Cinema Brasileiro em Portugal
Cinema Brasileiro em Portugal
Cinema Brasileiro em Portugal
Resumo
NDICE
INTRODUO ...................................................................................................................7
PARTE 1 - A crtica de cinema na imprensa como objeto histrico e retrico ..............13
A Esttica da Recepo.......................................................................................15
Retrica, crtica e comunicao .........................................................................45
A Retrica da crtica de cinema .........................................................................59
Consideraes finais: por um horizonte interdisciplinar..................................87
PARTE 2 - A crtica de cinema situada: cenrios e relaes histricas .........................92
A crtica no contexto ...........................................................................................93
Um perfil das publicaes portuguesas ...........................................................111
Um cenrio acolhedor aos filmes brasileiros ..................................................124
Mudana de cenrio .........................................................................................153
Alguns dados quantitativos...............................................................................168
PARTE 3 - As marcas nos discursos da crtica de cinema ............................................184
Delimitao do corpus ......................................................................................185
As marcas na crtica .........................................................................................196
Marcas retricas ...............................................................................................199
Marcas de contexto...........................................................................................249
Resultados das anlises ....................................................................................274
Os condicionalismos da crtica sobre o leitor ..................................................282
CONCLUSO .................................................................................................................286
Dois paradigmas invariveis ............................................................................286
FILMOGRAFIA .............................................................................................................291
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................293
ndice de Tabelas
ndice de Figuras
INTRODUO
Ver mais sobre este tema em: MARTINS, Maria Helena (org), Rumos da Crtica, So Paulo,
Editora SENAC, 1999. Sintomaticamente, as palavras crtica e crise possuem a mesma
etimologia que significa conflito, disputa; separao, deciso; juzo, sentena.
2
o que Gustavo Rubim (1999) questiona na posio de alguns autores modernos em Juzos
da Crtica. Na referncia est implcita a crtica a uma viso estruturalista que v a arte pela
arte.
Ver mais sobre este tema no texto de Srgio Luiz Gadini (2004) Tematizao e agendamento
cultural nas pginas dos dirios portugueses.
Hans Robert Jauss, crtico literrio alemo, um dos fundadores da esttica da recepo. Esta
corrente nascida em finais da dcada de 60 na Alemanha preconizava uma reestruturao do
pensamento literrio e criticava o plo imanentista das anlises textuais, at ento vigentes nos
estudos literrios, deslocando para o leitor o foco de ateno das anlises. Suas maiores obras
so: A histria literria como desafio cincia literria (1970), Pequena apologia da experincia
esttica (1972), Experincia esttica e hermenutica literria (1977).
A Esttica da Recepo
Maria Tereza Cruz prefere usar a expresso paradigma interacionista em relao esttica da
recepo. Diz a autora: Falar em paradigma comunicacional pode incorrer no perigo de evocar,
autnomas e evidentes, as categorias que constam de um modelo ortodoxo da comunicao,
enquanto que falar da interaco nos parece implicar mais, tanto o texto como o sujeito, num
processo que pe precisamente em causa a autonomia de ambos. (1986, p. 62).
6
Sobre este debate entre os tericos alemes ver tambm em: GOMES, Regina. O cinema como
experincia catrtica. In VALVERDE, Monclar., org. As formas do sentido. Rio de Janeiro : DP&A
editora, 2003. p. 46-66.
Refira-se que Adorno se dedicou mais inteiramente ao estudo da msica, deixando s outras
artes um papel secundrio. No caso do cinema, sua maior contribuio foi o livro Composing for
the films, escrito em co-autoria com Hans Eisler em 1947. Vale salientar tambm que ao
destacarmos a Escola de Frankfurt no inserimos o nome de Walter Benjamin nesta viso. Para
Benjamim (1992) como se sabe, esta distrao da experincia cinematogrfica no implicava
passividade no espectador, em vez disso esta experincia poderia ser um processo de
emancipao coletivo.
11
Todavia, como bem lembrou Eduardo Prado Coelho (1987, p. 166-169), Costa Lima parece ter
tomado uma posio, de certo modo anacrnica com a arte ao tentar posteriormente numa obra
de sua autoria, defender um rompimento entre a experincia esttica e a prtica crtica. Ao
conceber o juzo como poder nico e exclusivo dado s obras de arte pela crtica, Costa Lima
desqualifica a experincia esttica como um campo particular e parece esquecer os conceitos de
fruio compreensiva e compreenso fruidora, base da esttica da recepo de Jauss, ou,
como nos afirma Prado Coelho (1987, p. 166), trata-se de impor o poder da crtica contra a
subverso da esttica.
13
Ainda segundo Maria Tereza Cruz (1991, p. 58), Se a experincia esttica dever procurar
ainda hoje a sua especificidade, enquanto modo fundamental de acesso experincia de ns e
do mundo, no dever contudo faz-lo como utopia negativa ou figura gmea da perda de
experincia.
demarcar o alcance das pesquisas de Jauss e do seu colega Wolfgang Iser, cuja
investigao se ocupa mais dos efeitos da obra no leitor, enquanto que as
pesquisas de Jauss voltam-se mais para a recepo da obra no seu horizonte de
tempo 14.
O processo de interpretao de um texto implica no somente a interao
de leis internas e externas ao texto, como tambm o contexto de experincia
anterior no qual a percepo esttica se inscreve. Isso pressupe dizer que uma
obra no se revela como pura originalidade, pois ela fruto de um contexto
histrico, da tradio, e seu pblico, no isolado deste processo, j estaria
predisposto a um certo modo de recepo.
No possvel, portanto, desvincular a obra de suas condicionantes
histricas. Cada texto s poder ser entendido dentro de suas condies
histrico-sociais de leitura, de acordo com as quais dever ser recebido e
julgado pelo leitor, segundo a sua experincia de vida e de leituras acumuladas.
O modo pelo qual o leitor recebe o texto e constri o seu sentido funo de seu
lugar na sociedade.
O horizonte de expectativas demarca, assim, a compreenso da obra em
seu tempo e tarefa do intrprete a sua reconstituio. Regina Zilberman lembra
que por meio da noo de reconstruo do horizonte de expectativas que
Jauss esperava resolver o problema aludido quando da crtica s histrias da
literatura: estas eram unilaterais, porque ou examinavam as relaes das obras
com a poca, no dando conta de sua natureza artstica; ou centravam-se nesta,
esquecendo-se de confront-la a seu contexto histrico e social (1989, p. 34).
Esta reconstruo do horizonte possibilita chegar s perguntas a que o
texto respondeu, implicando na descoberta de como o leitor pode perceber e
14
Conforme expe Luiz Costa Lima (1979, p. 25): Ao passo que Jauss est interessado na
recepo da obra, na maneira como ela (ou deveria ser) recebida, Iser concentra-se no efeito
(wirkung) que causa, o que vale dizer, na ponte que se estabelece entre um texto possuidor de
tais propriedades o texto literrio, com sua nfase nos vazios, dotado pois de um horizonte
aberto e o leitor.
4. Crticas e polmicas
Pelo seu carter original e provocativo, a esttica da recepo no se viu
margem de crticas e polmicas. Estas vislumbram discutir questes, entre
outras, como o conceito de leitor, a noo de texto literrio e a problemtica da
objetivao do horizonte de expectativas. Dentre esses crticos citamos o nome
de Luiz Costa Lima, Susan Suleiman, Hans Ulrich Gumbrecht e Robert Holub. O
primeiro argumenta que lgica da pergunta e da resposta no supe a
participao do leitor concreto j que, para ele, Jauss trabalha exclusivamente
com a noo de leitor ideal (Lima, 1979, p. 9-36). Robert Holub, por sua vez,
questiona a possibilidade de objetivao do horizonte de expectativas: Apesar
dos seus esforos para se subtrair a um paradigma positivista-historicista, Jauss,
ao adotar a objetividade como um princpio metodolgico parece cair nos
mesmos erros que critica (apud Cascais, 1985, p. 83).
Embora se reconhea o carter enriquecedor, que dinamiza qualquer
cincia, proporcionado pelo debate livre e crtico, concordamos com Regina
Zilberman (1989, p. 106), que observa nestas crticas o predomnio da
perspectiva histrica e/ou sociolgica sobre a esttica no contexto da
determinao da recepo. O foco na experincia esttica, o prazer que tal
experincia proporciona e sua defesa apaixonada da arte em contradito as
estticas da negatividade, reafirmam o debate sobre a historicidade da arte e
sobre a ateno voltada recepo das obras. E mesmo alertando para uma
Banalizao esta reconhecida pelo prprio Jauss (1994, p. 75-76) quando se refere ao fato de
o conceito horizonte de expectativa ter sido acolhido pelo uso comum da lngua, chegando at a
reportagem futebolstica: o horizonte de expectativa dos torcedores era grande. Traduo da
entrevista de Jauss ao jornal alemo Frankfurter Allgemeine, Agosto de 1987.
importante fazer referncia aos trabalhos de: STAIGER, Janet. Interpreting films: studies in
the historical reception of american cinema. Princeton: Princeton University Press, 1992.
BORDWELL, David.; THOMPSON ; Kristin ; STAIGER, Janet. The classical Hollywood cinema:
film style & mode of production to 1960. New York : Columbia University Press, 1985.
BORDWELL, David. Making meaning: inference and rhetoric in the interpretation o cinema. USA :
Harvard University Press, 1991. ANDREW, Dudley. Film in the aura of art. Princeton: Princeton
University Press, 1984. KLINGER, Barbara. Melodrama and meaning: history, culture and the
films of Douglas Sirk. Bloomington: Indiana University Press, 1994.
O ps-estruturalismo no cinema teve suas origens ligadas especialmente na Frana, nos anos
60/70, s obras de filsofos como Jacques Derrida, Gilles Deleuze, Michel Foucault, Felix
Guattari e Jean Baudrillard, entre outros. Ferno Ramos (1998, p. 33-56) diz que a maneira
quase barroca de desenvolver as proposies dos ps-estruturalistas franceses entrava em
choque com as anlises precisas e objetivas da filosofia analtica, desenvolvidas sobretudo nos
pases de lngua inglesa.
Janet Staiger mais recentemente amplia a discusso sobre a recepo histrica dos filmes ao
lanar: Perverse spectators: the practices of film reception. New York : New York University
Press, 2000.
19Vale
tambm citar o excelente trabalho de Dudley Andrew: The mayor film theories, traduzido
para o portugus em 1989, por Jorge Zahar Editor.
20
BENNETT, Tony. Texts, readers and reading formations. London : Literature and History, 1983,
p. 214-227. O autor diz que o que a histria do discurso mostra a variao de significados que
pode ser dada a um texto, dependendo das diferentes circunstncias histricas. Bennett prope
uma interao entre o texto culturalmente ativado e o leitor culturalmente ativado. Um dilogo
estruturado pela teia material, social e ideolgica dentro da qual tantos textos quanto leitores
esto inevitavelmente inscritos.
Para Barthes (1978, p. 72-75), o crtico no pode, de todo, substituir-se ao leitor uma vez que
ele produz seu discurso mediado pela escrita: a escrita declara e nisso se constitui como
escrita, diz Barthes, para quem esta seria a separao entre a leitura e a crtica. E conclui:
Passar da leitura crtica mudar de desejo, deixar de desejar a obra para desejar a prpria
linguagem.
ser vista como um elemento do alcance histrico dos filmes e, desta forma,
refletiremos sobre como os filmes brasileiros foram recebidos em Portugal neste
perodo.
Por outro lado, naturalmente que a crtica de cinema tambm vista como
um objeto esttico, um produto simblico e at mesmo como uma construo
potica que evoca efeitos em seus destinatrios e enquanto tal, torna-se objeto
de investigao a ser explorado. O estudo dos princpios conceituais da retrica
(que abordaremos com mais ateno em outro ponto de nossa pesquisa) definir
este pathos compreendido e sentido pelos leitores das crticas.
importante deixar claro, desde j, que pensamos nestes dois
movimentos como no excludentes: pelo contrrio, h complementaridade entre
eles. Os textos crticos por si s sero tomados como objetos estticos e como
luz para entender o dilogo entre o presente e o passado da recepo de filmes
brasileiros em Portugal.
A propsito deste intercmbio, Maria Tereza Cruz ressalta que a esttica
da recepo , ao mesmo tempo, uma potica da recepo, pois o crtico
revela-se, simultaneamente, como um apreciador esttico (ou um pedagogo do
prazer esttico nas palavras de Jacques Aumont), assumindo a seu papel de
receptor da obra, e como produtor artstico, ao ser intrprete e reinventar a obra
e at mesmo, recri-la poeticamente. A crtica uma atividade que se impe
como prosseguimento natural da atividade criadora. Com efeito, no podemos
separar produo de recepo nem desqualificar a partilha, o dilogo que se
estabelece entre esta duas atividades produtivas da experincia esttica. Ser
dada, por conseguinte, uma ateno especial aos mtodos de pensamento e
escritura dos crticos portugueses, criando-se uma espcie de potica histrica
das crticas a fim de saber que mecanismos de contexto produzem as
contradies que definem estes discursos.
Importa, tal como acentuou a esttica da recepo, o exame de
Perelman (1993, p. 173) procura reforar seu empenho em reabilitar a retrica apontando o
interesse despertado, hoje, por esta, em quase todos os campos que remetem ao discurso.
Estamos nos referindo, por exemplo, a Phillipe Breton para quem, Barthes via no livro I da
Retrica de Aristteles o livro do emissor, no livro III o livro da prpria mensagem e no livro
II o livro do receptor da mensagem (2001, p. 36).
Escreve Rui Alexandre Grcio (1993, p. 14): O trao maior da chamada Escola de Bruxelas
reside, sem dvida, na convergncia do movimento crtico que, no pensamento dos seus trs
mais destacados representantes Eugne Duprel, Chaim Perelman e Michel Meyer -,
encontramos relativamente ao racionalismo clssico.
racional da modernidade.
Por outro lado, como acentua Michel Meyer: Hoje, o fim das grandes
explicaes monolticas, das ideologias e, mais profundamente, da racionalidade
cartesiana estribada num tema livre, absoluto e instaurador da realidade, e
mesmo de todo real, assinala o fim de uma certa concepo do logos. Este j
no tem fundamento indiscutvel, o que deixou o pensamento entregue a um
cepticismo moderno, conhecido pelo nome de niilismo. (...) e entre o tudo
permitido e a racionalidade lgica e a prpria racionalidade, surgiu a Nova
Retrica e, de um modo geral, toda a obra de Perelman (1996, p. XX).
Tendo como seu interlocutor polmico Descartes, assim como Jauss teve
o seu em Adorno, o filsofo de Bruxelas questiona a posio positivista que, ao
limitar o papel da lgica, do mtodo cientfico resoluo de problemas de fundo
meramente terico, abandona a soluo dos problemas humanos emoo. Um
juzo de valor ser sempre um tema por demais controvertido, fora, portanto, da
lgica cartesiana de demonstrao emprica dos fatos. A conseqncia deste
tipo de inferncia a desqualificao do mtodo que regula os raciocnios
persuasivos que Perelman buscava defender.
bom lembrar que esta atitude de questionamento lgica formal no
retira a retrica uma racionalidade argumentativa, antes pode ser visto como
uma nova forma de conceber a razo. Mais uma vez as palavras de Michel
Meyer (1996, p. XX) vm em nosso auxlio: A retrica esse espao de razo,
onde a renncia ao fundamento, tal como o concebeu a tradio, no se
identificar forosamente a desrazo.
a esta racionalidade argumentativa promovida pela Nova Retrica de
Perelman que Rui Alexandre Grcio dedica sua obra com o mesmo nome. O
autor esclarece que Perelman prope a tematizao de uma nova racionalidade
intrinsecamente pluralista (1993, p. 14). Para Grcio, o privilgio dado ao
raciocnio prtico - aquele que envolve valores e que no se pode dissociar de
Segundo Rui Grcio (1993, p. 11) esta estratgia de identificao entre os dois termos de
Perelman aceitvel em termos. Para o autor seria necessrio uma distino entre retrica e
argumentao, baseado no seguinte critrio: identificar o termo argumentao com o termo
retrica sempre que se trate de discurso, escrito ou falado. Desta forma, sempre que se escreve
ou fala, tambm se argumenta e se faz retrica. Distinguir argumentao e retrica quando a
aco comunicativa exercida sobre ns no depende exclusivamente do discurso: desta forma,
h uma retrica das imagens, (...) uma retrica da moda, etc. Ns, neste presente estudo,
concordamos com Perelman e utilizamos os dois termos como partilhados.
Discusso, cumpre ressaltar, que vem desde Aristteles, quando este defende que s se
argumenta a partir de opinies pr-estabelecidas.
outros. Certos argumentos podem pertencer a vrios esquemas sem que haja
uma relao de excluso entre eles. Alm disso, os argumentos devem ser
sempre contextualizados, inseridos na realidade histrica que os cerca.
O segundo aspecto remete utilizao dessas tcnicas argumentativas.
Perelman, em sua obra, no buscou fazer um manual orientado para aqueles
que procuravam instrues mecnicas sobre como construir um discurso
argumentativo de sucesso. Antes, props discutir sobre os recursos discursivos
para obter o assentimento do auditrio e, sobretudo, pensar a argumentao
como um campo de debates sobre a questo da formao das idias e sua
circulao.
Por fim, o terceiro aspecto trata da recepo desses argumentos.
Perelman chama a ateno de que este modelo, tal como outros nas cincias
sociais, implicam riscos de interpretaes truncadas, especialmente no discurso
oral, j que os textos persuasivos escritos, em geral, tm a vantagem de
apresentar os argumentos de forma mais simplificada ou estilizada sendo,
portanto, mais fcil o reconhecimento desses procedimentos retricos. Por outro
lado, e dialeticamente, valorizando estes procedimentos retricos
argumentativos que se conseguir perceber os efeitos prticos da
argumentao.
Perelman (1993, p. 24) assume que sua Nova Retrica prolonga e amplifica a obra de
Aristteles, que nos Tpicos opunha retrica e dialtica. Ao dizer que uma nova retrica (ou uma
nova dialtica) trata dos discursos dirigidos a todas as espcies de auditrios, Perelman no faz
a distino entre argumentos dirigidos a um nico interlocutor (dialtica) e aqueles direcionados a
vrios interlocutores (retrica), como considerava Aristteles. Entretanto, foi a distino entre
raciocnios dialticos (que incidem sobre a opinio, doxa) e raciocnios analticos (que incidem
sobre a verdade) que Perelman herdou de Aristteles.
Segundo Perelman (1993, p. 161) trs ordens dos argumentos foram preconizadas pela
retrica clssica: a ordem da fora crescente, a ordem da fora decrescente e a ordem
nestoriana, em que se comea e acaba com os argumentos mais fortes, deixando os restantes
no meio.
29
Bordwell (1991) relata que estas macroinstituies possuem, cada uma delas, suas
subinstituies caractersticas, ambas formais e informais. As instituies formais seriam as
universidades, os institutos, as publicaes de referncia, galerias, museus, conferncias e
congressos (nos anos 40, a Columbia University, nos anos 60, o British Film Institute, os Cahiers
du Cinema, a Screen, etc). As informais so chamadas de universidades invisveis e formadas
por redes de conhecidos, mentores e discpulos, enfim, grupos de participantes que
compartilham uma mesma teoria ou mtodo.
de sua atividade discursiva. Enfim, o crtico pode ser um analista, mas o analista
no pode ser um crtico. este limite que define as funes de cada um.
Michel Marie, em entrevista a Ferno Ramos (2003), demarca esta
diferena: A crtica de filme em geral feita na imprensa diria, semanal ou
mensal, incidindo sobre filmes que esto sendo lanados. A anlise flmica no
sofre essa restrio, no incide sobre a lgica do mercado e da realizao do
valor do filme em seu lanamento. A crtica deve fornecer ao espectador um
julgamento, que o incite a escolher, ou no, o filme para ver. Ela deve ser
bastante sinttica. Em princpio, a anlise no prope julgamentos de valor. Ela
decompe os elementos de significao, enriquecendo a leitura do filme, ao
fazer aparecer significados pouco evidentes.
Historicamente esta diferenciao aparece no momento em que as
anlises textuais recusavam o aporte valorativo da crtica de cinema tradicional
em favor de uma nova terminologia bebida na fonte da lingstica estrutural, da
narratologia, da psicanlise e sobretudo na diretriz conceitual de Christian Metz
de Linguagem e cinema em 1971. Robert Stam (2003, p. 212) esclarece que, ao
contrrio da crtica jornalista, os analistas citavam seus pressupostos tericos e
intertextos crticos (muitas anlises iniciavam-se com invocaes quaseritualsticas de nomes como Metz, Barthes, Kristeva ou Heath).
Tal distino, entretanto, no parece ser compartilhada por David Bordwell
(1991) ao colocar analistas e produtores de resenhas crticas sob a mesma
tutela, isto , a de produo de discursos cognitivos e com justificaes retricas.
De acordo com Bordwell, no to relevante a aplicao do valor de julgamento
dado aos crticos como um fator de diferenciao das prticas discursivas.
Sobretudo hoje, quando a opinio valorativa est cada vez mais generalizada e
qualquer comentarista poder ser considerado como um crtico de cinema.
Segundo Bordwell, os crticos, sejam eles acadmicos ou jornalistas, so todos
rhetorical creatures.
31
O autor recorre a Roland Barthes a fim de guiar sua assertiva de que a crtica como
interpretao faz significar o filme. (Cunha, 1996, p. 193).
32
exatamente o que David Bordwell faz em relao crtica de cinema em seu trabalho j
citado Making Meaning: inference and rhetoric in the interpretation of cinema. USA : Harvard
University Press, 1991.
33
Srie de textos organizados por Stefan Collini. Os autores so Umberto Eco, Richard Rorty,
Jonathan Culler e Christine Brooke-Rose. COLLINI, Stefan, org., Interpretao e
sobreinterpretao. Lisboa : Presena, 1993.
leitura que pem elementos em relao. Ou, por outras palavras, procura-se
reduzir o arbitrrio entre os componentes de um filme. No h crtica que no
tenha este projeto: a reduo mxima de um arbitrrio. Mas persegu-lo no leva
iluso de se vir a saber tudo. Bem pelo contrrio, trata-se de circunscrever com
rigor os lugares do no saber.
35
exame terico dado a qualquer interpretao, que por sua vez no busca
estabelecer verdades, procura sim, reivindicar que a verdade que defende
plausvel. Por outras palavras, h uma forte relao entre retrica e
hermenutica, relao estabelecida por um desejo de origem pelo processo de
compreenso da linguagem.
Vale tambm referir o papel interdisciplinar da retrica e da hermenutica,
reconhecido por Manuel Alexandre Jnior ao afirmar que estes dois campos do
saber esto intrinsecamente ligados essncia da prxis humana produzir ou
criar, e interpretar, manipular ou domesticar o que se criou. De fato, todo o
discurso tem, no princpio como no fim, uma fase hermenutica implcita: a
intelectio (compreenso do que se pretende dizer) e a hermeneia (compreenso
do que se disse) (1998, p. 9). Por outras palavras, impossvel interpretar sem
fazer perguntas.
Esta discusso est diretamente ligada ao tipo de conhecimento que
ambos os campos produzem. Apesar de Bordwell (1991, p. 250) admitir que o
discurso da crtica de cinema tem se afastado de uma atividade verdadeiramente
interpretativa, aproximando-se mais de uma prxis, um ofcio como o de um
carpinteiro, o autor no nega que estas disciplinas (retrica e hermenutica)
esto muito mais prximas daquilo a que chamou de conhecimento
procedimental pautado pela verossimilhana e afastam-se do conhecimento
proposicional que busca estabelecer a verdade.
Em Crtica e verdade, Barthes (1978, p. 14) defendeu a existncia de um
verossmil crtico e acrescenta: O verossmil no corresponde
necessariamente ao que foi dito (pois no pertence histria) nem ao que deve
ser (pois no pertence cincia), mas simplesmente quilo que o pblico julga
possvel e que pode ser totalmente diferente do real histrico ou do possvel
cientfico.
Barthes (1971, p. 38-43) retoma este tema posteriormente quando parte
do gnero. Por outro lado, se esta cena fosse concebida num pas como a ndia
onde existe uma cinematografia popular feita com parcos recursos financeiros e
tcnicos, certamente a leitura do crtico seria mais elogiosa.
Nesse sentido, o trabalho do crtico revela-se mais desafiante quando
exposto aos chamados filmes de vanguarda. Convm, a propsito, considerar a
digresso do crtico e terico de cinema Jean-Claude Bernadet (1985, p. 39-42),
que sai em defesa de uma crtica ficcional, particularmente daqueles filmes que
produzem uma ruptura, que apontam para uma renovao da linguagem
cinematogrfica. Segundo Bernadet, h uma inadequao do discurso crtico a
estes filmes e uma defasagem metodolgica nestas anlises. Sobretudo porque,
sendo filmes inovadores, os crticos assumem riscos juntamente com o cineasta
e falam ao mesmo tempo de dentro e fora do projeto. Desse modo, os escritos
dos crticos assumiriam um projeto mais experimental, inventivo e, ao limite,
produzir-se-ia uma crtica ficcional.
