qual se pode identificar, visibilizar e encorajar “lugares” e
construções alter-(n)ativas” (tradução livre).
SUMÁRIO 25
do saber-poder-ser e suas consequentes ressonâncias no campo
da Educação. Vejo tal obra como originariamente decolonial:
uma reflexão crítica do Sul global para o mundo, produzida por
um professor progressista, nordestino, de um país violentamente
colonizado por europeus.
SUMÁRIO 26
individualidade e coletividade, linhas duras e linhas flexíveis. Linhas
de fuga. Esse estado de poesia interroga nossa garganta, ninho da
palavra, como dizem os guaranis, e faz a alma a falar.
SUMÁRIO 27
Estado de poesia é assim, prazer irremediável pela fabricação de
sentidos abertos e inconclusos. As metáforas sombreiam o caminho
e de repente da garganta brota a palavra seminal, potente, desejosa
de papel ou tela. Só quer vir para este mundo. Gestação e parto ao
mesmo tempo. Talvez a gestação seja do poeta, o verbo sempre esteve
lá, não imóvel, muda de lugar e de forma também. Não esperemos
previsibilidades. Estado de poesia só joga com o imprevisível. Desenha
caminhos do “desver”.
Que tal, caro Paulo? Creio que está sorrindo dos meus deva-
neios poético-caóticos. Mas não é do caos que surge a estrela dan-
çante, como diria o filósofo? Esse lampejo prosopoético me parece
ajudar a refletir de forma pragmática sobre a decolonização do
inconsciente. Nunca duvidei das forças dos movimentos micropolí-
ticos para sacudir a pasmaceira do cotidiano. Na verdade, cada vez
mais aposto nas potências das microrresistências no plano micros-
social, as quais vão gerando microrressonâncias nas macropolíticas
e no cenário macrossocial.
SUMÁRIO 28
Certamente, precisamos estar sempre imbuídos no exercício de pro-
blematizar, ressignificar e reinventar suas ideias. Sabemos que era
exatamente isso que você defendia, a recriação das ideias, situando
socio-historicamente as práticas de libertação e de decolonização.
Um abraço afetuoso.
Atauan
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 39.ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2009 (1996).
ROLNIK, S. Esferas da insurreição: notas para uma vida não cafetinada. 2.ed. São
Paulo: n-1 edições, 2018.
SUMÁRIO 29
Marilde Queiroz Guedes
A EXTENSÃO
NO CENTENÁRIO
DE PAULO FREIRE:
POSSIBILIDADES
NA AUSÊNCIA/PRESENÇA
Caríssimo professor Paulo Freire,
SUMÁRIO 31
humana que exige segurança, competência profissional e generosi-
dade” (Freire, 1996, p. 102). Assim, comungo com a ideia que o ensino
deve estar voltado para uma concepção formativa, que articule indis-
sociavelmente a teoria e a prática, dentro de uma visão sócio-histó-
rica, emancipadora e inclusiva.
SUMÁRIO 32
diálogo como preocupação permanente. O diálogo com respeito
às diferenças de ideias e posições, quanto a necessidade humana
de comunicação social é um imperativo na prática freireana. Pois, o
diálogo, em suas palavras, “nasce de uma matriz crítica e gera cri-
ticidade. Nutre-se do amor, da humildade, da esperança, da fé, da
confiança (...). Só o diálogo comunica” (Freire, 1989, p. 107). Nesta
citação, percebo o entrelaçamento do diálogo com a esperança e a
amorosidade, categorias também presentes no Projeto.
SUMÁRIO 33
gerações. “Esse foco no “inédito viável”, aquilo que ainda não é, mas
pode e deve ser, na visão freireana tem como única possibilidade o
potiron, ou seja, de mãos juntas”. (Cortella, 2008, p. 20). Pois, como
diz Nóvoa (1999), um dos seus leitores, o futuro é hoje, não é possí-
vel postergar a sua construção. O construímos no presente, com as
condições que são dadas.
SUMÁRIO 34
Não houvesse esperança, a educação não faria nenhum sentido,
pois é a esperança que carrega adiante os ideais humanos” (Dias
Sobrinho, 2016, p. 17).
Bem, não é possível lhe contar tudo nessa breve carta, mas
essa boniteza tenho que registrar, a obra que publicamos em 2022,
“Educação e Mudança Social: o legado de Paulo Freire, pela Editora
Pimenta Cultural, fruto das leituras, reflexões e discussões dos auto-
res que colaboraram com a primeira edição do Projeto.
SUMÁRIO 35
Barreiras, 15 de setembro de 2023.
REFERÊNCIAS
CORTELLA, M. S. Educação, escola e docência: novos tempos, novas atitudes. São
Paulo: Cortez, 2014.
CORTELLA, M. S. Paulo Freire: utopias e lembranças. In: PERES, E. et al. (org.). Processos
de ensinar e aprender: sujeitos, currículos e cultura, livro 3. Porto Alegre: Edipucrs,
2008, p. 17-32.
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 19.ed. 1989.
SUMÁRIO 36
Eliana Ayoub
CARTA
PARA CELEBRAR
A ESPERANÇA
Querido Paulo Freire,
SUMÁRIO 38
Mas afinal, quem sou eu? Melhor eu me apresentar para você.
Meu nome é Eliana Ayoub, mais conhecida como Nana, apelido que
me acompanha desde a infância. Sou uma mulher branca, sudestina,
nascida em Campinas-SP, no ano de 1966, em plena ditadura militar
no Brasil. Sou “professora sim, tia não!”, como você escreveu em seu
livro de “cartas a quem ousa ensinar” (Freire, 1997b).
SUMÁRIO 39
delas nesta carta para partilhar os significativos aprendizados que
continuam me mobilizando a cada vez que eu retomo as suas lei-
turas. Aliás, eu fiquei tão impressionada quando soube que o livro
Pedagogia do Oprimido (Freire, 1987) foi traduzido em mais de 57
idiomas (Santana; Souza, 2019). Você sabia disso?
SUMÁRIO 40
Quando eu o li, fiquei imensamente tocada com a boniteza
das suas cartas, das de Nathercinha e das fotografias e imagens que
narram histórias entrelaçadas entre você, Nathercinha e outras pes-
soas da família. As memórias de uma mulher que se correspondia
com seu primo quando era criança movimentam as(os) leitoras(es)
pelos (des)caminhos da sua história no exílio em plena época da
ditadura no Brasil e em outros países da América Latina, mobilizando
diversas reflexões sobre educação, política, humanização e eman-
cipação, num momento em que tentaram, mas não conseguiram,
silenciar a sua voz, a qual passou a ser ouvida, reconhecida e respei-
tada pelo mundo afora. São tantas homenagens, honrarias e títulos
recebidos em diversos países ao longo da sua vida, e postumamente,
que seria muito difícil mencionar todos eles.
SUMÁRIO 41
Há entretanto, certas questões sobre as quais emitir um
parecer é quase uma ofensa. Emitir um parecer sobre
Nietzsche, ou sobre Beethoven, ou sobre Cecília Meireles?
Para isto seria necessário que o signatário do documento
fosse maior que eles, e o seu nome mais conhecido e mais
digno de confiança que aqueles sobre quem escreve...
SUMÁRIO 42
para “emprestar” a minha voz (e a minha emoção) para a narração do
texto do vídeo ao “Patrono da Educação Brasileira”, que foi exibido por
ocasião do “Colóquio Internacional Centelhas de Transformações -
Paulo Freire & Raymond Williams - Parte 1” (o qual pode ser assistido
no canal do youtube da FE Unicamp, a partir do minuto 17 - https://
www.youtube.com/watch?v=7SkucSf5Rxo).
Nana.
REFERÊNCIAS
AYOUB, E. Memórias da educação física na escola: cartas de professoras. Campinas,
SP: Pontes Editores, 2021.
SUMÁRIO 43
DIAS, V. V. Convergências entre o pensamento de Frantz Fanon e Paulo Freire: da zona do
não-ser à vocação ontológica do ser-mais. In: Revista Estudos do Sul Global, v. 1, n. 2,
p. 239-246, 2021.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
FREIRE, P. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho
d’Água, 1997b.
HOOKS, B. Ensinando pensamento crítico: sabedoria prática. São Paulo: Elefante, 2020.
HOOKS, B. Ensinando comunidade: uma pedagogia da esperança. São Paulo: Elefante, 2021.
LACERDA, N. A casa e o mundo lá fora: cartas de Paulo Freire para Nathercinha. Rio de
Janeiro: Zit, 2016.
SANTANA, O. A.; SOUZA, S. C.. Pedagogia do oprimido como referência: 50 anos de dados
geohistóricos (1968-2017) e o perfil de seu leitor. In: Revista História da Educação,
[S.L.], v. 23, p. 1-31, 2019.
SUMÁRIO 44
Daniella Taveira dos Prazeres
A PALAVRA E O MUNDO:
SER PROFESSORA
É UM ATO DE RESISTÊNCIA!
Estimado professor e escritor Paulo Freire,
SUMÁRIO 46
da Autonomia, o bem-estar individual e social dos indivíduos, priori-
zando uma sociedade mais comprometida com a educação pública,
enfim mais crítica e humana.
SUMÁRIO 47
A jovem negra, de família humilde e da periferia sonhava alto dentro
de uma realidade familiar e comunitária na qual a maioria das mulhe-
res não concluíram a Educação Básica.
SUMÁRIO 48
Ironicamente, após o resultado do Enem, fui aprovada para ingressar
nos cursos de Letras e Direito em instituições distintas da cidade.
Uma dúvida cruel passou a incomodar meu sono, mas eu não deve-
ria ter dúvidas, pois havia abandonado o sonho da docência. No
entanto, ironicamente, “o coração tem mesmo razões que a mente
desconhece”, como afirmou o filósofo francês Blaise Pascal, porque
no último dia de matrícula para um dos dois cursos fiz a opção para
o curso de Letras: Língua Portuguesa e Literaturas.
SUMÁRIO 49
Uma compreensão crítica do ato de ler, que não se esgota
na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem
escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do
mundo. A leitura do mundo precede a leitura da palavra,
daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da
continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade
se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a
ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção
das relações entre o texto e o contexto (Freire, 1989, p. 9).
SUMÁRIO 50
habilidades com a tecnologia. Tive todas as razões para abandonar a
profissão, contudo fui resistência novamente.
SUMÁRIO 51
positiva e esperançosa. O seu amor pela educação nacional ressig-
nificou muitas professoras e ainda o fará, no interior do Brasil, bem
aqui, em Barreiras-Ba, e quiçá pelo mundo.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: https://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 03 set. 2023.
DRUMMOND, C. A. Alguma poesia.1 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.
FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo:
Autores Associados: Cortez, 1989. (Coleção polêmicas do nosso tempo; 4)
Jornal Nacional. Brasil está entre os países com maior proporção de jovens que estão
fora da escola e sem trabalhar, diz OCDE. Disponível em: https://g1.globo.com/jornal-
nacional/noticia/2023/08/29/brasil-esta-entre-os-paises-com-maior-proporcao-de-jovens-
que-estao-fora-da-escola-e-sem-trabalhar-diz-ocde.ghtml. Acesso em: 29 ago. 2023.
SALES, B. Brasil pode ter déficit de 235 mil professores até 2040, aponta
estudo. Acesso em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/brasil-pode-ter-deficit-
de-235-mil-professores-ate-2040-aponta-estudo/#:~:text=Brasil%20pode%20ter%20
d%C3%A9ficit%20de%20235%20mil%20professores%20at%C3%A9%202040%2C%20
aponta%20estudo. Disponível em: 03 set. 2023.
SUMÁRIO 52
Grazielle Matos dos Reis
EDUCAÇÃO EM TEMPOS
DE INCERTEZAS:
UMA REFLEXÃO CRÍTICA
PARA PAULO FREIRE
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 54
para todos, independentemente de sua orientação sexual, raça ou
gênero? Quando buscamos uma educação verdadeiramente liber-
tadora, não podemos deixar de enfrentar essas questões urgentes.
SUMÁRIO 55
suas ideias para atender às demandas de nossa época, à medida
que enfrentamos os desafios do século XXI. Devemos continuar a
defender uma educação que liberte, conscientize e transforme, mas
também devemos ser adaptáveis e criativos. Inspirados por você,
buscamos contribuir para a renovação da educação em nosso pró-
prio caminho. Temos a obrigação de honrar seu legado, não apenas
repetindo suas palavras, mas também reinventando-as para um
mundo que está em constante mudança.
SUMÁRIO 56
Géssica de Souza Canaverde
SER PROFESSOR É
EXERCER A HUMANA
DOCÊNCIA
Estimado Paulo Freire,
SUMÁRIO 58
Atualmente, ainda se tem a ideia de que professor é o único
que tem algo para ensinar e que não pode ser questionado, que tem
apenas a tarefa de transmitir o que sabe e, infelizmente, há muitos
casos em que professores adotam esta postura, proporcionando
uma educação que forma pessoas alienadas, que não questionam
ou criticam o mundo ao seu redor. Ao me enxergar como futura pro-
fessora, sigo a linha do pensamento freirianos em que a educação
que muda e transforma pessoas, que não se resume em transmitir
o conteúdo, mas em construir saberes coletivamente. Que não só
ensina, mas que aprende com cada aluno ou pessoa, que se preo-
cupa em formar seres com sonhos de poder ser o que quiserem, de
pensar e criticar sua sociedade, seu mundo, contribuindo para uma
vida melhor a todos. Você me ensinou que
O educador já não é o que apenas educa, mas o que,
enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando
que, ao ser educado, também educa. Ambos assim se
tornam sujeitos do processo em que crescem juntos
(Freire, 1981, p. 78).
SUMÁRIO 59
construção do conhecimento de forma interessante e prazerosa,
garantindo às crianças a motivação intrínseca necessária para uma
boa aprendizagem. É através da brincadeira que a criança vive e
reconhece a sua realidade.
SUMÁRIO 60
Assim, a educação é um importante instrumento transfor-
mador. É ela que nos impulsionará a buscar mudanças e melhorias
para o nosso futuro.
SUMÁRIO 61
E mesmo diante de todos os desafios precisamos seguir com o seu
legado da esperança, da capacidade de sonhar com um mundo
melhor e que nós sejamos o profissional de educação que idealizamos.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25.ed.
São Paulo: Paz e Terra, 1996.
FREIRE, P. Educação como Prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
PIAGET, J. Psicologia e Pedagogia. Trad. de Dirceu Accioly Lindoso e Rosa Maria Ribeiro
da Silva. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1976.
SUMÁRIO 62
Ivana Cristina Lovo
DO INDIVIDUAL
AO COLETIVO
PARA ALCANÇAR
O SER MAIS
Queridos mestres Elza e Paulo Freire,
SUMÁRIO 64
No breve espaço desta carta, gostaria de me ater a potên-
cia do que os mestres Freireanos vão delinear como arqueologia da
consciência, de onde emerge a práxis como movimento dialético de
reflexão-ação-reflexão do sujeito sobre si mesmo e sobre o mundo
em que está inserido, produzindo assim os próprios meios para inter-
venção crítica nas realidades, que, por sua vez, possuem interseção
e incidências entre questões individuais e coletivas e entre diferentes
formas de opressão. Revelo, então, que esse processo de tomada de
consciência, transitando da denúncia ao anúncio do Ser mais, me
remeteu as minhas experiências de me tornar sujeito com a capaci-
dade de dizer não e fazer escolhas, que envolveu e envolve o cami-
nhar pela educação formal, agregado a um processo de autoconhe-
cimento, envolvendo o campo da psicologia e psicanálise, incluindo
a dimensão espiritual com a prática de meditação. Assim, essa cami-
nhada me aproximou e possibilitou melhor consciência sobre o que
Elza e Paulo Freire produziram de revolucionário para a educação.
SUMÁRIO 65
inacabados, o que nos convida a estar reflexivo, crítico e atuante
no presente, alimentando esse processo, ou seja, mantendo essa
postura constantemente. A partir da clareza sobre esse processo, e
reforçando a importância do entendimento dialético sobre como se
dão consciência e mundo na relação e introjeção do(a) opressor(a)
pelo(a) oprimido(a), Freire (2011, p. 77 e 146), reforçando a escuta de
Erich Fromm, cita: “Uma prática educativa assim é uma espécie de
psicanálise histórico-sociocultural e política”.
SUMÁRIO 66
Não sou se você não é, não sou, sobretudo, se proíbo você
de ser. É por isso que, como indivíduo e como classe, o
opressor não liberta nem se liberta. É por isso que, libertan-
do-se, na luta necessária e justa, o oprimido, como indivíduo
e como classe, liberta o opressor, pelo fato simplesmente
de proibi-lo de continuar oprimindo (Freire, 2011, p. 138).
SUMÁRIO 67
Para hooks e Freire, pensar é uma ação, e a linguagem é
expressão dessa ação. Assim, há uma potência de liberdade no ato
de falar e se expressar, como afirma hooks (2019, p. 45) “encontrar a
voz é um ato de resistência”.
Falar se torna tanto uma forma de se engajar em uma
autotransformação ativa quanto um rito de passagem
quando alguém deixa de ser objeto e se transforma em
sujeito. Apenas como sujeitos é que nós podemos falar.
Como objetos, permanecemos sem voz – e nossos seres,
definidos e interpretados pelos outros. ...
Toda vez que uma mulher começa a falar, inicia-se um
processo libertador, que é inevitável e tem implicações
políticas poderosas. ...
Consciência da necessidade de falar, de dar voz às
variadas dimensões de nossas vidas, é uma maneira de
a mulher não branca começar o processo de se educar
para a consciência crítica (Hooks, 2019, p. 45-46).
SUMÁRIO 68
A autora reforça que a mudança individual anda junto com a
mudança na realidade política e social mais amplas e, que, em uma
educação como prática da liberdade, o compromisso com a autorre-
alização dos estudantes é necessário e, fundamentalmente, radical,
entendendo que “ideias não são neutras e que ensinar de forma a
libertar, expandir consciência, despertar, é desafiar a dominação em
sua própria essência” (Hooks, 2019, p. 115). Assim, para bell hooks
(2017. p. 25), a educação como prática da liberdade é um jeito de
ensinar que qualquer um pode aprender, e se torna mais fácil para
aqueles professores que entendem que “nosso trabalho não é o de
simplesmente partilhar informação, mas sim o de participar do cres-
cimento intelectual e espiritual dos nossos alunos”. A autora reforça
ainda que, para tanto, “é importante que professores tenham coragem
de transgredir as fronteiras que fecham cada aluno numa abordagem
do aprendizado como uma rotina de linha de produção.
Ivana
SUMÁRIO 69
REFERÊNCIAS
ADORNO, T. W. Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Tradução de Maria Helena Ruschel.
Petrópolis/Rio de Janeiro: Vozes, 1995.
FREIRE, P. Ação cultural para liberdade. 5.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
HOOKS, B. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. Tradução Catia
Bocaiuva Maringolo. São Paulo: Editora Elefante. 2019.
SUMÁRIO 70
Olivia Rochadel
(DES)ENVIDRAÇAMENTO NO
CONTEXTO UNIVERSITÁRIO:
A PRÁTICA LIBERTÁRIA
DE RENOVAÇÃO DOS INSTRUMENTOS
DE ENSINO-APRENDIZAGEM
Estimado Freire,
SUMÁRIO 72
Eu ia para a escola todos os dias de manhã e, quando che-
gava, logo, logo eu tinha que me meter no vidro. É, no vidro!
SUMÁRIO 73
Ainda assim, estava dentro de um vidro, pois me preocupara em
demasia com a seleção de conteúdos para as disciplinas ao invés de
elaborar convites e construir situações em que pudéssemos construir
um roteiro de aprendizagem juntos a partir das nossas realidades e
daquilo que poderíamos adquirir por meio de pesquisa e leitura.
SUMÁRIO 74
Após apresentarmos a interdisciplinaridade enquanto
metodologia de ensino e informarmos que os instrumentos de
avaliação seriam definidos ao longo do semestre, alguns estu-
dantes nos responderam:
SUMÁRIO 75
“– Não sou professor(a), não tenho experiência em sala de aula.”
SUMÁRIO 76
para interpretação e elaboração de conhecimentos – definidos pela
particularidade das turmas e de seus indivíduos (sim, nossas aulas e
estratégias de avaliação consideravam particularidades). Essa rotina,
nos conduziu à conceber a sala de aula enquanto espaço social
complexo – desde então não tive aulas que pudessem ser repetidas
ou replicadas, pois a realidade dos estudantes se tornou o ponto de
partida para a relação didática a ser estabelecida.
8 Nome fictício em homenagem ao meu primeiro aluno (de atendimento educacional especializado
no estágio não obrigatório que fiz enquanto cursei a Licenciatura em Pedagogia). Nesta carta, o
nome Tiago representa muitos estudantes com quem tive a honra e a felicidade de aprender sobre
sexualidade, gênero e afeto.
9 Nome fictício.
SUMÁRIO 77
Embora acometida pelo ímpeto de querer puxar alguns
do vidro, não forcei ninguém a sair, pois percebi que se trata de
uma caminhada requerente de decisões autônomas, embasadas
em valores que fomentem aos estudantes o significado de dig-
nidade e humanidade.
REFERÊNCIAS
ROCHA, R. Quando a escola é de vidro. In: ROCHA, R. Este admirável mundo louco.
Ilustrações de Walter Ono. Rio de Janeiro: Salamandra, 2003.
SUMÁRIO 78
Cristiane Gomes Oliveira Arraes de Almeida
CARTA EM
HOMENAGEM
A PAULO FREIRE
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 80
violência policial ou pelo crime organizado, mas o que quero dizer é
que a realidade da nossa sociedade é feia, e não aguento mais ver e
ter que me acostumar com isso.
SUMÁRIO 81
Eu sempre fui observadora, e após transitar e conhecer dife-
rentes tipos de pessoas que são da classe trabalhadora, mas que
ganham salários muito diferentes, e portanto, têm condições finan-
ceiras diferentes e conseguem manter suas famílias conforme o que
ganham, uns com muita dificuldade, outras nem tanto, pude notar
que as diferentes formas de viver e de ler o mundo que os cerca pode
ser determinante para a leitura de realidade da sociedade.
SUMÁRIO 82
A realidade hoje é que o nosso povo tem que saber como a
sociedade capitalista funciona e que podemos alterar a realidade que nos
cerca com nossas ações, com nossos pensamentos e com a conscien-
tização de nossa classe, de que existe um conflito de interesses e esta-
mos servindo de ferramentas de acúmulo de capital na mão de poucos.
Cristiane.
SUMÁRIO 83
Antônia Maria Prado de Araujo
CARTA PARA
PAULO FREIRE
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 85
vida dos estudantes. Claro que com a leitura de suas obras, essas
questões se tornam mais claras. Certamente que achar é diferente
de pensar. E o seu pensar é uma bússola para a rota certa, é âncora
que nos firma no terreno do nosso ofício. Ratifica minhas palavras,
entre outros, o seu pensamento: “me movo como educador, primeiro,
porque me movo como gente” (Pedagogia da Autonomia).
Ah! Sobre o meu amor pela leitura e pela escrita, não poderei
deixar de fazer alguns relatos. Eu comecei a escrever na areia aos
dois anos de idade (o que à época, chamava a atenção das pessoas).
Recentemente, com mais de sessenta anos de idade, lancei meu
primeiro livro: À tona: páginas de areia. Ah! Sim, eu cursei Letras
com Literatura, depois dos 40 anos. Fiz especialização em Estudos
Linguísticos/Técnicas de Leitura e Produção Textual.
SUMÁRIO 86
Hoje vou me expressar utilizando o recurso da intertextuali-
dade, haja vista a importância e a correlação das palavras dialógicas
e de amorosidade entre São Paulo e Paulo Freire.
Externo aqui, mais uma vez, minha gratidão por tudo e por tanto!
A sua maneira de pensar tem transformado a Educação no mundo.
Abraços!
Antônia Prado
SUMÁRIO 87
Lucinete Teixeira dos Santos Sampaio
A EDUCAÇÃO
COMO ATO POLÍTICO
DE TRANSFORMAÇÃO
E LIBERTAÇÃO
Caro amigo Paulo Freire,
10 A Covid-19 é uma infecção respiratória aguda causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, potencial-
mente grave, de elevada transmissibilidade e de distribuição global.
