Leticia Vitoria 3

Fazer download em docx, pdf ou txt
Fazer download em docx, pdf ou txt
Você está na página 1de 4

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃO


DEPARTAMENTO DE LETRAS

PORTUGUÊS 3 – MORFOSSINTAXE II
AVALIAÇÃO 2

Aluna: Letícia Vitória Farias da Silva

TEXTO

família é bom e todo mundo quer? ahn... talvez não. essa história de proximidade compulsória
com mãe, pai, tio, irmão, avó nem sempre nos faz bem. até porque, não é todo mundo que tem
uma relação boa com esse ambiente familiar, então, por que obrigar as pessoas a fazer algo
que elas não querem? almoço de domingo na casa do vô? tem quem prefira encontrar a
família que escolheu pra si (alô, amigas, bora tomar uma?) ou só ficar na minha própria
companhia mesmo. passar pano pra familiar racista só porque "é o tio que te viu crescer", ou
pra parente homofóbico porque "vocês eram tão próximos!" não vale o estresse emocional.
bora normalizar o "não" familiar? e aceitar que família é um bicho complexo e diferente pra
todo mundo e que, às vezes, tá bem longe da família margarina que a gente invejava em
comercial dos anos 90? de obrigação já bastam os boletos a pagar, será que a gente não pode
olhar de forma mais fluída pra essa coisa chamada família e tirar esse peso da obrigação е das
nossas costas? fica aí a reflexão.
ANÁLISE
Com a prática social de criar textos que serão exclusivamente compartilhados em uma
rede social consideravelmente nova, consigo ver, nesse contexto, o surgimento de um gênero
textual novo, o texto de Instagram, ou textão de Instagram, como chamam os usuários, que
estão acostumados a fotos acompanhadas de pequenos textos. O gênero é utilizado por
usuários que, em sua maioria, querem expressar os sentimentos acerca de acontecimentos na
própria vida ou na vida de terceiros, ou, como fazem os perfis profissionais, informar sobre os
mais variados temas.
O texto se dá em um único parágrafo, e sua linguagem não tem compromisso com regras
gramaticais, é informal - mostrado em traços como a primeira letra do texto/após ponto final
ser minúscula, por exemplo -, e carrega um tom de conversa com o leitor, do qual a página se
intitula amiga, e como tal, dá conselhos para lidar com problemas do cotidiano que, de
alguma forma, possam afetar a saúde mental. Esse tipo de conteúdo tem sido bem mais
comum no Instagram desde o início dos lockdowns, isto é, o isolamento necessário ao
momento pandêmico, que causou o aumento de doenças mentais, causadas pelo luto, pelo
distanciamento com entes queridos, enfim, pelo desespero de se estar vivendo um surto viral
universal.
A estrutura de textos como esse tem algumas estruturas impessoais, usadas para convencer
o leitor da perspectiva do autor acerca do tema do texto, isto é, uma maneira saudável de lidar
com problemas familiares.
Assim, para começar o texto, o autor usa uma frase fruto de senso comum: "família é bom
e todo mundo quer", e, a seguir, precedido por um elemento marcador de hesitação - "ahn",
que é proveniente de textos orais, normalmente antecedendo uma expressão de negação.
Nesse caso "talvez não" - começa a desconstruir o que essa frase impõe, transmitindo a
mensagem do texto, que tenta quebrar o ideário da sociedade que leva e, algumas vezes,
obriga as pessoas a viverem com e perdoarem as pessoas que não lhes fazem/fizeram bem,
apenas pelo fato de compartilharem "o mesmo sangue".
A partir da terceira linha do texto, o autor utiliza perguntas para oferecer sugestões de
substituição de eventos familiares e até mesmo tipos de parentes que podem fazer as pessoas
se sentirem mal: almoço de domingo na casa do vô, tio racista, parente homofóbico. Nesse
trecho, é evidente que o que é dito é baseado numa experiência própria de quem escreve,
dadas as situações bem particulares usadas como exemplo. Além disso a expressão "só ficar
