sexta-feira, 18 de abril de 2025

Entrevista – Gonzo Sandoval (Armored Saint): bateria, fotografia e paixão pelo Metal

Foto: Divulgação

Por Jessica Valentim e Gabriel Arruda 

Formada em 1982, em Los Angeles, Califórnia, o Armored Saint segue firme até hoje, realizando shows ao vivo e lançando novos discos sempre que possível. A ascensão da banda no cenário do Heavy Metal mundial ganhou força anos mais tarde com o álbum Symbol of Salvation (1991), considerado até hoje uma obra marcante do gênero. 

Além das composições impactantes, os músicos do grupo também chamaram atenção individualmente, tanto que o vocalista John Bush, que integrou o Anthrax entre 1992 e 2005, e depois de 2009 a 2010, e o baixista Joey Vera, entre 2004 e 2005, foram convidados a fazer parte da lendária banda nova-iorquina, fortalecendo ainda mais o nome do Armored Saint e atraindo novos fãs para o seu som. 

Às vésperas de se apresentar no festival Bangers Open Air, que acontece nos dias 2, 3 e 4 de maio, no Memorial da América Latina, em São Paulo, o baterista e membro fundador do Armored Saint, Gonzo Sandoval, bateu um papo com a gente. Na conversa, ele falou sobre a expectativa de retornar ao Brasil, sua preparação na bateria, a paixão pela fotografia e os próximos passos da banda.


O Armored Saint vai se apresentar na abertura do Bangers Open Air em São Paulo, no dia 3 de maio. O que os fãs podem esperar do show? Haverá alguma surpresa nas músicas que serão tocadas?

Gonzo Sandoval: Nós decidimos que vamos tocar o que há de melhor no repertório do Armored Saint, então vocês podem esperar que a maioria das nossas músicas mais conhecidas estará no setlist. Afinal, os sucessos são sempre os sucessos (risos).

Como você se prepara pessoalmente para uma turnê? Tem alguma rotina específica para se manter em forma para tocar bateria?

Gonzo Sandoval: Essa é uma excelente pergunta! Para os mais jovens, eu diria que o ideal é começar a se preparar meses antes, praticando a bateria sozinho, tocando as músicas e trabalhando na resistência antes de nos reunirmos com a banda para os ensaios. O Armored Saint é uma banda muito sortuda, pois não ensaiamos muito quando estamos juntos; geralmente fazemos apenas três ou quatro ensaios. Acredito que essa química entre nós é realmente especial, e percebi isso recentemente, já que em algumas das turnês que fizemos não tivemos muitos ensaios, inclusive nas últimas.

Todos nós mantemos nossas habilidades afiadas, mas no meu caso, em relação à parte física de tocar bateria, começo a me preparar bem antes e busco aumentar minha resistência. Assim, quando nos encontramos, tudo flui mais naturalmente e de forma rápida.

Você está com o Armored Saint há décadas. Como sua abordagem à bateria evoluiu ao longo dos anos?

Gonzo Sandoval: Estou com o Armored Saint há décadas, e posso dizer que minha abordagem à bateria evoluiu um pouco ao longo do tempo. Atualmente, estou utilizando a técnica AB com ABS, e tudo tem fluído muito bem. Fiz algumas alterações nos meus conjuntos de bateria e, no momento, estou tocando uma DDrum com um bumbo duplo de 22 por 20 polegadas, que produz um som incrível. Estou bastante satisfeito com essa escolha. Além disso, conto com o apoio de patrocinadores, como as baquetas da Scorpion Percussion e os pratos da Paiste, além do meu assento de bateria. Todos esses elementos são essenciais para o meu estilo único de tocar, que eu chamo de DRUMS OF THUNDER. Sou muito grato a todos eles! Em termos criativos, cada novo álbum traz desafios únicos. O John [BUSH] e o Joey [VERA] são muito criativos quando montam as demos e ideias, então as músicas exigem sempre algo novo de mim como baterista. A gente evita repetir fórmulas, cada disco é um reflexo de onde estamos musicalmente naquele momento.

Você também é apaixonado por fotografia. Pode nos contar um pouco sobre isso? Que tipo de temas você gosta de fotografar?

Gonzo Sandoval: Eu tenho uma grande paixão por capturar imagens em shows de Rock, mesmo que isso represente um desafio considerável. A iluminação varia constantemente, o que requer uma habilidade específica. Me sinto afortunado por contar com amigos talentosos na área da fotografia, como Neo Slowzauer. Igor Vidyashev, do RockXposure.com, é outro amigo e um mentor para mim. Minha motivação inicial para entrar no mundo da fotografia surgiu das câmeras menores. Quando a fotografia digital foi introduzida, decidi me aprofundar mais nesse campo. Em dado momento, pensei: "Sim, aprecio a fotografia, mas não quero estar preso em um quarto escuro". Eu evitava lidar com o processo de revelação de filmes em um ambiente cheio de produtos químicos e que exigia tempo. Entretanto, com a chegada da fotografia digital, é possível capturar uma imagem, visualizá-la e excluí-la em questão de segundos, o que me possibilitou experimentar e buscar composições criativas. Durante minha adolescência, tinha o sonho de desenhar e pintar, mas não sou muito talentoso nessas atividades. Quando peguei a câmera, percebi que podia registrar imagens de maneira similar a como se fosse um desenho ou uma pintura, apenas com um clique. A fotografia é uma arte ampla e cheia de inspiração, e eu realmente adoro isso. Aprendi muito com Igor, que mudou minha maneira de pensar e me estimulou a fotografar. A Canon me incentivou a explorar o universo da Nikon, e atualmente possuo uma D750 acompanhada de uma lente 24-120, que se tornou minha ferramenta de trabalho. A tecnologia evoluiu bastante, e compreender como ela funciona é fundamental para quem deseja ser fotógrafo nos dias de hoje. Não temos mais os tradicionais laboratórios fotográficos, mas sim programas de computadores que utilizamos para edição, como Photoshop e Lightroom, que nos auxiliam a criar fotos impressionantes e inspiradoras.