SUMÁRIO 89
atravessados pela cultura nos permite refletir sobre a compreensão
do homem no jogo de suas relações com esses mundos, consti-
tuindo e, ao mesmo tempo, sendo constituído em meio à cultura. Por
que digo isso? Porque, meu caro amigo, venho observando que as
pessoas estão envoltas numa cultura capitalista de massa, pautada
na individualidade e na meritocracia, indo na contramão do que seria
uma sociedade justa e igualitária e, sobretudo, humanizada.
SUMÁRIO 90
crítica por ser ela capaz de rejeitar a passividade e se caracterizar
por uma atuação capaz de rever as posições, apresentar uma per-
manente reflexão, uma busca do rigor do raciocínio, da prática do
diálogo com embasamento, o acolhimento ao novo sem a rejeição
do antigo, e formas de vida flexíveis, questionadoras, ativas e autênti-
cas. Como essa consciência crítica fez falta nos últimos quatro anos!
Às vezes, me pego questionando: onde foi que erramos? Quanto
retrocesso! Você acredita que fomos bombardeados por fake news,
causando desinformação, polarização, prejuízos à reputação de pes-
soas e instituições, além de influenciar negativamente o processo
democrático? Fomos ameaçados por um golpe, acredita?
Lucinete
SUMÁRIO 91
Nívia Barreto dos Anjos
MINHA APROXIMAÇÃO
TEÓRICA, METODOLÓGICA,
ÉTICA E POLÍTICA COM
PAULO FEIRE
Querido Paulo Freire,
11 Aula de Política Social, ministrada no curso de Serviço Social da Universidade Federal da Bahia,
Campus São Lázaro, pela professora doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal da Bahia, Larisse Miranda de Brito, em 16/09/2023.
SUMÁRIO 93
Se tudo que vivemos girasse em torno apenas da rela-
ção capital X trabalho, uma mulher preta dona dos meios
de produção, detentora de capital e/ou pertencente às
classes mais altas da nossa sociedade, não continuaria
a sofrer racismo. Por isso, sem desconsiderar a análise
marxiana de (re) produção do capital, devemos também
incluir o debate dos símbolos culturais que forjam rela-
ções mais complexas que àquelas reduzidas à área eco-
nômica (Brito, 2023, p. 43 – grifo nosso).
SUMÁRIO 94
a das gentes, a de certa esquina, a da comida...” (Freire, 2022b, p. 47).
E olhe que o meu, diferente do seu, foi opcional, mas comer bacalhau
todo dia é difícil para uma nordestina, imagine entrar no mar e ten-
tar tomar banho em uma água que deixa o corpo dormente de tão
gelada, isso em pleno verão. Mas como você argumenta, a saudade
não pode virar nostalgia.
SUMÁRIO 95
não sendo a chave, a alavanca da transformação social, é, ainda
assim, indispensável à transformação social” (Freire, 2021, p. 39).
SUMÁRIO 96
semana, porque a guerra do narcotráfico e o confronto com a polícia
estavam tão pesados, que os estudantes corriam risco de bala per-
dida. E eu que tinha vindo daquela universidade pública em Lisboa
que possuía aquela biblioteca tão exuberante, só podia diante desta
situação parar e refletir em tudo que você escreveu a vida toda. “Não
sou esperançoso por pura teimosia, mas por imperativo existencial
e histórico[...] Minha esperança é necessária, mas não é suficiente.
Ela, só, não ganha a luta, mas sem ela a luta fraqueja e titubeia.
Precisamos da esperança crítica” (Freire, 2022b, p.15). Então eu não
podia fraquejar nem titubear, tinha que fazer minha pesquisa. Eu
devia isso a você! Afinal você diz que “urge que assumamos o dever
de lutar pelos princípios éticos mais fundamentais como o respeito à
vida dos seres humanos” (Freire, 2022a, p. 77).
SUMÁRIO 97
quando voltar da minha licença para o Doutorado, trabalharei seu
pensamento com os estudantes de uma forma completamente dife-
rente, aplicando na minha prática profissional cada livro que você
escreveu. Você é o Icone entre os pesquisadores que lutam pelos
Direitos Humanos e também o Inspirador dos Assistentes Sociais que
atuam na Educação Profissional e Tecnológica (estes são os títulos
dos meus dois novos artigos). Sua Pedagogia do Oprimido originou
o Paradigma Transformativo, porque o seu pensamento e sua pro-
posta de formação de uma consciência política fazem uma diferença
enorme neste mundo permeado por injustiças sociais.
REFERÊNCIAS:
ANDRÉ, G. M. Formar Assistentes Sociais para uma Mediação em Direitos Humanos.
Lusiadas. In: Intervenção Social, Lisboa, n. 38, 2. semester. 2011.
FREIRE, P.; SHOR, I. Medo e Ousadia: o cotidiano do professor. 15.ed. Rio de Janeiro: Paz
e Terra: 2021.
SUMÁRIO 98
GAL, J.; WEISS-GAL, I. Policy practice in social work: an introducion. GAL, J.; WEISS-GAL,
I. (Org.) Social Workers affeting Social Policy: an International Perspective. Chicago:
University of Chicago Press, 2014. (pp. 1-16)
IFE, J. Human Rights and Social Work. Towards Rights-Based Practice. Cambridge:
University Press, 2004.
MOREIRA, C. F. N. Método Paulo Freire, Trabalho com Grupos e Serviço Social. In:
SCHEFFER, G.; CLOSS, T.; ZACARIAS, I. (Orgs.). Serviço Social e Paulo Freire: Diálogos
sobre Educação Popular. Curitiba: Editora CRV, 2021. (p. 157-170)
SUMÁRIO 99
Sabrina Gomes dos Santos Costa Leite
ENTRE O MEDO
E A OUSADIA
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 101
Na pandemia do novo Coronavírus e também no recente
período eleitoral em nosso país, pude perceber o tamanho da dis-
tância entre o que falamos e o que fazemos. Bauman (2015, p. 95)
nos alertou sobre essa incoerência ao escrever: “Vocês se surpre-
enderão ao descobrir o tamanho do fosso entre ideais e realidades,
palavras e ações”. Agora, no período pós-pandemia, estamos frente
a uma sociedade cada dia mais doente, ansiosa, deprimida e com
pensamento acelerado. Também temos enfrentado o aumento da
violência e de outros problemas sociais que afetam diretamente a
escola. Afinal, é também na escola onde se refletem as transforma-
ções e os problemas da sociedade.
SUMÁRIO 102
Retomando a música supracitada de Emicida, é uma das
mais profundas que já ouvi, pois traz a mensagem da compreensão
da negação de espaços a muitos sujeitos históricos que tem sido
marginalizados e oprimidos. Leandro, o nome verdadeiro do cantor,
usa o rap como forma de resistência, luta e engajamento. Por meio
de sua arte também tem buscado colaborar para que a realidade seja
transformada. Essa música, por exemplo, foi utilizada em uma cam-
panha de prevenção ao suicídio – enfermidade crescente no Brasil
e no mundo. Outro trecho da música diz: “Eu sonho mais alto que
drones. Combustível do meu tipo? A fome” (Emicida, 2019). Logo, me
vem a pergunta: fome de quê?
SUMÁRIO 103
Diante do que tratei nessa carta, considerando o enorme
desafio da educação e dos professores deste país, não posso
concluir sem agradecê-lo. Obrigada por não desistir, por levantar
a bandeira dos oprimidos e servir de instrumento de voz e ação!
Obrigada por contribuir para que várias pessoas deste país
pudessem também sonhar!
SUMÁRIO 104
REFERÊNCIAS
AMARELO. Emicida. São Paulo: Laboratório Fantasma, 2019. 1 CD (48 min 48 seg).
EVARISTO, C. Olhos d’água. Rio de Janeiro: Palhas, Fundação Biblioteca Nacional, 2016. 116 p.
SUMÁRIO 105
Aúbe Soares de Queiroz Almeida
MINHA
PRIMEIRA CARTA
A PAULO FREIRE
Caríssimo Paulo Freire,
SUMÁRIO 107
“A escola é feita de gente”. Somos gente. Cada ator que com-
põe o coletivo da escola tem suas individualidades, suas particulari-
dades, desejos, objetivos. Andamos nos corredores, adentramos as
salas de aula, e muitas vezes só passamos. Não olhamos de fato. Não
percebemos muitas vezes quem está a nos ouvir.
SUMÁRIO 108
forma que, além do aprendizado dos livros, nós os ajudemos no
aprendizado da vida.
Despeço-me aqui.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 69. ed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2021.
SUMÁRIO 109
Emilly Monteiro de Alcântara Silva
TECENDO CONEXÕES:
UMA CARTA REFLEXIVA
A PAULO FREIRE SOBRE DIÁLOGO
E CONSCIÊNCIA CRÍTICA
Estimado Paulo Freire,
SUMÁRIO 111
gente, porque a história em que me faço com os outros e de cuja
feitura tomo parte é um tempo de possibilidades, e não de determi-
nismo” (Freire, 2018, p. 52). Diante dessa perspectiva, compreendi
que só serei capaz de praticar a pedagogia que defendo, entendendo
e reconhecendo a pedagoga que sou e quero ser.
SUMÁRIO 112
Uma educação que possibilitasse ao homem a discussão
corajosa de sua problemática. De sua inserção nesta pro-
blemática. Que o advertisse dos perigos de seu tempo,
para que, consciente deles, ganhasse a força e a coragem
de lutar, ao invés de ser levado e arrastado à perdição
de seu próprio “eu” submetido às prescrições alheias
(Freire, 1999, p. 97 e 98).
SUMÁRIO 113
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Educação Como Prática da Liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
GIL, G.; VELOSO, C. Divino Maravilhoso. Gravado por Gal Costa. Rio de Janeiro: Philips,
1968. Gravação em LP.
SUMÁRIO 114
Eliara Marli Rosa
SUMÁRIO 116
que, enquanto “necessidade ontológica, a esperança precisa da prá-
tica para tornar-se concretude histórica” (Freire, 2011, p. 15). Nesse
aspecto, a pedagogia freireana demostrou ser um dos caminhos viá-
veis de ações contra as mais diversas formas de opressão e validou o
estabelecimento do amor e da esperança como subsídios essenciais
da vida social como prática de liberdade. Mas, a quem serve e para
quem interessa a educação popular como prática de liberdade? Qual
a importância da pedagogia freireana na atualidade?
SUMÁRIO 117
7 de outubro em Belo Horizonte - Minas Gerais. Depreendemos dessa
valiosa experiência que, a educação popular, presente na raiz desse
seu legado, nos remete ao currículo enquanto percurso dessa bela
trajetória que é a própria vida e a realidade do cotidiano. Experiência
profunda que possibilitou e, ainda, possibilita admirar a beleza da
vida e do mundo, a “abertura ao diálogo e o gosto da convivência
com o diferente” (Freire, 2000, p. 20).
SUMÁRIO 118
Escolas de Ensino Fundamental e Médio; Escola de Tempo Integral;
Escola do Programa Ensino Integral (PEI) e Faculdade.
SUMÁRIO 119
Assim sendo, Freire, à luz de suas valiosas contribuições
como prática de libertação, permeada por ações contra as formas de
opressão e discriminação, tendo como elementos centrais o amor e
a preocupação com uma pedagogia que, efetivamente dê sentido e
significado à vida; sinto-me, hoje, sustentada por sua proposta meto-
dológica de natureza crítico-dialógica, firmada epistemologicamente
na sua concepção de educação, especialmente a educação popular
freireana. Sinto-me, ainda, resiliente por e para superar os conflitos
nas relações sociais e os ataques à democracia, tais como os viven-
ciados nos últimos cinco anos.
SUMÁRIO 120
Comungamos contigo, Freire: a educação necessita provo-
car outras mudanças. Para tanto, devemos “viabilizar os sonhos que
parecem impossíveis” (Freire, 1991, p. 126). Essa é a educação popular
como prática de liberdade que interessa ao setor popular, aos mais
pobres, mais vulneráveis e mais excluídos - cultural e socialmente.
No entanto, o maior desafio é a prática de uma pedagogia em uma
dimensão mais humanizadora, pois como você mesmo sugere: “Não
há outro caminho senão o da prática de uma pedagogia humani-
zadora” (Freire, 2013, p. 77). Assim nasceu e firmou o nosso com-
promisso por uma educação popular freireana em favor e defesa da
democracia, da vida e do respeito à dignidade humana.
SUMÁRIO 121
REFERÊNCIAS
FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. A Alegria do Evangelho. Sobre o
anúncio do Evangelho no mundo atual. São Paulo: Paulus/Loyola: 2013.
FREIRE, P. Política e educação. Organização Ana Maria de Araújo Freire. 2.ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2015.
FREIRE, P. Professora sim tia não: cartas a quem ousa ensinar. 9.ed. São Paulo: Olho
d´Água, 1998.
SUMÁRIO 122
Kaonny Rodrigues da Silva
CARTA ABERTA
DE DIÁLOGO
E REFLEXÃO
PEDAGÓGICA
Caro Paulo Freire,
SUMÁRIO 124
poder ajudá-las a desenvolver uma consciência crítica e a se torna-
rem agentes de transformação.
Uma das lições mais valiosas que aprendi durante meu está-
gio foi a importância do diálogo genuíno com os alunos. Ao ouvir
suas vozes e perspectivas, pude me conectar verdadeiramente com
eles e compreender suas necessidades individuais. Descobri que,
ao construir um relacionamento de confiança com os alunos, pude
promover um ambiente de aprendizagem significativo e inclusivo.
SUMÁRIO 125
Paulo Freire, sua visão revolucionária da educação continua
a inspirar e orientar educadores em todo o mundo e eu sou uma des-
sas pessoas que ver a educação por outra ótica, com esperança de
que estamos caminhando para um futuro melhor. Seu compromisso
com a justiça social, a igualdade e a emancipação dos oprimidos é
um farol de esperança em um mundo que muitas vezes parece desi-
gual e desumano. Sua crença na capacidade humana de transformar
a si mesma e ao mundo é um lembrete poderoso de que, como edu-
cadores, temos um papel fundamental na construção de um futuro,
um futuro próximo, o nosso amanhã. Me sinto na abertura de dizer
que esperançar é papel do pedagogo. Notamos cotidianamente a
alegria, a criatividade no olhar dessas crianças e na certeza de que
o amanhã traz grandes avanços. As crianças e adolescentes sabem
e querem aprender e nós como pedagogos devemos instigá-los a ir
cada dia mais longe.
SUMÁRIO 126
Elisângela dos Santos Clementino
CARTA
DE SIGNIFICAÇÃO
AO NOSSO QUERIDO
PAULO FREIRE!
Prezado Paulo Freire,
Olá! Muito bom estar escrevendo essa carta para você. Sou de
uma família de piauienses. Meus pais vieram para Brasília, na década
de 70, na época da construção da capital federal. Somos seis irmãos,
sendo 4 mulheres e 2 homens. Sou a caçula das mulheres, fui criada
pela minha avó materna Adilia, no sul do estado do Piauí na cidade
de Bom Jesus, com quem aprendi os valores da vida e a vontade de
crescer em sabedoria e graça, bem como avançar nos estudos.
SUMÁRIO 128
As linhas de pesquisas que participo são: GEPPESP- Grupo
de Estudos e Pesquisa Profissão, Docentes: Formação, Saberes
e Práticas e a ETEC- Educação, Tecnologias e Comunicação,
no momento estou estudando sobre a Inteligência Artificial na
Educação. E todos os meus professores têm apreço e admiração por
você e pelo seu trabalho. Você está no cronograma das atividades do
semestre e nos planos de curso da nossa Faculdade de Educação.
SUMÁRIO 129
fazer uma pesquisa, analisar conteúdos e interagir com a IA para
formar o pensamento.
SUMÁRIO 130
Agora, pensando no curso de formação vigente, o que levanto
de dilemas sobre a prática da assistência da IA para a escrita e conte-
údo de produções científicas são os questionamentos éticos, sociais e
morais quanto ao seu uso que devem ser lembrados constantemente.
Abraços!!!
SUMÁRIO 131
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Carta de Paulo Freire. Freire aos professores: ensinar, aprender- leitura de mundo,
leitura da palavra. In: Estudos avançados. São Paulo, v. 15. n.42. p. 259-268, 2001.
SUMÁRIO 132
Edinéia Alves Cruz
SOBRE SER-ME,
EM PERSISTENTE
ESPERANÇAR, ATRAVESSADA
POR CONSCIENTIZAÇÃO,
GENTETUDE E BONITEZA
Querido Senhor Paulo Freire,
Sabe, Seu Paulo, não sou boa na lida com certezas. Aliás,
me dói a rigidez delas. São as desconfianças que me instigam. Vivo
adentrando fissuras, tateando as texturas das relações, porque não
desaprendi a desconfiar de que haja algo importante acomodado no
SUMÁRIO 134
improvável, no absurdo ou no apagado. Desconfio de que o âmago
da consistência de seu legado seja a sensibilidade que te postura na
consideração do sujeito como (a)gente de transformações a partir
dele mesmo. Observando como o Senhor embebe racionalidade de
gentetude, e vice-versa, sem macular nem uma nem outra, aprendi
a desconfiar também da previsibilidade das ações humanas. Venho
tirando da pele de meus sentidos as escamas de costumeiro fatalismo.
Da tendência ao salvacionismo também. Tem se tornado mais fluida
a respiração das possibilidades de surpreender-me positivamente. Há
poesia neste deságue de leveza nas relações. Se negarmos o poten-
cial de maravilhamento que há na realidade, o que nos restará senão
suportá-la? Decidir vivê-la traz o rigor da responsabilidade social aos
processos de conscientização. O principal deles diz respeito a e res-
peita o que me vincula às causas que sinto reluzir, olhos adentro.
SUMÁRIO 135
Assentei boniteza num lugarzinho macio do peito como pala-
vra-princípio-guia de meus passos nessa trajetória compartilhada de
construções identitárias em diferentes papéis sociais que, impas-
síveis de completude, se atravessam entre si e me atravessam em
uníssono e também em tempos e modos específicos, conforme dá
pra movimentar a vida. Palavra-princípio-guia, porque é boniteza que
eu desejo sentir pulsar em mim, conscientemente, ainda que tudo o
que meus olhos alcançam seja impermanência. Assim, saberei por
onde recomeçar e seguirei para onde o coração apontar, sempre que
necessário, esperançando sem cessar. Quando penso, escrevo ou
pronuncio boniteza, Seu Paulo, sinto-me lhe pedindo a bênção para
me atrever a tentar interferir na crueza dura da realidade que me
atravessa. Gosto de falar boniteza em voz alta. Tanto que sempre
sorrio ao dizê-la. Fica um gosto bom na boca. Encoraja-me a decidir.
SUMÁRIO 136
das praxiologias cujos sentidos compartilhou ao longo de sua vida e
para além dela. Prevalecerão as microrrevoluções lançadas em rede
no mar de boas possibilidades de nos constituirmos mais humanos
em coletividade. Elas sempre prevalecem, não é mesmo?
SUMÁRIO 137
quando vou a campo, à medida que me constituo campo. De sujeito
em sujeito, Seu Paulo, o Senhor continua girando o mundo. Aliás, o
giro do mundo, seja ele mundo-gente ou mundo-lugar, não se man-
tém igual depois de tocado pelas palavras que tuas mãos constroem.
Liberdade de tantos. Fúria de uns.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 2004.
SUMÁRIO 138
Marli Vieira Lins de Assis
“PAULO FREIRE
PARA MIM É TUDO”!
Amado e eternamente admirado Paulo Freire,
SUMÁRIO 140
falar na aula!”. Eu agradeci a fala da educanda e fui embora tocada por
aquelas doces palavras ditas a uma estagiária inexperiente, mas feliz.
SUMÁRIO 141
alfabetização, querendo ler Paulo Freire. Imediatamente, eu lhe disse
que não havia necessidade de comprar, pois eu lhe daria o livro: A
Importância do Ato de Ler em três artigos que se completam. Algumas
semanas depois, o educando teve acesso ao livro e começamos
as leituras coletivas da obra. Em um belo dia, na Universidade de
Brasília, em uma apresentação que eu fazia sobre Paulo Freire junta-
mente com Francisco, uma aluna da pós-graduação lhe perguntou:
O educando respondeu:
Sim, Paulo Freire, você é tudo para nós! Sua forma de ver
o mundo, as pessoas e a educação nos tocaram e nos tocam de
tal forma que não conseguimos nos manter na inércia da educação
bancária, que prevalece em nosso meio até os dias de hoje.
SUMÁRIO 142
Obrigada, Paulo Freire, por nos ensinar a ver e a ler o mundo
com outros olhos: os olhos da esperança e da libertação. Obrigada,
Paulo Freire, por nos ajudar a levar a liberdade aos nossos educan-
dos e por permitir que vivenciemos as várias pedagogias que nos
deixou como exemplo, não para copiarmos, mas para irmos além!
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.
SUMÁRIO 143
Tainara lima
AMOR ALÉM
DA LEITURA
Prezado educador Paulo Freire,
SUMÁRIO 145
A esse respeito, é válido salientar em práticas de ensino “Os
alunos não tinham que memorizar mecanicamente a descrição do
objeto, mas apreender a sua significação profunda. Só apreenden-
do-a seriam capazes de saber, por isso, de memorizá-la, de fixá-la
(Freire, 1982, p. 12). Diante desse pensamento, é notória a importân-
cia do hábito da leitura compreendida e não apenas a codificação
de palavras, e haja vista cenário hodierno, muitas das vezes só se da
importância a codificação das palavras sem levar em conta o verda-
deiro sentido da mesma.
SUMÁRIO 146
a educação bancária a qual, em suas palavras refere-se quando “a
educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os
depositários e o educador, o depositante”. (Freire, 1987, p. 33); onde o
ensino é meramente propedêutico, com o intuito de depositar o con-
teúdo no estudante a fim de que o mesmo absorva esse tal conteúdo
visando apenas vestibulares, concursos, entre outros meios os quais
servirão apenas para o mercado de trabalho, esquecendo-se do
principal objetivo que seria o aprendizado e o conhecimento sobre
um determinado conteúdo o qual se leva por uma vida inteira, assim
como você mesmo reforça em suas obras. Por fim, deixo aqui os
meus mais sinceros agradecimentos a todas as suas contribuições
para a educação brasileira, tais como os métodos de ensino que se
fazem pertinentes até os dias atuais.
Tainara
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 23.ed.
São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1987.
SUMÁRIO 147
Floraci Mariano de Carvalho
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
NA EDUCAÇÃO:
É POSSÍVEL NEGAR OU INOVAR?
Estimado Paulo Freire, o meu respeito e consideração.
12 A educação híbrida caracteriza-se por: combinar o aprendizado online e o presencial; fornecer ex-
periências de aprendizagem que integram as tecnologias digitais da informação e comunicação;
inserir a tecnologia como facilitadora e potencializadora do ensino. Disponível em: http://www.
cipead.ufpr.br/portal1/index.php/ufpr-hibrida/educacao-hibrida/). Acesso em: 02 out. 2023.
SUMÁRIO 149
com a colaboração do humano-máquina, está deixando os professo-
res assustados. Diante de tal situação, questionamentos são levan-
tados sobre quais as causas, efeitos e benefícios que a IA trará a
aprendizagem dos estudantes? Quais as possibilidades ou prejuízos
isso causará a educação? Segundo Freire (2010, p. 232), “no decurso
de nossa vida pessoal e social, encontramos obstáculos, barreiras
que precisam ser vencidas, as “situações-limite”.
SUMÁRIO 150
A respeito de admitir ou não que eu tenha experiências para
fazer o uso da IA, para gerar a escrita de textos híbridos, parte do
conteúdo do projeto de pesquisa e na produção de artigo científico
com a colaboração de algoritmos. Penso que existe a possibilidade
da parceria humano e máquina, porém é preciso que a universidade
crie mecanismos de vigilância, produzindo códigos de ética que pos-
sibilitem o acompanhamento das escritas de textos híbridos pelos
estudantes. Para Kaufman (2016), ética é um comportamento do
indivíduo construído com base nos relacionamentos na sociedade.
