História de Sinop
História de Sinop
História de Sinop
Introdução
1
Programa criado pelo Governo Federal na década de 1940, que incentivava o progresso e a ocupação da região
Centro-Oeste do Brasil, para que se pudesse ocupar o “espaço demográfico vazio”, pois havia muitas terras
“desocupadas”.
87
região pela política de colonização do governo sob o regime militar. (LORD, 2011). Ou seja, a
região passou a ser ocupada por migrantes principalmente vindos do Sul do País. No entanto, o
governo teve como prática o silenciosamente e a expulsão de grupos sociais já residentes na
região.
fotos que eram propagandeadas pela colonizadora, que exaltavam os fatores climáticos, como
a ausência de geadas e de chuvas constantes.
Podemos constatar essas assertivas, também, no seguinte excerto de entrevista realizada
com um pioneiro de 57 anos, morador da região central da cidade de Sinop, que chegou ao
município em 1977:
Olha, o meu pai, o sonho dele era o café, a plantação de café. Como mostravam
fotos falsa na época, pra trazê o pessoal pra cá, fazendas de cafezais aqui na
cidade que nunca existiu, meu pai foi um dos que se iludiu com o café que
nunca teve no Mato Grosso, aqui na nossa região também não. Mostrado pela
própria Colonizadora Sinop. Foi uma decepção total. Luz só tinha na escola,
que era da Colonizadora e ligava na escola. Tudo era decepcionante, não tinha
nada, foi decepcionante quando chegamos aqui. (Entrevistado A2)3.
Além da frustração com as ‘falsas’ propagandas divulgadas pela colonizadora por meio
de folders e fotografias que enalteciam a Gleba Celeste como terra ‘fértil’, sobre cafezais que
não ‘existiam’ e com o insucesso na produção do café e outras culturas por causa do solo e à
falta de financiamento aos colonos, os primeiros migrantes enfrentaram também dificuldades
em relação à moradia, à malária e à febre amarela, bem como dificuldades no período de chuva4.
Conforme é enfatizado na entrevista com o pioneiro entrevistado A, “as condições de moradia
eram difíceis, as casas eram levantadas com lonas, sem piso e divisórias, eram tudo provisórias
[...] a febre amarela era epidemia na região”.
Com o declínio da produção da agricultura, a falta de recursos e financiamentos do
governo federal, inicia-se então, uma expansão na extração e instalação de madeireiras,
desenhando-se o cenário do setor madeireiro na região. Conforme Philippsen (2013, p. 67), “a
madeireira tornou-se, consequentemente, o principal produto de industrialização e de
comercialização da região”.
Segundo Teixeira (2006), a madeira foi a principal fonte de renda no início da ocupação
da região, já que a madeira era encontrada em abundância e precisava ser retirada para o
processo de ocupação, o que garantiria de certa forma a posse da terra.
2
Apesar do sujeito entrevistado conceder a entrevista e sua divulgação, não foi autorizado a revelação de sua
identidade.
3
Procurou-se preservar a variação fônica ou da pronúncia características de todos os entrevistados.
4
O período de chuvas compreende-se entre os meses de novembro a abril. Entre os meses de maio a outubro é o
período relativo à seca.
90
Dessa forma, o trabalho na extração de madeira nas décadas de 1970 e 1980 passa ser a
principal atividade econômica na região mediante as instalações do setor madeireiro no norte
mato-grossense, que ganham forças com a expansão de empresas das regiões sul e sudeste do
país, visto que muitos dos trabalhadores das madeireiras foram funcionários deslocados para a
região e junto trouxeram a família que passa a depender exclusivamente das condições de
moradia e educação que eram ofertadas pelas empresas. Assim, este trabalho foi o pilar na
formação da sociedade local (LORD, 2011).