Você leva sua câmera em turnê? Se sim, tem alguma foto favorita que tenha tirado enquanto viajava com a banda?

Gonzo Sandoval: Eu frequentemente carrego minha câmera, mesmo que não a utilize sempre para tirar fotos. Contudo, quando participamos de festivais e eventos semelhantes, a experiência é extraordinária. Tocamos ao lado de diversas bandas que admiro, e ter a chance de obter um passe para capturar imagens desses artistas é verdadeiramente um privilégio e uma grande honra. Eu aprecio muito essa oportunidade e gosto de registrar momentos do rock and roll. Existem muitas fotografias disponíveis, mas sempre existem aquelas que se destacam, seja da banda ou de qualquer indivíduo que eu tenha retratado.

O Armored Saint tem uma torcida forte e fiel no Brasil. Você tem alguma experiência memorável de visitas anteriores aqui?

Gonzo Sandoval: Nós somos apaixonados pelo Brasil! No ano de 2018, visitamos São Paulo e outros lugares. Lembro que, naquela ocasião, um amigo nos auxiliou a viajar ao Brasil pela primeira vez e nos levou a um incrível restaurante brasileiro. Gosto muito de carne, e lá havia uma extensa seleção de bifes e pratos saborosos. A forma como eles servem os alimentos, fatiando na nossa frente, é uma experiência inesquecível. Além disso, os fãs são muito acolhedores e sempre compartilham suas experiências sobre o impacto das músicas do Armored Saint em suas vidas. É realmente emocionante sentir essa conexão, e nós, como banda, sentimos isso também ao nos apresentarmos lá. A recepção do público foi verdadeiramente impressionante! Estamos bastante ansiosos para retornar ao Brasil no dia 3 de maio para o Bangers Open Air. Faremos um show bem pesado no estilo do Armored Saint.

Você trabalhou com o produtor David Jerden em Symbol of Salvation, e ele faleceu recentemente. Como foi trabalhar com ele e como você acha que a influência dele moldou aquele álbum?

Gonzo Sandoval: David Jerden, que descanse em paz, eu te amo. Sim, ele faleceu há pouco tempo. Meu irmão e eu ficamos gratos por termos sido convidados para seu funeral, então estávamos presentes quando ele fez a transição para uma nova fase de sua existência; sua presença era realmente impactante. Lembro-me dele demonstrando interesse em ouvir a banda antes de nos ajudar a produzir nosso álbum Symbol of Salvation. Ele compareceu a um dos nossos ensaios e recordo que nós conversamos sobre bateria. Eu comentei que adorava o som poderoso, semelhante ao do AC/DC, algo grande e forte, bem impactante; esse era o tipo de batida que eu desejava. Ele disse que também gostava disso, e imediatamente criamos uma conexão. Ele nos levou a um processo de gravação no El Dorado Studio, que era o antigo estúdio de Marvin Gaye na Sunset Boulevard, em frente ao Cat and Fiddle. As coisas mudaram ao longo do tempo, mas aquele era o local. Ele nos permitiu acessar o estúdio e tocar as músicas que planejava gravar para nos ambientar, acho que começamos isso no primeiro dia, seguindo para o segundo, terceiro, quarto e no quinto dia já tínhamos registrado cerca de cinco músicas. Pensamos: 'uau, realmente estamos indo bem', e então ele nos disse que as faixas estavam bem gravadas e eram boas, mas não o suficiente. Assim, ele descartou aquelas cinco primeiras músicas e recomeçamos. As novas composições acabaram se transformando no que Symbol of Salvation representou. Achei isso uma ideia brilhante, pois estávamos convencidos de que estávamos progredindo, mas ele nos deixou nos familiarizar com o estúdio e nos fez acreditar nisso. Quando finalmente estávamos prontos, ele disse que era hora de começar a gravação do álbum. Para mim, isso representou uma preparação para o processo, como um aquecimento para produzir algumas músicas e avaliar nosso desempenho, com ele nos indicando que a jornada agora se iniciava em um nível mais elevado, o que achei incrível.

Olhando para o futuro, o que vem por aí para o Armored Saint depois do Bangers Open Air? Algum plano para novas músicas ou mais turnês?

Gonzo Sandoval: Você está ciente de que muitas novas músicas estão a caminho, e há bastante conteúdo do Armored Saint por vir. Estamos atualmente trabalhando em um novo álbum, e no próximo mês (N.T.: a entrevista foi feita em março), começarei a gravar cerca de cinco faixas. Portanto, estamos nos organizando e nos preparando para apresentar o que espero ser o álbum mais extraordinário do Armored Saint até hoje. Temos tido a sorte de lançar álbuns realmente bons, e cada um deles é único. Mas, incentivamos todos os fãs no Brasil a saírem e absorver um pouco do Armored Saint. Estaremos ocupados, e você pode ter certeza de que estamos muito animados com isso. Mantenha contato conosco através do Facebook, Instagram, perfis pessoais no Facebook e Instagram, e aproveite o show. Cuide-se e venha curtir um pouco do Armored Saint. Nós os amamos!




quinta-feira, 17 de abril de 2025

Cobertura de Show: 13 Fest – Grunge is Dead, Psicodosy, Treze Black e Praga – 05/04/2024 – Tequila Bar, Caçapava do Sul/RS

 


Na sexta-feira, 5 de abril, Caçapava do Sul foi palco de mais uma edição do 13 Fest. O Tequila Bar recebeu um bom público, mostrando que, mesmo no corre diário, o underground do interior ainda tem sangue correndo. 

