YOGA SUTRA Cap 01

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1.

O Yoga Sutra: Introdução

O Yoga Sutra foi escrito aproximadamente no século IV a.C, no entanto, os conceitos


e técnicas que ele ensina, já eram parte da Tradição do Yoga há milhares de anos. A
escritura reúne uma grande quantidade de informações sobre autoconhecimento,
meditação e Yoga. Patãnjali, seu escritor, não foi o criador desses conceitos, mas
alguém que conseguiu organizar e registrar essa sabedoria com maestria.

Patãnjali teve a habilidade literária de organizar e construir um livro que fosse levado
como uma referência para todos os yogins e não é à toa, que esse livro já dura 2.500
anos ou mais. A tradição, na qual ele se inspirou, a tradição do Yoga é ainda mais
ancestral que o Yoga Sutra.

O grande problema da maior parte dos métodos modernos de desenvolvimento


pessoal ou mesmo de dicas para autoajuda é que, quando você recebe esse tipo de
informação e implementa, em um primeiro momento ela pode até gerar uma
motivação, mas em médio e longo prazo, quando você repetidamente vai colocar
essas ideias contra a realidade e a verdade, na maior parte das vezes, elas não
funcionam e o método em si acaba não se mantendo em pé. Tudo o que já possui
um tempo de história, uma tradição, tem mais chance de funcionar, pois já foi
testado por milhões de pessoas.

Muita gente que passa por um início frustrante quando busca desenvolver-se
internamente e torna-se cética com relação a esse tipo de conhecimentos. Deixam de
acreditar que o conhecimento espiritual, que tem o intuito de fazer com que se viva
uma vida com menos sofrimento, não funciona para nada. Muita coisa de
espiritualidade não serve para nada mesmo, a não ser para enriquecer os escritores
e palestrantes, mas essas informações também costumam serem esquecidas depois
de alguns anos. Sendo assim, a própria permanência de uma tradição é a prova de
que algum valor para as pessoas esse conhecimento possui.

Esse é o caso do Yoga Sutra, ele é um livro que já foi testado e validado ao longo dos
anos por milhares ou quem sabe bilhões de yogins. Ele ficou marcado e dura até hoje
por conta da eficiência do seu ensinamento.

01
Patãnjali foi um grande sábio e sua obra teve um valor enorme para a Tradição do
Yoga, sua capacidade de concisão dos ensinamentos merece toda a reverência dos
yogins de todos os tempos. No entanto, a cultura do Yoga incluiu mais elementos os
seu manancial que foram sendo registrados em escrituras posteriores. Entretanto, os
nomes dados as partes do Yoga e dos estados de consciência, ainda são usados da
forma como Patãnjali explica, na maior parte das tradições do Yoga. Por isso, tudo
que está no Yoga Sutra válido para quem vai praticar e ensinar Yoga.

Existe uma grande dificuldade com relação a traduzir qualquer tipo de texto antigo
em qualquer língua, especialmente se for uma língua morta, pois a língua é algo
dinâmico e que está o tempo todo em transformação. A nossa geração já fala um
português muito diferente dos nossos avós e bisavós. Então, de fato, a língua está em
constante mudança, algo que falávamos há um tempo atrás, já não é falado da
mesma forma hoje. Palavras que funcionavam em um certo contexto, hoje podem
funcionar em outro.

A tradução do Yoga-Sutra tem esse mesmo problema. Apesar de podermos traduzi-lo


com um dicionário sânscrito, existe a dificuldade de identificar as palavras e seus
significados dentro do contexto, já que a tradução palavra por palavra pode não fazer
sentido.

Justamente por isso que preferimos não seguir uma tradução literal que tem a
grande chance de estar errada por conta dessa mudança das palavras ao longo do
tempo.

02
Escolhemos uma tradução conceitual, que significa que a pessoa, que fez a tradução,
tem conhecimento e entendimento do Yoga e sabe o que o autor estava querendo
dizer em cada termo. Essa foi a nossa opção de escolha, mas não impede que você
possa ler outras traduções. Disponibilizaremos a melhor versão do Yoga Sutra na
nossa opinião, mas você pode estudar e comparar com outras traduções também e
escolher qual representa mais verdades para você.