Entretanto, conforme Philippsen (2007), a atividade no setor madeireiro, que teve
apogeu na década de 80, passa a entrar em declínio já no início da década de 90. Como podemos
verificar no fragmento abaixo:
a atividade madeireira, tão explorada e difundida nos anos 80, não conseguiu
se estabilizar e nem garantir ganhos substanciais aos empresários madeireiros.
Sem infra-estrutura, sem investimentos e recursos para se capitalizar e sem
incentivos políticos governamentais para o fortalecimento do setor, o
madeireiro, em geral com um perfil de pouca instrução (escolaridade) e de
gerenciamento muito abaixo dos padrões exigidos para uma inserção
competitiva nos mercados nacionais e internacionais, não encontra apoio para
prosseguir na atividade (PHILIPPSEN, 2007, p. 24).
A partir da década de 1990 inicia-se, então, um avanço no setor agrícola com a produção
de milho, arroz e a soja como carro chefe. De acordo com Lacerda (2013, p. 25), passam a se
instalar na região as grandes companhias internacionais voltadas ao desenvolvimento do setor
agrícola. Dentre as companhias o autor destaca a Bunge5, Cargill6 e a ADM7. Assim, o objetivo
da ocupação dessas áreas passa da colonização e fundação de cidades para um novo processo,
a “expansão cada vez maior da produção de grãos, destinada à exportação”.
5
“BUNGE: Bunge Corporation, baseada em Saint Louis. Tem unidades industriais, silos e armazéns nas
Américas do Norte e do Sul, Europa, Ásia, Austrália e Índia, além de escritórios da BGA (Bunge Global
Agribusiness) atuando em vários países europeus, americanos, asiáticos e do Oriente Médio. No Brasil, controla a
Bunge Alimentos, a Bunge Fertilizantes e a Fertimport.
6
CARGILL: é uma multinacional norte-americana fundada em 1865 por W.W. Cargill em Iowa. Atualmente
comercializa, processa e distribui produtos agrícolas, alimentícios, financeiros e industriais em 59 países. Sua sede
está em Minneapolis (Minnesota – EUA).
7
ADM: Archer Daniels Midland, com sede em Decatur, Illinois (USA), processa ingredientes especiais para
rações e produtos alimentícios” (LACERDA, 2013, p. 25).
91
Atualmente, Sinop conta com uma população de132.934 habitantes (estimativa IBGE8,
2016), é considerada como um dos mais importantes municípios de Mato Grosso devido ao seu
importante papel no setor do agronegócio e prestação serviços. Além de estar situada em uma
área de expansão da atividade agrícola moderna e de produção agroindustrial, influenciam, “na
atual sustentação econômica, a múltipla prestação de serviços e um comércio varejista e
atacadista estruturado”, além da caracterização do alto uso tecnológico na utilização de insumos
agrícolas e maquinários (empresas especializadas nessa área) e centralização de prestação de
serviços públicos e privados (MOURA, 2014, p. 06). Em relação a prestação de serviço,
concentram-se na parte central, com serviços diversificados, com um grande número de
estabelecimentos comerciais, tais como vestuários, mobiliários, saúde, educação,
eletrodomésticos, serviços bancários, produtos agropecuários e implementos agrícolas.
A cidade destaca-se também na área educacional, sendo considerada ‘cidade
universitária’. De acordo com Philippsen (2013, p. 80), “são nove faculdades que oferecem
mais de 60 cursos de nível superior, com destaque para a Universidade Federal de Mato Grosso
(UFMT) e à Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT)”.
Composta atualmente por migrantes de todas as regiões do país, fato que se deve ao
processo histórico de colonização, contudo a existência de traços que remetem à identidade
cultural sulista é notavelmente presente na cidade de Sinop, fato que se justifica pelas políticas
de colonização incentivadas pelo governo militar em parceria com empresas privadas
provenientes da região sul do país, conforme já supracitado, e enaltecido no seguinte excerto
de Moura:
8
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dados retirados em:
<http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=510790&search=mato-grosso%7Csinop>.