Organizado pela Treze Black, banda da cidade, o festival trouxe mais uma vez a mistura de música pesada, arte independente, tatuagem, piercings e merchandise, tudo feito no esquema DIY, sem patrocínio grande, só na força que o underground sabe.

Quem abriu a noite foi a Grunge is Dead, tributo ao grunge dos anos 90. Tocando clássicos como "Breed", "Come As You Are" e "Black Hole Sun", a banda conseguiu trazer o público para perto logo no começo. Muita gente cantava junto, aumentando o clima da casa já nas primeiras músicas.

Grunge is Dead

Na sequência veio a Psicodosy, de Santa Maria. A banda mandou um metal progressivo, mas sem deixar o peso de lado, com sons como "Depois do Limbo", "Manipulação" e "Ninguém Vai Nos Salvar", que fizeram o pessoal prestar atenção. O que podia ter virado aquele momento morno entre bandas acabou surpreendendo, tendo até roda rolando em algumas músicas mais agressivas.

Psicodosy

Quando a Treze Black subiu no palco, o 13 Fest virou de vez. A banda que mistura metalcore com nu metal não deu tempo pra respirar: riffs afiados em músicas como "Submerso", "Antivírus" e "Efeito/Caos" (música inédita, apresentada em primeira mão no Fest), vocais absurdos e aquela energia que a gente sabe. 

A resposta do público foi como sempre é com a Treze Black, com moshpit começando já nas primeiras músicas. Diandro Dymme, que iniciou usando uma máscara,  comandava o público, com muito domínio do seu espaço, não deixando que o pique caísse em momento algum. 

A formação atual, já estabilizada há algum tempo, mostra um entrosamento invejável. 



Treze Black 

A banda também aproveitou para mostrar em primeira mão novos sons, como a já citada ", Efeito/Caos" e "Mal Natural". O pessoal conhecia as letras, cantava junto e dava para sentir que muita gente ali acompanha a banda faz tempo. Ainda teve participação especial do vocalista Pedro, do Präga, em um dueto com Diandro.



Fechando a noite, a Präga entrou destruindo tudo. Hardcore rápido, sujo e direto, daquele tipo que não pede licença. Tocando pedradas como "Submissão", "Nova Ordem" e "Sem Anistia", a banda trouxe o discurso político pra dentro do pit. 

"Sem Anistia", música que manda a real sobre a tentativa de anistiar os crimes do governo Bolsonaro, virou grito coletivo em meio do caos. 

Präga

Quem já estava cansado ganhou gás e o pit voltou a abrir, com gente se empurrando até a última nota. A Praga entregou uma apresentação absurda que fechou a noite com a intensidade que o 13 Fest merecia.

O mosh não poderia faltar.

Entre uma apresentação e outra, o som ficava responsável pelas DJ’s Hammer e Spitz, que tocaram desde o emo até o metal extremo. E não vamos esquecer que enquanto tudo isso rolava, tinha um pessoal se tatuando, aplicando piercings e visitando as exposições presentes no evento. 

Foi um evento bem sucedido e plenamente aprovado pelo público, e que com certeza acontecerá mais vezes.



O Fest contou com vários expositores 

No final, ficou claro: o 13 Fest não é um grande festival cheio de estrutura, mas é verdadeiro. É feito pra quem realmente vive e apoia o underground, seja no palco, no pit ou atrás de uma banca vendendo arte independente.

Texto: Mellissa Freitas 
Edição/revisão: Caco Garcia 
Fotos: Mellissa Freitas e Fotos Oficiais do Evento

Instagram das Bandas:


Setlist Grunge is Dead

1 - Breed
2 - In Bloom
3 - Aneurysm
4- Drain You
5- Floyd The Barber
6- School
7- Come as you are
8 - Would
9- Junkhead
10- We Die Young
11- Then Bones
12 - Hunger Strike
13 - Black Hole Sun


Setlist Psicodosy:

1. Depois Do Limbo 
2. Sujando Minhas Mãos
3. Enquanto Existir
4. Meus Demônios
5. Mesmo Nas Sombras 
6. Manipulação
7. Uma Dose
8. Meus Demônios 2
9. Ninguém Vai Nos Salvar


Setlist Treze Black

1- intro 13613
2- homicídio solar
3- sentidos
4- alma órfã
5- passos cegos
6- o mal natural
7- efeito/caos
8 - s.o.n.o
9- submerso
10- antivírus 
11- blind
12- psychosocial


Setlist Präga:

1- Submissão
2- Quem vai lembrar
3- Enxame de vermes
4 - Juízo final
5- Humanidade
6- Em nome do sofrimento 
8- Anseios de Libertação 
9- Nova ordem
10 - Sem anistia



terça-feira, 15 de abril de 2025

Entrevista – Savatage: o reencontro com os palcos que os fãs sempre sonharam

Por Gabriel Arruda 

Savatage, uma das bandas mais icônicas do Heavy Metal mundial, que conquistou seu auge entre os anos 1980 e 1990, anunciou seu retorno às atividades no final do ano passado, após quase uma década de hiato. 

O primeiro show dessa aguardada volta acontece neste fim de semana, no festival Monsters of Rock, no sábado (19/04), no Allianz Parque, em São Paulo, seguido por uma apresentação no Espaço Unimed, na segunda-feira (21/04). 

Em meio aos ensaios, o guitarrista Chris Caffery atendeu rapidamente o Road to Metal para falar sobre esse momento especial e outros assuntos relacionados à trajetória da banda.