Em Ensaio sobre a anlise flmica, Francis Vanoye (1994, p. 14-19) nota
que, numa primeira fase, o analista (e nesse caso tambm o crtico) deve
decompor o filme em seus elementos constitutivos, descontru-lo em camadas
de sentido que esto conectadas ao todo flmico. Na fase posterior a anlise
faria o movimento contrrio, isto , uma atividade de reconstruo, de
estabelecer elos entre os elementos isolados, compreender como eles se
associam e se tornam cmplices para fazer surgir o todo significante. O crtico
analista, portanto, passa de uma instncia descritivo-argumentativa para uma
interpretativa, at chegar a compor um juzo sobre o filme. Para isso ele deve
postular que elementos da linguagem cinematogrfica (montagem, roteiro,
interpretao, etc) devem ter um valor muito mais indicativo e, deste modo, mais
baseados num conhecimento procedimental do que definidos como normas
invariveis que podem ser utilizadas em qualquer argumentao crtica,
independentemente do contexto em que esta se insere.
No texto Mediao, persuaso e tcnica, Tito Cardoso e Cunha (1999) j nos chamava
ateno a respeito quando sugere uma espcie de estilhaamento, hoje, da prpria noo de
auditrio com o aparecimento das novas tecnologias e da consequente multilateralidade dos
processos comunicacionais.
Por exemplo, os crticos brasileiros dos jornais O Dia e Folha de So Paulo, respectivamente,
Nelson Hoineff e Incio Arajo, em entrevista publicada no site na revista de cinema eletrnica
Contracampo n 24 http://www.contracampo.he.com.br. o que pensa tambm o crtico, exibidor
e produtor espanhol Enrique Gonzlez Macho: H determinado tipo de cinema em que a crtica
tem pouca ou nenhuma influncia, um cinema, por assim dizer, mais comercial. H outro tipo em
que a crtica no s tem importncia como fundamental, dentro deste cinema inclui-se o
cinema estrangeiro, o cinema de autor e o cinema espanhol. In Academia: revista del cine
espanhol. Madrid : no 22 (Abril de 1998) 28.
O jornal americano USA Today publicou o resultado de um recente estudo que fez sobre a
relao significativa entre as arrecadaes das bilheterias e as crticas da imprensa. Segundo a
publicao, apesar de no ser possvel estabelecer uma relao de causa e efeito entre as
resenhas e os lucros, no se trata de uma mera coincidncia o fato de os filmes mais elogiados
terem sido tambm os de maior bilheteria. A pesquisa foi feita com 140 grandes lanamentos de
filmes no ano de 2003 (isto , em cartaz em pelo menos 600 salas) e numa escala de 0 a 4
estrelas, cada meia estrela equivale a mais US$ 26,5 milhes nos lucros. Curiosamente, os
resultados ainda revelaram que somente os filmes do gnero comdia e terror no se deixam
influenciar pelas crticas, tendo sempre bons resultados. In: WLOSZCZYNA, Susan., DE
BARROS, Anthony, Movie critics, fans follow surprisingly similar script; Reviewers and filmgoers
go hand in hand when it comes to picking box office hits. USA Today (Feb 25, 2004) A01.
processos comunicativos. Dito de outro modo, para alm do texto e dos recursos
a inscritos, deve-se considerar os interlocutores envoltos neste ambiente
comunicacional.
A interpretao de uma obra est ligada aos traos do contexto em que se
opera e ao espao onde mensagem e sujeitos interagem. A inscrio concreta
desses discursos crticos acaba por dar sinais sobre a poca, sobre o produtor
destes discursos e sobre o leitor nela inserido. Esta sinalizao, inscrita na
prpria obra e simultaneamente fora dela, dever ser reconhecida - usando a
expresso no sentido de Paul Ricoeur, ou seja, de distinguir a permanncia de
uma identidade no universo desta pesquisa. Identificadas as marcas formais
desses discursos, pensa-se na sua apropriao pelo pblico-leitor que exige no
mnimo uma certa coerncia interna, uma consistncia de significado que se
constituir em valor lgico argumentativo. No entanto, a relao entre o discurso
concreto e a realidade exterior tambm fundamental para a compreenso - no
sentido hermenutico do termo, de envolvimento e alcance a fim de fornecer
sentido deste mesmo discurso j constitudo de suas marcas formais.
Desde seu clssico ensaio sobre a obra de arte, Walter Benjamin (1992)
alerta para os condicionantes histricos envolvidos na relao entre cinema e
sociedade. As transformaes scio-histricas, sem dvida, provocam mudanas
no modo de recepo das obras. As resenhas crticas portuguesas, tambm
representantes desta recepo, sofrem influncias de seu tempo (e exercem
influncias sobre ele), influncias visveis nos enunciados dos discursos da
crtica ou mesmo, visveis naquilo que ela deixou de enunciar.
As teorias do cinema hoje acordaram para a necessidade de um olhar
mais atento recepo histrica dos filmes. Certamente um olhar que adota
mltiplos instrumentos mas que no tem pretenso de encontrar um meio nico
e definitivo. Citando Casetti (1994, p. 322), este olhar deve ter um aporte de
histria-problema e sobretudo, uma histria que sabe que o sentido dos fatos
A crtica no contexto
93
39
Segundo Diderot, um juiz das artes deve ter: um grande amor a arte, um esprito fino e
penetrante, um raciocnio slido, uma alma cheia de sensibilidade e uma equidade
rigorosa. (apud Ribeiro, 1997, p. 71).
94
1. Crtica de cinema
A histria da crtica cinematogrfica finca razes em nomes como Louis
Delluc, Riccioto Canudo, Siegfried Kracauer, Jean Epstein, Otis Ferguson ou
Grahan Greene, que durante o incio do sculo passado escreviam para jornais e
outras publicaes, algumas especialmente endereadas aos cinfilos. Neste
perodo, estes escritos crticos buscavam, sobretudo, definir o cinema como arte
e como linguagem visto que o prprio ainda comeava a dar seus passos iniciais
em direo a um sistema de expresso especfico da rea flmica (Bordwell,
1991, p. 21).
A novidade do cinema como arte ainda mal definida acabou por
ironicamente afastar deste primeiro cinema os tiques de interpretao, como
assinalou Susan Sontag (2004, p. 29-30), prprios de outras reas artsticas. Os
filmes eram vistos exclusivamente como mero entretenimento, espetculos da
cultura de massa em oposio alta cultura e, uma vez assim, desprezados
pelos intelectuais. O lado ruim disso, diramos, foi a carncia de registros
escritos de anlises mais apuradas sobre os primeiros filmes, ficando no campo
meramente da descrio do evento.
Posteriormente, quando o cinema ganhou certo respeito no campo das
artes, a atividade da crtica de filmes e a prpria teoria do cinema se viram
vinculadas aos sistemas referenciais interpretativos das disciplinas humansticas
sobretudo da literatura. Com efeito, em meados do sculo XX os mltiplos
enfoques dados aos estudos literrios foram tambm transferidos para a crtica
de cinema e, diga-se, no somente para a chamada crtica acadmica como
tambm para a crtica comum de filmes, naturalmente parte deste horizonte
histrico. Esta pluralidade de enfoques passava pelos estudos dos mitos, das
abordagens psicanalticas, marxistas ou estruturalistas que converteu o filme
num texto pronto para ser dissecado.
Aps a Segunda Guerra Mundial, h uma multiplicao de revistas de
cinema, especialmente na Frana (Cahiers du Cinma, Positif e Cinthique) na
Inglaterra, (Screen, Sequence, Sight and Sound, Movie) e nos Estados Unidos
95
40
Em entrevista a DVILA, Antnio. A trajetria dos Cahiers du Cinma. Revista Filme Cultura.
Rio de Janeiro : Embrafilme, n. 45 (Maro de 1985).
41
Nas palavras de Joo Mrio Grilo (1999, p. 229), os componentes da Nouvelle Vague tinham
uma ntida vontade de compreender o cinema na sua materialidade significante e no seu modo
de fazer. E conforme Michel Marie (1999, p. 66), um dos primeiros critrios de pertena ao
movimento a experincia da crtica. Vale salientar os nomes de Andr Bazin, Claude Chabrol,
Jean Luc Godard, Eric Rohmer e Franois Truffaut, crticos-realizadores que fizeram parte do
movimento da Nouvelle Vague, a exceo de Andr Bazin que permaneceu essencialmente
como crtico e terico do cinema.
96
42
Alm de Ferguson, nomes como o de James Agee, Andrew Sarris e Pauline Kael nos EUA,
figuram como grandes nomes da boa crtica de cinema. Esta ltima, crtica do The New Yorker
desde meados dos anos 60, tinha um estilo pessoal inconfundvel e acreditava na conexo do
crtico com o pblico, escrevendo sempre em primeira pessoa. Ela ser a primeira crtica
jornalista a defender uma abordagem mais pessoal e emotiva dos escritos, hoje to comum
nesta prtica (Bywater; Sobchack, 1989, p. 10-17).
97
2. Brasil e Portugal
No Brasil, o crtico teatral Arthur Azevedo publica em 1897 no jornal O
Paiz aquilo que seria considerado o primeiro comentrio sobre filmes, exibidos
ainda nesta poca em casas teatrais. No incio do sculo XX, a partir da
consolidao do setor exibidor nas principais cidades brasileiras, surgem as
primeiras publicaes especializadas como as revistas O cinema (1913), A Fita
(1918) Palcos e Telas (1918), Selecta (1924), Cinearte (1926), O Fan (1928)
sendo que boa parte delas cobria com regularidade tambm o teatro. Crticos
como Plnio Sussekind Rocha, Adhemar Gonzaga, Pedro Lima, Moniz Viana,
Walter da Silveira, Paulo Emlio Salles Gomes, Alex Viany e o prprio Glauber
Rocha, exerceram suas atividades de crtica seja em peridicos ou em revistas
mais especializadas (Gardnier, 2002 e Ramos; Miranda, 2000, p. 455).
Tendo como sua fase mais marcante os anos 60 e 70, a resenha crtica de
cinema procurava definir seu espao produzindo textos sobre pelculas
consideradas experimentais bem como sobre os grandes filmes comerciais.
Alis, no interior da comunidade daqueles que escreviam e pensavam sobre
cinema, havia uma diviso entre os refletiam sobre a esttica cinematogrfica
43
Segundo Bordwell (1991, p. 22) o maior acesso s tecnologias dos meios de comunicao
implicava as projees de pelculas de 16 mm na dcada de 50, as mesas de edio Steenbeck
nos anos 60 e o videocassete nos anos 70.
98
99
45
Optamos por utilizar o itlico para demarcar todas as transcries de textos publicados em
peridicos. Para as citaes de textos cientficos, as aspas (ou comas duplas) constituem a
regra. Dirio de Notcias. 23.11.1960. p. 7. A resenha no est assinada.
100
a constituir-se como parte da rede de divulgao dos filmes. Havia aqueles que
deploravam a falta de iseno e anlise dos crticos, especialmente nos
peridicos, e outros que se mantinham impassveis perante o cumprimento da
agenda imposto pelas editorias dos jornais que, de um modo geral, seguiam as
referncias dos boletins de divulgao cinematogrficos norte-americanos
voltados para as atualidades dos espetculos-negcio.
Este quadro de predomnio do modelo industrial americano a que
chamaremos factual-valorativo suscitou sentimentos de rejeio por parte de
alguns crticos portugueses como Fernando Duarte, diretor da revista Celulide,
o que o levou a clamar em 1961 por um congresso da crtica cinematogrfica em
Portugal. Duarte diz que durante anos adulterou-se a misso informativa e
analtica da crtica cinematogrfica e continua foi a chamada grande imprensa
que mais amesquinhou a funo do crtico, que mais contribuiu para o seu
descrdito, impondo-lhe uma total dependncia da publicidade, do elogio de
favor, dos imperativos administrativos46.
Em verdade, o discurso de Duarte j refletia uma insatisfao dos
profissionais ligados ao universo cinematogrfico (os crticos a includos) contra
o cinema comercial e o clamor por uma crtica que fugisse do mero elogio do
filme. A partir de aproximadamente meados da dcada de 60 o discurso de
louvor da crtica de cinema passa a ser questionado por alguns crticos em
particular e at mesmo por publicaes como a revista Plano que em Dezembro
de 1965 vociferava: a crtica de espetculos que por c se faz aquilo que toda
gente sabe: ou no diz nada, ou laudatria, ou comprada ou compassiva
(vivam as excepes). (apud Barroso, 2002, p. 1279).
Vejamos mais um exemplo de uma resenha47 que primava pelo elogio
superficial, sobretudo pelo fato do filme j ter sido aclamado no Festival de
46
47
Dirio de Lisboa. 21.04.1963. p. 11. A resenha no est assinada. O fato de boa parte das
resenhas deste perodo no estar assinadas e, quando esto, aparecer somente as iniciais,
demonstra a falta de profissionalizao na rea de espetculos. Segundo Bnard da Costa
(1990, p. 254-255), tratava-se de recenses elogiosas, assinada por iniciais, em que as ditas
(iniciais) podiam dizer tudo, menos dizer mal.
101
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Barroso (2000, p. 134-137) igualmente afirmou que a crtica de cinema portuguesa deste
perodo enfocava aspectos como a anlise do estilo, do gnero, o impacto social da obra e a
figura do realizador, ressalvando a forte influncia da crtica francesa, especialmente naqueles
crticos originrios dos cineclubes, que, afinal, constituam a sua maioria. Sobretudo a partir de
meados dos anos 60, a essncia da arquitetura argumentativa das crticas fundamentava-se na
esttica, na poltica e no pblico. Discutir sobre o conceito de polticas dos autores num embate
acirrado contra o grande cinema comercial, defender a idia e uma nova concepo esttica para
o cinema, alm de refletir sobre a questo do pblico como bilheteira, eram temticas
constantemente presentes nos escritos dos crticos portugueses da poca.
49
Bnard da Costa (1990, p. 256) diz que foi em 1955, quando descobriu os Cahiers du Cinma
que revira tudo a outra e definitiva luz.
103
Conforme Jos-Augusto Frana (1995, p. 46), em 1947 nasceu o Crculo de Cinema de Lisboa
que a polcia poltica proibiu, por alegadas prticas conspiratrias, alargando-se a suspeita,
ento, a todo movimento nacional que em 1956 contava mais de 30 clubes pelo pas fora,
nomeadamente em Coimbra, e em Lisboa, no Universitrio, no ABC, no Catlico.
104
51
Na Frana, Itlia, Inglaterra ou EUA o peso foi o mesmo. Conforme Michel Chion (1996, p.
478-479) na Frana, j em 1920 Louis Delluc inventa a palavra cineclube lanando seu
semanrio que levava o mesmo nome cuja inteno era apoiar a arte cinematogrfica
organizando encontros entre cineastas e pblicos. Ricioto Canudo, outro crtico pioneiro, tambm
cria em Paris em 1921 o clube de amigos da stima arte.
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Dirio Popular. 05.05.1974, p. 4. Assinavam o documento: Rui Afonso, Joo Csar Monteiro,
Tito Lvio, Antnio Cunha Telles, Fernando Lopes, Jos Camacho Costa, Manuel Carvalheiro,
Eduardo Geada, Joo Lopes, Lauro Antnio, Eduardo Prado Coelho e outros.
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Lus de Pina (1978, p. 75) afirma que: (...) nos anos 70, at por virtude da concorrncia da TV,
de sesses especiais dos cinemas, dos cinemas de estdio, da motorizao da vida e dos finsde-semana, o movimento cineclubista conheceu uma crise grave.
56
Bnard da Costa (1998, p. 69) dir que a partir de 1980, os anos gordos da cinefilia ou de
salas cheias (que, apesar de tudo, foram os anos 60-70, que culminaram com os grandiosos
ciclos da Gulbenkian, verso correcta e aumentadssima das 3as Feiras Clssicas de outrora)
chegaram ao fim.
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1. Os jornais
O contexto poltico-jornalstico, entre o ano de 1960 at ruptura ocorrida
com 25 de Abril, foi naturalmente marcante para a vida da imprensa de
referncia portuguesa. Os dirios viviam sob o domnio da censura prvia, o que
garantia uma forada harmonia entre as empresas jornalsticas e o Estado Novo.
A descrio da presena de autoridades nos locais das ante-estrias dos filmes
pode revelar um constante panegrico ao regime de Salazar.
Este horizonte, por certo, demarcava uma cumplicidade da imprensa com
o Estado em cujos jornais havia uma espcie de autocensura64. O matutino
Dirio de Notcias, fundado em Lisboa em 1864, era considerado o porta-voz
oficial do governo, devidamente disciplinado para participar do jogo de interesses
via uma prtica de obedincia, acomodando-se aos constrangimentos impostos.
Nos anos 60, a seo dedicada aos espetculos era chamada de Vida artstica e
em meio a uma confuso de textos de variados gneros, viam-se pequenos
comentrios sobre os filmes em exibio, numa leitura factual das pelculas
geralmente sem qualquer tipo de meno aos aspectos polticos que a produo
poderia eventualmente ter.
Esta assepsia ideolgica presente nas crticas era oposta ao momento
marcante politicamente na histria de Portugal: as guerras coloniais na frica.
Dir Joo Bnard da Costa: Em 1963, a guerra alargou-se a Guin. Em 1964, a
Moambique. 50.000 portugueses partiram para as colnias, rapidamente e em
fora. Em 1965, a Oposio reclamou a autodeterminao das colnias e
64
Para Joo L. De Moraes Rocha (1998, p. 37), a censura vigorou como forma de criar uma
mentalidade; efectivamente, o lpis azul (os censores assinalavam os cortes com lpis azul)
originou a autocensura, a coibio da escrita por auto-reprovao e receio.
111
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Como nota Cndido de Azevedo (1999, p. 227) por determinao do diploma no 13 564, de
06.05.1927, era rigorosamente interdita a exibio de fitas perniciosas para a educao do povo,
de incitamento ao crime, atentatrias da moral e do regime poltico e social vigorantes e aquelas
fitas que exibissem cenas de: Maus tratos a mulheres. Torturas a homens e animais.
Personagens nuas. Bailes lascivos. Operaes cirrgicas. Execues capitais. Casas de
prostituio. Assassnios. Roubo com arrombamento ou violao de domiclio, em que pelos
pormenores apresentados, se possa avaliar dos meios empregados para cometer tal delito. A
glorificao do crime por meio de letreiros ou efeitos fotogrficos.
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Repblica. 23.03.1971, p. 7.
114
Novo Cinema ganhou fora neste ambiente de censura, por exemplo, com a
criao de cursos tcnicos na rea de cinema. Entre 1961 e 1964 organizou-se o
primeiro curso de cinema em termos profissionais pelo Estdio Universitrio de
Cinema Experimental no Centro Universitrio de Lisboa, levando a renovao ao
setor (Pina, 1978, p. 44).
Sem dvida, a Revoluo dos Cravos ser um divisor de guas na histria
poltica e cultural do pas. Com o desaparecimento da censura, os dirios
lisboetas politizaram-se de tal forma que alguns deles dedicaram metade de
suas pginas s questes polticas. Como relata Joaquim Vieira (1998, p. 276):
Os comunistas, com um setor de imprensa bem estruturado e organizado,
apoderam-se da linha editorial dos principais dirios de Lisboa - DN e O
Sculo -, passando a controlar ainda o Dirio de Lisboa e mantendo
considervel influncia noutras redaes, sobretudo na RTP. Certamente que
este contexto ir tambm refletir-se no discurso da crtica de cinema e no prprio
Cinema portugus. Pelculas como O encouraado Potemkine de Eisenstein e
Sofia e a educao sexual de Eduardo Geada encontram finalmente espao
para sua livre exibio nas salas de Lisboa. Foram fervorosas as discusses
sobre novas leis no cinema e o papel do Estado neste processo, sobretudo por
conta das lutas partidrias inerentes ao perodo posterior Revoluo.
Um dado a salientar diz respeito a uma mudana na direo assumida
pela cinematografia portuguesa, dois anos aps o 25 de Abril, com seu
distanciamento do filme comercial-popular. Segundo Luis de Pina (1978, p. 62):
Foge-se deliberadamente ao filme popular, acessvel, comunicativo,
procurando frmulas de interesse que vm mais dos contedos culturais,
informativos ou polmicos, procurando transformar o prprio pblico que,
progressivamente politizado, aceita propostas novas (caso de Deus, ptria e
autoridade, documentrio de montagem) e estar em condies de aceitar um
cinema que lhe d algo mais que o espectculo de diverso a que
fundamentalmente o habituaram, como o vo habituando ao filme pornogrfico e
ertico, que invadiu Portugal de roldo e acaba de ser limitado por decreto a
cinemas especiais, depois de sujeito a forte tributao em sua entrada. Nota-se
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3. As revistas especializadas
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Vale citar que o crtico e futuro diretor da cinemateca portuguesa Joo Bnard da Costa foi
diretor da O Tempo e o Modo que saiu de circulao em 1977.
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Durantes os anos 70, sobretudo aps o 25 de Abril, o mercado editorial se expandiu com o
surgimento de diversas revistas especializadas ou generalistas. Na dcada posterior o mercado
se retrai e entra em crise com o encerramento de muitas publicaes. (Perestrello; Amaro, 1993,
p. 120).
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Plateia durou de 1951 at 1979 e em Julho de 1979 sua tiragem era de 25 mil exemplares. A
Celulide nasceu em 1957 e perdurou at 1986.
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Refere Lusa Perestrello e Aribal Joo Amaro (1993, p.120) que (...) os 855 nmeros de
Plateia, repartida em duas sries, passam pouco a pouco do cinema ao espectculo em geral,
para terminar como uma publicao mais ou menos ertica.
75
121
como uma fonte de influncia para o leitor. Os anos que se seguiram a este
ambiente de produo editorial cinematogrfica foram marcados por profundas
metamorfoses, com encerramento de alguns peridicos (Dirio de Lisboa em
1990, Dirio Popular em 1992) e de grande parte das revistas de cinema. Em
compensao, na dcada de noventa chegou ao mercado o jornal Pblico, que
veio amparado pelo cenrio de maior profissionalizao do setor jornalstico e de
grandes investimentos em grupos de mdia. A sua pgina dedicada crtica de
cinema espelha-se na prpria modernidade grfica do jornal, com crticos mais
jovens como Vasco Cmara. J quase no final da dcada, Lisboa recebe a
revista Premire numa verso portuguesa da revista espanhola que por sua vez
tambm uma verso da tradicional revista francesa de cinema, mas
predominantemente nos jornais e semanrios onde hoje se cultiva um jornalismo
cinematogrfico em Portugal, sem esquecer, contudo, os sites de crtica
hospedados na internet.
Nos anos 80 e 90, a crtica de cinema lusa convive com estas mudanas
mais estruturais aliadas ao surgimento de alguns grupos de mdia que se
mostram cada vez mais fortes e concorrentes entre si. Um dado interessante a
nossa pesquisa o fato de que o Jornal de Notcias e o Dirio de Notcias sero
adquiridos em 1992 pelo grupo Lusomundo originalmente vinculado rea de
distribuio cinematogrfica e videogrfica. Este dado poderia pressupor
questes ticas ligadas ao fato de como a crtica de cinema destes jornais lida
com a empresa que a contratou. Entretanto, apesar de muito interessantes,
estas questes esto fora do alcance de nossa investigao.
Quanto ao tipo de discurso da crtica, essas dcadas representaram
(sobretudo a de 90 com o fim do sonho poltico comunista e a derrocada do muro
de Berlim) o remexer nas referncias polticas e ideolgicas daquela parcela da
crtica que via nos ideais do cinema realista a soluo para educar os
espectadores. Por outro lado, grande parte da crtica que privilegiava os
aspectos estticos, da linha da pesquisa formal da matria flmica, manteve-se
presente at dias atuais e mesmo preservando a independncia de opinio
favorecida, em parte, pela pequena dimenso do mercado portugus, no quis
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123
Ver mais sobre isto na obra de Alexandre Figueira Cinema Novo: a onda do jovem cinema e
sua recepo na Frana. So Paulo : Papirus, 2004.
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seu
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Nelson Pereira dos Santos e Ruy Guerra. H a uma idia de que somente o
Cinema Novo representava o cinema brasileiro.
Ademais, este circuito de cinema de arte muito eficiente em
interlocuo com a cultura dos festivais e das mostras nas universidades e
cinematecas. No caso especfico do Cinema Novo, os canais de divulgao
eram primordialmente estes em que participavam, sobretudo cinfilos,
formadores de opinio e um pblico fiel com grande poder de legitimao dos
movimentos culturais. O 1 Festival do Cinema Brasileiro em Portugal, assim
como a 1 Retrospectiva do Cinema Brasileiro e a 1a Semana do Cinema
Brasileiro, atuaram como canais de disseminao e legitimao do cinema
brasileiro e que apesar de certos problemas, expunham, por vezes em primeira
mo, filmes j relativamente famosos mas desconhecidos do pblico portugus
(Tabelas 1, 2 e 3).
Tabela 1: Filmes exibidos no 1o Festival de Cinema
Brasileiro 17 a 24 de Maro.
A vida provisria
Antes, o vero
As amorosas
Copacabana me engana
Fome de amor
Juliana do amor perdido
Macunama
Memria de Helena
O diabo mora no sangue
Os cafajestes
Os deuses e os mortos
Panorama do cinema brasileiro
Proezas de satans na vila de leva-e-traz
Senhores da terra
1971
1971
1971
1971
1971
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1971
1971
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1971
1971
1971
1971
1971
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A falecida
A grande cidade
A hora e a vez de Augusto Matraga
Asilo muito louco
Ganga Bruta
Macunama
Na garganta do diabo
O cangaceiro
Antnio das mortes
So Paulo S.A.
