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Direito Administrativo - Ponto 2

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................................................ 4

1. DOUTRINA (RESUMO)................................................................................................... 5

2. QUESTÕES ................................................................................................................... 13

3. GABARITO COMENTADO ............................................................................................ 15

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APRESENTAÇÃO

Amigos,
Objetivando contextualizar o segundo ponto do nosso edital e complementar
o conhecimento com temas correlatos, nosso material aborda (i) a origem do Direito
Administrativo, (ii) a noção de Administração Pública, de função administrativa e de
reserva de administração, (iii) o conceito e objeto do Direito Administrativo e,
finalmente, (iv) os sistemas de jurisdição.
Espero que gostem,
Professor Bruno Pinto.

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1. DOUTRINA (RESUMO)
1.1. ORIGEM DO DIREITO ADMINISTRATIVO

A teoria da tripartição dos poderes, que teve como maior mentor Charles
MONTESQUIEU (Espírito das Leis, de 1748), abriu caminho para o surgimento do Direito
Administrativo, ao estabelecer a necessidade de distribuição do poder estatal entre
diferentes órgãos, separando e delimitando as funções legislativa, executiva e judiciária.
Na França, o art. 13 da Lei nº 16/1790 previu a separação rígida dos Poderes.
Some-se a isso o nascimento do Estado de Direito, o qual, à luz das ideias
iluministas do final do século XVII e início do XVIII, no embalo das Revoluções
Constitucionalistas Norte-Americana (1787) e Francesa (1789), estabeleceu que todos,
inclusive o Estado, estão submetidos ao Direito posto. Compreende-se, então, que a
organização e funcionamento dos órgãos estatais, em suas relações internas e externas,
não escapam à disciplina da lei.
A doutrina aponta como marco inicial do Direito Administrativo a edição, na
França Pós-Revolucionária, da Lei 28 de Pluvioso do Ano VIII (algo em torno de 1800),
diploma normativo da organização da Administração Pública francesa. Acrescenta-se,
ainda, o importante trabalho da jurisprudência do Conselho de Estado francês,
responsável pela construção de importantes institutos administrativistas, a exemplo da
noção de serviço público.
O Conselho de Estado francês foi criado pela Constituição de Brumário de 1799, 5
com a dupla função de assessorar o governo na elaboração de atos normativos e de
resolver as controvérsias administrativas. Tal competência contenciosa, contudo, era
ainda incipiente, eis que suas decisões estavam submetidas ao Chefe de Estado, a quem
competia dar a última palavra, naquilo que se chamava “justiça retida”. Somente a partir
de 1872 é que o Conselho de Estado ganha autonomia, com decisões não mais sujeitas
ao controle do Executivo, assumindo verdadeira função jurisdicional, decidindo com
independência e definitividade. A Administração Pública contenciosa define-se, então,
de forma clara e apartada, iniciando-se a fase da intitulada “justiça delegada”. A
doutrina explica o surgimento do Conselho de Estado na França a partir da desconfiança
da burguesia revolucionária que ascendia ao poder em relação aos membros do
Judiciário, estes que se teriam mostrado comprometidos com o Ancien Régime.
Aponta-se como marco para autonomia do Direito Administrativo Francês o
famoso Caso Blanco: Agnès Blanco, uma menina de 05 anos, foi atropelada por uma
vagonete de uma companhia estatal e seu pai ingressou com uma ação de
responsabilidade civil contra o Estado, momento em que se instaurou controvérsia
acerca de qual Justiça teria competência para julgar o caso, a Comum, através da Corte
de Cassação, ou a Administrativa, por meio do Conselho de Estado, no qual o Tribunal
de Conflitos estabeleceu que o serviço público seria o critério divisor das Justiças
Comum e Administrativa, conferindo ao Direito Administrativo, por tabela, um
instituto/princípio próprio, o serviço público.
Para além da França, que nos legou os importantes institutos, princípios e
teorias do serviço público, ato administrativo, contrato administrativo, responsabilidade
civil do Estado e regime jurídico administrativo marcado por prerrogativas e restrições,