Sei que vocês estão no meio dos ensaios, se preparando para os dois primeiros shows deste retorno, que vão acontecer nessa semana no Monsters of Rock (19/04) e o outro no Espaço Unimed (21/4). Como estão os preparativos finais? Imagino que deve estar sendo divertido revisitar essas músicas depois de tanto tempo.

Chris Caffery: Os ensaios têm sido incríveis. Honestamente, nem parece que se passaram tantos anos desde a última vez em que tocamos essas músicas juntos. É como andar de bicicleta, sabe? A gente nunca esquece.


Essa será a segunda vez que vocês tocam no festival Monsters of Rock. Naquela ocasião, dividiram o palco com bandas como Megadeth, Slayer e Dream Theater. Que lembranças você guarda daquele show e também dos outros dois que fizeram aqui?

Chris Caffery: Todos os shows que fiz no Brasil foram incríveis. O Monsters of Rock foi uma experiência inesquecível. Me lembro das câmeras da MTV me seguindo pelo palco em um momento que eu joguei minha guitarra na direção de uma câmera, quase fui parar na plateia, mas acabei me segurando nela e caí de volta no palco. 

Lembro claramente dos caras do Manowar me olhando e dizendo: ‘Isso é metal!’. Os shows principais também foram incríveis. No último que fizemos – o de São Paulo, há alguns anos – foi absolutamente insano. Como eu disse, cada show no Brasil foi uma experiência única. Nunca vou esquecer.


O último show do Savatage foi no Wacken, em 2015. Confesso que fiquei com um pouco de inveja por não ter estado lá para vê-los ao vivo. Mas agora são os fãs de outros países que terão que esperar, já que vocês escolheram o Brasil como ponto de partida para esse retorno. Existe um carinho especial pelo nosso país?

Chris Caffery: Com certeza. O Brasil, junto com a Grécia e a Alemanha, é um dos três países que realmente consideramos como uma segunda casa. Claro, a lista é longa... temos muitos amigos e fãs incríveis na Itália, na Holanda e em tantos outros lugares. Mas esses três, em especial, sempre tiveram shows ao vivo com uma energia única e inesquecível.

O Savatage ficou fora dos holofotes por bastante tempo, mas a música da banda continuou conquistando novas gerações. Imagino que, com o surgimento desses novos fãs, também tenha crescido o desejo de voltar aos palcos, até porque muitos deles nem eram nascidos quando a banda estava ativa. Isso pesou na decisão de voltar?

Chris Caffery: Eu sempre tive a esperança de que voltaríamos a tocar. Parte de mim sabia que isso iria acontecer, mais cedo ou mais tarde. Eu costumava dizer às pessoas que, quando chegasse a hora certa, eu estaria pronto. 

E chegou a hora. Desde a última vez que subimos no palco, ganhamos muitos novos fãs, como você disse, muitos nem estavam vivos na época! Estou muito empolgado para rever os rostos familiares, mas também para conhecer os novos fãs dessa legião que nos acompanha.


O período mais marcante do Savatage foi entre os anos 80 e 90. A banda não viveu tanto a era da internet, das redes sociais e dos serviços de streaming. Como você enxerga a cena do Heavy Metal hoje em dia?

Chris Caffery: É engraçado, porque pra quem tem a minha idade, o Heavy Metal continua sendo uma parte essencial da vida. Claro, mudou um pouco entre os mais jovens, hoje existem muito mais opções de entretenimento do que quando eu era criança. 

Mas a música ainda é muito especial, ainda ocupa um lugar importante na vida de muita gente. Eu diria que talvez não seja mais um estilo de vida tão dominante quanto era nos anos 80, mas vejo muitos fãs jovens super dedicados, e isso é animador. 

Também tem muitas bandas novas excelentes por aí. E os músicos de hoje têm acesso a muitos recursos online, isso ajuda a nova geração a atingir um nível técnico impressionante desde cedo. Quando eu era jovem, se você não tivesse dinheiro para aulas, era praticamente impossível aprender. Hoje você encontra tudo online e de graça.


Na sua opinião, está melhor ou pior do que naquela época? Muitos músicos dizem que os anos 90 foram um período difícil para o gênero, mas foi justamente ali que a banda lançou "Edge of Thorns", talvez a música mais emblemática da carreira do Savatage. Como foi enfrentar a ascensão de outros estilos musicais naquela época?

Chris Caffery: Como eu disse, naquela época a gente precisava se virar para aprender. Ou você pagava por aulas ou passava 20 horas tentando tirar uma música de ouvido. Hoje você abre um vídeo no YouTube e alguém te ensina um solo em cinco minutos. 

E sim, os anos 90 foram diferentes. Nos anos 80, o Metal estava em alta, era moda. Já nos 90, vieram as camisas de flanela, nada de maquiagem, nada de spray de cabelo. O Metal saiu dos holofotes e voltou para o underground, de onde veio nos anos 70, com bandas como Black Sabbath e Led Zeppelin. 

A diferença é que nos anos 90 surgiram grupos como Metallica, Alice In Chains e Pantera, que tinham uma pegada mais crua, mais de rua, mais próxima das raízes. Foi um contraste forte com o estilo glam que dominava a MTV nos anos 80, como Guns N’ Roses, Whitesnake, Mötley Crüe e Bon Jovi.

Além dos shows de reunião, vocês estão trabalhando em um novo álbum, previsto para ser lançado ainda nesse ano de 2025. O que os fãs podem esperar? Será uma continuação da onde pararam ou pretendem revisitar toda a essência do Savatage?

