Políticas Culturais em Revista, 1(8), p. 121-135, 2015 - www.politicasculturaisemrevista.ufba.br
DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA CRIATIVA BRASILEIRA A PARTIR DOS
PONTOS DE CULTURA
Adriano Pereira de Castro Pacheco1
Elcio Gustavo Benini2
RESUMO
O presente artigo propõe a análise do Programa Cultura Viva, a partir do eixo estruturante dos
Pontos de Cultura, como estratégia governamental de gestão compartilhada, capaz de
dinamizar o surgimento de clusters ou territórios da Economia Criativa. Para isso, recorreu-se
à revisão da literatura sobre Economia e Indústria Criativas e à análise dos dados de
implementação da política pública desenvolvida pelo Ministério da Cultura, articulada por
organizações não governamentais. Os resultados revelam que os Pontos de Cultura
desenvolvem atividades em pelo menos um dos grupos da Indústria Criativa brasileira,
segundo modelo proposto pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e
Desenvolvimento – UNCTAD, o que permite vislumbrar oportunidades reais de
fortalecimento da Indústria Criativa nacional, a partir da estrutura funcional apresentada pelo
Programa.
Palavras-chave: Economia Criativa. Indústria Criativa. Pontos de Cultura. Cultura Viva.
ABSTRACT
This article proposes the analysis of the Living Culture Program, from the structural axis of
Culture Points, as a government strategy of shared management can stimulate the emergence
of clusters or areas of the Creative Economy. For this, appealed to the literature review of
Economy and Creative Industry and analysis of data implementation of public politics
developed by the Culture Ministry and articulated by non-governmental organizations. The
results show that the Culture Points develop activities in at least one of the Brazilian Creative
Industry groups, according the model proposed by the Conference of the United Nations on
Commerce and Development - UNCTAD, this paves real opportunities for strengthening
national Creative Industries from the structure functional presented by the Living Culture
Program.
Keywords: Creative Economy. Creative Industries. Culture Points. Living Culture.
1
Mestrando em Administração: Gestão de Organizações & Sociedade da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul. e-mail: adrianopcastro@gmail.com.
2
Doutor em Educação. Professor do Programa de Mestrado em Administração da Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul. e-mail: elciobenini@yahoo.com.br.
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1. INTRODUÇÃO
O termo Economia Criativa define setores cuja origem está na criatividade, no
conhecimento e no talento, individual e coletivo, características que possuem potencial para a
criação de riqueza e empregos, através da geração e exploração de ativos criativos, como a
propriedade intelectual (HOWKINS, 2001). Fato é que organizações com essas características
têm despertado o interesse de grandes investidores e chamado a atenção de organismos
públicos e privados, principalmente pela forma como conseguem transformar ideias, que
decorrem da criatividade, em produtos e processos de impacto, também social e cultural, junto
ao consumidor final. Essa nova economia tem transitado em organizações de diferentes
setores, dentre elas as do Terceiro Setor que, ao desempenharem suas atividades de escopo,
ganham competividade e singularidade, por meio de modelos de gestão e produção de
conteúdo que se aderem facilmente às Indústrias Criativas,3 dado o processo de inovação e
sustentabilidade incorporado às iniciativas do setor (REIS, 2008).
Estima-se que a economia criativa formal represente algo em torno de 2,84%
(FIRJAN, 2012) do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, correspondente a R$ 104,37
bilhões, segundo dados do IBGE (2010), aproximadamente 2% da mão de obra e 2,5% da
massa salarial formal (IPEA, 2013). Comparativamente, os setores com atuação em Economia
Criativa têm demonstrado grande dinamismo econômico, cuja participação no PIB supera
alguns subsetores tradicionais de atividade econômica, como a indústria extrativa (R$ 78,77
bilhões) e a produção e distribuição de eletricidade, gás, água, esgoto e limpeza urbana (R$
103,24 bilhões), ainda segundo o sistema FIRJAN (2012).4
O sistema FIRJAN reposiciona o Brasil à frente de países como a Itália, Espanha,
Holanda, Noruega e Dinamarca, a partir de dados agregados da Conferência das Nações
Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento – UNCTAD (2010), em razão do PIB gerado por
empresas do núcleo criativo brasileiro, conferindo-lhe posição de destaque no cenário
mundial da Economia Criativa. Além disso, os trabalhadores em economia criativa tendem a
ganhar mais e possuem nível de formação escolar acima da média. Ademais, os produtos e
serviços que decorrem das indústrias criativas possuem elasticidade-renda elevada
3
Conceito decorrente das Indústrias Culturais e apresentado no lançamento do relatório Creative nation:
commonwealth cultural policy, na Austrália, em 1994.