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outros países influenciaram decisivamente a construção do Direito Administrativo: a
Itália, com a noção de mérito administrativo, interesses públicos primário e secundário
e sujeições geral e especial; a Alemanha, por meio dos estudos sobre direitos
fundamentais, conceitos jurídicos indeterminados e princípios da proporcionalidade,
segurança jurídica e proteção da confiança; e a Common Law anglo-americana, que nos
brindou com a unicidade de jurisdição, o due process of law, as teorias sobre regulação
e agências e a concepção das parcerias público-privadas. Costuma-se acrescentar, ainda,
o papel da doutrina social da igreja, que muito trabalhou a ideia de função social da
propriedade e da subsidiariedade estatal.
Por fim, registre-se que foi em 1819, em Paris, que se criou a primeira cátedra
de Direito Administrativo, sendo que, no Brasil, ela somente veio a surgir com o Decreto
608/1851. A primeira obra doutrinária brasileira foi publicada apenas em 1857, em
Recife, com o nome de “Elementos de Direito Administrativo Brasileiro”, do autor
Vicente Pereira do Rego.

1.2. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, FUNÇÃO ADMINISTRATIVA E RESERVA DE


ADMINISTRAÇÃO

Preliminarmente, cumpre esclarecer o conceito de Administração Pública: em


sentido formal, orgânico ou subjetivo, é o conjunto de órgãos e agentes estatais no
exercício da função administrativa; em sentido material ou objetivo, equivale à “função
administrativa”, compreendida como a atividade administrativa do Estado de realização
6
do interesse público.
A função administrativa não se confunde com a função política, pois,
enquanto esta corresponde às altas escolhas do Governo, de gestão superior da vida
estatal, marcada por ampla discricionariedade, aquela atua, de modo subordinado,
dentro dos limites da competência executiva, na concretização dos interesses públicos,
através da prestação de serviços públicos, exercício do poder de polícia, regulação e
fomento estatais e controle administrativo.
Por oportuno, sobreleva destacar que essa função administrativa – de
concretização dos interesses públicos, sempre nos limites da lei – não é exercida tão
somente pelo Poder Executivo, sendo também desempenhada, de forma atípica, pelos
Poderes Legislativo e Judiciário, nas hipóteses expressas da Constituição. Repita-se: há
exercício de função administrativa por todos os Poderes.
Diretamente relacionada com o conceito de função administrativa, com
fundamento de validade no princípio da separação dos poderes (art. 1º, CF/88), temos
a noção de “reserva (geral) de administração”, compreendida como um núcleo duro de
competências próprio da Administração Pública, infenso à intromissão dos demais
Poderes, relativo à sua organização e funcionamento, bem como à execução das leis,
inclusive no exercício da discricionariedade administrativa. Essa noção de reserva geral
de administração está intimamente ligada com os limites da atividade legislativa e do
controle judicial sobre a Administração Pública, fixando o norte de que não cabe ao juiz
nem ao legislador administrar.

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A doutrina fala também em “reserva específica de administração”,
concernente aos casos em que a própria Constituição Federal estabelece que
determinada matéria é da competência exclusiva do Poder Executivo, a exemplo da
competência privativa do Presidente da República para, mediante decreto (autônomo),
dispor sobre a “organização e funcionamento da administração federal, quando não
implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos” (art. 84, VI,
CF/88, conforme EC n.º 32/20011). Nesse sentido, de acordo com Maria Sylvia Zanella
Di Pietro, a partir da EC n.º 32/2001, existe uma “reserva de regulamento, sendo vedada
a intromissão legislativa nesses assuntos, sob pena de inconstitucionalidade”2.
O Supremo Tribunal Federal - STF reconhece a reserva de administração como
um princípio constitucional que impede que o Legislativo se imiscua em matérias
sujeitas à competência exclusiva do Poder Executivo. Vejamos:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO


