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MODELO DE COLAPSO
DE SOCIEDADES COMPLEXASzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZY
Proj. Norma Musco Mendes - UFRJ/ LH/A
O aprofundamento dos meus estudos sobre a História de Roma na
Antigüidade, e principalmente sobre o processo de desagregação do Império Romano do Ocidente, despertou o interesse em construir uma teoria explicativa que acomodasse de forma lógico-modelar a interveniência
de fatores que atingiram a estrutura das relações sociais romanas em sua
totalidade. Isto porque sempre nos preocupamos em indagar o porquê da
longa duração do sistema imperial romano e não simplesmente nos preocupamos em entender o seu colapso. Quer dizer, entendemos que o processo de desagregação do Império Romano do Ocidente somente poderá
ser explicado se considerarmos de forma dinâmica as circunstâncias históricas que levaram à formação e que caracterizaram o funcionamento
do sistema imperial romano, assim como os seus limites.
Certamente, a análise da "queda" do Império Romano do Ocidente
representa um apaixonante tema para todos aqueles que desde a Antigüidade sentiram-se atraídos pela busca de uma explicação para os reveses
políticos, econômicos e culturais internos, e para as questões de ordem
externa que destruíram uma das mais importantes e desenvolvidas civilizações da Antigüidade. Sendo assim, desde o século III até os nossos
dias se produzi aram mútiplas interpretações sobre o fim do mundo antigo, constituindo-se em inúmeros discursos que ao tentarem fornecer a
melhor explicação possível acerca desse acontecimento, nos revelam os
meandros de uma discussão secular. A análise de tais explicações nos
levaram a perceber que envolvem um número limitado de temas
explicativos recorrentes, tais como: penetração e invasão de "bárbaros",
conflito social, desgoverno da elite governamental, depressão de recursos, transformaçãoes culturais e religiosas e concatenizaçõe de eventos.
Por outro lado, podemos também agrupar tais explicações em 4 principais linhas de abordagem: a natureza das relações entre o Estado e a sociedade; as transformações produzidas no âmbito do sistema escravista;
a reelaboração qualitativa da escala de valores sócio-culturais, principalmente no tocante à religião e à renovação do Baixo Império e ação dos
"bárbaros". Obviamente, tais estudos realizados por eminentes especia-
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listas apresentam contribuições importantíssimas para o estudo do processo de desagregação do Império Romano do Ocidente. No entanto, permanece sempre a indagação sobre os motivos pelos quais tal fenômeno
ocorreu, bem como quanto ao peso específico a ser atribuído a cada fator interveniente
no processo
em questão.
Estas abordagens
historiográficas estabelecem as mais variadas relações de causa e efeito
para explicar esse proceso em questão. Na maioria das vezes, chega-se
à elaboração de teoria explicativas de caráter factual que definem o alcance das transformações ocorridas de acordo com as causas identificadas
como determinantes, carecendo de uma explicação lógica. Além disto,
são análises que explicam o caso específico do Império Romano do Ocidente.
Diante do exposto, é evidente que nossa preocupação será construir uma teoria explicativa que apresente caràter geral, uma vez que o
colapso é um fenômeno recorrente nas antigas sociedades complexas;
incorpore as temáticas explicativas menos gerais; apresente flexibilidade
de aplicação a diversas sociedades que sofreram o processo de colapso;
possibilite resguardar as variáveis e, principalmente, ofereça uma explicação lógica.
Optamos como referencial de análise pelo termozyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYX
colapso de sociedade complexa porque diferentemente dos termos queda, declínio,
decadência,
refere-se
ao fenômeno de decomposição
política,
reestruturação institucional e transformação sócio-econômica. Por outro
lado, os conceito de queda, decadência, declínio, implicam em mudanças vistas como moralmente ou esteticamente inferiores tomando como
base um padrão superior previamente escolhido. Logo, tais conceitos
fundamentam-se num julgamento de valor de caráter não científico.
