Livro - O Risco Espreita
Livro - O Risco Espreita
Livro - O Risco Espreita
ISABEL ALADA
ISABEL ALADA
Ttulo: O risco espreita, mais vale jogar pelo seguro Coleo: Seguros e Cidadania Autoras: Ana Maria Magalhes e Isabel Alada Copyright 2013: APS2013 Edio: Associao Portuguesa de Seguradores Ilustraes: Carlos Marques Conceo grfica e paginao: TVM Designers Impresso: Grfica Maiadouro Tiragem: 50 000 exemplares Depsito Legal n. 364 065/13 ISBN: 978-972-98847-4-0 1. Edio setembro 2013
No ser exagero dizer que toda a gente conhece o seguro. Mais difcil ser reconhecer a sua importncia. H quem diga que o seguro caro e que no um produto de primeira necessidade. Em geral isso s acontece at altura em precisamos de recorrer a ele porque algum azar nos bateu porta. H, por isso, quem s venha a conhecer, ou melhor dizendo, a reconhecer a importncia do seguro, numa idade j mais adiantada. H at quem, talvez, nunca chegue a conhecer a importncia do seguro. Mas quando conhecemos, apreciamos e julgamos melhor as capacidades deste instrumento nico de previdncia e de proteo contra os riscos que corremos diariamente. Por isso, dar a conhecer aos jovens o seguro, e a sua verdadeira utilidade, bem mais importante do que se pensa. que, convivendo mais, e mais cedo, com a realidade do seguro os jovens tm mais tempo para pensar como ele os pode ajudar a construir um futuro com menos preocupaes. Bem basta as que no podemos evitar. , portanto, muito louvvel que a Associao Portuguesa de Seguradores tenha decidido levar por diante uma campanha de divulgao do seguro dirigida aos jovens, da qual este livro uma pea chave. E no poderia ter entregue a sua realizao a duas Autoras mais competentes, que h muitos anos escrevem para os jovens histrias que os entusiasmam e os ajudam a encarar a vida melhor. As minhas felicitaes APS. E Ana Maria Magalhes e Isabel Alada, que to bem sabem comunicar com os mais novos.
E se os jovens de hoje sabem to bem ou melhor que muitos adultos lidar com as tecnologias mais recentes, e tirar delas o maior proveito, designadamente os telemveis inteligentes, os tablets, as consolas de jogos e os computadores mais sofisticados, porque haveriam de ter qualquer dificuldade em entender o seguro? E no preciso saber a sua tcnica, como no indispensvel saber de que so feitos e como se constroem os aparelhos j referidos. Basta saber para que servem, como funcionam e como podem facilitar, ou animar, as nossas vidas. E nisso, quantas vezes os jovens batem os adultos aos pontos! Alm disso, vo ser com certeza alguns dos jovens de hoje que, mais tarde, vo ajudar a fazer do seguro um produto ainda melhor do que ele j . E para que a vida tenha menos surpresas desagradveis, bom saber quais so os riscos com que convivemos constantemente. Assim podemos evit-los melhor e saber como lhes fazer frente quando for preciso. E, para isso, o seguro um instrumento privilegiado, e aplica-se em tantas situaes que, s vezes, desconhecemos Ora este livro um guia que ajuda a compreender melhor tudo isto. esse o seu grande mrito, sobretudo porque explica de modo fcil o que parecem ser situaes difceis. J disse que as suas Autoras sabem h muitos anos como escrever para os jovens. S falta agora os jovens descobrirem os riscos e olhar para eles como eles so: os inevitveis companheiros das nossas vidas desde que o ser humano existe, e com os quais s temos vantagens em saber conviver. Mais vale jogar pelo seguro!
Ruy de Carvalho
A noo de que todas as atividades envolvem riscos to antiga como a humanidade. Os homens perceberam desde sempre que arriscar importante para progredir, mas que a cada passo podiam ter que enfrentar obstculos ou serem vtimas de acidentes. A experincia levou a imaginar perigos futuros e a ir encontrando formas de os evitar ou de compensar prejuzos. Viver em grupo ou viajar em grupo, por exemplo, foram maneiras das pessoas se protegerem ou de se ajudarem mutuamente quando necessrio. Aquilo a que se chama mutualismo consiste precisamente no compromisso entre vrios elementos de um grupo para valerem a quem precisar de apoio. Estas formas de entreajuda, ou mutualismo, conduziram inveno do seguro moderno e tm uma longa histria que comeou no tempo das cavernas. Nos nossos dias, uma maneira excelente de enfrentar o risco fazer um seguro.
Mas havia perigos que podiam ser uma completa surpresa tanto para os mais novos como para os mais velhos.