RECEBIDOS COMO RECURSO DE AGRAVO - DECISÃO QUE SE
AJUSTA À JURISPRUDÊNCIA PREVALECENTE NO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL - CONSEQÜENTE INVIABILIDADE DO
RECURSO QUE A IMPUGNA - SUBSISTÊNCIA DOS FUNDAMENTOS
QUE DÃO SUPORTE À DECISÃO RECORRIDA - RECURSO DE
AGRAVO IMPROVIDO. - O princípio constitucional da reserva de
administração impede a ingerência normativa do Poder
Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência
administrativa do Poder Executivo. É que, em tais matérias, o
7
Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos
administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes.
Não cabe, desse modo, ao Poder Legislativo, sob pena de grave
desrespeito ao postulado da separação de poderes,
desconstituir, por lei, atos de caráter administrativo que tenham
sido editados pelo Poder Executivo, no estrito desempenho de
suas privativas atribuições institucionais. Essa prática legislativa,
quando efetivada, subverte a função primária da lei, transgride
o princípio da divisão funcional do poder, representa
comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e
importa em atuação “ultra vires” do Poder Legislativo, que não
pode, em sua atuação político-jurídica, exorbitar dos limites que
definem o exercício de suas prerrogativas institucionais.

1
Antes, esse inciso VI do art. 84 previa competir ao Presidente da República “dispor sobre a organização
e o funcionamento da Administração Federal, na forma da lei”. Com a nova redação dada pela EC n.º
32/2001, a matéria foi retirada do processo legislativo, passando a espaço reservado do Poder Executivo.
Inclusive, a Emenda também modificou o art. 88 da CF/88, para prever que “A lei disporá sobre a criação
e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública” (nova redação), e não mais que “A lei disporá
sobre a criação, estruturação e atribuições dos Ministérios”. Ainda, o inciso XI do art. 48 da CF/88 foi
alterado para estabelecer que cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República,
dispor sobre a “criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções públicas, observado o
que estabelece o art. 84, VI, “b”.
2
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella (Coord.). Direito regulatório: temas polêmicos. Belo Horizonte: Fórum,
2003. p. 566

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(STF - RE: 427574 MG, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de
Julgamento: 13/12/2011, Segunda Turma, Data de Publicação:
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-030 DIVULG 10-02-2012 PUBLIC 13-
02-2012)

Além disso, no julgamento da ADI n.º 2.806-5/RS, o STF entendeu que, dentre
outras inconstitucionalidades, a lei gaúcha em análise era contrária “ao poder de
disposição do Governador do Estado, mediante decreto, sobre organização e
funcionamento de órgãos administrativos, no caso das escolas públicas”. Outrossim, no
âmbito da ADI n.º 2601, embora o mérito não tenha sido julgado pelo STF, o Procurador-
Geral da República opinou ser possível que o Decreto Federal n.º 3.995/2001 alterasse
dispositivos da Lei Federal n.º 6.385/1976 (que criou a Comissão de Valores Mobiliários),
desde esses preceptivos legais alterados tratem de matéria reservada ao Poder
Executivo.
Mesmo antes da EC n.º 32/2001, já se encontrava na CF/88 o art. 155, § 2º, XII,
“g”, que exige convênio dos Estados e do Distrito Federal para a concessão de benefícios
fiscais referentes ao ICMS, sendo inconstitucional, por conseguinte, qualquer lei que
invada esse campo próprio da Administração (STF, ADI 286-RO. Rel. Min. Maurício
Corrêa. DJ, 30/08/2002).
Ricardo Marques de Almeida destaca que o processo legislativo é rico em
exemplos em que a reserva de administração foi o cerne da discussão:
8
O processo legislativo é rico em exemplos similares. Nesse
sentido, o Ministro da Fazenda, na Exposição de Motivos nº 213,
que resultou no referido Decreto nº 3.995/2001, registrou que
“as atribuições e a estruturação dos Ministérios e órgãos da
administração pública não mais tocam à lei, podendo ser
veiculadas em decreto autônomo – (...) espécie normativa
primária – desde que não implique aumento de despesa ou
criação ou extinção de órgãos públicos”.
Em outro exemplo também envolvendo a CVM, houve o veto
presidencial, por inconstitucionalidade, contra o art. 5º do
Projeto que resultou na Lei nº 10.303/2001, que pretendia
acrescentar o art. 21-A à Lei nº 6.385/76. Na Mensagem nº
1213/2001, o Presidente da República defendeu que as normas
que “têm por objetivo atribuir competências à Comissão de
Valores Mobiliários (...) tornaram-se, por força da Emenda
Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001, questões
reservadas a Decreto”. E o veto, diga-se de passagem, não foi
derrubado pelo Congresso Nacional.
Mais recentemente, o Presidente da República, na Mensagem nº
182/03, utilizou o mesmo argumento para vetar dispositivo do
Projeto de Lei de Conversão nº 1 de 2003 (Medida Provisória nº
79/02 – o chamado “Estatuto do Torcedor”), sobre dispositivos
que estabeleciam “atribuições ao Ministério do Esporte, que,