4
Ver Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil. (FIRJAN, 2012)
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(UNCTAD, 2010), ou seja, tendem a sofrer impacto menor, quando comparados às demais
indústrias, frente a crises internacionais.
Todavia, as possibilidades de avanço na adoção de medidas de incentivo e de
fortalecimento de iniciativas presentes na Indústria Criativa brasileira esbarram no processo
de reconhecimento efetivo de suas potencialidades e desdobramentos, bem como na ausência
de estudos e informações que consolidem a Economia Criativa como aquela capaz de
promover desenvolvimento econômico, social e cultural, equitativo, inclusivo e sustentável.
Fato é que diante das possibilidades apresentadas pela nova economia, a criativa, torna-se
fundamental o entendimento do processo de transição por qual passa a economia mundial, a
partir da observação dos fundamentos teóricos e dos motivadores globais que compõem a
estrutura das Indústrias Criativas e sua economia.
No Brasil, essa possibilidade de avanço teve seu reconhecimento vislumbrado, a partir
da implementação do Plano Brasil Criativo,5 pela Secretaria de Economia Criativa do
Ministério da Cultura que, por meio da conjugação de ações e diretrizes estratégicas, buscou
fomentar políticas de desenvolvimento para o setor, apoiadas em vetores micro e
macroeconômicos, dentre eles: Territórios Criativos, Marcos Legais, Fomento a
Empreendimentos Criativos, Fomento à criação de Redes e Coletivos com competências no
campo da Economia Criativa, entre outros.
Assim, o presente trabalho tem por objetivo promover uma discussão teóricoconceitual da trajetória percorrida desde a concepção de Indústria Cultural, cunhada pela
Escola de Frankfurt, conceito que foi posteriormente ampliado para o de Indústria Criativa,
até o estabelecimento do que hoje se denomina de Economia Criativa, bem como analisar o
esforço de desenvolvimento dessa nova economia, sob o prisma da estrutura funcional do
Programa Cultura Viva, do Ministério da Cultura, revelada na atuação do seu eixo
estruturante: os Pontos de Cultura.
Para isso, recorreu-se a um levantamento bibliográfico acerca do que as principais
literaturas do Brasil e ao reder do mundo têm tornado consensual no campo de estudo da
Economia Criativa. Ademais, visando promover a aproximação do tema a instâncias setoriais
e de aplicação de políticas públicas de incentivo, buscou-se promover uma relação entre as
5
Disponível em: <http://culturadigital.br/brasilcriativo/files/2014/06/livro_web2edicao.pdf>. Acesso em:
29.03.2015.
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ações do Programa Cultura Viva,6 observadas por meio da análise de conteúdos oficiais
disponibilizados pelo Ministério da Cultura, e as atividades que estão indelevelmente
relacionadas às Indústria Criativas no Brasil.
Assim, o artigo está estruturado em uma breve contextualização do campo de estudo,
seguida do referencial teórico e dos principais esforços conceituais despendidos no intuito de
se prover a delimitação mais adequada ao universo da Economia Criativa. Após, tem-se a
apresentação dos resultados da análise de conteúdo decorrentes da aproximação entre as ações
fomentadas pelo Programa Cultura Viva e a Economia Criativa, cujas atividades surgem a
partir dos setores industriais criativos. Por fim, as considerações acerca dos resultados e das
possibilidades vislumbradas a partir do estudo proposto.
2. ECONOMIA CRIATIVA: UM CONSTRUCTO MULTIDIMENSIONAL
O presente capítulo busca, de forma despretensiosa, apresentar definições que
caminham para um lugar comum rumo à compreensão da Economia Criativa. Para isso, um
traçado do panorama histórico dessa nova economia torna-se seminal. Além disso, propõe
uma revisão conceitual da política pública encabeçada pela Secretaria da Cidadania Cultural,
no período de 2004-2014, com a implementação do Programa Cultura Viva, para, ao final,
delinear os eixos e dimensões de aproximação entre o programa e as atuais estruturas das
indústrias da Economia Criativa.
