O Desenho - Um Processo de Ensino...
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O Desenho - Um Processo de Ensino...
APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO
DO PROCESSO CRIATIVO
Marcia Moreno
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Resumo: Esta pesquisa visa justificar a importncia do desenho como
linguagem para o desenvolvimento do processo criativo do sujeito, refletindo,
inclusive, essa ampliao da criatividade, na fase adulta. Sendo assim, no
decorrer do texto, so apresentadas algumas situaes/possibilidades,
trazidas por alguns autores bem como da minha prpria trajetria como
docente.
Palavras-chave: criatividade; desenho; educador; educando.
MARCIA MORENO
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Revista Pedaggica - UNOCHAPEC - Ano 10 - n. 21 - jul./dez. 2008
Introduo
Essa pesquisa surgiu a partir dos estudos realizados no decor-
rer da trajetria docente, onde um dos principais contedos que eu
tenho trabalhado no ensino o desenho e, posteriormente, o reflexo
dessa atividade no que se refere criatividade e ao sujeito criativo.
Como suporte terico, entre vrios investigados, o mais signi-
ficativo foi o livro da autora Cox (2001), onde ela traz detalhadamente
os processos e resultados do desenho aplicados em sala de aula em
distintos continentes, mostrando a influncia do adulto na construo
do processo criativo da criana, tendo como instrumento, o desenho.
Outro assunto importante aqui apresentado quanto
criatividade e ao sujeito. H uma apresentao quanto a esse processo
no decorrer do desenvolvimento do sujeito e de qual reflexo ter quando
adulto. E mais uma vez citada a importncia do professor para a
construo do indivduo, incluindo tambm o meio social, tendo um
papel fundamental os pais, que so os mediadores iniciais desse
processo.
Embasamento terico
A criatividade e o sujeito
Segundo a autora Ostrower (1987), criar basicamente for-
mar, so novas relaes estabelecidas pela pessoa e o ato criador.
Compreende a capacidade que o ser humano tem de significar as
coisas, sendo ele um fazedor, porque capaz de relacionar e confi-
gurar as suas experincias de vida, dando significados.
Ns vivemos entre formas e estmulos que recebemos a todo o
instante. Alguns, relacionamos e percebemos, pois, esto vinculados a
ns mesmos e sobretudo com uma atitude do nosso ser mais ntimo,
constituindo uma maneira especfica de interpretar os fenmenos, bus-
cando significados que trazem a motivao de criar, sentindo a neces-
sidade de comunicar-se com os outros; s assim podemos crescer
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enquanto seres humanos, coerentemente, ordenando, dando formas e
criando.
No mbito conceitual ou intelectual, os processos criativos arti-
culam-se principalmente atravs da sensibilidade, sendo ela patrimnio
de todo ser humano, ainda que em reas sensveis diferentes. O ser
humano nasce com um potencial de sensibilidade, que um canal ou
porta de entrada das sensaes, ligando-o de imediato a tudo que acon-
tece em seu entorno.
O beb ao nascer j portador do potencial de conscincia, enquanto
dorme ele vai ordenando certas sensaes e gradualmente vai organizando-
as. Ele vai crescendo e adquirindo novas experincias; constata que quando
chora por estar molhado atendido, portanto comear a usar desta
descoberta para ficar seco e posteriormente para ganhar colo.
Experimentar sensaes de cheiros ou movimentos, comea a significar.
Adquirindo a significao e comeando a interagir mais intensa-
mente com o meio, o beb transfere para o consciente e inconsciente
essas informaes e cria smbolos. o desenvolvimento do processo
de crescimento interno, onde criamos vrias formas de viver e nelas o
nosso fazer.
A imaginao produtiva ou criadora, por sua vez, refere-se
capacidade de inveno, de criao de formas e figuras. algo que
introduz o novo, constitui o indito, a posio de novos sistemas de
significados e de significantes, presentifica o sentido. Esse imaginrio
passa a ser, especialmente, o motor de criao.