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por serem ínsitas à organização e funcionamento de órgão da
administração pública, devem ser objeto de decreto”.

1.3. CONCEITO E OBJETO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

Na busca de conceituar o Direito Administrativo, diversos critérios surgiram ao


longo da história para definir seu objeto, a saber:

- Corrente ou Escola Legalista/Exegética/Empírica/Caótica: de


forma reducionista, entende que o Direito Administrativo se
resume ao conjunto da legislação administrativa existente no
país e sua interpretação exclusivamente a partir da
jurisprudência dos tribunais administrativos;
- Critério do Poder Executivo: identifica o Direito Administrativo
como complexo de leis disciplinadoras da atuação do Poder
Executivo, olvidando de que este possui também a função de
governo (política) e que o Legislativo e o Judiciário também
desempenham, atipicamente, atividades administrativas, sem
falar nos particulares que atuam por delegação estatal ou em
parceria com o Poder Público;
- Critério das relações jurídicas: disciplinaria as relações jurídicas
9
entre a Administração Pública e o particular, omitindo-se quanto
às outras ações administrativas não interpessoais e à existência
dessas mesmas relações em outros ramos do Direito (Tributário,
p.ex.);
- Critério ou Escola da Puissance Publique (potestade pública):
no século XIX, Maurice Hauriou promove a distinção entre atos
de gestão, regidos pelo Direito Comum, e atos de autoridade,
submetidos a um regime jurídico extroverso, marcado por
prerrogativas exorbitantes, estas que delimitaram, justamente,
o âmbito do Direito Administrativo. O critério desconsidera que
a Administração também desenvolve suas funções submetida
predominantemente ao Direito Comum, a exemplo de quando
pratica atos negociais;
- Critério ou Escola do Serviço Público (ou de Bordeaux):
capitaneada por Leon Duguit, Gaston Jèze, Roger Bonnard e
Louis Rolland, estabelece, a partir da jurisprudência do Conselho
de Estado Frances (caso Blanco), que o serviço público seria o
verdadeiro critério definidor do Direito Administrativo [em
substituição à noção de poder público, de Hauriou]. Também se
mostrou insuficiente, contudo, dadas as diversas outras
atividades da Administração Pública;
Obs.: Gaston Jèze apresenta uma concepção de serviço público