A experincia de vida permitiu que os vrios grupos humanos fossem encontrando solues para se protegerem.
No tempo das cavernas, os homens no viviam sempre no mesmo lugar, eram nmadas. Ora andar por montes e vales em busca de caa, envolve grandes perigos.
A fome era um risco permanente. Grandes tempestades, inundaes, neves ou ento grandes secas faziam desaparecer os frutos e razes que os homens recolhiam para comer. E os animais morriam ou desapareciam, o que se traduzia numa verdadeira tragdia. Tero sido experincias do gnero que levaram a armazenar alimentos e a mant-los de reserva para os perodos de crise.
A ENTREAJUDA
EXCELENTE FORMA DE PROTEO CONTRA RISCOS
Quando os homens descobriram a agricultura, a criao e a domesticao de animais, a vida modificou-se porque as famlias, os grupos, as tribos puderam instalar-se num determinado local e erguer o primeiro tipo de povoaes. Ou seja, no perodo a que se d o nome de neoltico, os homens tornaram-se sedentrios.
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a descoberta da agricultur a
A TROCA DIRETA
LHE DOU 3 MAS SO UMA PORQUE E CABRA TEIMOSA.I A MINHA CABRA VALE 5 GALINHAS.
No perodo neoltico os homens comearam a produzir mais do que precisavam para o seu grupo passou ento a haver sobras, os excedentes, que podiam ser trocados por outros bens. Foi esse o primeiro tipo de comrcio, que se fazia por troca direta pois o dinheiro ainda no tinha sido inventado. O comrcio obrigou a pensar na melhor maneira de proteger pessoas e mercadorias, a inventar processos de entreajuda.
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A ANTIGUIDADE
A Histria comea com a inveno da escrita. Aos tempos mais recuados da Histria d-se o nome de Antiguidade.
s Mar C
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Mar Mediterrneo
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Os sumrios viviam numa zona chamada Mesopotmia entre os grandes rios Tigre e Eufrates. Como habitavam uma zona muito frtil, conseguiam obter mais cereais do que precisavam para se alimentarem e podiam procurar povos vizinhos para trocar as sobras por produtos que lhes fizessem falta como por exemplo gado, loias, etc. A pouco e pouco os sumrios perceberam que valia a pena produzir ainda mais para futuras trocas e assim se tornaram grandes comerciantes da Antiguidade.
Golfo Prsico
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a antiguidade
Para viajarem por terra com mais segurana, os sumrios deslocavam-se em caravanas.
A I .I
Nos rios ou no mar procuravam segurana organizando viagens em que participavam vrios navios.
Deste modo, tanto em terra como no mar, em caso de acidente ou de ataque, podiam contar com o apoio direto dos companheiros.
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a antiguidade
O cdigo de Hammurabi
Os povos da Mesopotmia deixaram um dos mais antigos conjuntos de leis escritas. Mas se chegaram aos nossos dias foi por serem gravadas em pedra. A essa pedra, descoberta por arquelogos, d-se o nome de Estela e atualmente encontra-se no Museu do Louvre em Paris.
As 280 leis do cdigo de Hammurabi destinavam-se a organizar a vida dos homens em sociedade.
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a antiguidade
Curiosidade
Hammurabi foi rei, viveu muitos sculos antes do nascimento de Cristo e dominou a regio da Mesopotmia. Tornou-se famoso por ter mandado reunir e gravar numa pedra as leis do seu reino. E deu provas de ser um homem inteligente, pois como dominava vrios povos, mandou gravar as leis em trs lnguas diferentes, que usavam alfabetos diferentes. Entre as leis de Hammurabi, algumas referem-se ao comrcio e permitem saber quais as regras destinadas a cobrir os riscos. A lei n. 102 por exemplo diz que se um mercador confiar dinheiro a uma pessoa que organize negcios e os negcios correrem mal, essa pessoa obrigada a devolver ao mercador a quantia que recebeu. Mas a lei n. 103 acrescenta que se a pessoa no tiver culpa da perda por ter sido roubado em viagem, ou por ter sofrido um acidente, fica dispensada de devolver o dinheiro.
QUERO QUE TODA A GENTE ENTENDA AS MINHAS LEIS .I
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a antiguidade
NA CHINA
China
Japo
Mar da China
Os chineses foram grandes navegadores desde a mais remota Antiguidade. E grandes comerciantes tambm.
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a antiguidade
Os navios chineses os juncos usavam velas de esteira. Viajavam sempre em conjunto para se protegerem mutuamente em caso de ataque de piratas, de incndios a bordo, de naufrgios.
Os primeiros mercadores que se lembraram de dividir a carga por vrios navios, como medida de precauo eram chineses. Tal como hoje se diz, tiveram o cuidado de no pr os ovos todos no mesmo cesto.