Para o autor Busse (apud ALENCAR,1993), a criatividade
tratada como um conceito relativo, sendo denominado um produto
criativo, considerando o momento histrico, apresentando diferentes
nveis de criatividade, o nvel menos e o mais elevado que tem uma
identificao de um grau maior de transformao. Segundo o autor, a
criatividade [...] implica emergncia de um produto novo (p. 15),
sendo ela uma ideia ou uma inveno original, ou at mesmo a
reelaborao e aperfeioamento de um produto j existente, mas para
essa criatividade ser aceita necessrio que a ideia seja apropriada a
uma determinada situao.
Existem pensamentos de que a criatividade um dom divino, ou
ento, de que existem pessoas seletas para a criatividade. Ou ela ou
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no criativa, desconsiderando que, na realidade, o que existe so pes-
soas mais criativas e outras menos. Essa habilidade criativa pode ser
desenvolvida e aprimorada com a utilizao da prtica e do treino,
pois, alm de iluminao e de inspirao, precisamos de muito trabalho,
prtica, atitude criativa e padres perfeccionistas.
Analisando a criatividade nos artistas e cientistas, nos quais ela
mais evidente, verificou-se que ela no resultado de uma inspirao
sbita, mas sim, de muito trabalho e esforo por parte do indivduo
(GARDNER,1996). Para estimular a criatividade existem vrios pro-
gramas que visam remover as barreiras que inibem ou bloqueiam essa
manifestao nos menos favorecidos.
Existem os processos cognitivos ligados aos processos
psicolgicos que envolvem o conhecer, compreender, perceber,
aprender, etc. Segundo o autor, eles estariam presentes nos vrios
estgios do processo criativo, j que a criatividade desenvolvida na
rea em que o indivduo est atuando, levando-o a apresentar
originalidade ao apresentar respostas incomuns e remotas.
Mas antes dessa apresentao h uma elaborao, e esta
dada a partir de esboos, e segundo o autor, esse aspecto pode ser
observado com intensidade nas produes dos artistas plsticos que,
aps vrios esboos que chegam a uma obra concluda. Para isso, o
artista deve ter conhecimento dos materiais e tcnicas; assim como os
bons escritores, estar alm da imaginao; um crtico, boas
habilidades avaliativas e assim por diante.
Gardner (1997) comenta que h uma necessidade essencial do
sujeito desenvolver habilidades tcnicas. Encontramos essa afirmao
tambm no livro de Dalto (1993), quando ela entrevista vrios
profissionais de diferentes reas de atuao quanto ao desenvolvimento
criativo. Na maioria das respostas houve a confirmao de que, para
um sujeito ser criativo, independentemente da rea, h a necessidade
da habilidade/conhecimento tcnico e de muito treino, repetio de
exerccios, de atividades.
E Alencar (1993) afirma que as escolas devem dar maior ateno
para a criatividade de seus alunos, porm, no h uma garantia de que
uma criana criativa venha a ser um adulto criativo. As escolas foram
criticadas em 1967 pelo fracasso em estmulos criatividade do aluno,
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condenaram presso, submisso, ao comodismo e ao hbito com-
pulsivo de trabalho, alm da repetitividade de exerccios que acabam
prejudicando o pensamento espontneo e intuitivo.
No processo criativo h tambm a preparao, fase em que o
criador pesquisa, anota, discute, explora, aponta os pontos positivos e
negativos, d-se como um investigador. Dessa forma, ignora-se a ideia
de que o artista plstico, escritor e outros produzem num momento de
inspirao ou de iluminao. Ele produz aps um intenso processo
operatrio, tendo esse processo a durao de semanas e at mesmo
anos. Quando nos dedicamos a desenvolver um tema, tanto para a escrita
quanto para a ilustrao, devemos passar o tempo todo questionando o
tema, mesmo j estando em processo de desenvolvimento.
J a iluminao, momento de grande importncia o instante
em que surge a ideia, a soluo para o problema. Esse processo ocorre
aps um intenso perodo de preparao, podendo surgir em momentos
intensos de alegria, levando o indivduo a trabalhar por longos perodos,
interrompendo no momento de esgotamento de ideias ou com a
exausto. Mas a iluminao pode tambm se manifestar no momento
em que o indivduo estiver totalmente desligado da procura da soluo
ou inspirao. Um exemplo clssico o de Einstein, que tinha as
suas melhores ideias enquanto se barbeava.