O conteúdo do Yoga-Sutra é complementado com a aula, de Sat Sang em que será


apresentado o Gyana Yoga, o Yoga do Autoconhecimento. Então, se alguns conceitos
ficarem nebulosos, retorne e assista essa aula que será complementar aos assuntos
das próximas aulas.

03
2. Yoga Sutra: Capítulo 01 - Samadhipada: O caminho do Samadhi

O Contexto, a importância e a forma como o Yoga-Sutra


foi produzido

Acima falamos de como a maior parte dos

métodos de auto-ajuda não se sustentam, pois

propõe algo que ainda não resistiu ao confronto


com a realidade de milhões de pessoas e assim

que é testado e não funcionam acabam sendo

esquecidos ao longo da História. Pude

acompanhar de perto esse fenômeno quando o

documentário “The Secret” chegou ao Brasil.

Todo mundo do meio do Yoga, falava em Lei da

Atração e que bastava mentalizar que tudo se


concretizaria.

04
O filme traz várias histórias motivantes com gente até recebendo dinheiro pelo
correio. Só que na realidade, a maior parte das coisas que mentalizamos não se

concretizam. A partir dessa dura, mas verdadeira constatação, aceita-se o fato de que

não basta mentalizar para que as coisas aconteçam ou acredita-se que falta algum

entendimento ou que somente as coisas que se mentaliza muito (outro aspecto


subjetivo) acontecem. Em qualquer uma das opções, você continuará com um

conhecimento que não pode ser aplicado com resultados reais.

A proposta do Yoga-Sutra é atuar num nível de conhecimento que é superior às

compreensões da matéria. O conhecimento da sabedoria, chamado no Yoga de

Gyana Vidya.

A eficiência do que Patanjali ensina pode ser validada de diferentes formas.

Inicialmente deve-se considerar o tempo que a obra de Patañjali persiste. Também


pode-se considerar o prestígio que grandes meditadores dão a esse texto.

Finalmente pela própria experiência pessoal de cada leitor desses ensinamentos que

ao testá-los percebe-se seu real valor e continua a usar esse conhecimento ao longo
de toda a vida.

05
Patãnjali não é o pai do Yoga

A opinião de Patanjali não é unânime para os conhecimentos do Yoga, como já vimos,

ele não criou o Yoga, tampouco é reconhecido como um personagem divino.

Se suas palavras fossem à explicação completa para os yogins, todos deveriam

acreditar nas paranormalidades descritas no 3º capítulo (vibhuti pada) tais como ficar

invisível, menor que um percevejo ou maior que uma montanha.

A dificuldade de uma tradução.

A tradução deste Yoga-Sutra foi feita por Rajnath com validação de Mangalnath, dois

yogins da Tradição Natha, a Tradição que criou o Hatha-Yoga e da qual Patanjali fazia
parte. Esta tradução é conceitual, não literal. Quem quiser, poderá consultar a versão

completa que analisa palavra a palavra.

O conhecimento do Yoga-Sutra complementa-se com o Sat Sang, então essas aulas

podem ser usadas como complemento uma da outra.

06
CAPÍTULO 1
समा$धपाद
SAMADHIPADA
Yoga é Samadhi

O Yoga-Sutra é dividido em 4 partes chamadas de padas ou trilhas. Os


títulos dos capítulos do livro indicam o que será tratado naquela parte e
qual o objetivo dos ensinamentos do capítulo. O primeiro capítulo,
Samadhi Pada, tratará de como a Meditação deve conduzir seus
praticantes ao samadhi, o estado de não-mente. O Samadhi Pada é
composto por 51 sutras, versos ou aforismos (frases concisas de
conhecimento concentrado).

A palavra sutra significa cordão ou barbante, pois a estrutura literária do


Yoga-Sutra faz com que cada frase seja ligada a outra de forma que para
se ter a compreensão total é preciso ler o os 198 sutras distribuídos
pelos 4 capítulos de uma única vez, um cordão de conexão entre todos.

07
अथ योगानुशासनम ् ॥१॥
atha yogAnushAsanam ||1||

atha yogAnushAsanam

Atha - “E agora...” (significa uma bênção para o começo de algo); Yoga - absorção em samadhi;
Anu - de acordo com a tradição;
Shasanam - (shas implica uma instrução que acontece juntamente com a disciplina), portanto
shasanam significa instrução e também disciplina.