SUMÁRIO 151
dos riscos e benefícios para a comunidade acadêmica, haja vista
ser uma temática nova e pouco explorada, onde o debate não está
ainda amadurecido em pensar para além dos horizontes. Para Freire
(2018, p. 93), “o que nos parece indiscutível é que, se pretendemos
a libertação dos homens, não podemos começar por aliená-los ou
mantê-los alienados.”
SUMÁRIO 152
benefícios nenhum, e sim medo e controle do comportamento das
pessoas de maneira opressora. Neste contexto, a IA pode ser utili-
zada para um bem maior da sociedade, sem envolver a ganância do
capitalismo e dos donos das grandes empresas privadas.
REFERÊNCIAS
FREIRE, A. M. A. Inédito viável. In: STRECK, D. R.; REDIN, E.; ZITKOSKI, J. J. (orgs). Dicionário
Paulo Freire. 2.ed. Revista e Ampliada. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 65.ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2018.
SUMÁRIO 153
Ozenilde Santos do Nascimento
ENCONTRO
DE ALMAS, ESCRITAS
E APRENDIZAGENS:
APRENDENDO COM PAULO FREIRE
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 155
Foi naquele nosso encontro, no centro de formação, você
lembra? CEPAFRE (Centro de Educação Paulo Freire) na Ceilândia,
que ainda resiste ao tempo e as pressões políticas, porém mantêm
viva sua memória e sua luta. Neste espaço, ouvi atentamente seu
discurso sem ainda compreender a dimensão que seus ensina-
mentos tomariam no mundo, assim como na África com as Cartas
à Guiné-Bissau e tantos outros lugares. E eu sou extremamente feliz
por fazer parte desse processo. Sei que fiquei muito tempo sem
lhe dar notícias, mas ser professora requer muito tempo e tem sido
corrido por aqui em busca de desenvolver saberes e conquistar o
meu espaço como educadora sendo Professora Sim, Tia Não: Carta
a Quem Ousa Ensinar.
SUMÁRIO 156
ainda existem professores que mantém a prática da Educação e atu-
alidade brasileira com o viés na educação bancária, sem perceber o
tamanho do prejuízo que essa prática traz para o desenvolvimento
do indivíduo e da sociedade.
SUMÁRIO 157
Desta Mangueira, pudesse mobilizar debates, reunir e encantar cen-
tenas de pessoas como fez comigo décadas atrás. Mas acredite que
seu legado está favorecendo a formação de educadores desafiados
a desenvolver mentes críticas e pensantes, sejam eles Educadores
de Rua, uma Abordagem Crítica – Alternativas de Atendimento aos
Meninos de Rua, ou qualquer outra minoria que precisa ter sua voz
propagada por meio da educação, na busca de caminhos possíveis
para mudar a condição de marginalizados do processo e serem
agentes na sociedade.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 1967.
SUMÁRIO 158
Priscila Ferreira de Carvalho
OS DESAFIOS ATUAIS
PARA CONTEXTUALIZAR
AULAS COM ABORDAGEM
FREIRIANA PARA CRIANÇAS
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 160
Assim, caro Freire, percebe-se que o ensinar exige respeito
à autonomia do educando que vem sendo cada vez mais tirada da
criança, jovem ou adulto, não se insere uma aula dialógica que faça
sentido na atualidade, que ressalte a realidade do aluno. Urge que
o professor tenha essa percepção de sentido em suas aulas e não
retire do aluno, nem minimize sua curiosidade e identidade cultural.
SUMÁRIO 161
Assim, como educadores, temos que ter consciência de que
a práxis educativa não é transferir conhecimentos de forma conteu-
dista e mecânica. Requer perceber que estamos em aprendizado
contínuo enquanto ser cultural e histórico que se identifica em um
processo de inacabamento. Assim, “A inconclusão que se reconhece
a si mesma implica necessariamente a inserção do sujeito inacabado
num permanente processo social de busca” (Freire, 2011, p. 54), con-
forme foi dito pelo Senhor.
SUMÁRIO 162
Assim, querido Freire tenho utilizado suas ideias para fazer
dos discentes seres críticos e curiosos, pois, “Se, de um lado, não
posso me adaptar ou me “converter” ao saber ingênuo dos grupos
populares, de outro, não posso, se realmente progressista, impor-
-lhes arrogantemente o meu saber como verdadeiro” (Freire, 2011, p.
79). É importante salientar, que quem tem poder quer sempre calar
a classe popular, para que estes não lutem por seus direitos e se sin-
tam culpados por sua situação desvantajosa. O educador tem como
responsabilidade auxiliar o educando em sua participação crítica
no mundo em que está inserido seja ele político, histórico, cultural
e social, para que intervenha na sociedade em que está inserido e
lute por melhorias.
SUMÁRIO 163
Por fim, finalizo essa carta agradecendo a sua atenção e as
ótimas cartas, obras e textos que o Senhor deixou para mostrar o
caminho de como ser um professor humanista libertador com as
crianças, jovens e adultos deste país, que ainda não assumiu de fato
na educação suas ideias.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 2011.
FREIRE, P. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho
d’Água, 1997.
LINS, I; MARTINS, V. Novo tempo. Álbum Novo tempo. Portugal, 1980. duração 4’e14”.
SUMÁRIO 164
Alana Gabriela Barros de Araújo
DIÁLOGO E MEDIAÇÃO
DA APRENDIZAGEM
ESCOLAR
Caro Paulo Freire,
SUMÁRIO 166
nosso sistema educacional, a fim de promover uma verdadeira trans-
formação. O conceito de diálogo como uma ferramenta de libertação
me levou a repensar minhas práticas de ensino, incentivando a parti-
cipação ativa dos alunos e a valorização de suas vozes.
SUMÁRIO 167
de aula a importância da empatia, do diálogo e da construção cole-
tiva do conhecimento, estabelecendo um ambiente de aprendizagem
participativo e inclusivo.
SUMÁRIO 168
Como educadora, tenho a honra de seguir seus passos e
me orientar com suas ideias em minhas práticas pedagógicas. Seu
legado continua a nos inspirar a criar espaços educacionais inclu-
sivos, nos quais os alunos possam se tornar sujeitos de sua própria
aprendizagem e agentes de mudança em uma sociedade mais justa.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1971.
SUMÁRIO 169
Raniely Souza Dourado
REFLEXÕES DE UMA
(QUASE) PEDAGOGA
COM MEDO DA
DOCÊNCIA
Caro Paulo Freire,
Uma das primeiras coisas que precisei fazer para lidar com
os meus medos, foi tomar consciência deles e ir verbalizando com
minha parceira no estágio. Entender que não estava sozinha e que,
em alguns casos, as situações podem ser mais assustadoras na
nossa cabeça, foi essencial eu começar parar de acreditar não ser
capaz de estar à frente de uma turma. Em uma de suas cartas, do
livro “Professora sim, tia não” o senhor diz que “a assunção do medo
é o começo de sua transformação em coragem.” (Freire, 1997, p. 45).
E de fato, não ter vergonha e assumir seus sentimentos pode ser o
primeiro passo para conseguir enfrentar tudo que estiver por vir.
SUMÁRIO 171
A verdade é que o docente é um ser humano e também
tem seus sentimentos, expectativas, limitações, o senhor mais do
que eu, deve saber disso. Durante o estágio, não só em uma, mas
em várias situações me vi conversando com os educandos sobre o
fato daquele momento/processo ser algo novo para mim e minha
dupla. Que aprendíamos algo com cada um deles e também que
não sabíamos de tudo, em alguns casos iria e foi preciso pesquisar
em casa sobre um assunto que foi colocado como dúvida para, pos-
teriormente, podermos responder. A isso você chama de humildade
epistemológica que “requer também, profunda confiança – não ingê-
nua, mas crítica – nos outros e uma opção, coerentemente vivida,
pela democracia.” (Freire, 1997, p. 45).
SUMÁRIO 172
Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos alguma
coisa.” (Freire, 1989, p. 39). Tento levar isso comigo na maioria das
situações, principalmente nas que a insegurança aparece. Durante
os 15 dias de regência com a turma de 20 crianças, sabia que aquele
era o momento para aprender e poder viver, mesmo que durante
pouco tempo, a docência, e errar faz parte do processo.
SUMÁRIO 173
além de contar com o apoio e orientações das professoras de estágio
e a da turma que estagiei.
SUMÁRIO 174
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 23.ed. São
Paulo: Autores Associados, Cortez, 1989.
FREIRE, P. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho
d’Água, 1997.
SUMÁRIO 175
José Nildo de Souza
LETRAS LIVRES
NA SOCIOEDUCAÇÃO:
INSPIRAÇÕES FREIREANAS
COM JOVENS EM RESTRIÇÃO
DE LIBERDADE
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 177
Precária”13 fundamentados na pedagogia libertadora de Paulo Freire.
Tornei-me ainda professor-formador na Eape, coordenando o curso
“Muito Além das Grades” e a formação docente em grupos de pes-
quisa sobre pedagogias para a socioeducação.
SUMÁRIO 178
Nestes movimentos e ações constroem-se formas de enfrentamento
e rupturas teatrais com a opressão e a discriminação que diariamente
convivemos em um estabelecimento de internação socioeducativa.
SUMÁRIO 179
Para construir vínculos desses jovens com a leitura tomei várias ini-
ciativas. E, em cada iniciativa dessas, eu levava a poesia, a música e o
teatro como forma de motivá-los a se interessarem pela leitura.
14 Essa atividade se tornou a atividade inicial do projeto. Foi sugerida pelo supervisor pedagógico
do núcleo de ensino da unidade de internação visando o empréstimo de livros, pois, não existia
biblioteca nas dependências do estabelecimento. Ou seja, ele sugeriu e eu tomei a iniciativa de
realizar uma campanha de leitura junto a jovens em restrição de liberdade.
SUMÁRIO 180
No teatro dispõe-se uma sala de aula de outro jeito: coor-
denação de atividades cênicas em círculos, distribuição coletiva de
tarefas, combate ao autoritarismo e, portanto, a desconcentração de
poder – alguns dos princípios da pedagogia freireana ou pedagogia
libertadora. Essas dinâmicas já subvertem a ordem hierárquica da
unidade de internação. Desse ponto tenho que negociar com a segu-
rança, pois, minha aula é acompanhada pelos agentes que são res-
ponsáveis pelo deslocamento dos socioeducandos até a biblioteca,
local onde ocorre o projeto que criei, Letras Livres na Socioeducação.
Todas essas pequenas dinâmicas teatrais restituem, gradativamente,
a palavra e a leitura àqueles jovens que, privados de suas liberdades,
estão condicionados à obediência e a disciplinarização de seus cor-
pos: cabeça baixa, ombros encolhidos e braços para trás.
REFERÊNCIAS
Brasil. Presidência da República. Secretaria Geral. Mapa do encarceramento: os
jovens do Brasil / Secretaria-Geral da Presidência da República e Secretaria Nacional de
Juventude. – Brasília: Presidência da República, 2015. 112 p.: il. – (Série Juventude Viva).
SUMÁRIO 181
Kêmily Alcântara Barreto
VIVÊNCIAS
DE UMA MONITORIA
DE ENSINO
Querido Paulo Freire,
É com muita alegria que lhe escrevo esta carta para relatar
as minhas vivências na educação pública e na Monitoria de Ensino
Superior. Meu nome é Kêmily Alcântara Barreto, sou estudante de
Pedagogia pela Universidade do Estado da Bahia e sou agricultora
em busca de uma graduação no nível superior. Venho da roça, estu-
dei desde a educação infantil até o nível superior em escolas e insti-
tuições públicas, fato este que me traz incentivo para lutar e acreditar
no ensino público de qualidade.
Sou mulher, sou neta, sou filha, sou mãe. Venho de uma gera-
ção de mulheres do campo, minha família é da roça, sou a primeira
a ingressar no ensino superior, e o senhor nem imagina o abrir de
portas que foi esse ingresso. Minha prima também se tornou filha
da UNEB e minha irmã agora também é. Meu coração transborda
ao lhe contar isso, a luta por uma educação pública, emancipatória,
deve fazer parte do cotidiano das nossas escolas. Acredite, sem o
incentivo da minha mãe e dos professores que sempre me disseram
que eu poderia ir além, que fizeram minha inscrição no programa
Universidade Para Todos - UPT, eu jamais teria chegado aqui. Não
por não ter capacidade de ir além, mas por não ter conhecimento
sobre como ingressar em uma universidade.
SUMÁRIO 183
Desta forma, eu consegui fazer parte dos programas e
assistências estudantis do governo estadual e federal, comecei com
o PIBID que durou 18 meses atuando em sala de aula, logo após
esse programa, consegui a bolsa do Mais Futuro. Após o PIBID eu
consegui fazer o Partiu Estágio e atuei junto a coordenação de uma
escola estadual da minha cidade Ibititá-Ba, local que aprendi muito
sobre coordenação pedagógica. Com o encerramento da bolsa do
Mais Futuro, surgiu a oportunidade de fazer o estágio do próprio
programa no Núcleo Territorial de Educação-NTE 01 dentro do Setor
Pedagógico, e foi o ambiente que me proporcionou vivências do
fazer pedagógico inestimáveis.
SUMÁRIO 184
partilhar das experiências juntamente com meus colegas e encon-
trar dentro destes partilhamentos o meu tema de pesquisa para
o TCC. Em uma escuta atenta dos relatos dos futuros pedagogos
em seus processos de estágio na escola Parque Municipal Ineny
Nunes Dourado, na cidade de Irecê-Ba, trouxeram à tona assuntos
emergentes para se trabalhar e contribuir com a educação do nosso
município. Bingo! Eureca!! O papel do coordenador na dinamização
do currículo da rede municipal.
SUMÁRIO 185
sentido para aquele que vai ser alfabetizado, “a leitura do mundo
precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não
possa prescindir da continuidade da leitura daquele” sendo que
esta leitura somente fará sentido se for acompanhada de uma capa-
cidade de ler o mundo, de perceber o mundo, de reconhecer os
papéis desempenhados pelos atores do mundo e de reconhecer-se
como peça naquele mundo, e foi isto que eu vivenciei durante a
monitoria de ensino.
SUMÁRIO 186
Empoderamento Comunitário a partir da Infância, com foco também
na alfabetização freiriana, pois me entendendo dentro de contexto
social, sendo mulher, negra e pobre, preciso conhecer e reconhecer
o que é ser oprimido e o que é ser opressor, senão o oprimido conti-
nua em seu lugar de oprimido e não sai para a luta, já que:
O opressor só se solidariza com os oprimidos quando o
seu gesto deixa de ser um gesto piegas e sentimental, de
caráter individual, e passa a ser um ato de amor àqueles.
Quando, para ele, os oprimidos deixam de ser uma desig-
nação abstrata e passam a ser os homens concretos,
injustiçados e roubados. Roubados na sua palavra, por
isso no seu trabalho comprado, que significa a sua pes-
soa vendida. Só na plenitude deste ato de amar, na sua
existenciação, na sua práxis, se constitui a solidariedade
verdadeira (Freire, 2011, p. 23).
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 50. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2011.
SUMÁRIO 187
Joilton Lopes de Brito Lemos
Escrevo esta carta para lhe contar que durante minha vida
acadêmica fui me apaixonando por seus escritos. Ainda no Ensino
Médio, aluno do Curso Normal (Formação de Professores), tive con-
tato com uma de suas obras. Uma professora pediu par que lêsse-
mos o livro Professora Sim, Tia Não: Cartas a Quem Ousa Ensinar. A
partir dessa leitura, sinto que comecei a construir o professor que
sou, consciente do papel social da escola, das disputas ideológicas,
do papel formativo e de luta da greve dos trabalhadores e de que os
educandos são sujeitos da História.
SUMÁRIO 189
fazer pontes com outros autores, seja para embasar ideias seme-
lhantes ao que é defendido em sua obra, seja para contrastar con-
cepções divergentes.
SUMÁRIO 190
Bourdieu ressalva que as diferenças culturais entre os
alunos das diversas classes sociais seriam menos eviden-
tes nos níveis mais elevados do sistema de ensino. Isso
ocorreria porque os alunos das classes médias e popula-
res que chegam a esses níveis do sistema já teriam pas-
sado por um processo de “superseleção”, no qual teriam
sobrevivido apenas aqueles mais qualificados (Nogueira;
Nogueira, 2004, p. 87).
SUMÁRIO 191
desobediente com a vontade de Deus – uma espécie de
enfrentamento indevido com o destino. Daí a necessidade,
que tanto enfatizamos, de problematizá-las em torno dos
mitos de que a opressão as nutre. (Freire, 1987, p. 162).
SUMÁRIO 192
morações, Lula chupou jabuticabas colhidas, por ele próprio, de uma
jabuticabeira que plantou em seu segundo mandato. É a prova cabal
de que “Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas
jamais conseguirão deter a chegada da primavera”.
REFERÊNCIAS
BOURDIEU, P. PASSERON, J. A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de
ensino. Petrópolis: Vozes, 2008.
SUMÁRIO 193
Lana Lima Pereira
A REEXISTÊNCIA
DO FAZER EDUCATIVO
COMO PRÁTICA
DE LIBERDADE
Saudoso e respeitável Freire,
SUMÁRIO 195
cultura digital. Ela compete com o nosso papel em sala. O universo
digital tem ditado todas as regras do sistema. Tudo de maneira difusa
e desorganizada. Cada um faz o que quer, compartilha o que deseja,
sem ter um olhar cuidadoso e cauteloso sob seus dedos.
SUMÁRIO 196
escola, no entanto aqui vemos o quanto a teoria e a prática traçam
caminhos diversos e contrários.
SUMÁRIO 197
A minha grande preocupação, Freire, é se realmente conse-
guiremos superar as nossas necessidades individuais de sobrevivên-
cia, de existência e de reexistência, através da profissão de educador,
com todos os desafios que carregamos nas costas na contempora-
neidade, da falta de condições de trabalho, da precária remuneração
e da desmotivação dos alunos pelos estudos, e assim construir uma
possível prática de liberdade. Esta carta, mais do que resolver essa
questão, é querer abrir um diálogo com você que tanto dedicou seu
tempo, pensamento e escritos vislumbrando a tão sonhada liber-
tação da humanidade, em especial dos grupos marginalizados. A
questão que quero finalizar este diálogo é então: como reexistir na
profissão em busca da libertação?
Lana
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários a prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 2004.
SUMÁRIO 198
Marilza Pereira da Silva
A SOMBRA DAS
MINHAS MEMÓRIAS
Estimado professor Paulo Freire!
SUMÁRIO 200
importante espaço informal de educação, no qual vivi muitas experi-
ências interessantes.
SUMÁRIO 201
aí podíamos cabriolar à vontade e isso não era repreendido porque
estávamos debaixo do olhar atento dos pais.
SUMÁRIO 202
Meu primeiro acesso às letras não foi na escola, ao chegar na
classe do “ABC”, estranhei, visto que já cheguei alfabetizada e a pro-
fessora achou melhor me promover para a primeira série. Eu estava
avançada na aprendizagem, mas traumatizada com a metodologia
utilizada na minha alfabetização.
Meu irmão mais velho, que estudou até a quarta série ganhou
a missão imperiosa de alfabetizar, eu e minha irmã. Por sermos as
mais novas, não tínhamos recursos para a farda, então tínhamos que
esperar para herdar dos irmãos mais velhos.
SUMÁRIO 203
mãos em punho) o que em mim causava frequentes dores de cabeça.
A professora mostrava seu poder de forma autoritária e violenta,
buscando nos silenciar e domesticar, como se fôssemos animais em
adestramento, sem liberdade de pensar, sem o direito a expressar,
sem o respeito ao sujeito, me fazendo recordar o que o senhor diz no
livro Pedagogia da autonomia: “[...] a autoridade docente mandonista,
rígida, não conta com nenhuma criatividade do educando. Não parte
de sua forma de ser, esperar, sequer, que o educando revele o gosto
de aventurar-se” (Freire, 1996, p. 104).
Morar com as avós não era ruim, tinha uma outra energia, outro
formato e funções, a minha, por exemplo, era de fazer as compras, pois
tinha excelente memória e não esquecia nenhum item da compra, minha
avó confiava em mim, pela primeira vez me senti, útil, inteligente e feliz!
Era outra forma de ler e entender o mundo, seus símbolos e significados.
SUMÁRIO 204
Na minha busca solitária de não aceitar ser capacho dos que
não sabiam me amar, perdi a esperança, mas me reconectei com ela,
assim me reporto a Pedagogia da Autonomia, quando o senhor sabia-
mente diz que: [...] “É preciso ficar claro que a desesperança não é
maneira de estar sendo natural do ser humano, mas distorção da espe-
rança. Eu não sou primeiro um ser da desesperança a ser convertido
ou não pela esperança” (Freire, 1996, p. 29). Com esperança me refiz,
sofrida, endurecida pela vida, mas, “esperançada” das coisas boas, da
minha caminhada de vida pelas trilhas das Caatingas semiáridas.
Índia Caatingueira
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. À sombra desta mangueira. 11.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.
SUMÁRIO 205
Terezinha Oliveira Santos
Meu ato de escrever esta carta é guiado por suas palavras, nas
páginas iniciais do livro, A importância do ato de ler: três artigos que
se completam, gosto muito daquela sua imersão poética-filosófica
ao conceituar a compreensão crítica da leitura como um processo no
qual a palavra escrita, a linguagem escrita possui um tempo que lhe
é anterior e um tempo que se estende “(...)na inteligência do mundo.
A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior
leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele.
Linguagem e realidade se prendem dinamicamente” (Freire, 1989, p.
9). Na sala de aula de Língua Portuguesa, em especial, a linguagem
se materializa nos gêneros do discurso, orais e escritos. Autores, a
exemplo de Marcuschi (2010), nos falam de um continuum entre
fala e escrita, no entanto, o mito da supremacia da escrita sobre a
oralidade persiste e, nessa ideologia, se perde aquilo que você tanto
apreciava , educador querido: a escuta , o prestar atenção ao que a
pessoa está dizendo para, a partir dali, em comunhão, se pensar em
formas de transformar a realidade comum no texto a ser lido.
SUMÁRIO 207
lhe dizia, melhor seria continuar suas andanças pela roça, quintal e
cozinha lugares da sua vivência.
SUMÁRIO 208
pode ferir gravemente a pessoa. Um outro narrador interveio e con-
tou sobre o baiacu; um peixe que infla quando é ameaçado e possui
um veneno. E eu, aprendiz, fiz perguntas como ouvinte interessada.
Despeço-me!
REFERÊNCIAS
FREIRE, M. Totonha. In: Contos Negreiros, 2005. Disponível em: https://edview.php?id=
2510534. Acesso em: 30 set. 2023.
FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo:
Cortez,1989.
SUMÁRIO 209
Rosimaria Barbosa de Oliveira Moura
AO GRANDE EDUCADOR,
TRANSMISSOR DE
AMOR E ESPERANÇA
Estimado e saudoso Paulo Freire,
SUMÁRIO 211
Nós educadores, resistimos, nos reinventamos, muitos de nós tive-
mos que aprender às pressas, trabalhar com recursos tecnológicos,
dar aulas online, muitas vezes sem nenhum treinamento, criar canais
no YouTube, blogs e grupos em redes sociais, fazer busca ativa dos
educandos via celular.
SUMÁRIO 212
Afinal, a necessidade das crianças, adolescentes e jovens de hoje, vai
além da mera transmissão de conteúdo. Em dias nebulosos, como os
de hoje, é preciso suscitar a pedagogia do amor, com nova base epis-
temológica voltada para o diálogo, liberdade com troca de saberes
diversos sob à luz de uma educação dialógica e problematizadora.
Assim como disseste em 1978:
O educador deve ser um inventor e um reinventor cons-
tante desses meios e desses caminhos com os quais
facilite mais e mais a problematização do objeto a ser
desvelado e finalmente apreendido pelos educandos.
Sua tarefa não é a de servir-se desses meios e desses
caminhos para desnudar, ele mesmo, o objeto e depois
entregá-lo, paternalisticamente, aos educandos, a quem
negasse o esforço da busca, indispensável ao ato de
conhecer. Na verdade, nas relações entre o educador e
os educandos, mediatizados pelo objeto a ser desvelado,
o importante é o exercício da atitude crítica em face do
objeto e não o discurso do educador em torno do objeto
(Freire, 1978, p. 17).