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a antiguidade
NO EGITO
Mar Mediterrneo
No antigo Egito as mercadorias no circulavam s no Nilo, havia caravanas que atravessavam o deserto e essas viagens eram muito perigosas.
Para proteger os mercadores do deserto, os sacerdotes do deus Amon organizaram as Confrarias do deserto a quem encarregavam ESTOU de marcar caminhos, de MORTO abrir poos ao longo dos DE SEDE I percursos sobre a areia para os caravaneiros no se perderem nem morrerem de sede e at de os defenderem em caso de ataque.
.
N Rio ilo
QUE VIAGEM VEL.I AGRADA
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a antiguidade
Os construtores de pirmides uniram-se para se protegerem entre si. Os fundidores e os ferreiros tambm criaram as suas associaes.
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a antiguidade
NA FENCIA
Os fencios habitavam uma estreita faixa de terra no extremo oriental do mar Mediterrneo.
Oceano Atlntico
Pennsula Ibrica
Mar Negro
Norte de Africa
Mar Mediterrneo
Fencia
Colnias Fencias
O solo da Fencia era pouco frtil, mas no faltavam grandes rvores que ofereciam madeira para a construo de navios. Estas condies naturais foram aproveitadas pelos fencios da melhor maneira: tornaram-se navegadores e comerciantes. Circulando pelo mar Mediterrneo trocavam os produtos que eles prprios fabricavam como por exemplo objetos de vidro e cermica por produtos que compravam e vendiam a outros povos. Os fencios serviam de intermedirios entre os povos que habitavam as costas do Mediterrneo. A partir de certa altura, passaram a instalar-se em determinados locais do seu percurso habitual, onde construam armazns e algumas casas para apoiar a sua rede de comrcio. A esses lugares d-se o nome de colnias.
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a antiguidade
~O QUEM NA CONTRIBUIR COM UMA PARTE DOS LUCROS, EM GIO NA ~O CASO DE NAUFRA RECEBE NADA...
As viagens podiam correr bem ou mal porque no mar enfrentavam vrios riscos, sobretudo naufrgios, ataques de piratas e de povos que tambm se dedicavam ao comrcio e procuravam aniquilar os concorrentes. Por volta do ano 1600 a.C. os fencios decidiram passar a guardar uma parte dos lucros de cada viagem para compensar perdas de viagens que corressem mal. Ou seja, organizaram-se para terem um fundo comum destinado a ajudar quem precisasse. Foi uma forma de mutualismo.
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a antiguidade
NA GRCIA
Pennsula Ibrica
Norte de Africa
Colnias gregas
Os gregos da Antiguidade viviam em cidades independentes umas das outras, as cidades-estado. Rodeados de mar e dominando uma srie de ilhas, dedicaram-se desde sempre navegao e ao comrcio. Tal como os fencios, tambm fundaram colnias em vrias zonas do Mediterrneo.
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a antiguidade
As riquezas que acumularam e os extraordinrios talentos que possuam permitiram que se distinguissem em todos os aspetos da vida humana e que se tornassem mestres em todas as artes. Os gregos desenvolveram muito a entreajuda organizada por profisses. Os trabalhadores associavam-se entre si e pagavam uma cota para juntar dinheiro que s seria usado para apoiar os que se vissem em dificuldade.
Estas associaes de socorros mtuos ou associaes mutualistas ajudaram a criar um modelo eficaz para as comunidades unirem esforos e fazerem face aos riscos que prejudicassem os negcios.
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EM ROMA
Os romanos conquistaram territrios to extensos que formaram o maior Imprio da Antiguidade. Desenvolveram uma civilizao avanadssima e lanaram as bases de uma vida em sociedade que veio a dar origem ao tipo de organizaes sociais que estiveram na origem das que hoje existem.
m Ro
Mar Mediterrneo
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a antiguidade
Os navios romanos circulavam por todo o Mediterrneo e naturalmente corriam os riscos habituais, como naufrgios, incndios, ataques de piratas e de concorrentes.
Os mercadores iam com frequncia buscar cereais ilha da Siclia, ao Egito e a outros lugares para os venderem na cidade de Roma. Se fossem atacados ou perdessem a mercadoria podiam ficar na misria ou abandonar a profisso. Os governantes quiseram proteg-los a fim de impedir que faltasse po em Roma e passaram a compensar os mercadores que tivessem prejuzos. E assim, os riscos a que os mercadores estavam sujeitos foram transferidos para o Estado.
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~ O! JA FALA MOS DAS NA ~ ES PROFISSIONAIS ASSOCIAO E HOUVE MUITAS OUTRAS FORMAS DE ENTREAJUDA E DE SOLIDARIEDADE.