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mais restrita, limitada à prestação de utilidades ao público,
deixando de fora, assim, funções administrativas de polícia,
intervenção e fomento, ao passo que Leon Duguit, buscando
contornar o excessivo reducionismo dessa teorização, oferece
uma visão excessivamente ampla de serviço público, abrangente
de todas as funções estatais, incursionando até mesmo por
campos outros do Direito, como o Direito Constitucional.
- Critério teleológico ou finalístico: o Direito Administrativo se
ocuparia da regulação das atividades do Estado para o
cumprimento dos seus fins;
- Critério negativista ou residual: caberia ao Direito
Administrativo normatizar todas as questões não contempladas
por outro ramo jurídico, vale dizer, todas as funções de Estado
que não fossem legislativas ou jurisdicionais;
- Critério funcional ou da Administração Pública: adotado pela
doutrina majoritária brasileira, define a função administrativa (e
suas regras e princípios próprios) e suas entidades, órgãos e
agentes como o verdadeiro objeto do Direito Administrativo,
exercida por quaisquer Poderes Estatais ou mesmo por
particulares.

A partir desse critério funcional ou da Administração Pública, pode-se dizer que 10


o Direito Administrativo tem por objeto:

(i) as relações internas à Administração Pública (entre os órgãos


e entidades administrativas e entre a administração e seus
agentes);
(ii) as relações entre a Administração e os administrados
(reguladas predominantemente pelo direito público ou pelo
direito privado); e
(iii) as atividades de Administração Pública em sentido material
exercidas por particulares sob regime predominante de direito
público (a exemplo da prestação de serviços públicos mediante
contratos de concessão).

Nessa toada, Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma que o Direito Administrativo
“tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que integram a
Administração Pública, a atividade não contenciosa que exerce e os bens de que se
utiliza para a consecução de seus fins, de natureza pública”.
Definido o objeto do Direito Administrativo, podemos conceituá-lo como ramo
do Direito Público que disciplina a função administrativa (serviços públicos, poder de
polícia, regulação e fomento estatais e controle administrativo) e a organização e

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funcionamento dos agentes, órgãos e pessoas jurídicas administrativos que a
desempenham.

1.4. SISTEMAS DE JURISDIÇÃO: SISTEMA INGLÊS, SISTEMA FRANCÊS E


SISTEMA ADOTADO NO BRASIL

Os sistemas de jurisdição adotados no mundo ocidental dividem-se, grosso


modo, em: sistema inglês ou de jurisdição única; e sistema francês ou do contencioso
administrativo. A distinção entre esses sistemas de jurisdição é de fundamental
importância para a delimitação do controle da atuação administrativa. Vejamos:
No SISTEMA INGLÊS, também chamado de sistema judiciário ou de jurisdição
única/una, o exercício da jurisdição é reservado ao Poder Judiciário, a quem cabe, com
exclusividade, aplicar o direito ao caso concreto com definitividade, com aptidão de
formação de coisa julgada material.
Nesse sistema, a Administração Pública, conquanto possua poder para
controlar seus próprios atos (autotutela), não o faz de forma definitiva, sempre cabendo
ao Poder Judiciário examinar a legalidade e legitimidade dos atos e processos
administrativos. A decisão administrativa, portanto, jamais formará a chamada coisa
julgada material, sendo amplo o acesso ao Poder Judiciário, a quem cabe dar a última
palavra.
É o sistema adotado no Brasil desde a República e atualmente consagrado no 11
art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, de acordo com o qual não se pode excluir do
Judiciário a apreciação da lesão ou ameaça de lesão de um direito.
Pertinente destacar que, diante da garantia do amplo acesso ao Judiciário, não
se pode exigir, em regra, o esgotamento da via administrativa para que aquele Poder
analise e controle a atuação administrativa. Ressalvam-se, contudo:

(i) ações relativas à disciplina e às competições desportivas (art.


217, § 1º, CF/88);
(ii) ato ou omissão administrativa que contrarie súmula
vinculante, para sua submissão ao STF por meio da reclamação
(art. 7º, § 1º, da Lei Federal nº 11.417/2006);
(iii) habeas data, que, conforme entendimento do Supremo,
pressupõe o indeferimento ou a omissão administrativa em
atender pedido de informações pessoais;

OBSERVAÇÃO: Em relação ao exaurimento da via administrativa para o ajuizamento de


ações pleiteando a concessão de benefícios previdenciários, O STF, no julgamento do
RE 631240/MG, manifestou-se no sentido de que: “A concessão de benefícios
previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando
ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se
excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de

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prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. A
exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o
entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação
do segurado”.