Sinh Moa
1972
1972
1972
1972
1972
1972
1972
1972
1972
1972
1972
A compadecida
A selva
Misso: matar
Tati, a garota
Um anjo mau
1973
1973
1973
1973
1973
129
linha do cinema novo brasileiro, e queles juntava, numa segunda linha, Fome
de Amor, Os Deuses e os Mortos, Vida Provisria e Memria de
Helena80. De fato, a ausncia de importantes filmes do movimento e, sobretudo
de Glauber Rocha foi motivo de protesto neste festival. Por outro lado, e mesmo
com a ausncia de obras significativas, a presena de filmes brasileiros inditos
em territrio luso contribuiu para uma maior divulgao do Cinema Novo. No
Dirio de Lisboa, o crtico Oliveira Pinto publicou vrios artigos (um total de sete,
todos no ms de Maro de 1971) sobre temas relacionados ao Festival, mas
sobretudo sobre o Cinema Novo, inclusive acompanhados por entrevistas com
realizadores participantes do movimento. J o crtico Carlos Pina expressa que,
para l da realidade scio-poltica de um pas heterogneo, este primeiro festival
do cinema brasileiro poder-nos- abrir diversos outros caminhos. A viso de um
Brasil sui generis (que a maior parte dos portugueses ainda possui) poder
ser substituda agora pela percepo de algo muito forte que esse mesmo Brasil
j produziu ou (o que mais importante), por aquilo que ainda tem para nos
dar81.
Um ano aps este 1o Festival, outro evento marca a presena e promoo
do cinema brasileiro em Lisboa. Trata-se da 1a Retrospectiva do Cinema
Brasileiro realizada entre 8 e 22 de Maro de 1972 na Cinemateca Nacional
(Palcio Foz), tambm organizada pela embaixada do Brasil em Lisboa. Tal
como o 1o Festival, esta Retrospectiva teve uma grande afluncia de pblico:
Ontem aconteceu o que muita gente julgaria impossvel. s primeiras horas da
manh, vrias centenas de pessoas, sobretudo rapazes e raparigas, formavam
bichas que enchiam os passeios contguos ao Palcio Foz, esperando conseguir
bilhetes para assistir a um filme admirvel chamado Macunama (...)82, referiu
o crtico Carlos Pina. E, ao contrrio do ano anterior, foi exibido pela primeira vez
em Portugal uma obra de Glauber Rocha: Antnio das Mortes, o que
efetivamente contribuiu para uma maior discusso acerca do Cinema Novo. Em
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Seara Nova. N 1437, Julho de 1964, p. 216-217. O texto parece ser a traduo de um artigo
do crtico francs Michel Capdenac, aqui considerado pelo seu teor de divulgao do movimento
cinemanovista em Portugal.
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contato com a crtica, operavam como amplificadores dos ideais deste Cinema
Novo. Glauber Rocha, certamente foi o maior deles a partir de seu manifesto A
Esttica da Fome87. Glauber Rocha dava com certa frequncia entrevistas a
revistas de cinema francesas e italianas com o objetivo de divulgar o seu
cinema da fome e pelo menos uma delas foi traduzida e publicada em Portugal
pelo crtico A. Roma Torres na coletnea Cinema, arte e ideologia, em 197588.
Estes realizadores e seus projetos conformavam-se com a poltica dos
autores ao mostrar unidade formal e agregaes temticas de suas obras. Para
Eduardo Geada (1987, p. 143), Uma vez que a crtica procura desvendar e
valorizar o discurso pessoal do realizador, no de estranhar que a maioria das
revistas da especialidade e da imprensa em geral reserve pelo menos tanto
espao s entrevistas e as biofilmografias como anlise de filmes. Se a
entrevista assume um papel complementar da crtica nas sees especializadas
precisamente porque ela permite ao crtico decifrar na origem as intenes do
autor caucionando deste modo as suas prprias opinies. Ou seja, o crtico, ao
dispor da entrevista, garante entre outras coisas, mais autoridade sua fala.
Outros meios de comunicao como as antologias tambm serviram para
credibilizar e promover o Cinema Novo em Portugal. Um deles 89 traz a traduo
de um texto de Glauber Rocha publicado nos Cahiers du Cinma, intitulado O
cinema tricontinental. Neste texto Glauber defende os cinemas da sia, frica e
Amrica Latina e procura explicar, sua maneira barroca, o que o Cinema
Novo entendido como um cinema cuja esttica tem mais relaes com a
ideologia do que com a tcnica. Nesta mesma antologia, destaca-se o artigo A
batalha do novo cinema de Louis Marcorelles, crtico dos Cahiers du Cinma que
87
Cadernos de Cinema: Novo Cinema, Cinema Novo. Lisboa : D. Quixote, 1968. p. 75-86.
133
Ver mais sobre a importncia de Louis Marcorelles na divulgao do Cinema Novo na Frana
no livro de Alexandre Figueira. Cinema Novo: a onda do jovem cinema e sua recepo na
Frana. So Paulo: Papirus, 2004.
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O filme foi realizado em esquema de cooperativa por um grupo de jovens (atores, produtores e
tcnicos no profissionais) durante quase um ano e foi fortemente influenciado pelo cinema neorealista de Rosselini e Cesare Zavattini.
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Nelson Pereira dos Santos (apud Vianny, 1999, p. 483) confirma: A grande influncia que
recebemos foi do Neo-realismo. A gente descobriu que podia fazer um cinema no Brasil sem
estdios gigantescos, sem grandes capitais, com equipamento leve. As histrias saam da
prpria realidade, enfim todos aqueles ensinamentos. E principalmente a idia de transformao
social, que era o mais importante e que o Cinema Novo herdou e fez.
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a arte da periferia deveria deglutir esta cultura invasora em vez de neg-la por
completo. Macunama foi, ademais, o filme que mais se aproximou do projeto de
pr-comunicao com pblico do Cinema Novo, dando anuncia de visibilidade
comercial aos anseios de uma produo mais requintada, mas sem as frmulas
gastas da narrativa clssica. Mas, como dissemos, o filme era uma exceo no
movimento cinemanovista, que viu seu projeto de aproximao com o pblico
fracassado.
Para finalizar, ao nosso ver, uma palavra define toda a esttica do Cinema
Novo brasileiro: convergncia. Uma convergncia entre a renovao da
linguagem, os filmes de baixo oramento e a poltica dos autores, traos que
marcam, conforme expressou Ismail Xavier (2001, p. 14), o cinema moderno,
por oposio ao clssico e mais plenamente industrial. As obras de realizadores
que defenderam este projeto estavam presentes em diferentes regies do
mundo. Estes realizadores tomaram o cinema como exerccio de inveno, ao
quebrarem tabus e instaurarem uma nova maneira de ver os filmes. O jovem
cinema brasileiro, inserido nesta experincia de modernidade, traou caminhos
paralelos ao cinema europeu e latino-americano mas tambm perseguiu seu
percurso peculiar. Este percurso implicava numa renovao da linguagem
baseada na descontinuidade, fruto de uma fragmentao narrativa exibida no
espao e tempo diegticos; na montagem complexa e descontnua entre os
planos; em dilogos cujo carter discursivo supervalorizado ansiava pelo falar
nacional. E a despreocupao com o acabamento tcnico industrial levou a que
as deficincias tcnicas fossem incorporadas como opes estticas, traduzidas
nas cmeras com ngulos que privilegiavam a paisagem humana e na
iluminao natural.
O Cinema Novo foi a verso brasileira de uma poltica de autor que
procurou destruir o mito da tcnica e da burocracia de produo, como bem
salientou Xavier (2001, p. 63). A figura do autor, redefinida tambm pela tica do
nacional, deve ter como condio necessria, a liberdade de criao e produo,
uma vez que, estando o cineasta-autor vinculado s imposies dos estdios,
nunca viria a ter independncia no seu exerccio de criao cinematogrfica. Por
144
outras palavras, Glauber Rocha defendia uma relao intrnseca entre autoria e
cinema independente.
145
146
147
Mas convm registrar que, em 1953, o filme O cangaceiro de Lima Barreto teve uma forte
repercusso na Europa, sobretudo aps ganhar o Festival de Cannes daquele ano. Entretanto,
Glauber Rocha (2003, p.128) assinala a iniciante marcha do Cinema Novo na Europa em 1961:
Cinema Novo em marcha: volta da Europa Paulo Csar Saraceni, aps ano e meio de trabalho
com jovens realizadores italianos, contato tcnico e vivncia com o moderno cinema europeu,
sucesso de trs prmios importantes para Arraial do Cabo, criao conjunta com Mrio Carneiro
[...] A descompostura intelectual do cinema brasileiro, sua falta de prestgio, seu abandono
poltico e econmico, sua trgica destinao demagogia, aventureirismo, teoria de algibeira,
subitamente levanta a cabea.
96
Ver mais sobre o cinema brasileiro na Frana na obra de Alexandre Figueira: a onda do jovem
cinema e sua recepo na Frana. So Paulo : Papirus, 2004.
148
para ser aceito na Europa. Eles confiavam no Ministrio das Relaes Exteriores
para enviar seus filmes aos festivais e depois procurar vend-los no exterior,
tendo Paris como principal ponto de divulgao mundial (2004, p. 42). Este
papel mais que diplomtico do Ministrio foi igualmente significativo em Lisboa 97
acrescentando-se o fato de Brasil e Portugal estarem vinculados historicamente.
Assim, no obstante as dificuldades no mbito da censura e da distribuio dos
filmes, o cinema brasileiro passou a ser bem mais conhecido em Portugal do que
antes. Pode-se dizer que esta conjuntura auxiliou e muito a crtica de cinema
lusa a ver o Cinema Novo como um modelo a ser at mesmo abraado por
outras cinematografias nacionais. Para alm disso, o cinema brasileiro, que
antes dos anos 60 era praticamente desconhecido dos crticos portugueses, ir
ser identificado quase que exclusivamente com o Cinema Novo.
certo que o projeto cinemanovista era um projeto caracterstico de sua
poca e este fator ajudou a legitimao do movimento e por extenso sua
identificao com a totalidade do cinema brasileiro. Aps a exploso neo-realista
e afirmao da Nouvelle Vague, sobretudo no chamado mundo subdesenvolvido,
as cinematografias procuravam afirmar-se e legitimar-se dentro e fora de seus
espaos nacionais. Como vimos, a crtica francesa recebe e autentica estas
cinematografias ao fornecer voz e espao nas publicaes especializadas. Os
festivais promovem-nas nos circuitos alternativos de exibio e em territrio luso
a repercusso no diferente da Frana.
Neste mesmo perodo, o Novo Cinema portugus igualmente reclamava
por mudanas estticas que buscavam romper com as convenes ditadas pelo
cinema clssico narrativo, cinema este, para os que reclamavam,
predominantemente afirmativo e que levava os espectadores a uma fruio
esttica desinteressada e no reflexiva. A aproximao do Novo Cinema
97
149
150
Eduardo Geada (1987, p. 143) assinala que o que mais caracterizou a noo de autor de
cinema foi justamente a defesa da subjectividade e da especificidade do trabalho do realizador
no seio de uma mquina que tendia a recalc-los. Assim, a tarefa do crtico consistiria
prioritariamente em descobrir os autores onde eles eram menos visveis, ou seja, no cinema
espectculo e no discurso do seu universo exponencial Hollywood.
151
152
Mudana de cenrio
153
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99
155
101
Revistas Celulide, No 195, Maro de 1974, p. 5-6, No 214, Agosto de 1975, p. 12-15 e No
209, Abril de 1975, p. 11-12.
156
102
103
Jornal de Letras Artes e Ideias. 08 a 21.12.1981, p. 30. Assinada por Guilherme Ismael.
157
Rocha resolve fixar residncia em Sintra 104 em Fevereiro de 1981, aps ter
passado por Veneza e Paris para lanar com bastante polmica seu ltimo filme
A idade da terra. Em Abril do mesmo ano, a Cinemateca Portuguesa organizou
uma retrospectiva105 da obra de Glauber, e para ser includa no catlogo da
Mostra, foi realizada por Joo Lopes uma das mais lcidas, sintticas e serenas
entrevistas de toda sua vida, segundo Sylvie Pierre (1996, p. 93)106 . De fato,
nesta entrevista Glauber Rocha ressalta a relao entre a histria do Cinema
Novo e o contexto poltico brasileiro durante o regime militar at abertura
poltica e, como este contexto motivou rupturas necessrias ao projeto
cinemanovista que ele no considerava extinto em 1981, mesmo com a
diversidade de propostas existentes. Para Glauber, esta diversidade e
contradies entre autores eram sinal de progresso e desenvolvimento: como
se o movimento se tivesse dissolvido para se integrar em vrios ramos do
cinema brasileiro, que um cinema em formao porque o Brasil um pas que
vive uma fase de revelaes em todos os seus aspectos (Lopes, 1987, p. 140).
Infelizmente, Glauber Rocha adoeceu seriamente, vindo a falecer no
Brasil em 22 de Agosto de 1981, dois dias aps ter sado do hospital da CUF em
Lisboa. A imprensa portuguesa deu ampla cobertura morte trgica de Glauber.
O JL declarou: A morte de Glauber Rocha, o realizador que revolucionou o
cinema brasileiro, trouxe o seu nome para as manchetes dos jornais, quer pelo
que significa em si mesmo, quer pelas circunstncias dramticas e inesperadas
em que ocorreu 107. O JL ainda publica algumas das ltimas fotografias inditas
de Glauber Rocha poucos dias antes de sua morte (fotos de Paula Gaitan,
104
recebido por Manuel Carvalheiro, Jos Fonseca e Costa e Carlos Pinto. Reside alguns
meses na antiga casa de Ferreira de Castro e depois vai para um grande casaro, propriedade
de Carlos Pinto.
105
Sylvie Pierre que trabalhou nos Cahiers du Cinma entre 1966 e 1971, era muito prxima de
Glauber Rocha. Em 1987 publicou um livro sobre ele onde reproduz integralmente a ltima
entrevista fornecida a Joo Lopes. Diz Pierre: A entrevista concedida em Portugal em 1981,
passagem das mitologias, uma entrevista clssica, e parece-me notvel no somente por ter
sido a ltima e verdadeira entrevista de importncia concedida por Rocha a um jornalista, nos
ltimos meses de vida e durante uma das ltimas remisses de sua doena (1996, p. 191).
107
158
159
160
161
109
110
111
Ainda que no caso do cinema, como mencionamos, a crtica no tenha recebido muito bem
estes filmes. Jorge Leito Ramos diz a propsito: (...) Mas receio muito que a invaso (quase
certa) de cinema brasileiro se faa pelo lado menos bom, da lgrima fcil e da pornochanchada,
e sirva apenas para que a exibio ganhe muito dinheiro fcil e a gente, todos, fique um pouco
mais estpidos. Dirio de Lisboa. 23.09.1977, p. 13.
162
externo112.
Com a chegada dos anos 80, a poltica de privatizaes em Portugal
atingiu as empresas jornalsticas, mas a televiso s ver mudana em seu
modelo de gesto no final da dcada, com uma reviso na Constituio e a
abertura aos grupos privados em 1992. Ainda na dcada de 80, as telenovelas
brasileiras dominam o espao na televiso pblica portuguesa e ttulos como
Guerra dos sexos (1984) e Roque Santeiro (1987) garantem as boas audincias
da RTP1. Joo Brnad da Costa (1998, p. 69) afirmou que na dcada de 80
nem os maiores xitos dos primeiros anos dela (E.T. de Spielberg, por exemplo,
ou o ciclo da Guerra das Estrelas) se aproximaram das audincias conseguidas
pelas telenovelas brasileiras, que, em Portugal, entraram a matar em 1977 com
a clebre Gabriela. A televiso a cores chegada em 1980 rematou e
arrematou.
J nos anos 90, este quadro pouco se modificou e o sistema telenovelatelejornal-telenovela vai ser mantido, s que em 1992 a rede pblica de televiso
tem que dividir seu produto cultural com a nova operadora privada (SIC), que
posteriormente assina um acordo de exclusividade com a rede Globo. Mas as
telenovelas continuam a angariar espectadores como salienta Jorge Paixo da
Costa (2003, p. 88): Com o incio da televiso privada, em 1992, assistiu-se a
um incremento gradual da exibio de telenovelas em Portugal. Esse aumento
significativo de emisses, que at a tinham apresentado uma mdia de 2
telenovelas por ano, com 4 novelas exibidas no ano de arranque do primeiro
canal privado (SIC), teve seu auge nos anos de 1994 e 1995 com um total de 26
telenovelas exibidas pela RTP1, 20 na SIC, 10 na TVI e apenas 4 na RTP2 em
112
A produo de telenovelas no Brasil comea em 1963 mas somente dez anos mais tarde
inaugura-se o comrcio de exportao deste produto com O bem amado vendido para o Uruguai.
O bem amado foi a primeira telenovela a cores que atendeu s exigncias do mercado
internacional da poca. Em 2003 a rede Globo j vendia telenovelas para 130 pases e seus
melhores clientes estavam na Europa e no Oriente Mdio. Ao lado de Terra Nostra, Escrava
Isaura um dos grandes fenmenos de vendas internacionais da emissora de TV (Jimenez,
2003).
163
1994113.
Neste contexto de forte presso da indstria cultural brasileira, traduzida
sobretudo nas telenovelas, d-se um fenmeno que Isabel Ferin (2004b)
esclarece: A relao entre os diversos produtos da indstria cultural, e de
contedos, com a telenovela estabelecida constantemente, de diversas formas
e em diferentes nveis: entre literatura e a telenovela, entre o teatro, os actores e
a telenovela, entre a MPB e a telenovela, assim como entre o cinema, os actores
e a telenovela. Se o cinema brasileiro j no recebia a calorosa acolhida dos
anos 60/70, aps a presena das telenovelas a dominar o espao das televises
portuguesas, esta acolhida ser bem pior. Ao contrrio das grandes massas de
espectadores, os crticos de cinema 114 no viam com bons olhos este tipo de
narrativa seriada, considerada como subproduto cultural. O estabelecimento de
relaes, normalmente de semelhana, entre as telenovelas e o cinema
brasileiro vai alterar sobremaneira a imagem do cinema brasileiro em Portugal.
Esta alterao passa pelo olhar da crtica de cinema lusa sobre a perda de
qualidade dos filmes brasileiros, uma vez que, desde os atores inscritos numa
rede de sistema de estrelas j consagrados na televiso, at adoo de
determinados efeitos estticos como os fechados enquadramentos, sero, desde
1977, com Gabriela, associados ao cinema brasileiro como parte constituinte de
uma indstria de banalizao esttica e comercial.
Para a crtica, o cinema havia garantido seu lugar de arte conquistado
desde os anos 50/60 e no poderia ser confundido com a vulgarizao comercial
113
certo que nem todas as telenovelas eram brasileiras, mas sua grande maioria sim,
sobretudo as exibidas na RTP1 e na SIC. Jorge Paixo (2003, p. 88) acrescenta que, em 1995,
as novelas exibidas na SIC foram, na sua esmagadora maioria, provenientes da Rede Globo de
Televiso (56 ttulos), excepto Tocaia Grande, que foi produzida pela Rede Manchete, Os
Imigrantes da TV Bandeirantes e duas telenovelas venezuelanas da produtora Venevision Mulher
Proibida e Por Amar-te Tanto.
114
164
Dados retirados do livro de Eduardo Geada. O Cinema espectculo. Lisboa : edies 70,
1987, p. 140.
165
118
Arlindo Machado tambm tem se dedicado a romper com os clichs, reproduzidos em muitos
estudos de comunicao, sobre a demonizao ingnua da televiso e das telenovelas
sobretudo no livro A televiso levada a srio. O autor salienta que h, entre os crticos e
acadmicos, uma recusa intelectual televiso (Machado, 2000).
166
167
168
1974
1975
1975
1976
1977
1977
1977
1978
1980
1980
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1981
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1983
1983
1983
1983
1983
1984
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1985
1985
1985
1985
1985
1985
1985
1985
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1986
1986
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1987
1987
1987
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1988
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169
1989
1989
1990
1993
1994
1994
1994
1996
1996
1996
1996
1996
1996
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1997
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1992
1992
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1994
1994
1994
1994
1994
1994
1994
1995
170
1998
Alma corsria
Pequeno dicionrio amoroso
Quem matou Pixote?
Amores
Central do Brasil
Felicidade ...
Kenoma
Meia-noite
Traio
Ao entre amigos
Dois crregos
Hans Staden - L vem nossa comida pulando
O beijo no asfalto
Orfeu
Os sete gatinhos
Por trs do pano
Um copo de clera
1997
1997
1997
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1999
1999
1999
1999
1999
1999
1999
1999
171
A casa assassinada
A hora e a vez de Augusto Matraga
Assalto ao trem pagador
Deus e o diabo na terra do sol
Lio de amor
Macunama
O amuleto de ogum
O bandido da luz vermelha
O cangaceiro
O caso dos irmos Naves
O pagador de promessas
Os fuzis
Os herdeiros
Os inconfidentes
Pecado na sacristia
Perdida
Rio, 40 graus
Sangue mineiro
So Bernardo
Simo, o caolho
Toda nudez ser castigada
Uir, um ndio em busca de Deus
Vidas secas
1978
1978
1978
1978
1978
1978
1978
1978
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1978
1978
1978
172
pelculas de Glauber Rocha, Hector Babenco, Leon Hirszan e outros. Por fim, j
em 1999, um ciclo dedicado a Ruy Guerra quando alguns ttulos de sua
cinematografia foram oferecidos ao pblico (Tabela 8).
Tabela 8: Filmes brasileiros exibidos na Cinemateca
Portuguesa Anos 80/90
1985
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
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1987
1987
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1987
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1987
1987
1987
1987
1990
1990
173
Barravento
Pixote, a lei do mais fraco
A idade da terra
So Bernardo
Vidas secas
Imagens do inconsciente
Anjos do arrabalde
Deus e o diabo na terra do sol
Mil e uma
Antnio das Mortes
Pixote, a lei do mais fraco
A hora e a vez de Augusto Matraga
A ostra e o vento
Aleluia, Gretchen
Assalto ao trem pagador
Carlota Joaquina, princesa do Brasil
Como ser solteiro
Deus e o diabo na terra do sol
Dona Flor e seus dois maridos
Eles no usam black-tie
Esta noite encarnarei no teu cadver
Exorcismo negro
Iracema, uma transa amaznica
Macunama
O baile perfumado
O judeu
O quatrilho
Os fuzis
Pequeno dicionrio amoroso
Pixote, a lei do mais fraco
Terra estrangeira
Uir, um ndio em busca de deus
A intrusa
A queda
Kuarup
pera do malandro
Os cafajestes
Os deuses e os mortos
1991
1992
1993
1993
1993
1994
1996
1996
1996
1996
1996
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
1998
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1998
1998
1998
1998
1998
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1999
1999
1999
1999
1999
174
A idade da terra
Antnio das Mortes
Barravento
Cabeas cortadas
Cncer
Claro
Deus e o diabo na terra do sol
O leo de sete cabeas
Histria do Brasil
Terra em transe
A idade da terra
Barravento
Barravento
A idade da terra
Deus e o diabo na terra do sol
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1987
1990
1990
1991
1993
1996
119
Ainda hoje a Cinemateca Portuguesa mantm esta prtica de distribuio das Folhas da
Cinemateca, prtica que parece vir dos cineclubes.
175
1996
1998
2. O circuito comercial
Entre 1960 e 1999, a exibio de filmes brasileiros nas salas comerciais
de Lisboa variou em termos de quantidade havendo uma predominncia de
ttulos na dcada de 70. De um modo geral, estas variaes inseriram-se nas
experincias histricas vividas no Brasil e em Portugal (como j mencionamos),
embora outros fatores 120 tivessem tambm contribudo para tal quadro. Com
efeito, nos anos 60 problemas ligados distribuio e censura dificultaram a
acessibilidade de filmes, problemas estes que perduraram at 1974. Aps este
perodo h um crescimento significativo (em termos comparativos) de filmes que
s ir decair severamente em incio dos anos 90 com o colapso da Embrafilme e
o consequente desmantelamento da produo cinematogrfica brasileira. Em
meados da dcada de 90, o mercado volta a crescer ainda que em nmeros
pequenos. Em 1999 o filme Central do Brasil ganha lanamento simultneo em
11 salas de Lisboa. Importante observar que a cinematografia brasileira,
considerada perifrica em termos de mercado de produo e distribuio,
como a cinematografia chinesa ou iraniana, cujos filmes tm uma circulao
mais eficiente entre os festivais do que nos circuitos comerciais (Tabela 10).