Acesso em 15 de jan. de 2017.
92
Conforme a fala do entrevistado acima, a família do entrevistado veio para a região norte
mato-grossense com o intuito de trabalhar com a pecuária, atividade já exercida no Paraná,
iniciando assim, logo que chegaram com a atividade pecuária, no entanto, não obtendo bom
resultado com a atividade, e com a advento do setor agrícola na região, aliado as características
peculiares, tal como a planície, o clima e o solo, fizeram com que despertasse o interesse
econômico na área de produção agrícola, passando a exercer a atividade a partir da década de
90 com a produção de milho e soja.
Desta forma, a partir dos anos 90 em torno da rodovia BR-163 se desenvolve a
agricultura modernizada e fortemente voltada para a produção de grãos com vistas ao mercado
externo.
De acordo com estudos de Pereira (2007, p. 33), “a agricultura mato-grossense é
responsável pela maior parte do dinamismo vivenciado pela economia do Estado nos últimos
anos. [...] o crescimento recente do PIB de MT tem sido liderado pelo incremento da sua
produção agropecuária”.
Conforme Junior (2014, p. 109), a soja é o principal produto cultivado e move a
economia local. Segundo dados deste autor, o cultivo da soja foi se expandindo na região e se
tornou a principal atividade econômica, “obtendo mais de 8 milhões de hectares plantados na
safra 2013/14 e respondendo por 60% do valor das exportações”.
Segundo as estimativas do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária
(IMEA), a produção é de 9.396.349 milhões de hectares plantados e 30.469.579 milhões de
toneladas de soja em Mato Grosso para a safra de 2016/17, com um aumento de 0,91% a safra
anterior 2015/20169. Somente para a região médio norte que abarcam as cidades de Cláudia,
9
Dados retirados do site da Aprosoja/MT. Disponível em:
<http://www.imea.com.br/upload/publicacoes/arquivos/05122016165335.pdf>. Acesso em 18 de jan. de 2017.
94
Feliz Natal, Ipiranga do Norte, Itanhangá, Lucas do Rio Verde, Nova Maringá, Nova Mutum,
Nova Ubiratã, Santa Carmem, Santa Rita do Trivelato, São José do Rio Claro, Sorriso, Tapurah
e União do Sul e Sinop a estimativa na safra de 2016/2017 foi de 3.166.217 milhões de hectares
plantados na macrorregião.
A seguir, no mapa da figura 1, podemos observar a quantidade produzida da soja em
2006 nos municípios brasileiros, e em menos de uma década, mais especificamente 7 anos
depois, percebe-se um aumento considerável da produção de soja na Amazônia Legal em 2013,
no mapa 2.
Mato Grosso lidera a produção de soja no Brasil, e é conhecido como o celeiro do país.
Conforme pudemos constatar nos dados estatísticos e nos gráficos acima, a produção da soja
exerce uma nítida supremacia na agricultura mato-grossenses e na economia do estado.
10
PRODES é um projeto do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que realiza o monitoramento por
satélite do desmatamento na Amazônia Legal e produz as taxas anuais de desmatamento na região, usadas pelo
governo brasileiro para o estabelecimento de políticas públicas.
11
Taxas anuais de desmatamento em: <http://www.obt.inpe.br/prodes/prodes_1988_2016n.htm>. Acesso em 20
de jan. de 2017.
97
Amapá 24 km²
Maranhão 261 km²
Mato Grosso 1508 km²
Pará 3025 km²
Rondônia 1394 km²
Roraima 209 km²
Tocantins 80 km²
Total 7989 km²
Fonte: ISA, 2016 – modificado pela autora
Considerações finais
Referências Bibliográficas
JUNIOR, Valdemar João Wesz. O Mercado da Soja e as Relações de Troca Entre Produtores Rurais e
Empresas no Sudeste de Mato Grosso (Brasil). Tese de Doutorado. Rio de Janeiro: Universidade Rural do Rio
de Janeiro, 2014.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Disponível em:
<http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=510790&search=mato-grosso%7Csinop>.