Para os estudiosos, de extrema importncia o abandono do
pensamento lgico, pois este bloqueia a criatividade, interrompendo a
formulao de ideias. Somente num segundo momento que deve ocorrer
a elaborao em que as ideias ficam sujeitas a uma avaliao lgica.
Ocorre muitas vezes das pessoas acordarem no meio da noite
com vrias ideias, bloqueando o passado e o futuro, vivendo somente
com o presente. Essa fase de inspirao da criatividade chamada de
integrao self. A criatividade , tambm, com um trabalho
sistemtico e conhecimento acumulado durante muitos anos, mas com
aceitao dos prprios impulsos.
Outro grande fator que influncia a criatividade o meio social do
indivduo, por exemplo: valores familiares, personalidade e caractersticas
cultivadas. Os fatores tanto intrapessoais quanto os interpessoais tm
importncia significativa no desenvolvimento criativo do indivduo, re-
fletindo na sociedade, pois, a criatividade no depende somente dos
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esforos do indivduo. De Masi (2005) afirma em seu livro que: [...]
depois de Cristo, a criatividade individual somente uma abstrao ou
um delrio de onipotncia. Neste campo, mais do que nunca, vlida a
frase de Thomas Merton: Nenhum homem uma ilha (p.47).
Para que o social possa ter um papel completo na evoluo da
criatividade, deve favorecer a criao por parte do indivduo, dando-
lhe chances para obter experincias em inmeras reas, evitando assim
a limitao de conhecimento.
Para que ocorra o desenvolvimento da criatividade, os estmulos
devem dar-se no lar, no convvio social e, posteriormente, nas escolas,
pois so necessrias condies adequadas para o desenvolvimento da
criatividade. Sabe-se que as manifestaes criativas so dadas em
pessoas que apresentam um conjunto de valores, atitudes, interesses,
motivaes e traos de personalidade, que proporcionam ao indivduo
um pensamento independente e flexvel e o uso da imaginao.
Em muitos casos, os estmulos na criana so bloqueados por
comportamentos rgidos dos pais. Eles favorecem a explorao da
criatividade quando estes tm um relacionamento no possessivo com
seus filhos, e cooperam tambm para a independncia, autoconfiana
e at mesmo para a inteligncia das crianas.
Experincias vividas nos primeiros anos na escola, tambm so
de fundamental importncia. A influncia do professor facilita a
formao de imagens positivas ou negativas de si mesmo pelo aluno.
O simples fato de um professor chamar o aluno pelo prprio nome,
cumpriment-lo, elogi-lo, propicia-lhe um sentimento de valor pessoal.
A seguir teremos alguns relatos de como ns professores
poderemos melhor orientar os nossos educandos quanto ao processo
de ampliao da capacidade de desenhar e criar, levando m conta
sobretudo os estudos de Maureen Cox (2001).
O desenho e a criana na escola: algumas possibilidades
Foi em torno de 1880, num dia chuvoso que Corrado Ricci, ao
buscar abrigo em uma viela coberta, percebeu na parede a presena
de alguns rabiscos que lhe chamaram a ateno. Viu alguns dese-
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nhos encantadores e um tanto desajeitados que qualquer pessoa reco-
nheceria como feitos por mo infantil (COX, 2001, p.02). A partir da,
Ricci se envolveu por inteiro nos estudos sobre o desenho infantil,
lanando sete anos depois seu livro A arte das Crianas Pequenas.
Figura 01: Acredita-se que o primeiro desenho tenha trs mil anos e o Tange-
Asno foi desenhado em 1829, por Emily Brote, aos 10 anos de idade.
Fonte: Cox, 2001
Antecedendo a esse acontecimento de Ricci, o ento filsofo e
educador Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) j considerava a
infncia distinta e importante quanto ao desenvolvimento do sujeito
em um processo evolutivo idade adulta (no mais como adultos em
miniatura). Elas passam a ser vistas como sujeitos nicos e que tm
sua maneira prpria de pensar e de resolver as situaes diferentemente
dos adultos.