1.1- Preste atenção a disciplina do yoga

योगि,च.व1ृ .2नरोधः ॥२॥

yogashchittavrîttinirodhaH ||2||
yogashchittavrîttinirodhaH

Yoga - absorção em samadhi;

Chitta - consciência mental;

Vritti - turbilhões;

Nirodha - completa ausência de movimento.

1.2- Yoga é a completa ausência de movimentos internos. Melhor dizendo, é a consciência de


um ponto onde nunca aconteceram movimentos.

Comentário
A partir desse sutra, não haverá a tradução de cada palavra, mas somente o sutra completo e
o comentário.

Nirodha (estado de ausência das volições da consciência). O objetivo do Yoga é que esse nirodha
produza a compreensão de que na verdade nada pode abalar o observador é um efeito do
samadhi.

08
“Yoga é Samadhi” Vyasa Nessa definição de Patanjali ele está dizendo que Yoga é
igual a samadhi. A “prática do yoga” é o caminho para o samadhi. Ao comentar esse
sutra, Vyasa, o principal comentarista do YS disse: “Yoga é Samadhi”

A compreensão é que você é quem você é na tranquilidade e não as agitações de


vrittis. O EU é quem observa as agitações passando e não o que as agitações
produzem no seu corpo ou na sua mente.

O processo não é revelar o EU, mas perceber algo que sempre esteve ali. Um ponto
que nunca se deslocou, sempre esteve em nirodhah, completa ausência de agitações.

O Yoga não demoniza a mente, mas sabe que são suas agitações, vrittis que
produzem o sofrimento. Para explicar como é a agitação ou identificação que produz
o sofrimento.

Há uma metáfora que explica esse distanciamento da agitação mental que produz o
sofrimento comparando duas pessoas num dia de feira na cidade. A primeira pessoa
vê a feira do alto de uma colina e aquilo não a abala em nada, a outra está dentro da
feira, sendo conturbada pelo barulho e por todo o tipo de distração. A que está
distante apenas percebe, não é afetada pelo barulho ou pela agitação, enquanto a
pessoa que está dentro da feira está sujeita a todo tipo de perturbação.

09
O que é chitta da frase que define o Yoga segundo
Patanjali?

O significado de chita é explicado através da imagem de uma gaiola com


três macacos, na qual um buddhi, outro é ahamkara é o terceiro é
manas e chitta é toda gaiola.

1º macaco apenas recebe, buddhi;

2º macaco traz a informação para personalidade, ahamkara;

3º macaco cria a narrativa, manas

Todos estes estão dentro da gaiola chamada: chitta ou antarkarana

Imagine que você está passando na rua e um carro passa numa poça de
água e dá um banho em você. O primeiro aspecto de chitta (a gaiola) é o
que percebe o banho, esse aspecto é buddhi. O que apenas constata. O
segundo aspecto de chita conduz a percepção para a personalidade
observando o quanto o fato o afeta diretamente. É o macaco ahamkara,
expressão que refere-se a egoidade. O terceiro aspecto é a parte da
mente que cria a narrativa e uma história para contar e resolver o
problema.

10
Buddhi é um aspecto importante no Yoga, é o aspecto estimulado na
Meditação. Buddhi significa o impassível, aquele que apenas percebe. A
expressão dá origem a palavra Buddha, que é aquele que não é afetado
e se mantém sereno, pois entende que o que produz sofrimento na
visão do Yoga são os vrittis e não a mente.

तदा @Aटुः CवDपेऽवCथानम ् ॥३॥

tadA draShTuH svarUpeavasthAnam ||3||

1.3- Então o Eu real , que é Pura Observação, manifesta-se na sua real


forma de Consciência (transcendente aos conteúdos, original, pura,
anterior aquilo que pensas ser). Conhecendo a essência você deixa as
identificações passarem sem causarem dor.

Comentário

O EU simplesmente é e somente observa. As identificações não fazem


parte da sua essência.

11
व1ृ . साDHयIमतरJ ॥४॥

vRittisArUpyamitaratra ||4||

1.4- Fora do samadhi você sempre estará identificado aos turbilhões mentais, ao invés de sua
Fonte. Para Patanjali só há dois caminhos ou você entende a diferença para mente ou você irá
produzir sofrimentos a partir dos vrittis.