Tabela 10: Filmes brasileiros exibidos no circuito comercial
Anos 60/90
1960
1962
1963
1965
1967
1970
1972
120
176
O homem n
Os herdeiros
So Bernardo
Terra em transe
Aladino e a lmpada maravilhosa
Antnio das mortes
Os paqueras
O leo das sete cabeas
Os fuzis
Os inconfidentes
Toda nudez ser castigada
Macunama
Barravento
Cabeas cortadas
Cncer
Dona Flor e seus dois maridos
Xica da Silva
Deus e o diabo na terra do sol
O casamento
O casal
Gente fina outra coisa
A dama do lotao
Lcio Flvio, o passageiro da agonia
Eu te amo
Toda nudez ser castigada
Bye Bye, Brasil
Pixote, a lei do mais fraco
Cassy Jones, o magnfico sedutor
O beijo da mulher aranha
pera do malandro
A turma da Mnica em a princesa e o robot
A turma da Mnica em o bicho-papo e outras
histrias
Mnica e a sereia do rio
Novas aventuras da turma da Mnica
Dias melhores viro
Gozo alucinante
O orgasmo sexual de miss James
A estrelinha mgica
O cangaceiro trapalho
Gabriela, cravo e canela
O quatrilho
Bocage, o triunfo do amor
O escorpio escarlate
1973
1974
1974
1974
1974
1975
1975
1975
1975
1975
1976
1976
1976
1976
1976
1977
1977
1977
1977
1977
1978
1978
1979
1981
1981
1982
1982
1983
1986
1987
1989
1989
1989
1989
1990
1990
1990
1990
1995
1995
1996
1999
1999
177
Central do Brasil
Amor e Cia
O judeu
1999
1999
1999
3. As distribuidoras
A Animatgrafo foi, sem dvida, a maior distribuidora de filmes brasileiros
em Lisboa. No auge de sua atividade nos anos 70, a Animatgrafo distribuiu em
Portugal quase todos os filmes de Glauber Rocha e tambm algumas fitas de
Ruy Guerra e Leon Hirszman. Estes filmes foram exibidos em salas como
Estdio e Universal, sinalizando a via alternativa de circulao. J a Castello
Lopes foi a distribuidora do Eu te amo de Arnaldo Jabor e do O beijo da mulher
aranha de Hector Babenco, ambos nos anos 80. A Doper distribuiu filmes como
Bye Bye, Brasil de Carlos Diegues e pera do Malandro de Ruy Guerra, ambos
exibidos no Estdio 444. A Ecofilmes fez a distribuio dos filmes infantis de
Maurcio de Sousa, como Novas aventuras da turma da Mnica. Por fim, a
Lusomundo, considerada a maior distribuidora de filmes brasileiros (e no s) da
dcada de 90, apresentou Central do Brasil de Walter Salles (Tabela 11).
Tabela 11: Filmes brasileiros exibidos por distribuidoras
Anos 60/90
Animatgrafo
Castello Lopes
Doper
Ecofilmes
Distribuidora no identificada
Lusomundo
Filmes ocidente
Imperial Filmes
Vitria Filmes
Rivus
Saturno
Atlanta
Cinema Novo
9
6
5
5
5
4
3
3
3
2
2
1
1
178
Columbia
Rank
Sacil
Sofilmes
1
1
1
1
53
4. Os realizadores
Dentre os realizadores brasileiros, Glauber Rocha foi o que mais mostrou
seus filmes no circuito comercial lisboeta. Quase toda a sua cinematografia foi
exibida desde Barravento at O leo de 7 cabeas e apesar de tardia e sem
grandes campanhas de marketing, as exibies marcaram a passagem do
Cinema Novo em Portugal, sobretudo na dcada de 70. Curiosamente, aps
Glauber Rocha o cartunista e criador de banda desenhada Maurcio de Sousa
aparece como o segundo realizador que mais exibiu filmes comercialmente em
Lisboa. Os filmes infantis sobre As aventuras da turma Mnica tiveram boa
distribuio e exibio comercial na dcada de 80, embora no suscitassem
qualquer crtica. A seguir temos Carlos Diegues, Arnaldo Jabor, Hector Babenco
e Ruy Guerra, todos com um nmero de filmes exibidos bem abaixo de suas
cinematografias (Tabela 12).
Tabela 12: Filmes brasileiros exibidos no circuito comercial
por realizador Anos 60/90
Realizadores
Glauber Rocha
Maurcio de Sousa
Carlos Diegues
Arnaldo Jabor
Hector Babenco
Ruy Guerra
Anselmo Duarte
Bruno Barreto
Daniel Filho
Joaquim Pedro de Andrade
Antnio Calmon
de
filmes
7
5
4
3
3
3
2
2
2
2
1
179
Carlos Coimbra
Carlos Hugo Christensen
Djalma Limongi Batista
Fbio Barreto
Helvcio Ratton
Ivan Cardoso
J. B. Tanko
Jean Garret
Jona Toby Azulay
Leon Hirszman
Lus Srgio Person
Nelson Pereira dos Santos
Neville d'Almeida
Reginaldo Faria
Roberto Farias
Roberto Santos
Rubens Eleutrio
Stefan Wohl
Walter Salles
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
53
5. As publicaes
No que concerne s publicaes, foi nos dirios lisboetas onde mais se
publicou crticas sobre filmes brasileiros entre os anos 60 e 90, notadamente no
Dirio de Lisboa, Dirio Popular e Repblica, todos hoje fora de circulao do
mercado editorial portugus. Levando-se em considerao seu tempo de vida e
o fato de ter uma tiragem semanal, o jornal Expresso tambm produziu um
nmero razovel de resenhas. J nas revistas especializadas, a Celulide
dedicou muito mais ateno ao cinema brasileiro que a sua contempornea
Plateia (Tabela 13).
Tabela 13: crticas a filmes brasileiros por publicao
Anos 60/90
Publicao
Jornal Dirio de Lisboa
Jornal Dirio Popular
de crticas
38
37
180
Jornal Repblica
Jornal A Capital
Revista Celulide
Jornal Dirio de Notcias
Jornal Expresso
Revista Plateia
Jornal de Letras
Jornal Correio da Manh
Revista Isto Espectculo
Jornal Pblico
Revista O Tempo e o Modo
Revista Isto Cinema
Revista Seara Nova
Revista Filme
Revista Estdio
Revista Cinema 15
29
27
25
24
17
7
7
5
3
3
2
2
1
1
1
1
230
6. Os crticos
Lauro Antnio foi o crtico que mais publicou resenhas sobre filmes
brasileiros exibidos em Lisboa. Um dos mais antigos crticos de Portugal, Lauro
Antnio exerceu seu ofcio sobretudo no Dirio de Lisboa e no Dirio de Notcias,
tendo assinado tambm algumas crticas na revista Celulide. Alm de Lauro
Antnio, destaque para Jos Vaz Pereira, Fernando Duarte e Tito Lvio que
atuavam respectivamente no A Capital, na revista Celulide e no Dirio Popular.
Observamos tambm um nmero significativo de crticas no assinadas e outras
assinadas somente com as iniciais (Tabela 14).
Tabela 14: Crticas a filmes brasileiros por autor Anos
60/90
utor
Lauro Antnio
No Assinada
Jos Vaz Pereira
Fernando Duarte
Tito Lvio
Afonso Cautela
de crticas
31
27
19
15
15
12
181
Carlos Pina
Jorge Leito Ramos
Jos de Matos-Cruz
Eduardo Prado Coelho
Joo Lopes
Vitoriano Rosa
Avelino Dias
Francisco Perestrello
Rui Afonso
Adelino Cardoso
Alberto Seixas Santos
Alberto Seixas Santos e Eduardo Geada
Antnio Cabrita
Augusto M. Seabra
Carlos Albino
Eduardo Geada
Eurico de Barros
Guilherme Ismael
Manuel Cintra Ferreira
Manuel de Azevedo
Manuel S. Fonseca
Mrio Jorge Torres
Noberto Viana
Oliveira Pinto
Vasco Santos
Alb.
Carlos Mendes Leal
D. A.
D. S.
E. M.
E. P.
Eduarda Ferreira
F.
Francisco Ferreira
Helena Vaz da Silva
I. O.
Joo Bnard da Costa
Joaquim Cavalheiro
Jorge Pinho
L. d' O. N.
M. G. R.
M. Machado Luz
Maria Fernanda Reis
Miguel Esteves Cardoso
11
10
7
4
4
4
3
3
3
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
182
Nuno de Bragana
P.
P. da C.
P. de M.
Pedro Borges
R.
Rodrigues da Silva
Servais Tiago
V.
Vera Ferreira
Vicente Jorge Silva
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
230
183
184
Delimitao do corpus
185
122
186
187
188
189
190
191
1. O recorte
Partindo deste corpus total de 230 crticas, delimitamos para o nosso
escopo de investigao o nmero de 112 resenhas. Esta seleo baseou-se
predominantemente na escolha dos filmes mais criticados nas quatro dcadas,
com algumas excees presentes na dcada de 70 e logo abaixo justificadas.
Quanto s publicaes, nossa seleo privilegiou as principais revistas, dirios e
semanrios lisboetas do perodo e suas disponibilidades nos acervos da
192
193
A Capital. 27.03.1971. Cena Sete, p. 6. Os referidos crticos foram: Alberto Seixas Santos,
Eduardo Geada e Eduardo Prado Coelho.
194
relevncia que Glauber Rocha teve para o Cinema Novo e por este ser o
realizador brasileiro de maior prestgio junto da crtica em Portugal. Outros filmes
de Glauber Rocha124 foram tambm exibidos no perodo, mas no receberam
tanta ateno da crtica quanto estes.
Para as dcadas de 80 e 90, nossa seleo seguiu o princpio geral das
resenhas dos filmes brasileiros mais criticados na imprensa. Desta maneira, as
32 crticas acerca de O beijo da mulher aranha (Hector Babenco), Eu te amo
(Arnaldo Jabor), Bye Bye, Brasil (Carlos Diegues), Pixote, a lei do mais fraco
(Hector Babenco) e pera do Malandro (Ruy Guerra) completam o nosso quadro
da dcada de 1980 e as 17 resenhas sobre Central do Brasil (Walter Salles),
Amor &Cia (Helvcio Ratton), O quatrilho (Fbio Barreto) e O escorpio
escarlate (Ivan Cardoso) constituram a unidade da dcada de 1990.
124
195
As marcas na crtica
196
197
198
Marcas retricas
1. As marcas de valor
Anos 60
Finalmente! O filme mais notvel do ano, dizia o cartaz de promoo de O
pagador de promessas num claro apelo retrico aos espectadores lisboetas. Foi
somente em Abril de 1963 que o filme, premiado no Festival de Cannes no ano
anterior e dirigido por Anselmo Duarte, estreou-se em Portugal. O filme atrara a
ateno da crtica por vrios motivos: por tratar-se de uma co-produo (lusobrasileira), por ter um ator portugus em seu elenco (Amrico Coimbra), por
levantar uma polmica religiosa ao se reportar ao tema do sincretismo religioso
brasileiro e, finalmente, por ter ganhado a palma de ouro em Cannes num
concurso em que disputavam Robert Bresson (O processo de Joana Darc) e
Antonioni (O eclipse).
A imprensa cinematogrfica portuguesa deu ampla cobertura estria do
filme, na qual estavam presentes a atriz brasileira Norma Benguel, o produtor
portugus Francisco de Castro e o ator Amrico Coimbra. A maioria dos registros
crticos publicados fez uma apreciao bastante positiva do filme, apesar das
polmicas que envolveram sua exibio. Assim, o filme foi celebrado como uma
obra singular da cinematografia brasileira. Adjetivos como notvel, pungente e
escaldante, marco luminoso, potico sem melodramatismo e tantos outros foram
utilizados para qualificar a pelcula e excitar o leitor para uma ida sala de
cinema.
199
***
A mesma apreciao (com apenas uma exceo) pode ser dada a Assalto
ao trem pagador, dirigido por Roberto Farias e exibido pela primeira vez em
Portugal no II Festival Internacional de Arte Cinematogrfica de Lisboa em
Fevereiro de 1965. Seis meses depois ganhou espao no circuito comercial no
cinema Imprio. Recebeu o prmio Caravela de Prata para Valores Humanos no
Festival e, segundo boa parte da crtica, o filme constituiu uma agradvel
surpresa uma vez que esta esperava que o representante brasileiro no evento
fosse Vidas secas.
exceo de Jos Vaz Pereira no JL que considerou Assalto ao trem
pagador, decepcionante, palavroso, retrico e no isento de demagogia125, o
filme ganhou uma boa recepo da imprensa cinematogrfica expressa nas
marcas de valor visveis nos comentrios dos crticos: obra excepcional; obra
corajosa e digna; constituiu a primeira surpresa agradvel do festival; filme pleno
de vida e de juventude, rico de contedo social 126.
***
J Vidas secas, filme de Nelson Pereira dos Santos, foi exibido em
Portugal pela primeira vez em Junho de 1966, poca do III Festival de
Internacional de Arte Cinematogrfica de Lisboa, onde ganhou os prmios da
Crtica e dos Cineclubes. No foi com surpresa, ento, que quando o filme
acedeu ao circuito comercial em Maro de 1967, a crtica de cinema ofereceu-lhe
bons comentrios. A marca de valor foi essencialmente positiva: O filme um
fresco impressionante do Nordeste, um hino forte belo e solidrio com o ser
humano. (...) Um filme terno e simultaneamente tenso, a que nenhum espectador
sensvel pode ficar indiferente.127 O Dirio Popular avalia: Vidas Secas surge-nos
como um filme sincero, verdadeiro e esse o melhor aplauso que podemos lhe
125
Jornal de Letras e Artes. 01.09.1965, p. 12. Assinada por Jos Vaz Pereira.
126
127
200
Anos 70
A fria do cangaceiro, realizado por Anselmo Duarte, foi o primeiro filme
brasileiro exibido comercialmente em Lisboa na dcada de 70. Nesta ocasio, a
crtica lusa ansiava com veemncia pela exibio das verdadeiras obras do
Cinema Novo brasileiro, isto , esperava pelos filmes de Glauber Rocha, Ruy
Guerra, Paulo Csar Saraceni, Nelson Pereira dos Santos e outros. O filme de
Duarte veio frustrar esta expectativa da crtica e talvez por isso, tenha recebido
comentrios de valor hegemonicamente negativos 131. Desse modo, o filme foi
considerado um melodrama simplista e folclrico 132 possuidor de uma pssima
banda sonora metida a martelo e de um ar pretensamente denunciador133. O
julgamento da crtica foi impiedoso e perpassado por uma significativa afirmao:
128
129
130
O nico caso de apreciao positiva foi dado pelo Dirio de Notcias que, na verdade,
reproduziu o release da produtora do filme e, por isso, no foi classificado em nossa amostra
como crtica de jornal.
132
133
201
***
Os comentrios sobre As amorosas de Walter Hugo Khouri, pelcula
exibida no 1 Festival de Cinema brasileiro em Portugal, foram permeados por
marcas de valor negativas e positivas. Os crticos Fernando Duarte (Celulide) e
Afonso Cautela (Repblica) tiveram uma boa impresso do filme a ponto de o
considerarem uma obra-prima do cinema, um dos grandes filmes de todos os
tempos134 ou ainda foi de longe a mais grata surpresa deste ingrato festival135. J
os comentrios de Jos Vaz Pereira (Dirio Popular) e Lauro Antnio (Dirio de
Lisboa) apresentaram uma avaliao negativa do filme, que possua um realismo
de pacotilha e algumas vezes roando o grotesco, um filme falso de temtica
alm de palavroso e discursivo136.
***
J as marcas de valor nas resenhas de Macunama de Joaquim Pedro de
Andrade, filme exibido no mesmo festival, foram predominantemente positivas. A
lotao esgotada (com generosos aplausos no final) nas sesses do Imprio e
do Estdio demonstra que o filme foi, sem dvida, o nico que suscitou a
unanimidade do pblico e da crtica 137. Jos Vaz Pereira considerou o filme uma
obra fora de srie em qualquer parte do mundo138 e Lauro Antnio referiu que
Macunama fica como um dos mais belos e frenticos filmes que atravessaram
Lisboa nos ltimos anos139 . A nica reserva veio da crtica de Afonso Cautela ao
relatar a falta de originalidade do roteiro: Macunama vive totalmente do romance
134
135
136
137
A Capital. Cena Sete. 27.03.1971, p.7. Assinada por Eduardo Prado Coelho.
138
139
202
***
Tambm as marcas de juzo percebidas nas resenhas sobre Antnio das
Mortes foram hegemonicamente positivas. Primeiro filme de Glauber Rocha
comercialmente distribudo em Portugal em Outubro de 1972, trs anos aps o
diretor ter recebido a Palma de Ouro de melhor realizador em Cannes. A lotao
esgotada na estria foi referida pela crtica, que recebeu o filme calorosamente:
Antnio das Mortes aparece-nos como um dos mais surpreendentes filmes
ultimamente sados dos estdios brasileiros141 ou Antnio das Mortes uma
soberba obra pica, uma colagem plstica e sonora, uma combinao
exclusiva que repe, em discusso, em termos de combate e de interveno, o
futuro do cinema142 e ainda, A arte no tem ptria assim se compreendendo
este notvel trabalho do realizador brasileiro Glauber Rocha 143.
***
J as marcas de valor nos discursos sobre O homem nu do realizador
Roberto Santos indicam juzos mistos, ou seja, o filme foi considerado
interessante em alguns aspectos, sobretudo temticos, mas pouco ousado
estilisticamente e por isso, avaliado como uma pelcula mediana. A nica
exceo veio da apreciao essencialmente negativa do crtico Tito Lvio, do
Dirio Popular, que avaliou o filme como sensacionalista e acrtico e o realizador
como um cineasta com excessiva falta de imaginao, num cinema brasileiro
que j no pode ser chamado de novo e onde aquela falta abunda144.
140
141
142
143
144
203
***
Terra em transe, segundo filme de Glauber Rocha a ser exibido
comercialmente em Portugal em Maio de 1974, contou com a presena do
realizador na sua estria. Glauber Rocha viera a Lisboa logo aps o 25 de Abril e
a imprensa deu ampla cobertura sua visita. As marcas de juzo de valor da
crtica apontaram para a boa receptividade do filme que foi chamado de filme
poltico, filme potico, cntico revolucionrio e lrico 145 e sobretudo, um filme a
no perder146.
***
O leo de sete cabeas, tambm obra do realizador Glauber Rocha e que
foi apresentado comercialmente em Portugal em Fevereiro de 1975, recebeu
avaliaes positivas da crtica lusa, embora com ressalvas de alguns crticos que
alertavam para o perigo de incomunicabilidade com o pblico que a obra
eventualmente poderia causar. Entretanto, o filme foi qualificado de importante,
polmico, fascinante, atual e urgente por grande parte da crtica que acolheu
bem a obra de Rocha.
***
A exibio em 1976 de Toda nudez ser castigada de Arnaldo Jabor
suscitou avaliaes positivas de grande parte da crtica cinematogrfica,
exceo do comentrio de Avelino Dias para a revista Celulide. Para o
semanrio Expresso, o filme uma das melhores surpresas do cinema
brasileiro147. A crtica do A Capital considera-o uma obra mordaz e que merece
ateno148. A revista Cinema 15 avalia que o filme feito com os requisitos
essenciais para agradar a uma vasta Plateia, mas sem resvalar para o mau
145
146
147
148
204
***
Grande sucesso de bilheteria em Portugal em 1977, o filme Dona Flor e
seus dois maridos de Bruno Barreto recebeu boas crticas da imprensa
exceo da avaliao de Jorge Leito Ramos no Dirio de Lisboa, embora este
no desqualificasse a obra por inteiro. O Dirio Popular refere que Bruno Barreto
transpe para o cran com talento e paixo 151 o romance de Jorge Amado. O
Dirio de Notcias diz que no filme, Barreto usou imaginao, humor e um
esprito crtico desperto e atento ao ambiente social onde o filme decorre152. A
Celulide assegura que Dona Flor uma delcia de bom humor, de requinte e de
arte, de espectculo153.
***
Acompanhado por uma forte campanha publicitria, o filme Lcio Flvio, o
passageiro da agonia do diretor Hector Babenco foi recebido com ressalvas pela
imprensa cinematogrfica lusa, ou seja, verificaram-se juzos mistos de valor.
Para Lauro Antnio, a pelcula um testemunho vigoroso e apaixonante de uma
realidade, mas no todavia, um filme perfeito 154. Jos de Matos-Cruz avaliou a
obra como contundente, chocante, apesar de algumas discutveis solues ao
nvel de acercamento visual e linearidade de linguagem155. E Jorge Leito
Ramos apesar de reconhecer uma certa habilidade em Hector Babenco, julga
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152
153
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155
205
Anos 80
As avaliaes acerca de Eu te amo do diretor Arnaldo Jabor foram
constitudas de juzos inclinadamente negativos da imprensa cinematogrfica
lisboeta. O filme foi tambm acompanhado por uma forte campanha promocional
incluindo a presena do diretor e da atriz Snia Braga na estria em 1981.
Verificaram-se alguns comentrios favorveis (em menor nmero) como o de
Lauro Antnio no Dirio de Notcias, que achou o projeto do filme fascinante e
inteligente157 e Jos Vaz Pereira que refere a qualidade da linguagem158, quer
dizer, a qualidade da interpretao, dos dilogos, da fotografia e da msica.
Entretanto, a maioria da crtica compartilha o juzo de Jorge Leito Ramos que
avalia: o jogo de Eu te amo no franco, embrulha-se em psicanlises de
pacotilha, bocas quanto realidade brasileira, tiques de vdeo e memria
cinfila, numa salada indigesta donde est ausente toda a verticalidade de
processos159. A crtica do Expresso argumenta se vale a pena escrever ou falar
sobre um filme mentiroso 160 e a revista Celulide161 interpela-se com o ttulo
irnico: Filme de qualidade?.
***
Em 1982, a recepo crtica a Pixote, a lei do mais fraco de Hector
Babenco foi, de um modo geral, favorvel ao filme, ainda que a crtica de alguns
peridicos questionasse certas opes estticas do diretor. Jos Vaz Pereira
156
Dirio de Lisboa. Sete.Sete. 1 a 7 de Junho de 1979, p. 3. Assinada por Jorge Leito Ramos.
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160
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206
avalia que desde j pode considerar-se Pixote como um dos grandes filmes de
1982162 e Lauro Antnio julga que Hector Babenco oferece-nos um filme de um
impressionante realismo, admiravelmente conseguido na sua coerncia e
consistncia estilstica e dramtica163. Enquanto que Jorge Leito Ramos
acredita que Pixote um filme invulgar. Tem garra para nos prender mas no
nos convence164.
***
Lanado um ms aps Pixote, Bye Bye, Brasil do diretor Carlos Diegues
foi recebido muito bem pela crtica lusa. A crtica do JL afirma que Bye Bye,
Brasil tem qualidade, inteligente e tambm um filme sutil que pe um pas
como objeto de um olhar que tem tanto de raiva como de amor a gui-lo165. Jos
de Matos-Cruz avalia que Bye Bye, Brasil relana a nossa estimulante
curiosidade pelo cinema brasileiro166. E Manuel S. Fonseca expressa que a fita
uma tentativa de reinventar uma quase perdida magia, sem que isso implique
vender a alma ao diabo. (...) o filme de Diegues o exemplo de um cinema que
atingiu a idade adulta167.
***
Filme do diretor Hector Babenco, O beijo da mulher aranha foi exibido
comercialmente em Portugal em 1986 e auferiu juzos mistos da crtica
jornalstica. A maioria dos crticos avaliou que o filme possui mritos (sobretudo
na performance dos atores), mas a histria desilude pois tinha potencialidades
162
163
164
165
Jornal de Letras Artes e Ideias. No 30, 13 a 26.04.1982, p. 29. Assinada por Miguel Esteves
Cardoso.
166
167
207
***
J pera do malandro de Ruy Guerra, apresentado em 1987, teve marcas
de valor predominantemente negativas, com exceo da resenha do Correio da
Manh. Os principais dirios e semanrios lisboetas avaliaram que Ruy Guerra
perdeu o tom do filme 171 e o crtico Joo Lopes acrescenta o falhano do projeto
que se parece com um produto para exportao 172. Augusto M. Seabra afirma
que apesar da co-produo franco-brasileira, Guerra no teve os meios, nem
sobretudo o talento de recriar a exuberncia do musical 173.
Anos 90
Aps vrios anos de retrao, em 1996 O quatrilho de Fbio Barreto
finalmente estria no circuito comercial portugus. As marcas de juzo deram um
valor mdio para a pelcula, considerando que, embora no sendo um grande
filme, uma obra limpa, hbil no jogo dos sentimentos e das paixes, e que
apesar de receber uma nomeao para o Oscar, foi-lhe atribudo uma
168
169
170
Dirio Popular. Sbado Popular. 08.03.1986, p. 16-17. Assinada por Tito Lvio.
171
Jornal de Letras Artes e Ideias. N 258, 15 a 21.06.1987, p. 27. Assinada por Pedro Borges.
172
173
208
***
Em 1999, as resenhas a propsito de Amor & Cia de Helvcio Ratton
apresentaram marcas de juzos com uma inclinao para a desaprovao do
filme. A crtica do Pblico comparou-o queles filmezinhos quase artesanais
destinados na essncia, a pblicos escolares (...)176. O crtico Antnio Cabrita, no
Expresso, afirmou que estes projetos de co-produo (...) tm redundado em
objetos de nula qualidade esttica (...)177.
***
Relativamente s resenhas a respeito de Central do Brasil, publicadas
tambm em 1999, o predomnio foi para a valorao negativa da pelcula.