Sem avançar no estudo do controle administrativo, registre-se que o Judiciário


jamais poderá examinar o mérito dos atos administrativos, cuja análise, em respeito ao
princípio fundamental da separação dos poderes (art. 2º, CF/88), é exclusiva da
Administração Pública responsável por sua edição.
Finalmente, importa explicar a noção de “coisa julgada administrativa”, que se
traduz na definitividade de determinada matéria controvertida submetida ao exame da
Administração no âmbito administrativo, sem prejuízo, é claro, de sua revisibilidade pelo
Poder Judiciário. A coisa julgada administrativa vai ao encontro do princípio da
segurança jurídica substancial e da estabilidade das relações jurídicas, impedindo que a
Administração rediscuta litígios por ela já solucionados, segundo as normas de processo
administrativo, quebrando a boa-fé e a legítima expectativa dos cidadãos.
A seu turno, o SISTEMA FRANCÊS ou de dualidade de jurisdição confere
jurisdição também à Administração Pública, atribuindo-lhe, com exclusividade (e
definitividade), competência para decidir sobre matérias administrativas, tornando-as
infensas ao controle pelo Poder Judiciário.
Na França, a jurisdição administrativa é encabeçada pelo Conselho de Estado,
órgão integrante da Administração Pública e que analisa com exclusividade matérias
12
relacionadas à função administrativa, retirando-a do âmbito de conhecimento da
chamada “jurisdição comum”, a quem cabe decidir sobre os demais litígios.
Neste sistema dual, não é possível o controle judicial dos atos administrativos.
Ademais, existe coisa julgada material propriamente dita no âmbito da Administração
Pública, a partir daquilo que é decidido pelo Conselho de Estado.
No Brasil, a Constituição Imperial de 1824 criou um Conselho de Estado, que
veio a ser extinto com a Constituição Republicana de 1891. Mais na frente, em 1977, a
Emenda Constitucional 7 (à Constituição de 1967/69) chegou a prever a recriação do
contencioso administrativo, o qual, entretanto, jamais foi implantado.

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2. QUESTÕES

1. (AGU – ADVOGADO DA UNIÃO – 2009 – CESPE) Relativamente aos critérios de


delimitação do âmbito do Direito Administrativo, julgue os itens a seguir:
Pelo critério teleológico, o Direito Administrativo é considerado como o conjunto de
normas que regem as relações entre a administração e os administrados. Tal critério
leva em conta, necessariamente, o caráter residual ou negativo do Direito
Administrativo.

2. (TJ-PR – JUIZ SUBSTITUTO – 2014 – PUC-PR) Sobre o conceito do direito


administrativo e a sua formação histórica no Brasil, analise as assertivas abaixo e
assinale a alternativa CORRETA:
I. A primeira cadeira de direito administrativo no Brasil foi criada em 1851 e com a
implantação da República acentuou-se a influência do Direito Público Norte-Americano,
adotando-se todos os postulados do rule of law e do judicial control.
II. O Brasil adotou, desde a instauração da primeira República, o sistema da jurisdição
única, com exceção do período de vigência da Emenda Constitucional nº. 07/77, com a
instalação dos dois contenciosos administrativos por ela estabelecidos.
III. O direito administrativo tem como fontes a lei, a doutrina, os costumes e a
jurisprudência, vigorando entre nós, desde o início da República, dado a influência
sofrida do direito norte-americano, o princípio do stare decises. 13
IV. A interpretação do direito administrativo, além da utilização analógica das regras do
direito privado que lhe foram aplicáveis, há de considerar, necessariamente, três
pressupostos: 1º) a desigualdade jurídica entre a Administração e os administrados; 2º)
a presunção de legitimidade dos atos da administração; 3º) a necessidade de poderes
discricionários para a Administração atender ao interesse público.
a) Apenas as assertivas III e IV estão corretas.
b) Apenas as assertivas I e III estão corretas.
c) Apenas as assertivas I e II estão corretas.
d) Apenas as assertivas I e IV estão corretas.