Regressivamente, partimos de um entendimento comumente utilizado no Brasil de que
Economia Criativa “é o conjunto de atividades econômicas que dependem do conteúdo
simbólico – nele incluído a criatividade como fator mais expressivo para a produção de bens e
serviços” (IPEA, 2013, p. 6). Com efeito, o esforço de síntese apresentado pelo Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada é o que mais contempla os setores da Economia Criativa
brasileira, revelados na multiplicidade da produção dos Clusters ou Territórios Criativos.7
Contudo, outras tentativas de conceituação têm sido lançadas ao redor do mundo, o
que de certa forma demonstra o interesse e estimula diversos países para as possibilidades
apresentadas pela nova economia. Tal interesse teve uma primeira manifestação decorrente da
apresentação do termo Indústrias Criativas, em 1994, na Austrália, inspirado no projeto
Principal política cultural implementada pelo Ministério da Cultura, em 2004. (SILVA; ARAÚJO., 2010)
Espaços prospectados com potencialidades em Economia Criativa (bairros, polos produtivos, cidades e bacias
criativas). Plano da Secretaria da Economia Criativa, 2012.
6
7
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Creative Nation, que incorporou os setores tecnológicos, e o trabalho criativo neles
despendidos, ao rol das Indústrias Criativas, dada a sua contribuição para a economia do país
(REIS, 2008).
Para prosseguirmos, faz-se necessária a apresentação do conceito de criatividade
adotado neste estudo, a fim de contribuir com o entendimento daquilo que se convencionou
chamar de trabalho criativo, conforme mencionado no parágrafo anterior. A criatividade,
conquanto possa ser mencionada nas perspectivas artística, científica, econômica e
tecnológica (OSTROWER, 1993) terá, aqui, o conceito estabelecido por Hui, sendo definida
“como o processo pelo qual as ideias são geradas, conectadas e transformadas em coisas que
são valorizadas” (HUI et al., 2005, p. 10). Dessa forma, é possível inferir que o trabalho
criativo lança mão das possibilidades de geração de riqueza, a partir de ideias transformadas.
Cabe dizer, também, que é consenso na literatura mundial a interpretação do tema em
questão, a partir da contribuição teórico-conceitual de Howkins (2001), que cunhou o
conceito Economia Criativa, em decorrência das Indústrias Criativas, agrupando-as em 15
setores, que percorrem desde as artes até campos da ciência e tecnologia. Para Howkins
(2001), “a criatividade não é uma coisa nova e nem a economia o é, mas o que é nova é a
natureza e a extensão da relação entre elas e a forma como combinam para criar
extraordinário valor e riqueza” (HOWKINS, 2001, p. 22). Sob essa estrutura se assentam
todos os demais conceitos propalados no estudo da Economia Criativa.
John Hartley apud Reis (2008), em Creative Industries, adjetivou o conceito a partir
da incorporação das Tecnologias da Informação, em uma intersecção de cultura e tecnologias:
[...] a ideia de indústrias criativas busca descrever a convergência conceitual
e prática das artes criativas (talento individual) com indústrias culturais
(escala de massa), no contexto das novas tecnologias de mídia (TICs) em
uma nova economia do conhecimento, para o uso dos novos consumidorescidadãos interativo. (HARTLEY apud REIS, 2008, p. 21)
A visão de Hartley, conquanto ampla na percepção dos setores de núcleo criativo, foi
acompanhada de vários outros postuladores do debate em Economia Criativa, expandindo a
abrangência de seu significado aos direitos autorais, marcas e patentes (HARTLEY, 2005;
DUISENBERG apud REIS, 2008), cujas contribuições são corroboradas por Davis apud Reis
(2008), ao defender que embora uma abordagem regional possa ser útil, a estratégia de
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desenvolvimento de cada país precisa levar em conta seus atributos e circunstâncias
singulares.
A profusão de interpretações conceituais acerca da Economia Criativa torna-se
proeminente, quando são considerados os aspectos intangíveis da geração de valor,
evidenciados também na economia do conhecimento,8 ao incorporar direitos de propriedade
intelectual, formas de expressão coletivas e populares, moda, atividades de entretenimento,
entre outras, que incorporam dimensões funcionais de combate às desigualdades sociais, de
incentivo à criação de redes e de fluxos econômicos criativos inclusivos (CASTELLS, 2000;
FLORIDA, 2002; HARTLEY, 2005).