Lanado em Lisboa em vrias salas simultaneamente e acompanhado por uma
forte campanha publicitria, o filme do diretor Walter Salles parece no ter
agradado maioria da crtica de cinema dos jornais, com exceo das crticas
do A Capital e do Correio da Manh. Mrio Jorge Torres considera que o filme
apenas um produto para exportar num dilvio de falsas emoes, impregnadas
de lgrima fcil, muito muito longe da pretendida reincarnao do Cinema
Novo178. Eurico de Barros avalia Central do Brasil como um filme previsvel,
imediatista e muito montono 179. J Francisco Perestrello avana: Central do
Brasil tem como principal qualidade assumir as suas caractersticas muito
174
175
176
177
178
179
Dirio de Noticias. Artes e Multimdia. 14.05.1999, p. 46. Assinada por Eurico de Barros.
209
***
Por fim, alguns dias aps a estria de Central do Brasil, outro filme
brasileiro entra em cartaz em Lisboa. Trata-se de O escorpio escarlate do
diretor Ivan Cardoso e premiado com um especial do jri do Fantasporto de
1998. As marcas de valor exibidas nas poucas crticas ao filme foram positivas e,
segundo a resenha do Correio da Manh, a pelcula uma inteligente e divertida
mistura de gneros181. O filme foi visto como uma bem humorada caricatura de
vrios aspectos dos anos 60 e uma obra de excessos182 que mistura humor e
terror.
2. As marcas de justificao de valor
Anos 60
Os argumentos que sustentaram o juzo positivo da crtica de O pagador
de promessas centraram-se predominantemente na escolha e excelente
adaptao da histria original de Dias Gomes e no modo como Anselmo Duarte
conseguiu mold-la para a linguagem do cinema. Observou-se que todas as
resenhas optaram por discutir primeiro os aspectos de enredo e contedo ao
narrar a histria cuja ao gira em volta de um humilde caboclo dos sertes da
Baa que promete imagem de Santa Brbara, o percurso de 35 quilmetros
com uma cruz s costas, depondo-a depois a seus ps, se o seu burro Nicolau,
escapar de uma doena que o assaltara 183. Algumas questes foram levantadas
pelos crticos como o porqu da dramtica histria de Z do Burro ter chamado
a ateno de Cannes e a questo religiosa que envolveu sua mensagem. Por
outro lado, no h quaisquer referncias ao aspecto poltico que envolvia o tema:
180
181
182
183
210
184
185
Por exemplo, neste trecho da crtica de Servais Tiago: O pagador de promessas deve ser
encarado como um filme invulgar, no s pelo que nele expresso plstica, apontamento
pictrico, mas sobretudo pela mensagem humana, pela impressiva comunicabilidade flmica da
sua linguagem. Plateia. N 148, 01.05.1963, p. 55.
211
colaboradores registrar e repetir os gestos e a fala do povo 187. Outro dado que
merece ser ressaltado que as marcas de aspectos formais presentes nas
crticas so mais visveis nas resenhas da imprensa especializada, apesar de
seus enunciados mostrarem um uso abundante de adjetivos para fundamentar
os elementos tcnicos como, por exemplo: H que contar com a fora e a
impressividade da narrao (...) com a souplesse invejvel da cmara, (...)
com a beleza e o acento potico de muitos ngulos, o sortilgio rtmico das
seqncias de conjunto, onde com audcia planos gerais se aliam a planos de
ngulo curto188. Evidentemente que a poca (e o leitor) solicitava um texto com
tamanhos qualificativos para um movimento de cmara ou para um plano, mas a
idia essencial - por sinal, bastante utilizada, com a devida atualizao do
quadro de adjetivos, no discurso da crtica at os dias de hoje - a transferncia
de sentido. Para o leitor, um plano audacioso evoca a idia de atrevimento e
coragem e, portanto, um plano digno de visualizao189. Ainda em relao a uma
transferncia de sentido, o uso de metforas e analogias foi outro recurso
retrico utilizado pela crtica. Cmaras com agilidade da serpente, do pssaro190
ou um filme em que subimos e descemos as escadas com o protagonista191
ilustram bem a utilizao desta linguagem figurativa num discurso que pretende
convencer o leitor.
***
Nas resenhas do filme Assalto ao trem pagador identificamos marcas de
justificao de valor positivo fundamentadas na mensagem de crtica social do
187
Jornal de Letras e Artes. 01.05.1963, p. 11. Assinada por Jos Vaz Pereira.
188
189
Outro exemplo colhido no Dirio de Lisboa. 18.04.1963, p. 3 em crtica assinada por Manuel
de Azevedo: Movimentos de cmara ousados, a par de uma ingnua panormica das massas
populares contribuem em muito para a criao de um clima verista quase conseguido. O uso
permanente de cenrios naturais, uma montagem desembaraada e gil, a utilizao subtil de
uma simbologia religiosa, contribuem para dar s cenas uma significao que ultrapassa o valor
simples da imagem.
190
191
Jornal de Letras e Artes. 01.05.1963, p. 11. Assinada por Jos Vaz Pereira
212
192
193
194
213
***
J as marcas de justificao de valor positivo observadas nas resenhas
sobre Vidas secas apresentaram um equilbrio entre os critrios de forma e de
contedo. So ressaltadas as opes estilsticas presentes em Vidas secas
como na fotografia sabiamente baa, na aparncia de rudeza do ritmo geral do
filme e at dos prprios enquadramentos, na propositada nudez da banda
sonora, como salientou o crtico Manuel Machado da Luz na revista Seara
Nova197. Como mencionamos antes, o emprego de expresses qualificativas visa
fornecer ao leitor uma associao de sentido que o conduza para a aceitao do
filme. Trata-se de um filme que paralisa por sua imagem realista, quase
documental, cujo sentido de durao parece acompanhar o tempo lento vivido
pelas populaes no nordeste brasileiro. Joo Bnard da Costa discorre sobre
uma excessiva durao vista no filme, contudo revela: Nelson Pereira dos
Santos caminhou obstinadamente ao encontro dela [da excessiva durao] e
desse encontro s muito raros raramente so capazes198 . O aparato estilstico do
filme foi, sem dvida, motivo de grande impacto da apreciao positiva a que o
filme recebeu na revista O Tempo e o Modo e expe uma anlise influenciada
195
Como neste trecho da crtica de Lauro Antnio na citada revista Plateia: O filme tem defeitos
flagrantes. Sobretudo no que respeita sua narrativa. Tem, todavia, muitas mais e bem mais
importantes virtudes.
196
197
Seara Nova. N 1457, Maro de 1967, p. 91. Assinada por M. Machado Luz.
198
O Tempo e o Modo. N 37, Abril de 1966, p. 538. Assinada por Joo Brnad da Costa.
214
199
200
215
Anos 70
As marcas negativas de valor presentes nos textos sobre A fria do
cangaceiro foram justificadas com argumentos fundamentados, sobretudo, no
fato de o diretor preferir seguir o caminho da exibio em tons de folclore da
realidade brasileira, afastando-se, assim, por completo dos ideais do Cinema
Novo. Para a crtica, Anselmo Duarte se apropriou de temticas presentes no
Cinema Novo o fenmeno do cangao e a misria do nordeste brasileiro mas
redefiniu suas pretenses de realismo crtico para um realismo de tonalidade
melodramtica e sentimental. Lauro Antnio, no Dirio de Lisboa, questiona-se a
si prprio e ao leitor o que esta pelcula tem a ver com o Cinema Novo e afirma:
A fria do cangaceiro antes, um amontoado de lugares-comuns sobre o
Cangao, seu folclore, sua situao histrico-social. De um ponto de vista
cinematogrfico, a pelcula um repositrio de bilhetes postais destinados
circulao no estrangeiro, para propaganda das belezas naturais do Brasil e de
suas nativas201. Tito Lvio no Repblica apela s emoes do leitor ao dizer:
Quo longe estamos do novo cinema brasileiro, de Deus e o diabo na terra do
sol, de Vidas secas, de Nelson Pereira dos Santos, dos filmes de Lima
Barreto (autor do argumento) e de Ruy Guerra! Cinema, este sim de testemunho,
de denncia, de lcida presena202. A comparao com o Cinema Novo vai
estabelecer os parmetros de critrios utilizados pela crtica para julgar o filme.
Por outras palavras, o Cinema Novo servir de argumento para a apreciao do
filme: Anselmo Duarte (...) no tem nada a ver com os novos cineastas e
perfeitamente abusivo assimil-lo s intenes do Cinema Novo 203.
As alegaes para a avaliao negativa do filme fundamentaram-se
tambm nas suas deficincias estticas. Em quase todos os comentrios so
referidas a folclorizao e assepsia da imagem fotogrfica e a tentativa frustrada
do diretor em utilizar referncias do gnero western e ainda: (...) um dilogo
201
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***
Nas resenhas sobre As amorosas, de Walter Hugo Khouri, as justificaes
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J nas resenhas sobre Macunama, as marcas de justificao de valor
fundamentaram-se principalmente na valorizao do enredo e da histria de um
brasileiro que foi comido pelo Brasil, nas palavras do realizador Joaquim Pedro
de Andrade, citadas em diversas resenhas. Foi destacado o fato de o filme ser
produto de uma boa adaptao do romance de um dos lderes do movimento
modernista brasileiro, Mrio de Andrade, e sobretudo a originalidade da
apresentao de uma temtica carregada de alegorias sobre o povo brasileiro e
sobre o prprio Brasil: Admirvel resulta a lio da histria, da dupla personagem
e dos atores, apresentando-nos Macunama sem indulgncia mas no sem
ternura, o brasileiro e todo um mundo complexo que o devora212. Em quase
todas as crticas, os critrios relacionados ao contedo da histria prevaleceram
e a mensagem em forma de stira do filme condicionou as resenhas: Universo
satrico e grotesco, Macunama mostra como os grandes comem os
pequenos, e de como estes, enquanto se aprestam para devorar os grandes, se
alimentam de si mesmos213. Alm disso, para a crtica, a mensagem do filme se
conformava com as propostas do Cinema Novo (ainda que em sua fase
terminal), uma vez que Joaquim Pedro de Andrade foi um dos integrantes do
movimento.
Obra de proposta nacionalista, Macunama foi tambm apreciada pelo seu
lado esttico e, se um filme choque, adverte a crtica ao leitor, porque se
inscreve numa dupla ruptura: ruptura com a lgica comum da estrutura ficcional
(que uma lgica de causa-consequncia ao longo de seqncia) e ruptura com
a moral dirigvel atravs de um certo nmero de transgresses pela palavra e
pela imagem. (...) Mais pelo seu processo e pela sua desenvoltura do que pela
sua problemtica especfica, a obra de Joaquim Pedro de Andrade (seguindo
dum modo bastante fiel o texto de Mrio de Andrade) caracteriza-se pela rejeio
de qualquer hiptese intelectualista (...) ou de qualquer hiptese esteticista para
212
213
219
***
As alegaes para um juzo unanimemente positivo da crtica a Antnio
das Mortes deveram-se conjugao dos aspectos formais e de contedo que o
filme apresentara. Vasco Santos, na revista Plateia, resume bem o porqu da
atribuio positiva da crtica, ao afirmar que o filme um Espectculo inslito,
extico e alucinante, de um lirismo macabro, panfletrio, de enorme fora
expressiva, numa linguagem eloqente, implacvel, em que todos os elementos
se conjugam, desde a encenao excepcional contribuio musical, desde a
denncia sciopoltica participao do povo. (...) desde a qualidade tcnica
(belssima fotografia) ao concurso de destros atores217. Nas resenhas verificouse que o enredo era carregado de alegorias e mitologias, marca dos filmes de
Glauber Rocha e do prprio Cinema Novo. Glauber Rocha, para os crticos,
conseguira produzir uma obra de moderna inveno com toques de vanguarda
esttica e poltica. Antnio das Mortes era, para a crtica, um exemplar de
cinema moderno de autor.
Verificou-se tambm que entre as alegaes estava o fato de o filme j ter
sido bem recebido pela crtica internacional e seu diretor ter ganhado o prmio
214
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217
220
***
Nas resenhas sobre o filme O homem nu, as justificaes para um
parecer mediano fundamentaram-se na ineficcia do realizador em promover
uma narrativa que sustentasse a temtica de crtica burguesia citadina
brasileira. Por outro lado, so salientados outros aspectos mais positivos, como
o destacado por Joo Lopes no Repblica: (...) parece-me necessrio assinalar a
estreia de O homem nu como um caso que, apesar de sua fragilidade,
procura, de algum modo, afastar-se do convencionalismo do cinema vigente 220.
As alegaes pautaram-se preferencialmente pelo inslito da histria (baseada
num conto de Fernando Sabino) de um homem nu que corria pelas ruas da
cidade do Rio de Janeiro, o homem tal como ele no seu todo, esmiuando as
suas imperfeies, as suas virtudes, o seu encontro consigo mesmo no dia a dia
da sua vivncia221.
Em todas as resenhas, sobretudo na crtica contundente de Tito Lvio, fezse notar que um dos principais fios condutores das alegaes foi o fato de O
homem nu no representar o bom cinema brasileiro: Do cinema novo
brasileiro, da dcada de 60, no resta mais que um rtulo, ou apenas as suas
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***
As alegaes para a apreciao positiva de Terra em transe
fundamentaram-se sobretudo nos aspectos de contedo, isto , na mensagem
poltico-ideolgica da obra. A histria a de Paulo Martins, um poeta anarquista
que busca servir o movimento revolucionrio de um qualquer pas da Amrica
Latina denominado eufemisticamente de Eldorado. Mas, Paulo Martins nunca se
consegue libertar da sua condio de artista burgus que v o povo como uma
massa curiosa, sim, mas mal esclarecida, esfomeada e incapaz de servir de
base a qualquer transformao poltica radical223. O contedo revolucionrio do
filme foi marcante para a avaliao da crtica, que justificou sua sentena: (...)
existe aqui como principal constante propositadamente marcada, a violncia
exercida como forma de controle poltico, de neutralizao dos elementos tidos
como potencialmente perigosos224. Lauro Antnio, na crtica do Dirio de Lisboa,
contudo, exprime uma ressalva que tambm uma marca de tempo importante,
ao criticar certo intelectualismo do filme: (...) sendo uma anlise correta de um
processo poltico e revolucionrio acaba por se enredar num perigoso
intelectualismo de escrita que afasta o filme de um contato concreto com as
camadas populares que procura servir225.
Alguns aspectos estilsticos do filme foram tambm destacados nas
resenhas como a fotografia mas, principalmente a msica, considerada elemento
fundamental do discurso e indispensvel deste cinema da crueldade, onde nada
222
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224
225
222
***
Do mesmo modo, as marcas de justificao de valor nos comentrios
sobre O leo das sete cabeas pautaram-se nos polmicos aspectos de
contedo que o filme carregava. Para a crtica, era especialmente importante
que o leitor assistisse obra de Glauber Rocha uma vez que esta exibia o
desmascaramento das alianas do imperialismo e sua cara-metade, a violncia,
e os seus agentes mais devotados, com as faces instrumentos-fantoche do
poder econmico internacional227. Apesar de considerar a simbologia do filme
impenetrvel para aqueles mais desatentos, Jos Vaz Pereira considera que O
leo das sete cabeas merece ser mostrado onde as populaes ainda no
sabem o que colonialismo, o que so mercenrios, burguesia colaborante,
imperialismo, etc228.
As alegaes tambm remetem a elementos estticos. Lauro Antnio
salienta que o filme traz de novo o cinema de Glauber Rocha ao primeiro plano
da discusso poltica e esttica 229 e refere s semelhanas entre os longos
planos-sequncia do filme e os idnticos processos de Jean-Luc Godard. Outros
aspectos como o enquadramento e o realismo da imagem foram tambm
levantados: sob o aspecto visual, Rocha volta a demonstrar as suas qualidades
de homem que consegue impacto em cada imagem. Nenhum enquadramento
nos deixa indiferente, tanto mais que o cineasta brasileiro sabe aproveitar, duma
maneira humana e sensvel, a fotogenia africana 230.
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***
As justificativas de valor nas recenses acerca de Toda nudez ser
castigada enfatizaram os elementos de contedo e estticos, ou seja, o modo
custico como Arnaldo Jabor trata a questo da moralidade sexual, utilizando as
estratgias do folhetim para alcanar a ateno dos espectadores: Jabor faz
Brecht com uma estrutura de folhetim, faz-nos rir com situaes de melodrama,
faz cinema com um filme cem por cento teatral 231, diz a crtica do Expresso.
Jorge Leito Ramos argumenta que o filme trabalha com a idia do absurdo e da
farsa: Estamos ento em pleno reino da farsa, da farsa de costumes, e o
resultado um filme ultradivertido onde ante os nossos olhos se desmancham
no s os fios da verosimilhana fotonovelesca como algumas das instituies
morais mais caras burguesia 232. A valorizao esttica da obra tambm foi
destacada no que diz respeito interpretao dos atores, a fotografia, os
cenrios e sobretudo aos dilogos.
Contudo, a crtica da Celulide sustentou que o enredo (imbrglio) do
filme tinha um valor de descrdito e (...) se o caminho que segue o novo (?)
cinema brasileiro, como parece inculcar o programa do 444 onde aquele foi
desembocar. Que desiluso233. Mais uma vez, aparecem marcas indicando que
o Cinema Novo servia de parmetro para o julgamento do cinema brasileiro.
***
J as marcas de justificao de valor presentes nos comentrios sobre
Dona Flor e seus dois maridos remetem para a boa adaptao da histria do
escritor Jorge Amado, alm da excelente reconstituio de poca promovida por
Bruno Barreto: Ele domina, como criador, todo o filme e dirige, com acerto todos
os artistas, sabendo tirar deles subtilezas e cambiantes e fazendo um retrato da
sociedade brasileira daqueles anos de 40, a Baa, o carnaval, a culinria, a
231
232
233
Celulide. Nos. 226, Junho de 1976, p. 17. Assinada por Avelino Dias.
224
***
Os comentrios sobre Lcio Flvio, o passageiro da agonia apresentaram
marcas de justificao de valor sustentadas principalmente nos elementos
narrativos da histria (baseada num caso verdico) de um famoso marginal que
se alinhou a uma fora parapolicial - o Esquadro da Morte e acabou sendo
tambm vtima deste poder paralelo. Lauro Antnio argumenta que Lcio Flvio
uma obra de grande densidade e vigor e acrescenta que desta relacionao
entre marginais e homens da ordem institucionalizada pelo poder que resulta o
interesse maior desta pelcula violenta e brutal que colhe diretamente do cinema
americano de fluncia descamada e sincopada237 . Entretanto, Jorge Leito
Ramos avalia que o filme possui uma frgil fragilidade de um certo libi poltico
(denncia do Esquadro da Morte). Para o crtico do Dirio de Lisboa, devemos
tomar o filme como ele , quer dizer, como uma histria de cafajeste contada
234
Celulide. Nos. 234/235, Dezembro de 1976, p. 28. Assinada por Fernando Duarte.
235
236
237
225
com escorreiteza tcnica mas sem grande coisa que a diferencie do vulgar
comrcio da violncia flmica238. Tal como em Dona Flor, a crtica do Dirio de
Lisboa v com desconfiana a grande campanha de promoo do filme e o apelo
fcil de pblico.
Anos 80
A justificao do julgamento desfavorvel para Eu te amo de Arnaldo
Jabor baseou-se nos elementos temtico-estticos apresentados no filme. A
crtica salientou a nfase no nu comercial proposta pelo filme, que expe o
enredo e os atores numa clara tentativa de apelar s grandes massas de
espectadores. Para a crtica do JL, a dupla proposta do filme de ter um carimbo
de qualidade e de modernidade falsa, pois na verdade Eu te amo se utiliza de
uma gama completa de teclas rentveis239. O Expresso alega que as falas no
filme so suficientemente vagas ou doseadamente panfletrias e as sugestes
sexuais so tambm admirveis de cinismo240. E o Dirio de Lisboa critica a
interpretao dos atores: Snia Braga e Vera Fischer so belssimas mas os
seus espasmos e trejeitos no est (sic) longe do vulgar macaquear do gozo que
qualquer filme do Olmpia canhestramente d 241. Por outro lado, uma pequena
parcela da crtica destacou a beleza da msica de Tom Jobim e Chico Buarque,
que d uma envolvncia emocional e lrica ao filme, a fotografia notvel que
criou um ambiente irreal, cheio de cores sensuais e por fim, a cmara acaricia os
corpos, f-lo (sic) viver, sublinha a sua expresso. Ora arrebatado ora irnico, o
filme de Arnaldo Jabor vai ser uma das sensaes da temporada242.
238
Dirio de Lisboa. Sete.Sete. 1 a 7 de Junho de 1979, p. 3. Assinada por Jorge Leito Ramos.
239
240
241
242
226
***
J as alegaes para uma avaliao favorvel observada nas recenses
acerca de Pixote, a lei do mais fraco, remetem sobretudo para os elementos de
contedo da pelcula. Em quase todas as resenhas, o modo como o diretor
tratou do tema da marginalidade, dos excludos sociais e da falncia dos
organismos que tratam da delinquncia juvenil foram destacados e usados como
critrio de juzo do filme. Maria Fernanda Reis argumenta que Pixote , de fato, o
drama de uma criana marginalizada e um belo filme de crtica social243. A
resenha do JL declara: E a verdade que Babenco parece querer-nos
convencer de que estamos no reino da sociologia e no nesse reino muito mais
delirante que o do cinema244. Outras justificativas de juzo basearam-se na boa
atuao dos atores, sobretudo na protagonista admiravelmente interpretada por
Marlia Pra 245 e tambm nas crianas-atores, todas elas sem experincia
anterior na rea. O realismo do filme tambm foi destacado: Pixote prova
ainda que no substituto para o dcor real: nesse aspecto, o filme est perto
do neo-realismo, mas longe de seu esquematismo; claro que h carrascos e
vtimas mas o verdadeiro monstro o sistema246. Mas, a crtica do Expresso
considera que no se pode esconder que o filme enferma da falta de um projeto
esttico capaz de fazer ultrapassar a tipificao, projetando-o para a
universalidade 247.
***
As marcas de justificao de valor positivo da crtica a propsito de Bye
Bye, Brasil fundamentaram-se primordialmente na temtica do filme, embora
outros aspectos fossem tambm destacados, como a boa caracterizao dos
243
Celulide. No. 334, Abril de 1982, p.15-101. Assinada por Maria Fernanda Reis.
244
Jornal de Letras Artes e Ideias. No. 27, 2 a 5.03.1982, p. 35. Assinada por Guilherme Ismael.
245
246
247
227
personagens e a trilha sonora. Lauro Antnio argumenta que o filme uma hbil
conjugao de documentrio e fico que se expressa essencialmente como
narrativa dramatizada, mas que colhe da escaldante realidade social e cultural
brasileira o cenrio exato para uma viagem pelo seu interior 248. Miguel Esteves
Cardoso expe as razes que o levaram a um parecer favorvel: a razo nmero
um, pois, a qualidade de Bye Bye Brasil. No como filme brasileiro, no
como filme terceiro-mundista, no como grito do Ipiranga da cinematografia
sul-americana mas apenas, como filme de cinema 249. E Jos de Matos-Cruz
justifica que atravs do perfil psicolgico de seus protagonistas, denso e
enigmtico, que encontramos um aliciante fio condutor, detectvel na forma
como palmilham o destino, ou partilham emoes e sentimentos, sem
compromissos inibidores250.
***
J nas resenhas acerca de O beijo da mulher aranha os argumentos para
os juzos mistos residiram sobretudo na adaptao simplificadora que Hector
Babenco fez da obra de Manuel Puig, uma adaptao infeliz sobretudo porque
houve a tentao de abrir o filme para outros cenrios, anulando a intensidade
que se poderia conseguir com a unidade de dcor251. A m atuao de Snia
Braga foi tambm justificativa para a crtica: evidente tudo o que de fcil h
neste filme, desde um populismo miserabilista at ao fracasso absoluto da tripla
presena de Snia Braga 252. Entretanto, em todas as resenhas a excelente
performance de Willian Hurt foi destacada como a melhor, seno nica coisa
aprecivel do filme, apesar da crtica do Dirio de Lisboa ir alm: Este filme no
isento de falhas longe disso mas miopia menosprez-lo ou sequer reduzi-
248
249
Jornal de Letras Artes e Ideias. No. 30, 13 a 26.04.1982, p. 29. Assinada por Miguel Esteves
Cardoso.
250
251
252
228
***
Nas resenhas acerca de pera do malandro, as alegaes de valor
negativo da crtica residem em critrios temticos (gnero) e estticos. Ruy
Guerra falha na tentativa de fazer um musical enquanto gnero maior do cinema
americano, principalmente pela limitao de suas condies de produo,
argumenta a crtica do Expresso: por um lado o realizador fetichiza os meios de
produo espetacular (cenrios sobretudo) mas, por outro lado, esses meios
esto sujeitos a comparaes que realam esta pera do Malandro como sendo
sobretudo a pera do pobre254. Joo Lopes avalia que o grande problema do
filme que Ruy Guerra tenta fazer um musical que, de algum modo, se
parea com o modelo clssico americano 255. A construo e o tratamento
dado aos personagens foi tambm um elemento de justificao de valor
principalmente na crtica do JL: No fundo, o que faltou a Ruy Guerra foi a
passagem para o lado de dentro dos seus personagens, que a multiplicidade de
pontos de vista que o cinema pode adotar facilitaria, mas que a sisudez com que
parece ter encarado o projeto limitou256. Como pontos positivos, alguns crticos
salientaram a boa interpretao dos protagonistas (sobretudo Elba Ramalho) e
certas seqncias bem conseguidas, com coreografias e dcor estilizados.