MAS AFINAL NA ANTIGUIDADE SE PREOCUPAVAM AS PESSOAS SO COM A SEGURANA DOS VIAJANTES RCIO? QUE FAZIAM COME
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a antiguidade
Moiss entendeu que o povo de Israel tinha obrigao de contribuir com uma parte dos seus bens para dar apoio a pessoas desprotegidas, a mulheres vivas, a crianas rfs e a estrangeiros que se vissem em dificuldades. Com essa finalidade, determinou que de trs em trs anos uma parte da riqueza do povo de Israel ficasse de reserva para esse efeito, conforme est escrito na Bblia.
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EM ROMA
Em Roma, formaram-se vrios tipos de associaes destinadas a pessoas que tinham a mesma profisso, por exemplo: artesos, militares, juzes, sacerdotes, etc. Umas surgiram por iniciativa do grupo, outras por iniciativa do Estado.
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a antiguidade
Os cidados que possuam riqueza entregavam uma certa quantia ao Estado e o Estado comprometia-se a pagar-lhes um tanto por ano enquanto fossem vivos. O acordo podia beneficiar o Estado se o cidado vivesse pouco tempo. Ou prejudicar o Estado e beneficiar o cidado se tivesse uma longa vida. Este tipo de acordo foi um antecedente daquilo a que na poca atual se chama renda vitalcia.
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No tempo dos castelos, a que os historiadores chamam Idade Mdia, a vida na Europa mudou muito. O Imprio romano desagregou-se, e deu lugar ao aparecimento de vrios reinos que lutavam constantemente entre si para alargar o territrio. Sendo a ameaa de guerra um risco permanente, tornava-se necessrio tomar medidas para proteger as populaes. Por isso se ergueram castelos com muralhas e vrios tipos de torres, tendo o cuidado de preparar uma mais alta, mais forte e mais resistente que funcionasse como ltimo refgio a torre de menagem. Os reis no conseguiam garantir a proteo do seu povo em todo o territrio e procuravam resolver o problema entregando terras a nobres da sua confiana, na condio de tratarem eles da defesa dessas terras.
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Entre as ordens religiosas masculinas, destacaram-se por exemplo a ordem de So Bento, a ordem dos Cartuxos, a ordem de Cister, a ordem de So Francisco, a ordem de So Domingos.
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Entre as ordens religiosas femininas destacaram-se a ordem de Santa Clara, a ordem das Dominicanas, etc. Os monges, frades e freiras que pertenciam a estas ordens, viviam em conjunto nos seus conventos e mosteiros e o rei tambm lhes dava terras na condio de as desenvolverem e protegerem as populaes. As ordens religiosas prestavam vrios tipos de auxlio aos pobres: davam de comer, tratavam doentes, recolhiam rfos, etc.
As irmandades e fraternidades prestavam o mesmo tipo de auxlio, mas eram os seus elementos que reuniam o dinheiro para o fazer. Em certos casos o rei ou os grandes senhores da nobreza tambm contribuam.
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EM FRANA
No sculo XI surgiu uma confraria num porto francs destinada a proteger os mercadores que ficassem sem as suas mercadorias, mas s o faziam no caso do mercador no ter culpa nenhuma. As regras impunham que viajassem sempre em grupo e que levassem armas. Se no cumprissem estas regras, ainda que perdessem tudo a confraria no lhes pagava nada.
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NA FLANDRES
Na Flandres, pela mesma poca, surgiu uma confraria destinada essencialmente a cobrir prejuzos em caso de incndio ou a pagar resgates para libertar pessoas que fossem raptadas em viagem. Foi tambm na Flandres que se organizaram confrarias destinadas a cobrir os prejuzos de pessoas que se dedicavam criao de gado.
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EM PORTUGAL
Em Portugal, o rei D. Dinis e a sua mulher, a rainha Santa Isabel, preocuparam-se com a segurana e a proteo das pessoas e tomaram medidas para valer a quem precisasse. Em 1293, o rei confirmou a Bolsa dos Mercadores que tinha sido fundada por um grupo de proprietrios de navios que viviam no Porto e se dedicavam ao comrcio com o norte da Europa, sobretudo com a Flandres. Conforme tinham acordado, depositavam uma determinada quantia por viagem, num fundo comum. Parte desse fundo ficava em Portugal e outra parte ficava na Flandres. Em caso de naufrgio, ataque de piratas, rapto de pessoas ou outros prejuzos, o fundo compensava as perdas. Os donos dos navios maiores depositavam uma quantia mais elevada do que os donos dos navios pequenos. A partir do momento em que o rei confirmou a existncia da Bolsa, a contribuio para o fundo passou a ser obrigatria.
