Pedagogia do futebol
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Sobre este e-book
Gostaria de contribuir para que o futebol faça tão bem para as outras pessoas como fez para mim. Esta é a razão deste livro.
João Batista Freire
Freire busca nas ruas a inspiração para seu trabalho, fazendo da escola apenas um palco, digamos assim, mais técnico – no sentido de ser lugar apropriado para sistematizar os fundamentos do futebol. E não está preocupado em formar craques ou campeões, embora não os exclua como resultado final. Apenas quer aprofundar o caráter lúdico do jogar bola, mostrando que aprender e sentir prazer não se opõem, ao contrário. E quer dar ao futebol todo o sentido social que dele se pode extrair, ensinando a perder e a ganhar, a lidar com a vitória e com a frustração, habilidades que, quando assimiladas, só fazem o homem ser mais feliz e ajustado.
Juca Kfouri
(excerto do prefácio)
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Pedagogia do futebol - João Batista Freire
Grandes civilizações existiram, certamente. Não seria eu que iria denegrir as civilizações do Egito, da China, da Índia, e mesmo da Europa na Idade Média. Contudo, todas elas falharam em um ponto: limitaram a liberdade de imaginação dos jovens.
J. BRONOWSKI
A escola não é o único lugar onde aprendemos coisas importantes. A escola é importante, sem dúvida. Ela nos diploma, o que equivale, para os desassistidos, a algumas cartas de alforria e, para os privilegiados, a alguns passaportes para o poder.
Quase nunca a escola traduz as aspirações de seus alunos. Raramente, leva em conta a bagagem cultural que acumularam durante anos e anos de experiência viva. Que mal pode haver em uma criança querer ser jogador de futebol ou piloto de avião? A escola procura transformar a todos em alunos, pacotes prontos de sabedoria para serem engenheiros, médicos, advogados e, mais recentemente, especialistas em computação.
Como todas as crianças do mundo, eu construía, quando criança, meu mundo de fantasias.
QUERO SER JOGADOR DE FUTEBOL
Por azar dos meus pecados, eu era o primeiro da classe quando estudava no primário, numa escola chamada Escola Isolada do Morro do São Bento. Uma redundância. Não era necessário enfatizar o isolada
: ficava no alto de um dos morros de Santos.
Naquele tempo, o assunto mais frequente entre os alunos era futebol. O Santos começava a ser o grande Santos de Pagão, Álvaro, Tite, Pepe, Pelé. A gente só pensava nisso. Jogava futebol em qualquer pedaço de chão; antes e depois da aula e na hora do recreio. Jogava com bola de meia, lata de óleo, tampinha de garrafa, ou qualquer outra coisa chutável.
Minha mãe era daquelas que queria o filho o primeiro da classe. Filho seu tinha que estudar na escola e depois em casa. Bola só depois que acabasse a lição. Terminada, eu saía como um tiro, atrás da primeira coisa que rolasse aos meus pés. Tendo que estudar tanto, numa escola em que quase ninguém estudava, o filho da minha mãe só podia virar o primeiro da classe.
Esse primeiro da classe, no Dia da Independência ou da Bandeira, tinha que decorar aquelas poesias do Olavo Bilac para declamar em público, mexendo as mãos como se fossem uma revoada de pombos: Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá […]
. E lá ia eu, de verso em verso, parecendo um Pinochio antes de ganhar vida. Além disso, obviamente, a professora depositava no seu primeiro da classe as esperanças de futuro brilhante, alguma coisa como médico, advogado ou engenheiro, as profissões nobres daquela época.
Um belo dia a dona Célia – era esse o nome da professora – resolveu perguntar a cada um de nós, uns 40, o que queria ser quando crescesse. Fui dos últimos. Um por um, perguntados, respondíamos: Jogador de futebol, professora
. Chegou minha vez. Ela já perguntou como se a resposta não pudesse ser outra: Médico, engenheiro, advogado
. E eu, um tanto constrangido: Jogador de futebol, professora
.
Dona Célia, morena que era, ficou vermelha, roxa, verde: Até você, João Batista
. Calado estava, calado fiquei. Sentia muito, mas não podia responder outra coisa. Ser jogador de futebol era o que eu queria, com todas as minhas forças. Não fazia sentido algum futuro meu que não fosse correndo no gramado da Vila Belmiro ou do Pacaembu. Ninguém no mundo podia ser mais importante que Pagão, Canhoteiro ou Zizinho.
Nunca cheguei àquele futuro de menino. Futebol, para mim, só o dos sábados à tarde ou o dos domingos pela manhã na várzea. No entanto, ainda hoje, se me perguntarem o que vou ser quando crescer, ouvirão um menino constrangido respondendo: Jogador de futebol
.
1. ALGUNS PRINCÍPIOS PEDAGÓGICOS
Não tenho a intenção de sugerir uma simples repetição do futebol que se faz na rua. Sabemos o quanto a pedagogia da rua tem sido competente para ensinar futebol. Mas rua e escola são instituições bastante diferentes. Há, na pedagogia da rua, diversas coisas que eu não gostaria de ver repetidas na escola. Por exemplo, os grupos infantis, quando jogam futebol, costumam excluir os mais fracos. A pedagogia da rua é muito suscetível tanto às coisas boas como às coisas ruins. Trata-se de uma pedagogia que não compensa as deficiências que se forem formando; não se trata de uma pedagogia dirigida necessariamente à formação de consciências. Apesar disso, ela será o principal referencial dos procedimentos aqui sugeridos, principalmente porque, para ensinar crianças e adolescentes, sempre deveremos levar em consideração, acima de tudo, a cultura popular relacionada ao futebol. O modo de trazer essa cultura para a escola será preservar o espaço lúdico, esse espaço de brincadeira tão produtivo para a aprendizagem.