Da mesma forma, julgamos ser mais adequado aos nossos princípios teórico-metodológico o termo colapso de sociedades complexas, ao
invés de colapso da civilização. A civilização é entendida por nós como
o sistema cultural de uma deteminada sociedade. As manifestações culturais são epifenômenos ou covariáveis de sua complexidade social, política e econômica. Assim, há uma simetria entre o desenvolvimento e
Jz
queda do nível de complexidade e as transformações do sistema de valo<,
res e de representações simbólicas de uma sociedade que em latu sensu
denominamos de sistema cultural. Posto isto, deve ser ressaltado que
colapso de sociedades complexas não se refere à morte da civilização.
Este conceito deve ser analiticamente desassociada da teoria de analogia
biológica ou sócio-política e da estrutura civilizacional da sociedade, sendozyxwvutsrqp
158
visto como um contínuo processo de construção de limites sociais. No
caso específico do processo de colapso da civilização romana já existem
as sementes para a reconstrução de um novo sistema social. Há, portanto, uma ligação entre colapso e a continuidade.
Diante destas preocupações encontramos na teoria geral sobre colapso de sociedade complexas desenvolvida pelo arqueólogo Joseph Tainter
subsídios teóricos e metodológicos para a construção de um modelo
explicativo para o processo de colapso de Império Romano do Ocidente,
no qual seja possível identificar e considerar as variáveis específicas da
sociedade romana.
Na construção da referida teoria explicativa identificamos a contribuição de arqueólogos, antropólogos, sociólogos, economistas e historiadores cujos estudos baseados nos mais diversos princípios teóricometodológicos foram canalizados para a construção de princípios gerais,
leis e explicações universalistas sobre o surgimento das sociedades complexas. Ademais, a sociedade e o processo de colapso são vistos por Tainter
dentro da teoria geral de sistemas.
As sociedades complexas são entendidas como sistemas de interações
onde seus componentes constituem um conjunto interligado, cuja organização segue uma disposição ordenada. A entidade formada pela totalidade destes elementos não é redutível à sua soma, reage globalmente como
um toda às pressões exteriores e às reações dos seus elementos internos.
Sendo assim, seu funcionamento deve ser concebido como um sistema
aberto de retroação (feedback) articulando-se as informações (input) recebidas que implicam na necessidade de repostas (output), que podem ou
não gerar mudanças intervenientes internas e externas, ajustadas à capacidade de tomada de decisão do sistema para atingir os fins. Os sistemas
se retroalimentam com suas ações como uma estratégia para a manutenção e controle do seu equilíbrio. Portanto, os níveis de complexidade de
uma sociedade são atingidos de forma articulada ao processo de mudanças organizacionais do sistema sócio-político.
Joseph Tainter entende que colapso é um termo abrangente que pode
É um aspecto recorrente nas sociesignificar 'muitos tipos de processos.zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPO
dades humanas, não sendo restrito a nenhum tipo de sociedade ou vinculado a níveis específicos de complexidade, quer dizer, pode ser encontrado em sociedades com Estado ou sociedades sem Estado. Isto porque as
chamadas sociedades simples, também, apresentam modos específicos
de ordenar internamente seus problemas sociais e sua economia, através
de ajustes governamentais. Baseado nas conclusões da Antropologia
159
Cultural, Tainter considera o desenvolvimento da complexidade como
É
uma variável contínua, sendo, também, a sua reversão: o Colapso.zyxwvutsrqponm
este fato que torna apropriado a construção de uma explicação geral considerando a existência de variáveis específicas a cada contexto histórico.
Um dos princípios norte adores da construção da teoria explicativa
de J. Tainter é o entendimento do colapso como um processo sócio-político que de forma interligada e interdependente atinge os sistemas econômico e cultural. Assim, o estudo do colapso deve considerar o processo de formação e desenvolvimento das sociedades complexas e as transformações sócio-políticas e econômicas que comprometem os padrões
de complexidade destas sociedades.