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Em 1297, a rainha Santa Isabel apoiou a Confraria Leiga de Beja, iniciativa de homens do concelho que tinham posses e decidiram contribuir com donativos para um fundo destinado a socorrer qualquer deles em caso de doena, acidente ou morte. Em caso de morte o apoio era dado viva. Quanto ao filho de D. Dinis e de Santa Isabel, D. Afonso IV, tomou a iniciativa de enviar dois mercadores a Inglaterra para propor um acordo ao rei Eduardo III: a coroa portuguesa tomaria sob sua proteo os comerciantes ingleses que fizessem negcios em Portugal. E a coroa inglesa tomaria sob sua proteo os mercadores portugueses que fizessem negcios em Inglaterra. A proposta foi aceite e assinou-se o tratado em 1353. No ano 1380 o rei D. Fernando de Portugal criou a Companhia das Naus destinada aos navios que tivessem capacidade para transportar mais de 50 tonis. Os donos entregavam uma parte do lucro obtido em cada viagem, que ficava de reserva para substituir navios naufragados ou para pagar o arranjo de mastros, cascos, velas danificadas. Lopo Martins e Gonalo Peres Canelas ficaram encarregues de receber essas quotas e de as conservar numa arca com trs fechaduras. Cada um deles guardava uma chave, a outra ficava entregue a um escrivo ou ao secretrio que tomava nota dos nomes dos mercadores que tinham efetuado pagamento e registava a quantia entregue. A existncia de trs chaves destinava-se a impedir abusos e roubos pois s era possvel abrir a arca na presena dos trs chaveiros, a quem competia indemnizar as infelizes vtimas de naufrgios ou de acidentes.
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Os navios protegiam-se mutuamente e lutavam contra a concorrncia dos que no fossem scios. Na compra e venda de produtos, davam preferncia aos associados. Todas as cidades da Liga tiveram o cuidado de equiparem bem os seus portos, sem esquecer os armazns para as mercadorias e residncias para marinheiros e comerciantes que no tivessem onde ficar. Todos os associados respeitavam um regulamento feito para a navegao, para as trocas comerciais, para os pesos e medidas. Para facilitar as trocas, criaram uma moeda prpria da Liga Hansetica: o witten de prata.
No ano 1353, mercadores portugueses estabeleceram relaes comerciais com a Liga Hansetica.
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OS MONTES
Os primeiros Montes criados com fins de solidariedade receberam este nome, segundo consta, porque de incio eram montes de cereais acumulados pelos agricultores italianos que tinham tido boas colheitas e podiam dispensar uma parte. Esses montes eram guardados e serviam para ajudar os infelizes que tinham tido ms colheitas.
TEMOS BASTANTE JA TRIGO! SE HOUVER UMA STROFE AQUI NA CATA M NOSSA TERRA NINGUE PASSA FOME.I
Em Portugal tambm se organizaram associaes deste tipo a que se dava o nome de Celeiros Comuns. O primeiro foi criado em vora, no ano de 1576. Pouco depois surgiram outros em Grndola e em Beja. Os Celeiros Comuns foram a base dos seguros agrcolas portugueses.
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EU ENCARREGO -ME DE CONSTRUIR UM LIDO. NAVIO BEM SO S E NO COMPROMETEMO -NOS A COMPRAR E VENDER A CARGA.
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Os navios pertenciam a particulares, mas todos estavam sujeitos a um coordenador que defendia os interesses de Veneza e obrigava por exemplo a que fossem embarcadas mercadorias vindas do Oriente mesmo que no interessassem especialmente ao dono do navio. Deste modo se impediam os concorrentes de Veneza de fazer negcios com produtos orientais.
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No sculo XIV e XV fizeram-se muitos outros seguros em Pisa, Gnova, Veneza e Florena, cidades italianas que se dedicavam ao comrcio martimo.
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Os primeiros contratos de seguro foram pois feitos em Itlia e destinavam-se a cobrir prejuzos do comrcio martimo. Como se tornou claro que valia a pena, a pouco e pouco foram sendo adotados noutros pases. A mais antiga aplice de seguro martimo da Pennsula Ibrica foi assinada em 1378, na cidade de Barcelona. Data de 1399 a primeira aplice respeitante ao transporte de mercadorias portuguesas, peles de animais, couros, que viajaram de Lisboa para Florena numa barca que pertencia a Fernando Sanches. Mas este contrato foi iniciativa de um mercador italiano. A partir de ento, fizeram-se muitos outros, sempre registados em Itlia, mas envolvendo portugueses e mercadorias portuguesas, incluindo o acar da ilha da Madeira.
Em Frana encontram-se algumas aplices do sculo XV. Depois, a prtica de segurar navios e mercadorias estendeu-se aos pases do norte da Europa, mas quase sempre com a participao de mercadores italianos.