Chris Caffery: Nosso objetivo é fazer um álbum do Savatage que seja realmente grandioso. Já se passou muito tempo, então queremos garantir que ninguém se decepcione. O Savatage tem uma história musical rica, com composições cheias de narrativa, vocais marcantes, contrapontos e queremos continuar explorando tudo isso. 

Vamos honrar o legado do Paul O’Neill e usar todas as influências que ele nos deixou. Claro que sentiremos falta dele como letrista e produtor, mas vamos fazer o possível para canalizar sua energia e entregar o melhor disco que pudermos.


Chris, não quero tomar mais do seu tempo. Sei que você está bastante ocupado. Muito obrigado pela atenção! Você gostaria de deixar uma mensagem para os fãs brasileiros?

Chris Caffery: Quero apenas agradecer por estarem sempre com a gente. Vocês são uma das grandes razões pelas quais estamos voltando. Sentimos a falta de vocês, amamos vocês e mal podemos esperar para vê-los de novo!



segunda-feira, 14 de abril de 2025

Cobertura de Show: The Amity Affliction – 06/04/2025 – Carioca Club/SP

The Amity Affliction apresenta show enérgico em única apresentação no Brasil

Australianos trás show recheado de hits e emoção para fãs brasileiros.

A banda australiana The Amity Affliction fez sua segunda, e rápida, porém marcante passagem por São Paulo no domingo, 6 de abril de 2025. Com um setlist já conhecido dos fãs brasileiros, o grupo não economizou na entrega e realizou um show memorável no Carioca Club.

Sem banda de abertura, o público se concentrou em peso na casa, aguardando com ansiedade o início da apresentação, que começou pontualmente às 20h, conforme prometido. O local estava lotado, com a grade disputada e uma plateia fervorosa — foi esse o cenário que Joel Birch (vocal), Dan Brown (guitarra), Joe Longobardi (bateria) e Johnathan Reeves (baixo) encontraram ao subir no palco. Logo no início, o vocalista recebeu e posicionou no palco uma bandeira do Brasil com o nome da banda, preparada pelos fãs — um gesto que já demonstrava o carinho mútuo entre artista e plateia.

A abertura ficou por conta de “Pittsburgh” (Let the Ocean Take Me, 2014), o hino mais conhecido da banda, que incendiou a casa e deu o tom da noite. Na sequência, “Drag the Lake” (Misery, 2018) emocionou e fez o público cantar em uníssono. Desde os primeiros acordes, dava pra sentir que aquela noite seria especial.

A conexão entre banda e público foi intensa: cartazes, sorrisos, olhares e gestos de carinho dominaram o ambiente, suavizando a atmosfera pesada das guitarras e dos vocais guturais. Joel, sempre atento, interagia com os fãs o tempo todo e, entre uma música e outra, pedia para abrirem espaço para o mosh, que era atendido de imediato, com a pista se abrindo como um mar em meio ao caos.

Clássicos como “Chasing Ghosts” (Chasing Ghosts, 2012) agitaram ainda mais a plateia, e um dos pontos altos da apresentação foi a execução da nova “All That I Remember”, que mostra que a banda segue firme, evoluindo sem perder a carga emocional característica das suas melodias. “Death’s Hand” (Let the Ocean Take Me, 2014) foi entoada como um verdadeiro hino, com o público — em sua maioria jovem — matando a saudade da banda, que havia se apresentado no Brasil pela primeira vez em 2017.

Já às 21h05, o show se encaminhava para o fim. No encore, a banda voltou ao palco com “Soak Me in Bleach”, encerrando com chave de ouro sua passagem pelo país. Joel agradeceu ao público em português, em mais um momento de afeto genuíno, e deixou claro o quanto a banda valoriza os fãs brasileiros. Ao fim da apresentação, enquanto tocava “Girls Just Want to Have Fun”, de Cyndi Lauper, os integrantes ainda interagiram com o pessoal próximo à grade, dando atenção e sorrisos — o tipo de detalhe que fica na memória de quem esteve lá.

Foi uma noite incrível. Tomara que voltem logo!


Texto & Fotos: Raíssa Campos 

Edição/Revisão: Gabriel Arruda 


Realização: GIG Music

Press: Tedesco Comunicação & Mídia


The Amity Affliction – setlist: 

Pittsburgh

Drag the Lake

The Weigh Down

Like Love

Don't Lean on Me

Open Letter

All My Friends Are Dead

Chasing Ghosts

All That I Remember

Death's Hand

I See Dead People

My Father's Son

It's Hell Down Here

Give It All

Bis 

Soak Me in Bleach

Cobertura de Show: Matanza Ritual Fest – 28/03/2025 – Audio/SP

Ergam-se os copos! Matanza Ritual Fest fecha março com chave de ouro

O já conhecido festival organizado pela banda transforma a Audio em um verdadeiro caos.

Após ser adiado em dezembro de 2024, o tradicional festival da banda Matanza Ritual finalmente aconteceu na última sexta feira (28 de março) na Audio, zona oeste de São Paulo, com convidados de peso e seguindo a tradição de apresentar ao público novas bandas em ascensão: Allen Key  abriu  os trabalhos, seguidos por Pavilhão 9,  os veteranos do Ratos de Porão e os anfitriões da noite Matanza Ritual, que além de relembrar músicas já conhecidas pelos fãs, apresentou novidades do seu novo álbum, "A Vingança é Meu Motor", disponibilizado nas plataformas digitais a poucos dias atrás. 


A animada Allen Key

Com um público ainda tímido, a banda paulistana de Hard Rock Allen Key deu início aos trabalhos da noite pontualmente às 21h35. Animados, já que haviam se apresentado no festival Lollapalooza horas antes, eles estavam prontos para oferecer um show enérgico e especial. Mesmo com a pequena plateia e o tempo limitado, Karina Menasce (vocal), Victor Anselmo (guitarra), Pedro Fornari (guitarra), Mateus Hortêncio (bateria) e Raphael Paiva (baixo) se entregaram completamente ao momento, trazendo versatilidade e atitude. A vocalista irradiava felicidade, sempre agradecendo pela oportunidade de estar ali.

