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A Cosmovisão Cristã em um Mundo de Vãs Ideologias

2017, CPAD

Em uma época carregada de ideologias, tanto antigas quanto novas, como o cristão pode escutar a serena voz de Deus e discernir a sua perfeita vontade quando tantas vozes humanas invadem o nosso espaço e tentam nos convencer de que são elas-e não o evangelho-a resposta para os problemas do mundo? Sabendo que a sociedade atual é dominada por sistemas de pensamentos incompatíveis com a fé cristã, iremos refletir neste capítulo sobre o conceito de ideologia e como formar uma mentalidade essencialmente cristã, uma visão de mundo abrangente, pela qual possamos discernir as vozes do nosso tempo e refutar os sistemas de ideias incompatíveis com as Escrituras.

Capítulo 2 A Cosmovisão Cristã em um Mundo de Vãs Ideologias E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela ƌĞŶŽǀĂĕĆŽĚŽǀŽƐƐŽĞŶƚĞŶĚŝŵĞŶƚŽ͕ƉĂƌĂƋƵĞĞdžƉĞƌŝŵĞŶƚĞŝƐƋƵĂůƐĞũĂĂ ďŽĂ͕ĂŐƌĂĚĄǀĞůĞƉĞƌĨĞŝƚĂǀŽŶƚĂĚĞĚĞĞƵƐ͘ͶRomanos 12.2 E m uma época carregada de ideologias, tanto antigas quanto novas, como o cristão pode escutar a serena voz de Deus e discernir a sua perfeita vontade quando tantas vozes humanas invadem o nosso espaço e tentam nos convencer de que são elas — e não o evangelho — a resposta para os problemas do mundo? Sabendo que a sociedade atual é dominada por sistemas de pensamentos incompatíveis com a fé cristã, iremos refletir neste capítulo sobre o conceito de ideologia e como formar uma mentalidade essencialmente cristã, uma visão de mundo abrangente, pela qual possamos discernir as vozes do nosso tempo e refutar os sistemas de ideias incompatíveis com as Escrituras. Um Mundo Movido Por Ideias e Ideais Com o fim da Guerra Fria e o colapso do comunismo, muitos pensadores chegaram a declarar o fim das ideologias. O cientista político, nipo-americano, Francis Fukuyama foi um dos principais profetas dessa decadência ideológica. Fukuyama acreditava que o capitalismo e a democracia liberal representavam o último estágio da história humana e, após o esgotamento do comunismo e do fascismo, não haveria mais espaço para novas lutas ideológicas. Tal prognóstico, po- SEGUIDORES DE CRISTO rém, não foi confirmado pela realidade. Embora todas as ideologias e promessas históricas que marcaram o século XX, baseadas na autonomia do indivíduo, tenham falido, caindo uma após a outra como soldadinhos de brinquedo1, outras ideologias se apresentaram para preencher o vácuo deixado2, porquanto a mente caída do homem é habilidosa para inventar (Ec 7.19) sistemas sociais e políticos que visam dar sentido ao mundo e resolver os problemas decorrentes da queda no pecado. Porém, quando tal idealização se firma em fundamentos secularizados, que partem da premissa da inexistência de Deus, então o desmoronamento ideológico é inevitável. Mas, afinal, que é uma ideologia? Em linhas gerais, os dicionários a definem como o conjunto de ideias, convicções e princípios filosóficos, sociais, políticos que caracterizam o pensamento de um indivíduo ou grupo social. Seu propósito básico é estabelecer um conjunto de premissas e pressupostos que sirvam como norte para a conduta pessoal ou coletiva. A ideologia pode ser vista como uma falsa consciência, utilizada com o intuito de justificar uma determinada ordem social; uma suposta leitura verdadeira da realidade3. Nesse sentido, ideologia é um elemento básico em qualquer visão de mundo, pois fornece as crenças básicas e estabelece os ideais de vida de uma pessoa4. Pense por exemplo no socialismo. Aqueles que acreditam nessa ideologia vivem de acordo as suas declarações básicas, pois acreditam serem elas verdadeiras. A ideologia molda as opiniões e o comportamento das pessoas, instigando-as a agirem dessa ou daquela outra maneira. Ideias e Consequências Considerando que as ideologias não se tratam de simples modelos teóricos, elas têm repercussões. Afinal, ideias tem consequências! Thomas Sowell diz que “políticas baseadas em uma determinada visão de mundo têm consequências que se espalham pela sociedade e reverberam durante anos, ou mesmo por gerações, ou séculos”5. 