Em paralelo ao entendimento dos setores criativos presentes na indústria, Richard
Florida propôs um modelo de análise do mercado de trabalho nas Indústrias Criativas, a partir
da perspectiva ocupacional. Florida (2002) cunhou o termo “classes criativas”, para
denominar grupos de ocupações profissionais, artísticas e científicas, que lançam mão do
elemento criativo, nele contido o simbólico, como principal ativo da produção. De posse da
contribuição realizada no campo ocupacional, a Unctad relacionou profissionais dessa
natureza, percorrendo campos da ciência, engenharia, artes e entretenimento, cuja função
econômica é a de criar ideias:
De acordo com essa abordagem, a classe criativa também inclui um grupo
mais amplo de profissionais criativos na área de negócios, finanças e direito.
Sejam eles artistas ou engenheiros, músicos ou cientistas de informática,
escritores ou empreendedores, esses trabalhadores compartilham um etos
criativo comum, que valoriza criatividade, individualidade, diferença e
mérito. Em suma, eles são pessoas que acrescentam valor econômico por
meio da criatividade. (UNCTAD, 2010, p. 11)
Finalmente, o relatório da Unctad, lançado em 2010, torna consensual a Economia
Criativa, a partir das indústrias culturais, cujos estudos se originaram na Escola de Frankfurt,
consideradas como aquelas que “combinam a criação, produção e comercialização de
conteúdos que são intangíveis e culturais por natureza. Estes conteúdos são tipicamente
protegidos por direitos autorais e podem assumir a forma de bens e serviços” (UNCTAD,
2010). Adorno e Horkheimer, em “Dialética do Esclarecimento”, debatem a cultura de massa
(re)significada pela Indústria Cultural, fortemente associada ao entretenimento, mencionando
o cinema, o rádio, a literatura e o teatro – tradicionalmente o grupo de belas artes – como
8
Ver Knell e Oakley, 2007.
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setores de destaque no ato da produção cultural, cujo centro de discussão reside no paradigma
“identidade do universal e do particular”, da cultura de alto nível versus a popular
(ADORNO; HORKHEIMER, 1985). Para vislumbrar esse entendimento, os autores postulam
que:
Os interessados inclinam-se a dar uma explicação tecnológica da indústria
cultural. O fato de que milhões de pessoas participam dessa indústria
imporia métodos de reprodução que, por sua vez, tornam inevitável a
disseminação de bens padronizados para a satisfação de necessidades iguais.
(ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 100)
Não obstante serem apresentadas de formas antagônicas, a cultura e a indústria eram
debatidas, no período pós-guerra, sob o viés do trabalho e do conteúdo estilístico presentes na
produção, sendo fortemente associadas às metas do liberalismo:
Não somente suas categorias e conteúdos são provenientes da esfera liberal,
tanto do naturalismo domesticado quanto da opereta e da revista: as
modernas companhias culturais são o lugar econômico onde ainda sobrevive,
juntamente com os correspondentes tipos de empresários, uma parte da
esfera de circulação já em desagregação. (ADORNO; HORKHEIMER,
1985, p. 108)
Assim, os bens culturais – vistos sob a produção mercadológica da época – eram
também classificados como produtos destinados à troca e ao consumo, difusão e fruição. Tais
atributos permitiram à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
– UNESCO definir as indústrias criativas como aquelas que respondiam à criação, produção e
ao consumo de conteúdos criativos e imateriais, de natureza cultural, incorporados a um bem
ou serviço (UNESCO, 2006).
Dado o avanço da discussão acima proposta e a partir do esclarecimento feito sobre as
Indústrias Culturais, a Unctad propôs um modelo de apoio à definição de Indústrias Criativas
como instrumento norteador de política pública, agrupando-as em grupos:
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Figura 1 – Classificação da Unctad para o modelo de Indústrias Criativas
Fonte: Unctad (2010).