Quem já acompanha o Matanza Fest há algum tempo conhece bem a dinâmica do evento, que costuma incluir bandas em ascensão no lineup, trazendo um frescor ao festival. Com o Allen Key não foi diferente. Apesar de já estarem na cena musical há algum tempo, para muitos presentes era a primeira vez que eles tinham contato com a banda.

A vocalista Karina, muito carismática no palco, interagiu com os outros músicos em vários momentos, demonstrando um ótimo entrosamento e proporcionando um show incrível. A apresentação começou com “Granted”, uma música já conhecida pelos fãs. Em seguida, eles tocaram canções de diferentes álbuns da banda, como “Straw House”, “Death from Above” e o mais recente lançamento, “Easy Prey”. Ainda apresentaram “Get in Line” e finalizaram com “The Last Rhino”.






Pavilhão 9 representando o Rap no Fest.

Uma das apresentações mais aguardadas da noite foi da banda Pavilhão 9, que, desde os anos 90, traz em sua trajetória uma mistura inconfundível de Rap e Rock, com letras de protesto. Ao longo de sua história, a banda acumulou diversas parcerias com grandes nomes de vários gêneros. O público estava animado para ver Rhossi, o vocalista fundador, e sua trupe. Era evidente a expectativa da plateia; todos ali queriam testemunhar o Pavilhão 9 — nome que faz referência a uma torcida organizada do time de futebol Corinthians — e seu Rap com letras afiadas, complementado por solos de guitarra.

Usando uma máscara de ferro, o vocalista deixou claro, logo nas primeiras músicas, que não haveria espaço para conversas paralelas. Com uma mistura de letras politizadas, guitarra, baixo, bateria e um DJ, não demorou para que a galera se animasse e participasse ativamente do momento.

A apresentação foi especial. No palco, além dos músicos Rhossi (vocal), Beto Braz (baixo), Leco Canali (bateria), DJ MF e Doze (vocal), que tem acompanhado as raras apresentações da banda, estavam também dois ex-integrantes: o guitarrista Blindado e o respeitado baterista Fernando Schaefer (ex-Korzus), que trouxeram ainda mais força e um sentimento de nostalgia aos fãs.

O setlist, repleto de sucessos consagrados, incluía músicas como "Grito de Liberdade", "Acredita Não Dúvida" e "Vai Explodir", mostrando por que o Pavilhão 9 é uma referência quando o assunto é colocar o dedo na "ferida".






Ratos de Porão mostrando o porquê é considerado uma das maiores bandas punk/hardcore do Brasil

Ir a um festival que tem Ratos de Porão no line-up é ter a certeza de que teremos ótimos momentos com João Gordo, Jão, Boka e Juninho, com seus pulos incríveis. Cada dia mais ativa, a banda paulistana nunca decepciona, seja pela animação, pelos clássicos do setlist ou pelas letras politizadas entoadas não só pelo vocalista João Gordo, mas também pelos fãs presentes no local. E na sexta-feira não foi diferente: subindo ao palco às 23h55, sem pedir licença, já iniciaram com “Ódio”, seguido de “Anarcofobia” e “Amazônia”. Nunca mais sabíamos o que esperar; foi um show para ninguém botar defeito!

Casa cheia, público pronto para o caos que se transformava em mosh e vozes ecoando por toda a Audio. Não havia ninguém parado ou com sono, apesar do horário. Ao contrário, a cada música a resposta era imediata, confirmando o efeito Ratos de Porão. O setlist, lotado de clássicos como “Sofrer”, “Juventude Perdida”, “Alerta Antifascista”, “Crucificados pelo Sistema”, “Beber até Morrer” e com uma breve introdução de 'Bolsonaro na Cadeia', "Aids, Pop e “Repressão” deixou o clima fervendo para os anfitriões. João Gordo fazia paradas estratégicas para respirar, e quem estava na pista aproveitava para também recuperar o fôlego.

É impressionante o poder e a potência que o Ratos de Porão apresenta em seus shows. Para públicos de diversas faixas etárias, não há quem fique atônito ou quieto diante dos quatro músicos. O show do Ratos terminou às 00h45, e você acha que havia alguém desanimado, fraco ou inconsistente? Não! Estavam todos preparadíssimos para o último show da noite...



E veio aí eles... MATANZA RITUAL!

Nem mesmo o atraso de 25 minutos (com início às 1h25 da manhã) foi capaz de desanimar os fãs da banda, que entoavam com empolgação a icônica frase: "Hey Jimmy...". A ansiedade tomava conta de cada canto do local, assim como o público — o espaço do mosh já estava garantido e a animação, em nível máximo. Tinham os fãs veteranos, os +30, mas também muita gente nova, uma geração estreante no festival, que reacendia a energia dos mais antigos.

Quando as cortinas se abriram, o clima já era de pura expectativa. No palco, Antônio Araújo (guitarra), Amílcar Christófaro (bateria) e Renan Campos (baixo, substituindo Felipe Andreoli, ausente por compromissos com o Angra) já estavam a postos, aguardando o momento de explosão: a entrada de Jimmy London, a voz inconfundível do Matanza Ritual. E foi só ele pisar no palco que o público foi ao delírio. A noite começou com “Paciente Secreto”, do recém-lançado álbum A Vingança É Meu Motor, e mesmo sendo uma faixa nova, a galera já estava cantando junto como se fosse clássico.

