Criacionismo e Evolucionismo: Interpretando As Evidências
Criacionismo e Evolucionismo: Interpretando As Evidências
Criacionismo e Evolucionismo: Interpretando As Evidências
Os textos centrais das Escrituras no que se refere à polêmica da criação, são, sem
dúvida, os primeiros capítulos de Gênesis. Portanto, será sobre estes capítulos e sobre a
base de evidências que construímos até aqui que criaremos nossa visão sobre esta
polêmica.
No que diz respeito à Gn 1, usaremos os seguintes fatores na leitura e
compreensão deste texto:
Fatores que mostram a idade antiga do Universo e da Terra.
Evidências de seleção natural e microevolução
A explosão cambriana, complexidade irredutível e outros fatores mal explicados
pela ciência
O referencial de espaço nos textos bíblicos
O uso da palavra yon no texto bíblico
O contexto da escrita dos textos bíblicos
A dificuldade com “mitos” bíblicos
A pouca distinção entre ação primeira e segunda no texto bíblico
Levando isto em consideração, façamos um estudo verso a verso de Gn 1,
inicialmente.
Versículo 2 – A terra era sem forma e vazia; a face do abismo era coberta por
trevas, e o Espírito de Deus pairava por sobre a face das águas.
A terra era sem forma e vazia – Deus criou todo o Universo e nele o planeta
Terra. Esta criação foi realizada por Deus, que age tanto através das leis naturais
(providência) quanto através de ações sobrenaturais (milagres). Porém, a Terra ainda era
apenas uma bola de material incandescente e derretido, sem forma fixa e sem nenhum
ser vivo presente. Aqui é dito que a terra era sem forma, e não que se tornou sem forma,
como algumas versões influenciadas pela teoria do intervalo fazem crer. A forma como
este versículo está escrito é a principal razão para não aceitação da teoria do intervalo.
a face do abismo– Abismo é no original ( תְּ הֹוםtehom), expressão que aparece
em outros trechos como por exemplo no relato do dilúvio (Gn 7.11). Teólogos liberais
enxergam neste abismo aqui apresentado uma ligação ao mito mesopotâmico de Tiamat,
uma personificação do caos primordial. Nada, porém, exige que se enxergue aqui
qualquer idéia deste tipo. O abismo (tehom) é mais bem entendido, pelo seu uso em Gn
7.11 e em outras passagens do Antigo Testamento como sendo um oceano profundo
abaixo da Terra. Esta era idéia comum dos povos semíticos da época de Moisés. A idéia
é de um oceano primordial encoberto por trevas. Através das mais recentes e
desenvolvidas pesquisas realizadas sobre como a Terra se formou temos que não houve
um oceano de águas antes da formação da parte seca da Terra, e sabemos que não existe
um oceano no mais profundo da Terra. Porém a figura do oceano e das águas é a melhor
descrição que poderia ser dada para um leitor da época de Moisés. O abismo é na
verdade uma forma de descrever a Terra em seu estado inicial, antes da solidificação da
crosta terrestre, com um núcleo de material incandescente coberto por uma atmosfera
muito diferente da atual. A face do abismo é a camada mais superficial deste “oceano
primordial’, ou seja, este material líquido, pelas altas temperaturas, que formava o
núcleo do Planeta. Não podemos porém ser dogmáticos neste ponto. Como já dissemos
anteriormente, o relato da criação, muito embora não seja apenas um mito, foi escrito
primeiramente com motivação religiosa e não como relato cientifico. Além disso foi
escrito em uma época que não conhecia os avanços científicos que hoje temos e nem
tinha a riqueza de termos para descrever fenômenos como os envolvidos na formação
do Planeta. Assim, ao que este abismo se refere verdadeiramente não podemos afirmar
com certeza, embora a idéia da palavra tehom seja como já falado, de um oceano
profundo.
era coberta por trevas – O abismo era coberto de trevas. Caos e escuridão eram
o que havia na Terra até que Deus iniciasse a criação relatada pelos versículos a seguir.