Acesso em 15 de jan. de 2017.
ISA, Instituto Socioambiental. Desmatamento na Amazônia explode entre 2015 e 2016. Disponível em:
https://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-socioambientais/desmatamento-na-amazonia-explode-entre-2015-
e-2016. Acesso em 09 de dez. de 2017.
IMEA. Soja: Estimativa de Aérea. Disponível
em:<file:///C:/Users/Andressa%20Farias/Faculdade%20Letras/MESTRADO%20LINGU%C3%8DSTICA%202
016/1%C2%B0%20SEMESTRE/FRONTEIRA%20-
%20CRISTINNE/TEXTOS%20PARA%20ARTIGO/Estimativa.pdf>. Acesso em 19 de jan. de 2017.
LACERDA, Natalício Pereira. Políticas Públicas, Ocupação do Espaço e Desenvolvimento na Região Norte
Mato-Grossense: uma análise crítica dos municípios de Sinop e de Lucas do Rio Verde – MT. Tese de
Doutorado. Santa Cruz do Sul: Universidade de Santa Cruz do Sul, 2013.
LORD, Lucio. Trabalho, Educação e Cultura: considerações sobre o terceiro movimento de ocupação da
Amazônia matogrossense e formação da sociedade local. Revista Educação, Cultura e Sociedade - Sinop/MT,
v.1, n.2, p.175-187, 2011.
MAPA, IBGE. Mapa 2 – Geografia da produção de soja na Amazônia (2013). Disponível
em:<https://journals.openedition.org/confins/docannexe/image/9949/img-5.png>. Acesso em 17 de set. 2017.
MAPA, IBGE. Mapa 1 – Geografia da produção de soja na Amazônia em 2013. Disponível
em:<http://www2.fct.unesp.br/nera/atlas/arq_capitulos/cgc/mapa_10.2.png>. Acesso em 17 de set. 2017.
MOURA, Edenilson Dutra. A Produção da Cidade Universitária no Norte de Mato Grosso: Sinop de Gleba a
pólo estudantil de nível superior. Anais do VII CBG. Universidade Federal de Mato Grosso, 2014.
100
PICHININ, Érica dos Santos. O contexto do avanço da fronteira agrícola na Amazônia: algumas reflexões sobre
desenvolvimento regional no norte de mato grosso/MT. Revista Formação, n°14 volume 2 – p. 70‐79, 2012.
PHILIPPSEN, Neusa Inês. A Constituição do Léxico Norte Mato-Grossense na Perspectiva Geolinguística:
abordagens sócio-semântico-lexicais. Tese de Doutorado. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2013.
________________. Mídia Impressa e Heterogeneidade: polêmicas da esfera da atividade madeireira no
espaço discursivo da Amazônia Legal. Dissertação de Mestrado. Cuiabá: Universidade Federal de Mato Grosso,
2007.
PEREIRA, Benedito Dias. Mato Grosso: Principais eixos viários e a modernização da agricultura. Cuiabá, MT:
EdUFMT, 2007.
SANTOS, Milton. O Espaço Dividido. São Paulo: Edusp, 2004, 440p.
SOUZA, Edison Antônio de. Mato Grosso: a (re)ocupação da Terra na fronteira Amazônica estado e políticas
públicas. Tempos Históricos Volume 16 - 2º Semestre de 2012, p. 127 – 144.
_________________. Sinop: história, imagens e relatos um estudo sobre a sua colonização. Cuiabá:
EdUFMT/FAPEMAT, 2ª ed. 2006.
TEIXEIRA, Luciana. A Colonização no Norte de Mato Grosso: o exemplo da Gleba Celeste. Dissertação de
Mestrado. Presidente Prudente: Universidade Estadual Paulista, 2006.