Lembro perfeitamente do quanto chegava a ser excludente, para alguns, a pedagogia da rua. Portanto, não é porque essa pedagogia está carregada de virtudes que a escola de futebol deve ser simplesmente uma repetição do que se faz na rua. Por outro lado, não é porque ela tem defeitos que a escola de futebol deve ignorar a competência com que a rua ensina as crianças. Não faltam histórias, lembradas por mim, ou por qualquer outra pessoa que tenha jogado futebol na rua, para ilustrar essas afirmações.
PAR OU ÍMPAR
Antes de começar o racha era preciso escolher os times. Geralmente os dois goleiros faziam a escolha no par ou ímpar. Um de cada vez iam chamando os nomes. O primeiro escolhido mal escondia a vaidade. A ordem da escolha revelava o status de cada um no grupo. Ser escolhido entre os seis ou oito primeiros ainda indicava uma condição de respeito. A partir daí era a sobra, era jogar só para formar os times. Mas o último… Ah! O último era denunciado no seu estado de miséria moral dentro do grupo. Era vergonhoso.
Não raramente os últimos escolhidos eram estigmatizados e, pior, aceitavam essa condição, às vezes para sempre. Ou aceitavam ou não jogavam. Não se interessavam em jogar melhor; sabiam que sempre faltaria um jogador em um dos times. Mesmo sendo os últimos e execrados, não queriam ficar de fora, queriam ter grupo.
Já os primeiros, também tinham seus problemas. Quem chegava a esse posto, fazia de tudo para não perdê-lo. O jogo acabava, mas não para eles. Iam para casa treinar sozinhos. Era preciso melhorar a habilidade. Até que um dia…
Um belo dia ocorria de um deles não ser o primeiro dos escolhidos. Todos o olhavam diferente. A admiração convergia para o eleito à condição de o bom de bola. O excluído era visto como decadente.
A cultura infantil da rua, tão competente para ensinar futebol, bolinha de gude, garrafão, é, em muitos aspectos, cruel. O altruísmo, a compaixão são pouco presentes na relação dos meninos e meninas nessa cultura.
Escola não é rua e nunca será demais repetir isto. Professores são profissionais especialistas em ensinar e devem se orientar por ideias, teorias, princípios.
Quero eleger quatro princípios básicos norteadores dos trabalhos aqui sugeridos:
Ensinar futebol a todos
É prática comum, tanto no futebol de várzea ou de rua, como nos clubes ou escolinhas, dar atenção somente àqueles que, por algum motivo, apresentam maiores habilidades. As experiências anteriormente vividas, talvez fatores genéticos, quem sabe ambas as coisas, permitiram fazer com que apresentassem mais facilidade que outros na prática do futebol. Portanto, dão pouco trabalho; não é preciso ensinar-lhes quase nada. É só deixá-los jogar e se desenvolver. Os adeptos de tal pedagogia gostam de acreditar que é tudo uma questão genética; ou seja, esses privilegiados teriam nascido para jogar futebol. Cria-se um ambiente onde o que decide é a seleção natural. Que bom se pudessem clonar os grandes craques. Um time inteiro de Romários. Já pensaram?!
Não sendo adepto de tais ideias, penso que qualquer pessoa pode aprender a jogar futebol. Não desprezo a importância dos fatores genéticos, mas esses fatores não podem impedir a aprendizagem de quem quer que seja. Não podemos manipular geneticamente a formação do conhecimento, mas podemos interferir na aprendizagem. De modo que aqueles que já sabem jogar futebol devem ser orientados para aprender a jogar melhor; aqueles que sabem muito pouco ou nada de futebol devem receber toda a atenção até que aprendam, no mínimo, o suficiente.
Ensinar bem futebol a todos
Não basta ensinar; é preciso ensinar bem. A tarefa de quem ensina futebol não é ensinar qualquer coisa. Temos que ensinar cada aluno, não importa o nível de habilidade com que inicie, com as melhores técnicas, com o maior cuidado, de modo que possa, ao longo do tempo, expressar habilidades para jogar futebol de boa qualidade. Tenho motivos para acreditar que todos podem jogar futebol de boa qualidade, alguns em menor tempo, outros com maior demora. Não importa; todo processo pedagógico exige paciência.
Ensinar mais que futebol a todos
Além de ensinar futebol a todos e ensinar bem, a tarefa educacional supõe preparar sempre para algo mais que a atividade específica da escola. Quem aprende futebol pode desenvolver um acervo de habilidades bastante diversificado, podendo aproveitar essas habilidades em muitos outros esportes. Além disso, poderá estar aprendendo a conviver em grupos, a construir regras, a discutir e até a discordar dessas regras, a mudá-las, com rica contribuição para seu desenvolvimento moral e social. Deve fazer parte da pedagogia do