Segundo Moreno (2005), a agilidade e a transitoriedade natural do
desenho em geral acompanhada pela flexibilidade e rapidez mental, que
integram a percepo e o pensamento. Existe a vontade de uma repre-
sentao como tambm existe uma necessidade de trazer tona desejos
interiores, comunicados, impulsos, emoes e sentimentos (p.50).
Quando solicitadas a desenharem algo na escola (principalmen-
te), onde o professor leva em considerao a importncia do desenho
para o desenvolvimento da criana, bem como o prprio entusiasmo,
utiliza desses fatores para a elaborao de atividades artsticas. A ni-
ca preocupao da criana quanto inteno de promover no adulto
a percepo da forma em si, o seu real significado, principalmente
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entre os oito anos de idade. Porm, embora se mostrem dispostos e
desinibidos em desenhar, as crianas se preocupam extremamente
com que os objetos de seus desenhos possam ser identificados (COX,
2001, p.04).
Figura 02: Passando a Roupa, de Amy, cinco anos e oito meses.
Fonte: Cox, 2001
J ao pedirmos para o adulto para realizar um desenho, a grande
maioria afirmar no saber, inclusive se esquivando, com certo embarao
e desleixo para como seu desenho. Embora no se possa esperar que
seus desenhos se equiparem aos dos grandes artistas, poderamos esperar,
pelo menos, certo grau de competncia e habilidade (p.5).
Cox (2001), assim como outros autores, afirma que as Artes
Plsticas so importantes meios para o desenvolvimento criativo das
crianas, mas muitas vezes o adulto acaba, atravs de algumas atitudes/
situaes, sufocando o processo criativo. A ideia de que o professor
possa mostrar a uma criana como desenhar algo ou ao menos
conversa sobre como algo poderia ser desenhado, descartado como
excessivamente direcionado pelos professores (p.7). Essa atitude,
muitas vezes, pode fazer com que a criana adote os esteretipos
fornecidos pelo professor.
Rabiscando
No momento em que a criana passa a explorar o desenho (pois
ela percebe que consegue produzir algo com o lpis), observa que
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realiza vrios tipos de traos, ampliando seu repertrio. Esse repert-
rio pode ser visto no quadro que apresenta onze componentes.
Segundo Hsuan-An (1997), o desenho tratado como uma lin-
guagem entre tantas outras nas Artes Visuais: Desenhar um pro-
cesso da ao criadora que se desenvolve mediante a percepo, re-
flexos intuitivos e intelectuais e controle do material (p.26).
Figura 03: Rhoda Kellogg de opinio que os rabiscos bsicos das crianas
evoluem para formas mais complexas que, por sua vez, transformam-se em figu-
ras humanas. A evidncia desse desenvolvimento no no entanto, muito forte.
Fonte: Cox, 2001
No quadro acima so demonstrados alguns processos evolutivos
do desenho infantil at chegar figura representativamente humana.
Porm, esses exemplos no so regras. A autora traz exemplos, em
que foi solicitado a algumas crianas para representarem a figura
humana e quase 40% das crianas de dois anos e 80% de trs produ-
ziram os desenhos sem passar pela sequncia vista anteriormente.
No uma regra, apenas uma possibilidade vir a ter essa sequncia
evolutiva dos traos.
Sem mesmo saber construir as formas em si, as crianas tm a
real noo do fazer desenhos. Elas adquirem tambm uma boa
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noo de como as formas devem ser dispostas na pgina: por exem-
plo, os olhos lado a lado e acima do nariz, e este, por sua vez, acima da
boca (COX, 2001, p.23). Ser que precisamos ficar insistindo com o
homem palito com as crianas? Claro que no, as crianas so muito
perceptivas at mais que os adultos. Temos como exemplo dessa
afirmao (apresentado pela autora Cox, 2001), uma experincia de
Bill Ives que solicitou as crianas de dois a trs anos que construssem,
com pedaos de feltro, rostos, e o resultado foi muito satisfatrio. A
grande maioria construiu com coerncia.