SUMÁRIO 213
Não podemos nos calar diante de tantos retrocessos, é pre-
ciso que levantemos a bandeira de uma educação problematizadora,
que compreendemos nossos jovens no mundo pós-pandêmico.
SUMÁRIO 214
No entanto, meu nobre educador, como diz o dito popular
não há mal que dure para sempre, o gigante adormecido acordou no
segundo turno e nos reacendeu a esperança de dias melhores. Por
hora, ainda somos um regime democrático de direito.
REFERÊNCIAS
Ataques de Bolsonaro deterioram liberdade de imprensa no país, segundo RSF. In: Abraji.
Disponível em: https://rsf.org/pt-br/ranking-mundial-da-liberdade-de-imprensa-2020-
estamos-entrando-numa-d%C3%A9cada-decisiva-para-o. Acesso em: 02 jun. 2023.
SUMÁRIO 215
BRASIL. Lei 12.711 de 29 de agosto de 2012. Dispõe sobre o ingresso nas universidades
federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras
providências. Brasília, DF: Presidência da República, [2012]. Disponível em: https://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12711.htm. Acesso em: 27 set. 2022.
SUMÁRIO 216
Saoara Barbosa Costa Sotero
ESCREVIVÊNCIAS
DE UMA PROFESSORA-
PESQUISADORA
Admirado Paulo Freire
SUMÁRIO 218
Trabalhando com a Educação de Jovens e Adultos no SESI
Bahia tenho percebido como é importante para as pessoas que fazem
parte da turma, o movimento de ir a escola, de ter seus saberes valori-
zados subvertendo o pensamento equivocado de que na EJA estão as
pessoas incapazes de aprender. Não estar dentro da idade estabele-
cida por lei, como a ideal para cursar a educação básica é o reflexo da
realidade dura daquelas pessoas que Miguel Arroyo chama de “passa-
geiros da noite” em seu livro Passageiros da Noite: do trabalho para a
EJA: itinerários pelo direito a uma vida justa, que foi publicado em 2017.
SUMÁRIO 219
Saberes - RDS - que tem o objetivo de construir um plano de estudos
personalizado para cada estudante, partindo de suas experiências
formais, informais e não formais, valorizando e certificando as com-
petências que desenvolveram em suas práticas cotidianas.
SUMÁRIO 220
A segunda reflexão que fiz, Paulo Freire, foi partindo da per-
gunta: para que serve o ensino de História na Educação de Jovens e
Adultos? Entendo que o ensino de História na EJA precisa ter a finali-
dade de contribuir para uma educação emancipatória. É através dela
que nos referenciamos no mundo quando compreendemos nossas
origens, tradições, valores, a realidade em que vivemos, como che-
gamos a ela e principalmente como olhar o mundo a partir da diver-
sidade que o habita, pensando a partir de epistemologias não hege-
mônicas e com práticas que visem reduzir as desigualdades e subal-
ternização construídas historicamente e mantidas até os dias atuais.
SUMÁRIO 221
REFERÊNCIAS
ADICHIE, C. N. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
SUMÁRIO 222
Lucirleide Rosa de Jesus
DO SONHO
À REALIDADE
Estimado e sempre presente mestre Paulo Freire, saudações
libertadoras!
SUMÁRIO 224
nessa obra foram fundamentais para minha compreensão de classe
e do quanto a minha posição diante do elitismo mudaria o rumo da
minha história. Aprendi com o senhor que eu devo lutar sempre pela
minha emancipação e de todos os meus pares. Sua obra foi muito
importante para eu compreender a minha condição social e lutar
por melhores condições de vida e para a construção de uma socie-
dade mais crítica, mais igualitária, mais justa e menos opressora, pois
como o senhor nos ensinou,
Quem melhor que os oprimidos se encontrará preparado
para entender o significado terrível de uma sociedade
opressora? Quem sentirá, melhor que eles, os efeitos
da opressão? Quem melhor que eles, para ir compreen-
dendo a necessidade da libertação? Libertação a que não
chegarão pelo acaso, mas pela práxis de sua busca; pelo
conhecimento e reconhecimento da necessidade de lutar
por ela (Freire, 2005, p. 34).
SUMÁRIO 225
desenvolvimento do pensamento crítico, através da formação integral
do sujeito, através de práticas educativas emancipadoras e libertado-
ras, o que aprendi em Pedagogia Como Prática da Liberdade quando
aponta que a palavra pode deixar de ser o veículo das ideologias que
alienam para tornar-se o instrumento de transformação do homem
e da sociedade. A palavra, nesse sentido, se aprende na escola, e é
este o papel da escola: o de ensinar o educando a ler o mundo para
nele intervir positivamente, no sentido de realizar transformações
para o bem viver de todos.
SUMÁRIO 226
contra os resquícios desse período tenebroso que durou cerca de
cinco anos, mas que, graças àqueles que acreditam na Democracia
para garantia dos direitos de todos, vencemos a batalha, no entanto,
estamos em alerta sempre, pois, a nossa jovem Democracia ainda
corre sérios riscos de ataques cruéis.
Abraços!
SUMÁRIO 227
REFERÊNCIAS
ALTHUSSER, L. Ideologia e aparelhos ideológicos do Estado. Lisboa: Presença, 1970.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 42.ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2005.
FREIRE, P. A importância do ato de ler. São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1989.
SUMÁRIO 228
Elayne Santana Costa
INCLUSÃO:
UM OLHAR ATENTO A PARTIR
DO DIÁLOGO E DA EDUCAÇÃO
LIBERTADORA
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 230
Nessa perspectiva, entendi que o espaço da sala de aula teria
que ser mais acolhedor, de maneira que ele pudesse ser incluído
para assim garantir uma aprendizagem significativa, não queria ser
apenas uma reprodutora dos assuntos abordados no livro. Queria
inovar a didática e construir conhecimento com a turma. Paulo Freire
ressalta que, “Desta maneira, o educador já não é o que apenas
educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o
educando que, ao ser educado, também educa” (Freire, 1987, p. 68).
O meu principal objetivo era que juntos nós pudesse transformar a
sala de aula num ambiente libertador, e no coletivo construir uma
educação problematizadora contextualizando a realidade.
SUMÁRIO 231
Em um processo dialógico de muita iniciativa e elogios
conseguir sua participação nas atividades, cativei seu interesse e
atenção, os trabalhos em grupo permitiram seu desenvolvimento,
de maneira tímida sempre perguntava se a atividade estava certa,
participando e conversando com os colegas da turma, percebi em
alguns momentos principalmente em trabalhos em grupos ele dando
ideias e sugestões, ele tinha um pouco de dificuldade na leitura e
na escrita então ele perguntava aos colegas se estava correto, os
mesmos ajudava e corrigiam juntos as atividades.
Eu sabia que por detrás daquele olhar, existia uma criança que
precisava apenas se sentir incluído, aquele menino tímido e inseguro
perdido no seu silêncio com olhar de tristeza, trazia consigo conhe-
cimentos que precisava ser explorados, nessa convivência conseguir
manter uma relação dialógica entre ele e a turma e as professoras,
numa troca de saberes, conhecimentos, experiência e vivências cria-
mos juntos uma relação de interação que me possibilitou um olhar
mais ampliado do mundo e da prática pedagógica.
SUMÁRIO 232
autonomia, criar e atuar de maneira significativa, pensando nas suas
habilidades sociais e emocionais. Paulo freire em seu livro Pedagogia
do oprimido aborda questões muito importantes sobre o diálogo e a
educação, e inspirada nessas reflexões e nas palavras amor, diálogo,
esperança e liberdade, que conseguir resolver o problema.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 35.ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1987.
SUMÁRIO 233
Jaildes Andrade Barreto Rosendo
GOTAS PEDAGÓGICAS
DE UM POVO DA EDUCAÇÃO
DE JOVENS E ADULTOS (EJA)
Prezado Freire,
SUMÁRIO 235
de opressores, os quais ainda hoje negam direitos à sociedade, que
enquanto seres humanos tem o mesmo direito que qualquer vivente
de classe A ou B. Quando, na sua obra Pedagogia do Oprimido, você
retrata muito claramente sobre o opressor e o oprimido:
O opressor só se solidariza com os oprimidos quando o
seu gesto deixa de ser um gesto piegas e sentimental, de
caráter individual, e passa a ser um ato de amor àqueles.
Quando, para ele, os oprimidos deixam de ser uma desig-
nação abstrata e passam a serem os homens concretos,
injustiçados e roubados. Roubados na sua palavra, por
isso no seu trabalho comprado, que significa a sua pes-
soa vendida. Só na plenitude desse ato de amar, na sua
existenciação, na sua práxis, se constitui a solidariedade
verdadeira (Freire, 2005, p. 35).
SUMÁRIO 236
sair do mundo da indignação. E assim, no semestre seguinte, o estu-
dante da EJA já havia conquistado sua liberdade, conseguiu produzir
pequenos textos, e realizar desafios relacionados à sua profissão.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. A educação na cidade. São Paulo: Cortez Editora, 1991.
FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo:
Autores Associados: Cortez, 1989.
SUMÁRIO 237
Ananda Lima Silva Arruda
O SILÊNCIO
DA EDUCAÇÃO
Querido Paulo Freire,
SUMÁRIO 239
O silêncio foi muito presente em minha vida, ainda hoje o
é, mas numa outra dimensão. Fico imaginando quantas crianças,
jovens e adultos estão nas escolas e universidades num silencio gri-
tante! A nossa tendência é nos encantar e concentrar nossa atenção
aos estudantes com maior expressividade, seja na aprendizagem ou
no comportamento. E aqueles silenciosos, que, normalmente, estão
reservados às margens de nossas salas vão passando sem um olhar
amoroso e atento. Como sujeitos históricos, reproduzimos o que
vivenciamos. Por isso, a importância de recorrer a você, aos seus
pensamentos expressos em muitos textos.
O meu bom senso me adverte de que há algo a ser com-
preendido no comportamento de Pedrinho, silencioso,
assustado, distante, temeroso, escondendo-se de si
mesmo. O meu bom senso me faz ver que o problema
não está nos outros meninos, na sua inquietação, no seu
alvoroço, na sua vitalidade. O meu bom senso não me
diz o que é, mas deixa claro que há algo que precisa ser
sabido. Esta é a tarefa da ciência, que sem o bom senso
do cientista, pode se desviar e perder. (Freire, 2004, p. 63).
SUMÁRIO 240
eleva sobremaneira as atribuições desses profissionais que em mui-
tos espaços têm se ocupado demasiadamente com questões buro-
cráticas ou frívolas. Muitas vezes impostas a eles, inviabilizando as
análises, reflexões, autoanálises e tudo que pudesse lhe dar respos-
tas quanto ao processo de ensino e aprendizagem construído. Freire,
meu caro, em Pedagogia da autonomia (2004), você fala da respon-
sabilidade de ser professor, do compromisso ético que precisamos
ter com a nossa atividade. Você sinaliza que não temos como fugir
do juízo de valor dos estudantes, dentre tantos possíveis, o pior é a
ausência dele na sala de aula. Isso me fez pensar em outro aspecto do
silêncio que permeia a nossa educação, o silêncio dos professores.
SUMÁRIO 241
ajudarem, se fortalecerem coletivamente, se fragilizam em detrimen-
tos de caprichos, orgulho e desejo de controle. Certamente, no livro
Educação como prática de liberdade (2022), você nos ilumina com
um ponto importante a ser considerado:
Não é o resultado exclusivo da transitividade de sua cons-
ciência, que o permite auto-objetivar-se e, a partir daí,
reconhecer órbitas existenciais diferentes, distinguir um
“eu” de um “não eu”. A sua transcendência está também,
para nós, na raiz da sua finitude. Do ser inacabado que
é e cuja plenitude se acha na ligação com o seu Criador.
Ligação que pela própria essência, jamais será de domi-
nação ou de domesticação, mas sempre de libertação
(Freire, 2022, p. 56).
SUMÁRIO 242
Entretanto, você afirma que a humanização é própria da natureza
humana, e a desumanização estará sempre em companhia da nega-
ção, produzindo processos de exclusão. Nas relações imbricadas, se
estabelecem as figuras do opressor e oprimido. Em sintonia consigo,
querido Mestre, Santos (2014) sinaliza que os discursos e jogos de
interesses são contraditórias, posto que levantam bandeiras em
favor da libertação do pensamento, mas a aprisionam na prática
para manutenção dos opressores e assim, os excluídos – oprimidos
- continuam onde estão. A escola é elemento chave nesse construto
social, que de diferentes maneiras vem contribuindo para o silen-
ciamento de si mesma, por meio de seus estudantes e professores,
como parte de um sistema que a todos envolve e oprime.
SUMÁRIO 243
desconsiderando os seres singulares que são, a culpa é dele que não
se esforçou nem se dedicou para tê-las. Se o professor tem dificul-
dades para lidar com tantas demandas que lhes chegam, a culpa
não é de quem elege e implementa tantas atribuições, mas sim do
professor que não é qualificado suficientemente. A culpa é sempre
daqueles que estão na condição de oprimidos.
SUMÁRIO 244
Espero que seu café não tenha esfriado enquanto lia esta
carta. Espero que não se desesperance, pois necessitamos da sua
energia esperançosa.
REFERÊNCIAS
ESTEBAN, M. T.; AFONSO, A. J. Olhares e interfaces: reflexões críticas sobre a avaliação.
São Paulo: Cortez, 2010.
FREIRE, P. Pedagogia como prática de liberdade. 52.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022.
SUMÁRIO 245
Jônatas Medeiros Júnior
SOBRE A DESESPERANÇA
GERADA PELA PRÁTICA
CONSERVADORA DISFARÇADA
DE CRISTIANISMO
Prezado Paulo Freire,
SUMÁRIO 247
é um discurso cristão é um discurso conservador de passividade. E
graças ao senhor, professor, posso afirmar corajosamente isso.
SUMÁRIO 248
que a explora tanto que sua hora de falar com Deus precisa ser mar-
cada com seu patrão, uma pergunta precisa e clara neste caso é
“Qual é o sofrimento neste contexto?” a resposta “a exploração do
trabalho está retirando a qualidade de vida do nosso irmão”, outra
pergunta é “Como Cristo se manifestará através de nossas ações
para conseguirmos melhor qualidade de vida?” a resposta “prati-
cando a justiça que assiste o estrangeiro, o órfão e a viúva”.
SUMÁRIO 249
chama de educação menor, uma educação que se faz dentro dos
limites impostos, mas que alteram os sentidos dos conceitos mais
utilizados para que o ataque não pareça uma disputa de conceitos.
É apontar a liberdade existencial que compreende a dificuldade que
é assumir uma posição aceitando todas as suas consequências. É
praticar a autoridade que guia o aluno para o exercício pleno de
sua razão. É ter a certeza que a minha aula será vista, mesmo que
afirmada como uma disciplina inútil, através da ótica do amor dos
alunos pelo conhecimento. É combater o autoritarismo com genuína
autoridade e ver que os alunos me respeitam não porque exijo isso,
mas porque eles percebem que o conhecimento gerado em aula
neles é muito mais importante que as distrações
SUMÁRIO 250
minha gratidão pelos seus ensinamentos e nutro a esperança de
poder resolver o problema de Bernardo Soares, gerar uma época em
que as pessoas têm esperança e fé sabendo o porquê.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2023
KELLER, T. Justiça generosa: a graça de Deus e a justiça social. São Paulo: Vida
Nova, 2017.
SUMÁRIO 251
Adilma Vilela
CARTA
A PAULO FREIRE
Querido Seu Paulinho,
SUMÁRIO 253
Você me fez transitar numa rota de alteridade, com esse
jeito único de ouvir profundo, fazendo com que a arte de se colo-
car no lugar do outro, fosse sempre motivação para todo e qualquer
fazer, seja em projetos de vida ou pedagógicos. Em todo o tempo,
quando imagino dias nublados, em que ficamos de luto pela perda
de entes queridos, eu incluo você. À sombra de muitas mangueiras,
deitei e chorei, acompanhada, certamente, de um coletivo de vozes,
igualmente comovidas, mas imbuídas da clara ideia de sua ausência
deixaria lacunas, vazios, mas jamais desesperança ou tristeza. Foi
também nesse momento que aprendi sobre medo e ousadia; e não
permiti que nenhum obstáculo colocado diante de mim, ou da minha
prática docente – criativa, amorosa e inquietante - fosse paralisada.
SUMÁRIO 254
Seu Paulinho, acredito que o mais importante é nunca per-
der a capacidade de aprender, tendo convicção da incompletude dos
seres humanos em contínua evolução. Ainda bem que um legado
nunca se esgota, e sua vasta obra original, colaborativa e/ou revisi-
tada, é uma reserva de força e coragem, em que se conjuga, desde
sempre, o verbo esperançar. Vou viver as coisas velhas, que também
são boas. Vou buscar as novas para retroalimentar o pensamento e
enriquecer a caminhada. E vou viver no mundo e com o mundo, no
tempo e com o tempo e espalhar por todo canto o amor social que
aprendi contigo. E como no sonho possível, não há liberdade em
solidão, me despeço aqui, tal qual você outrora o fez, à “maneira de
quem, saindo, fica”.
Amorosamente,
Adilma Vilela
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 79.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2020.
SUMÁRIO 255
Cristino Cesário Rocha
SUMÁRIO 257
A emergência e/ou ressurgência do movimento neoconser-
vador, com o objetivo de atacar a democracia brasileira, teve sua
expressão embrionária em 2013, como uma preparação para um
possível golpe contra decisão majoritária da população, ao eleger
Dilma Rousseff ao segundo mandato presidencial, em 2014. A massa
foi manipulada por lideranças religiosas, ruralistas, empresariais e
políticas exigindo a volta da ditadura militar, a destituição de Dilma
e outras ações que ferem o Estado Democrático de Direito. O movi-
mento de ir às ruas, Sr. Paulo Freire, em vários estados, neste período,
revelou, essencialmente um cunho conservador, o discurso do ódio e
retrocesso, reivindicando a volta da ditadura civil militar (1964-1985)
que violou direitos, torturou e matou lideranças estudantis, religiosas,
sindicais e políticas.
SUMÁRIO 258
Outro período tenebroso ocorreu em 2018, quando foi eleito
um candidato avesso aos trabalhadores/as, aos negros/as, mulheres,
indígenas, LGBTQIA+, STF, etc. A gestão presidencial (2019-2022) foi
um desastre que tensionou, usando suas palavras, “a relação oprimi-
do-opressor” com predominância de relações de opressão.
SUMÁRIO 259
O Brasil, em tempo de desgovernos Temer e Bolsonaro, a
vida da população negra e demais marcadores das diferenças foi
um sofrimento, quando se agravaram o racismo estrutural, individual
e institucional. A pandemia trouxe à baila toda a perversidade sistê-
mica – o racismo estrutural que se exprime no cotidiano (individuo) e
nas instituições, produziu e produz relações assimétricas de acesso
aos bens socialmente produzidos e aos bens imateriais.
O ato de existir, Sr. Paulo Freire (2008), tem uma força his-
tórica em sua concepção, que ajuda na apreensão do pensar-lu-
tar-transformar a vida negra contemporânea: “existir é um conceito
SUMÁRIO 260
dinâmico. Implica numa dialogação eterna do homem com o homem.
Do homem com o mundo. Do homem com o seu criador. É essa dia-
logação do homem sobre o mundo e com o mundo mesmo, sobre os
desafios e problemas, que o faz histórico”.
Sendo o/a negro/a um ser histórico, Sr. Paulo Freire, sua luta
é por direitos amplos, historicamente roubados. Essa luta tem múlti-
plos significados e não pode ser limitada, porque significa, simultane-
amente, luta anticapitalista, antirracista e antissexista, dentre outras.
Não dá para viver e viver bem coabitando com o racismo, o sexismo
e o capitalismo destrutivos. Neste contexto, na esteira de sua contri-
buição (2008), o tipo de educação libertadora deve ser aquela que
prepara para a decisão, a igualdade, para a responsabilidade social,
para o desenvolvimento humano e para a democracia.
SUMÁRIO 261
não havendo acaso na produção do racismo e outras violações de
direitos. Esse entendimento, Sr. Paulo Freire, dialoga com a objetivi-
dade dos fatos no que diz respeito à população negra. Sílvio Almeida
(2019) tem algo a dizer: “homens brancos não perdem vagas de
emprego pelo fato de serem brancos, pessoas brancas não são “sus-
peitas” de atos criminosos por sua condição racial, tampouco têm
sua inteligência ou sua capacidade profissional questionada devido
à cor de sua pele”.
SUMÁRIO 262
Como educador e educadora popular, destacamos que o senhor é
um pensador imprescindível tanto para a educação, como para a
revolução, pois envolve-nos pelo caminho do inédito viável, em dire-
ção à resolução das situações cotidianas.
SUMÁRIO 263
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, S. Racismo estrutural. São Paulo: Pólen, 2019.
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. 31.ed. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 2008.
FREIRE, P. À sombra desta mangueira. 11.ed. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 2013.
SUMÁRIO 264
Camila Trindade Coelho
DESCOLONIZANDO A VIDA:
UMA CARTA PARA PAULO FREIRE
Prezado Sr. Freire,
SUMÁRIO 266
Faz parte do processo de empoderamento, quando pensa-
mos nas mulheres, sobretudo, em mulheres negras, é preciso retor-
nar para questões históricas para entender esse sentimento de infe-
riorização, sendo marcado pelo colonialismo. O direito das mulheres
chegou de maneira tardia, originando gerações inferiorizadas, sus-
cetíveis a riscos e situações de vulnerabilidade, refletindo um padrão
de dominação masculina, enfrentamentos para a autonomia pessoal
e tencionando as desigualdades (Durand et al, 2021).
SUMÁRIO 267
educação popular, oferece uma perspectiva única para o empodera-
mento de todas nós, com base em seus princípios de diálogo, cons-
cientização e ação transformadora.
SUMÁRIO 268
envolvendo a ação - reflexão - ação. Querido Paulo Freire, você
capacita as pessoas a atravessar os obstáculos e a buscarem o
enfrentamento das situações vividas e estimulando-as a uma nova
compreensão da realidade, seus princípios encontram-se com as
concepções que amparam a Promoção da Saúde. Urge, a atenção em
saúde ser modificada transcendendo o cuidado do corpo, resultando
na emancipação e autonomia das mulheres em torno de sua vida.
Florianópolis, 03/09/2023.
SUMÁRIO 269
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra:
Uma Política do SUS. 3. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2017. Disponível em: https://bvsms.
saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_populacao_neg ra_3d.pdf.
Acesso em: 14 jun. 2023.
HOOKS, B. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. São Paulo:
Elefante, 2019.
SANTOS, M.P.A et al. População negra e Covid-19: reflexões sobre racismo e saúde. In:
Estudos Avançados, São Paulo, v. 34, n. 99, p. 225-243, maio/ago. 2020.
SUMÁRIO 270
CARTAS PARA
BELL HOOKS
Kátia Luzia Soares Oliveira15
E HOJE EM DIA,
COMO DIZER EU TE AMO
NO AMBIENTE ESCOLAR?
15 Este texto é assinado por mim, mas é fruto de esforços coletivos, de trocas com colegas de traba-
lho que ao longo da caminhada vêm se constituindo em amigos/as. Assim, gostaria de destacar as
colaborações de Igor Alexandre de Carvalho Santos, Gracy Kelly Andrade Pignata Oliveira e Sandra
Samara Pires Farias.
Prezada bell hooks,
SUMÁRIO 273
devires-revolucionários, como ação transformadora que vai qualifi-
car as nossas relações na Educação Inclusiva.
SUMÁRIO 274
de qualidade em que o paradigma da inclusão esteja entrelaçado
à sua identidade institucional. Com base no seu arcabouço teórico
sobre a Educação como prática de liberdade, de transgressão à rea-
lidades opressoras, o que se pretendeu nas discussões em torno da
temática foi potencializar a necessidade de construção de um com-
promisso ético e político com um devir pedagógico equânime no
contexto da Educação Inclusiva. Isto é, trata-se de um chamamento
para a elaboração coletiva de práticas educativas que efetivamente
materializem o que já está consolidado nos documentos legais, o
direito de todos/todas e de cada um/uma à educação de qualidade
no que tange ao acesso, permanência e conclusão.
SUMÁRIO 275
atendimento pedagógico da Educação Inclusiva que desejamos.
