Mediunidade Na Terceira Idade

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XI Fórum Nacional de Coordenadores de Projetos da Terceira Idade de Instituições

de Ensino Superior e X Encontro Nacional de Estudantes da Terceira Idade de


Instituições de Ensino Superior

Mediunidade na Terceira Idade


Prof. Dr. Adilson Marques
Doutor em Antropologia das Organizações e Educação pela USP
Professor da Fundação Educacional São Carlos (FESC)
Pesquisador dos fenômenos mediúnicos e paranormais

Apresentação

Este paper é fruto de uma pesquisa mais ampla denominada “Gerontologia


Holonômica: a arte de envelhecer”, que começou a ser delineada no ano de 2004 quando fui
convidado para ministrar uma palestra em um curso para cuidadores de idosos que ocorreu
na Fundação Educacional São Carlos (FESC). Naquela ocasião, abordei o tema
“envelhecimento e espiritualidade: para além da consciência da finitude”, cuja transcrição
pode ser acessada na Internet (http://www.scribd.com/doc/17463495/Envelhecimento-e-
espiritualidade), no portal scribd.

Um dos pressupostos da Gerontologia Holonômica, e que a diferencia radicalmente


da Gerontologia materialista, é a compreensão de que somos Espíritos eternos e que o
Espírito não envelhece. Essa aceitação da realidade espiritual nos ajuda a compreender
vários fenômenos que a abordagem materialista não é capaz de explicar.

Neste trabalho abordarei a experiência de duas senhoras que descobriram que eram
médiuns na Terceira Idade, e que aceitaram com naturalidade o fenômeno e hoje convivem
de forma harmoniosa com esse potencial psíquico, sem que o mesmo afete o seu cotidiano.
Ambas são alunas da Universidade Aberta da Terceira Idade, um dos programas mantidos
pela FESC.

Analisando de dois casos

A primeira aluna ingressou na escola no ano de 2005, quando estava com 58 anos
de idade. Certo dia, manifestando uma desesperadora crise depressiva, além de sofrer com
visões e outros fenômenos que a ciência tradicional classificaria como sintomas de
esquizofrenia, ela foi orientada por outra aluna a me procurar. Conversando com ela em
particular, notei que a aluna apresentava sinais de uma mediunidade ostensiva e que
precisava conhecer melhor o fenômeno para saber lidar com ele. Expliquei o meu ponto de
vista e ela me respondeu que era católica praticante e que nunca tinha acreditado na
possibilidade da mediunidade existir. Porém, devido à gravidade de seu problema, pediu-
me auxilio.

Com a experiência na formação de médiuns, desde 2001, a convidei para participar


de um novo grupo que estava sendo montado em meu consultório. Ela estaria participando
junto com outras pessoas que apresentavam um quadro similar ao dela, e todos sem
nenhuma experiência anterior com a mediunidade.

Ela aceitou participar do grupo e, após alguns meses de estudos, começou a dar
“passagem” para entidades espirituais típicas da Umbanda, como os “pretos-velhos”, os
“índios”, as “crianças”, os “médicos” e os “ciganos”.

Ao contrário de algumas religiões reencarnacionistas que proíbem a manifestação


dos espíritos acima, classificando-os como “selvagens”, “inferiores”, “bárbaros”,
“zombeteiros” etc., interferindo negativamente na formação mediúnica dessas pessoas, nos
meus grupos de formação mediúnica permito que cada pessoa trabalhe livremente o seu
próprio potencial interior e depois encaminho para centros espiritualistas onde a pessoa
possa colocar em prática sua mediunidade, de acordo com o potencial apresentado durante
o seu aprimoramento, cumprindo, assim, a missão de seu próprio Self.

Após adquirir confiança e mais controle sobre esse fenômeno, a aluna foi trabalhar
em um centro espiritualista localizado na cidade de São Carlos/SP que realiza trabalhos de
Umbanda e de Apometria. Além da incorporação, ela passou a psicografar mensagens,
principalmente de sua mãe e de seu marido, ambos já falecidos.

Em 2007, ela foi procurada por uma jornalista da revista “Sou mais eu!” e foi capa
de uma edição cujo tema foi “eu converso com os espíritos”. A aluna não deixa de
freqüentar a igreja católica, mas hoje aceita o fenômeno mediúnico com mais naturalidade e
serenidade. “Da mesma forma que a Igreja teve que aceitar que a Terra é redonda e gira em
torno do Sol, terá que aceitar, um dia, que nossa pátria é o mundo espiritual e que, quando
Deus permite, existe a possibilidade de comunicação entre os ‘mortos’ e os ‘vivos’, como
registra a Bíblia na passagem em que o rei Saul conversou com Samuel, já morto”, ela
afirma.