3. (TJ-SP – JUIZ SUBSTITUTO – 2009 – VUNESP) Compromissos republicanos,


liberalismo político e econômico, proteção dos direitos individuais e, especialmente,
independência da Administração Pública foram valores postos pela Revolução
Francesa que, sob os influxos da teoria de Montesquieu, deram origem ao contencioso
administrativo.
À vista desses parâmetros, pode-se afirmar que:
a) no Brasil, adota-se o sistema da jurisdição única visando dar efetivo cumprimento ao
regime jurídico-constitucional de proteção e garantia dos direitos individuais contra
abuso ou arbítrio do Estado.

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b) a instalação do Conselho Nacional de Justiça significa a introdução do contencioso
administrativo no sistema jurídico-administrativo brasileiro com o efeito de impedir o
abuso ou arbítrio dos juízes.
c) os Tribunais de Contas produzem decisões com a qualidade de definitivas, própria do
sistema do contencioso administrativo.
d) o sistema do contencioso administrativo é o que melhor atende ao atual conceito de
Estado Democrático de Direito porque coloca o Estado, no plano jurisdicional judicial,
em pé de igualdade com o particular.

4. (MPE-SC – PROMOTOR DE JUSTIÇA – 2016 – MPE-SC) Sinônimo de função de governo


para a doutrina brasileira, a função administrativa consiste primordialmente na defesa
dos interesses públicos, atendendo às necessidades da população, inclusive mediante
intervenção na economia.

5. (TJ-MT – JUIZ SUBSTITUTO – 2015 – FMP CONCURSOS) Em face da formação


histórica do Direito Administrativo e do modelo de Estado vigente, é correto afirmar
que:
a) a noção de coisa julgada nas esferas administrativa e judicial tem a mesma dimensão
e conteúdo.
b) as decisões proferidas por órgãos públicos de natureza superior não podem ser
revistas pelo Poder Judiciário 14
c) o processo administrativo somente pode ser instaurado mediante provocação do
interessado, por representação escrita endereçada ao agente competente para a
solução da controvérsia.
d) o regime jurídico juspublicista, no todo ou em parte, somente pode ser aplicado às
pessoas jurídicas de direito público.
e) tem por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que integram a
Administração Pública, a atividade não contenciosa que exerce e os bens de que se
utiliza para a consecução de seus fins, de natureza pública.

6. (DPE-RO – DEFENSOR PÚBLICO – 2022 – CESPE/CEBRASPE) O direito administrativo


é um conjunto de normas e princípios que rege a atuação da administração pública.
Assinale a opção que indica apenas as fontes do direito administrativo.
a) lei, jurisprudência, normas e regras.
b) costumes, regras, jurisprudência e normas.
c) jurisprudência, costumes, lei e doutrina.
d) normas, lei, doutrina e regras.
e) lei, normas, jurisprudência e doutrina.

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3. GABARITO COMENTADO

1. RESPOSTA: “ERRADO”
O critério finalístico, como visto, entende o Direito Administrativo como o conjunto de
princípios e regras jurídicas que disciplinam a atividade do Estado para a consecução dos
seus fins, não se confundindo com o negativista, que atribui ao Direito Administrativo
um objeto por exclusão, enquanto todas as questões não relativas às funções legislativa
e judiciária ou a outro ramo do Direito.