Anos 90
Nos comentrios acerca de O quatrilho, as marcas de valor mediano
basearam-se, sobretudo, no modelo escolhido pelo diretor para contar sua
253
254
255
256
Jornal de Letras Artes e Ideias. N 258, 15 a 21.06.1987, p. 27. Assinada por Pedro Borges.
229
***
Em relao a Amor & Cia, a defesa de um juzo negativo sustentou-se em
critrios estticos, sobretudo aqueles relacionados com a adaptao da histria
de Ea de Queirs. Mrio Jorge Torres argumenta: Ora, a viso desta adaptao,
agora rebatizada de Amor & CIA e geograficamente deslocada para almatlntico, perde o valor de sintoma social e sofre uma sobrecarga de
superficialidade decorativa259. Esta infeliz adaptao artesanal da obra literria
para o cinema foi tambm justificada pelo mesmo crtico na opo pelo modelo
televisivo adotado pelo diretor e no desempenho dos atores: E, no entanto, a
noo de teatro televisivo nunca sai dos nossos olhos, os cordelinhos de uma
representao compungida marcam todos os secundrios e o registro forado de
Alexandre Borges, num pouco credvel gal. Tambm Antnio Cabrita argumenta
na mesma linha: O problema que Horcio Ratton no descola de uma certa
eficcia de seriado televisivo e limita-se a ilustrar a trama sem alcanar a
intensidade cinematogrfica que legitima a passagem de uma linguagem para
257
258
259
230
outra 260.
***
J as alegaes para um julgamento desfavorvel acerca de Central do
Brasil deveram-se tanto a elementos de ordem esttica quanto queles de
ordem temtica. Ou seja, para grande parte da crtica, h no filme uma
estetizao da misria no nordeste brasileiro onde o realizador explora o
infortnio humano em forma de um arremedo de neo-realismo, sem nervo nem
interveno social 261. A crtica do Pblico tambm argumenta que o problema
fulcral de Central do Brasil resulta deste branqueamento temtico e estilstico,
quer dizer, uma recusa de qualquer politizao profunda das questes, o objetivo
apelar lgrima fcil (...)262.
Mas a valorao negativa fornecida Central do Brasil baseou-se,
sobretudo, em dois pontos: primeiro no era aceitvel comparar o filme de Walter
Salles s obras do Cinema Novo e segundo a influncia do modelo de telenovela
denunciada no filme. A crtica do Dirio de Notcias avalia que preciso ter o
sentido das propores e no desatar a evocar o Cinema Novo dos anos 60 e
70. Nem Walter Salles a reincarnao de um Glauber Rocha, nem Central do
Brasil uma pedrada revolucionria na vitrina do ramerro cinematogrfico
brasileiro. (...) A histria (...), funciona em parte base dos mecanismos
narrativos e dramticos da telenovela, em parte encarreira na tradio do
realismo de denncia documental do cinema brasileiro 263. Do mesmo modo, o
comentrio do Expresso afirma que Walter Salles atualiza o modelo [de
explorao da misria extica] com mtodos da telenovela264. Por outro lado,
uma pequena parte da crtica destacou a qualidade do argumento e a
260
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262
263
Dirio de Notcias. Artes e Multimdia. 14.05.1999, p. 46. Assinada por Eurico de Barros.
264
231
***
Por fim, os argumentos para um julgamento positivo do filme O escorpio
escarlate de Ivan Cardoso residiram na narrativa, ou melhor, na forma bem
humorada que o realizador encontrou para contar a histria dividida em duas
estruturas paralelas: Uma decorre no mundo real; a outra no entrecho da
radionovela. Entre os dois mundos cria-se um paralelismo total, de que a
montagem tira um partido muito especial, realando os contrastes ao mesmo
tempo que atenua as seqncias de ligao. (...) O maior trunfo do filme reside
no humor que est implcito em cada caricatura apresentada. (...) Mesmo sem
provocar, em geral um riso aberto, tal humor tem resultados positivos e d um
bom suporte ao desenvolvimento da ao266. A propositada mistura de gneros
(terror e comdia) foi tambm justificativa para a avaliao do filme, mistura
considerada uma combinao originalssima utilizando alis a imensa graa e,
at, a beleza ertica da mulher brasileira, atravs de um jogo de atrizes que se
desdobram em caricaturas certeiras de gnero obviamente vulnerveis267.
3. As marcas de estratgias de persuaso
Anos 60
Em relao s questes de organizao e estilo no filme O pagador de
promessas, as marcas indicam que houve a prevalncia do resumo da histria
do filme logo no primeiro pargrafo, seguido de uma apreciao e alegao
265
266
267
232
***
As resenhas sobre Assalto ao trem pagador apresentaram marcas de
estilo bastante semelhantes s de O pagador de promessas. Tambm nos
268
Jornal de Letras e Artes. 01.05.1963, p. 11. Assinada por Jos Vaz Pereira.
233
***
Em relao ao filme Vidas secas, marcas retricas observadas em alguns
comentrios revelaram-se na fora persuasiva dos textos, desde a
demonstrao de erudio cinematogrfica compondo a natureza do Ethos dos
produtores do discurso, como se pode notar neste trecho: Vidas secas, de 1963,
o filme mais significativo de Nelson Pereira dos Santos que , por sua vez, o
mais significativo representante do Cinema Novo, que por sua vez, a
expresso at agora de maior expanso mundial do novo Brasil, quero dizer, do
Brasil visto pelas suas mentalidades mais lcidas271. O crtico j no primeiro
pargrafo exibe seu conhecimento do autor da obra e do Cinema Novo brasileiro
ainda pouco conhecido em Portugal. Neste novo cinema, o Brasil apresentado
de forma mais lcida sem o emblema do carto-postal e, portanto, presta-se
mais a um cinema que garante sua identidade. Clamar ao leitor e futuro
espectador do filme, usando expresses como nenhum espectador sensvel
269
270
271
234
pode ficar indiferente 272 ou Algo de litnico transforma este filme imperfeito numa
apaixonante obra de cinema 273, revela o apelo s emoes do pblico que adere
a este pathos discursivo.
Outro sinal exibido nas resenhas de Vidas secas que no h uma
uniformizao de estilo na escrita, apesar do emprego abundante de adjetivos
ser um fator comum. Mesmo entre as crticas publicadas nos jornais, as
diferenas so visveis entre os estilos de um e outro crtico. claro que
prevalecia o estilo gil e objetivo da prtica jornalstica, mas as diferenas
podem ser observadas em alguns comentrios inclinando-se mais para o rpido
descritivo e outros dedicando maior tempo anlise formal do filme. O Dirio de
Lisboa, contudo, apresentou o estilo mais conservador, onde pode ser visto o
relato ou crnica social da estria muito comum ao jornalismo at meados dos
anos 60274. O texto de Joo Bnard da Costa (O Tempo e o Modo) diferenciou-se
dos demais na composio de um estilo de escrita muita prxima do ensaio. Seu
comentrio desliza para uma espcie de pensamento livre sobre o filme, o qual
certamente s foi possvel por tratar-se de uma publicao voltada para o
pensamento e idias.
Anos 70
Nas resenhas sobre A fria do cangaceiro percebeu-se uma mudana na
estilstica do texto crtico. Alm de textos mais agressivos e contundentes, as
resenhas passam a afirmar o ethos do autor uma vez que agora os comentrios
esto devidamente assinados, o que parece ser um passo para a
profissionalizao do setor.
Foram verificadas marcas de estratgias de persuaso geradas a partir de
272
273
O Tempo e o Modo. N 37, Abril de 1966, p. 538. Assinada por Joo Brnad da Costa.
274
Como podemos observar neste trecho: A estreia de ontem assistiram numerosos membros da
colnia brasileira, entre os quais o Dr. Odylo da Costa Filho, adido cultural embaixada do Brasil,
que muito contribuiu para ser possvel a exibio entre ns deste belo exemplo do jovem cinema
de alm-Atlntico. Dirio de Lisboa. 31.03.1967, p. 6. Vale salientar que outros jornais como o
Repblica j no apresentavam esse tom elogioso.
235
entimemas ou premissas dadas como j aceitas pelo leitor: (...) Anselmo Duarte
no novo cinema brasileiro e A fria do cangaceiro est muito longe de
constituir um filme de denncia lcida e consciente 275. Em quase todos os
comentrios foi fundamental a preocupao em distinguir A fria do cangaceiro
do Cinema Novo brasileiro. Esta distino dada como uma concluso e no
como uma inferncia, que o leitor convencido a seguir.
O crtico Eduardo Geada, no jornal A Capital, apresentou um entimema de
apelao autoridade para sustentar sua convico (e a dos leitores) de que A
fria do cangaceiro, alm de no representar o verdadeiro Cinema Novo
brasileiro, possua ingredientes falaciosos para agradar a determinado pblico,
ou seja, ao grande pblico. A apelao autoridade de Glauber Rocha que
considerava estes ingredientes como mentiras elaboradas da verdade (os
exotismos formais que vulgarizam problemas sociais) conseguiram-se comunicar
em termos quantitativos, provocando uma srie de equvocos que no terminam
nos limites da arte, mas contaminam, sobretudo, o terreno geral do poltico276. A
crtica lusa no s apreciava Glauber Rocha, conhecia tambm seus trabalhos
escritos e comungava com ele seus ideais de um cinema revolucionrio, o que
reforou sua autoridade e competncia no processo de convencimento do leitor.
Outras marcas revelam que a organizao do discurso nas resenhas de A
fria do cangaceiro acompanhou o padro dos anos 60, no qual os crticos
procuraram inicialmente fornecer informaes acerca do novo cinema brasileiro,
emitiam um juzo do filme s que agora acrescido de uma comparao com o
Cinema Novo, depois apresentavam os argumentos para confirmar o julgamento
no final da resenha.
***
As marcas de estratgias de persuaso nas resenhas sobre o filme As
amorosas perpassam pela mesma agressividade de estilo da escrita. As
275
276
Depoimento de Glauber Rocha citado por Eduardo Geada em A Capital. 28.11.1970, p. 19.
236
***
Identificamos, desta vez nos comentrios sobre Macunama, marcas de
um discurso para convencer o leitor atravs da demonstrao do ethos do
crtico. Seu conhecimento e erudio cinematogrfica informavam ao leitor a
histria do movimento modernista brasileiro a fim de chegar aos argumentos
favorveis ao filme: A antropofagia esteve na base do modernismo brasileiro
literrio no Brasil. Nascido da Semana de Arte Moderna (Rio de Janeiro,
277
237
***
As marcas de estratgias de persuaso nas resenhas sobre Antnio das
Mortes fundamentaram-se na proposta de convencer o leitor de que se tratou de
um filme premiado em Cannes e pertencente ao grande representante do
Cinema Novo brasileiro, Glauber Rocha: (...) nos encontramos em presena de
uma obra-prima da moderna cinematografia, revelao portuguesa de um dos
278
279
238
***
As marcas de estratgias de persuaso verificadas nos comentrios sobre
O homem nu indicam o uso de textos que visam persuadir o leitor atravs da
afirmao do ethos, sobretudo regulado no conhecimento do crtico em relao
cinematografia brasileira e aos seus realizadores. Nas resenhas, a marca de
autoridade da fala, transfigurada como premissa para o leitor, bem visvel e
contundente: Toda a gente medianamente interessada pelo cinema que se faz
280
Celulide. Nos 178/179, Out/Nov de 1972, p. 44. Assinada por Lauro Antnio.
281
282
239
***
Nos comentrios sobre Terra em transe, as estratgias de persuaso
estruturam-se de modo a dar ao leitor informaes atualizadas sobre Glauber
Rocha, sua cinematografia e sobretudo decodificar, com autoridade e juzo
crtico, o enredo do filme. A traduo dos simbolismos da histria atravs de
exemplos mais clarificados para o leitor agiu como fora persuasiva eficiente.
A ordem do texto no foi alterada, todavia percebe-se um aumento
considervel de expresses de ordem poltica como revolucionrio, ditadura,
censura fascista e massas populares. O estilo de afirmao agressiva tornou-se
mais contundente tanto na crtica de Lauro Antnio quanto na de Tito Lvio, que
utilizou adjetivos como demaggico e grotesco para qualificar um dos
personagens da histria.
283
240
***
Semelhantemente, nos comentrios sobre O leo de sete cabeas, as
marcas de estratgias de persuaso da crtica indicam o modo de leitura da obra
mais clarificado para o leitor. Era necessrio e at imprescindvel saber algumas
informaes sobre o filme, traduzir certas simbologias (desde o ttulo composto
por palavras de vrias lnguas)284 antes de v-lo.
A organizao das informaes no texto privilegiou o resumo do enredo,
oferecendo vrios pargrafos a esta sntese em todas as resenhas. Nas
questes de estilo, permaneceu o discurso politizado e afirmativo de Jos Vaz
Pereira, Lauro Antnio e Eduarda Ferreira. Esta ltima, crtica do jornal
Repblica foi a mais incisiva na sua escrita: (...) o filme demonstra que a
Cooperao imperialista um aperto de mo e uma rajada de metralhadora
nas costas e s o sangue e o trabalho dum povo espezinhado podem alimentar
as razes das rvores das patacas285.
***
Este quadro de inveno e organizao do discurso a fim de conseguir a
anuncia dos leitores permaneceu mais ou menos o mesmo em 1976 nas
recenses sobre Toda nudez ser castigada, de Arnaldo Jabor. Contudo,
verificou-se muitas vezes nas resenhas a argumentao mediante exemplos,
para convencer o leitor das convices do crtico em relao ao filme: Toda
nudez ser castigada um exemplo magnfico de como um brilhante autor
barroco, catlico e reacionrio, pode servir s mil maravilhas para fazer um filme
terrivelmente agressivo em relao moralidade social vigente, instituio
familiar, ao obscurantismo religioso, numa palavra, ser exatamente o contrrio
daquilo que mostra, mantendo-se o mais fiel possvel s situaes criadas na
pea de que se inspira fazer a sua inverso crtica graas a uma qualidade que,
284
O filme tem como ttulo original, Der Leone Have Sept Cabeas, numa remisso ao conjunto
de naes imperialistas presentes no territrio africano.
285
241
depois de Lubitsh, Renoir, Cukor e pouco mais, se julgava perdida o tom. Alm
da transferncia de sentido por meio dos adjetivos, a crtica com autoridade de
conhecimento recorre a grandes nomes da cinematografia mundial para atribuir
qualidades obra.
Tambm foi observada a utilizao da descrio de cenas atravs da
ilustrao como base de sustentao dos argumentos produzidos pelos crticos,
como vemos neste trecho de Jos Vaz Pereira: o trabalho dos atores e do
fotgrafo sensacional, explorando as imagens de Lauro Escorel, as cores, no
s a rua (e a rua brasileira inconfundvel com as suas multides, as suas
palmeiras, os seus Volkswagens, as suas pedrinhas da calada portuguesa)
como os interiores onde arranca belos efeitos na imensa galeria, toda anos vinte,
que existe nas casas de passe286.
***
Nos comentrios sobre Dona Flor e seus dois maridos percebe-se a
reiterao da estratgia de expor (predominantemente no primeiro pargrafo) ao
leitor a descrio do enredo como principal recurso para gui-lo at uma sala de
cinema. Permanecem o uso de adjetivos, os exemplos e as ilustraes como
recursos argumentativos. A escrita de Jorge Leito Ramos se destacou na forma
como o crtico, j na abertura do texto, tentou se aproximar do leitor revelando
uma intimidade e, ao mesmo tempo, delimitando seu territrio: Na minha casa,
como diria o Fernando Assis Pacheco, o garrafo eletrnico coisa banida.
No perteno, por isso, maioria da populao deste pas que diariamente,
segue a Gabriela televisiva como um caso pessoal 287.
***
J as marcas nas recenses sobre Lcio Flvio, o passageiro da agonia
foram assinaladas pela forte publicidade que cercou a fita. Em quase todas as
286
287
242
Anos 80
As primeiras marcas persuasivas presentes nas crticas sobre Eu te amo
remetem para o clima de seduo do filme de Arnaldo Jabor. As fotografias de
divulgao do filme presentes em quase todos os peridicos exibem os corpos
nus de Snia Braga e Paulo Csar Pereio, que funcionam como um primeiro e
grande atrativo para o leitor. Entre as estratgias verificadas nos textos citam-se
os exemplos de cenas para sustentao de argumentos que, neste caso, eram
desfavorveis ao filme, mas uma cena merecia destaque: A cena com o travesti
Vera Abelha (sem dvida a mais conseguida do filme) a nica onde algo de
intenso percorre o cran, talvez por que a a fora dos fatos elimine totalmente o
requentado do discurso 289. Alm disso, a descrio pormenorizada do enredo foi
tambm usada como estratgia, sobretudo na crtica do Dirio de Notcias.
Outros recursos foram tambm percebidos como a estratgia de aproximao
com o leitor atravs de questes interrogativas no texto (Dirio de Lisboa).
288
289
243
***
Nas resenhas acerca de Pixote, a lei do mais fraco, as marcas de
estratgias de persuaso revelaram a presena de informaes (como a
quantidade de prmios que o filme recebeu) usadas para valorizar a obra e
garantir o ethos do crtico perante o leitor. O uso de cenas para ilustrar a
justificao de argumentos continua e tambm a analogia como forma de
transferir sentido: uma espcie de Mundo Co da delinqncia juvenil
brasileira ou os 400 golpes do subdesenvolvimento latino-americano? Nem
tanto ao mar nem tanto terra290. Um tipo de texto mais ensastico foi observado
na resenha do JL, onde o crtico Guilherme Ismael utiliza o filme para falar sobre
a marginalidade em seus diversos sentidos. Quanto s questes de organizao,
as resenhas continuam mantendo o formato da dcada anterior com variaes
aqui e ali e tambm sem diferenas na qualidade da informao entre a revista
(Celulide) e os peridicos (A Capital, Dirio de Lisboa, Dirio de Notcias).
***
As marcas nos comentrios de Bye Bye, Brasil no se diferenciaram muito
daquelas encontradas nas ltimas resenhas: uso de grandes fotografias para a
aproximao inicial com o leitor e, de um modo geral o discurso permaneceu
organizado para cumprir sua funo retrica. Contudo, as publicaes Expresso
(Manuel S. Fonseca) e JL (Miguel Esteves Cardoso) indicaram um tipo de escrita
mais prxima do formato ensaio no primeiro caso e uma crnica no segundo.
Nesses textos, observa-se uma maior liberdade no modo de leitura do filme,
que foi tratado como emblema de uma viagem da inocncia perdida.
Permanecem tambm a utilizao de adjetivos e exemplos de cenas ou
seqncias para sustentar a argumentao da crtica, sobretudo nos jornais
(Dirio de Lisboa, Dirio Popular, Dirio de Notcias e A Capital). A crtica da
revista Celulide no apresentou diferena em relao dos jornais, exibindo
um texto curto e ligeiro acerca do filme.
290
244
***
J no filme O beijo da mulher aranha, as marcas persuasivas mantiveramse na ao das imagens fotogrficas ao lado de textos que, apesar das
ressalvas feitas ao filme, despertaram a curiosidade do leitor para a histria, cuja
ao se passava predominantemente numa cela de priso. A descrio da
histria foi o grande fator de mobilizao do leitor em trs jornais (Dirio de
Notcias, A Capital e Dirio Popular). No Dirio Popular tambm as informaes
acessrias sobre a pelcula (desde o convite do diretor aos atores at uma
crnica sobre os bastidores da produo) tiveram um papel importante nesta
adeso.
Na questo do estilo destaca-se mais uma vez o texto de Jorge Leito
Ramos e sua conversa com o leitor atravs de perguntas: J estou a ver meus
leitores mais atentos a interrogarem-se sobre a entrada deste texto: bicha
termo que se use para designar um homossexual? Que racismo este que, de
sbito, se introduziu no vocabulrio do crtico? No racismo nenhum, a
realidade do filme, a sua histria, o seu cerne, aquilo que de essencial l
acontece (...).
***
Nos comentrios sobre pera do malandro, as marcas verificadas
diferiram quanto ao estilo apresentado entre as publicaes (JL e Expresso) e os
jornais dirios (A Capital, Dirio de Notcias e Correio da Manh). Os textos do
JL e Expresso eram prximos do ensaio, enquanto os textos dos jornais
mantiveram a objetividade da anlise. Enquanto nos textos dos primeiros foram
observadas expresses como dramaturgia no-aristotlica 291 ou mitologia
figurativa292, nos textos dos dirios o apelo ao pathos do leitor era declarado:
Edson Celulari (...) um ator que pede meas a qualquer dos gigantes da
atualidade, compondo uma mescla de talentos em que entram um Robert De
291
292
Jornal de Letras Artes e Ideias. N 258, 15 a 21.06.1987, p. 27. Assinada por Pedro Borges.
245
Niro, um Dustin Hoffman ou um Al Pacino dando, cada um, um farto lote dos
seus mltiplos recursos293 . So recorrentes as grandes fotos (sobretudo nos
dirios) e tambm os exemplos e ilustraes de cenas ou seqncias do filme.
Anos 90
Relativamente ao filme O quatrilho no foram observadas mudanas nas
estratgias para convencer os leitores. As fotos mantm-se como chamariz do
texto, que permaneceu organizado de modo a dar, sobretudo informaes
acessrias ao leitor, como dados sobre o diretor e sua carreira no Brasil. A
descrio pormenorizada do enredo tambm foi verificada, trao comum a todos
os jornais.
***
Tambm se destaca nas marcas persuasivas sobre Amor & Cia o
predomnio de textos com elevadas informaes acessrias ao leitor. Estas
informaes, geralmente localizadas nos primeiros pargrafos, tratam sobre
assuntos relacionados produo, distribuio bem como entrevistas com o
realizador e/ou atores do filme. O leitor inicialmente satisfeito na sua
curiosidade sobre os bastidores da obra para depois se centrar na anlise e juzo
acerca do filme. Permanecem as grandes fotos de divulgao e o apelo s
emoes do leitor, sobretudo nos dirios: Que co-produo justifica transformar
uma novela portuguesa, situada na Lisboa oitocentista, numa histria brasileira,
com atores brasileiros e tcnicos brasileiros? 294, exclamava a crtica do Pblico.
***
As marcas persuasivas presentes nas resenhas a respeito de Central do
Brasil caracterizam-se pela apresentao de discursos eloqentes, afirmativos e
293
294
246
ou pedrada
***
Por fim, as marcas persuasivas nos comentrios sobre O escorpio
escarlate no diferem muito das marcas verificadas nas crticas precedentes.
Mantiveram-se as imagens de suporte, uma pormenorizada descrio do enredo
(A Capital), as informaes acessrias sobre o diretor e prmios e a
organizao do discurso.
295
296
Dirio de Noticias. Artes e Multimdia. 14.05.1999, p. 46. Assinada por Eurico de Barros.
297
298
247
248
Marcas de contexto
1. As marcas de tempo
Anos 60
Foram observadas como marcas de tempo nas resenhas sobre O pagador
de promessas uma certa despolitizao no contedo dos textos. Marca de tempo
que reflete a censura escrita da poca, os comentrios sobre o filme de
Anselmo Duarte publicados em Abril de 1963 concentraram-se primordialmente
na questo religiosa e os crticos abstiveram-se de provocar ou sugerir qualquer
temtica poltica, apesar de o polmico enredo do filme solicitar uma tal reflexo
ideolgica.
Outras marcas temporais encontradas revelaram o conhecimento da
crtica lusa de uma grande mudana na cinematografia brasileira datada em
incio dos anos 60. Diz o primeiro pargrafo da crtica do Dirio popular: O que
distingue o moderno cinema brasileiro de outros cinemas de narrativa que
impuseram certa supremacia universal do espectculo da tela e, sem dvida, a
poderosa sensao de verdade que, desprovida de artifcios aparentes, nos
transmite os casos e as figuras que animam os seus melhores filmes. Na
verdade, colocando a latere tendncias generalizadas procuraram criar um
novo estilo de espetculo de cunho eminentemente mais profundo e humano e
que refletisse de forma cabal os dramas de nosso tempo299. Os dramas daquele
tempo permanecem at hoje, assim como a discusso em torno da sensao de
verdade da imagem cinematogrfica, todavia a presena desta marca temporal
dialoga com uma poca em que os debates sobre Neo-realismo italiano e
299
249
300
250
imagens eram diferentes porque eram exticas com todo o sentido (diramos
positivo e negativo) que esta palavra implica.