Colapso é visto, portanto, mais como o resultado da trajetória
sistêmica interna de um sistema social do que como o resultado de fatores externos.
Uma sociedade entra num processo de colapso quando perde de
forma significativa o nível estabelecido de sua complexidade sócio-política. Tainter entende por complexidade um conjunto de elementos caracterizado pelo tamanho da sociedade, diversidade de suas partes, existência de especialização social, variedade de mecanismos organizacionais
para integrar o corpo social num todo coeso e em funcionamento. O
aumento de cada uma destas dimensões implica no crescimento da complexidade social. Portanto, a complexidade se fundamenta em dois conceitos principais: desigualdade (diferenciação vertical, hierárquica, ou
acesso desigual às fontes de recursos materiais e sociais) e heterogeneidade
(número de partes distintas que compõem a sociedade e as formas pelas
quais a população é distrubuída entre estas partes). Desta forma, a complexidade das instituições governamentais é o resultado do desigual acesso
aos recursos disponíveis pela sociedade em benefício da concentração de
poder e autoridade visando a integração da sociedade e o bem estar da
população como um só corpo. A complexidade constitui-se num sistema
interdependente e interligado de três subsistemas básicos: agricultura e
produção dos demais recursos que nos levam a inferir a produtividade
econômica geral da sociedade; processamento de informações (canais de
comunicação e sistema de educação); controle sócio-político (existência
de uma elite, buracracia especializada,
sistema fiscal, atividades
legitimadoras de poder, controle interno e externo). O crescimento destes subsistemas deve ocorrer de forma interligada, interdependente e
cumulativa para que haja uma situação de normalidade e estabilidade
social. A complexidade é entendida, assim, como uma estratégia parazyxwvutsrqpon
160
manter a integridade social e a legitimidade de poder e autoridade, sendo
o seu desenvolvimento voltado para gerir os conflitos sociais e políticos
de cada momento histórico.
A expressãozyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
nível estabelecido de complexidade significa a transformação na estrutura organizacional sócio-política de uma sociedade,
cuja inferência qualitativa é a1caçada pela manifestação e identificação
dos seguintes fenômenos principais:
a) menor grau de estratificação e diferenciação social;
b) menor especialização econômica e ocupacional de indivíduos,
grupos e territórios;
c) menor capaciadade de centralização e, por conseguinte, menor
regulação e integração dos diversos grupos econômicos e políticos
pela elite, envolvendo a diminuição do processamento de informação entre indivíduos, grupos políticos e econômicos e entre o centro e a periferia;
d) menor investimento nos epifenômenos da complexidade que definem o conceito de civilização (monumentos arquitetônicos, realizações artísticas e literárias);
e) menor divisão, troca e redistribuição de recursos;
f) fragmentação política e contratação do território submetido a uma
única autoridade política;
Joseph Tainter buscou na Microeconomia o fundamento principal
para a construção de sua teoria explicativa. Refiro-me à lei dos rendimentos decrescentes formulada pelos economistas para o estudo da teoria da produção capitalista.
Os princípios da teoria da produção proporcionam as bases para
análises de custos de produção e oferta de bens particulares. O universo
de análise é uma unidade econômica individual, uma firma ou uma organização. Busca-se a maximização dos lucros através do crescimento da
quantidade do produto que se pode obter com um determinado custo ao
adquirir e combinar os fatores de produção. Isto nos leva ao conceito de
eficiência econômica que envolve uma razão entre a quantidade de algo
que sai do processo produtivo (output) e a quantidade de algo entra no
processo produtivo (input). Quer dizer, é a razão produto/fator. O tratamento tradicional dos princípios da teoria da produção começa com a
natureza variável da "função produção" e posteriormente considera-se a
lei dos rendimentos decrescentes. A expressão "função produção" apli-
161
ca-se às relações físicas entre os recursos (insumos) de uma organização
econômica e a quantidade de bens ou serviços produzidos por unidade
de tempo.
