Limes: A Mariologia Antiga em Santo Ambrósio de Milão
Limes: A Mariologia Antiga em Santo Ambrósio de Milão
Limes: A Mariologia Antiga em Santo Ambrósio de Milão
A mariologia antiga em
Santo Ambrósio de Milão
pp. 139 - 158
Abstract
The Christian faith believes that Maria is the only human person that
deserves the establishment of an own theology by the Church, named Mariology,
because she was elected by God to be the Savior’ Mother. This theology is based in
four dogmas that had been proclaimed across the centuries: the Divine Maternity
(431); the Perpetual Virginity (553 and 649); the Conception Immaculate (1854) and
the Maria’s Assumption (1950). By the way, she received a very special veneration by
the believers as the Jesus’ Mother. She, the Apostles and the martyred people were
considered as Saints. The Latin and Greek priests had been inspired by her to think
about the Incarnation Mistery, as Ambrosio of Milan, one of the most important
apologists of Maria and her sanctity. He was the first to affirms that the Maria’ sanctity
was a necessary condition to the compliance of her mission as the God’s Mother.
Resumen
La fe cristiana considera que María, por haber sido elegida por Dios
para ser la madre del Salvador, es la única persona humana que merece de la Iglesia
el establecimiento de una teología propia, la Marialogía. Esta se fundamenta en
cuatro dogmas proclamados a lo largo de los siglos: la Maternidad Divina (431); la
Virginidad Perpetua (553 y 649); la Inmaculada Concepción (1854) y la Asunción
de María (1950). De la misma forma, era digna de una veneración especial por los
fieles, una vez que era la madre de Jesús y, así como los apóstoles y los mártires,
a su memoria la cultivaban como una santa. Los Monjes latinos y griegos la han
tomado como base para sus reflexiones sobre el Misterio de la Encarnación, de entre
ellos Ambrosio de Milán, uno de los más importantes apologistas de María y de su
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santidad. Él ha sido el primero en afirmar que la santidad de María era la condición
esencial para el cumplimiento de su misión como la Madre de Dios.
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esde o início da História do Cristianismo que Maria, mãe
de Jesus, é considerada como digna de uma veneração toda
especial por parte dos fiéis. Escolhida por Deus para ser a
mãe do Salvador, Maria é a única pessoa humana a merecer da Igreja o
estabelecimento de uma teologia própria, a Mariologia, fundamentada
nos quatro dogmas que, ao longo dos séculos, foram sendo desenvolvidos
e fixados a seu favor: a Maternidade Divina (Concílio de Éfeso, de 431);
a Virgindade Perpétua (Concílios de Constantinopla II e de Latrão,
respectivamente de 553 e 649); a Imaculada Conceição (estabelecido
pela Bula Ineffabilis Deus do papa Pio IX, em 8 de dezembro de 1854); a
Assunção de Maria (Constituição Apostólica Manificentissimus Deus
do papa Pio XII, de 1 de novembro de 1950).
Na Igreja Antiga, sua memória era recordada como santa ao
lado dos apóstolos e mártires, enquanto entre os Padres, gregos e
latinos, sua figura foi tomada como base para as reflexões acerca do
Mistério da Encarnação divina, já que fora através dela que o Salvador
havia encarnado entre os homens.
Um dos principais apologistas marianos, foi Santo Ambrósio
de Milão, bispo de 373 a 397, o primeiro a afirmar ser a santidade de
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GREGORIO DE NAZIANZO, Carta a Cledonius Sacerdote, 101 In: FRANGIOTTI,
1995, p. 104.
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Deus enviou seu Filho que nasceu de uma mulher (...), a fim de remir
os que estavam sob a Lei...”.
Este é o testemunho neotestamentário mais antigo sobre Maria, já
que a carta paulina é comumente datada de 49 d.C., constituindo-se em
um dos poucos textos paulinos sobre a Encarnação, que ele considera
como evento preparatório da Salvação. Percebe-se, contudo, a pouco,
ou melhor, nenhuma atenção dada à pessoa de Maria, que nem chega
a ser denominada, assim como à questão da virgindade da mãe do
Messias, que nem sequer é mencionada!
São, assim, nos Evangelhos que devemos buscar os elementos
básicos para a elaboração de uma teologia propriamente mariana.
No mais antigo Evangelho sinóptico, o de Marcos, Maria não aparece
revestida de nenhuma característica especial. Ao contrário, mostra-se
até como incapaz de compreender a extensão da tarefa confiada a Deus
a seu Filho (Mc., 6,3).
Já em Mateus, logo na introdução, encontramos a genealogia de Jesus.
Esta remontaria a Abraão, passando por Davi, sempre determinada pelo
lado paterno, exceto para o próprio Jesus: “Jacó gerou José, esposo de Maria,
da qual (grifo nosso) nasceu Jesus que é chamado Cristo” (Mt., 1,16).