Comentário
Para isso ser aprendido, o Yogin deve dedicar-se à Meditação. Ele precisa vivenciar essa não
identificação e não apenas ouvir um professor ensinando, pois as palavras, por mais próximas
da essência que estiverem, continuam sendo vrittis. .

व.
ृ यः पLचतMयः िNलAटािNलAटाः ॥५॥

vrîttayaH pañchatayyaH kliShTAakliShTAH ||5||

1.5- Embora nem sempre isso seja sinônimo de sofrimento para o ego. Pois existem
experiências não-dolorosas.

Comentário

A identificação com os vrittis foi explicada no sutra I, IV. Nem todo vritti é doloroso e por isso é
tão difícil desapegar deles.

12
Qमाण 1वपयSय 1वकUप 2न@ा Cमत
ृ यः ॥६॥

pramANaviparyayavikalpanidrAsmritayaH ||6||

1.6- Existem 5 tipos de vrittis (turbilhões da mente que turvam a visão de nossa real
natureza): o conhecimento correto, conhecimento equivocado, o imaginar, o sono e o
rememorar.

Comentário

Diferença entre conhecimento correto e equivocado


O que gera o sofrimento é pressupor estes estados mentais como sendo a última
realidade. A Realidade Última é composta unicamente por energia estática, como por
exemplo o não-movimento do silêncio, e estes vrittis são baseados em energia
dinâmica, em movimentos.

Aqui Patanjali lista coisas que ocorrem na mente fora do samadhi. Foi a forma
encontrada por ele para detalhar o processo, assim como em muitas outras partes
do Yoga-Sutra. O Yoga-Sutra descreve racionalmente aquilo que está acima do
próprio racionalismo. E a tentativa de descrever com palavras aquilo que É.

13
QWयXानम
ु ानागमाः Qमाणा2न ॥७॥

pratyakShAnumAnAgamAH pramANAni ||7||

1.7- O conhecimento correto é uma percepção direta ou dedução testemunhal. É o


conhecimento espiritual que está baseado naquilo que não tem começo nem fim. Mas mesmo
assim ainda é algo que acontece na mente e não sua natureza original.

Comentário

Existem três formas de obtê-lo: percebimento direto e claro (do Ser), pela correta dedução
(por conseguir discernir entre o Eterno e o ilusório. E o critério é que o que não é eterno é
ilusório) e pelo ensinamento de um mestre.

1वपयSयो IमZया[ानमत@प
ू Q2तAठम ् ॥८॥

viparyayo mithyAjñAnamatadrUpapratiShTham ||8||

1.8 - O conhecimento equivocado é qualquer outro tipo de conhecimento que for deduzido a
partir das formas e não da experiência direta na Natureza Real do Eu.

Comentário

Assim como no início Patanjali deixa claro que também com relação ao conhecimento, ou você
o absorve diretamente da experiência ou, por mais elaborado que seja, sempre será
conhecimento imanente.

14
श_द[ानानप
ु ाती वCतश
ु a
ू यो 1वकUपः ॥९॥

shabdajñAnAnupAtI vastushUnyo vikalpaH ||9||

1.9 - A imaginação é uma sequência de objetos vazios de sabedoria, é quando nos


baseamos apenas em imagens em movimento dentro de nossa mente. Coisas que
não estão aqui e agora: julgamentos, fantasias místicas, vãos filosofares, etc.

A força da mente em criar cenários com eventos passados. O real é apenas o


presente.

अभावQWययालdबना तमोव1ृ .2नS@ ॥१०॥

abhAvapratyayAlambanA vRittirnidrA ||10||

1.10) O estado mental do sono se apoia na ausência de cognição (não tem nada a ver
com o samadhi).

Comentário

O 4º estado , Turya ou Samadhi, corpo ligado e mente desligada! Temos três estados,
que são:

1- vigília, (Jagrat)

2 - sonho (Svapna)

3 - sono profundo (Sushupti)

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Pessoas perguntam se o sono profundo se assemelha ao Samadhi pela pausa
nos pensamentos. No entanto, em sono profundo (Sushupti) pode parece não
haver pensamentos, mas o que não há é a consciência deles.

Samadhi é justamente o contrário, existe uma agudíssima consciência que não


se prende a nenhum dos meios de expressão mentais.