Figura 04: Robert, quatro anos e nove meses.
Fonte: Cox, 2001
Outra questo importante de se apontar a respeito da nomen-
clatura dada pelas crianas para os seus prprios desenhos. A autora
solicitou a sua filha Amy (dois anos e onze meses), que desenhasse
uma pessoa, porm, aps concluir seus rabiscos, a menina justificou
ser um tronco com vrias mas. Ocorre que, s vezes, as crianas
vo desenhando e posteriormente que passam a nomear seus rabis-
cos, como no exemplo trazido:
Em outra ocasio ficou surpresa e maravilhada com a forma
que acabara de desenhar (Amy): Olhe! um pssaro!
Disse ento Est faltando o olho, e acrescentou um ponto.
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Em seguida, Eles tm pernas, no tm Cinco pernas! Ten-
do desenhado a forma bsica de um pssaro ela foi capaz
de, intencionalmente, acrescentar-lhe suas outras partes
(p.24).
Figura 05: Um pssaro feito por Amy, aos dois anos e dez meses.
Fonte: Cox, 2001
Quanto aos objetos tridimensionais, isso outro fator que mere-
ce nossa ateno, pois o que oferecido s crianas so formas, e
no apenas linhas. Sendo assim, ela se questiona sobre como, atravs
das linhas, que a natureza no lhes proporciona, vai poder representar
atravs do desenho essas formas reais com o volume.
Para Arnheim (2000) [...] as crianas observam com uma
agudeza que faz os adultos ficarem envergonhados (p.155). H uma
dedicao muito maior por parte delas quanto ao desenho e apresentam
uma intensa concentrao na atividade, se forem comparadas com
pessoas mais velhas.
Durante o perodo de quatro a cinco anos, as crianas, ao
desenharem pessoas, j apresentam a relao aproximada entre parte
do corpo e nmeros de dedos, mas no de modo correto. Gardner
(1999) complementa: No final dessa faixa etria as crianas exi-
bem mapeamento digital ou numrico, no qual distncias especfi-
cas, propores e nmeros so dominados e retidos (p.138). Nesse
perodo, a criana desenha o que conhece em vez de o que v
(p.161).
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Figura 06: Alguns exemplos de representao das mos.
Fonte: Cox, 2001
Com o passar da idade a criana deixa de fazer apenas linhas
para realizar, ento, as reas/regies, como forma de representar a
volumetria. A linha usada individualmente (agora) apenas para
representar cabelos, cordes de sapato, clios, etc.
Figura 07: O pai de Samantha, cinco anos e dez meses. Auto retrato de
Andrew, cinco anos e onze meses.
Fonte: Cox, 2001
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Figura 08: Desenhos realizados por crianas de trs anos de idade.
Fonte: Cox, 2001
A maneira como a criana desenha pode ser a manifestao de
seu prprio estilo com um pouco de influncia de outras crianas, bem
como com muitas interferncias de formas, podendo propagar at
mesmo em uma sala inteira, tornando-se um estilo local ou, ainda,
regional. o que poderemos observar a partir das imagens seguintes:
Figura 09: Primeiro: auto-retrato de Amy, aos cinco anos e onze meses.
Mostra a construo arredondada da figura humana, comum entre crianas
ocidentais.
Segundo: Desenho de um homem, feito por um menino de Berdgdama, de
sete anos, no sudoeste da frica. Mostra a construo triangular da figura,
tpica da regio.
Fonte: Cox, 2001
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Figura 10: Este auto-retrato foi desenhado por um menino dos Iorubas, de
dez anos, na Nigria. O corpo retangular uma caracterstica dos desenhos
produzidos em muitos pases islmicos do Oriente Mdio e da frica.
Fonte: Cox, 2001
Figura 11: A primeira figura a representao de uma mulher, feita por um
menino indiano de seis anos. Todas as partes do corpo foram enfileiradas
ao longo da linha da figura. O segundo o desenho de uma mulher feito
por uma menina iraniana de sete anos. No h linha de limite englobando
os traos faciais da figura.