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Os primeiros navegadores portugueses, que no reinado de D. Joo I (incio do sculo XV) partiram descoberta de novas terras, navegaram ao servio do infante D. Henrique. Os navios, os mantimentos, o salrio dos capites e dos marinheiros, tudo era pago com as riquezas da Ordem de Cristo a que o infante presidia. Se dessas viagens houvesse lucros, ficavam para a Ordem de Cristo. Nesta poca ainda no se pode pois falar de seguros martimos feitos em Portugal. Despesa e receita, sucesso ou fracasso, tudo era da responsabilidade de uma s organizao, a Ordem de Cristo.
Havia no entanto donos de navios que viviam no Algarve, sobretudo em Faro ou Tavira, que navegavam por sua conta, no para descobrir terras, mas para comerciar com cidades do Mediterrneo ou do norte da Europa. Esses indivduos organizaram associaes mutualistas a que podiam pertencer todo o tipo de profisses ligadas ao mar: pescadores, construtores de navios, mercadores, marinheiros, etc. Os associados contribuam com uma parte dos lucros que obtinham na sua atividade. Em caso de doena, ou de prejuzo, recebiam apoio dessas associaes a que se dava o nome de Compromissos Martimos.
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A partir do reinado de D. Joo II (1481) as iniciativas relacionadas com os Descobrimentos passaram a ser da coroa, que assumia todas as responsabilidades. No reinado de D. Manuel I (14951521), o trfico martimo intensificou-se muito com a descoberta do caminho martimo para a ndia e com a descoberta do Brasil. A partir de ento, as armadas organizadas pela coroa passaram a aceitar a participao de navios e cargas de particulares. Tornou-se indispensvel fazer registos sobre o que pertencia coroa e aos privados. No sculo XVI existia em Lisboa uma organizao destinada a registar as aplices de seguro que envolvessem comrcio martimo portugus. Chamava-se Casa dos Seguros e funcionava na Rua Nova dos Ferros, perto do Terreiro do Pao. Esta casa ainda existia no sculo XVIII, mas ficou totalmente destruda com o terramoto de 1755, perdendo-se todos os documentos que ali se encontravam. No entanto, como era muito importante para o comrcio, depressa se reorganizou e trs anos depois do terramoto j estava novamente a funcionar.
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No sculo XVII a Holanda, a Blgica, a Inglaterra j tinham grandes armadas que navegavam nas rotas abertas pelos portugueses e faziam negcios com produtos do Oriente. A Holanda criou em 1602 a Companhia das ndias Orientais que alm de organizar as viagens e estabelecer as regras a que deviam obedecer as compras e vendas, assumia os prejuzos que pudessem advir de tempestades, naufrgios, ataques de piratas, incndios a bordo. Mas o seguro era feito para uma viagem e s cobria os riscos que pudessem surgir nessa viagem. No se tratava pois ainda daquilo que vieram a ser os seguros modernos.
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QUERO FAZER ` MINHA UM SEGURO DE VIDA A ODO DE FILHA FRANCESCA PELO PERI 1 DE MARO A 6 DE SETEMBRO DE 1515. E PAGO PARA O SEGURO COBRIR TODAS AS CAUSAS DE MORTE VEIS. POSSI
O facto deste seguro se referir a um perodo de tempo to curto leva a pensar que talvez a filha estivesse grvida e o pai receasse que morresse de parto.
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AS MISERICRDIAS
Em Portugal, a rainha D. Leonor, mulher do rei D. Joo II, em 1498 fundou uma organizao de solidariedade que tinha finalidades idnticas s dos seguros: socorrer quem precisasse de ajuda. Essa organizao recebeu o nome de Misercrdias e obedecia a regras ou Compromissos. A primeira teve sede em Lisboa, com tanto sucesso que depressa surgiram outras por todo o pas e em todos os continentes onde se instalavam portugueses.
As Misercrdias protegiam crianas rfs, famlias pobres, pessoas sem abrigo, peregrinos, doentes, apoiando tambm os presos e acompanhando at os condenados morte a quem davam enterro cristo. As verbas das Misericrdias eram obtidas atravs de peditrios, donativos feitos por pessoas ricas, receitas obtidas em festas e romarias ou testamentos de pessoas que lhes deixavam os seus bens.
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O grande incndio de Londres As reunies de mercadores na Lloyds Coffee House A elaborao da Tbua de Halley
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o seguro moderno
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o seguro moderno
CONTEM COMIGO .I
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o seguro moderno
A certa altura decidiram fundar um jornal que veio a ter muitos leitores. E mais tarde fundaram a primeira organizao totalmente dedicada a fazer seguros. Oferecia servios a quem fizesse negcios de comrcio martimo em qualquer parte do mundo. O nome escolhido foi Corporation of Lloyds para lembrar o caf onde o grupo em tempos se reunia. Esta corporao, mais tarde, veio a contribuir para a criao da Bolsa de Londres.
