Saltar para o conteúdo

Tipologia de Myers-Briggs

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
(Redirecionado de INFP)

A tipologia de Myers-Briggs,[1][2] indicador tipológico[3] ou ainda classificação tipológica de Myers-Briggs[4] (do inglês Myers–Briggs Type Indicator - MBTI) é um instrumento utilizado para identificar características e preferências pessoais que utiliza reivindicações pseudocientíficas. Katharine Cook Briggs e sua filha Isabel Briggs Myers[5] desenvolveram o indicador durante a Segunda Guerra Mundial, baseadas nas teorias de Carl Gustav Jung sobre os Tipos Psicológicos.[6] O CPP Inc., editor do instrumento MBTI, o chama de "a avaliação de personalidade mais amplamente utilizada no mundo",[7] com até dois milhões de avaliações administradas anualmente. O CPP e outros defensores afirmam que o indicador atende ou ultrapassa a confiabilidade de outros instrumentos psicológicos[8][9] e inclui relatos do comportamento individual.[10]

Apesar de sua popularidade, a tipologia foi apontada como pseudocientífica por pesquisadores.[11][12][13] Estudos têm encontrado divergências frente à validade, consistência interna e confiabilidade (teste-reteste), mesmo havendo sido observadas algumas oscilações.[14][15] Entretanto, alguns psicólogos acadêmicos criticaram o indicador, afirmando que este "carece de dados válidos convincentes".[16][17][18] O uso do MBTI como um prognosticador do sucesso profissional não recebe suporte em estudos,[19][20] e seu uso com este propósito é expressamente desencorajado no Manual.[21]

Tipo e dicotomia

[editar | editar código-fonte]

Um conceito fundamental para o MBTI é "Tipo Psicológico". A ideia é que os indivíduos acham certas maneiras de pensar e agir mais fáceis que as outras. O MBTI postula a existência de quatro pares opostos de maneiras de pensar e agir, chamados dicotomias (dimensões).[22] As preferências são normalmente indicadas por letras maiúsculas que indicam cada uma destas quatro preferências.

As quatro dicotomias

[editar | editar código-fonte]
As dicotomias
Extroversão Introversão
Sensação iNtuição
Pensamento (Thinking) Sentimento (Feeling)
Julgamento Percepção

Os quatro pares de preferências ou "dicotomias" são apresentadas na tabela à direita.

Os termos usados para cada dicotomia têm significados técnicos específicos relacionados ao MBTI, que diferem do seu significado cotidiano. Por exemplo, pessoas com uma preferência para julgamento em relação à percepção não são, necessariamente, mais críticos ou menos perceptivos.

Além disto, o MBTI não mede as aptidões: apenas mostra que uma preferência se sobressai a outra. Uma pessoa que informa alta pontuação para extroversão em relação à introversão não pode ser corretamente descrita como mais extrovertida: ela simplesmente tem uma preferência evidente.

Tabela correlacionando os 16 tipos de personalidade conforme as teorias de Myers-Briggs e David Keirsey

Às quatro dicotomias correspondem 16 tipos psicológicos que podem ser divididos em 4 grupos de temperamentos (ordenados segundo a frequência na população nos Estados Unidos em How Frequent Is My Type?):[23]

SJs ou Guardiões (46,1%) SPs ou artesãos (27%) NTs ou Racionais (10,4%) NFs ou Idealistas (16,5%)

O MBTI é frequentemente utilizado nas áreas de aconselhamento de carreira, pedagogia, dinâmicas de grupo, orientação profissional, treino de liderança, aconselhamento matrimonial e desenvolvimento pessoal, entre outros.[24]

Os 16 tipos são:[25]

O instrumento gera um relatório onde as 4 dicotomias do respondente são representadas niveladamente em um gráfico de barras em que quanto mais longa a barra, mais clara e certa é a preferência. Na sequência, as preferências analisadas serão relacionadas e alinhadas detalhadamente de acordo aos patamares: "Seu estilo de trabalho", "Suas preferências no trabalho", "Seu estilo de comunicação", "Ordem de suas preferências", "Sua abordagem para resolução de problemas".

Precisão e validade

[editar | editar código-fonte]

[...] uma tarefa importante na interpretação é ajudar os entrevistados com preferências relatadas menos claras a chegar a uma avaliação confortável e precisa de seu tipo. Isso é feito em uma sessão de interpretação principalmente por meio de uma exploração de como as preferências de tipo aparecem nos comportamentos do cliente.