1 2 COLSON, C.; PEARCEY, N. E Agora, como Viveremos? Rio de Janeiro: CPAD, 2000, p. 360. KOYZIS, D. T. Visões e Ilusões Políticas: uma análise e crítica cristã das ideologias contemporâneas. São Paulo: Vida Nova, 2014, p. 17. 3 RAMOS, L. Os Ídolos do nosso Tempo: a cosmovisão cristã em um mundo de esquerdas e direitas. In: RAMOS, L; CAMARGO, M; AMORIM, R. Fé cristã e cultura contemporânea: cosmovisão cristã, igreja local e transformação integral. Viçosa/MG: Ultimato, 2009, p. 138. 4 PALMER, 2001, p. 26. 5 SOWELL, T. &RQÀLWRGH9LV}HV: origens ideológicas das lutas políticas. São Paulo: É Realização, 2011, p. 20, 21. 24 A Cosmovisão Cristã em um Mundo de Vãs Ideologias Para ilustrar o poder das “meras ideias”, Dallas Willard relembra o livro de 1889 do romancista francês Paul Bourget, intitulado O discípulo. O livro narra a história de um importante filósofo e psicólogo, que vivia basicamente absorto em coisas “meramente” acadêmicas. Ele morava em seu apartamento e a sua rotina consistia basicamente em refeições, passeios, cafés e aulas e, três vezes por semana recebia visitas de professores e aluno das quatro às seis, depois jantava, fazia uma curta caminhada. Depois, trabalhava um pouco mais e ia se deitar pontualmente às dez horas. Era a existência de um erudito inofensivo que, nas palavras de sua empregada, “não machucaria uma mosca”. Um dia, entretanto, ele foi chamado a prestar depoimento num inquérito policial sobre um de seus ex-alunos, um rapaz brilhante que costumava ir à casa de seu mestre para aprender e embriagar-se em discussões iluminadoras e libertadoras. E, na prisão, enquanto aguardava o julgamento por homicídio, o jovem rapaz escreveu ao seu mestre falando sobre aquilo que havia feito e sobre como todas as teorias aprendidas e discutidas em sala de aula foram colocadas em prática por ele. Ao final, Willard diz que “só raramente as consequências envolvem assassinato, mas os acontecimentos do mundo e da vida das pessoas navegam sobre as águas de um mar ideológico. As matanças no Camboja procedem de discussões filosóficas em Paris”6. Outro exemplo marcante dos efeitos negativos de ideias distorcidas está em um dos maiores assassinos da história mundial: Adolf Hitler. Suas concepções sobre a superioridade da raça ariana e as suas teses racistas e antissemitas foram responsáveis pelo genocídio de milhares de pessoas, desencadeando a 2ª Guerra Mundial. Hitler simplesmente aplicou os conceitos teóricos de sua ideologia de seleção natural aos seres humanos. Prova disso foi Auschwitz, campo de concentração e símbolo do holocausto provocado pelo nazismo. Jesus afirmou que uma árvore é conhecida pelos seus frutos (Mt 7.15-20). Assim como árvores ruins não podem dar bons frutos, ideologias maléficas, portadoras de visões distorcidas acerca da humanidade e da moralidade, não podem dar bons resultados; ao contrário, elas trazem prejuízos e levam ao caos social. Por esse motivo, devemos ter cautela e discernimento para não nos tornarmos presas de ideologias desvirtuadas, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo (Cl 2.8). 6 WILLARD, 2001, p. 27. 25 SEGUIDORES DE CRISTO CaraCterístiCas das ideologias Contrárias ao evangelho Idolatram Algo Dentro da Criação Conceitualmente, vimos que ideologia corresponde a um sistema específico de ideias, uma visão totalizante da vida. Enquanto tal, ela busca resolver os problemas sociais, econômicos e políticos do mundo, apresentando-se como uma “tábua de salvação”. Em certo sentido, todos os sistemas de ideias possuem uma dimensão religiosa, ao prometer ao ser humano libertação de certos males que afligem a sociedade. O que distingue uma ideologia da outra é a ênfase dada a algum aspecto ou elemento presente no mundo. Com efeito, o ponto comum a todas as ideologias é a veneração excessiva a algum aspecto da criação, o que faz surgir um tipo de idolatria (Êx 20.3; Rm 1.25; 1 Co 10.7). Geralmente, pensamos em idolatria exclusivamente como o culto de imagens e esculturas feitas por mãos humanas. Mas a idolatria envolve