Face a multiplicidade de definições que abarcam o tema em questão, o modelo
conceitual adotado acerca das Indústrias Criativas para a análise proposta neste artigo é o da
Unctad, também utilizado pelo Ministério da Cultura, em decorrência da estrutura proposta
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capaz de contemplar a quase totalidade dos clusters9 criativos do Brasil. Pelo modelo, é
possível identificar as indústrias ou setores criativos em quatro grandes grupos (IPEA, 2013):
•
Patrimônio: o patrimônio cultural é identificado como a origem de todas as
formas de arte e a alma das indústrias culturais e criativas, o ponto de partida
para esta classificação. É a herança que reúne aspectos culturais, dos pontos de
vista histórico, antropológico, étnico, estético e social, e influencia a
criatividade, dando origem a uma série de bens e serviços do patrimônio, bem
como atividades culturais. O grupo, por sua vez, subdivide-se em: expressões
culturais tradicionais e sítios culturais;
•
Artes: este grupo inclui as indústrias criativas baseadas puramente em arte e
cultura. A obra artística é inspirada no patrimônio, identidade de valores e no
sentido simbólico. Este grupo abrange as artes visuais e performáticas;
•
Mídia: este grupo abrange dois subgrupos de mídia que produzem conteúdo
criativo, com o objetivo de gerar comunicação com o grande público:
Publicações e mídia impressa; e Audiovisual;
•
Criações funcionais: este grupo agrega atividades que são mais orientadas à
demanda e atividades de criação de bens e serviços com fins funcionais. Está
dividido nos seguintes subgrupos: design e novas mídias.
2.1 PONTOS DE CULTURA: OS CLUSTERS DA INDÚSTRIA CRIATIVA BRASILEIRA
Criado por intermédio da Portaria nº 156, de 07/2004, do Ministério da Cultura, e
transformado recentemente em uma política de Estado consolidada por meio da Lei nº
13.018/2014 (BRASIL, 2014), o Programa Nacional de Promoção da Cidadania e da
Diversidade Cultural – Cultura Viva é apresentado, por Silva e Araújo (2010), como
responsável por articular associações da sociedade civil proporcionando-lhes acesso a
recursos públicos que promovam o fortalecimento e o reconhecimento de circuitos culturais
de base comunitária, sob a lógica da produção, recepção e disseminação de produtos que estão
à margem do circuito econômico cultural convencional.
9
Espaços de prospecção com características aderentes à Indústria Criativa.
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Segundo Silva e Araújo (2010), o programa foi implantado envolvendo um conjunto
de ações distribuídas em cinco eixos e desenvolvidas em diferentes graus de consolidação
enquanto ações públicas: Pontos de Cultura, Cultura Digital, Agentes Cultura Viva, Griôs
(Mestres dos Saberes) e Escola Viva. Todavia, o bojo do programa foi ampliado durante o seu
redesenho, de modo que outras dimensões de atuação pudessem ser contempladas à luz do
desenvolvimento cultural, social e econômico demandado pelos beneficiários do programa.
Assim, ações envolvendo novas mídias, tecnologias da informação e comunicação, moda e
design também foram incorporadas às ações do programa, cujo reconhecimento se deu
também por meio de premiações10 e a concessão de bolsas, como o Prêmio Cultura Viva,
Agente Escola Viva, Agente Cultura Viva, Intercâmbio Cultura Ponto a Ponto, Cultura e
Saúde, Tuxaua, Interações Estéticas, Pontos de Mídia Livre, Areté, Estórias de Pontos de
Cultura, Ludicidade e Pontinhos de Cultura, Economia Criativa, Culturas Indígenas, Popular,
Ciganas, Mídia Livre, Hip Hop, entre outros.