Entende-se por recursos os meios disponíveis para produzir bens,
os quais, por sua vez, são utilizados para satisfazer necessidades. Os
recursos podem ser classificados em duas categorias: 1) trabalho ou recursos humanos e 2) capital ou recursos não-humaos. Os recursos de
trabalho consistem na força de trabalho ou na capacidade do esforço
humano (intelectual ou muscular) empregados na produção de bens. Por
capital designamos todos os recursos não humanos que contribuem para
a produção de bens, tais como: equipamentos, terra, recursos minerais,
matérias-primas e, quaisquer outros itens não humanos utilizados no processo produtivo.
O montante do produto que uma organização pode produzir depende da quantidade de recursos utilizados. Este montante pode ser aumentado ou diminuido pelo aumento ou diminuição das quantidades de
todos os recursos utilizados. Ou, uma vez que os recursos geralmente se
combinam em proporções variáveis para produzir um bem, a quantidade produzida pode ser aumentada até um nível máximo, aumentando a
quantidade de um recurso e mantendo fixa a quantidade dos demais. A
título de exemplo, diremos "que várias combinações de terra, mão-deobra, sementes e fertilizantes podem ser utilizados para produzir trigo,
poderíamos esperar que aumentos na quantidade de fertilizantes, permanecendo constantes as quantidades dos demais recursos, elevariam a
produção até um nível máximo". (Leftwich, pag 112). No entanto, no
estudo do processo produtivo a lei dos rendimentos decrescentes descreve o sentido geral e a taxa de mudança na produção da organização quando
varia a quantidade de apenas um insumo. Estabelece que "mantendo-se
a tecnologia e todos os insumos, exceto um deles, constante, conforme
são adicionados incrementos iguais do insumo variável, além de um certo ponto a taxa resultante de aumento do produto irá diminuir. Dito de
outro modo, depois de um certo ponto, o produto físico marginal do
insumo variável irá diminuir." (Miller, pago 169).
Esta lei se fundamenta na existência de distinção entre produto físico total (TP), produto físico médio (AP) e produto físico marginal (MPP)
que resultam do processo produtivo. O produto físico médio é encontrado pela divisão do produto físico total pelo número das unidades do insumo
variável utilizado. O produto físico marginal é a variação do produto
162
físico total devido à variação de uma unidade no fator variável de produção, permanecendo constantes todos os outros fatores. Existe, ainda, uma
relação definida entre as curvas destes tipos de produto que estabelece os
três estágios da produção. O primeiro estágio de produção é caracterizado pelo crescimento do produto físico médio do insumo variável. No
estágio III o produto médio continua a diminuir, assim como, o produto
físico total, porque o produto físico marginal, agora, é negativo. (Miller,
pago 172)
O estágio II é denominado região econômica de produção porque
as combinações do recurso variável com os recursos fixos podem ser
economicamente eficientes para a organização.
A título de ilustração dos rendimentos decrescentes apresentamos
o gráfico a seguir, retirado do livro LEFTWITCH, R. OzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZ
Sistema de Preços
e a Alocação de Recursos. S.P., Liv. Pioneira Editora, pago 116.
Produto
Terra
Estágio II EstógioIIIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcba
I
EstágiozyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDC
TP
(a) zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
Produto
Trabalho
l' A'
Mão de-
Oz'
O~----~~--~----~~-----
-obro
Terra
MPP
(b) zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
163
"A curva côncava para cima nas primeiras diferentes unidades de
trabalho mostra situação em que pequena quantidade do recurso variável, usada com certa quantidade de recurso fixo, tende a ser ineficiente,
ou está sendo usado em quantidade demasiado pequena em relação ao
recurso fixo. O aumento de quantidade do recurso variável provocará
aumentos sucessivamente maiores no produto total, ou rendimentos crescentes até algum ponto tal comozyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPO
B. No ponto B a lei dos rendimentos
decrescentes passa a se manifestar e iguais acréscimos de mão-de-obra
determinam acréscimos sucessivamente menores no produto total. Quando
11 unidades de trabalho são usadas numa unidade de terra, o produto
total alcança o máximo. Conforme mostra o gráfico, a utilização de mais
unidades de trabalho por unidade de terra faz o produto total diminuir.