Partindo desses valores o Seminário apresentou e ressaltou diversas
e diferentes maneiras de dizer eu te amo no espaço escolar. Deixe-
nos contar-lhe algumas:
SUMÁRIO 276
nos convoca enquanto docentes a buscarmos metodologias,
estratégias e recursos que permitam alcançar os objetivos de
aprendizagem definidos.
SUMÁRIO 277
importante para que as pessoas com deficiência seja aco-
lhida não apenas pelos docentes, mas também pelos demais
discentes da turma, que pode então se constituir em “uma
comunidade aberta de aprendizagem” (Hooks, 2013, p. 18).
SUMÁRIO 278
a coragem para “nos aproximarmos dos alunos com a vontade e o
desejo de responder ao ser único de cada um” (Hooks, 2013, p. 25).
A nossa esperança, assim como sempre foi para você, é que mais
educadores e educadoras juntem-se à nós nesse esforço coletivo
por uma educação como prática de liberdade.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 1996.
HOOKS, B. Tudo sobre amor: novas perspectivas. São Paulo: Elefantes, 2020.
SUMÁRIO 279
Bruna Moraes Battistelli
A DOCÊNCIA
COMO FERRAMENTA
DE CUIDADO
Querida bell,
SUMÁRIO 281
O amor é um ato revolucionário16
16 É possível ouvir a música O amor é um ato revolucionário, de Chico César. Disponível em: https://
www.youtube.com/watch?v=vjbOt3cbjrQ&list=PLIjteCcXYLQahvnhFajrtAylzIWBivpLD. Acesso em:
29 set. 2023.
SUMÁRIO 282
uma existência preocupada com as ampliações de possibilidades de
vida de todes. Tu vais nos trazendo o amor como ética da liberdade e
como possibilidade para o trabalho do movimento feminista. E desta
forma, acompanhada por ti e teus livros, venho sonhando e buscando
uma docência que seja cuidadosa com as mais variadas formas de
existir; sempre em ato, assim como tu narra o amor (Hooks, 2020a);
quero que minhas/meus alunas/os se sintam seguras/os em minha
sala de aula. Desejo que minhas/meus alunas/os me reconheçam
como alguém preocupada com seu crescimento pessoal e implicada
com a transformação do mundo ao nosso redor.
SUMÁRIO 283
Gosto dessa atividade, pois permite que muitas pessoas
narrem histórias particulares de dores, de sofrimentos vividos,
assim como aquelas histórias de conquistas e alegrias que elas/es
se sentem culpadas/os de contar. Essa atividade, por mais simples
que possa parecer, nos conecta e cria um senso de cumplicidade e
cuidado; sinto que muitas/os alunas/os se implicam de uma forma
bastante diferente depois dessa atividade, pois estabelecemos um
laço de confiança, já que comento todas as histórias ofertadas. Como
produzir uma docência interessada pelas múltiplas histórias que nos
compõem enquanto pessoas?
SUMÁRIO 284
A sala de aula é lugar de reafirmação de existências múl-
tiplas, pois caso não seja, cairemos na formatação em massa que
a educação bancária supremacista branca reproduz como modelo
ideal de formação. Se quero que minhas/meus alunas/os pensem
criticamente, que aprendam a acolher suas/seus futuras/os alunas/
os, preciso dar o exemplo, e oferecer estratégias pedagógicas que
permitam que eles vivam a experiência do acolhimento em nossas
aulas. Aprendi contigo que é assim que ensinamos e construímos
uma comunidade de aprendizagem (hooks, 2020b), pois se quero
que minhas/meus alunas/os aprendam o valor das histórias como
estratégia de aprendizagem e aprendam a importância de criarmos
espaços de escuta ativa, preciso colocar essas ações em ato em meu
processo pedagógico.
SUMÁRIO 285
humano se dá, sem analisarmos os impactos que os sistemas de
opressão causam nas vidas que são múltiplas em suas posicionali-
dades. Quem cuida da vida e do direito à aprendizagem de crianças
pobres no Brasil? Como acolhemos os cuidados que necessitam as
crianças queers em suas infâncias e adolescências? Como discuti-
mos o envelhecer em um país como o nosso que mata com tanta
facilidade a população negra? Como alimentamos com outras/os
referenciais as docências de nossas/os alunas/os? Quero honrar
intelectuais que como tu ousaram em seguir produzindo uma polí-
tica de produção de conhecimento sobre educação e docência para
além da norma hegemônica.
SUMÁRIO 286
REFERÊNCIAS:
ADICHIE, C. N. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
BATTISTELLI, B. M.; RODRIGUES, L. Contar histórias desde aqui: Por uma sala de aula
feminista e amefricana. In: Quaestio: Revista de Estudos em Educação, v. 23, n. 1, p.
153-173, 2021.
HOOKS, B. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. São Paulo: Editora
Elefante, 2019.
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. São Paulo: Editora Elefante, 2020a.
LORDE, A. Irmã outsider: ensaios e conferências. São Paulo: Autêntica Editora, 2019.
SUMÁRIO 287
Bárbara Magnani Rodrigues
APRENDENDO
A TRANSGREDIR
Querida, bell hooks!
SUMÁRIO 289
não é aceitável. Muitas vezes a Psicologia entende que um texto
simples é sinônimo de um texto raso e segue escrevendo parágra-
fos e mais parágrafos, quando poderiam resumir sua longa ideia em
uma singela frase. E mesmo criticando essa academia diariamente,
eu ainda continuo me contaminando com ela e caindo em suas
armadilhas. Eu estava insegura de escrever em primeira pessoa, por
exemplo. Queria conversar com as leitoras do meu trabalho assim
como estou fazendo contigo agora, mas não sentia que estava certa
fazendo isso nem mesmo que alguém pudesse me entender. Parecia
que havia algo errado…
SUMÁRIO 290
que tive enquanto aluna de graduação, me assusta saber que poucas
foram as que possibilitaram uma conexão sincera com as professo-
ras. Assim como você narra em seu livro Ensinando a transgredir: a
educação como prática da liberdade,
A grande maioria dos nossos professores não dispunham
de habilidades básicas de comunicação. Não eram auto-
atualizados e frequentemente usavam a sala de aula para
executar rituais de controle cuja essência era a dominação
e o exercício injusto de poder. Nesse ambiente, aprendi
muito sobre o tipo de professora que eu não queria ser
(Hooks, 2017, p. 35).
SUMÁRIO 291
estabilidade? Ou só queriam seguir pesquisando? Não sei. Confesso
que muitas vezes também tenho medo de perguntar. Será que todos
os alunos de mestrado e doutorado que pensam em se tornar pro-
fessores já se questionaram sobre o exercício da docência? Sobre
o que é ser professor? O que eles querem ou não querem reprodu-
zir em sala de aula?
SUMÁRIO 292
Não demorou muito para relatos como esse de outras turmas apare-
cerem também. Ao mesmo tempo que isso tudo acontecia, em outra
sala de aula os alunos, já no final do semestre, estavam fazendo uma
prova. Novamente, as pessoas souberam o que aconteceu, o pro-
fessor soube o que aconteceu, mas o silêncio e a prova seguiram
ocorrendo como se nada tivesse acontecido.
SUMÁRIO 293
Essa carta não é um ataque aos professores ou às univer-
sidades. É um pedido de socorro junto ao desabafo de uma aluna
esgotada. É triste e revoltante ver essa realidade no ensino superior,
uma combinação de violências e formas de dominação que tam-
bém se fazem presentes em outros contextos. Ainda assim, segue
sendo um problema nosso. Afinal, somos nós alunos que precisa-
mos lidar com isso diariamente sem suporte algum. Precisamos nos
fortalecer e encontrar locais seguros de compartilhamento e acolhi-
mento, para seguirmos nos apoiando e enfrentando essa academia
colonizadora. Também segue sendo problema de vocês: professo-
res e trabalhadores.
SUMÁRIO 294
Seguiremos juntas em meio a tantas outras que insistem em defen-
der e lutar por uma educação verdadeira e politicamente engajada
com a nossa transformação social e com o fim dos sistemas de
dominação. Obrigada pela oportunidade de partilhar contigo um
pouco deste intenso percurso da graduação.
Bárbara Rodrigues,
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Ensinando a transgredir: a educação como prática de liberdade. 2.ed. São
Paulo: WMF Martins Fontes, 2017.
LORDE, A. Sou sua irmã: escritos reunidos. São Paulo: Ubu Editora, 2020.
SUMÁRIO 295
Márcia Rasia Figueirêdo
CARTA PARA
BELL HOOKS
“A prática do amor como potência
para a construção de uma nova
sociedade” (Bell Hooks).
SUMÁRIO 297
com vistas num novo horizonte. Pode ser sim, uma questão de ética
pela vida, muito bem entendido nas suas palavras.
SUMÁRIO 298
A vida espiritual é também citada no livro como algo impor-
tante na sociedade. Uma sociedade que partindo do vazio espiritual,
do isolamento e da solidão, incentiva o consumismo desenfreado
como algo para dar alegria, e, no entanto, a questão do ter é mais
importante que o ser. E os que não podem, fracassam. E os que não
têm, são considerados fracassados. Sendo assim, a escola trans-
borda alunos com ansiedade, com autoestima baixa e com pouca,
ou quase nada de inteligência emocional.
SUMÁRIO 299
transmissor de informações, mas de participar do crescimento
intelectual e espiritual dos alunos (Hooks, 2013). Transgredir para
desmistificar conceitos e visões e, sobretudo, agir sobre o mundo a
fim de modificá-lo.
SUMÁRIO 300
Termino esta carta com um abraço oceânico no seu cora-
ção. Pois todo abraço, ou quase todos, têm o dom de acalen-
tar com amor e poesia.
REFERÊNCIAS
ALVES, R. A alegria de ensinar. Campinas: Papirus, 2000.
SUMÁRIO 301
Guilherme Vasco Marques
ENSINANDO
A EVOLUIR
Querida Bell Hooks,
SUMÁRIO 303
Bell, há pouco tempo me deparei com o conceito de “pala-
vra mundo”, do educador e filósofo brasileiro, Paulo Freyre, e como
o processo de leitura do mundo precede a leitura da palavra, um
passo importante para a nossa alfabetização. Com tal entendimento,
busquei me situar nessa evolução como ser e questionar tudo o que
precede meu desenvolvimento intelectual. Acredito que a vida tem
infinitos mistérios, são tantas dúvidas, experiências, lugares. Talvez
esse seja o ponto, não saber de nada, caber a nós desvendar tudo
isso. É aí que entra a leitura, como uma ponte, a passagem direta
para milhares de experiências. Imagino que você sabe muito bem
sobre isso, em suas próprias palavras (Hooks, 2013, p. 37):
No período entre o término de um projeto e o começo de
outro, sempre enfrento uma crise de sentido. Começo a
questionar sobre o sentido da minha vida e sobre o que
vim fazer aqui na Terra. É como se eu, mergulhada num
projeto, perdesse a noção do eu.
SUMÁRIO 304
grandes capítulos. São essas palavras do mundo que me compõem
e gostaria de, um dia, descobrir suas palavras mundo. Deixarei aqui
uma que amo, “hipopotomonstrosesquipedaliofobia”, ela é designada
a fobia de palavras longas ou de uso incomum, irônico, não é? Mas
essa é a vida, Bell, uma completa ironia.
Carinhosamente, Guilherme.
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. Tradução
de M. Cipolla. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2013.
SUMÁRIO 305
Giovanna de Jesus Camargo
A VIDA ENTRE
O APRENDER
E O ENSINAR
Cara Bell Hooks,
SUMÁRIO 307
Até pouco tempo, vivíamos em constante tensão entre
esquerda e direita e a cada dia que se passava era perceptível como
o conservadorismo era colocado como algo que devesse ser seguido
por todos, sem ser questionado, dando a quem não concordasse com
tais pensamentos a sensação de impotência e medo. Ao falarmos de
conquistas, devemos falar também de todo o processo de lutas por
trás delas, algo que ao longo dos séculos foi se tornando cada vez
mais recorrente. Torna-se cada vez mais arriscado a busca por nos-
sos direitos e nossa voz na sociedade, que se mantém firme contra
a pressão do legado colonialista, ainda presente nos dias atuais, nos
fazendo resistir a pensamentos e padrões repetitivos de descrimina-
lização e ódio recorrente. O que evidencia ainda mais a hierarquia
social que impõe posições aos indivíduos desde raça, gênero e etnia
como é citado em “Em defesa da cultura africana” (Fanon, 1980).
SUMÁRIO 308
Sobre vivências e leitura de mundo, arrisco-me a dizer que,
como qualquer criança, sempre fui um tanto curiosa. A partir dessa
curiosidade, vivia me perguntando se ter tanta imaginação me faria
ser uma adulta menos focada, mas acho que, por ser tão curiosa,
pude buscar conforto e respostas no campo literário, já que o mesmo
também é feito para pessoas curiosas e com pensamentos inquietos
se eu definisse minha leitura de mundo em uma palavra, eu lhe diria
mágico. Você deve se perguntar se tal palavra representa a carac-
terística de algum momento e eu diria que sim, afinal de contas
“mágico” vem do livro de título O mágico de Oz ⁴ , sendo o primeiro
livro infantil que li por conta própria e que me fez ser tão interessada
pela leitura desde minha infância.
REFERÊNCIAS
FANON, F. Em defesa da cultura africana. Tradução de Isabel Pascoal. Portugal: Sá da
Costa Editora, 1980.
FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo:
Autores Associados, Cortez, 1989.
SUMÁRIO 309
Danuza Kovaleski Machado
POR UMA
COMUNIDADE
AMOROSA
Querida bell,
SUMÁRIO 311
Com isso, o livro Tudo sobre o amor: novas perspectivas tem
estado presente sempre, tanto junto ao grupo de mulheres, com-
pondo com outros materiais como também junto ao coletivo bell
hooks, coordenado pela professora Luciana Rodrigues, vinculado ao
Programa de Pós-graduação de Psicologia Social e Institucional da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul que tem por objetivo:
a pesquisa, estudo, extensão e formação em políticas do cuidado
com o aporte de epistemologias feministas e anticoloniais. Embora
esta obra esteja muito presente, acredito que seja pelo livro Erguer
a voz: pensar como feminista, pensar como negra que venho me
erguendo e junto a realização do meu trabalho também buscado
alcançar outras mulheres.
SUMÁRIO 312
Desde o início do ano passado, participando deste coletivo,
me encontrei com pessoas que partilhavam angústias que, mesmo
sendo diferentes das minhas, encontravam-se em pontos comuns
pelo desejo do rompimento com o sistema opressor, ecoando no
grupo, através de cada um e uma, formando um espaço seguro para
além dos campos da pesquisa, um lugar de troca e de acolhida afe-
tiva, que dava corpo e nome aos incômodos vivenciados por todes.
Nesta caminhada também venho me construindo feminista, a partir
da observação e da escuta de outras mulheres e de me encontrar
nelas, mesmo quando nossas correntes forem diferentes, como
diz Audre Lorde (2019).
SUMÁRIO 313
a saúde física e mental de quem o realiza. Gostaria tanto que visse
o quanto foi lindo, empolgante, inspirador, pelo atravessamento pro-
porcionado através das falas manifestadas.
bell, teu legado escrito pelas tuas vivências nos fornece pis-
tas para esperançar na identificação e construção de bases para o
afeto e o afetar-se, ensinando modos de comunidade, tua presença
bibliográfica tem contribuído muito para a autorrecuperação, erguer
a voz e pensar a forma que nos relacionamos por novas perspectivas
do amor de forma política.
SUMÁRIO 314
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Ensinando Comunidade: uma pedagogia da esperança. Tradução de Kenia
Cardoso. São Paulo: Elefante, 2021.
HOOKS, B. Erguer a Voz: pensar como feminista, pensar como negra. Tradução de Cátia
Bocaiuva Maringolo. São Paulo: Elefante, 2019.
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. Tradução de Stephanie Borges. São
Paulo: Elefante, 2020.
LORDE, A. Irmã Outsider. Tradução de Stephanie Borges. Belo Horizonte: Autêntica, 2019.
ROCHA, J. Pacientes que curam: o cotidiano de uma médica do SUS. 5.ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2021.
SUMÁRIO 315
Jenilza Rodrigues dos Santos
SENTIDOS DAS
EXPERIÊNCIAS
VIVENCIADAS
POR BELL HOOKS
Querida bell hooks!
SUMÁRIO 317
E aí, surgiu o questionamento? Aonde podemos encontrar
estes professores? Mas, entendi também que nem todos os profes-
sores com qual encontrou em seu caminho, foram comprometidos
com uma “boa educação”.
SUMÁRIO 318
vando sua emancipação, o desenvolvimento do pensamento crítico,
o atendimento aos seus direitos, o exercício da sua cidadania e a
capacidade de compreenderem o seu papel na luta por melhores
condições sociais. (Freire, 2016; 2005)
SUMÁRIO 319
pedagógica bem distante do que seria considerado essencial, para o
desenvolvimento do pensamento crítico, o que contraria os interes-
ses das classes dominantes (Hooks, 2017; 2021).
SUMÁRIO 320
vimento das habilidades que favoreçam aos alunos o pensamento
crítico é que poderemos vislumbrar uma educação libertadora que
conduza nossos alunos ao pensamento crítico e à reflexão acerca
assuntos diversos que precisamos discutir em sala de aula (Freire,
1986). Neste momento, estaremos oportunizando aos nossos alunos
a capacidade de desenvolver perspectivas e expectativas, na busca
por um mundo mais igualitário e democrático (Hooks, 2017; 2021).
Atenciosamente,
Jenilza
SUMÁRIO 321
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. Tradução:
Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Editora Martins Fontes. 2017.
HOOKS, B. Ensinando pensamento crítico: sabedoria prática. São Paulo: Elefante, 2020.
FREIRE, P.; SHOR, I. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. 10.ed. Rio de Janeiro:
Editora Paz e Terra, 1986.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 42.ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2005.
SUMÁRIO 322
Mariana Almada Viana
É SOBRE O AMOR
QUE HABITA EM VOCÊ
E CHEGA ATÉ MIM
Minha querida e ousada bell,
SUMÁRIO 324
nome das disciplinas, dos bimestres... todos com suas respectivas
letras maiúsculas, mas em cada sala de professores, sala de aula que
entro, levo a força social das letras minúsculas.
SUMÁRIO 325
Como você bem nos lembra em sua obra que acabei de citar,
faz-se necessário conhecermos as várias vertentes do amor, vou até
me permitir abrir o índice para citá-las aqui, a saber: a clareza, a justiça,
a honestidade, o compromisso, a espiritualidade, os valores, a ganân-
cia, a comunidade, a reciprocidade, o romance, as perdas, a cura, bem
como o próprio destino, elementos primordiais para que não apenas
entendamos, mas vivamos a práxis. Eu estava pensando exatamente
em cada um desses elementos e quais obras de artes, literárias, pen-
samentos estariam associados a eles. Quando nos debruçamos sobre
uma leitura como essas, criamos asas e por isso fui para o mundo das
artes. Sua obra nos faz mergulhar no amor. Ah o amor!
SUMÁRIO 326
Fui longe hein, bell!!! Mas citemos ainda o compromisso, a
espiritualidade e os valores, outros elementos que, para dar mais
sabor ao amor, talvez nos obriga à nossa individualidade. Falo sobre
o amor que habita em ti e chega até mim, namastê! Vivemos num
momento em que segurar as mãos umas das outras é essencial, nós
mulheres negras que sabemos dos nossos sofrimentos, tantas vezes
esmagados nas entrelinhas da nossa trajetória, olhemo-nos pois.
Por isso bell, tão inspirada, você nos trouxe a valorização do com-
promisso pessoal e por consequência, coletivo. O quanto o cuidado
intrapessoal que buscamos em nossas entranhas se faz presente em
nossa ancestralidade, e a força da espiritualidade no ânima, numa
reflexão contínua de quem sou, onde estou e para onde vou como em
Paul Gauguin, e com todas as que vieram antes de mim, com honra
e respeito. E não poderia deixar de cantar “Pra todas as mulheres”:
“Abafaram nossa voz, mas se esqueceram de que não estamos sós…
essa dor é secular e em algum momento a de curar, diga sim para o
fim de uma era irracional, patriarcal!”.
SUMÁRIO 327
as relações interpessoais que buscam uma “comunhão amorosa”,
cada um/cada uma em suas funções, e quem diz isso? Você! Rs A
riqueza dessa dimensão é entender quem é comunidade, que de
antemão não se restringe ao campo familiar, vai além.
REFERÊNCIAS
FOUCAULT, M. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. Petrópolis: Editora Vozes, 1987.
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. São Paulo: Elefante, 2020. HOOKS, bell.
SUMÁRIO 328
Thamires Gambôa dos Santos
CARTA A UMA
ANTIGA ANCESTRAL
Prezada bell hooks…
SUMÁRIO 330
Como nos provocou a escritora nigeriana Chimamanda
Ngozi Adichie (2019, p. 23) “O poder é a habilidade não apenas de
contar a história de outra pessoa, mas de fazer que ela seja sua his-
tória definitiva”. Essa imagem colonial violenta conduz os indivíduos
na construção de sua subjetividade e de um pensamento único
sobre si e sobre o amor. Como defende a artista e psicanalista por-
tuguesa Grada Kilomba (2019), “a linguagem também é transporte
de violência, por isso precisamos criar novos formatos e narrativas.
Essa desobediência poética é descolonizar.” Considerando que as
narrativas poético-epistemológicas também disputam lugares de
poder, estamos em constante luta na construção de estratégias para
a sobrevivência epistemológica-poética e o protagonismo na elabo-
ração de conhecimento através dos nossos corpos e subjetividades
atravessadas-interseccionadas por diversos marcadores políticos e
sociais. E nesse sentido, bell hooks (2020, p. 39) “Uma mulher que fala
de amor é suspeita. Talvez isso ocorra porque tudo que uma mulher
esclarecida teria a dizer sobre o amor representaria uma ameaça e
um desafio às visões que nos foram oferecidas pelos homens.”
SUMÁRIO 331
para nós mesmas e para as nossas comunidades. Para que o amor
não seja simplesmente uma quimera da qual muitos têm medo de
sentir ou explicar. Com o propósito de falarmos de amor a partir dos
nossos corpos e de nossas escrevivências.
SUMÁRIO 332
Escrevo cartas desde pequena, incentivada pela minha mãe,
fui uma criança muito afetuosa com as pessoas e com as palavras,
na adolescência utilizei a escrita como uma forma de me entender,
desabafar e também de falar sobre paixões e amores, mais adulta a
escrita é um lugar de afeto onde posso desenvolver minha sensibi-
lidade, meu amor por mim mesma, minha imaginação e criatividade
na elaboração de narrativas-mundos da minha lesbiandade, como
Tatiana Nascimento diz (2014, p. 14) “uma escrita-corpo, nomeia,
celebra e define a lesbiandade negra que Lorde elabora como ‘a
própria casa da diferença’”. As mulheres negras artistas e intelectuais
inauguram reflexões traçando pensamentos que são pautados pela
relação com a linguagem e com a autodefinição. Elas tensionam a
insuficiência de categorias hegemônicas heteropatriarcais brancas
produzindo análises e conceitos que apenas a lente de seus próprios
corpos poderiam e podem criar. Foram e são essas mulheres, e muitas
outras mulheres negras, que me inspiraram a escrever esse poema:
BELL HOOKS
Em letras maiúsculas, porque eu quero gritar TUDO SOBRE
O AMOR
Igual quando o Rico Dalasam canta na poesia “O que eu sei
sobre o amor eu inventei”
E eu tô inventando jeitos para me amar. Novas perspectivas
de afeto. Novas políticas do sentir.
Antes de permitir outro corpo me tocar e parece que a estrada
é muito mais sobre paciência e a bell hooks disse “querer amar ainda
não é amar.”
Eu quero muito que tu me ame, Thamires.
E Upile Chisala disse “Às vezes parece que queremos o amor
mais do que o amor nos quer”
E eu… eu já quis tanto o amor a ponto de não me amar.
SUMÁRIO 333
Eu já quis tanto o amor a ponto de me anular.
Eu já quis tanto o amor a ponto de me machucar.
Eu já quis tanto o amor a ponto de tentar controlar.