***
Em relao aos comentrios sobre Assalto ao trem pagador (publicados
em 1965), as marcas de contexto exibem-se igualmente, nas aluses, mesmo
que bem pontuais, ao jovem cinema brasileiro que vinha ganhando espao nos
festivais internacionais. Isto foi visvel, sobretudo na resenha de Lauro Antnio
apresentada numa revista especializada302 : O cinema brasileiro, quase
totalmente desconhecido de nosso pblico, adquiriu, durante os ltimos anos
(sobretudo durante as presidncias de Jnio Quadros e Joo Goulart), uma fora
e um vigor, aliados a uma sinceridade e espontaneidade notveis, que o
impem, presentemente, nos festivais internacionais a que concorre,
conquistando para seu pas os favores da crtica, do pblico e alguns galardes
merecidamente alcanados303. Com espao e ateno maior para a anlise do
filme, Lauro Antnio mostra seu descontentamento pela falta de divulgao de
um cinema jovem que floresce em terras sul-americanas, mas, ao mesmo
tempo, reconhece que as referncias a esta nova cinematografia tm crescido
bastante com a propagao dos festivais. A crtica da Plateia localiza tambm o
filme num contexto com outros diretores do cinema brasileiro: Aguardava-se,
pois, com muito interesse, a exibio de O assalto ao trem pagador de
Roberto Farias. Sabamos que era um jovem, tal como Glander (sic) Rocha,
Nelson Pereira dos Santos ou Ruy Guerra. Sabamos que usava o cinema como
meio de mostrar a todo o mundo a realidade social brasileira, descobrindo-lhe as
suas chagas, procurando assim encontrar a soluo que se impe. E o filme
resultou uma agradvel surpresa!304. Os sinais exibidos neste trecho apontam
302
Mas no exclusivamente na revista, como pode ser observado tambm neste trecho de jornal:
Assalto ao trem pagador que enfileira fundamentalmente no novo cinema brasileiro uma
demonstrao inequvoca de possibilidades que nos diz no ser falso o apregoado incremento de
qualidade patente no cinema praticado em terras de santa cruz. Dirio Popular. 16.02.1965, p.
11. Assinada com as inicias D. A.
303
304
251
***
Quanto s marcas de contexto nas resenhas sobre Vidas secas, as
referncias ao Cinema Novo brasileiro tambm prevaleceram. Parece ter sido
fundamental informar ao leitor de 1967 as ligaes do filme e do prprio diretor a
este movimento: este o primeiro exemplo do hoje universalmente famoso
cinema novo brasileiro que chega s nossas telas, afirma M. Machado Luz em
seu comentrio na revista Seara Nova306. Isto vem revelar, como mencionamos,
uma importante marca de tempo, uma vez que o Cinema Novo comeava a ser
referido enquanto movimento cinematogrfico (j relativamente conhecido na
Frana e Itlia) de merecida ateno pelos leitores e cinfilos portugueses. Outra
marca encontrada foi a referncia poltica dos autores como parte da
conveno de interpretao peculiar crtica de cinema dos anos 60 e 70 (e que
305
306
Seara Nova. N 1457, Maro de 1967, p. 91. Assinada por M. Machado Luz
252
Anos 70
Em 1970, uma das mais significativas marcas de tempo observadas nas
resenhas sobre a Fria do cangaceiro foi o discurso de revolta dos crticos
devido pouca exibio em Portugal de filmes do Cinema Novo brasileiro,
sobretudo de filmes de Glauber Rocha. A solicitao e crtica no eram dirigidas
a algum em particular e, em certos casos, dirigiam-se aos distribuidores e
exibidores. Entretanto, havia indcios implcitos de que a mensagem dos crticos
dirigia-se tambm ao governo que vetava a exibio de certos filmes
considerados perigosos.
Outras marcas de tempo identificadas nas resenhas igualmente foram
permeadas pelo enquadramento histrico do Cinema Novo brasileiro que,
segundo as convenes ou matrizes de referncias da crtica, estava sendo
desrespeitado na pelcula de Anselmo Duarte. O cinema brasileiro j era visto
como produtor de discursos crticos, como produtor de filmes de autor e A fria
do cangaceiro teria uma gnese que no social mas sentimental308.
307
308
253
***
Nos comentrios sobre o filme As amorosas destacam-se algumas
marcas temporais emblemticas. Como mencionamos, o filme fora exibido em
1971 no circuito de um Festival do Cinema Brasileiro e a crtica portuguesa
ansiava por ver obras representativas deste cinema, em especial do Cinema
Novo e mais especificamente de Glauber Rocha. Os filmes de Glauber Rocha
no se fizeram presentes neste Festival e a insatisfao da crtica foi visvel nos
comentrios 309. O fato do filme de Khouri no representar o Cinema Novo moveu
a desconfiana da crtica que, com convenes bem delineadas, esperava
menos intelectualismo e mais crtica social. Como mencionamos, Lauro Antnio
v o filme como fora de seu tempo e espao. Fora, na verdade, das matrizes
scio-polticas vigentes no pensamento da crtica cinematogrfica no perodo.
Outra marca presente foi revelada na resenha que defendia o filme.
Afonso Cautela advoga que Walter Hugo Khouri produziu cinema de autor, com
tema e modo de feitura marcadamente pessoais, e que tambm por isso, As
amorosas justifica-se como uma das melhores obras exibidas durante o Festival:
Dir-se- que os dilogos pecam e teimam em certo intelectualismo. Talvez, mas
logo neutralizado pela naturalidade dos outros, pelo calo sabiamente mesclado,
pelos silncios, por uma conjugao diretiva de todos os elementos, sntese que
faz afinal a grande fora de um autor e lhe d marca, lhe imprime estilo, lhe
confere estatuto de tal: de autor310 .
***
Nos comentrios sobre Macunama, filme tambm exibido no Festival de
1971, as marcas temporais evidenciam um tempo em que a tomada de posio,
309
Como nos comentrios dos crticos do suplemento Cena Sete, Alberto Seixas Santos,
Eduardo Geada e Eduardo Prado Coelho ao relatarem que Glauber Rocha foi o grande ausente
do Primeiro Festival do Cinema Brasileiro. Sobre o filme dizem eles: A pornografia mascarada
com todos os tiques da modernidade intelectual de receita comercial garantida constituiu o prato
forte do filme mais repelente do festival: As amorosas (Walter Hugo Khouri). A Capital. Cena
Sete, 27.03.1971, p. 6. Assinada pelos trs crticos acima citados.
310
254
***
Em 1972, nas resenhas sobre Antnio das Mortes, as marcas de tempo
revelam que o fato do filme apresentar de forma simblica os conflitos sociais
brasileiros acabou por beneficiar a produo de um discurso menos politizado da
crtica que tambm devia explicaes censura, ainda que se percebesse uma
maior liberdade nas anlises. O filme foi exibido com cortes 313, mas nenhuma
referncia a este fato foi vista nas crticas, denotando a ao da censura ainda
em vigor. As diversas solicitaes para a exibio das obras do Cinema Novo no
circuito comercial revelavam que a crtica ainda se via privada dos filmes,
sobretudo das obras de Glauber Rocha: A apresentao deste filme do mais
famoso cineasta do cinema novo no satisfar a sede do espectador lisboeta
que pretende, ansiosamente, a comercializao de outras obras de valor que
conhece de ouvir falar e ler e advinha pelos ciclos efetuados, em dois anos
consecutivos, pela embaixada do Brasil314.
311
A Capital. Cena Sete. 27.03.1971, p.7. Assinada por Eduardo Prado Coelho.
312
313
O crtico Lauro Antnio relata o caso na revista Celulide anos depois: De Glauber Rocha,
um dos nomes mais importantes do Cinema Novo brasileiro, de quem os portugueses conhecem
somente Antnio das Mortes (que a censura fascista havia permitido com cortes e para ser
exibido unicamente em sesses do cinema Estdio, de Lisboa, e no Passos Manuel, do Porto.
Celulide. N 197, Maio de 1974, p. 19.
314
255
Ainda nos comentrios sobre Antnio das Mortes, uma outra marca de
tempo aparente foi a valorizao, caracterstica do pensamento crtico da poca,
do filme por sua coerncia ideolgica e esttica315 , exigida, sobretudo, nas
cinematografias que se propunham produzir cinema de inveno descolado da
imagem hollywoodiana.
***
As marcas de tempo presentes nas crticas sobre o homem nu evocam
primordialmente comparaes entre o filme e o movimento do Cinema Novo
brasileiro. Como trao de uma crtica engajada, as resenhas publicadas em
Julho de 1973, indicaram que enquanto o Cinema Novo debruava-se sobre a
realidade social, no filme de Roberto Santos esboa-se uma plida e ingnua
tentativa de crtica conduta de uma certa burguesia, (...) mas tudo isto to leve
e acriticamente, to permissivo e digestivo, que no fere, no choca, no colide,
no magoa, nada pondo em causa, apesar do volte-face final, que no mais
do que um ltimo recurso para salvar a face, ou remediar o irremedivel316. Os
parmetros engajados de avaliao do filme remetiam a que era necessrio
afastar-se do cinema vigente, ou seja, ao falar de cinema vigente, devemos
entender, antes de mais, o cinema americano, na medida em que o cinema
novo representa primeiro que tudo a materializao da necessidade de por em
causa a linguagem e o conformismo alienantes dos filmes que, em maior
nmero, atingem o mercado brasileiro317.
Outra marca de tempo verificvel nos comentrios sobre o homem nu
remete, mais uma vez, solicitao de uma maior exibio dos filmes do
Cinema Novo em Portugal. Lauro Antnio declara no Dirio de Lisboa: Em
Portugal alm de uma dzia de fitas vistas em festivais oficiais ou particulares
haver que referir, em cerca de dez anos de exibio, a estreia de duas ou trs
315
316
317
256
obras decisivas: Vidas Secas de Nelson Pereira dos Santos e Antnio das
Mortes de Glauber Rocha, sobretudo estas duas. De resto, mais nada que nos
fale desse cinema visceralmente brasileiro, integralmente sul-americano, feito
com raiva e fome318.
***
Importantes marcas temporais foram encontradas nas crticas a Terra em
transe. Publicadas pouco depois da Revoluo de Abril, as resenhas evidenciam
o processo de queda da censura liberdade de expresso ao exibir, por
exemplo, textos com um grau de politizao acentuado. A crtica de Tito Lvio
afirma j no primeiro pargrafo: Glauber Rocha foi um dos construtores do novo
cinema brasileiro, que morreu no Brasil com a implantao da ditadura militar e o
regime censurial apertado que, desde ento, ali se utilizou como instrumento de
opresso 319. Alm de atestar a morte do Cinema Novo, Tito Lvio utiliza
expresses que antes certamente seriam vetadas pela censura.
Outra marca revela-se no destaque da mensagem ideolgica de Terra em
transe e, sobretudo, na crtica ao intelectualismo que afasta o filme de um
contato concreto com as camadas populares. Lauro Antnio expe ser esta
discusso extremamente proveitosa neste perodo da histria portuguesa uma
vez que Terra em transe (onde se sente uma influncia marcante da pera e do
sinfonismo de Eisenstein) , apesar disso (ou at por causa disso) um filme
importante e indispensvel no momento actual 320. E o momento era de
questionamento, de uma parcela da crtica, do cinema como instrumento de
educao para as massas.
***
Tal como nas crticas Terra em transe, as resenhas sobre O leo de sete
318
319
320
257
***
As referncias censura do filme no Brasil foram as marcas de tempo
encontradas nas recenses sobre Toda nudez ser castigada, estreado em Abril
de 1976 em Lisboa. As crticas do A Capital e do Expresso no deixaram de
assinalar o interdito da obra de Arnaldo Jabor: possvel que, com o
agravamento da censura, j no se possam fazer no Brasil os filmes que dantes
321
322
323
258
vamos [os do cinema novo]. Mas Toda nudez ser castigada prova que se
podem dizer coisas muito srias brincando324. E ainda: O filme de Jabor, que foi
um dos maiores sucessos do cinema no Brasil at ao dia em que a senhora
censura se apercebeu do alcance e do perigo do filme e decidiu usar das
tesouras325.
***
J as marcas de tempo presentes nas recenses sobre o filme Dona Flor
e seus dois maridos, exibido em Setembro de 1977, indicam pela primeira vez,
referncias telenovela brasileira para questionar uma aproximao com o
cinema. Jorge Leito Ramos menciona que E se chamo para este texto a
Gabriela tal deve-se apenas ao fato deste filme estar, antecipadamente
condenado ao sucesso fcil em virtude deste parentesco de atores326 , referindose a Snia Braga e Jos Wilker, pertencentes tambm ao quadro de elenco de
Gabriela. Entretanto, Jos de Matos-Cruz salienta que Tambm o pblico
portugus o aceitar, tcita e imaginativamente, fazendo de Dona Flor um
xito, por muitas mais razes que o fato de ser com os atores de Gabriela327.
As aluses grande campanha promocional que envolveu o filme foram tambm
uma marca de tempo evidente nas recenses.
***
Em Abril de 1979, nas crticas a Lcio Flvio, o passageiro da agonia, as
tambm constantes referncias campanha de divulgao da fita podem ser
consideradas como marcas temporais bem definidas. Jorge Leito Ramos afirma
que quatro salas em Lisboa, para a estreia de um filme, que, que eu saiba, um
recorde absoluto e diz ainda que a fita teve um lanamento at agora s
324
325
326
327
259
Anos 80
As marcas temporais presentes nas resenhas de Eu te amo, exibido em
Lisboa em 1981, caracterizaram-se, tal como em Lcio Flvio e Dona Flor, por
referncias intensa campanha de promoo da pelcula. Mais uma vez, Jorge
Leito Ramos assinala que a pelcula tornou-se um acontecimento na cidade:
capas de jornais e revistas, cartazes no metro, vinda a Portugal de Snia Braga
e Arnaldo Jabor, recepo na embaixada para as gentes do espectculo,
presena de Snia Braga na televiso, enfim, tudo o que um bom tcnico de
marketing podia desejar330. O modo como o cinema brasileiro entrava neste
perodo no mercado portugus no deixava margem para dvida e este quadro
estava associado a uma conseqente viso de perda de qualidade dos filmes,
agora considerados pela crtica muito mais como produtos culturais do que como
obras de apreciao esttica. Outras marcas de tempo foram as diversas
referncias televiso e imagem-vdeo tambm presentes no interior da
pelcula. Joo Lopes diz com ironia que os planos ousados utilizados por
328
Dirio de Lisboa. Sete ponto Sete. 01.06.1979, p. 3. Assinada por Jorge Leito Ramos.
329
330
260
***
As recenses acerca de Pixote, a lei do mais fraco em 1982 deixaram
marcas de tempo que seguem a esteira das marcas encontradas desde fins da
dcada de 70. Ou seja, o cinema brasileiro visto agora num contexto de
tentativa de ampliao de mercado, com mais maturidade para alguns crticos e
para todos distante dos ideais do Cinema Novo: Com Pixote o cinema do Brasil
d mais um passo indesmentvel na conquista de mercados internacionais (...)332
afirma a crtica do Dirio de Notcias. Jorge Leito Ramos, no Dirio de Lisboa,
expressa: No j a lio do cinema novo de Glauber, Guerra, Diegues.
ainda, porm, uma esttica da fome, urbana 333.
***
As marcas temporais nos comentrios acerca de Bye Bye, Brasil,
publicados tambm em 1982, indicam semelhantes referncias feitas pelos
crticos em relao expressiva presena de filmes brasileiros no circuito
comercial portugus e a busca desta mesma cinematografia pelo sucesso
comercial tanto a nvel interno como no plano internacional. Esta busca no est
dissociada do novo esprito que os cineastas do novo cinema refletem,
afastando-se de um elitismo de propostas, excessivamente hermtico na sua
331
332
333
261
formulao (...)334. Para alguns crticos, esta sada era um sinal de maturidade
de uma cinematografia que desejava ampliar seus mercados, mas para outros
revelava tambm o preo a pagar por esta aspirao: a perda de qualidade.
Manuel S. Fonseca afirma que, apesar da dominao dos filmes americanos no
mercado portugus, o cinema brasileiro vem, degrau a degrau, subindo as
escadarias (triunfais ou decrpitas?) da exibio em Portugal. (Por influncia do
comum patrimnio lingstico, diro os paladinos da causa luso-brasileira, por
influncia das discutidas (agora menos) telenovelas, pensaro os mais cpticos)
335.
cinema brasileiro era visto de forma diferente, ainda que a relao com o Cinema
Novo fosse referida em algumas resenhas. Miguel Esteves Cardoso, no JL,
intitula sua crtica de Bye Bye Cinema Novo, al al Carlos Diegues. O mesmo
crtico questiona a conveno, um credo paternalista (e aflitivamente
etnocentrista) segundo o qual existem dois tipos de filmes bons: aqueles que so
realmente bons, e aqueles que so bons porque so tnicos 336. O crtico
classifica o filme na primeira categoria, mas a viso de exotismo atribuda a
cinematografias do terceiro-mundo vigente desde os anos 60 parece ter se
mantido como conveno.
***
Em Maro de 1986, nas recenses a propsito de O beijo da mulher
aranha, a tentativa de internacionalizao do cinema brasileiro foi mais uma vez
destacada pela crtica na imprensa. Joo Lopes no Expresso comenta: Assinalese, porm, que este [O beijo da mulher aranha] seguramente, um dos mais
importantes projectos para a projeo internacional do cinema brasileiro 337.
Outra marca de tempo recorrente desde os anos anteriores, foi a referncia
334
335
336
Jornal de Letras Artes e Ideias. No 30, 13 a 26.04.1982, p. 29. Assinada por Miguel Esteves
Cardoso.
337
262
***
No foram observadas muitas marcas de tempo nos comentrios acerca
de pera do malandro, publicados em Junho de 1987. Entretanto, uma marca
bastante significativa foi visvel na resenha de Joo Lopes e remetia para dois
indcios. O primeiro dizia respeito ao olhar extico sobre o cinema brasileiro e o
segundo a decepo com o Ruy Guerra atual (de 1987), em comparao com o
Guerra participante do movimento do Cinema Novo: Ora, difcil sustentar um
discurso coerente quando pouco mais se tenta do que imitar tal sistema [o do
musical americano], acrescentando-lhe umas pinceladas de exotismo brasileiro.
Estamos longe do melhor de Ruy Guerra, nomeadamente neste filme telrico
que era Os Fuzis339 .
Anos 90
Em 1996, importantes marcas de tempo foram observadas nas resenhas
sobre O quatrilho. Depois de vrios anos sem exibies de filmes brasileiros em
Lisboa devido ao desastre da poltica cultural do governo do presidente
Fernando Collor no Brasil, o filme chega a Portugal com a marca de candidato
ao Oscar de melhor filme estrangeiro. O crtico Manuel Cintra Ferreira registra
esta informao para os leitores: O Quatrilho (...) surge num momento especial,
numa altura em que a pouco e pouco o cinema brasileiro vai recuperando da
crise em que mergulhara (...). O sucesso de O Quatrilho e de outros poucos
filmes feitos em 1995 est na origem de um novo boom de cinema
338
339
263
***
Trs anos depois, em 1999, semelhantes marcas foram encontradas nas
resenhas a propsito de Amor & Cia. Permanecem as referncias s telenovelas
enquanto modelo para a linguagem do novo cinema brasileiro e a imagem dos
atores associados ao folhetim: (...) e Patrcia Pilar em Ludovina, cuja
interpretao no se liberta das suas personagens de telenovela 343. Outra marca
de tempo indicou a criao da FBF filmes, uma nova distribuidora com sede no
Porto que co-produziu o filme e foi vista pela crtica como uma tentativa de
romper o cerco monopolista das grandes distribuidoras num perodo de grande
expanso do mercado de salas de cinema em Portugal. Registra o crtico do
Pblico: No momento em que abrem cada vez mais salas, e com mais
sofisticadas meios tcnicos, assistimos tambm, paradoxalmente, a um
afunilamento do mercado 344, refere o crtico em relao pouca exibio de
filmes no hollywoodianos em Portugal.
340
341
342
343
344
264
***
Ainda em 1999, Central do Brasil estreou-se em vrias salas antecedido
por uma intensa campanha de marketing que inclua a divulgao dos prmios
ganhos em festivais internacionais. Importantes marcas de tempo foram
constatadas nas resenhas sobre o filme, dentre elas referncias atual situao
do cinema brasileiro e sua mudana de enfoque. Eurico de Barros registra a
crise e a origem de uma nova atitude no cinema brasileiro mas que nada tem a
ver com o Cinema Novo: Se verdade que a produo de filmes no Brasil
regressou da vizinhana do reino dos mortos na segunda metade da dcada de
90, e que Central do Brasil o exemplo de sucesso desse regresso, tambm
preciso ter o sentido das propores e no desatar a evocar o Cinema Novo dos
anos 60 e 70345. Outras aluses ao saudoso Cinema Novo dos anos 60 foram
referidas sempre em comparao ao filme de Walter Salles: Da fora telrica do
universo de Glauber nem sombra; do olhar acusador dos primeiros filmes de
Nelson Pereira dos Santos (como o perturbante Vidas Secas), ou de Ruy
Guerra (da crueza de Os Fuzis ironia de Os Deuses e os Mortos) nem o
mais leve resqucio346.
Outras marcas nas resenhas igualmente fizeram referncias ao modelo de
esttica de telenovela adotado no filme e mesmo aqueles que no viam
semelhana entre a esttica do filme e a esttica das telenovelas no deixaram
de fazer aluses ao tema, como Francisco Ferreira no Expresso: Este filme est
longe de ser uma telenovela mas partilha os mesmos compromissos daquela:
ser um objeto raso que possa espreitar todos os mercados 347. E, sobretudo,
Francisco Perestrello, quando afirma que, Mas no haja iluses; tal no
corresponde, felizmente, a qualquer aproximao telenovela, fenmeno que
mais contribuiu para aniquilar o cinema brasileiro em Portugal 348. Francisco
345
Dirio de Noticias. Artes e Multimdia. 14.05.1999, p. 46. Assinada por Eurico de Barros.
346
347
348
265
***
Por fim, foram verificadas poucas marcas de tempo nos comentrios
sobre O Escorpio escarlate, exibido logo depois de Central do Brasil. Estes
vestgios indicam os registros da pequena vaga de cinema brasileiro a estrear
nas salas portuguesas em 1999 350. De fato, num s ms de Maio estrearam-se
trs filmes brasileiros, tendncia interrompida nos meses seguintes. Outra
referncia encontrada diz respeito estria do Canal Brasil, canal de TV a cabo
cuja programao incide essencialmente na divulgao do cinema brasileiro: (...)
mais quando cruzado com os filmes que habitualmente passam no nosso pas
do que ser comparado com o cinema sul-americano, designadamente o
brasileiro, onde abundam as obras inslitas que agora podem ser conhecidas
pelo pblico em geral no Canal Brasil351.
2. As marcas de espao
Anos 60
Os espaos internos destinados escrita da crtica de O pagador de
promessas foram diferenciados nos espaos institucionais. As revistas
forneceram um ambiente amplo para a anlise do filme, inclusive com exibio
de fotos, alm de disponibilizar uma cobertura do festival de Cannes (caso da
349
350
351
266
revista Filme). O Jornal de Letras e Artes tambm ofereceu um bom espao para
a crtica de Jos Vaz Pereira. J os jornais dirios seguiam a regra da rapidez e
da objetividade da informao, dedicando poucos pargrafos em pginas mal
diagramadas e com excessos de textos sobre os mais diversos campos da
cultura como circo, msica, rdio e teatro, com divises pouco ntidas nas
colunas. Aliado a isto, grandes anncios dos mais variados filmes preenchiam
por vezes quase todo o espaamento da pgina nos jornais.
***
As marcas de espao nas resenhas de Assalto ao trem pagador no
foram muito diferentes. Nos jornais a confuso visual da pgina permanece e os
anncios, por vezes, crescem em tamanho. Os textos de crtica a produtos da
cultura mantm-se misturados com as sees internas embaralhadas. A revista
Plateia oferece crtica a quase todos os filmes do festival e oferece um espao
razovel para Assalto ao trem pagador.
***
Com relao a Vidas secas, os jornais e revistas igualmente
apresentaram diferenas quanto ao tamanho disponibilizado para a escrita da
crtica. As revistas dedicaram um espao maior para as crticas (incluindo
fotografias), ainda que a maior resenha tenha sido aquela publicada pelo jornal
Repblica. Os outros jornais cumpriram a tarefa bsica de fornecer espao para
alguns pargrafos no mesmo ambiente de excesso de textos sobre outras
variadas crticas culturais.
Anos 70
Relativamente a A fria do cangaceiro, j comea a ser visvel o primeiro
sinal de mudana grfica nas colunas dos jornais. O espao permanece
pequeno, mas agora melhor delineado no contexto da pgina. As fontes das
letras aumentaram em tamanho, as sees esto mais bem divididas, facilitando
267
***
No h uma alterao significativa em relao anlise das marcas de
espao nas crticas sobre As amorosas. A exceo que aparece um
suplemento semanal dedicado exclusivamente ao cinema, denominado Cena
Sete e apresentado pelo jornal A Capital. A revista Celulide fez uma grande
cobertura do 1 Festival de Cinema Brasileiro, mas dedicou poucos pargrafos
crtica do filme.
***
As mesmas observaes podem ser ditas em relao ao posicionamento
das crticas nos jornais e revistas sobre Macunama, uma vez que as resenhas
foram publicadas no mesmo perodo e nos mesmos espaos institucionais das
As amorosas.
***
J no que diz respeito s resenhas sobre Antnio das Mortes, a revista
Plateia, apesar de manter um reduzido espao para a coluna de crticas Guia do
espectador, fornece pela primeira vez o quadro de estrelinhas com suficiente (*),
bom (**) e timo (***), para os critrios argumento, realizao e interpretao. O
filme recebe o somatrio de oito estrelas, com valor de excelente. No quesito
espao, nos jornais mantm-se o quadro da dcada.