A unidade estruturante do Programa Cultura Viva, por meio da qual todas as demais
ações ganham profusão, é o Ponto de Cultura. Silva e Araújo (2010) apresentam a ação
estruturante da seguinte forma:
Pontos de Cultura. O ponto de cultura é a ação prioritária do programa
Cultura Viva e articula todas as suas demais ações. Para se tornar um ponto
de cultura, é preciso que uma iniciativa da sociedade civil seja selecionada
pelo MinC por meio de edital público. A partir daí, um convênio é
estabelecido para o repasse de recursos, e o ponto de cultura se torna
responsável por articular e impulsionar ações já existentes em suas
comunidades. O ponto de cultura não tem um modelo único de instalações
físicas, de programação ou de atividades. Um aspecto comum a todos é a
transversalidade da cultura e a gestão compartilhada entre o poder público e
a comunidade. Atualmente, existem já cadastrados mais de 800 pontos de
cultura em todo o Brasil, que foram selecionados pela antiga Secretaria de
Programas e Projetos Culturais, hoje Secretaria de Cidadania Cultural, do
MinC, por meio de editais. Cada um dos pontos recebe uma quantia de R$
60 mil/ano, divididos em parcelas semestrais e renováveis por três anos, para
investir de acordo com a proposta do projeto apresentado. Parte do incentivo
recebido na primeira parcela, no valor mínimo de R$ 20 mil, é utilizada para
aquisição de equipamento básico multimídia em software livre, composto
por microcomputador, miniestúdio para gravação de CD, câmera digital e
outros materiais que sejam importantes para o ponto de cultura. Esta
iniciativa está integrada a uma das ações do programa Cultura Viva, a
Cultura Digital. (SILVA; ARAÚJO, 2010, p. 40)
10
Cultura Viva. Disponível em: < http://www.cultura.gov.br/cultura-viva1>. Acesso em: 12/03/2015
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Ademais, os Pontos de Cultura são capazes de prospectar ações multidimensionais de
criação de valor social e econômico, possibilitando inclusive, desenvolvimento territorial a
partir da dinâmica cultural desdobrada por meio de atividades formativas e de qualificação
profissional. Dados de 201011 mostram que aos pontos de cultura confluem atividades
singulares ou multiplataformas que percorrem, com destaque, desde as áreas de música e artes
performáticas até manifestações populares, audiovisual, literatura, artesanato, artes plásticas,
fotografia, entre outras. As ações prospectadas no âmbito dos pontos de cultura, por sua vez,
desdobram-se em outras de natureza inclusiva, ao promoverem a democratização de acesso a
bens culturais, formando públicos e novos consumidores da cadeia produtiva cultural.
O anuário Cultura em Números (FUNARTE, 2009), do Ministério da Cultura,
apresenta estatisticamente a evolução da oferta e a criação de mecanismos de acesso aos bens
culturais, sob a lógica do estabelecimento do Programa Cultura Viva. O aumento no número
de cinemas, espaços de exibição, ações de cine-clubismo, concertos, espetáculos, museus,
bibliotecas comunitárias, livrarias, entre outros equipamentos e artefatos da Indústria Criativa,
foram exponencialmente ampliados nos Estados e municípios (BRASIL, 2009).
Dados da Secretaria da Cidadania Cultural (BRASIL, 2013) mostram investimentos
identificados e comprometidos da ordem de R$ 699,2 milhões, no período de 2004 a 2015,
exclusivos para o Programa, sendo de R$ 516,0 milhões o valor do repasse do Ministério da
Cultura. O investimento, partilhado com exigência de contrapartidas dos municípios, Estados
e/ou consórcios públicos ou privados, possibilitou o surgimento de 3.662 Pontos de Cultura
no Brasil, segundo o documento de base do programa.
Assim, à luz do que a política pública cultural representou para as organizações do
Terceiro Setor chanceladas como Pontos de Cultura, bem como, dos desdobramentos, nas
dimensões cultural, social e econômica, é possível estabelecer relações inextrincáveis entre o
novo modelo de Indústria Cultural, que tem a criatividade como cerne de produção, e as ações
fortemente impulsionadas pelo Programa Cultura Viva, uma vez que ao menos uma das
atividades contempladas na Indústria Criativa se insere no escopo de atuação dos Pontos.
Uma análise focada no desenvolvimento de territórios ou clusters criativos, em
espaços aparentemente pouco atrativos para a consolidação de um núcleo ou setor da
indústria, sob a perspectiva da atuação dos Pontos de Cultura, permite o estabelecimento de
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Pesquisa “Avaliação do Programa Educação, Cultura e Cidadania –Cultura Viva”. (IPEA; FUNDAJ, 2010)
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relações de captura acerca dos efeitos de dispersão da política pública cultural em questão
que, segundo a Unctad (2010), ocorrem sob as formas:
•
Dispersões do Conhecimento: nas quais as organizações se beneficiam de
novas ideias, descobertas ou processos desenvolvidos por outras. Nos Pontos
de Cultura, essa transferência ocorre sob a forma das tecnologias sociais e de
gestão;
•
Dispersões de Produtos: desenvolvimento de produtos com foco na demanda e
na
disponibilidade
de
recursos
locais.