e o Espírito de Deus – Original: ( םיהלא חורruah Elohim). A palavra para
Espírito, ruah, é literalmente vento ou sopro, tradução usada por algumas versões. O
Espírito de Deus é a terceira pessoa da Trindade, o Espírito Santo. Muitos vêem aqui,
não a presença do Espírito Santo, mas sim a presença da primeira pessoa da Trindade,
Deus, em Espírito. No Antigo Testamento ainda não temos uma pneumatologia (estudo
a respeito do Espírito Santo) desenvolvida. De qualquer forma, todas as pessoas da
Trindade estão presentes na criação: Deus, o Espírito e Jesus (ver Jo 1.3).
pairava – Algumas versões preferem “se movia”. Porém, a idéia do original é
mais bem expressa por pairava. Podemos ver isso por outro texto do Pentateuco onde
esta palavra aparece, Dt 32.11. A idéia deste texto é de uma águia que paira sobre seus
filhotes protegendo-os. Semelhantemente, mesmo no caos da Terra nos seus primórdios,
o Espírito de Deus pairava preparando caminho para a criação que logo se iniciaria.
por sobre a face das águas – novamente temos a figura do oceano primordial
que na cultura da época acreditava-se ser a forma inicial da Terra. As águas aqui são o
material ainda incandescente de uma Terra ainda sem forma definida e vazia. A visão
dos fenômenos naturais na Bíblia é sempre dada do ponto de vista de alguém na Terra e
de acordo com o conhecimento da época. É neste sentido que devemos ver as descrições
do relato de Gênesis.
Viu Deus que a luz era boa – A criação de Deus é boa, como ele próprio atesta
após o ato criativo. A luz é boa, pois dissipa as trevas (Jo 1.5). As obras de Deus são luz
e quem nelas permanece não está nas trevas (Jo 12.46).
e separou a luz das trevas – Este mundo, embora não seja feito só de luz, não
seria de apenas trevas. Porém Deus dividiu as trevas da luz, dando a cada uma seu
tempo e propósito. Tanto a luz quanto as trevas estão debaixo do controle de Deus e
servem para o engrandecimento do Seu Nome, cumprindo seu propósito.
E Deus chamou à luz dia, e as trevas chamou noite – Deus, como Senhor da
luz, das trevas e do tempo; designa nomes conforme seu desejo.
E passaram-se tarde e manhã, e esse foi o primeiro dia – Com a criação da
luz é possível uma divisão entre o tempo da luz e o tempo das trevas. Assim, é possível
se contar o tempo e os dias. O significado dos dias de Gênesis 1 é alvo de debates, e
depende muito da visão que se tem do relato da criação, conforme já discutimos
anteriormente. Este é um tema que necessita ser visto com maior atenção. Pelo exposto
anteriormente, acreditamos que os dias de Gênesis são melhor vistos como períodos
indeterminados (provavelmente muito longos e diferindo de extensão entre si), que
colocam a sucessão dos eventos da criação e estabelecem o padrão das semanas e do
descanso. Outro argumento a que não tenhamos de ficar presos a dias de 24 horas é que
para Deus um dia é como 1000 anos, e 1000 anos como um dia (2 Pe 3.8). Deus não
está restrito e nem contido pelo tempo, mas o transcende, de forma que para Ele a
duração do tempo da criação não é central.
Versículo 6 – E disse Deus: “Haja um firmamento no meio das águas, que separe
águas e águas”
Haja um firmamento no meio das águas – No segundo dia Deus cria uma
separação entre as águas na superfície da Terra e a água na atmosfera. Aqui a atenção é
focalizada na questão da separação da água. Segundo as melhores simulações já
realizadas para a origem da Terra, no início, quando a Terra ainda não tinha sua forma
atual, a Terra tinha uma atmosfera primordial que não possuía água, e que era levada
pelo vento solar, até que a Terra atingiu cerca de 40% do seu volume atual, onde esta
pode reter sua atmosfera. Na atmosfera então formada existia uma boa possibilidade de
presença de água. Não podemos ser dogmáticos em relação a que evento em especifico
este dia se refere (como, aliás, não podemos ser em relação a nenhum outro dia. A idéia
do texto, como já discutimos, não é ser um relato cientifico da criação) até por que não
temos certeza dos eventos envolvidos na formação da Terra, e este é um campo onde há
muito por descobrir. Como já dissemos antes, Deus fez a criação através de
intervenções especiais, mas também através das leis naturais que criou. Não sabemos
em que ocasiões Ele usou cada um desses tipos de ações. O relato de Gênesis 1 escolhe
alguns detalhes de cada era de desenvolvimento da Terra, de forma a montar um quadro
que mostre a criação de todas as coisas por Deus. Assim, provavelmente neste dia da
criação Deus fez as primeiras formas de vida sobre a Terra, que depois, através de
reações com sulfeto de hidrogênio e dióxido de carbono, levariam a formação de mais
água, que alimentaria o ciclo da água (a separação) e permitiriam a formação dos
oceanos. A origem do planeta Terra, da vida e o desenvolvimento desta é complexa e
envolveu muitas etapas, que nosso conhecimento atual está longe de conhecer
totalmente. Seria incoerente esperar que todos os detalhes fossem dados aqui, ainda
mais em um texto com motivação religiosa e não científica.