Uma vez que o produto médio é igual ao produto total dividido pelo número de unidades de trabalho usadas, então, o produto médio de 1 unidar ou à inclinação
da !ina OA correspondes de trabalho é igual a l ' a 101 zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHG
dente e, consequentemente, o produtomédio da mão-de-obra cresce. Para
1 unidades de mão-de-obra a inclinação da linha OA' é maior do que a de
qualquer outra traçada da origem à curva de produto total. Assim, o produto médio da mão-de-obra será máximo neste ponto. Além de 10 unidades de mão-de-obra, o produto médio decrescerá, mas permanecerá positivo enquanto o produto total for positivo. Sendo que o produto marginal da mão-de-obra é o aumento do produto total por unidade de aumento
na quantidade de mão-de-obra, a inclinação da curva de produto total em
dada quantidade de mão-de-obra será igual ao produto marginal da mãode-obra daquela quantidade. O produto marginal alcança um máximo no
ponto B onde a curva do produto total passa de côncava para cima a côncava para baixo. Com a quantidade 11 de mão-de-obra, o produto total é
máximo; conseqüentemente, o produto marginal é zero. A partir de 11
unidades adicionais de mão-de-obra reduzem o produto total, portanto o
produto marginal é negativo." (Leftwich, pag 115 a 117).
A lei dos rendimentos decrescentes é uma proposição empírica da
realidade. Não é um teorema deduzido a partir de uma série de hipóteses
ou um sistema axiomático. Não é uma proposição lógica e, portanto,
suscetível de prova ou refutação matemática.zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVU
É uma afirmação sobre as
relações físicas do processo produtivo observadas no mundo real (Miller,
pag 169). Foi desenvolvida para caracterizar mudanças nas curvas de
custo/benefícios na extração de recursos e das proporções de input/output
no setor manufatureiro.zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJ
164
A curva do produto marginal ou a idéia da diminuição de retornos
para a atividade econômica remonta aos economistas clássicos, tais como
Thomas Malthus, David Ricardo e John Stuart Mill. Nas últimas décadas, os princípios básicos da idéia de diminuição de retornos marginais
foram aplicados ao estudo da agricultura de subsistência, à produção
mineral, ao processamento de informações, à política de expansão territorial, ao sistema fiscal e ao sistema administrativo (Tainter, Cap 4).
Tainter amplia a aplicaçãci desta lei à totalidade da organização societal
defendendo a hipótese de que o retorno do investimento em complexidade varia e que esta variação segue as curvas semelhantes às do processo
de produção. Ou melhor, em muitas esferas cruciais, os investimentos
contínuos e variados na complexidade sócio-política alcançam um ponto
onde os benefícios de tais investimentos começam a declinar, inicialmente
de forma gradual, mas depois, de forma acelerada. Maiores quantidades
de recursos são alocados pela população para manter uma sociedade, sendo
que, depois de um certo nível, crescente quantidade destes investimentos
renderam menores retornos marginais.
Embora não haja analogia exata entre a organização de uma unidade produtiva e a organização da sociedade, Tainter afirma que a lei de
rendimentos decrescentes também é um aspecto recorrente da evolução
sócio-política e do investimento em complexidade.