muito mais. É o pecado que tenta substituir o Deus verdadeiro por falsos deuses criados pelo homem, sejam eles físicos ou não, tanto em forma material quanto teórica (Sl 96.5). Em sentido mais amplo, portanto, “a idolatria em formas teóricas pode incluir as vãs filosofias dos homens, pois ela tira parte da glória de Deus (Rm 1.23) e confere honras divinas a outrem. Assim, o naturalismo, o humanismo e o racionalismo são tipos de idolatria”7. Não é sem razão que no Decálogo a proibição de ter outros deuses vem em primeiro lugar (Êx 20.3), pois o pecado de idolatria é a origem dos demais pecados. Ao cultuar falsos deuses e falsas ideias o homem perde os referenciais morais e espirituais estabelecidos por Deus, levando a outras práticas iníquas. Se no Antigo Testamento8 a reverência a Moloque, Asera, Astarte e Baal acarretava matança de crianças, assassinatos, danos físicos, distorções sexuais e outras mazelas, hoje, a obediência cega e idolátrica a certas convicções filosóficas e políticas tem igualmente provocado danos pessoais e sociais catastróficos. A diferença é que os ídolos contemporâneos são sofisticados, e vem envoltos em uma roupagem pós-moderna. 7 8 PFEIFER; VOS; REA, 2000, p. 946. Ver: BENTHO, E. C. A Família no Antigo Testamento: História e sociologia. 2ª. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2006. 26 A Cosmovisão Cristã em um Mundo de Vãs Ideologias Os ídolos de hoje costumam usar as vestes da racionalidade, da radicalidade e da instrumentalidade das ideologias modernas. Além disso, ao contrário dos anteriores, esses deuses são poderosamente dinâmicos e estão sempre em movimento. O que permanece aplicável é a essência da idolatria em si. As pessoas colocam algo feito elas em uma posição exaltada na sociedade. Depois, oferecem, sacrifícios em seu nome, como se aquilo tivesse vida e poder próprios. Por fim, elas se sujeitam a esses ídolos, mesmo que seus desejos não tenham sido satisfeitos.9 Voltando ao ponto inicial, as ideologias elegem algo dentro da criação e a transformam em seu próprio deus. David Koyzis expressou que “a idolatria escolhe um elemento da criação de Deus e tenta colocar essa coisa acima da barreira que separa o Criador da criatura, transformando-a numa espécie de Deus”. Tal ocorre quando se valoriza mais a liberdade (individualismo), a nação (nacionalismo), o dinheiro (capitalismo), a propriedade comum (socialismo) ou o meio ambiente (ambientalismo), por exemplo, acima de Deus, crendo que tais elementos, por si sós, possam proporcionar prosperidade, segurança e salvação para o homem. Em certo sentido, o processo de construção ideológica revela o desejo legítimo do ser humano em explicar o que ocorre a sua volta, manifesta a sua necessidade interna de satisfazer a angústia por segurança, liberdade ou organização. Naturalmente, o homem anseia por referenciais. No episódio do bezerro de ouro (Êx 32), por exemplo, o povo de Israel, vendo que Moisés tardava em descer do monte, construiu a sua própria divindade. Seria ela o guia, o ponto de referência visual para aquele povo rebelde. Entretanto, o desejo legítimo foi satisfeito por uma ação ilegítima: a tentativa de substituir Jeová. O problema mais básico das ideologias é que elas tentam substituir a soberania e a suficiência divina por algo aparentemente benéfico, mas canalizado para um fim equivocado. O ouro usado para a construção do bezerro era, afinal, elemento da natureza criada por Deus, mas uma vez fundido e feito em forma de animal para ser adorado, isso culminou na usurpação do propósito divino para o homem. No mesmo sentido, a devoção demasiada a qualquer coisa fora do Criador se transforma em idolatria. Afinal, compreendemos que o pecado de idolatria se expressa não somente pela adoração aos deuses 9 RAMOS, 2009, p. 143. 