que separe águas e águas – As águas na superfície e interior do planeta das
águas na atmosfera.
firmamento – Essa palavra, que pode ser traduzida também por “extensão”, dá a
idéia de um lugar fixo, firme, onde as estrelas ficam presas. Esta era uma idéia antiga
sobre os céus.
céu – De acordo com a concepção judaica haviam 3 céus: o primeiro era o logo
acima da terra, onde as aves voam (Gn 2.19, Lm 4.19); o segundo, o espaço, onde se
encontram os astros, o exército do céu, ou os poderes do céu (Dt 17.3, Jr 8.2, Mt 24.29);
e o terceiro céu, o céu dos céus (Dt 10.14, Sl 148.4, 2 Co 12.2), lugar da manifestação
especial de Deus, morada dos anjos, um outro plano além do nosso. Céu aqui descreve
tudo que está acima da terra, à atmosfera mais especificamente.
Viu Deus que isso era bom – A Terra, que no início era sem ordem, agora já
está ordenada em terra e mares, águas na terra e mares, e águas no céu. Deus cria todas
as coisas como primeira ou segunda causa (ou direta e indiretamente, ou naturalmente e
sobrenaturalmente) e as ordena pela sua própria vontade. O próprio Deus atesta que sua
criação é boa.
Versículo 11 – Então Deus disse: “Cubra-se a terra de vegetação, plantas que dêem
semente e árvores frutíferas que produzam semente de acordo com suas espécies”.
E assim foi.
A terra produziu – Vemos aqui que se tem em mente uma ação natural: “a terra
produziu”. A criação de Deus é feita tanto por meios naturais quanto sobrenaturais. O
desenvolvimento das plantas sobre a terra (e também em outros ambientes) foi realizado
por meios naturais e não podemos afirmar pelos dados que temos hoje que não tenham
sido também por meios sobrenaturais. A grande diferenciação e evolução das plantas
não é totalmente explicada pela teoria da macro-evolução, embora não se deva excluir
mecanismos deste tipo em etapas da criação dos seres vivos. Até onde esses
mecanismos apenas naturais foram empregados por Deus é motivo de discussão e alvo
de pesquisas. Este versículo é um indicativo de que não temos um dia de 24 horas em
mente, a não ser que se entenda que a Terra produziu toda vegetação em um tempo
muito mais rápido que os processos naturais que conhecemos. Se for isto que se tem em
mente, seria mais adequado que o texto fosse redigido dizendo que Deus produziu, e
não que a terra produziu.
Haja luminares – Não que o Sol, Lua e estrelas tenham sido criados apenas
neste dia. Como resultado da formação das primeiras plantas e das mudanças sobre a
Terra, diminuindo as nuvens de poeira cósmica, por exemplo, passa a ser possível em
uma atmosfera que se torna limpa ver com clareza, sempre do ponto de vista de um
observador terrestre, o céu, enxergando os luminares, que assim, podem ser usados
como sinais para a marcação do tempo: dias e estações.
no firmamento do céu – Do ponto de vista da superfície da Terra, os astros
estão fixos nos céus.
para separar o dia do noite – Com a presença dos luminares, é possível se
marcar com mais clareza dia e noite, do que até então. É possível também pela
observação das estrelas se marcar a passagem dos anos e estações, como o texto a seguir
destaca.
estações – Algumas versões trazem em lugar de estações, traduções como
solenidades ou festivais religiosos. A palavra traduzida por estações, Mo'adim, é
encontrada também em Lv 23.2, onde é traduzida geralmente como celebrações ou
festas fixas. A idéia da passagem do ano, estações e celebrações religiosas é realmente
ligada no Antigo Testamento. Porém, de forma alguma aqui se deve ver ligação entre a
Bíblia e ritos das estações ou da fertilidade da Antiguidade.