A TBUA DE HALLEY
Edmund Halley foi um dos cientistas ingleses mais famosos do seu tempo. A ele se devem por exemplo as previses sobre a passagem do cometa Halley. E devem-se tambm contributos em reas to variadas como a Matemtica, a Geografia, a Fsica. Um dos estudos que desenvolveu destinou-se a calcular a esperana mdia de vida das populaes. Para isso realizou clculos relacionados com o nascimento e a morte de inmeros indivduos e em 1693 apresentou uma Tbua de Mortalidade que, tal como o cometa, tambm passou histria com o seu nome a Tbua de Halley. A Tbua de Halley passou a ser usada pelas companhias que faziam seguros de vida, ou estabeleciam contratos de rendas vitalcias, para calcularem quanto deviam cobrar a cada cliente e quanto teriam de desembolsar para honrar os contratos feitos com o grupo a que aquele cliente pertencia, de modo a equilibrarem o negcio sem correrem o risco de ir falncia.
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o seguro moderno
No Porto, as primeiras seguradoras foram: a Segurana de 1835; a Douro de 1846; a Garantia de 1853; a Equidade do mesmo ano.
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o seguro moderno
A pea era realmente magnfica, mas era tambm muito cara e D. Fernando afinal no teve dinheiro para a pagar. O ourives decidiu ento apresent-la ao pblico, numa exposio que envolvia concurso e ganhou a medalha de ouro. Muitos jornalistas e crticos de arte, maravilhados, escreveram artigos elogiosos sobre a beleza da faca e tentaram impedir que sasse do pas.
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o seguro moderno
S que em Portugal no apareceram compradores e o dono da ourivesaria, Estvo de Sousa, decidiu envi-la para uma exposio em Londres, na esperana de que algum a comprasse. Como era um homem prudente fez seguro de transporte por mar, numa companhia de seguros portuguesa. E em boa hora o fez porque o navio Cdis, onde viajava a pea, sofreu um terrvel naufrgio junto costa de Frana e levou para o fundo do mar passageiros e carga. A companhia de seguros pagou imediatamente a indemnizao de 700000 libras a que o ourives tinha direito. Mas depois, resolveu enviar mergulhadores ao local do naufrgio para que tentassem recuperar a faca de caa que agora lhe pertencia e outras peas que tambm tinham seguro. A operao de resgate era perigosssima devido s tempestades frequentes naquela zona, em frente ao porto de Brest, por isso o governo francs proibiu os seus mergulhadores de participar. No entanto houve uma empresa inglesa que aceitou o trabalho e os mergulhadores foram bem sucedidos. Ao longo de seis semanas conseguiram recuperar muitas peas do poro e quando conseguiram entrar na cabine do comandante encontraram o cofre onde estava guardada a preciosa faca de caa. Depois de limpa e restaurada em Inglaterra, onde foi considerada pea de valor incalculvel, voltou para Lisboa. Apesar do perigo, veio ainda a ser apresentada na Exposio Universal de Paris de 1878 e, no ano seguinte, na Exposio do Rio de Janeiro. A maravilhosa faca de caa um tesouro que pertence companhia de seguros, que a guarda a sete chaves num cofre.
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a revoluo industrial
A REVOLUO INDUSTRIAL
No sculo XIX a histria da vida da humanidade entrou numa nova fase devido descoberta da mquina a vapor e da utilizao do carvo como fonte de energia. A existncia de mquinas e de fbricas alterou profundamente a maneira de trabalhar e de produzir. Alterou tambm a distribuio das populaes que se concentraram junto das fbricas dando origem a cidades cada vez maiores. A necessidade de matrias primas para a indstria e de carvo para fazer funcionar as mquinas intensificou a explorao das minas.
A revoluo industrial alterou profundamente os transportes. Surgiram os navios a vapor, muito mais rpidos e que no dependiam do vento para chegar ao seu destino, e comboios, que a uma velocidade antes inimaginvel, deslocavam toneladas de carga e milhares de passageiros entre povoaes prximas ou distantes. O trabalho com mquinas, nas fbricas, nas minas e nos novos meios de transporte, aumentou muito o risco de acidentes e veio mais tarde a dar origem ao seguro de acidentes de trabalho. Portugal foi um dos primeiros pases a criar um seguro de acidentes de trabalho, em 1913.