अनभ
ु त
ू 1वषयासंQमोषः Cम2ृ तः ॥११॥

anubhUtaviShayAsampramoShaH smrîtiH ||11||

1.11 - Memória é a ligação com eventos passados.

Comentário

Só existe o presente. Aprofunde a compreensão desse sutra com o livro “O


Poder do Agora” de Eckhart Tolle.

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अiयासवैराkयाiयां तिaनरोधः ॥१२॥

abhyAsavairAgyAbhyAn tannirodhaH ||12||

1.12) O recolhimento (nirodha) destes vrittis vem de abhyasa e vairagya.

Comentário

A seguir entenderemos como estas duas práticas são os pilares do yoga.

तJ िCथतौ यWनोऽiयासः ॥१३॥

tatra sthitau yatnoabhyAsaH ||13||

1.13) Abhyasa é a disciplina constante na prática da identificação com o Si Mesmo


(samadhi). Um esforço para ficar firmemente estabelecido em si.

Comentário

Abhyasa pode ser entendida como disciplina de repetir algo até a excelência.

स तु दmघSकाल नैरaतयS सWकारादरासे1वतो oढभIू मः ॥१४॥

satu dIrghakAlanairantaryasatkArAsevito dRîDhabhUmiH ||14||

1.14) Porém este nirodha só se firma se for feito por um longo tempo, sem
interrupção e com profunda dedicação, consolidando o samskara de nirodha.

17
Samskaras são marcas deixadas na mente pelas nossas ações, pensamentos e tudo
aquilo que chega até nós pelos 5 sentidos. Tais marcas não são passivas, exercendo
uma poderosa força na ação de nossa psique. As ações podem ser de dois tipos:
vyutthana (que levam para fora) e nirodhah (que inibem os processos mentais,
porém não a Consciência). O yogin procura cultivar este último, que vai na contramão
do primeiro.

oAटानq
ु 1वक1वषय1वतAृ णCय वशीकारसंrणा वैराkयम ् ॥१५॥

dRîShTAnushravikaviShayavitRîShNasya vashIkArasanjñA vairAgyamh


||15||

1.15) Vairagya é o desapego através da cessação da auto-indulgência que damos à


tendência natural da mente em reagir as impressões.

Comentário

É a prática da indiferença a tudo que não seja o Eu. É a prática de retirar o foco das
coisas percebidas e imaginadas (o mundo dos cinco sentidos mais a mente) e voltar
este foco ao Eu (e permanecer neste foco com abhyasa).

18
तWपरं पs
ु षtयातेः गुणवैतAृ uयम ् ॥१६॥

tatparan puruShakhyAteHguNavaitRîShNyam ||16||

1.16 - Tendo em mente que todo o universo é uma manifestação do Eu, então, surge
a indiferença às coisas compostas pelos gunas (o mundo material dos 5 sentidos
mais a mente).

Comentário

Esta indiferença surge com a visão do Supremo Eu Silencioso que ocorre no último
estado de vairagya. Quando nos desapegamos do que não É, o que É revela-se por si
mesmo. Perto disto o resto torna-se sem graça.

1वतकS1वचारानaदािCमताsपानग
ु माWसंQ[ातः ॥१७॥

vitarkavichArAnandAsmitArUpAnugamAth samprajñAtaH ||17||

1.17 - Atinge-se então o Samprajnata Samadhi, que subdivide-se em racionalidade


(vitarka), discriminação (vichara), sensação de bem-estar espiritual (ananda) e
sensação de ser uma presença (asmita).

Comentário

Samadhi não é um estado, é uma prática que poderia muito bem ser chamada de
"meditação profunda", por ser a continuidade de Dhyanam como veremos no
capitulo 2. Os primeiros samadhis que são os samadhis "com semente" (sa-bija) são
chamados de samapattis para diferenciar do último samadhi, o "sem semente" (nir-
bija)

19
1वरामQWययाiयासपव
ू ःS संCकारशेषोऽaयः ॥१८॥

virAmapratyayAbhyAsapUrvaH sanskArasheShoanyaH ||18||

1.18 - Isto surge com o samskara criado por abhyasa através da prática.

Comentário

Lembre-se Abhyasa, prática disciplinada.