27 SEGUIDORES DE CRISTO feitos de pedra ou madeira, mas também pela veneração a ideias e doutrinas humanas, que possam levar a um estilo de vida correspondente (Sl 115.8). A paixão ideológica produz mentes cativas, subservientes às suas proposições. Biblicamente, todavia, o pensamento do cristão deve ser levado cativo não pelas ideologias humanas, mas à obediência de Cristo (2 Co 10.5). Nesse aspecto, cabe o alerta paulino para fugir da idolatria (1 Co 10.14), não nos deixando enganar por ideias que têm aparência de piedade (2 Tm 3.5) e dizem defender o bem, mas no fundo estão cheias de mentiras (Jo 8.44). Negam a Realidade do Pecado Outra característica básica das ideologias mundanas é a negação dos efeitos do pecado sobre o homem. O filósofo francês, do século XVIII, Jean-Jacques Rousseau dizia que o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe. Essa afirmação aparentemente simples foi responsável por uma guinada no pensamento ocidental. Ao rejeitar a natureza humana pecaminosa, Rousseau ofereceu uma perspectiva de completa liberdade e autonomia do indivíduo, em contraposição às instituições. A filosofia de Rousseau, com isso, deu origem ao conceito moderno de revolução, o “qual envolve não somente rebelião política para destituir um governo em especial, mas também a destruição em bloco da sociedade existente, a fim de construir uma nova e ideal sociedade do nada”10. Isso levou ao mito do progresso e ao pensamento utópico, acreditando ser possível criar uma sociedade perfeita nesse mundo, bastando estabelecer as estruturas econômicas e sociais adequadas para o homem. A Era da Razão (1650-1789) alavancou ainda mais o pensamento de que o progresso pela ciência e tecnologia era algo inevitável. “Os líderes do Iluminismo acreditavam que a razão humana podia retirar o véu da ignorância e superstição e revelar um universo formosamente ordenado”11. Ocorre que essa perspectiva ideológica não encontra ressonância nas Escrituras em particular ou no pensamento cristão em geral. A utopia terrena e a ideia do progresso humano, afinal, negam a realidade do pecado decorrente da queda e a força do mal presente no coração do homem. O otimismo humanista desconsidera por completo que a força da maldade opera na sociedade, gerando corrupção, ganância e desonestidade. Com esses fatores, como é possível criar uma sociedade 10 COLSON; PEARCEY, 2000, p. 210. 11 PALMER, 2001, p. 129. 28 A Cosmovisão Cristã em um Mundo de Vãs Ideologias boa e justa pela força do braço do homem, sem a intervenção divina? O teólogo anglicano N. T. Wrigth faz uma comparação pertinente. Aqueles que creem no mito do progresso são como pessoas remando num barco, tentando chegar à praia, enquanto a maré empurra-os para mais longe, em direção ao alto mar. Por estarem do lado errado, eles não conseguem enxergar que seus esforços são em vão, e pedem que outros barcos se unam a eles nessa esplêndida viagem em direção à praia12. Wrigth então afirma: O mito do progresso fracassa porque ele, na verdade, não funciona; porque ele é incapaz de resolver o mal cometido no passado; e, por fim, porque subestima a natureza e o poder do mal em sim mesmo, deixando de enxergar a importância vital da cruz — a rejeição de Deus e ao mal, que abre a porta para o seu ‘sim’ à criação. Só no cristianismo — e certamente não nas histórias seculares da modernidade — faz algum sentido afirmar que os problemas do mundo não se resolvem pelo nosso esforço para alcançar a luz, mas pelo Deus criador descendo às trevas para resgatar a humanidade e o mundo de sua triste condição.13 O utopismo não coaduna com as bases cristãs, pois sabemos que os problemas deste mundo, embora possam ser remediados, não serão solucionados completamente, diante da falibilidade humana (Rm 1.28). Não obstante, a crença na Queda e na natureza pecaminosa do homem não afasta o anseio cristão por mudança e melhoria social, visto que a crença no porvir tem implicações para o tempo presente, proporcionando esperança. Gordon Fee explica essa correlação ao chamar a Igreja Primitiva de “comunidade escatológica”, visto que os primeiros crentes da era apostólica acreditavam que o futuro havia começado, precisamente por causa do derramamento do Espírito14. De acordo com o teólogo pentecostal inglês, “Embora as pessoas fossem incorporadas individualmente ao povo de Deus, o alvo não era simplesmente preparar indivíduos para o céu, mas formar um povo que, pelo poder do Espírito, vivesse a vida do futuro (a vida do próprio Deus) na era presente”15. 