Em Mateus, Maria é aquela que não só dá à luz a Jesus (1,25),
como é a virgem que o concebe por virtude do Espírito Santo (1,
18), realizando a profecia de Isaías. Temos, aqui, os fundamentos dos
dogmas marianos da Maternidade Divina e da Virgindade Perpétua
em sua primeira parte: “E sem que ele (José) a tivesse conhecido, ela
deu à luz o seu filho” (1,18).
Mas é em um Evangelho apócrifo, de grande circulação entre os
primeiros séculos cristãos, principalmente nas províncias orientais do
Império Romano, o “ProtoEvangelho de Tiago”, um dos mais antigos
do Novo Testamento (final do século I), que se mostra sistematizada
a crença na virgindade perpétua de Maria: antes do parto, na prova
a que Maria e José são submetidos (cap. XVI); durante o parto, no
exame corporal feito por Salomé em Maria (caps. XIX e XX); e depois
do parto, ao atribuir a um casamento anterior de José a existência de
possíveis irmãos de Jesus.
Na medida em que a virgindade de Maria seria o sinal escolhido
por Deus para revelar ao mundo a chegada do Salvador, daí resultaria
a conveniência teológica para a ideia da sua manutenção posterior ao
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Apenas três anos após a eleição episcopal, publica uma pequena obra
de cunho moral e pedagógico, De Verginibus, coletânea de sermões e
meditações a respeito de Maria e onde já apresenta duas das suas ideias
fundamentais sobre a Mariologia: chama-a de Mãe de Deus e insiste
em afirmar a sua virgindade perpétua.
Apesar disto, a obra não pode ser considerada como um tratado
teológico. O “Pai” da Mariologia Latina mesmo chamando Maria de
a Mãe de Deus, não chega a cunhar nenhuma nova expressão a ser
utilizada no seu culto. Maria é a Virgem (I, 21), a Mãe (I, 23), a Mãe de
Deus (II, 7),a Mãe do Filho de Deus (II, 10), a Virgem Maria (II, 19).
Nestes títulos podemos observar, claramente, o destaque dado à
virgindade e à maternidade. Ambrósio é o primeiro Padre a colocar
de forma evidente Maria como participante estreita do Mistério
da Encarnação. Ela agiu, ela foi a geradora daquele que redimiu a
humanidade: “Depois, ele (o Espírito Santo) veio sobre a Virgem Maria
e o poder do Altíssimo a cobriu com a sua sombra quando ela gerou
(grifo nosso) a redenção para o gênero Humano.”8
Ambrósio é também o primeiro a defender um argumento que
influenciará enormemente toda a tradição latina posterior: o de que a
concepção virginal fora a raiz, a base da isenção de Cristo da herança
do pecado original9, e isto antes de Santo Agostinho. Tudo isto se daria
devido ao fato de que o início de Cristo como homem foi de Deus: “não
foi do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem,
mas do Espírito Santo e da Virgem que ele nasceu.”10
Ele retornará ao tema da Encarnação em vários escritos. Este se
constitui em um acontecimento singular, único, que não altera a
ordem da natureza, criada por Deus, apenas a completa, já que “o
parto da Virgem não mudou a natureza, mas renovou o uso de gerar
(...). A Virgem, por isto, teve algo de seu para dar (...) ofereceu o
que tinha de próprio nas suas entranhas de modo insólito sim, (mas)
mediante dom sólito”.11
Contudo, em Sobre os Mistérios, 59 Ambrósio dirá que sim, que a
natureza fora alterada, mas porque obra divina
8
AMBROSIO DE MILÃO, Sobre os Mistérios, 59
9
V. DE FIORES & MEO, 1995, p. 1023
10
AMBROSIO DED MILÃO, Sobre o Salmo 37
11
AMBRÓSIO DE MILÃO, De incarnationis dominae sacramento, IX, 104.
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mãe do Senhor, ele que era descrito como um homem justo? Seria
absolutamente impensável19.
E quanto a Maria, deixar-se-ia levar pelo erro de, logo ela, a mestra
da virgindade, como a chama, depois de ter trazido em seu seio Deus
resolvesse entregar-se a um homem? Também questão descabida e
sem propósito20.
E quanto ao próprio Deus? Será que poderia ter escolhido como
mãe alguém que “contaminasse, pelo contato com um homem, o
seu celeste seio, como se fosse impossível conservar intacta a sua
integridade virginal?”21
19
Ibid., 6,45
20
Ibid. Ibidem.
21
Ibid. Ibidem.
22
AMBROSIO DE MILÃO, A Virgindade, I, 31.
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Maria, para Ambrósio, não é apenas aquela que creu, mas uma
mulher que sabia quem havia gerado, quem era aquele que morria. É a
nova mulher, a nova Eva, de um mundo novo, aquela que assim agira
em prol da salvação do mundo. Em suma, o exemplo maior de criatura
humana, a Mãe Sempre Virgem de Deus deveria ser também o modelo
a ser seguido pela Igreja e por todos os fiéis: “Esteja em cada um a alma
23
AMBROSIO DE MILÃO, A Educação das Virgens 6,49. In: TONIOLO, 1995, pp.
1024-1025.
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GOMES, 1979, pp. 446
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