भवQWययो 1वदे हQकृ2तलयानम ् ॥१९॥

bhavapratyayo videhaprakRîtilayAnAm ||19||

1.19 - Este é o sentimento dos que estão incorpóreos na Criação. Tal sentimento nasce da persistência
do Eu.

Comentário

Essa compreensão é alcançada no Samprajnata samadhi ou samapatis (primeiros estágios de samadhi).

qwधावीयSCम2ृ त समा$धQ[ापव
ू क
S इतरे षाम ् ॥२०॥

shraddhAvIryasmRîtisamAdhiprajñApUrvaka itareShAm ||20||

1.20 - Visto que o estado que surge da prática do Samadhi desvanece-se tão logo a prática acaba,
podemos reter/prolongar isto através da fé nos shastras (escrituras) e no Guru, através da firme
disposição da vontade e através de um esforço rememorativo do Eu. Retendo assim a percepção
intuitiva do Ser nas atividades quotidianas.

Comentário

O ensinamento deste sutra é de como sustentar a compreensão do Samadhi.

20
तीyसंवेगानामासaनः ॥२१॥

tIvrasanvegAnAmAsannaH ||21||

1.21 - Isto está próximo quão mais dedicado e inquieto para atingir a libertação o praticante estiver.

Comentário

Ele está falando do Samadhi em que os mais dedicados tem mais chance de alcançar.

मद
ृ म
ु zया$धमाJWवा.तोऽ1प 1वशेषः ॥२२॥

mRîdumadhyAdhimAtratvAth tatoapi visheShaH ||22||

1.22 - Você pode querer pouco, médio ou muitíssimo (principal objetivo da sua vida). Daí vem a diferença
de como e quanto os praticantes evoluem no caminho.

Comentário

Quanto mais dedicado você for, mais próximo estará do samadhi.

ई,वरQ|णधानाwवा ॥२३॥

IshvarapraNidhAnAdvA ||23||

1.23 - Também há a via inconsciente para a obtenção do conhecimento intuitivo que é a entrega
absoluta ao Íshwara.

Comentário

Isso é um método usando a fé.

21
Nलेश कमS 1वपाकाशयैःपरामAृ टः पs
ु ष1वशेष ई,वरः ॥२४॥

kleshakarmavipAkAshayairaparAmRiShTaH puruShavisheSha IshvaraH


||24||

1.24 - Íshwara é o nosso "senhor interno", um aspecto de Púrusha (o Eu


transcendente) não afetável pelas perturbações mentais (kleshas) ou pelos resultados
das nossas ações (karma) e nem pelos depósitos no fundo da memória (ashaya) que
geram desejos e pensamentos.

Comentário

Ishwara é o observador. Por isso o karma não afeta ishwara.

तJ 2नर2तशयं सवS[बीजम ् ॥२५॥

tatra niratishayan sArvajñabIjam ||25||

1.25 - Nele (no Íshwara) está a Semente da Onisciência (Sarva-jña-bijam). Quando se


conhece o Ser não há mais nada de relevante a ser conhecido.

Comentário

O conhecimento de valor no Hinduísmo é somente esse.

22
स एष पव
ू •षाम1पगs
ु ः कालेनानव€छे दात ् ॥२६॥

sa pUrveShAmapi guruH kAlenAnavachChedAt ||26||

1.26 - Atemporal, é o mestre dos antigos mestres. Por ser o mestre interno de cada

um e de todos ao mesmo tempo. Mesmo aparentando ser vários é Um, mesmo


aparentando estar com você é Eterno, mesmo aparentando ser outro, é você.

Comentário

Para quem percebe o Purusha, sua compreensão é a mesma de um iluminado, por

isso há mantras em escrituras tantricas que dizem “eu sou Shiva”

तCय वाचकः Qणवः ॥२७॥

tasya vAchakaH praNavaH ||27||

1.27 - É representado pelo Om.

Comentário

O OM é o melhor som para a conexão.

तrजपः तदथSभावनम ् ॥२८॥

tajjapastadarthabhAvanam ||28||

1.28 - Conecta-se Íshwara através da repetição e meditação constante no Om.

23
ततः QWयNचेतना$धगमोऽHयaतरायाभव,च ॥२९॥

tataH pratyakchetanAdhigamoapyantarAyAbhAvashcha ||29||

1.29 - Então a mente se introverte conhecendo o Si Mesmo e supera-se as

limitações/obstáculos.