Versículo 15 – e sirvam de luminares no firmamento do céu para iluminar a
terra”. E assim foi.
Versículo 16 – Deus fez os dois grandes luminares: o maior para governar o dia e o
menor para governar a noite. E fez também as estrelas.
Deus fez – A palavra usada aqui no texto original não implica em ato criativo
necessariamente. Deus faz com que o Sol, Lua e estrelas, criados “no principio”, passem
a ser úteis do ponto de vista da Terra, por serem visto claramente.
os dois grandes luminares – O Sol e a Lua, amplamente adorados em cultos
pagãos da Antiguidade, aqui sequer são citados pelo nome. São apenas criaturas sob a
vontade de Deus.
o maior para governar o dia e o menor para governar a noite – Do ponto de
vista de alguém na Terra, onde o Sol é o maior astro e a Lua o segundo maior, depois
das estrelas, que na verdade são maiores que a Lua e muitas até do que o Sol.
E fez também as estrelas – As estrelas são citadas todas juntas. Elas também
passaram a ser visíveis claramente da Terra, muito embora já tivessem aparecido muito
tempo antes da formação da Terra. A luz que vemos da Terra hoje pode na verdade ter
sido gerada nas estrelas a milhões de anos, só chegando até nós hoje. Esta é uma prova
que a natureza nos dá da idade do Universo, que é certamente maior do que milhares de
anos apenas.
Versículo 18 – para governar o dia e a noite, e para separar entre a luz e as trevas.
E Deus viu que isso era bom.
Versículo 19 - E passaram-se tarde e manhã, e esse foi o quarto dia.
Versículo 20 – Disse Deus: “Encham-se as águas de seres vivos e sobre a terra, no
firmamento dos céus, estejam os seres vivos que voam”.
os grandes animais aquáticos e os demais seres vivos que habitam nas águas
– Aqui tem-se em mente todos os animais aquáticos, que através da ação de Deus foram
criados e diferenciaram até o que hoje temos, através da vontade e ação direta e indireta
de Deus. Os grandes animais aquáticos eram associados na mitologia antiga aos dragões
do mar, que se acreditavam ser rivais dos deuses criadores. Aqui , no entanto são apenas
mais uma parte da criação de Deus, e subordinados a Ele.
e todos os seres que voam – Primeiramente os insetos e outros animais menos
desenvolvidos, mas também as aves e mesmo os mamíferos que voam. Embora estes
últimos tenham sido criados apenas depois de um estágio avançado da história da Terra,
a lição aqui é clara: Deus criou todas as formas de vida das águas e dos ares. As formas
de vida da terra são destacadas apenas no último dia, pois é na terra que o homem, a
criação principal, habitará.
Aqui é destacada a benção de Deus sobre os seres vivos, para que estes
pudessem se reproduzir e encher a Terra. A capacidade de sobrevivência e
multiplicação de todos os seres vivos depende da vontade de Deus.
Produza a terra – Tendo o relato já focado na criação dos animais nas águas e
nos ares, agora ele passa a descrever como a vida se desenvolve na terra, onde o homem
será criado. Os animais que vivem na terra são os mais desenvolvidos e, portanto, o
relato está correto com nosso conhecimento da natureza.
animais domésticos – A palavra traduzida por animais domésticos é usada para
descrever os animais herbívoros, aqueles que o homem depois domesticaria para serem
seu rebanho.
animais selvagens – Os animais da natureza, especialmente os carnívoros.
e demais seres vivos da terra – No original temos uma palavra que designa os
animais que rastejam sobre a terra, o que leva muitas versões a trazer a tradução répteis.
Deus criou todos os animais, e todos os seres vivos da Terra, criando em seguida
o homem. Não temos conhecimento suficiente da natureza para entender os meios
usados por Deus em toda esta criação, mas de qualquer forma Deus nos mostra que a
causa de toda criação é Deus, seja ela primeira (criação direta/sobrenatural) ou segunda
(criação indireta/natural).