E bell hooks disse: “O amor não prevalecerá em qualquer situ-
ação em que uma das partes queira manter o controle e/ou poder.”
Eu já quis tanto o amor a ponto de...
Doar o que quer que seja. E nada dentro de mim sobrar. E
tudo se quebrar.
A ponto de não acreditar no amar. A ponto de não querer
mais amar.
A ponto de não saber mais COMO me amar.
A ponto de suplicar. Uma receita. Um antídoto.
Alguém que me fizesse acreditar e como disse Maya Angelou
“O amor é como a fé.”
Eu ainda não sei TUDO sobre o amor, mas eu já sei muita
coisa que o amor NÃO é.
Através do olhar generoso e crítico de bell hooks eu ainda tô
INVENTANDO jeitos, formas e pensamentos.
E Audre Lorde disse: “Me custou muito tempo o amor que
juntei” e eu tatuei na minha pele para lembrar que doeu. Para lembrar
que levou TEMPO pra cicatrizar tudo aquilo que me fez não amar.
E bell hooks disse “AUTO AMOR LEVA TEMPO” e todos os
dias eu repito TEMPO É AGORA.
Thamires Gambôa
SUMÁRIO 334
REFERÊNCIAS
ADICHIE, C. N. O perigo de uma história única. Tradução: Julia Romeu. São Paulo:
Companhia das Letras, 2019.
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. Tradução: Stephanie Borges. São
Paulo: Editora Elefante, 2020.
LORDE, A. Irmã Outsider. Tradução: Stephanie Borges. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.
LORDE, A. Entre nós mesmas: poemas reunidos. Tradução: Tatiana Nascimento, Valéria
Lima. Rio de Janeiro: Editora Bazar do Tempo, 2020.
SUMÁRIO 335
Maria Eduarda dos Santos
Mas, antes de tudo, acho que seria injusto da minha parte não
me apresentar para você, pois eu te conheço, mas você não conhece
nada sobre mim. Sendo assim, meu nome é Maria Eduarda, gosto que
me chamem de Duda, tenho 20 anos, sou uma mulher branca de cabe-
los pretos, latino-americana, bissexual, faço graduação em Filosofia na
Universidade Federal do Paraná e, também, sou professora num pro-
jeto voluntário de pré-vestibular. Sei que escrevi pouco sobre mim, mas
acho que você já consegue ter uma ideia de como sou e o que faço.
Por mais que esta carta seja sobre docência, tenho que te
confessar que, durante minha graduação, a docência não era minha
maior animação ou preferência, estava mais focada na filosofia e
na pesquisa acadêmica, porém, durante este percurso, eu tive dis-
ciplinas de licenciatura, e acho que tive sorte, pois tive dois ótimos
professores, que me ensinaram sobre docência, mas, também, me
apresentaram você, bell, e por isto vou ser eternamente grata a eles.
Um deles é o professor Marcos Oliveira e a outra, minha querida
professora Bruna Battistelli. Acho que você adoraria conhecê-los, me
apresentaram você de uma forma tão afetuosa, que só um educador
e uma educadora apaixonados pelo que fazem poderiam fazer.
SUMÁRIO 337
uma prática libertadora, que está com os pés no chão, observando
a realidade, além de várias outras coisas que a docência significa
para mim. Este livro, você o conhece muito bem, conta a história de
uma mulher forte, guerreira, doce, gentil, cuidadosa e que lutou para
estudar e se tornar professora num ambiente que não queria ela ali,
numa instituição supremacista branca.
Sei que fiz uma citação grande do livro, mas achei neces-
sária. Olha que coisa mais linda, chocante e que nos toca o que
você escreve. É muito forte, mas é uma força tão necessária que
SUMÁRIO 338
nos acolhe e nos encoraja para sermos que nem você foi. Sua his-
tória de vida, seu livro, me deu muita inspiração para pensar e fazer
uma educação diferente, melhor. Muitas coisas que você conta em
seu livro, acabei me identificando, por ser uma mulher, por ser uma
mulher numa família de renda baixa, mas, principalmente, por querer
ser uma professora. Me vejo agora querendo ter esse zelo e cui-
dado com meus alunos.
Com tudo isso que compartilhei com você, bell, não posso
deixar de me lembrar e te contar como foi minha experiência
entrando pela primeira vez numa sala de aula, como uma profes-
sora... lembro-me de estar muito nervosa naquele dia, seria um dia
diferente, um dia que eu não esperava acontecer tão cedo, ainda
mais durante a graduação. Esse era meu tão sonhado dia sendo uma
professora, me preparei bastante, não queria fazer feio em minha pri-
meira aula, não queria demonstrar muito nervosismo ou até mesmo
muito entusiasmo. Me recordo de tentar decorar tudo que ia falar, até
mesmo as pausas, acho que isso demonstra que estava bem ansiosa.
SUMÁRIO 339
veria não apenas como alunos, mas como humanos que tem seus
sofrimentos e prazeres na vida, e claro, esperando que eles me vis-
sem dessa mesma forma. Lembro que quando perguntei para cada
um qual curso e profissão eles queriam para a vida deles, uma das
alunas comentou que queria fazer pedagogia, fiquei feliz com aquilo,
pois além de saber que ela também queria ser professora, eu tam-
bém poderia voltar a falar de você, bell. Mas, não lembro apenas do
curso dessa aluna, mas também, me lembro de cada curso que cada
um dos meus alunos sonha para si.
SUMÁRIO 340
como uma mente que só está ali para passar conhecimento, mas,
como uma pessoa inteira que também aprende com seus alunos.
E, isso não é um mérito só meu, mas sim, de você, bell, que esteve
ali antes de mim e que soube transmitir através de sua escrita, suas
vivências e seu cuidado em estar numa sala de aula. E, isso é inspi-
rador, acho que depois de tudo que te escrevi, se eu pudesse resumir
em uma palavra o quão sou grata por tudo que aprendi com você,
seria: “obrigada”. Obrigada por ser você e por ver à educação como
algo que pode e deve ser nutrido, transgredido e principalmente, que
deve ser vista como uma prática de liberdade.
01/09/2023
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. Tradução
de Marcelo Brandão Cipolla. 2.ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2017.
SUMÁRIO 341
Maria Ester Alves de Souza
CARTA PARA
BELL HOOKS:
HISTÓRIA DE UMA VIDA
Querida Bell Hooks,
SUMÁRIO 343
placa e rapidamente li a palavra, isto me marcou tanto que a minha
palavramundo é ‘Placa’.
SUMÁRIO 344
Esta é uma fase da minha vida em que eu estou me redescobrindo,
tendo que ficar longe de pessoas que amo, mas com o coração
feliz, por estar vivendo tudo isso. Pode acreditar, Bell, que foi aqui
que eu me encontrei. Enfim, obrigada por ter sido essa pessoa tão
importante no nosso mundo, que me fez enxergar as coisas de uma
forma que não enxergava antes, saiba que você faz sim parte da
pessoa que sou hoje.
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. Tradução
de Marcelo Brandão Cipolla. 2.ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2017.
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. Tradução: Stephanie Borges. São
Paulo: Editora Elefante, 2020.
SUMÁRIO 345
Luana Moreira Vieira
SOBRE DIZER,
ACOLHER
E COMBATER
Querida bell,
Espero que essa carta lhe encontre bem! Tenho lido alguns de
seus livros desde que comecei a graduação em Pedagogia. A leitura
de seus pensamentos tem me encantado e fortalecido em diversos
aspectos, tanto que releio sempre que sinto que preciso. Só lamento
não ter te conhecido antes, mas penso que o importante é que, de
algum modo, você veio até mim. Minha leitura do momento tem sido
o livro Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade
(2017). Esse livro trouxe à tona uma vontade a mais em conhecer
minhas futuras alunas(os), em como eu poderei reproduzir, como
você, algum tipo de comunidade efetiva que vincule a todas(os), em
proporcionar experiencias simbólicas, vivas e, verdadeiramente, sig-
nificativas e críticas, durante o processo de aprendizagem que virá.
Penso frequentemente em como será, e sei que os questionamen-
tos que tenho em mim ainda não possuem respostas.
Mas, bell, retomando sobre a sua escrita, sei que você já deve
ter ouvido isso de alguém em algum momento, mas não posso dei-
xar de falar, que me identifiquei contigo imediatamente de tantas
formas que me inundei de você, de um jeito bom, brilhante, radiante,
feminino, amoroso e infinito. Admiro quando você fala abertamente
e corajosamente sobre o amor no ensino no livro Tudo sobre o amor
novas perspectivas (Hooks, 2020). Em suas palavras:
SUMÁRIO 347
nada a ver com nossa habilidade de ensinar e aprender” (Hooks,
2020, p. 240). Você prossegue sobre o amor próprio, o amor incon-
dicional que devemos e podemos direcionar a nós mesmas(os), não
de uma forma rasa ou simples, mas complexa como uma forma de
se opor à dominação, de transgredir de dentro pra fora, no sentido
desse processo de nos compreender e prosseguir. Vejo que amor,
solidariedade e transformação são pautas indissociáveis e impor-
tantes para você, e posso dizer que a mim também. Agora posso ver
isso como um caminho possível.
SUMÁRIO 348
que estava ainda no colo da mãe e o advogado que a acompanhava.
Foram muitas perdas, não cabendo espaço para comemorações da
minha parte naquele momento, mas, de alguma forma, não me sinto
sozinha. Escrevi um conto que dedico a mim, a essas mulheres e a
outras tantas, e gostaria de compartilhar contigo.
Outrora
no início dos tempos numa tarde de outono
a mentira sobrevoava os céus
impaciente e entediada provocava pequenas brigas
até que avistou a deusa da justiça ao longe
a deusa era alvo fácil, não estava de armadura, não tinha um exército seu
andava vendada e descalça trazia consigo apenas uma espada e
uma pequena balança
a espada afiada brilhava ao sol enchia os olhos
hipnotizava, a mentira experimentava agora um sentimento novo
quisera eu ser ela quisera eu empunhar essa espada
meus inimigos cairiam aos meus pés
foi então que o primeiro crime aconteceu
SUMÁRIO 349
até que a espada também me encontrou
atingiu onde mais doía, me separou dos meus
a dor era uterina latente chorei o mundo
e o mundo me ouviu as mulheres caídas
compartilharam seu fôlego de amor e morte comigo, em prece
senti a força de cada mãe em mim
agradeci pela benção recebida me refiz, segui meu caminho
SUMÁRIO 350
com o pertencimento que carregam. Tenho em mim esperança em
dias melhores que estão por vir, e espero poder te escrever mais
sobre isso em breve.
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1967.
FREIRE, P. Considerações em torno do ato crítico de estudar. In: FREIRE, P. Ação Cultural
para a Liberdade e outros escritos. 6.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. São Paulo: Elefante, 2020.
SUMÁRIO 351
Carolina Cristina dos Santos Nobrega
SOBREVIVÊNCIA?
PRESENTE!
Prezada bell hooks,
SUMÁRIO 353
reformista e desprezível na estrutura profundamente racializada.
Nesse estado de medo, o racismo engole o tempo de vida da gente.
A nossa dignidade confiscada é aclamada na composição da leitura
crítica e desabafada do esgotamento e reafirma: a intelectualidade
expressa à luta da vida negra pela liberdade!
SUMÁRIO 354
Recordo-me que minha mãe me acompanhava em todos
os concursos para o cargo de professor. Eu era uma das últimas a
terminar a prova, e lá estava ela com um lanchinho na mão, uma
palavra carinhosa, olhar feliz e muitas conversas com outras mães.
Lembro-me que, quando os passos de minha mãe ficaram mais len-
tos, e nós desconhecíamos a doença, lá estava ela comigo, numa
longa caminhada para mais um concurso. E sigo, como ela dizia,
tocando em frente! A minha avó e minha mãe eram meu alicerce,
minha força motriz. Minha avó nos deixou em 2009 e minha mãe
em 2020. Elas sempre falaram da relevância do nome próprio como
existência, do estudo, do território. Hoje, aprendo, com a literatura
indígena, a conexão corpo e terra; e me fortaleço nas religiões “crimi-
nalizadas”, como a Umbanda. Axé!
SUMÁRIO 355
A primeira vez que li “intelectuais negras” era como habi-
tar e encontrar o que se conhece na alma que estava tão calado e
sufocado na educação. Até que enfim, eu pensava, mesmo escre-
vendo em terceira pessoa eu posso ter lugar de escrita. Eu tinha ali
o reconhecimento feminista e, assim, a leitura internalizada, viva, que
incendeia as ideias, as palavras que foram sentidas como abraço
político-amoroso e me convidaram para diferentes encontros cole-
tivos. No início de 2014, eu percebi em mim o que Neusa Santos
Souza (1983, p. 17) alertava, ao afirmar que “[...] uma das formas de
exercer autonomia é possuir um discurso sobre si”. O que é ser afro-
-professora nas metamorfoses da Carolina? A fagulha criativa para
transformar as aulas de educação “física” no entendimento de uma
educação como libertação quilombista, eu encontrei na leitura das
contribuições de Beatriz Nascimento, Carolina Maria de Jesus e,
recentemente, François Vergès, Lélia Gonzalez, entre outras(os).
SUMÁRIO 356
A roda de conversa na comunidade de um bairro em Guarulhos/SP é
uma memória muito bonita da sabedoria de vida daquelas mulheres,
que preencheu o meu coração como água de Oxum. É como você
diz, bell: é a experiência “[...] com um professor [...] muito influente
que nos convenceu a dedicar a vida a atividades de leitura, escrita e
conversa pelo prazer individual, mérito pessoal e ascensão política
dos negros” (Hooks, 1995, p. 465). Antônio, Andreia (professora dos
anos iniciais) e eu trabalhávamos na mesma escola. Eu aprendi com
ela a força das palavras. A sua descolonização interna, a presença
do seu discurso na qualidade de enfrentamento à violência verbal e
à condenação de outros professores sobre os discentes e, ao falar,
conseguia a atenção de todos, não deixava passar nada em branco.
Eu a admirava e sabia o peso da dor e do desgaste que estavam por
trás daquele posicionamento político.
SUMÁRIO 357
processo de recordar experiências, do uso da linguagem oral, das
rodas de conversa, dos temas-elos afro-brasileiros, os saberes do
terreiro, a conexão cultura-natureza, a construção coletiva do conhe-
cimento que compõe uma condição de comunidade (identificada
pelos discentes), valorizando a identificação do território que propõe
outra escola possível (Nobrega, 2021).
REFERÊNCIAS
CARRASCOSA, D. Uma sismografia de nossos feminismos abolicionistas. In: DAVIS,
A.; DENT, G.; MEINERS, E. R.; RICHIE, B. E. Abolicionismo. Feminismo. Já. São Paulo:
Companhia da Letras, 2023. p. 7-23.
SUMÁRIO 358
PETIT, S. H. Pretagogia: pertencimento, corpo-dança afroancestral e tradição oral
africana na formação de professoras e professores. Contribuições do legado africano
para a implementação da lei n. 10.639/03. Fortaleza: EdUECE, 2015.
SILVA, M. L. et al. Professoras negras e suas valiosas trajetórias na educação. In: SILVA, N. (org.).
Educação e o empoderamento da mulher negra. São Paulo: Casa Flutuante, 2017. p. 91-107.
SUMÁRIO 359
Jacineide Arão dos Santos
SONHOS:
FIO CONDUTOR DO MEU
ESTAR NO MUNDO
Querida bell hooks,
SUMÁRIO 361
poesia “[...] E é tão bonito quando a gente entende/ Que a gente é
tanta gente onde quer que a gente vá/ É tão bonito quando a gente
sente/ Que nunca estar sozinho por mais que pense estar”. Fico a
pensar se as músicas dele também não a encontraram e alimenta-
ram a sua luta (rsrs).
SUMÁRIO 362
Meu canal de diálogo e chegada a cada jovem que cruzou o meu
caminho sempre foi a afetividade, o respeito mútuo e a crença na
potência de cada aluna(o).
SUMÁRIO 363
Ah querida, você nos encoraja, nos trouxe uma vasta obra,
mas um dos seus escritos que mais me tocaram foi Tudo sobre o
Amor (Hooks, 2021). A sua perspectiva sobre o amor é fecunda,
necessária. Também acredito que o amor é ação e vincula-se a ética
e ao coletivo. Amar é movimentar-se e esse movimento só faz sen-
tido quando estamos inteiras. Suas ideias são revolucionárias. São
um manifesto contra essa perspectiva individualista que nutre essa
sociedade capitalista, colonizada e racista. Pensar no amor como
prática de liberdade política e coletiva é transgressor, libertador.
SUMÁRIO 364
REFERÊNCIAS
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.
HOOKS, B. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. São Paulo: Editora
Elefante, 2019.
LUNA, L. Ain´t I A Woman. In: Bom mesmo é estar debaixo d`àgua. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=BCQnOftvLXM. Acesso em: 09 out. 2023.
PINHO, O. E não sou uma mulher? Soujurner Truth. Disponível em: https://www.geledes.
org.br/e-nao-sou-uma-mulher-sojourner-truth/. Acesso em: 08 out. 2023.
SUMÁRIO 365
Margareth Maura dos Santos
APRENDER A SER
FEMINISTA SENDO
NEGRA AO ERGUER
MINHA VOZ
Querida bell hooks,
SUMÁRIO 367
Essas reflexões lembraram-me o seu livro O feminismo é para
todo mundo, pois, nas linhas deste, você traça que mesmo diante de
questões debatidas no movimento feminista, ainda há o fator raça
que não vem atrelado ao de gênero. A cada leitura e passagem de
página, pegava-me em questionamentos, mas em seguida surgiam
as respostas, principalmente, nas reflexões quanto ao privilegiou
da branquitude, independente do gênero feminino, até porque no
movimento feminista havia a aclamação por sororidade. Como bem
você nos aviva a memória, nós, mulheres negras, éramos subal-
ternizadas e oprimidas ainda por estas outras mulheres que lide-
ravam este movimento.
SUMÁRIO 368
Brasil por ser um país multi, pluri e diverso em cultura, história, língua,
possa falar e dar voz a estes grupos sociais.
Margareth
SUMÁRIO 369
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra tradução Cátia
Bocaiuva Maringolo. São Paulo: Elefante, 2019.
SUMÁRIO 370
Maria Eduarda Alves Sousa
CARTA PARA
GLORIA JEAN WATKINS
EM SUA VERSÃO
BELL HOOKS
Prezada bell hooks,
SUMÁRIO 372
explicou que as pessoas odeiam perceber que a família nem sempre
é uma proteção, e sim construtores de barreiras.
SUMÁRIO 373
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. São Paulo: Elefante, 2020.
SUMÁRIO 374
Daniele do Nascimento Silva
AMORES EM
MOVIMENTO
Oi, bell!!!
A duras penas descobri que todo amor, até o mais lindo, puro
e saudável traz dor. Mas ainda assim vale a pena vivê-lo. E é incrível
as facetas do amor com a dor. Nessa nova fase descobri que quando
a gente para de receber o amor, a gente não deixa de senti-lo, a
gente não deixa de amar porque o objeto de nosso amor não estar
mais presente ou porque já não podemos mais sentir seu amor como
antes. Eu não parei de amar meu pai, só não posso mais devolver
meu sentimento e isso que deixa doloroso e o peito pesado. O que
fazer com o sentimento no peito que não encontra mais o caminho
para seu objeto de amor?
SUMÁRIO 376
Tenho novidades, enfim, comecei na escola nova, gostava
muito das relações que havia construído na escola anterior com quase
todos os colegas e com a comunidade. Contudo, não aguentava mais
o favoritismo que a branquitude tinha, a competição feminina, ora me
sentia invisível, ora excluída, minhas ideias eram roubadas e nunca
valorizadas. A nova escola é perto de casa, posso ir a pé; e é quase
em frente ao mar. Também é dentro da comunidade marcado pela vio-
lência do tráfico, do tribunal do crime e da polícia. Não é um ambiente
externo amistoso, mas há um espaço de aquilombamento interno.
SUMÁRIO 377
Falando em futuro, não posso mais fugir de falar de minha
vida amorosa. Infelizmente, não estou com ninguém, eu queria e as
vezes tenho dúvida se o amor romântico é para mim, sonho com o
amor fofo de meus pais de cuidado e cumplicidade e que durou 40
anos, até meu pai partir. Eu sigo anelando, esperançando o amor e
agindo, desejo uma casa cheia de filhos do ventre e do coração e
um cúmplice de caminhada, mas por ora sigo só. Estou me amando,
entrei na academia e até marquei um dentista, vou dar entrada nos
papéis para adoção, resolvi cuida de mim e me colocar como minha
prioridade, talvez pela primeira vez na vida. Autoamor é autocuidado
e assim, estabeleço o padrão de amor que quero para mim.
Dani Silva
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. São Paulo: Elefante, 2020.
SUMÁRIO 378
Luciana Dantas de Paula
SUMÁRIO 380
Que temos um corpo, que sentimos, que não aprendemos só com a
«mente», mas com todo o nosso corpo. Os desconfortos que apren-
demos a ignorar, o que fazemos para nos adequar a esse sistema,
isso nos afeta profundamente e afeta nossa aprendizagem.
SUMÁRIO 381
É, era sorte mesmo, bell, era privilégio, porque meus pais não
tiveram o mesmo, muito menos meus avós. Eles e elas trabalharam
desde cedo, e mesmo diante de tanto esforço nunca deixaram de
valorizar a educação. Esta era vista como caminho de emancipação,
para a construção de uma vida melhor. Mas o que eu não sabia ainda,
era que uma educação a serviço do capitalismo patriarcal supre-
macista branco não seria emancipatória. Essa era a fonte da minha
angústia no Ensino Médio para qual eu ainda não tinha nome, bell.
Eu sabia que estava em uma posição de privilégio, mas não entendia
que outros aspectos também me atravessavam. Não entendia por
que eu não poderia ter nenhuma escolha ou autonomia sobre o que
eu estudava. Por que os livros que eu leria deveriam ser escolhidos
por mim ao invés de escolhê-los? Por que, quando eu fazia uma per-
gunta difícil em sala de aula, a resposta do professor era “Isso não
importa.” ou “Ano que vem você verá essa matéria.”? Por que não
encontrava o tom da minha pele, a minha história, a história da minha
família contemplada naquele local de mármore, naqueles livros didá-
ticos? Por que quando eu ouvia dos meus colegas “Racismo não
existe.” essa frase não era seguida de nenhuma, absolutamente
nenhuma, intervenção de professores ou de outros colegas?
SUMÁRIO 382
Com seus livros, com a sua voz doce e firme, com o seu radi-
calismo amoroso, descobri que a coexistência de ativismo e amoro-
sidade, de intelectualidade e sensibilidade eram possíveis. Descobri
que era possível nomear injustiças que presenciei a vida toda. Você
já me trouxe tanto acalento, bell. Nunca perco a oportunidade de
dizer que All About Love (Hooks, 2001) (Tudo sobre o amor) não é
só um livro, é um abraço apertado na alma. Um abraço e acalento
profundos porque reconhecem dores, reconhece o luto e as con-
tradições da sociedade em que vivemos, mas também que trazem
a urgência de um cuidado coletivo, de um olhar generoso para nós
mesmos e nossa caminhada. É proposital, acredito, não falar em
autocuidado, que tanto remete a uma lógica individualista, mas um
cuidado construído em comunidade, um cuidado que reconhece
os sistemas de opressão e que as saídas são coletivas. Como você
afirma em Teaching Community: A Pedagogy of Hope (Ensinando
comunidade: uma pedagogia da esperança):
A cultura de dominação tentou nos manter com medo,
nos fazer escolher a segurança em vez do risco, a mes-
mice em vez da diversidade. Superar esse medo, desco-
brir o que nos conecta, celebrar nossas diferenças; este
é o processo que nos aproxima, que nos dá um mundo
de valores compartilhados, de comunidade significativa
(Hooks, 2003, p. 197).
SUMÁRIO 383
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. All about love: new visions. New York: Harper Collins, 2001.
SUMÁRIO 384
Emanuelle da Silva Oliveira
ESCOLHER SENTIR
Querida bell,
SUMÁRIO 386
looping da famosa síndrome da impostora, e um desses momentos
da minha maior falta de autocrença me vi pensando que precisava
encontrar de novo a sensação das suas palavras. E esse momento
foi a pandemia, foi quando meu corpo se tornou prisioneiro de minha
mente entre paredes e meu afeto se tornou prisão do meu corpo.