Em 2005, gravei um áudio com a aluna “incorporada”, dando passagem para um


“preto-velho” que se identifica como pai Jeremias. O Espírito, no áudio, dá conselhos para
um casal que possui um parente com mal de Alzheimer. O áudio pode ser acessado na
Internet, através do seguinte endereço:

http://www.youtube.com/watch?v=xfsfbAoG5-k

O segundo caso é de uma senhora com 73 anos de idade e também aluna da


Universidade Aberta da Terceira Idade. Coletei um depoimento dessa aluna, abordando a
sua experiência mediúnica, em minha pesquisa História Oral e Transcendentalismo:
imagens e imaginário do invisível. O depoimento foi gravado em vídeo e pode ser acessado
no youtube, no canal animagogiabrasil (http://www.youtube.com.br/animagogiabrasil).
Ela nos narra que por volta dos 40 anos de idade, após o nascimento de sua terceira
filha, começou a manifestar uma forte alergia. Foi orientada por um médico a tomar
cortizona, remédio que começou a lhe trazer fortes complicações de saúde, devido aos
efeitos colaterais que acarreta no organismo. Em um certo dia foi convidada para conhecer
o trabalho de um Centro Espírita na cidade de São Carlos/SP, chamado Luz e Caridade.
Neste centro conheceu uma pessoa que lhe indicou um tratamento com regressão de
memória. Durante a regressão acessou uma lembrança em que aparece em um campo de
concentração nazista, onde teria desencarnado asfixiando gás mostarda. Com a lembrança
desse fato, não teve mais o problema de alergia que tanto a incomodava e não precisou
mais tomar cortizona.

Ela nos narra que após o nascimento da filha começou também a ter vidências. Hoje
ela trabalha como médium no centro acima, local que freqüenta há mais de 30 anos, sem
que isso afete ou prejudique sua vida cotidiana. Em suma, a mediunidade é mais um fato
natural que faz parte de sua rotina, apesar de muitos acadêmicos ainda considerarem o
fenômeno como um sintoma de patologia mental.

Felizmente, esse quadro começa a dar sinal de falência, e não só no Brasil. Em


junho de 2008, aconteceu o I Encontro Anual da Sociedade Espiritualidade, Teologia e
Saúde nos EUA e, aqui no Brasil, em abril de 2009, no III Simpósio Internacional sobre
Religiosidades, Diálogos Culturais e Hibridações, na cidade de Campo Grande/MS,
aconteceu o simpósio temático Nova perspectiva para o século XXI: o diálogo entre
ciência, religião e espiritualidade, com a apresentação de 24 trabalhos. Entre eles, podemos
citar um que tem relação direta com o nosso tema: “Estados alterados de consciência,
percepções extra-sensoriais e mediunidade: percepções que agravam o curso das doenças
mentais?”, apresentado pelos médicos Alex Leite Melo e Leila Dittmar Moreira, trabalho
no qual os autores demonstram que a mediunidade é um fenômeno natural e sua prática não
pode ser apontada como causa de doenças mentais, afirmando, inclusive que o DSM-IV, ou
seja, o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders - Fourth Edition (publicado
pela Associação Psiquiátrica Americana - APA), criou uma nova categoria para estudos
(Problemas espirituais e religiosos) com o objetivo de melhor compreender alguns
fenômenos, entre eles a mediunidade.

E como afirma Denise de Assis, coordenadora do simpósio temático acima citado,


em sua pesquisa apresentada no referido evento:

