Tardes de Outono: Uma viagem quase sem volta
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Sobre este e-book
Mariana tem tudo o que uma adolescente precisa para ser feliz: é rica e bonita e tem uma vida inteira pela frente, com a expectativa de um futuro brilhante. Cheia de sonhos, com a ajuda dos pais, aos poucos a menina vai realizando todos eles, desta vez a sua tão esperada festa de quinze anos. Tudo escolhido a dedo, o vestido vermelho, as quinze amigas do corpo de balé, vestidas de branco à sua frente, os amigos, o baile...
Apaixonada por Carlos, o garoto mais popular da escola, Mariana não sabe o que fazer para conquistá-lo. Suas qualidades de garota boa de estudo, pois frequenta aulas de balé e faz curso de inglês, parecem não ser o suficiente para chamar a atenção do rapaz, muito pelo contrário.
Por isso, ser popular como Catarina, amiga de Carlos, passa a ser seu grande sonho, e assim no dia da festa, decidida a conquistar seu amor, Mariana embarca na aventura de ser outra pessoa, uma viagem quase sem volta na qual a adolescente descobre que, na verdade, nem todos os sonhos devem se realizar.
Roseni Kurányi
Roseni Kurányi - Natural de Petrópolis-RJ e reside em Stuttgart, Alemanha desde 1997. Estudou Psicologia e fotografia. Seus contos, livros infantis e romances foram publicados no Brasil e na Alemanha. A autora é premiada no Brasil e na Europa por seus trabalhos literários. No ano de 2012, convidada pela Focus Brazil Londres, junto com outros autores brasileiros, residente no exterior, recebeu da Brazilian International Press Awards em Londres, o reconhecimento especial por seus trabalhos litérários.
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Tardes de Outono - Roseni Kurányi
1
NAQUELA TARDE DE OUTONO, quando a brisa levemente fria pairava no ar, e as folhas secas e alaranjadas faziam um tapete avermelhado no quintal, sentada na longa varanda de sua casa, com a família reunida, Mariana sorria.
De repente, era mais que um sorriso. Tornaram-se gargalhadas. E incessantes. Todos os presentes passaram a olhá-la com curiosidade. A princípio até um pouco assustados. A avó, a mãe, o pai, Eduardo, o irmão caçula, Maria, e também Cíntia e Frederico, seus dois melhores amigos.
Foi com Eduardo que tudo começou. O irmão, olhando Mariana, foi contagiado pelo riso que também virou gargalhada. Não demorou muito, a avó ria como se ainda tivesse todos os dentes na boca. Ria como uma adolescente. O pai, Osvaldo; e Lídia, sua mãe, àquela altura também foram contagiados pelo riso da família. Riam todos sem saber o motivo. O som alegre invadindo a casa. Aliás, a causa de todo aquele riso de vários volumes e timbres não tinha a menor importância naquele momento. Era bom simplesmente sorrir, gargalhar sem razão, sem uma piada ou comentário que valesse. Era bom estarem rindo juntos, pois nem sempre foi assim naquela família.
As risadas pareciam enxugar toda lágrima escorrida e apagar toda lembrança triste deixada pelo passado.
Foi num fim de tarde de outono como aquela, alguns anos atrás, que naquela mesma varanda, a cena terrível que nunca mais seria esquecida por todos dera início a todo o terror...
2
LÍDIA LEMBRAVA DO SEU pavor ao observar, como na cena de um filme de terror, os paramédicos, com urgência, carregando numa maca o corpo desacordado e calamitoso de sua filha Mariana, que parecia morta. Acomodaram-na emergencialmente dentro de uma ambulância de sirene vermelha e altiva. Policiais cercavam por todos os lados.
Sua mãe, a avó Júlia, passava mal com tanta tristeza. Precisou ser socorrida às pressas por um enfermeiro. Foi ela quem encontrou Mariana naquele estado terrível, trancada em seu quarto, caída entre a cama e a cômoda. Ao seu lado, a antiga caixa de joias valiosas da família, agora vazia e contendo resíduos de drogas. Desesperada, a avó pensou ter perdido seu grande tesouro, sua neta.
Eduardo, o irmão, chorava sem parar quando retornou do colégio. E confessou que sabia de tudo, mas era ameaçado pela irmã. Tinha medo. Todos estavam muito assustados e em choque. A menina sempre tão obediente e exemplar havia mudado radicalmente e ninguém sabia ao certo como e nem por quê. Estava diferente, perdida, calada, agressiva. Uma aparência grotesca e rebelde. Companhia de amigos estranhos. Boatos de coisas horríveis a seu respeito. Vivia trancada em seu quarto. Tornou-se uma péssima aluna, desistiu das aulas de inglês e até do balé, antes sua grande paixão. Além de esquecer seus tantos outros sonhos.
Naquele dia, pouco antes do ocorrido, Lídia recebera um telefonema da diretora do colégio da filha. Dona Margarete ligara querendo saber de Mariana e para lhe informar coisas que Lídia não sabia ou evitou saber por tempo demais. Gostava de acreditar que tudo andava nos conformes da família, e que as crises e problemas de Mariana eram passageiros, da idade. Certas desgraças
, pensou ela, jamais imaginamos que aconteçam sob o nosso teto.
Preocupada com a notificação da diretora, desconfiou que algo realmente estranho acontecia em sua casa, principalmente com Mariana. E ela, culpada, soube que tudo sempre estivera claro, porém se recusava a ver, por mais que se esforçasse.
Por causa dos atropelos que foram se acumulando, Lídia havia despedido Maria, a empregada de anos, que fizera muita falta. Ela havia cuidado com zelo do seu lar e ajudado a criar as crianças. Estivera ao seu lado em vários momentos difíceis da família.Também quando Mariana começou a dar os primeiros passos e pronunciar as primeiras palavras. Era uma criança meiga e que enchia de vida o lar. Algum tempo depois — com o nascimento prematuro de Eduardo, que teve de ficar no hospital — mesmo tendo sua família, Maria praticamente mudou-se para a residência da patroa e a auxiliou em tudo. Sempre muito responsável, a prestativa Maria era o braço direito dela e de Osvaldo, seu esposo, que viviam em viagens de negócios.
Quando a mãe de Lídia, dona Júlia, veio morar com a família, a empregada teve de suportar por um bom tempo os ciúmes da avó, vendo o carinho que Maria tinha pelas crianças e os netos, pela empregada. Mas Maria, com todo seu jeito simples e terno, conquistou a avó e a ganhou como amiga e, mais tarde, uma forte aliada nos momentos difíceis daquela casa.
Após o comunicado da diretora, Lídia desligou o telefone e se sentou, com a expressão tensa. Soube, então, que não poderia negar o seu papel