Fonte: Cox, 2001
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Figura 12: Estas foram desenhadas por crianas africanas de nove anos e
mostram um perfil misto. A cabea est de perfil; os traos faciais so
separados da cabea e mostrados com o rosto de frente.
Fonte: Cox, 2001
Como auxiliar a criana para desenhar:
- Estimular o contato com o desenho (pais x filhos);
- Levar a linha pra passear, tornar a atividade mais subjetiva;
- Oferecer lpis substituindo o giz de cera (esse proporciona
maiores detalhes);
- Question-la sobre o assunto focado instigar (assim iremos
ajudar/auxiliar a criana a esclarecer para si mesma, o que no sabe e
a enfrentar os problemas de representao);
- Enfrentar e derrotar a nossa prpria dificuldade em orientar
para o desenho. [...] o professor deve certificar-se de que tudo o que
ensinado serve para finalidades criativas (LARK-HOROVITZ,
apud COX, 2001, p.242-243), procurando realizar a crtica e desafios
de forma construtiva e interessante.
Atividades promovidas pelos professores, criativamente:
Tomamos como exemplo a atividade desenvolvida pela professora
Grant Cooke (1986). O intuito da sua atividade era promover algumas
convenes bsicas do desenho sem sacrificar o objetivo das crianas
quanto criatividade e autoexpresso.
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Fritando Ovo foi uma atividade onde a professora trouxe
sala de aula um fogo e fritou ovos com os alunos. Aps, os alunos
auxiliaram a professora, que desenhava no quadro, com dicas sobre
as formas vistas na composio. Posteriormente, cada aluno realizou
o seu prprio desenho, tendo registrado visualmente vrias possibilida-
des e formas da composio.
Figura 13: Desenhos sobre o tema fritando um ovo, feitos por crianas
de seis a sete anos de idade.
Fonte: Cox, 2001
Eu sou uma bicicleta mgica e posso ajudar voc, foi outra
atividade desenvolvida pela professora que Cox (2001) relata em seu
livro. Da mesma forma que Fritando Ovos, ela trouxe uma bicicleta
para a sala. Porm, ao conclurem o desenho no quadro juntamente com
a professora, foi solicitado a um dos alunos, que retirasse um papel que
estava dentro do cesto da bicicleta e que continha a seguinte frase: Eu
sou uma bicicleta mgica e posso ajudar voc!. Sendo assim, a
professora sugeriu que os alunos desenhassem uma aventura que pudesse
ser realizada a partir dessa bicicleta mgica. Podemos perceber que
pelo fato de elas terem participado ativamente com a professora durante
o processo do desenho, as crianas conseguiram captar muitos detalhes
da bicicleta e que muitas vezes passam despercebidos ao nosso olhar.
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Figura 14: Desenhos de uma bicicleta mgica, feitos por crianas de cinco
a seis anos.
Fonte: Cox, 2001
[...] a vantagem que o peso de saber como desenhar certo
objeto retirado e as crianas ficam livres para incorpor-lo em seu
trabalho expressivo e imaginativo (COX, 2001, p.248).
A nossa maior dificuldade, enquanto adultos, livrar-nos dos
esteretipos j pr-estabelecidos. H uma repulsa em relao ao novo.
Para que no venhamos a transformar os nossos educandos nesses
sujeitos menos elsticos devemos nos precaver, propondo atividades
interessantes e instigantes, em que eles venham a manter uma constante
em relao ao novo saber. Segundo Piaget (mas a citao de
Munari... seria Piaget apud Munari???), o perodo ideal para isso
so nos primeiros anos de vida do sujeito.
Sabemos que aquilo que uma criana de tenra idade memoriza
permanecer para a toda a sua vida. por isso que podemos
ajudar a criar indivduos com uma mentalidade elstica e
pronta a resolver todos os problemas que algum pode ter
na vida: desde encontrar um emprego at projetar sua pr-
pria casa ou educar os filhos. (MUNARI, 2002, p. 235-236).