12 13 14 15 WRIGHT, 2009, p. 97. WRIGHT, 2009, p. 103. FEE, 2015, p. 11. FEE, 2015, p. 11. 29 SEGUIDORES DE CRISTO Imbuídos na experiência do Espírito, portanto, os discípulos foram capacitados a viverem a dimensão do Reino em seus próprios dias, tanto no nível individual quanto comunitário. As Boas-Novas eram, antes de tudo, uma mensagem de esperança, que assinalava a vida, a morte e a ressurreição do Filho de Deus. Segundo Fee, a ressurreição de Cristo e a descida do Espírito mudaram completamente a perspectiva da Igreja Primitiva. A expectativa do tempo do fim totalmente vinculada ao futuro ainda por vir, própria das raízes judaicas, “traduzidas pela esperança de um Messias”, deu lugar à crença que o futuro já havia começado, e a ressurreição de Cristo “assinalou o início do fim, a virada das eras”. É essa plataforma escatológica, prossegue Fee, “que define tudo o que diz respeito a eles — como viviam, como pensavam e como interpretavam o papel que tinham no mundo presente, que segundo criam, estava na reta final da existência”.16 Como se percebe, a nossa esperança difere — e muito — da esperança humanista e secular. Enquanto a esperança secular firma sua confiança na autonomia e habilidade do homem, a esperança cristã ancora-se na suprema graça de Deus, na perspectiva de que o seu Reino já teve início nesse plano. Mais ainda, a nossa esperança se firma na ressurreição de Cristo: Segundo N. T. Wrigth: “Esta é a mensagem para — e por meio de — toda a igreja, todos nós juntos. Esta é a mensagem de Jesus. Que assim seja para nós, em nós e, principalmente, por meio de nós”17. Descreem no Mundo Espiritual Com base no ponto de vista naturalista, as ideologias humanas não acreditam no mundo espiritual. Homens e mulheres são constituídos unicamente de matéria. O que existe é o aqui e agora, e nada mais. A forma mais básica desse tipo de naturalismo é o evolucionismo darwinista, para quem o homem é o resultado de forças aleatórias da natureza, sem qualquer intervenção divina. Tal concepção deu origem a várias outras visões de mundo ao longo da história, tais como o ateísmo, o marxismo, o humanismo, o existencialismo e mais recentemente o secularismo. 16 FEE, 2015, p. 77. 17 WRIGTH, 2015, p. 210. 30 A Cosmovisão Cristã em um Mundo de Vãs Ideologias A descrença no mundo espiritual tem efeitos notáveis e perigosos para a vida humana. Se não existe nada além do que podemos enxergar, a vida não tem propósito e o ser humano não deve prestar contas de seus atos a ninguém. Fiódor Dostoiévski escreveu: “Se Deus não existe, tudo é permitido”. Nessa mentira diabólica está a justificação para o hedonismo, o liberalismo moral, o antropocentrismo e todo tipo de “ismo” iníquo, destruidor da moral e os bons costumes. Por essa razão, Ravi Zacharias diz que quando alguém tenta viver sem Deus, as respostas à moralidade, à esperança e ao sentido da vida o enviam ao seu próprio mundo para moldar para si uma resposta individualizada. Ele escreve: “Fora do Cristo não há lei, não há esperança e não há sentido. Você, e só você, é aquele que vai determinar e definir estes elementos essenciais da vida; e você e só você, é o arquiteto da sua própria lei moral; você e só você, idealiza sentido para a sua vida; você, e só você, arrisca tudo o que tem baseado numa esperança que você imagina”18. Willian Lane Craig também expressou o absurdo da vida sem Deus da seguinte forma: Se Deus não existe, tanto o ser humano quanto o universo estão inevitavelmente condenados à morte. O ser humano, como todos os organismos biológicos, tem de morrer. Se esperança de imortalidade, sua vida apenas caminha para o túmulo. Sua vida não passa de uma faísca na escuridão infinita, uma fagulha que aparece, reluz e morre para sempre”. [...] Sem Deus... o ser humano e o universo seriam simples acidentes do acaso, jogados na existência sem motivo. Sem Deus o universo é resultado de um acidente cósmico, uma explosão