Atualmente, fatores religiosos e espirituais têm se configurado como tema


de pesquisa na área de psiquiatria. Por muito tempo, crenças e práticas
religiosas estiveram diretamente relacionadas à histeria, neurose e
delírios psicóticos, no entanto, estudos recentes têm revelado outro lado
da religião, servindo como recurso psicológico e social para lidar com
situações estressantes.
Há algum tempo atrás, religião e saúde mental estiveram
estreitamente ligadas. Muitos dos primeiros hospitais psiquiátricos
ficavam em monastérios e eram dirigidos por padres. Com algumas
exceções, tais instituições tratavam os pacientes com mais compaixão do
que as instituições do governo. Nos EUA, o primeiro método empregado
na área de psiquiatria foi o ‘tratamento moral’, que envolvia um
tratamento compassivo e humanitário dos doentes mentais. Isto se
configurou numa revolução para uma época em que os pacientes
psiquiátricos eram expostos ou internados em condições desprezíveis nos
fundos dos hospitais ou das prisões. Acreditava-se que a religião exercia
uma influência positiva e civilizadora nos pacientes que poderiam ser
recompensados por boa conduta assistindo aos trabalhos religiosos.
No final do século XIX, no entanto, o neurologista Jean Charcot e
Sigmund Freud começaram a associar religião com histeria e neurose.
Este fato criou uma divisão que separaria a religião da saúde mental
durante o século XX. Atualmente, este quadro vem mudando.
Freud foi um dos grandes opositores da religião. Em O Futuro de uma
Ilusão, ele esboçou a idéia de que a religião estaria ligada ao desamparo
que temos na infância, suprido pela figura do pai, que fornece proteção.
Como o reconhecimento deste desamparo continua durante a vida, foi
necessária a criação de um pai mais poderoso. Assim o governo
benevolente de uma providência divina seria capaz de mitigar o temor dos
perigos da vida. Por outro lado, também afirmou que a nossa civilização
se ergueu sobre os parâmetros ditados pela religião e caso as doutrinas
religiosas caíssem por terra, os homens se sentiriam isentos de toda e
qualquer obrigação de obedecer aos preceitos da civilização, pois dariam
vazão a todo seu egoísmo procurando exercer seu poder.
Com a chegada do século XXI, uma nova situação começou a surgir
na sociedade. O aumento do número das pessoas ‘sem-religião’. Este
fenômeno, atualmente, vem se caracterizando pela distinção entre
Religião e Espiritualidade.

A distinção entre religião e espiritualidade é de fundamental importância, uma vez


que a mediunidade é um fenômeno espiritual, registrado em todas as tradições culturais,
sem relação necessária com as religiões. Existem aquelas que tratam a mediunidade como
algo negativo e que deve ser combatida e aquelas que apóiam a sua prática, porém, como
fenômeno bio-sócio-psíquico ela tem uma importância filosófica e cientifica que pode
provar ou não a existência da vida após a morte.
E como aponta ainda a pesquisadora Denise de Assis:

Segundo pesquisa do IBGE, em 1980 o grupo conhecido como


pessoas “sem religião” representava 1,6% da população brasileira. No
ano 2000, passou a representar 7,3%. Estes dados estatísticos dizem
respeito à população brasileira, no entanto, tal fenômeno é mundial. A
característica marcante deste novo cenário se resume ao fato de que
apesar de não estarem vinculadas a nenhum grupo religioso, as pessoas
adotam formas pessoais de religiosidade, ou a uma busca pela
espiritualidade.
De acordo com Larson, Swyers e McCullough (1998), os termos
religiosidade e espiritualidade foram destacados muito recentemente. A
religiosidade além das crenças pessoais em um Deus ou poder superior
inclui práticas institucionais, com a freqüência a cultos envolvendo
compromissos doutrinários de uma religião organizada. Já a
espiritualidade diz respeito a uma busca espiritual individualizada
independente de qualquer outra forma de culto. Dá-se preferência à
experiência espiritual direta em contraposição às práticas de culto das
religiões institucionalizadas.

Conclusão

A mediunidade pode eclodir na vida de uma pessoa em qualquer faixa etária,


independentemente de sua classe social, grau de escolaridade e religião. No caso aqui
apresentado, trata-se de duas mulheres que vivenciaram o processo “tardiamente” em suas
vidas, mas que aceitaram o fato e hoje vivenciam a Terceira Idade de uma forma saudável e
sem que a mediunidade seja um transtorno. Obviamente que a mediunidade, quando não é
educada e compreendida, pode sim causar certos transtornos mentais e emocionais, e até
comportamentais, o que não significa que a pessoa seja esquizofrênica, louca ou “tomada
pelo demônio”.

Ao aceitar o fenômeno, estudar e compreender os seus limites e possibilidades, a


mediunidade pode ser vivenciada de forma sadia, transformando-se em uma agradável
companheira de viagem para aqueles que disponibilizam o seu tempo, amorosamente, no
auxilio ao próximo.

Bibliografia

ASSIS, Denise. A influência da espiritualidade na saúde física e mental. III Simpósio


Internacional sobre Religiosidades, Diálogos Culturais e Hibridações. UFMS: Campo
Grande, 2009.

MARQUES, Adilson. Fragmentos da história oculta de São Carlos e outros assuntos


transcendentais. BN Editora: São Carlos, 2007.

_____________. História Oral e Transcendentalismo: imagens e imaginário do invisível.


III Colóquio Internacional Imaginário, Educação e Utopia. UFF: Niterói, 2009.

MELO, Alex Leite Melo e MOREIRA, Leila Dittmar. Estados alterados de consciência,
percepções extra-sensoriais e mediunidade: percepções que agravam o curso das doenças
mentais?. III Simpósio Internacional sobre Religiosidades, Diálogos Culturais e
Hibridações. UFMS: Campo Grande, 2009.

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