A aplicação dos princípios fundamentais desta lei à organização
societal como um forma de se buscar um entendimento para o colapso,
fundamenta-se nos seguintes argumentos:
1) as sociedades humanas são mantidas por um contínuo fluxo de
energia que deve existir de forma harmonia de acordo com as necessidades de manutenção das instituições organizacionais;
2) o aumento da complexidade pressupõe uma maior especialização do trabalho; ampliação do controle hierárquico para regular
esta forma de trabalho; maior fluxo de informações visando maior
controle interno e externo; crescente necessidade de suportar trabalhadores especializados não diretamente envolvidos no processo
produtivo;
3) o desenvolvimento de organização para tomada de decisões é
um processo oneroso e baseado em parte na razão entre custos e
benefícios. Quanto mais complexa for uma sociedade maiores custos são exigidoszyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFED
per capita, os quais nas sociedades antigas estão
estritamente relacionados com o trabalho humano;
165
4) torna-se necessário estimar os benefícios que a população retira
do seu investimento em complexidade. Isto porque as soluções
organizacionais
ao apresentarem
caráter
cumulativo
e
interdependente provocam o crescimento do nível de complexidade. Estas soluções atingem patamares mais complexos, sofisticados e onerosos, uma vez que as soluções mais simples se esgotaram, mantendo-se fixa a proporção dos ganhos e as possibilidades
de recursos. Neste momento, os investimentos na complexidade
sócio-política como uma estratégia para gerir conflitos atinge o ponto
dos retornos marginais decrescentes.
Uma sociedade cresce em complexidade como um sistema. Quer
dizer, algumas de suas partes interligadas são forçadas em direção ao
crescimento e outras se ajustam harmoniosamente. Daí Tainter se referir à evolução sócio-cultural pelo termo "complexidade", que significa o
crescimento de vários subsistemas que compõem uma sociedade. No
entanto, há momentos onde um subsistema cresce em detrimentos de
outros, prejudicando a coesão do sistema social.
O crescimento está associado a um determinado custo e significa
um investimento porque pressupõe benefícios para a população, podendo ser verificado através de uma melhor administração e distribuição dos
recursos estocados, de investimentos na agricultura, da manutenção da
ordem, interna e externa, da realização de obras públicas e de outros).
Visando uma melhor aplicação dos princípios básicos da lei de rendimentos decrescentes à organização societal Tainter utliza o termo retorno marginal por unidade de investimento, ao invés de produto marginal.
O crescimento dos benefícios em relação aos custos forma uma curva
côncava que ilustra as situações de desenvolvimento da sociedade até o
ponto de tensão onde os investimentos adicionais em complexidade geram retornos marginais decrescentes. Desta forma, podemos encontrar,
as sociedades complexas de acordo com o processo histórico de cada uma
delas, três situações de desenvolvimento que correspondem nas análises
da teoria da produção aos três estágios da produção. Portanto, de acordo
com a teoria de colapso de sociedades complexas de J. Tainter podemos
construir o seguinte modelo:zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIH
Situação I:
Neste estágio a sociedade hipotética aumenta seus investimentos
na agricultura ou em outros setores produtivos, na hierarquia, na defesa,
no processamento de informações e outros. A curva custo/benefício é
166
ascendente, quer dizer, o retorno médio dos investimentos em complexidade está crescendo. Todavia, a continuidade das tensões exige maiores
investimentos na complexidade que, diante do caráter cumulativo, cada
vez se tornam mais onerosos. A hierarquia se expande em tamanho,
complexidade, especialização,
intensificação do trabalho agrícola,
necesidade de maior abrangência e sofisticação do sistema de informação; maior aparato militar e burocrático. Tais ajustamentos trazem como
benefícios melhorias no bem estar social e a manutenção dozyxwvutsrqponmlkjihgfedcb
status quo.
