14.7.25

Google maps


Saber onde estava
não lhe garantia
que pudesse saber
para onde ir.
Saber de onde vinha
tão-pouco quem era.
Havia quem morresse com mais mérito.




23.6.25


The book boyfriend

Era uma tendência, diziam,
as raparigas apaixonavam-se
pelo homem perfeito — terno, atencioso,
rico, inteligente. E etc. Parecia nem precisar
de ser bonito. Bastava-lhe olhá-las nos olhos
e não existir senão nos romances românticos.
Simply put, a book boyfriend is a character
you can’t stop thinking about
— and longing for — beyond the page.
Havia precedentes, sabia-se. 
Os herdeiros dos livros da Jane Austin,
o Mr. Rochester da Charlotte Brontë,
e outros, e outros
que inflamavam a imaginação
de Emma Bovary,
fazendo-a supor-se personagem de uma novela.
Aquela na qual o mundo obedecia aos olhos
que percorriam as páginas. Aquela na qual
o corpo e o coração coincidiam com as coisas.
Era uma ficção, acabara mal, 
mas talvez, na verdade, ninguém duvidasse
da distinção entre  real e ficção.
Seria por isso que ninguém podia preferir
a pobre e crua realidade do real.
A literatura não tinha outra utilidade.




17.6.25


As Lágrimas de Eros

E talvez, afinal,
isso a que chamava
literatura
(ou poesia, ou arte,
ou outra palavra
com quatro letras)
não tivesse outro fim
nem outra função
senão a de fazer de si mesma
fim e função. Sem órgãos,
sem geração,
no corpo e contra o corpo,
como corpo que faz
da cama tecto e túmulo.
Sem língua, sem som,
na boca e contra a boca,
como voz que é eco
nos olhos dos mortos.




28.5.25


Zeitgeist

A dificuldade
(aquela que em público
e para si própria
podia admitir)
era não ceder ao cinismo.