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Munari (2002) nos sugere, entre tantas outras possibilidades para
o desenvolvimento da comunicao verbal e visual e comportamento
social, que as crianas at os trs anos de idade tenham contanto com
jogos e brinquedos adequados. Nessa idade, ela memoriza os frutos
das experincias sensoriais do ambiente que a rodeia. Seus receptores
sensoriais funcionam todos ao mesmo tempo, ou seja, ela tem uma
percepo global do ambiente em que vive (p.237).
nessa fase que tudo o que se faz e se aprende fica registrado
para a vida a adulta, podendo-se resgatar as informaes quando for
necessrio. Nos casos oportunos, sero estabelecidas relaes com o
que j sabe/observou, facilitando a sua compreenso. O autor ainda
afirma que, se ocorrer a memorizao desses fatos na infncia
corretamente, o sujeito tende a ser criativo e ter menos dificuldade
em resolver diferentes tipos de situaes.
O autor nos traz um exemplo bastante interessante. A construo
de um livro, onde o sujeito possa ver, a sentir e interagir, criando diferentes
possibilidades e situaes. O jogo ou brinquedo deve estimular a
imaginao, e no vir pronto ou acabado (como acontece com algumas
miniaturas perfeitas de automveis), pois isso limita a participao da
criana (MUNARI, 2002, p.242). Para o autor, o jogo/brinquedo ideal,
aquele que permite criana entend-lo sem muitas explicaes, e ir
descobrindo-o no momento em que comea a manuse-lo.
Ocorrem casos em que o prprio adulto, s vezes, ao manter
contato com esse jogo/brinquedo mais simples encontra mais difi-
culdade do que a prpria criana, pelo fato de ter excesso de cultura
armazenada, no assimilando, assim, a novidade que lhe apresen-
tada. Com isso, acaba por recusar a tarefa para evitar o constrangi-
mento e no se sentir inferiorizado perante os outros. Munari (2002)
at sugere que se desenvolvam atividades didticas com os prprios
adultos, para afastarem os preconceitos, pois ele acredita que uma
pessoa que j traz um bloqueio da infncia fica fossilizada e
irrecupervel.
E para complementar esse pensamento, o autor acrescenta:
Seria necessrio treinar e habituar os adultos a compreende-
rem as crianas. Um antigo provrbio chins diz que a nica
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constante no mundo a mudana. Se algum procura det-
la, detm-se a si mesmo e envelhece mal. At uma certa altu-
ra, os adultos deveriam ensinar as crianas, mas depois se-
ria melhor que aprendessem com elas a conhecer o mundo
o mundo real, no o mundo artificial dos negcios.
(MUNARI, 2002, p. 245).
Para podermos exigir que as crianas desenvolvam o desenho,
a sua criatividade, devemos nos libertar do mundo lgico que nos
circunda vinte quatro horas. Como vamos exigir das crianas que
desenvolvam algo novo e que em ns mesmos causa constrangimento
quando somos solicitados a faz-lo? Precisamos refletir mais sobre as
nossas prprias aes e possibilidades de propostas a serem trabalhadas
com os nossos educandos. Somos responsveis, em parte, pelo
desenvolvimento desses futuros profissionais e antes de tudo, sujeitos.
Notas
1
Formada em Artes Visuais (Bacharelado e Licenciatura) e Mestre em Educao pela
Universidade Federal de Santa Maria. Atuou como docente na UFSM, UNOESC (Xanxer,
Joaaba e So Miguel do Oeste) e atualmente na UNOCHAPECO, nos cursos de Artes
Visuais e Arquitetura. moremar@unochapeco.edu.br
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Revista Pedaggica - UNOCHAPEC - Ano 10 - n. 21 - jul./dez. 2008
O DESENHO: UM PROCESSO DE ENSINO, APRENDIZAGEM E
DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO CRIATIVO
The drawing: a education process, learning and creative process development
Abstract: This research aims at to justify the importance of the drawing as
language for the evelopment of the citizens creative process, also reflecting,
this magnifying of the creativity, in the grown ups. By this way, in elapsing of
the text, some situations/possibilities, brought for some authors as well as of
my own trajectory are presented as professor.
Keywords: creativity, crawing; educat.
Recebido em abr. de 2008
Aceito em jul. de 2008