MBTI Manual, Capítulo 6: Interpreting Results of the MBTI and Verifying Type[26]

Apesar de sua popularidade, ele tem sido amplamente considerado como pseudociência pela comunidade científica.[27][28] A validade do MBTI como instrumento psicométrico tem sido objeto de muitas críticas. Relatos da mídia chamaram o teste de "praticamente sem sentido",[29] e "um dos piores testes de personalidade que existem".[30] O psicólogo Adam Grant é especialmente contra o MBTI. Ele o chamou de "a moda que não morre" em um artigo da Psychology Today.[31] O especialista em psicometria Robert Hogan escreveu: "A maioria dos psicólogos de personalidade considera o MBTI pouco mais do que um elaborado biscoito da sorte chinês...".[32] Nicholas Campion comenta que esse é "um exemplo fascinante de 'astrologia disfarçada', mascarada de ciência para reivindicar respeitabilidade".[33]

Estima-se que entre um terço e metade do material publicado sobre o MBTI tenha sido produzido para as conferências especiais do Center for the Application of Psychological Type (que fornece o treinamento no MBTI e é financiado pelas vendas do MBTI) ou como artigos no Journal of Psychological Type (que é editado e apoiado pelos defensores do Myers-Briggs e pelas vendas do indicador).[34] Argumenta-se que isso reflete uma falta de análise crítica.[34] Muitos dos estudos que endossam o MBTI são metodologicamente fracos ou não científicos.[35] Uma revisão de 1996 feita por Gardner e Martinko concluiu que: "Está claro que os esforços para detectar ligações simplistas entre preferências de tipo e eficácia gerencial têm sido decepcionantes. De fato, dada a qualidade mista da pesquisa e os resultados inconsistentes, não é possível chegar a uma conclusão definitiva sobre essas relações."[36][37]

O teste foi comparado a horóscopos, já que ambos se baseiam no efeito Barnum, na lisonja e no viés de confirmação, levando os participantes a se identificarem pessoalmente com descrições que são, de certa forma, desejáveis, vagas e amplamente aplicáveis.[38][39] O MBTI não é recomendado para aconselhamento.[40]