Mas claro, o que a maioria esperava eram os hinos. E eles vieram, um atrás do outro: “Meio Psicopata”, “Remédios Demais” e “A Arte do Insulto” ecoavam pelos quatro cantos. Jimmy não parava um segundo sequer — a mesma energia que eu vi há 10 anos em outro Matanza Fest estava ali de novo, intacta. A plateia respondia à altura, em gritos e refrões cantados com a alma. Era impossível ficar parado — uma chuva de clássicos embalava a madrugada de sexta para sábado.

Com um setlist de 30 músicas, o Matanza Ritual entregou uma performance memorável, reunindo os maiores sucessos da banda, brincando com frases emblemáticas e revivendo o espírito dos antigos, insanos e inesquecíveis Matanza Fests. Às 2h da manhã, ninguém queria saber de parar — era caos completo na Áudio, do jeitinho que a gente gosta.

E aí veio “Tempo Ruim”. E como sempre, todos cantando em uníssono. Um dos maiores sucessos da banda, e, segundo Jimmy, sua música preferida — com razão. Logo depois, o caos voltou com força total com “Lei do Esforço Mínimo”, uma das novidades do novo disco. O público aproveitou a sequência seguinte, com “Melhor Sem Você” (rara nos shows), “Mulher Diabo” (que teve um probleminha técnico na guitarra) e “Nascido num Dia de Azar”, pra dar uma respirada e abastecer o copo.

Mas a trégua durou pouco. Quando chegou “Todo Ódio da Vingança de Jack Búffalo Head”, o que já era insano virou um pandemônio — o mosh cresceu, o público enlouqueceu, e a energia parecia infinita. Tinha de tudo no meio da roda: veteranos, novatos, mulheres, homens e até um Goku (!) pulando no meio do caos. Já passava das 3h da manhã e, sinceramente, se deixassem, o show só acabaria lá pelas 5h.

Quem esteve lá viveu um momento único: a prova de que o Matanza Ritual segue forte, com um público fiel, vibrante e apaixonado. O chamado não vem só do bar — vem do palco, da voz de Jimmy London, e ainda faz muito, muito barulho.

Vida longa ao Matanza Ritual.






Texto & Fotos: Raíssa Correa

Edição/Revisão: Gabriel Arruda


Realização: Top Link Music


Allen Key – setlist:

Granted

Straw House

Death from above

Easy Prey

Get in line

The Last Rhino


Pavilhão 9 – setlist:

Grito de Liberdade

Tudo por Dinheiro

Trabalhador

Trilha do Futuro

Acredita Não Dúvida

Lockdown

Lados Opostos

Opalão Preto

Vai Explodir

Execução Sumária

Reação

Mandando Bronca.


Ratos de Porão – setlist:

Ódio

Anarcofobia

Amazônia Nunca Mais

Sofrer

SOS País Falido

Mais

Cérebros Atômicos

Juventude Perdida

Exército de Zumbis 

Difícil de Entender

Toma Trouxa

Arranca Toco

Alerta Antifascista

Crucificados pelo Sistema

Não me Importo

Suposicollor

Beber até Morrer

Aids, Pop, Repressão

Obrigado a Obedecer


Matanza Ritual – setlist:

Paciente Secreto 

Meio Psicopata

Remédios Demais

A Arte do Insulto

Bom é Quando Faz Mal

O chamado do Bar

Eu Não Gosto de Ninguém

Tudo Errado

Carvão, Enxofre e Salitre

Assim Vamos Todos Morrer

Clube dos Canalhas

O último Bar

Maldito Hippie Sujo

Pé na porta, soco na cara

Tempo Ruim

Lei do Mínimo Esforço

A casa em frente ao Cemitério

domingo, 13 de abril de 2025

Cobertura de Show: Atheist


 
O ano corrente foi iniciado com uma leva de promessas para todos aqueles que possuem uma afeição pelo Metal extremo, e apesar de estarmos no 1º trimestre, pode ser observado que as promessas felizmente estão sendo acompanhadas das entregas também.

Mais recentemente, os apreciadores do "Metal da Morte" foram agraciados com 2 nomes que são um testemunho do quão experimental o Death Metal veio a se tornar desde a sua concepção nos anos 80, sendo tão iguais e tão diferentes ao mesmo tempo: os norte-americanos do Atheist e os canadenses do Cryptopsy, nomes estes que não davam as caras em terras brasileiras há anos.

Com o assalto tendo local marcado (o Fabrique Club, no bairro da Barra Funda), esta dupla de bandas teve a missão de oferecer uma noite que, apesar do grande calor devastar a capital paulista, provaria ser fora do usual: cortesia da união entre a Chamuco, Xaninho Discos e a Caveira Velha Produções para trazer um casal de veteranos do "Tech Death".


ATHEIST

A Presença Deles É, De Fato, Inquestionável

Formada um pouco antes da nossa atual Constituição Federal ser promulgada, o ATHEIST é visto como um dos precursores do Death Metal Técnico, com a sua mistura incomum de jazz com elementos progressivos e até de Thrash Metal aliados ao seu som base.

A mencionada mistura foi usada como referência para outros atos considerados como influentes dentro não só do nicho ao qual faz parte, mas fora dele também: sendo um dos principais o DEATH, do lendário Chuck Schuldiner, que ajudou a moldar o que o seu som veio a ser a partir do icônico Spiritual Healing.


Ainda que com um atraso, o quinteto composto por Kelly Shaefer (vocal), Jerry Witunsky (Guitarra), Alex Haddad (Guitarra), Yoav Ruiz-Feingold (Baixo) e Steve Flynn (Bateria) gradualmente foi subindo ao palco sob o som proposital de In The Flesh, do Pink Floyd. Proposital porque ela ajuda a estabelecer a tonalidade psicodélica que envolve os contos audíveis oferecidos pelo ATHEIST, capaz de colocar a mente de quem os escuta em estado de transe.