Comentário

As limitações que impediam o samadhi, será explicado no próximo sutra quais são

eles.

‚या$ध CWयान संशय QमादालCया1वर2त ƒािaतदशSनाल_धभIू मकWवानविCथतWवा2न $च.1वXेपाः


ते अaतरायाः ॥३०॥

vyAdhistyAnasanshayapramAdAlasyAvirati
bhrAntidarshanAlabdhabhUmikatvAnavasthitatvAni

chittavikShepAsteantarAyAH ||30||

1.30 - Os limitadores são as dispersões mentais (na ordem que surgem no

praticante): (1) desinteresse, (2) preguiça, (3) doença, (4) dúvida, (5) falta de

realização/percepção do que é o yoga, (6) idéias erradas por divagações ou


ensinamentos de um guru não realizado (não-liberto), (7) volubilidade mental (o que

deixa a prática instável e fácil de ser abandonada por opiniões de terceiros, pressão

social ou falta de firme vontade), (8) falta de sensibilidade para sentir o caminho e (9)

desatenção.

24
दःु खदौमSनCया…गमेजयWव,वासQ,वासाः 1वXेप सहभव
ु ः ॥३१॥

duHkhadaurmanasyAñgamejayatvashvAsaprashvAsA
vikShepasahabhuvaH ||31||

1.31 - Os sintomas destes limitadores são: infelicidade (dor emocional), desespero


depressivo, agitação nervosa e respiração ofegante (comparada com a respiração de
um yogi).

Comentário
Estas são as consequências das dispersões.

तWQ2तषेधाथSमेकत†वाiयासः ॥३२॥

tatpratiShedhArthamekatattvAbhyAsaH ||32||

1.32 - Para evitar isso o yogi deve concentrar-se (vivenciar) no Atman, o seu Eu real.

Comentário
Atman é uma individualização do Purusha.

मैJी कsणा म‡ु दतोपेXाणांसख


ु दःु ख पu
ु यापu
ु य1वषयाणां भावनातः $च.Qसादनम ् ॥३३॥

maitrIkaruNAmuditopekShANA.n
sukhaduHkhapuNyApuNyaviShayANAn

bhAvanAtashchittaprasAdanam ||33||

1.33 - Projetar cordialidade, compaixão, alegria e equanimidade com as coisas e


pessoas, sejam elas o que forem, pacifica (prasadam) a consciência (chitta).

25
Q€छदS न1वधारणाiयां वा QाणCय ॥३४॥

prachChardanavidhAraNAbhyAn vA prANasya ||34||

1.34 - Alcança-se isso através de uma respiração profunda e calma com atenção aos
intervalos de não-movimento existentes entre os sucessivos movimentos, e tendo
consciência de que você é o Observador.

Comentário
Lacunas de silêncio, tudo vem do silêncio e volta ao silêncio.

1वषयवती वा Qव1ृ .sWपaना मनसः िCथ2त 2नबिaधनी ॥३५॥

viShayavatI vA pravRîttirutpannA manasaH sthitinibandhinI ||35||

1.35 - Ou através da "percepção divina" (divya samvid) gerada pela "atividade


centrada num objeto" (vishayavati pravritti), que é a prática de percepção
sensorial intensa quando você se entrega/abre-se a uma profunda percepção
de uma sensação ligada aos 5 sentidos: um aroma, um sabor, um toque. Uma
espécie de enlevo estético, por exemplo, que concentre a mente a tal ponto
que a leva ao nirodha.

Comentário

Karma Yoga é em essência esse sutra.

26
शोका वा rयो2तAमती ॥३६॥
vishokA vA jyotiShmatI ||36||

1.36 - Ou pela luz do discernimento que elimina todo o pesar.

Comentário
A luz é o autoconhecimento.

वीतराग 1वषयम ् वा $च.म ् ॥३७॥

vItarAgaviShayan vAchittam ||37||

1.37 - Ou quando a mente está desfocada dos objetos dos sentidos (pratyahara).

Comentário

Pratyahara = abstração dos sentidos.

CवHन2न@ा [ानालdबनम ् वा ॥३८॥

svapnanidrAj~nAnAlambana.n vA ||38||

1.38 - Ou pelo conhecimento intuitivo que vem quando dormimos.

Comentário

As informações captadas através dos sonhos são de grande valia para o


autoconhecimento.