Referências

  1. «O PERFIL PSICOLÓGICO E O ESTILO DE NEGOCIAÇÃO DOS NEGOCIADORES DE ENERGIA ELÉTRICA NO BRASIL» (PDF) 
  2. «Mapeamento das Relações entre Perfis de Jogadores, Tipos Psicológicos, Emoções e Componentes de Jogos Eletrônicos» (PDF) 
  3. «Detecção e Correção Automática de Estilos de Aprendizagem em Sistemas Adaptativos para Educação» 
  4. Fábia Rímoli, Hades, o rei dos ínferos, in: Alvarenga, Maria Zelia (org.) (2007). Mitologia Simbólica: Estruturas da Psique e Regências Míticas. [S.l.]: Casa do Psicólogo. pp. 117 e seg. ISBN 978-85-7396-522-3 
  5. Myers, Isabel Briggs; Myers, Peter (1995). Gifts Differing: Understanding Personality Type. Peter B. Myers. Mountain View, CA: Davies-Black Publishing. ISBN 0-89106-074-X. OCLC 32051485 
  6. Jung, Carl Gustav (August 1, 1971). Psychological Types (Collected Works of C.G. Jung, Volume 6. Princeton University Press. ISBN 0-691-09774.
  7. «CPP Products». Consultado em 20 de junho de 2009 
  8. Schaubhut, Nancy A.; Nicole A. Herk and Richard C.Thompson (2009). «MBTI Form M Manual Supplement» (PDF). CPP. 17 páginas. Consultado em 8 de maio de 2010 
  9. Clack, Gillian; Judy Allen. «Response to Paul Matthews' criticism». Consultado em 14 de maio de 2008. Arquivado do original em 4 de novembro de 2006 
  10. Tieger, Paul D.; Barron-Tieger, Barbara (1995). Do what you are: discover the perfect career for you through the secrets of personality type. Barbara Barron-Tieger 2nd ed ed. Boston: Little, Brown. ISBN 0-316-84522-1. OCLC 32310807 
  11. «How thousands of companies ended up using a bogus psychology test on their staff». The Independent (em inglês). 12 de outubro de 2022. Consultado em 5 de maio de 2023 
  12. Chen, Angus. «How Accurate Are Personality Tests?». Scientific American (em inglês). Consultado em 5 de maio de 2023 
  13. Burnett, Dean (19 de março de 2013). «Nothing personal: The questionable Myers-Briggs test». The Guardian (em inglês). ISSN 0261-3077. Consultado em 5 de maio de 2023 
  14. Thompson, Bruce; Borrello, Gloria M. (setembro de 1986). «Construct Validity of the Myers-Briggs Type Indicator». Educational and Psychological Measurement. 46 (3): 745–752. ISSN 0013-1644. doi:10.1177/0013164486463032. Consultado em 4 de fevereiro de 2022 
  15. Capraro, Robert M.; Capraro, Mary Margaret (agosto de 2002). «Myers-Briggs Type Indicator Score Reliability Across: Studies a Meta-Analytic Reliability Generalization Study». Educational and Psychological Measurement. 62 (4): 590–602. ISSN 0013-1644. doi:10.1177/0013164402062004004. Consultado em 4 de fevereiro de 2022 
  16. Hunsley J, Lee CM, Wood JM (2004). Controversial and questionable assessment techniques. Science and Pseudoscience in Clinical Psychology, Lilienfeld SO, Lohr JM, Lynn SJ (eds.). Guilford, ISBN 1-59385-070-0, p. 65.
  17. McCrae, R. R.; Costa, P. T. (março de 1989). «Reinterpreting the Myers-Briggs Type Indicator from the perspective of the five-factor model of personality». Journal of Personality. 57 (1): 17–40. ISSN 0022-3506. PMID 2709300. doi:10.1111/j.1467-6494.1989.tb00759.x. Consultado em 4 de fevereiro de 2022 
  18. Stricker, Lawrence J.; Ross, John (janeiro de 1964). «An assessment of some structural properties of the Jungian personality typology.». The Journal of Abnormal and Social Psychology (em inglês). 68 (1): 62–71. ISSN 0096-851X. doi:10.1037/h0043580. Consultado em 4 de fevereiro de 2022 
  19. Pittenger, David J. (novembro de 1993). «Measuring the MBTI...And Coming Up Short.» (PDF). Journal of Career Planning and Employment (em inglês). 54 (1): 48–52 
  20. Nowack, K. (1996). Is the Myers Briggs Type Indicator the Right Tool to Use? Performance in Practice, American Society of Training and Development, Fall 1996, 6
  21. Myers, Isabel Briggs; McCaulley Mary H.; Quenk, Naomi L.; Hammer, Allen L. (1998). MBTI Manual (A guide to the development and use of the Myers Briggs type indicator). [S.l.]: Consulting Psychologists Press; 3rd ed edition. ISBN 0-89106-130-4 
  22. Myers, Isabel Briggs; McCaulley Mary H.; Quenk, Naomi L.; Hammer, Allen L. (1998). MBTI Manual (A guide to the development and use of the Myers Briggs type indicator). Consulting Psychologists Press; 3rd ed edition. ISBN 0-89106-130-4
  23. «The Myers & Briggs Foundation - How Frequent Is My Type». www.myersbriggs.org. Consultado em 4 de fevereiro de 2022 
  24. «DinamicaSocial.com is for sale». HugeDomains (em inglês). Consultado em 28 de julho de 2021 
  25. NERIS Analytics Limited. «16personalities» 
  26. Myers, Isabel Briggs (2003). MBTI manual: a guide to the development and use of the Myers-Briggs Type Indicator (em inglês) 3.ª ed. Mountain View, California: CPP. p. 116. ISBN 978-0-89106-130-4 
  27. Stein & Swan 2019.
  28. Schweiger, David M. (1 de agosto de 1985). «Measuring managerial cognitive styles: On the logical validity of the Myers-Briggs Type Indicator». Journal of Business Research (em inglês). 13 (4): 315–328. ISSN 0148-2963. doi:10.1016/0148-2963(85)90004-9 
  29. Eveleth, Rose (26 de março de 2013). «The Myers-Briggs Personality Test Is Pretty Much Meaningless» (em inglês). smithsonianmag.com 
  30. Chen, Angus (janeiro de 2019). «How Accurate Are Personality Tests?». Scientific American (em inglês). Consultado em 30 de outubro de 2020 
  31. Grant 2013.
  32. Hogan, Robert (2007). Personality and the fate of organizations (em inglês). Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates. p. 28. ISBN 978-0-8058-4142-8. OCLC 65400436 
  33. Campion, Nicholas (2009). A History of Western Astrology (em inglês). II. London: Continuum Books. p. 259. ISBN 978-1-84725-224-1 
  34. a b Coffield F, Moseley D, Hall E, Ecclestone K (2004). «Learning styles and pedagogy in post-16 learning: A systematic and critical review» (PDF) (em inglês). Learning and Skills Research Centre. Arquivado do original (PDF) em 5 de dezembro de 2008 
  35. Gardner & Martinko 2016.
  36. Gardner & Martinko 2016, p. 77.
  37. Pittenger, David J (2005). «Cautionary comments regarding the Myers-Briggs Type Indicator». Consulting Psychology Journal: Practice and Research (em inglês). 57 (3): 210–221. doi:10.1037/1065-9293.57.3.210 
  38. Whitbourne, Susan Krauss (4 de janeiro de 2014). «What You Don't Know about This Personality Test Can Hurt You» (em inglês). Psychology Today. Consultado em 29 de março de 2024 
  39. «A Critique of The Myers Briggs Type Indicator (MBTI) – Part Two: a Personal Review» (em inglês). Consultado em 11 de agosto de 2019. Cópia arquivada em 11 de agosto de 2019 
  40. Healy, Charles C. (abril de 1989). «Negative: The MBTI: Not Ready for Routine Use in Counseling». Journal of Counseling & Development (em inglês). 67 (8): 487–488. doi:10.1002/j.1556-6676.1989.tb02125.x