na minha" é um marcador da subjetividade com a qual o texto foi escrito. Outras expressões
postas entre aspas, como se fossem ditas por parentes, também podem ser frutos de vivências
de quem escreveu, tais como: " 'é o tio que te viu crescer'" e "'vocês eram tão próximos'". Há
outros marcadores de subjetividade no texto, como a predominância de verbos conjugados em
terceira pessoa do plural - como na segunda linha: "não é todo mundo que tem uma relação
boa com esse ambiente familiar" .
Na parte do texto iniciada na sexta linha, são elencados alguns conselhos para lidar com
as situações de mal estar entre familiares, em um deles, "família [...], às vezes, tá bem longe
da família margarina que a gente invejava em comercial dos anos 90", infere-se que esta seja
a família perfeita, que se senta à mesa sorrindo e sempre se abraçando, mas que, por cada
grupo familiar ser composto por pessoas diferentes, isso não deve ser uma obrigação. Para
enfatizar essa não obrigatoriedade, o autor diz que "de obrigação já bastam os boletos a
pagar", querendo dizer que a obrigação de ter uma família perfeita não deve ser tão
importante quanto outras reais obrigações da vida adulta.
No que se refere à relação entre escritor e leitor, o autor do texto demonstra, por meio de
alguns marcadores de discurso, ora intimismo, ora afastamento. No trecho “essa história de
proximidade compulsória com mãe, pai, tio, irmão, avó nem sempre nos faz bem”, o pronome
pessoal do caso oblíquo "nos" sugere proximidade, já que não fala somente sobre si e nem
somente sobre o outro. Trata-se, na verdade, da ideia de conjunto, que conforta o leitor em
saber que não está só. Já em “ou só ficar na minha própria companhia mesmo”, o autor
demonstra que, ainda que seja adicionada certa proximidade, a distância e o espaço pessoal
são barreiras necessárias dentro das questões contextuais e dentro da própria gramática.
No início da parte conclusiva do texto, a sentença "bora normalizar o 'não' familiar?" é
introduzida por um marco oral - a variação “bora” como sinônimo de “vamos”- com objetivo
de dar um tom de convite ao leitor, que se sente apoiado pelo escritor a seguir a atitude
proposta, a normalização do “não”. Logo em seguida, a oração coordenada sintética aditiva "e
aceitar que família é um bicho complexo e diferente pra todo mundo e que, às vezes, tá bem
longe da família margarina que a gente invejava em comercial dos anos 90?" aparece e
percebe-se que a pontuação entre os dois enunciados rompe a progressão da estrutura, o que
aponta um desvio da norma-padrao do português Apesar de ser identificada como um desvio
gramatical, essa "falha" é comum e aceita dentro da intencionalidade do texto, que é passar
uma informação de maneira amadora e pessoal.
Ademais, no texto é predominante o uso de verbos no tempo presente do indicativo,
indicando que seus objetivos não dizem respeito somente à transmissão de informações, mas
também à indução dos leitores quanto à existência de similaridades entre eles e o autor e, além
disso, querendo convencê-los quanto a sua perspectiva de atitude ideal a ser tomada.
Por fim, é possível observar a importância da imagem que acompanha o texto, pois é
possível ler nela a mensagem que o autor quer passar, podendo ter servido como título do
texto, ou seja, o elemento que atrai o leitor, visto que, antes de ler textos no Instagram,
comumente são lidas as fotos que são postadas acima dele.
Dados os apontamentos desta análise, revela-se como os artifícios sintáticos desempenham
as funções dissertativas e informativas do texto, sendo cumpridos os preceitos de seu gênero,
que são: prender a atenção dos leitores, informar sobre algum fato e propor um ponto de vista
a ser seguido para que haja interação - curtidas, comentários ou compartilhamentos do post -
dentro e fora do Instagram.

Você também pode gostar