SUMÁRIO 387
Foi nas colinas do Kentucky que minha vida começou.
Elas representam o lugar de expectativas e possibilida-
des bem como o cenário de todos os meus medos, dos
monstros que me perseguem e assombram meu sono
(Hooks, 2022. p. 29).
Manu
SUMÁRIO 388
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Anseios: Raça, Gênero e Políticas Culturais. 2.ed. São Paulo: Elefante, 2019a.
HOOKS, B. Erguer a voz: Pensar Como Feminista, Pensar Como Negra. 2.ed. São Paulo:
Elefante, 2019b.
HOOKS, B. Tudo sobre amor: novas perspectivas. 2. ed. São Paulo: Elefante, 2021.
SUMÁRIO 389
Roberta da Silva Gomes
18 Povoada - Sued Nunes: [...] Eu sou uma, mas não sou só, minha fia’/Povoada/Quem falou que eu
ando só?/Nessa terra, nesse chão de meu Deus/Sou uma mas não sou só/Povoada/Quem falou
que eu ando só?/Tenho em mim mais de muitos/Sou uma mas não sou só/Povoada/Quem falou
que eu ando só?/Nessa terra, nesse chão de meu Deus/Sou uma mas não sou só/Povoada/Quem
falou que eu ando só?/Tenho em mim mais de muitos/Sou uma mas não sou só (5x)/Eu sou uma,
mas não sou só, ‘mermo!
SUMÁRIO 391
sendo através do coletivo que eu tenho descoberto as respostas
para as perguntas que faço no primeiro parágrafo dessa carta.
SUMÁRIO 392
criticamente para a sua supremacia e privilégios brancos, construindo
este espaço conosco – que também estão subvertendo a ordem
colonial da academia, entendo a força e a potência que o aquilomba-
mento (Nascimento, 2021) possui ao fornecer força e esperança para
aquelas que ousam transgredir e erguer a voz (Hooks, 2019a).
SUMÁRIO 393
Os quilombos surgem como uma necessidade dos africanos
escravizados em resgatar a sua liberdade e dignidade, fugindo dos
cativeiros e construindo uma sociedade livre (Nascimento, 2019). O
quilombismo exerceu um “papel fundamental na consciência histó-
rica dos negros” (Nascimento, 1979, p. 18), se estruturando através de
uma rede de associação, da solidariedade, convivência. A sociedade
quilombola era – e é ainda hoje – contra a propriedade privada da
terra, dos meios de produção e de elementos da natureza, defen-
dendo que a terra, as árvores, os rios e todos os elementos básicos
são de propriedade e uso coletivo (Nascimento, 2019).
Em seu livro Um feminismo decolonial, Françoise Vergès (2020)
retrata que a quilombagem era uma oportunidade de futuro, mesmo
quando ele é socialmente negado, pela igreja, pelo Estado, pela cultura.
Apesar do sistema de escravidão, os quilombolas lutaram e se declararam
livres, reivindicando e vivendo seus sonhos, suas esperanças e utopias.
Analisar a história do quilombismo é ter a certeza de que
temos a missão, enquanto população negra que resiste, de organizar
a nossa própria luta para garantirmos a sobrevivência e existência do
nosso povo (Nascimento, 2019). E transpondo essa tarefa para a aca-
demia, temos entendido no Coletivo bell hooks – e trabalhado para
isso – que é um dever expurgarmos a supremacia branca de nosso
meio. E fazemos isso não só com as pessoas negras, mas também
com as pessoas brancas que admitem terem sido historicamente
privilegiadas e beneficiadas por sua cor, por sua racialização branca.
Termos pessoas brancas ao nosso lado não significa que elas nunca
erram, mas que ao errarem são capazes de encarar o próprio erro e
se propor a corrigi-lo (Hooks, 2021).
Eu tenho, mais do que compreendido, sentido e vivido um aqui-
lombamento dentro do Coletivo bell hooks, que me possibilita estar viva,
construir coletivamente resistências e permanências. Eu me reconheço
nesse espaço, eu existo porque as outras pessoas existem e me reco-
nhecem. Nossa forma de existir, de pensar é circular (Piedade, 2017), é
espiralar (Martins, 2021), é começo, meio e começo (Bispo, 2023).
SUMÁRIO 394
REFERÊNCIAS
ANZALDÚA, G. A vulva é uma ferida aberta e outros ensaios. Rio de janeiro: A Bolha, 2021.
HOOKS, B. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. São Paulo: Editora
Elefante, 2019a.
KRENAK, A. A vida não é útil. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.
LORDE, A. Irmã outsider: ensaios e conferências. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.
MOMBAÇA, J. Não vão nos matar agora. Rio de Janeiro: Editora Cobogó, 2021.
NASCIMENTO, M. B. In: RATTS, A. (org). Uma história feita por mãos negras. Rio de
Janeiro: Zahar, 2021.
SUMÁRIO 395
Juliana Oliveira Albuquerque de Souza
SIGAMOS JUNTAS!
Querida bell hooks,
SUMÁRIO 397
mesmo como manter uma visão dissociada entre a vida pública e
privada, e isso faz cada vez mais sentido no nosso contexto atual.
SUMÁRIO 398
Aprendi com você que erguer a Voz num contexto atraves-
sado por questões de desigualdades de gênero, raça e classe social
é realmente um ato de muita coragem, mas principalmente de resis-
tência e desejo por profundas transformações de consciência cultu-
ral. E aí, mais uma vez fiquei surpresa com seus escritos, quando você
traz uma visão crítica sobre a nossa participação nessa sustentação
de estruturas sexistas. Como nós, mulheres, também recorremos à
violência, mesmo que de modo distinto dos homens, e como fomos
educadas para aceitar a opressão de grupo e o uso da força como
exercício de autoridade.
SUMÁRIO 399
minha vida. Desejo que minhas pesquisas tenham consonância com
os objetivos do feminismo (dentro dessa sua perspectiva inclusiva e
amorosa), de uma educação democrática e libertadora, que ultrapas-
sem os limites da academia e sejam acessadas por aquelas que de
fato precisam erguer suas vozes oprimidas nessa sociedade.
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. São Paulo:
Elefante, 2019a.
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. Tradução de Stephanie Borges. São
Paulo: Elefante, 2021.
HOOKS, B. Ensinando o pensamento crítico: sabedoria prática. São Paulo: Elefante: 2020.
SUMÁRIO 400
Marifainy Mendes da Silva
REFLEXÕES
DE UMA BUSCADORA
DE SABEDORIA:
UMA CARTA PARA BELL HOOKS
Prezada bell,
SUMÁRIO 402
Uma das contribuições mais notáveis de bell hooks é sua
ênfase na importância da educação crítica como uma ferramenta
de transformação. Como coordenadora pedagógica na escola onde
trabalho, tivemos a oportunidade de realizar uma intervenção incrí-
vel no primeiro semestre do ano, usando seu livro Meu Cabelo é de
Rainha. Foi uma experiência verdadeiramente impactante.
SUMÁRIO 403
Raiane Medeiros Pinheiro
REGISTROS DE UMA
CAMINHADA:
ETERNA ALUNA, EVENTUAL
PROFESSORA
Prezada bell hooks,
SUMÁRIO 405
sou uma pessoa de baixa renda, mas com privilégios, pois sou branca.
Reconhecer meu privilégio e os riscos de ser mulher foram funda-
mentais para minha decisão de cursar Licenciatura em Artes Visuais.
SUMÁRIO 406
Após isso, vi que nos arquivos recomendados da disciplina
tinha um outro texto teu Linguagem: ensinar novas paisagens/novas
linguagens, e esse texto foi um marco para eu repensar minha forma-
ção, minhas escolhas e principalmente minhas práticas pedagógicas.
Foi como se eu tivesse sido puxada para cima, levada na direção da
superfície após estar afundada tanto tempo na escuridão de águas
formadas pelo resultado da sociedade que vivi e compus sem ques-
tionar durante tanto tempo. Ainda não conseguia respirar, mas pelo
menos consegui ver uma luz, uma esperança.
Para cada uso incorreto de palavras, para cada colocação
incorreta das palavras, era um espírito de rebelião que
reivindicava a língua como um local de resistência. Usar o
inglês de uma maneira que rompeu o uso e os significados
padrões, de tal modo que o povo branco poderia frequen-
temente não entender a fala negra, fez do inglês muito
mais do que a língua do opressor (Hooks, 2008, p. 35).
SUMÁRIO 407
Lembra do meu sonho? Então, ele é meu material e mantra de ânimo
e força para continuar constituindo e formando uma profissional e
pessoa cada dia com mais consciência.
SUMÁRIO 408
nossas convidadas e uma mesa de lanchinho com chá, café e bolo
próximo de outra mesa que foi disposto alguns livros.
SUMÁRIO 409
Atividade lúdica simples, mas que ajudou a ruir com alguns dos meus
próprios medos sobre os encontros e sobre mim mesma. Enquanto
andávamos ao som de uma música animada e distribuíamos os
bilhetinhos, trocamos olhares, encostamos umas nas outras, com-
partilhamos risadas. E enquanto cada uma lia seus recados rece-
bidos, compartilhamos sentimentos e relembramos necessidades
simples da vida. Naquela noite, saí amando-me um pouco mais.
SUMÁRIO 410
experimentarmos a alegria da comunidade num relacionamento em
que aprendemos a processar todos os nossos problemas, a lidar com
diferenças e conflitos enquanto nos matemos vinculados” (Hooks,
2021, p. 144). Conseguimos criar, mesmo que brevemente, uma
comunidade com pessoas dispostas a escutar, compartilhar, apren-
der e aceitar. Conseguimos evidenciar o quão importante e pode-
roso é não se isolar.
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Ensinando a transgredir: a educação como prática de liberdade. 2.ed. São
Paulo: WMF Martins Fontes, 2017.
HOOKS, B. Tudo sobre o amor: novas perspectivas. São Paulo: Editora Elefante, 2021.
SUMÁRIO 411
Taila Jesus da Silva Oliveira
À BELL HOOKS,
COM CARINHO:
EM DEFESA DO BEM-ESTAR
EM SALA DE AULA
Cara bell hooks,
SUMÁRIO 413
O primeiro ponto e que considero curioso na minha histó-
ria e de muitas mulheres da minha cidade, inclusive das minhas
próprias alunas do Ensino Fundamental e Médio, é a descoberta
“tardia” de ser negra. A ausência dessa descoberta de forma mais
precoce impactou e impossibilitou uma formação crítica em minha
trajetória ou como você assim denomina – uma formação engajada.
Infelizmente, durante a minha construção escolar e familiar, eu não
tive a consciência da minha origem étnico-racial desde cedo, pelo
contrário, sempre fui ensinada que deveria rejeitar a minha negritude
e me embranquecer cada vez mais. Minha mãe também não teve
essa formação, como ela poderia me ensinar? Os textos seleciona-
dos nas escolas onde eu estudava, os livros, os discursos sempre se
inclinavam para o culto à branquitude e todos os seus privilégios.
SUMÁRIO 414
transgredir: a educação como prática da liberdade, acho interessante
que você começa expondo-se intimamente, revelando a angústia de
se atrelar “eternamente” a uma universidade; você que nunca sonhou
em ser professora, mas sempre quis ser escritora.
SUMÁRIO 415
Assim como você, durante os meus estudos da graduação
e da pós-graduação, sempre vi professoras e professores brancos,
nunca homens e mulheres negros à frente de debates sobre ques-
tões que envolvessem raça e gênero. Na verdade, confesso que a
minha descoberta em relação a essas temáticas aconteceu, na gra-
duação, de modo tão tímido que consigo contabilizar as poucas inte-
lectuais negras que tive o prazer de conhecer. Parece que o tema que
promove a nossa existência é sempre muito caro a uma sociedade,
a um programa e sobretudo a um currículo que insiste em celebrar o
cânone que não nos espanta pensar é formado apenas por homens
brancos, excluindo a diversidade do nosso território.
SUMÁRIO 416
de aula – “[...] Toda sala de aula em que for aplicado um modelo
holístico de aprendizado será também um local de crescimento para
o professor, que será fortalecido e capacitado por esse processo”
(Hooks, 2013, p. 35). Minha cara bell, é tão bom saber que nessas
palavras há um olhar para as nossas dores, pois precisamos também
de fortalecimento, é preciso humanizar o professor. Considero o seu
texto Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade
é o próprio manifesto do bem viver.
Com carinho,
REFERÊNCIAS
GERALDI, J. W. O texto na sala de aula: leitura e produção. Cascavel: Assoeste, 1984.
SUMÁRIO 417
Quessia Karina Garcia
TRAJETÓRIAS
DE APRENDIZAGEM
INSPIRADAS POR
BELL HOOKS:
UMA CARTA REFLEXIVA
Prezada bell hooks,
SUMÁRIO 419
falava seu próprio idioma, transmitia conhecimento de forma oral e
teve tudo isso arrancado. Perder a língua é como perder a alma, a
possibilidade de comunicação com os seus.
Esse país também foi formado por pessoas que foram arran-
cadas de seus países de origem, de suas tradições, de suas línguas
maternas e sofreram o inimaginável em terras desconhecidas. A lín-
gua do opressor se torna instrumento de dominação, mas quando foi
apropriada pelos oprimidos, ela se tornou não apenas um meio de
sobrevivência, mas também um ato de resistência.
SUMÁRIO 420
as nuances e diferenças na pronúncia das palavras. Com o tempo,
algo maravilhoso aconteceu. Meu sotaque se tornou multicolorido,
refletindo as diversas influências linguísticas da nossa comunidade.
Juntos, criamos nossa própria forma de comunicação, enriquecida
com entonações e gírias trazidas pelos meus alunos. Essas trocas
e adaptações transformaram minha experiência na escola em algo
verdadeiramente gratificante.
Confesso a você que tenho medo de não ser uma boa pro-
fessora para os meus alunos, tenho medo de que minha prática
transgressora se encontre com a educação tradicional em alguns
momentos e eu não atinja o “mundo novo” e suas possibilidades.
Por isso, sua escrita é tão importante e inspiradora para mim, para as
minhas crianças, para a minha comunidade.
SUMÁRIO 421
Gostaria de ter te conhecido em presença, sinto que te
conheço em espírito, sua escrita é tão íntima, acolhedora e provoca-
tiva que sinto que estou conversando com uma amiga quando leio
seus livros, me vejo em muitos dos seus anseios, reflexões e trajetos.
Fico imensamente feliz de poder te escrever essa carta, de ser uma
professora que se inspira em você, bell.
Kess.
REFERÊNCIAS
HOOKS, B. Ensinando a Transgredir: a educação como prática da liberdade. Tradução
de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2017.
SUMÁRIO 422
CARTAS PARA
FRANTZ FANON
Cacilda Ferreira dos Reis
SAÚDE MENTAL
E JUVENTUDE NEGRA:
UMA REFLEXÃO A PARTIR
DE FRANTZ FANON
Caro Frantz Fanon! Cordiais Saudações!
O conhecimento produzido por Fanon se constrói com
a vivência das relações de dominação colonial entre
pessoas negras e brancas, mas seu pensamento crítico,
como ideal humanista de liberdade e justiça, transcende
a consideração da cor da pele e abraça todas as formas
de opressão. Estende-se a todos os ‘condenados da terra‘,
distribuídos nos confins remotos e grandes metrópoles
da África, Ásia, América Latina e onde mais a desigual-
dade intrínseca ao capitalismo impõe injustiça e exclusão
(Sevalho; Dias, 2020, p. 941).
20 Como informa Benbassa (2010), embora condenado pela leucemia, em 1961, Fanon escreveu o
livro Os Condenados da Terra, prefaciado por Jean-Paul Sartre e publicado após sua morte
por François Maspero. Este livro, que defende o socialismo revolucionário, tornou-se um grande
clássico do pensamento do Terceiro Mundo. E segundo a autora, transformou Fanon em um dos
principais analistas e figura importante da libertação colonial, concebida como o nascimento de
um novo homem (tradução livre).
21 Para o aprofundamento sobre o pensamento Fanon, consultar os trabalhos de Deivison Faustino,
em especial sua tese de doutorado “Por que Fanon, Por que agora: Frantz Fanon e os fanonis-
mos no Brasil” (2015) e a recente publicação “Frantz Fanon e as encruzilhadas – Teoria, política
e subjetividade” (2022).
SUMÁRIO 425
e, sobretudo, com as dimensões sociais do sofrimento psíquico
(Gaudenzi et al, 2023). Além disso, como nos explicam Gil Sevalho
e João Vinícius Dias (2020), suas ideias e práticas médico-sociais,
precursoras na atenção à saúde mental, incorporam a cultura na
discussão de uma sociogênese do sofrimento mental e a crítica à
inadequação da psicanálise eurocêntrica para lidar com a opressão
colonial e o racismo. No Brasil, a psicanalista Neusa Santos Souza,22
autora da obra Tornar-se negro: ou as vicissitudes da identidade do
negro brasileiro em ascensão social, de 1983, inaugurou o debate
contemporâneo e analítico sobre racismo, identidade negra e sofri-
mento psíquico (CFP, 2017). Para Faustino, esta obra é um clássico
da psicanálise antiracista brasileira que tem nos seus estudos uma
das suas principais bases teóricas (Gaudenzi et al, 2023).
22 Segundo a Fundação Palmares (2008), esta obra de Neusa Souza é considerada a primeira refe-
rência sobre a questão racial na psicologia. A psicanalista busca mostrar como ocorre a rejeição
do negro por conta do seu aspecto exterior, sendo necessário um raro grau de consciência para
que esse quadro se inverta. No momento que isso acontece, para Souza, a cor e o corpo do negro
são sentidos como valor de beleza.
SUMÁRIO 426
O estudo da OMS também revelou que as desigualdades
sociais e econômicas, emergências de saúde pública, guerra e crise
climática estão entre as ameaças estruturais globais à saúde mental.
Assim como apontou que o estigma, a discriminação e as violações
de direitos humanos contra pessoas com problemas de saúde men-
tal são comuns em comunidades e sistemas de atenção em todos
os lugares. Por fim, salientou que na totalidade dos países são as
pessoas mais pobres e desfavorecidas que correm maior risco de
problemas de saúde mental e, ao mesmo tempo, são as menos pro-
pensas a receber serviços adequados (OPAS, 2022).
23 Em maio de 2013, a Organização Mundial da Saúde adotou o Plano de Ação Integral de Saúde
Mental 2013-2020, em uma assembleia composta pelos Ministros da Saúde dos Estados-Membros
da organização. Em 2019, o plano foi prorrogado até 2030.
SUMÁRIO 427
são vistos e tratados no Brasil, a raça tem uma operacionalidade na
cultura e na vida social”. Antônio Sérgio Guimarães (2023, p. 294), por
sua vez, adverte que “para a ciência, não basta negar a raça como
a priori social ou natural, é preciso compreender o modo como essa
noção atua na vida coletiva e usá-la, desse modo, como conceito
político ou sociológico.”
24 Segundo Vinuto (2023, p.301), o racismo institucional trata-se de uma ferramenta analítica que
ajuda a compreender de que modo as instituições se organizam com base em hierarquias raciais,
mesmo quando individualmente seus profissionais não veem ligações entre suas próprias ações
e o tratamento geral e habitual destinado ao público atendido por suas organizações. P.301.
SUMÁRIO 428
sobre preconceito, racismo e os desafios para a saúde e o bem-estar
da população negra no Brasil. Ela reivindica um novo olhar para a
saúde mental deste segmento, tomando como referência o seu
legado epistemológico, pois subilinha que você “traz à baila uma dis-
cussão fundamental para se (re)pensar as repercussões das vivên-
cias sob opressão e discriminação e a relevância do engajamento da
população em movimentos emancipatórios, com suas consequên-
cias psíquicas e sociais” (Frederico, 2021b, p.1).
SUMÁRIO 429
das relações raciais que, historicamente, foram marcadas pelo
preconceito, velado ou explícito, com relação aos negros. A esse
respeito, Guimarães (1999, p. 9) adverte que o racismo é “uma forma
bastante específica de ‘naturalizar’ a vida social, isto é, de expli-
car diferenças pessoais, sociais e culturais a partir de diferenças
tomadas como naturais”.
SUMÁRIO 430
nenhuma reação. Temos estudiosos, pesquisadores, instituições,
entidades e sociedade civil organizada lutando no sentido de avan-
çar na construção e implementação de políticas públicas voltadas
para melhorar a situação da saúde mental no país. Assim, doze anos
depois do último encontro, teremos a 5ª Conferência Nacional de
Saúde Mental (CNSM),25 a ser realizada em dezembro de 2023, com
objetivo central de propor diretrizes para a formulação da Política
Nacional de Saúde Mental e o fortalecimento dos programas e ações
de saúde mental em todo o território nacional, tendo como tema
“a política de Saúde Mental como Direito: pela defesa do cuidado
em liberdade, rumo a avanços e garantia dos serviços de atenção
psicossocial no SUS”.
Abraço afetuoso!
SUMÁRIO 431
REFERÊNCIAS
AGÊNCIA BRASIL. Inscrições para a 1ª Conferência Nacional Livre de Saúde Mental
e Juventudes terminam nesta sexta. Disponível em: https://agenciaaids .com.br/
noticia/inscricoes-para-a-1a-conferencia-nacional-livre-de-saude-mental-e-juventudes-
terminam-nesta-sexta-8. Acesso em: 29 set. 2023.
BRASIL. Ministério da Saúde. Óbitos por suicídio entre adolescentes e jovens
negros 2012 a 2016. Universidade de Brasília, Observatório de Saúde de Populações em
Vulnerabilidade. Brasília: Ministério da Saúde, 2018.
BRITO, M. Suicídio é maior entre adolescentes e jovens negros. In: INFORME. Publicado
em 21 de março de 2019. Disponível em: https://www.nupad.medicina.ufmg.br/suicidio-
e-maior-entre- adolescente -e-jovens-negros/. Acesso em: 27 set. 2023.
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psicólogas/os. Brasília: CFP, 2017.
COSTA, P. H. A.; MENDES, K. T. Colonização, Guerra e Saúde Mental: Fanon, Martín-Baró e
as Implicações para a Psicologia Brasileira. In: Psicologia: Teoria e Pesquisa. Brasília,
2020, v. 36, e36nspe.
FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Tradução Renato da Silveira. Salvador:
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FAUSTINO, D. M. Frantz Fanon e as encruzilhadas: teoria, política e subjetividade, São
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FAUSTINO, D. M. A práxis e a “consciência política e social” em Frantz Fanon. In: Lutas
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FEDERICO, R. Trauma racial: quando o racismo deixa suas marcas. Disponível em:
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SUMÁRIO 432
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Ford, 2003.
SUMÁRIO 433
Edvânio Campos Macedo
LETRAS NEGRAS,
CRÍTICA BRANCA:
O EU, A ZONA DO NÃO-SER
E UMA PESQUISA ENCARNADA
É possível a poesia após a Nigéria, Fanon?
É possível ainda sentir o mundo?
O sentimento e seus atravessamentos?
O não-ser evola-se de sentimentos
A zona árida é composta de angústias.
SUMÁRIO 435
Por essa razão, a vontade da minha pesquisa, Fanon, não
é mensurar o nível de Letramento Racial Crítico desses sujeitos
implicados, muito mesmo analisar a sua qualidade. Isso seria colo-
nial, descabido e, inclusive, reforçaria o discurso de legitimação e
de validade dessa “crítica branca”. Pelo contrário, a intenção dessa
pesquisa implicada é entender o que lhes interpela nesse processo
(o que lhes atravessou e o que lhes afetou) em suas experiências
vividas com seus impactos.
SUMÁRIO 436
De fato, isso tudo é tarefa árdua, tu mesmo disse quando
defendeu a revolução africana, mas acredito também que a deco-
lonização estrutural e não-estrutural (corpo e mente) relaciona-se à
construção de uma cosmovisão consolidada e pluriversal que faça
um dialogismo para uma nova transfiguração do sentir o mundo.