27
यथाIभमतzयानाwवा ॥३९॥

yathAbhimatadhyAnAdvA ||39||

1.39 - Ou por meditar em qualquer coisa que lhe agrade.

Comentário

Algo que agrada, prende mais a mente.

परमाणु परममह†वाaतोऽCय वशीकारः ॥४०॥

paramANu paramamahattvAnto.asya vashIkAraH ||40||

1.40 - Ao exercitar Atman (o Ser, o Verdadeiro Eu) ele estende-se desde as menores
partículas aos corpos celestiais.

Comentário

Tudo é uma única consciência observadora.

Xीणव.
ृ ेरIभजातCयेव मणेˆह
S mतˆ
ृ हणˆा‰येषु तWCथतदLजनता समाप1.ः ॥४१॥

kShINavRitterabhijAtasyeva maNergrahItRigrahaNagrAhyeShu

tatsthatadañjanatA samApattiH ||41||

1.41 - Quando os vrittis se enfraquecem, ocorre o estado de "coincidência"


(samapatti) entre o observador e o observado. Então o brilho da jóia (Atman, que até
agora aparentava estar somente no observador), mostra-se no observado, revelando
que só há a Observação.

28
तJ श_दाथS[ान1वकUपैः संकŠणाS स1वतकाS समाप1.ः ॥४२॥

tatra shabdArthajñAnavikalpaiH sankIrNA savitarkA samApattiH ||42||

1.42 - Quando praticamos sthula dhyana (meditação sobre um objeto grosseiro,


como uma vela) temos origem ao início dos samapatti (um semi-samadhi, porque
samadhi mesmo só se inicia como prática real no "samadhi sem semente")

Quando esse samapatti é acompanhado de algum palavratório mental (mesmo que


muito suave) chama-se savitarka.

Comentário

Samapatti são samadhis com semente, os primeiros níveis de samadhi.

Cम2ृ तप‹रशw
ु धौ CवDपशa
ू येवाथSमाJ2नभाSसा 2न1वSतकाS ॥४३॥

smRitiparishuddhau svarUpashUnyevArthamAtranirbhAsA nirvitarkA


||43||

1.43 - Menospreze este falatório e mantenha-se firme em sua sadhana, então o


sthula dhyana refletirá o objeto de meditação em sua forma pura (mostrará sua
essência, que é o Atman refletido naquilo)

Comentário

O yogin vê nas coisas e nas pessoas não a ideia conceitual que as define, mas as vê
como projeções/emanações de seu Eu (Atman-Brahman).

29
एतयैव स1वचारा 2न1वSचारा च सŒ
ू म1वषय ‚याtयाता ॥४४॥

etayaiva savichArA nirvichArA cha sUkShmaviShayA vyAkhyAtA ||44||

1.44 - Da mesma forma se explicam o estado de samapatti (coincidência) entre o


observador e o observado em sukshma dhyana (meditação sobre um objeto sutil,
como um som) quando há discriminação (vichara) mesmo que sutil (por isso também
ser um pensamento, mesmo que bem sutil). Estes estados são savichara e nirvichara
e são muito mais sutis.

Comentário

Essa são as meditações sutis.

सŒ
ू म1वषयWवdचाIलuग पयSवसानम ् ॥४५॥

sUkShmaviShayatvan chAliñgaparyavasAnam ||45||

1.45 - Esta gradual sutileza do nirvichara (o 4° nível de samadhi) estende-se até a


fronteira entre aquilo que ainda pode ser percebido e aquilo que não pode ser
percebido (por ser aquele que percebe). O "indiferenciado" (Alinga).

Comentário

Alinga é Quem observa. A consciência pura.

30
Conclusões finais

O Este é apenas o primeiro capítulo dessa obra clássica, mas temos certeza que este trecho
já tem muito a nos ensinar sobre autoconhecimento.

O Yoga-Sutra é um livro prático para Meditação ao mesmo tempo que traz


informações relevantes para o processo de investigação pessoal e
autoconhecimento.

A sabedoria do Yoga-Sutra pode ser usada tanto no dia a dia do yogin quanto
na sua prática. Espero que essa sabedoria tenha iluminado o seu caminho e
que você retorne a esses ensinamentos regularmente na sua trajetória.

Namastê!

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