Nascida através de uma demo, a abertura ficou por conta do encerramento do fantástico Piece of Time (lançado em 1990): NO TRUTH, e foi aqui que todos os músicos assumiram os seus postos. Kelly Schaefer, SEMPRE exalando bom-humor, já chegando soltando um "ei, ei, ei!" para soltar um barulho da multidão presente, que infelizmente ainda tinha muito lugar a ser preenchido no Fabrique Club.



O que iria ser visto daqui em diante era uma volta por uma passagem do tempo (trocadilho intencional), sendo o foco central os três primeiros trabalhos deles: Piece of Time, Unquestionable Presence e Elements. Se o anime Cavaleiros do Zodíaco chegou a despertar o seu interesse por astronomia, o mesmo potencial pode ser encontrado aqui, em formato musical, pois uma definição apropriada do ATHEIST seria "bestialidade audível com finésse cósmica".

Havia uma certa timidez para a criação de moshes dentro da casa, e era um tanto justificável, devido ao fato dos que estavam ali presentes se encontravam em estado de espanto ao estarem diante de verdadeiros professores ministrando uma aula de "Como Performar Death Metal Fora da Caixa", especialmente em ON THEY SLAY.


O baixista Yoav já estava ligado nos 220v desde que o show iniciou, e considerando que UNHOLY WAR é uma pura barricada sonora impiedosa, ele ficou de um lado ao outro no palco, sempre com a infame posição do dedo indicador direito levantado em movimentação circular, ordenando a formação de moshes, que gradualmente foram acontecendo.

A expressão popular "de 8 a 80" é mais do que apropriada para ser usada aqui, pois quando alguns dos sons de Elements tomaram conta do repertório, o ATHEIST demonstra a sua veia mais experimental com elementos progressivos e a influência pesadamente orientada do jazz, podendo ser visto sem esforço algum em MINERAL. Tudo isso casado com o peso tradicional do Death Metal, e explicando em atos o motivo do quão diferenciado e influentes os combatentes vindos dos Estados Unidos são.



Não havia muitas pausas e discursos entre uma pedrada e outra. Unquestionable Presence é o álbum favorito de muitos que ouvem o quinteto, mas somente perto da metade da apresentação que ele veio a marcar presença. Se lembra da influência que eles causaram no DEATH, mencionada lá em cima? Unquestionable Presence tem grande parte da "culpa" nisso, aparecendo nas formas de ENTHRALLED IN ESSENCE e YOUR LIFE'S RETRIBUTION. Foi a partir daqui que Schaefer elevou a sua agitação e, no meio das suas interações com o público, convidava gentilmente o público a "bangear", dizendo: "batam as suas cabeças, porra!".

AIR e FIRE, ambas do Elements, apresentam uma dualidade que talvez tenha sido uma piada interna colocarem uma em sequência da outra. AIR é uma declaração de intenção, que, para estar no ATHEIST, cada musicista precisa ser bom, onde cada instrumento aparenta ser uma extensão do corpo de cada um, com uma introdução calma, quase caleidoscópica, até que eventualmente chega ao estado de uma nevasca em atividade. 


FIRE, outro dos elementos naturais, possui uma abordagem mais agressiva, sendo bem mais "na sua cara", além de um vocal mais grave. Isso não excluiu, porém, a possibilidade de FIRE incluir as suas tradicionais passagens de jazz e até mesmo Fusion (algo que Paul Masvidal usaria com grande efeito no CYNIC).

Após mais da metade da performance ter acontecido, e o próprio Kelly se autoentitular como um "estadunidense estúpido" pelo seu vocabulário em Português ser composto apenas pela palavra "obrigado" (embora isso já diga mais do que aqueles que acreditam que o Brasil tem o Espanhol como a sua língua nativa), um destaque é merecido para I DENY: uma dedicatória a Roger Patterson, baixista da formação original que faleceu prematuramente, dando aquele clima tocante no ar. 

Deve ser notado que é neste momento em que Kelly orgulhosamente aponta para Yoav Ruiz-Feingold, dizendo que ele é o melhor baixista do ATHEIST desde a partida de Roger.



A trindade de maior hype entre os entusiastas do ATHEIST ficou para um final triunfante: Unquestionable Presence, Mother Man e a faixa-título do primeiro lançamento Piece of Time, anunciando o final desta autêntica viagem mental e extracorpórea, capaz de fazer o ouvinte questionar quanto tempo se passou desde que o "passeio" começou.

Após os carros-chefe dos iniciados pelo ATHEIST, vimos uma despedida levemente prolongada por parte dos seus membros, nesta que foi somente a segunda vez deles no Brasil. Mesmo com a casa tendo espaço suficiente para mais pessoas povoarem, isso não impediu o semblante de agradecimento pelo quinteto, cuja passagem certamente será carregada por uma miríade de características capazes de descrever que... sim, a presença deles foi, de fato, inquestionável.



Nota: há uma música chamada Samba Briza em seu histórico, e ela não foi reproduzida aqui. Samba Briza. Brasil.

O motivo para isso está além da minha compreensão.

Texto e fotos: Bruno França 
Edição/revisão: Caco Garcia 

Setlist

1) No Truth
2) On They Slay
3) Unholy War
4) Water
5) Mineral
6) Enthralled In Essence
7) Your Life's Retribution
8) Air
9) Fire
10) Brains
11) Room With A View
12) I Deny
13) Unquestionable Presence
14) Mother Man
15) Piece of Time