Essa
dimensão
permite
o
desenvolvimento de novos produtos ou, ainda, a melhoria de outros já
existentes. Na realidade dos Pontos de Cultura, essa dispersão é multifacetada
e caracterizada, sobretudo, pela atuação no artesanato conceitual e novas
mídias;
•
Dispersões de Rede: nas quais as organizações ganham benefícios de outras,
localizadas em diferentes espaços geográficos, como no aglomerado dos
serviços de produção de filmes em áreas específicas. Os Pontos de Cultura
trabalham em rede, local e regional. A rede articula-se de modo a promover a
troca de conhecimentos e estratégias de gestão e sustentabilidade;
•
Dispersões de Treinamento: quando o trabalho que é treinado em uma indústria
passa a outra, como quando os atores treinados no teatro subsidiado passam ao
teatro comercial ou à televisão. Na lógica de atuação dos Pontos, o treinamento
é empreendido na formação de competências específicas para o setor, por meio
de oficinas, cursos, workshops e encontros;
•
Dispersões Artísticas: quando o trabalho inovador de um artista ou de uma
empresa avança uma forma de arte para o benefício de outros artistas ou
empresas. É o ativo criativo da indústria. O simbólico e o conhecimento que
convergem em ideias inovadoras.
As dispersões acima apresentadas são fortemente identificadas, ao longo do
desenvolvimento das atividades de escopo dos Pontos de Cultura, e promovem a criação de
valor simbólico-cultural, social e, sobretudo, econômico. Esse valor produzido ressoa na rede,
fortalecendo sua estrutura funcional e garantido a manutenção de investimentos, a partir da
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renovação de editais públicos de seleção das organizações que farão a gestão dos Pontos,
impulsionando, consequentemente, a Indústria Criativa nacional.
Com efeito, vislumbrar a multiplicidade de ações que integram os grupos de
patrimônio, artes, mídias e criações funcionais, cujas atividades são claramente reveladas no
universo de produção dos Pontos de Cultura, a estratégia de desenvolvimento de clusters
criativos espalhados pelo país, ao longo de dez anos de existência, com base organizacional
comunitária e com foco na cidadania cultural, consagra o Programa Cultura Viva como um
instrumento estratégico capaz de impulsionar a Indústria Criativa do Brasil. Isso pelo fato de
que o modelo multidimensional do Programa, agora política pública de Estado, conjuga, em
sua estrutura funcional, aspectos de natureza inovadora e criativa, de inclusão social,
sustentabilidade e fruição cultural, a partir dos eixos estruturantes, dentre eles os Pontos de
Cultura e sua gestão compartilhada entre Estado e sociedade civil.
CONCLUSÃO
A análise do Programa Cultura Viva como política pública cultural estratégica para o
desenvolvimento da Indústria Criativa nacional mostra que a estrutura funcional do programa,
revelada na atuação do eixo estruturante Ponto de Cultura, responde às demandas de
investimento, apoio e promoção públicas exigidas para o estabelecimento da Economia
Criativa brasileira, a partir dos setores que compõem a sua indústria. De modo
multidimensional, o Programa Cultura Viva propõe um modelo de desenvolvimento que
contempla o social e o econômico, a partir da riqueza cultural do país.
Contribuição inovadora para a formação de um modelo muldimensional de
fortalecimento e promoção da Indústria Criativa nacional, o Programa Cultura Viva, no
período de 2004 a 2014, disponibilizou investimentos relevantes que, não por acaso,
contribuíram para o desenvolvimento de territórios criativos que trabalham em rede e
articulam ações que caminham para a consolidação da Economia Criativa no Brasil.
Nessa perspectiva, considerando que a temática abordada neste trabalho resulta no
surgimento de uma série de tensões criativas passíveis de investigação, emerge a necessidade
de se entender - em agendas de trabalhos futuros - quais entraves da legislação brasileira ainda
dificultam a disseminação da estratégia de fomento às Indústrias Criativas, em especial, no
que tange ao reconhecimento do fenômeno da inovação e à proteção da propriedade
intelectual desenvolvida nos espaços intensivos em criatividade, como os Pontos de Cultura.
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Políticas Culturais em Revista, 1(8), p. 121-135, 2015 - www.politicasculturaisemrevista.ufba.br
REFERÊNCIAS
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