2. RESPOSTA: LETRA “D”


I – CORRETO. Desde a República, o Brasil adotou o sistema de jurisdição una, de origem
inglesa, passando a se espelhar no Direito Público Norte-Americano, seguindo os
postulados do rule of law e do judicial control. A assertiva reproduz lição do eminente
administrativista Hely Lopes Meirelles;
II – ERRADO. De fato, a EC 07/77 trouxe a previsão do contencioso administrativo no
Brasil, o que, contudo, jamais se concretizou, nunca sendo efetivamente instalado;
III – ERRADO. O enunciado deixa de mencionar os princípios gerais do direito, para além
do fato de incluir a jurisprudência e a doutrina, que são apenas fontes
informais/indiretas/mediatas do Direito Administrativo. Como se não bastasse, o
princípio do stare decisis ou da vinculação ao precedente somente foi trazido ao sistema
jurídico brasileiro a partir de 2004, com a súmula vinculante e a repercussão geral, além, 15
mais recentemente, da técnica do julgamento de recursos repetitivos e do incidente de
uniformização de jurisprudência;
IV – CORRETO. O enunciado traz, de forma adequada, peculiaridades da interpretação
do Direito Administrativo.

3. RESPOSTA: LETRA “A”


O Brasil adotou o sistema de jurisdição una, cabendo apenas ao Judiciário dizer o Direito
no caso concreto com definitividade, com aptidão para a formação de coisa julgada
material. Não se adota, pois, o sistema dual de jurisdição ou do contencioso
administrativo. O CNJ e os Tribunais de Contas, assim, não são órgãos jurisdicionais, de
modo que suas decisões podem ser revistas pelo Poder Judiciário.

4. RESPOSTA: ERRADO
Função de governo não é sinônimo de função administrativa. O enunciado traz a
definição de função administrativa, que consiste na defesa concreta dos interesses
públicos, sempre dentro dos limites da lei, enquanto que a função de governo ou política
abrange as decisões e atos de governo, de gestão superior da vida estatal, dotados de
discricionariedade política, sendo exercida unicamente pelos Poderes Executivo e
Legislativo.

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5. RESPOSTA: LETRA “E”
A – ERRADA. O Brasil adota o sistema de jurisdição única, no qual a coisa julgada
administrativa não é dotada de definitividade, ou seja, ainda que esgotadas todas as
instâncias administrativas, a questão ainda poderá ser apreciada pelo Judiciário. A coisa
julgada judicial é a qualidade da decisão judicial que torna a questão imutável e
indiscutível;
B – ERRADA. No sistema de jurisdição única, adotado pelo Brasil, toda matéria poderá
ser apreciada pelo Judiciário, conforme o princípio da inafastabilidade de jurisdição,
consagrado no art. 5º, incido XXXV, da Constituição Federal;
C – ERRADA. A Lei Federal nº 9.784/99, que regula o processo administrativo federal,
estabelece, em seu art. 5º, que o processo administrativo poderá ser iniciado de ofício
ou a pedido do interessado;
D – ERRADA. O regime jurídico juspublicista aplica-se às relações jurídicas integradas
pelo Estado e pessoas jurídicas de direito público ou particulares;
E – CORRETA. O enunciado traz a definição de Direito Administrativo da Profa. Maria
Sylvia Zanella Di Pietro, segundo a qual o Direito Administrativo é “o ramo do direito
público que tem por objeto órgãos agentes e pessoas jurídicas administrativas que
integram a administração pública, a atividade jurídica não contenciosa que exerce e os
bens de que se utiliza para a consecução de seus fins de natureza pública”.

6. RESPOSTA: LETRA “C” 16


Como visto, são fontes do Direito Administrativo a lei (fonte formal e primária), os
costumes (fonte informal e secundária), a jurisprudência (fonrte informal e secundária)
e doutrina (fonte informal e secundária). Sem embargo, como bem ressalvado, entende-
se que, a partir da EC 45/04, as súmulas vinculantes assumiram, ao lado das leis, a
posição de fontes formais e primárias do Direito Administrativo.

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