Neste nível de crescimento o sistema social atinge o ponto B1, CI do
gráfico abaixo. Este é o ponto de inflexão onde os retornos marginais
alcançam o máximo.zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGF
B2
BI
,------,.-------,
I
I
I
I
I
I
I
I
I
,
I
,
CI
C2
c
Situação II:
Neste estágio, os maiores investimentos em complexidade já começam a render retornos marginais decrescentes. Finalmente, quando
se atinge o ponto B2 - C2 os retornos marginais são iguais a zero. Quando este ponto é atingido a sociedade entra numa fase de crescente
vulnerabilidade ao colapso que poderá ser acelerada ou não dependendo
das circunstâncias históricas de cada sociedade. A situação de equilíbrio
entre custos e benefícios não pode perdurar porque as sociedades enfrentam ao longo de sua existência histórica tensões recorrentes e constantemente têm que desenvolver mecanismos de respostas para gerir novos
problemas, ou o agravamento de tensões estruturais. Tais mecanismos
exigem investimentos mais onerosos, provocando o dec1ínio dos retornos marginais da complexidade.
Os retornos marginais decrescentes já indicam que a sociedade enfrenta problemas no armazenamento de recursos para conter maiores
adversidades, tornando-se mais frágil. Por outro lado, a razão desfavorável entre custos e benefícios indica uma relação assimétrica dos
subsistema, ou melhor, disparidade entre os recursos da sociedade e as
exigências e necessidades do aparato organizacional. A complexidade se
torna um mecanismo cada vez menos ineficiente para gerir conflitos.
167
Certos setores da sociedade optam por formas sociais mais simples e
menos onerosas, como a fragmentação e a desintegração. Ao mesmo
tempo a sociedade começa a enfrentar fenômenos próprios de momentos
de crise, tais como: apatia política, falta de resistência aos invasores,
revolta de camponeses, inflação, super-taxação, insatisfação entre a elite. O sistema social como um todo se engaja num comportamento "explorador". Busca-se auto-regular o sistema através de alternativas (subsídios de recursos através da expansão territorial, aumento da produtividade econômica) que revelam-se ineficientes porque esbarram nos
parâmetros técnico, populacional e organizacional do sistema social.zyxwvutsrqponmlk
Situação III:
A produtividade marginal atinge o seu ponto máximo e a sociedade
alcança o ponto C3 onde os retornos marginais são negativos, pressupondo-se a queda do nível de complexidade, a decomposição, a existência de um vacuum de poder ou a busca de um ajustamento econômico
entre o nivel de complexidade e os recursos do sistema social.
Diante do exposto julgamos plausível a aplicação desta teoria para
explicar o colapso do sistema imperial no Ocidente.
Através da documentação textual em estudo é possível analisar as
transformações ocorridas ao longo do período imperial romano de acordo com o modelo sobre as situações de desenvolvimento social construído por Tainter.
A estratégia para a aplicação desta teoria ao caso específico do
Império Romano do Ocidente está sendo isolar e quantificar os custos e
benefícios dos vários momentos da complexidade social e identificar as
mudanças da razão custos/benefícios através do processo histórico da
sociedade em questão. Certamente que uma análise quantitava para a
sociedade antiga torna-se impossível diante da inexistência de documentação adequada. A estratégia será a investigação detalhada do surgimento de mudanças e fenômenos que nos levem a inferir os períodos de
significantes declínios de retornos marginais em relação aos custos e
benefícios da complexidade do sistema sócio-político imperial romano.
Devem ser identifcados fenômenos e mudanças cuja ação compõe a complexidade sócio-política, tais como
1) aumento do efetivo burocrático;
2) maior especialização de serviços;
3) maior centralização e controle de comportamento;
168
4) crescente taxação;
5) desvalorização monetária e inflação;zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUT
6) crescente custos com as atividades legitimadoras e, ou, abandono destas atividades;
7) abandono de política expansionista;
8) custos crescentes no controle interno e defesa externa.
Parece-nos claro que tais fenômenos evidenciam as dificuldades de
adaptação e ajustamento do sistema imperial romano, uma vez que esta
relação assimétrica entre os subsistemas denota as disparidades entre os
parâmetros do sistema social romano e as exigências e necessidades da
sua complexidade sócio-política.
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