aleatória. Não há motivo pelo qual ele exista. Quanto ao ser humano ele é um capricho da natureza — um produto às cegas de matéria mais tempo mais acaso. O ser humano não passa de uma massa gosmenta que evoluiu até à racionalidade. Não há mais propósito na vida para a raça humana do que para uma espécie de inseto; ambos são resultado da interação cega de acaso e necessidade. É por esse motivo que o ateísmo não consegue explicar e atribuir sentido à vida de forma coerente.19 Além disso, se Deus não existe, não há um padrão moral absoluto 18 ZACHARIAS, R. Poder o homem viver sem Deus? São Paulo: Mundo Cristão, 1997, p. 95-96. 19 CRAIG, W. L. Apologética contemporânea: a veracidade da fé cristã. 2.ed. São Paulo: Vida Nova, 2012, p. 28. 31 SEGUIDORES DE CRISTO a que o homem deva se submeter. Esse tipo de ideia está na origem, por exemplo, na “ideologia de gênero”, ideia que apregoa que os dois sexos — masculino e feminino — são construções culturais e sociais, razão pela qual cada pessoa tem o direito de fazer a sua opção sexual (gênero). É uma prova do poder devastador das ideologias defendidas pelos ímpios. Paulo vaticinou que “o fim deles é a perdição, o deus dele é o ventre, e a glória deles é para confusão deles mesmos, que só pensam nas coisas terrenas” (Fp 3.19). Mentes Renovadas para um Mundo Cheio de Ideologias Vãs Vivendo em um mundo cheio de ideologias nocivas à fé cristã, que tentam seduzir e subjugar o nosso pensamento, como o crente pode fazer para discernir a voz de Deus e viver de acordo com a sua vontade? Certamente, o conselho de Paulo em Romanos 12.2 nos fornece princípios valiosos para o viver cristão em tempos de pluralidade ideológica: “E não vos conformeis com este mundo, mas trans- formai-vos pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”. A primeira parte do verso diz para não nos conformarmos com este mundo. Nesta passagem, a palavra conformar, no grego é syschematizesthe. Paulo está dizendo para não nos amoldarmos ao modelo mundano; para não sermos controlados pelo seu esquema, pela sua lógica. O aspecto chave na interpretação desta porção bíblica é a correta compreensão da palavra mundo. O expositor bíblico do início do Século XX, D. Martyn Lloyd-Jones, afirmou que ninguém teria a mínima possibilidade de entender o ensino neotestamentário sobre o comportamento e sobre a moralidade sem captar o ensino sobre o mundo20. Se você não compreender a distinção entre o Reino de Deus e o mundo dificilmente viverá de acordo com a vontade do Senhor. No sentido empregado pelo apóstolo Paulo, a palavra “mundo” não se refere às pessoas ou ao universo físico, afinal tanto um quanto 20 LLOYD-JONES, D. M. Romanos: Exposição sobre o capítulo 12 – o comportamento cristão. São Paulo: Editora PES, 2003, p. 99. 32 A grande maioria de nós, cristãos, não sabemos lidar muito bem com a palavra mundo. Somos rápidos em apontar suas mazelas, feiuras e horrores, mas não temos tanta habilidade assim para propor soluções genuinamente bíblicas para RVVHXVSUREOHPDVeOXJDUFRPXPVHDÀUPDUTXHYLYHPRVHPXPPXQGR corrompido, onde impera a desordem, a imoralidade, a violência e todos os demais efeitos estruturais do pecado. Todavia, poucos no meio evangélico têm VHSUHRFXSDGRHPHQIUHQWDUDVTXHVW}HVVRFLDLVHFXOWXUDLVGDQRVVDpSRFD 25HLQRGH'HXVIRLHVHPSUHVHUiRHOHPHQWRFKDYHSHORTXDORVGLVFtSXORV GHYHPFRPSUHHQGHUDYLGDFULVWmQRSUHVHQWHVpFXOR2QRVVRGHVDÀRFRPR FULVWmRVpYLYHUHPXPPXQGRFDtGRVHPQRVHVTXHFHUGDUHDOLGDGHGR5HLQR SRUPHLRGRTXDOSRGHPRVFRPSUHHQGHUWRGDVDVPD]HODVTXHLUURPSHPQD sociedade, sem perder a fé e a esperança. Valmir Nascimento é graduado e pós-graduado em Direito. Teólogo, com mestrado em Teologia pela EST. Educador Cristão. Docente universitário das Faculdades Feics. Membro e Diretor da Anajure. Evangelista da Assembleia de Deus em Cuiabá/MT, atua junto ao ministério de evangelismo universitário da Agência Pés Formosos/ Chy Alpha Brasil. Escritor e palestrante, é comentarista de Lições Bíblicas de Jovens da CPAD e autor do livro O Cristão e a Universidade. É casado com Carla Marcele Milomem, pai do Vinícius e da Beatriz.