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a revoluo industrial
Assim se foram multiplicando as companhias de seguros que procuraram aperfeioar os contratos para os diferentes tipos de riscos, a fim de atrair clientela. Na nossa poca, alm das companhias de seguros criaram-se nos vrios pases associaes que as representam. A Associao Portuguesa de Seguradores foi criada em 1982.
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o seguro no sculo x xi
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Quem tem carro obrigado por lei a fazer um seguro. H pessoas que fazem seguros de sade para si prprios e para a famlia. Tambm h quem tenha o cuidado de fazer seguro contra roubo e contra incndio da sua casa. E o mesmo se passa com as empresas. Algumas fazem seguros de sade para o pessoal, ou contra roubo e incndio do edifcio onde funcionam, para proteger navios que tm no mar, etc. Fazer um seguro a maneira mais eficaz das pessoas e das empresas se protegerem contra riscos que podem vir a sofrer no futuro. Mas afinal em que consiste exatamente o seguro moderno? Na nossa poca j possvel responder a esta pergunta com total clareza: um seguro um contrato entre quem? Entre o segurado e a companhia de seguros. O segurado pode ser uma pessoa singular ou uma empresa. A companhia de seguros uma organizao que tem como misso indemnizar o segurado ou prestar-lhe assistncia de acordo com o que estiver escrito no contrato, a aplice.
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O que que o contrato protege, por exemplo s a casa ou a casa e todo o recheio. Que riscos cobre, por exemplo incndio, ou incndio e tremor de terra, ou incndio, roubo e tremor de terra, etc. Qual a quantia que a companhia de seguros tem de pagar ao segurado no caso do risco se concretizar e ele ter direito indemnizao combinada. Qual a quantia que o segurado tem de pagar para a aplice ser assinada e se tornar um compromisso entre as duas partes. A data do incio e do fim do contrato e as condies de renovao.
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Ora sendo assim, se a pessoa partir uma perna em viagem, contacta a companhia de seguros que logo lhe aconselha a melhor maneira de receber tratamento e contribui com uma quantia para pagar esse tratamento, a estadia no hospital e a viagem de regresso a casa.
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O CANDEEIRO QUE O SEU FILHO PARTIU ERA DE CRISTAL! VAI TER DE ME PAGAR E BEM.
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SEGURO DE SADE
As pessoas, por mais saudveis que sejam, podem precisar de cuidados mdicos a qualquer momento. s vezes limitam-se a uma consulta, outras torna-se necessrio fazer anlises, radiografias e outros exames do gnero. Em certos casos so indispensveis tratamentos caros ou uma operao e internamento. O seguro de sade destina-se precisamente a ajudar as pessoas a pagar essas despesas. H vrios tipos de aplices, uns incluem mais tratamentos e so mais caros, outros menos tratamentos e so mais baratos. Cabe pessoa escolher o que melhor lhe convm.
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SEGURO MULTIRRISCOS
Os seguros multirriscos, como o nome indica, cobrem vrios tipos de riscos que as casas podem sofrer: incndios, roubos, inundaes, curto-circuitos e outros como por exemplo ficar sem telhado por causa de uma tempestade que levou as telhas ou que derrubou uma rvore grossa que havia mesmo ao lado. E ainda, atos de vandalismo como vidros partidos por malfeitores, arrombamento de portas, etc.
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Neste caso tambm h seguros mais caros e mais baratos conforme os riscos que cobrirem. E a pessoa escolhe o que lhe convm. Se quiser incluir o recheio da casa, necessrio avaliar os mveis e tudo o mais que l estiver dentro, para acertar o valor do prmio ou seja, aquilo que o segurado vai pagar por ano. E o valor da indemnizao, ou seja o que a companhia de seguros ter que lhe dar se ocorrer um dos riscos includo no contrato.
A MINHA CASA FOI ASSALTADA. AGORA QUERO FAZER UM SEGURO CONTRA ROUBO .I
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tem carro faa aquilo a que vulgarmente se chama seguro contra todos os riscos, ou seja um seguro que inclua danos sofridos pelo prprio, porque ento, em caso de acidente, a companhia de seguros pagar tambm uma boa parte das despesas do arranjo do carro do segurado. Estes contratos de seguro automvel tm variantes. Podem ainda incluir:
O direito a um carro de substituio enquanto o do segurado estiver a ser arranjado. A proteo do condutor responsvel pelo acidente. Assistncia em viagem. Indemnizao se o carro for roubado, se sofrer efeitos de catstrofes naturais ou se for danificado por atos de vandalismo.
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AGRADECIMENTOS
Para escrever este livro contmos com a preciosa ajuda do Dr. Ruy de Carvalho que generosamente nos disponibilizou o seu vasto trabalho de investigao sobre a histria dos seguros, nos esclareceu todas dvidas que foram surgindo e se disps a rever o manuscrito.