Esse é o caminho, esse é o nosso itinerário. Por isso, acredito que seja
necessário escutar essas dores, sentir essas fraturas (as expostas e
as mais profundas do nosso corpo e mente), pois é a partir desse
letrar que a trans-formação, a re-construção e a co-autoria produzirá
pensamentos outros: inaugurando novas terras (sem aqueles mes-
mos condenados), mas com plantações de outros afetos e saberes.
Por fim, Fanon, minha última prece é: oh, meu corpo preto,
faça sempre de mim um corpo se ame.
REFERÊNCIAS
FANON, F. Em defesa da revolução africana. Lisboa: Sá da Costa, 1969.
SUMÁRIO 437
Maria Divina Pereira Bomfim
UM DEDO DE PROSA
COM FANON
Caro Fanon,
Saudações oestinas!
SUMÁRIO 439
tão tardiamente em nosso país, assim como todos os processos anti-
colonialista/antirracistas. Na atualidade, ressignificando e buscando
acentuar uma consciência em viver o verbo aquilombar, compreendo
que não há afrofuturismo sem ancestralidade.
SUMÁRIO 440
que torna obrigatório o estudo da história e cultura indígena e afro-bra-
sileira nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, porém
não prevê a sua obrigatoriedade nos estabelecimentos de ensino
superior para os cursos de formação de professores (licenciaturas).
SUMÁRIO 441
Como podemos conciliar o racismo com democracia? Com o
racismo, não há democracia!
SUMÁRIO 442
A minha leitura prévia com a sua obra, Fanon - foi um tanto
dolorido, chocante, às vezes não dava para digerir. Porque você,
Fanon, nos coloca a refletir as nossas feridas no lugar de intersec-
cionalidade, colocando o preto frente a ele próprio. E na atualidade,
lendo ou revisitando outros pensadores. Digo: pensadoras! pois aqui
temos muitas mulheres enegrecendo a cena, ou a literatura.
SUMÁRIO 443
Sair dessa imposição do espelho de Narciso, o qual expulsa o
nosso rosto e procurar os espelhos da autoestima, que nos apontam
para a comunidade da coletividade, da subjetividade, e da dignidade.
Parafraseando, Muniz Sodré: Dignidade é não se reduzir ao preço, é
estar acima de qualquer preço.
SUMÁRIO 444
Helder Souza da Silva
REFLEXÕES
DECOLONAIS DE
LUTA E RESISTÊNCIA
EM FRANTZ FANON
Estimado companheiro de Luta, Frantz Fanon,
SUMÁRIO 446
Observa-se uma interconexão de ideias que não apenas
enriquece o diálogo dentro do campo dos estudos decoloniais,
mas também destaca que outras vozes, que não são classificadas
como decoloniais, já estavam envolvidas em debates sobre a colo-
nialidade antes mesmo do início dos estudos sobre modernidade/
colonialidade/decolonialidade (M/C/D), que é o seu caso Fanon
(1968), com a publicação de Os Condenados da Terra. A abordagem
decolonial, que você, amigo de luta influenciou implica em conside-
rar a perspectiva a partir da experiência da colonização e em adotar
uma posição epistêmica subalterna, em oposição à hegemonia epis-
têmica e ontológica.
SUMÁRIO 447
essa lógica tem sobre as mentalidades moldadas pelas categorias
de pensamento ocidentais. A descolonização do conhecimento
requer que valorizemos os insights, cosmovisões e perspectivas
dos pensadores críticos do Sul global, levando em consideração
também suas experiências pessoais e as subjetividades que atraves-
sam (Mignolo, 2003).
SUMÁRIO 448
almeja transcender a lógica dualista que caracteriza a modernidade/
colonialidade, rejeitando enfaticamente a separação entre o ato de
conhecer e o ato de agir.
SUMÁRIO 449
REFERÊNCIAS
FANON, F. Os condenados da Terra. Tradução de José Laurêncio de Mello. Rio de
Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1968.
SUMÁRIO 450
Pedro Neves Gonçalves Franco de Carvalho
SUMÁRIO 452
Ironically enough, however, what you once stated should be a goal
of all of those who fight worldwide for a better and more decent life,
which was to humanize humanism, is still and more than ever before
a concept needs to be defended.
I can quote for instance Kendrick Lamar, a rapper from the pro-
jects of Los Angeles, when he states in his music Savior: “Capitalists
posing as compassionates be offending me” (Lamar, 2022). I can
also think of a quote by Noname, a female rapper from the southside
of Chicago, as she references you in her song Rainforest: “Took the
wretched out the earth and called it baby Fanon” (Noname, 2021).
SUMÁRIO 453
country, despite class, gender or race, and can no longer be ignored,
helping black citizens’ cause gain space in a national discussions
regarding reparations for the descendants of those formerly enslaved.
I must say that for myself these matters are very much close to
my heart. You see my father once also saw himself having to illegally
enter the United States of America in search of a better life for him and
his family. I was only three at the time when we arrived at the new cou-
ntry. As an immigrant child, I had to overcome so many cultural and
linguistic barriers, but I managed the best I could, as did my family, and
I am glad to say that after spending most of my childhood in a foreign
country my relatives and I managed to return safely to Brazil. This expe-
rience, however, changed and shaped my life in such a way I am still
coming to understand. It has also made me at a very early age sensitive
and aware to the struggles and hopes of those who like my father many
years ago also today see themselves forced to leave their homeland.
SUMÁRIO 454
responsible in the first place for the misery me and my fellow coun-
trymen are left to deal with and overcome are whole lives, scraping
for whatever wealth is left at the periphery of capitalism. When I was
exposed to your concept of alienation, my own struggle became so
much clearer and helped me to come to terms with the arduous
struggle I would have to face to free myself from the mental slavery
imposed on me by so many cultural values that are not my own nor
are native to my homeland.
I must also share with you that unfortunately what you once
brilliantly stated regarding fascism and it being nothing more than
what Europe has imposed to its colonies but taking place in their own
territories, still applies today. North America as the new global super
power has kept its foot on the South’s neck, preventing nations like
my own to thrive and influence global affairs. We can also see clearly
today fascism arising in North America, with right-wing populist lea-
ders criminalizing immigrants that are not white, blond and blue eyed
and banning books on critical race theory from schools. Unfortunately
my country as well has suffered from this evil, with alarming rates of
fascists groups growing by the day after a recent presidential term
of a fascist leader as well, wishing to turn the country into a more
European alike nation and not only turning its back on the original
indigenous population, the enormous contributions of the African
diaspora population, and all the ancient wisdom and knowledge that
has till this day been overlooked and underappreciated, but with turst
for more genocide and conquering all in the name of progress.
SUMÁRIO 455
returns today to the mouths of modern thinkers in the form of ancient
wisdom that I know surely also guided your steps and thoughts. And
it is these truly liberating ideas, so old and new, so potent, that remain
under attack today and that we need to protect and spread.
So as you can see, my generation has its work cut out for it and
all I can report to you at the moment is that we are not many, but we
too multiply, wishing to see change in the world and still learning to put
aside are petty differences and organize in an effective political fashion.
These issues and challenges are, as I mentioned, very dear to me and I
have, as yourself, made it my life’s battle to fight back the many setbacks
we have suffered. And I am pleased to say I am not alone. Whenever
I feel discourage with the harsh reality in front of me, besides running
back to those who, as you, came before me and set an example and
paved the way for the victories we have had, I look to today’s youth, to
boys and girls younger than me and my heart is filled with hope.
SUMÁRIO 456
with more wealth than half the entire world population, a recipe for
disaster and that I honestly hope will stir in the current world popula-
tion the despair, rage and strength necessary to bring revolutionary
change all around the globe, as we the immigrants, we the children
of immigrants, we the diaspora, we the descendents of the colonized,
we continue to detect and remove from our lands and minds the
germs of rot left behind by imperialism and claim our right to ques-
tion everything and demand reparations.
Yours sincerely,
REFERÊNCIAS
FANON, F. Os Condenados da Terra. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2005.
KENDRICK, L. Savior. Los Angeles: Bekon Productions, 2022. Disponível em: https://genius.
com/Kendrick-lamar-baby-keem-and-sam-dew-savior-lyrics. Acesso em: 4 set. 2023.
KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
SUMÁRIO 457
Olga Maciel Ferreira
HUMANIDADE INCERTA:
DIFICULDADES NA CONSTRUÇÃO
DO EU DE UMA PESSOA
RACIALIZADA
Caro Frantz Fanon,
SUMÁRIO 459
mulher negra se minha família está cheia de misturas? De fato, o
olhar do outro me constitui, no entanto, no meu caso, não existe Um
outro (universal), mas sim, muitos “outros”. Eu, um ser miscigenado,
sou uma ambiguidade para quem me vê, mas percebi que o mais
triste e violento, é ser uma ambiguidade para mim mesma.
SUMÁRIO 460
REFERÊNCIAS
FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. São Paulo: Ubu editora, 2020.
SUMÁRIO 461
Vitor Igor Fernandes Ramos
“MAMÃE, OLHE...
UM NEGRO”:
CARTA A UM AMIGO
ANCESTRAL
Companheiro Fanon,
SUMÁRIO 463
Queer, Intersexo,Assexuais, Pansexuais, Não-Binaries E Mais) tivemos
a necessidade de incluir pessoas que historicamente – assim como
nós, população negra – foram “explorados, escravizados, despre-
zados por uma sociedade capitalista, colonialista, acidentalmente
branca” (Fanon, 2020b, p. 212).
SUMÁRIO 464
estabelecimento comercial, sofro de fase maníaca e sou delirante.
Tranca ele no manicômio! Se desejo uma roupa cara, sofro de uma
euforia excessiva. Prescreve um psicotrópico para melhorar! Se ao
sair de casa sou abordado por um policial, sofro de perseguição.
Compra uma bíblia para ele/ela, é falta de Deus no coração!
SUMÁRIO 465
Minha descoberta como corpo e mente negra, se deu apenas
em 2019, Fanon, quando ingressei pela primeira vez em uma
Universidade Pública. Eu imaginava que o mundo estava em minhas
mãos. Fanon, eu não sabia nada do mundo! A Universidade Federal
do Pará (UFPA) me proporcionou a percepção do que eu não via, do
que eu não queria ver.
SUMÁRIO 466
Uma guerra que deixa famílias adoecidas pela conexão enér-
gica passada por nossa ancestralidade, que acompanha a nossa
evolução como povo. Um povo, que necessita guerreiramente lutar
por sua sobrevivência e permanência nesse mundo cruel, que o povo
negro foi sucumbido a se reintegrar como sociedade e foi-se retirado
seu status de cidadão e cidadã. Somente a violência, Fanon, é capaz
de unir nosso povo em prol de uma mudança radical. Tivemos com-
panheiros e companheiras que tiveram seus corpos estraçalhados
pelas balas de armas colonialistas. O colonialismo fez e faz a gente se
matar, se revoltar contra nosso próprio povo! Mas devamos conhe-
cer o princípio da Rebelião, o princípio e a necessidade de se rebelar:
É preciso não só combater em prol da liberdade de seu
povo. É preciso também, ao longo de todo o tempo que
dura o combate, ensinar novamente a esse povo, e em
primeiro lugar a si mesmo, a dimensão do homem. É
preciso percorrer de novo os caminhos da história, da
história do homem condenado pelos homens, e provo-
car, tornar possível o encontro de seu povo e dos outros
homens (...) e só o combate pode verdadeiramente exor-
cizar essas mentiras sobe o homem que inferiorizam e
literalmente mutilam os mais conscientes dentre nós
(Fanon, 2022, p. 303-304).
Você marca a minha história desde a primeira vez que eu lhe li.
Comecei por Pele Negra e Máscaras Brancas. Companheiro, confesso
que não entendi muito bem sua escrita, sua provocação, sua revolta,
sua indignação. Talvez ainda estivesse em mudanças atmosféricas
dentro de mim. Talvez a metamorfose ainda não tivesse acontecido. Li
pela segunda vez e, como uma bala em meu peito, sentir você!
SUMÁRIO 467
A luta pelo fim desse “internacionalismo revolucionário”
(Fanon, 2022, p. 360) deve acontecer em todos os campos. Uma
sociedade para ser evoluída e pensar de forma igualitária, deve exter-
minar seus pensamentos e ações que exprimam colonialismo, impe-
rialismo, mercantilismo e, principalmente, racismo. Companheiro,
penso o Brasil como um grande território demarcado por deveras
injustiças e calamidades. Mas, também penso o Brasil, como um
grande território formado maioritariamente por pessoas negras. É por
isso, Fanon, que o meu Brasil, tem as cores da bandeira Pan-Africana,
por caracterizar e entender que não existe Brasil, sem a nação negra.
REFERÊNCIAS
FANON, F. Alienação e liberdade: escritos psiquiátricos. 2.ed. São Paulo: Ubu Editora, 2020a.
FANON, F. Pele Negra, Máscaras Brancas. São Paulo: Ubu Editora, 2020b.
SUMÁRIO 468
Marília Claudia Favreto Sinãni
SUMÁRIO 470
ontológicas, epistemológicas e axiológicas. A violência colonial
ainda mantém o seu legado nos dias atuais, buscando formas de
desumanizar os povos subalternizados e orientando-se pela ideia de
que “primeiro cê sequestra eles, rouba eles, mente sobre eles, nega
o deus deles, ofende, separa eles” (Emicida, 2019), como é o caso
dos povos indígenas, da população negra, entre tantos outros grupos
classificados e desumanizados pela estrutura opressora, responsável
por reproduzir a violência colonial e sua concepção de que:
Nada deve ser poupado para liquidar as suas tradições,
para substituir a língua deles pela nossa, para destruir a
sua cultura sem lhes dar a nossa; é preciso embrutece-los
pela fadiga. Desnutridos, enfermos, se ainda resistem, o
medo concluirá o trabalho: assestam-se os fuzis sobre o
camponês; vem civis que se instalam na terra e o obri-
gam a cultivá-la para eles. Se resiste, os soldados atiram,
é um homem morto; se cede, degrada-se, não é mais um
homem; a vergonha e o temor vão fender-lhe o caráter,
desintegrar-lhe a personalidade (Fanon, 1968, p. 9).
SUMÁRIO 471
Às vezes eu me sento no banco da praça e observo cada pessoa que
por ali passa. Passam as senhoras com sacolas pesadas lhes mar-
cando os dedos, passam crianças cabisbaixas com seus celulares
nas mãos, passam casais dividindo um chimarrão já morno, passam
os bandos, passam as/os solitárias/os, passam as/os invisibilizadas/
os com suas caixas de papelão desmontadas nas costas, só não
passa a pressa que todas estas pessoas carregam com elas. Nos
bolsos, nas mochilas, nos olhos, nos sapatos com a sola desgastada,
há pedaços do tempo convivendo no asfalto, disputando quem tem o
mérito de chegar até o amanhã. Mas todas as pessoas não deveriam
ter o direito e as condições necessárias para chegar ao amanhã?
26 A síndrome de burnout tem sido cada vez mais presente na vida das pessoas. Em uma sociedade
acelerada e com estresses diários nos espaços de trabalho, o burnout é caracterizado pelo esgo-
tamento mental e pela exaustão emocional.
SUMÁRIO 472
país economicamente dependente” (Fanon, 1968, p. 78). Chamado
de país subdesenvolvido, o Brasil ainda tem relações de dependên-
cia com países que contribuem para a produção de desigualdades e
aparecem, logo em seguida, para resolvê-las, ancorados na política
de terra atrasada e numa espécie de assistencialismo em que se auto
intitulam como ‘salvadores’ da economia de um país que eles explo-
raram por séculos e negligenciam até hoje. Tendo em vista essas
problemáticas, percebo que quanto mais eu leio os seus escritos,
mais compreendo que o capitalismo, o racismo e o imperialismo são
indissociáveis, nunca foram superados e um alimenta o outro.
SUMÁRIO 473
privando-se de lutar por ele desde o presente, e ambas não levam em
consideração a importância de pensar a união do passado, presente
e futuro na construção de uma sociedade mais justa. Apesar de exis-
tirem tanto as pessoas que dominam como as pessoas dominadas,
todas/os sofrem com estas contradições e a luta pela libertação não
é seletiva, deveria ser coletiva.
Mas esta carta não lhe traz apenas o desabafo de alguém que
se vê afetada/o pelas dores denunciadas em seus escritos, a partir
dela eu também compartilho o quanto me reconheço nas fendas de
esperança que emanam da tua luta. Talvez o meu texto te cause dor,
quiçá te traga vestígios de esperança, nem que seja um punhado
dela, mas a intenção é que o sinta. Por séculos pessoas, saberes e
sentires foram negados e agora, em coro, nós, as/os condenadas/os
da Terra, reivindicamos os nossos direitos para que, juntas/os, seja-
mos! Que tenhamos direito à educação! Que sintamos!
SUMÁRIO 474
denunciar a situação que vivemos por aqui. Entendo que escrevemos
de contextos distintos, mas os nossos ideais se aproximam porque
partimos da concepção de que não devemos nos acomodar com a
atmosfera da violência, mas sim recusar a situação opressora das
estruturas de poder.
REFERÊNCIAS
EMICIDA; MOREIRA, V. L.; SAMAM R. Ismália. In: Amarelo. Rio de Janeiro: Sony Music, 2019.
FANON, F. Alienação e liberdade. Escritos Psiquiátricos. São Paulo. UBU Editora: 2020.
SUMÁRIO 475
Paula Machava
TRIBUTO A FANON:
EMANCIPAÇÃO E CONSCIÊNCIA
EM MOÇAMBIQUE
Irmão Frantz Fanon,
SUMÁRIO 477
Como mulher africana, moçambicana e feminista, encontro
nas suas obras uma fonte inesgotável de orientação e iluminação,
guiando-nos não apenas rumo à libertação física, mas também à
emancipação mental e espiritual. Em Moçambique, rico em cultura e
história, somos testemunhas das cicatrizes dolorosas deixadas pelo
colonialismo. Nossa luta transcende a independência política; alme-
jamos redefinir nossa identidade, desvinculando-nos das correntes
do passado colonial.
SUMÁRIO 478
Neste momento crítico, em que a África e o mundo enfren-
tam desafios complexos, desde a desigualdade económica até às
incessantes lutas pelos direitos das mulheres, as suas palavras
ressoam como faróis de esperança. O seu impacto é eterno, e a
sua influência continuará a moldar os movimentos emancipató-
rios em todo o mundo.
REFERÊNCIAS
FANON, F. Os Condenados da Terra. 3.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1988.
SUMÁRIO 479
Eliane Costa Santos
CARTA A FANON
Ilustríssimo Doutor Frantz Fanon,
SUMÁRIO 481
dois doutores, duas mestres, três especialistas e todo esse processo
vivido com uma mãe que estudou até a 4ª série primária e um pai
que voltou a estudar após 50 anos, fazendo supletivo.
SUMÁRIO 482
me preocupado com a necessidade de descolonizarmos as nos-
sas mentes de todas as formas de preconceitos e assim segui na
perspectiva de decolonizar saberes e fazeres. Nesse sentido, busco
com estudantes de Angola, Guiné Bissau, Moçambique, São Tomé e
Príncipe, Cabo Verde e os quilombolas do Brasil (Comunidades de
Jatimane, São Brás, Acupe, Monte Recôncavo, Dom João, Alto Alegre,
Cumbe, Serra do Evaristo, Sítio Veiga, que foram meus estudantes
na Unilab de Males-Bahia e Ceará), e além mar, especialmente no
mestrado da Universidade Lueji A‘NKonde Angola, desde conhecer
melhor a história da nossa ancestralidade acentuando as lutas de
resistência antirracistas e lutas contra a dominação epistemológica
nas ciências e tecnologias até o estar em sala de aula provocando
inquietações no currículo em todas as áreas.
SUMÁRIO 483
Na atualidade, comungo muito esta perspectiva na
Universidade com as pesquisas de extensão, para trazer para o
ensino e assim fiz, para as séries iniciais da educação básica pen-
sar quais saberes existe e necessário para um determinado fazer
- e assim foi com a matemática que existia nos fazeres durante as
compras vendas e organizações dos feirantes, que existiam na orga-
nização dos marisqueiros até o momento de escoar o produto e essa
experiência propiciou que estudantes percebessem a utilidade da
matemática e a cientificidade dos seus fazeres, contribuindo para
quebrar o estigma e preconceitos existentes em uma população de
jovem essencialmente Negras que tinham evadido da escola pois a
“mesma não foi feita para eles”.
Destaco, meu caro doutor, que com essa luta armada de sabe-
res, eu trabalhava a identidade e o lugar de pertença dessas crianças
que tornaram-se grandes artistas nacionais e internacionais. Entendo
que quebrar as amarras de limitação de conhecimento, de distancia-
mento do saber com o fazer, do que é ciência e o que folclore foi se
aquebrantando e me permita fazer analogia a quando na guerra da
Argélia você diz que “de maneira imperceptível, a necessidade de um
enfrentamento decisivo se torna urgente”. Mas, penso assim porque
tivemos também caminhos de expressão, um ressurgimento de força
SUMÁRIO 484
interior, da mesma forma que você constata que a partir de 1954 os cri-
mes comuns diminuem expressivamente, sendo superada através da
libertação da guerra de independência, ouso em dizer que poder se ver
refletido na educação, nas ciências e nas tecnologias, quando vários dos
nossos são mortos por evadirem da escola não ter economicamente
como resistir – morrem para o mundo dentro da bandidagem e morre
para a vida terrena por meio das balas que tem cor e endereço cravadas
nos corpos que evadiram por não se ver retratado nas escolas.
SUMÁRIO 485
e mascaras, numa edição que li de 1952, o Negro ao verificar que
seu território, espaço de atuação enquanto negro está invadido por
sucessivas discrições, sucessivas subalternizações, emerge nele o
desejo de ser como o opressor. Para o negro oprimido, sua autono-
mia, sua personalidade, só começa a ter valor quando a sua aparecia
se aproximar a do colonizador. Ele se sente mais valorizado, mais
estimado ao estar mais perto do branco, assim nasce o sonho do
colonizado ser igual ao colonizador. Quanto mais ter sua identidade
próxima a do homem branco mas faz com que ele não olhe para sua
cultura e vá se aliando à cultura do colonizador.
REFERÊNCIAS
FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Tradução Renato da Silveira. Salvador:
EDUFBA, 2008.
SUMÁRIO 486
Áquila da Anunciação Camargo
SANGUE NEGRO,
PELE CLARA
Prezado Frantz Fanon,
SUMÁRIO 488
Em sua obra Os Condenados da Terra (1961), você chegou a abor-
dar esse assunto, ao mencionar que o colonialismo teve a intenção
de internalizar nos indivíduos negros a supremacia da branquitude
como algo a ser desejado.
SUMÁRIO 489
passa a ser vista como uma denominação externa (Lago, Montibeler
e Miguel, 2023, p. 3).
SUMÁRIO 490
REFERÊNCIAS
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UNIFACS: Debate Virtual, n. 201, 2017.
SUMÁRIO 491
SOBRE OS ORGANIZADORES
E AS ORGANIZADORAS
Atauan Soares de Queiroz
Doutor em Linguística pela Universidade de Brasília (UnB), Mestre em Educação pela
Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Licenciado em Letras pela Universidade
do Estado da Bahia (UNEB). Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia da Bahia (IFBA), Campus Barreiras. Líder do Grupo de Estudo e Pesquisa em
Linguagens e Educação (GELINE/IFBA). Professor do Programa de Pós-Graduação em
Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do Oeste da Bahia (PPGCHS/UFOB).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/3923805819866846
ORCID: 0000-0001-5550-0756
E-mail: atauan@ifba.edu.br
SUMÁRIO 492
Marilde Queiroz Guedes
Pós-doutorado em Educação pela Universidade de Lisboa/PT. Doutora em Educação:
Currículo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Mestre em Educação
Brasileira pela Universidade Federal de Goiás. Especialista em Metodologia do Ensino
Superior pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Graduada em Letras
pela Faculdade de Formação de Professores de Arcoverde/PE. Graduada em Pedagogia
pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Caruaru. Professora na Classe 5 Nível
A Pleno da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Docente Permanente do Programa
de Pós-Graduação em Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do Oeste
da Bahia (UFOB). Pesquisadora e Líder do Grupo de Pesquisa Formação de Professor e
Currículo – FORPEC. É Membro da Academia Barreirense de Letras (ABL).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/1353574837768991
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E-mail: marildequeiroz@outlook.com
SUMÁRIO 493