***
Nos espaos de publicao das resenhas sobre o homem nu, verificou-se
um enquadramento grfico mais definido no jornal Dirio de Lisboa, agora com
268
***
Nas crticas sobre Terra em transe no foram visveis mudanas
substanciais com relao ao seu posicionamento no espao interno das
publicaes. O Dirio de Lisboa mantm sua coluna assinada por Lauro Antnio
e o Dirio Popular permanece com a seo Depois das nove, assinada por Tito
Lvio. No quesito revistas, a Celulide d um pequeno destaque espacial para
Duas estreias finalmente autorizadas: O Couraado Potemkine e Terra em
transe 352.
***
Nenhuma alterao nas publicaes dirias sobre O leo das sete
cabeas. Entretanto, as crticas de cinema ganham espao no semanrio
Expresso ainda que de modo tmido no suplemento Expresso Revista, na coluna
Seleco crtica da semana assinada por Jos Vaz Pereira.
***
Em 1976, ano de publicao das recenses sobre Toda nudez ser
castigada, a revista Celulide muda de papel (passa para papel jornal) e diminui
o nmero de pginas, apesar de aumentar o tamanho delas. O Expresso Revista
continua com seu tmido espao para as crticas, seo agora coordenada por
Helena Vaz da Silva. No que diz respeito a outras publicaes (A Capital e Dirio
352
Celulide. N 197, Maio de 1974, p.19. A resenha sobre Terra em transe, tambm assinada
por Lauro Antnio, rigorosamente igual publicada pelo mesmo autor no Dirio de Lisboa.
269
***
Relativamente Dona Flor e seus dois maridos no foram verificadas
grandes alteraes quanto ao espaamento interno das crticas nas publicaes
nem diferenas quanto ao espao dedicado a elas entre a revista (Celulide) e
os jornais (Dirio de Lisboa, Dirio Popular e Dirio de Notcias).
***
Nos espaos dedicados s crticas sobre Lcio Flvio, o passageiro da
agonia, a entrevista com o realizador ganhou relevncia significativa nas pginas
de todos os jornais avaliados (Dirio de Lisboa - suplemento semanal Sete ponto
Sete - Dirio de Notcias e Dirio Popular)353. Aliadas promoo de lanamento
do filme, grandes fotos tambm ganharam destaque nas pginas das
publicaes.
Anos 80
O destaque dado a grandes fotografias permaneceu nas publicaes
dirias e semanais em 1981, sobretudo no jornal A Capital. Os ttulos
sensacionalistas para as resenhas de Eu te amo como Festival Snia Braga em
Eu te amo. Filme-choque vai impor de vez o cinema brasileiro?, assim como as
fotos, ocupavam o espao maior da pgina em detrimento do texto. Por outro
lado, vimos no Expresso, o suplemento Actual passou a disponibilizar mais
linhas para a crtica de cinema.
353
Outros jornais como o Correio da Manh e A Capital tambm deram destaque entrevista, a
ponto de no apresentarem a crtica do filme, somente a entrevista.
270
***
No foram verificadas alteraes em relao ao posicionamento das
resenhas acerca de Pixote, a lei do mais fraco nas pginas dos peridicos. A
revista Celulide dedicou um espao menor para anlise do filme em
comparao com os principais jornais e o JL manteve seu espao de uma
pgina para as crticas de filmes.
***
Em relao a Bye Bye, Brasil, percebe-se agora uma melhor disposio
do texto e das fotografias no espao da pgina o que facilita a procura e
visualizao da crtica pelo leitor. O Dirio de Notcias manteve o seu
conservadorismo em termos de programao visual misturando crtica de
literatura, cinema, teatro e televiso numa s pgina. A revista Celulide
conservou seu espao reduzido enquanto que no JL e no Expresso o nmero de
linhas para as recenses foi bem maior.
***
1986, ano de exibio do O beijo da mulher aranha, o espao dedicado s
crticas no Dirio de Notcias ampliou-se e a programao visual do jornal
mudou, apresentando sinais de modernidade grfica. O suplemento Sbado
Popular, publicado no Dirio Popular, dedicou duas pginas inteiras avaliao
do filme, embora uma pgina s com crnicas de bastidores. A Capital manteve
as grandes imagens fotogrficas e os grandes ttulos sensacionalistas: Snia
Braga no chega para ajudar evaso!
***
O posicionamento da resenhas acerca de pera do malandro nos jornais
e semanrios no mudou muito em relao aos anos anteriores. Vale salientar,
entretanto, que a programao visual da pgina (com pouco espao para texto e
271
muito para as imagens) foi verificada, sobretudo nos dirios Correio da Manh e
A Capital. J nos semanrios, ocorreu o inverso e o Expresso (Cartaz) contou
tambm com um quadro de classificao por meio de estrelas: o filme em
questo recebeu uma (Joo Lopes) e duas (Augusto M. Seabra).
Anos 90
Em 1996, poca da exibio de O quatrilho, as marcas de espao
verificadas j indicam uma melhoria considervel na programao visual do
Dirio de Notcias, cujas resenhas esto agora numa editoria intitulada Artes e
Multimdia. Em Novembro deste mesmo ano observa-se uma mudana radical
no padro do jornal, que troca o formato standard pelo tablide. Este formato
ser predominante nos dirios na dcada de 90, exceo do semanrio
Expresso que manteve o standard, ainda que as resenhas fossem publicadas no
suplemento (Actual) cujo modelo era o tablide.
***
Em 1999, poca da exibio de Amor & Cia, destaca-se a editoria Artes e
cios do jornal Pblico, reconhecido pelo seu bom gosto no grafismo. dado
um espao considervel (uma pgina com fotos) para crtica de cinema no dirio.
Os outros peridicos mantm o padro da dcada de 90.
***
Nas pginas das publicaes (Expresso, Pblico, A Capital, Dirio de
Notcias e Correio da Manh) acerca de Central do Brasil, as grandes imagens
fotogrficas destacaram-se, ganhando por vezes mais espao que os textos.
Todos os peridicos deram realce para a crtica do filme e utilizaram pelo menos
uma pgina para a resenha e as fotos. O Expresso tambm exibiu uma
entrevista com o realizador e dedicou duas pginas para a entrevista e crtica.
272
***
Por fim, em relao a O escorpio escarlate, no houve alteraes
significativas nas pginas, uma vez que as resenhas foram publicadas uma
semana aps as precedentes. Desse modo, manteve-se a composio de
espao para fotografias aliadas a pequenos textos (A Capital e Correio da
Manh).
273
274
Como referimos na primeira parte da tese, Bordwell traa uma sequncia de ordem varivel
correspondente a sinopse - juzo argumentao reafirmao do juzo.
275
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278
279
280
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356
Ver mais sobre esta questo nos trabalhos do historiador Roger Chartier, sobretudo no livro A
histria cultural: entre prticas e representaes. Chartier (1988) acredita que para a
compreenso do sentido da obra de fundamental importncia o trip: Texto, Suporte e Prtica
de Leitura.
282
283
357
284
285
CONCLUSO
Dois paradigmas invariveis
286
287
358
Esta questo esttico-ideolgica que norteou o cinema de ps 68 foi discutida por diversos
autores. Entre eles destacamos Francesco Casetti (1994) que tambm analisa esta tendncia em
revistas italianas como Cinema nuovo, Filmcritica, Ombre rosse e Cinema e Film, alm das j
citadas revistas francesas.
288
O problema que aqueles filmes que esto fora do crculo das boas
convenes acabam por receber tratamento qualitativo diferenciado, o que,
inevitavelmente, influenciar a interpretao dos leitores das crticas. Ademais,
no desejamos aqui imprimir um sentido de pura instrumentalidade no processo
comunicativo entre a crtica e seus leitores. Como afirmamos, os leitores
portugueses podem negar, corrigir, modificar ou simplesmente reproduzir este
modelo de apreciao, mas inequvoca a dimenso de seu efeito. A crtica de
cinema deve refletir se quer continuar devota de parmetros de avaliao que se
estabeleceram em outras pocas e em condies histricas bem diversas, sob
pena de pr-conceber e pr-julgar certos filmes de uma cinematografia. Sob
pena de cair na armadilha do saudosismo.
notrio que o atual cinema brasileiro corresponde a uma esttica, de
certa forma, distante do modernismo poltico-esttico de vanguarda dos anos 60.
A crtica no deve, ento, repensar certos conceitos como os de ideologia, tica,
verdade ou esttica luz de uma realidade que j no aquela que forneceu as
bases para o paradigma anterior? O crtico Luiz Zanin Oricchio (2003) chama o
cinema contemporneo brasileiro de cinema impuro ou aquele que no recusa
dilogo com as diferentes linguagens, aquele que no abre mo dos recursos do
espetculo em sua forma e aquele que mostra a corroso de um cnone, poltico
e esttico, materializado nos anos 60 pelo Cinema Novo. Como ocorre com os
movimentos de rupturas, o Cinema Novo inventou uma tradio, mas uma
tradio deve inspirar, e no inibir. Cria-se a partir dela, talvez contra ela ou
apesar dela. O que vital, desde que a no tenhamos como pea de museu,
fantasma assustador ou parmetro inatingvel em relao aos quais todas as
comparaes so desfavorveis (Oricchio, 2003, p. 229).
Historicamente, a crtica de cinema da imprensa portuguesa compreendeu
o cinema brasileiro exclusivamente como o Cinema Novo e desde ento moldou
seus parmetros a partir deste movimento. E tendo a crtica tambm um papel
de transmisso histrica de sentido para um leitor, cabe a ela estar atenta para
evitar distores e generalizaes abusivas. O discurso da crtica de cinema
constitui um meio socialmente efetivo da acolhida dos filmes, acolhida histrica,
289
290
FILMOGRAFIA
291
292
BIBLIOGRAFIA
Jornais
Dirio de Notcias
A maravilhosa comdia Meus amores no Rio. (23.11.1960), p. 7.
Esta noite no Tivoli A morte comanda o cangao. (17.09.1962), p. 6.
PINA, Carlos. Os deuses e os mortos (Ruy Guerra). (19.03.1971), p. 8.
PINA, Carlos. Os senhores da terra (Paulo Thiago). (19.03.1971), p. 8.
PINA, Carlos. Proezas de satans na vila de leva-e-traz. (22.03.1971), p.
6.
PINA, Carlos. A consagrao do genuno: Fome de amor. (24.03.1971),
p. 8.
PINA, Carlos. A consagrao do genuno: Macunama. (24.03.1971), p.
8.
PINA, Carlos. Ganga bruta de Humberto Mauro inaugurou o certame.
(09.03.1972), p. 8.
PINA, Carlos. O cangaceiro de Lima Barreto. (11.03.1972), p. 8.
PINA, Carlos. Sinh moa de Tom Payne. (11.03.1972), p. 8.
293
A Capital
GEADA, Eduardo. A fria do cangaceiro. (28.11.1970), p. 19.
SANTOS, Alberto Seixas. A vida provisria. Cena Sete. (27.03.1971), p.
8.
SANTOS, Alberto Seixas. Fome de amor. Cena Sete. (27.03.1971), p. 8
GEADA, Eduardo. Memria de Helena. Cena Sete. (27.03.1971), p. 7
COELHO, Eduardo Prado. Macunama. Cena Sete. (27.03.1971), p. 7
COELHO, Eduardo Prado. Os cafajestes. Cena Sete. (27.03.1971), p. 8
294
295
Repblica
Odeon - Meus amores no Rio. (24.11.1960), p. 14. (assinada com a
inicial F.)
A morte comanda o cangao. (18.09.1962), p. 3. (assinada com as
iniciais E. M.)
No Condes e Roma - O pagador de promessas. (18.04.1963), p. 3 e 10.
(assinada com as iniciais D. S.)
AFONSO, Rui. Corajosa Presena do Brasil. (16.02.1965), p. 9.
No Imprio - Assalto ao trem pagador. (26.08.1965), p. 3.
CAUTELA, Afonso. No Estdio - Vidas Secas de Nelson Pereira dos
Santos. (31.03.1967), p. 3 e 15.
LVIO, Tito. Eden - A fria do cangaceiro. (27.11.1970), p. 3.
Desenvoltura e subdesenvolvimento. (19.03.1971), p. 6.
CAUTELA, Afonso. Copacabana me engana. (20.03.1971), p. 11.
CAUTELA, Afonso. David Neves: delicadeza e procura de tempo
perdido. (20.03.1971), p. 6 e 11.
CAUTELA, Afonso. Didctico e discursivo. (21.03.1971), p. 9.
CAUTELA, Afonso. Deserto a preto e branco. (22.03.1971), p. 11.
Copacabana me engana de Antnio Fontoura. (24.03.1971), p. 8.
A vida provisria de Maurcio Gomes Leite. (24.03.1971), p. 8.
Antes, o vero de Gerson Tavares. (24.03.1971), p. 8.
Juliana do amor perdido de Srgio Ricardo. (24.03.1971), p. 8.
O diabo mora no sangue de Cecil Thir. (24.03.1971), p. 8.
Proezas de satans de Paulo Gil Soares. (24.03.1971), p. 8.
CAUTELA, Afonso. Fome de amor: das vidas secas s vidas regadas
(com champanhe). (26.03.1971), p. 11.
296
Dirio de Lisboa
Meus amores no Rio, no Odeon. (24.11.1960), p. 3.
A morte comanda o cangao no Tivoli. (18.09.1962), p. 3 e 5. (assinada
com as iniciais L. DO. N.).
AZEVEDO, Manuel de. O pagador de promessas. (18.04.1963), p. 3.
AZEVEDO, Manuel de. Um Assalto brasileiro de surpresa. (16.02.1965),
p. 5.
Assalto ao trem pagador no Imprio. (26.08.1965), p. 7. (assinada com a
inicial R.).
Vidas secas, no Estdio. (31.03.1967), p. 6.
ANTNIO. Lauro. A fria do cangaceiro. (30.11.1970), p. 4.
PINTO, Oliveira. Em memria de Helena. (17.03.1971), p. 3.
ANTNIO. Lauro. Os deuses e os mortos (Ruy Guerra). (18.03.1971), p.
297
4-5.
ANTNIO. Lauro. Memrias de Helena. (19.03.1971), p. 4.
ANTNIO. Lauro. Os senhores da terra. (20.03.1971), p. 4.
ANTNIO. Lauro. Antes o vero. (21.03.1971), p. 4.
ANTNIO. Lauro. Copacabana me engana. (21.03.1971), p. 5.
ANTNIO. Lauro. Os cafajestes. (21.03.1971), p. 4.
PINTO, Oliveira. Ruy Guerra e o realismo mgico de Os deuses e os
mortos. (21.03.1971), p. 1.
ANTNIO. Lauro. A vida provisria. (22.03.1971), p. 5.
ANTNIO. Lauro. O diabo mora no sangue. (22.03.1971), p. 5.
ANTNIO. Lauro. Juliana do amor perdido. (23.03.1971), p. 4.
ANTNIO. Lauro. Panorama do cinema brasileiro. (23.03.1971), p. 4.
ANTNIO. Lauro. Proezas de satans na vila de leva-e-traz.
(24.03.1971), p. 5.
ANTNIO. Lauro. As amorosas. (24.03.1971), p. 5.
ANTNIO. Lauro. Macunama. (25.03.1971), p. 4.
ANTNIO. Lauro. Fome de amor. (27.03.1971), p. 6.
ANTNIO. Lauro. Um homem nu nas ruas da cidade. (17.07.1973), p. 7.
ANTNIO. Lauro. O colonialismo tem sete cabeas e vrios idiomas.
(07.05.1974), p. 6.
ANTNIO. Lauro. Terra em transe. (18.11.1974), p. 6.
ANTNIO. Lauro. Os cafajestes, finalmente... (25.02.1975), p. 6.
RAMOS, Jorge Leito. Cabeas cortadas de Glauber Rocha.
(20.10.1975), p. 14.
RAMOS, Jorge Leito. Dona Flor e seus dois maridos. (13.04.1976), p.
15.
RAMOS, Jorge Leito. Toda nudez ser castigada de Arnaldo Jabor.
(24.06.1976), p. 14.
RAMOS, Jorge Leito. Macunama, Joaquim P. de Andrade.
298
(10.11.1976), p. 17.
RAMOS, Jorge Leito. Lcio Flvio, o passageiro da agonia.
(03.05.1977), p. 14.
RAMOS, Jorge Leito. Xica da Silva de Carlos Diegues. (23.09.1977), p.
13.
RAMOS, Jorge Leito. Eu te amo. (01.06.1979). Sete.Sete, p. 3.
RAMOS, Jorge Leito. Pixote, de Hector Babenco. (26.03.1982), p. 20.
RAMOS, Jorge Leito. Bye Bye Brasil, de Carlos Diegues. (06.04.1982),
p. 16.
RAMOS, Jorge Leito. O beijo da mulher aranha. (16.04.1986), p. 19.
Dirio Popular
Meus amores no Rio. (24.11.1960), p. 4-5. (assinada com a inicial P.).
Meus amores no Rio. (29.11.1960), p. 11.
Tivoli - A morte comanda o cangao. (18.09.1962), p. 2. (assinada com
as iniciais M. G. R.).
Um acontecimento cinematogrfico. (17.04.1963), p. 9 e 15.
Roma e Condes - O pagador de promessas. (18.04.1963), p. 3-4.
(assinada com as iniciais P. de M.).
Assalto ao trem pagador de Roberto Farias. (16.02.1965), p. 11.
(assinada com as iniciais D. A.).
Imprio - O assalto ao trem pagador. (26.08.1965), p. 3-4. (assinada com
as iniciais E. P.).
Vidas secas, no Estdio. (31.03.1967), p. 2-3.
PEREIRA, Jos Vaz. A fria do cangaceiro no Eden. (27.11.1970), p. 4.
LVIO, Tito. Os senhores da terra de Paulo Thiago. (19.03.1971), p. 5.
CARDOSO, Adelino. A vida provisria de Maurcio Gomes Leite.
(20.03.1971), p. 3.
LVIO, Tito. Os cafajestes de Ruy Guerra. (20.03.1971), p. 3.
299
300
Correio da Manh
ROSA, Vitoriano. pera do Malandro: um trunfo de magia. (19.06.1987),
p. 53.
Nosso tipo de humor dirigido s crianas. (05.06.1995), p. 38-39.
(assinada com as iniciais I. O.).
ROSA, Vitoriano. Amor & Cia. (07.05.1999), p. 34.
ROSA, Vitoriano. Central do Brasil. (14.05.1999), p. 34.
ROSA, Vitoriano. O escorpio escarlate. (28.05.1999), p. 33.
Pblico
TORRES, Mrio Jorge. Exibio e simpatia. (07.05.1999). Artes e cios,
p. 8.
TORRES, Mrio Jorge. Vidas molhadas. (14.05.1999). Artes e cios, p.
6-7.
Vida de Bocage em filme. (29.10.1999).
301
Expresso
PEREIRA, Jos Vaz. So Bernardo. (16.11.1974). Revista, p. VIII.
PEREIRA, Jos Vaz. Antnio das mortes. (01.02.1975). Revista, p. 4.
SILVA, Helena Vaz da. Toda nudez ser castigada. (23.04.1976).
Revista, p.19.
SILVA, Vicente Jorge. A dama do lotao. (27.05.1978). Revista, p. 27.
LOPES, Joo. Falar e no falar. (14.11.1981). Actual, p. 25.
FONSECA, Manuel S. Pixote, a lei do mais fraco. (27.02.1982). Revista,
p. 3-R.
FONSECA, Manuel S. O lupanar e a inocncia. (03.04.1982). Revista, p.
31-R.
COELHO, Eduardo Prado. O beijo da mulher aranha. (01.03.1986),
Revista, p. 4-R.
LOPES, Joo. O beijo da mulher aranha. (08.03.1986), Revista, p. 4-R.
SEABRA, Augusto M. O beijo da mulher aranha. (15.03.1986), Revista,
p. 4.
SEABRA, Augusto M. A pera do pobre. (13.06.1987). Revista, p. 6-R.
FERREIRA, Manuel Cintra. Casais trocados. (23.11.1996), Revista, p. 8.
302
Revistas especializadas
Estdio
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Filme
LEAL, Carlos Mendes. O pagador de promessas. (Julho de 1963), no 52,
p. 32.
Cinema 15
Toda nudez ser castigada. (Junho de 1976), no 8, p. 20.
Isto Espectculo
ANTNIO, Lauro. O casamento. (Setembro de 1976), no 1, p. 23
PEREIRA, Jos Vaz. O casamento. (Maio de 1977), no 6, p. 51.
PEREIRA, Jos Vaz. Xica da Silva de Carlos Diegues. (Maio de 1977),
no 6, p. 50-51.
303
Isto Cinema
CAVALHEIRO, Joaquim. A dama do lotao. (02.06.1978), no 19, p. 17.
Gente fina outra coisa. (02.06.1978), no 19, p. 18.
Plateia
A morte comanda o cangao. (01.10.1962), no 126, p. 39.
TIAGO, Servais. O pagador de promessas. (01.05.1963), no 148, p. 55.
ANTNIO, Lauro. O assalto ao trem pagador. (10.03.1965), no 215, p.
62.
SANTOS, Vasco. A fria do cangaceiro. (08.12.1970), no 514, p. 54.
SANTOS, Vasco. Antnio das Mortes. (24.10.1972), no 612, p. 69.
Deus e diabo na terra do sol. (01.10.1974), no 713, p. 63
MATOS-CRUZ, Jos de. A experincia militante. (29.04.1975), no 743, p.
64-65.
Celulide
DIAS, Avelino. Menino de engenho. (Junho de 1966), no 102, p. 8-10.
DIAS, Avelino. Vidas secas. (Junho de 1966), no 102, p. 10-11.
DUARTE, Fernando. Antes, o vero. (Maio de 1971), no 161, p. 9-10.
DUARTE, Fernando. Copacabana me engana. (Maio de 1971), no 161, p.
7-8.
DUARTE, Fernando. Os cafajestes. (Maio de 1971), no 161, p. 8-9.
DUARTE, Fernando. Juliana do amor perdido. (Maio de 1971), no 161, p.
10-11.
DUARTE, Fernando. Panorama do cinema brasileiro. (Agosto de 1971),
no 164, p. 17-18.
DUARTE, Fernando. Memria de Helena. (Setembro de 1971), no 165, p.
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22-23.
DUARTE, Fernando. Os senhores da terra. (Setembro de 1971), no 165,
p. 23-24.
DUARTE, Fernando. A vida provisria. (Out. e Nov. de 1971), nos
166-167, p. 28-30.
DUARTE, Fernando. As amorosas. (Out. e Nov. de 1971), nos 166-167, p.
31-33.
DUARTE, Fernando. Fome de amor. (Out. e Nov. de 1971), nos 166-167,
p. 34-36.
DUARTE, Fernando. O diabo mora no sangue. (Out. e Nov. de 1971), nos
166-167, p. 30-31.
DUARTE, Fernando. Proezas de satans na vila de leva-e-traz. (Out. e
Nov. de 1971), nos 166-167, p. 30-31.
ANTNIO, Lauro. Terras sem po. (Out. e Nov. de 1972), nos 178-179, p.
43-44.
ANTNIO, Lauro. Duas estreias finalmente autorizadas: O couraado
Potemkine e Terra em transe. (Maio de 1974), no 197, p. 18-19.
DIAS, Avelino. Toda nudez ser castigada. (Junho de 1976), no 226, p.
17-18.
DUARTE, Fernando. Operao cinema brasileiro. (Dezembro de 1976),
nos 234-235, p. 27-28.
DUARTE, Fernando. Brasil: cinema novo tem 25 anos. (Outubro de
1977), no 248, p. 105-106.
VIANA, Norberto. Dois filmes erticos brasileiros. (Agosto de 1978), no
263, p. 186.
DUARTE, Fernando. Filme de qualidade?. (Janeiro de 1982), no 331, p.
17-19.
Brasil. (Fevereiro de 1982), no 332, p. 3-33-3-34.
REIS, Maria Fernanda. Pixote e a injustia. (Abril de 1982), no 334, p.
15-101.
VIANA, Norberto. Digresso brasileira. (Julho de 1982), no 337, p.
19-193-20-194.
305
Revistas no-especializadas
Seara Nova
LUZ, Manuel Machado. Presena do cinema novo brasileiro: Vidas
Secas. (Maro de 1967), no 1457, p. 91.
O Tempo e o Modo
BRAGANA, Nuno. Menino de engenho. (Abril de 1966), no 37, p.
537-538.
COSTA, Joo Bnard. As exactas geometrias do destino. (Abril de 1966),
no 37, p. 537-538.
Jornais
Dirio Popular
CAUTELA, Afonso. Uma jornada lamentvel. (21.03.1971), p. 3.
VVAA. Associao de crticos. (05.05.1974), p. 4.
306
Dirio de Lisboa
GRANJA, Vasco. A cultura cinematogrfica no Brasil. xito. (16.04.1963),
p. 3.
PINTO, Oliveira. Quem quem no Cinema Novo brasileiro. (17.03.1971),
p. 3.
PINTO, Oliveira. O Cinema Novo como que o esprito universal da
cultura brasileira - diz o ausente Carlos Diegues. (23.03.1971), p. 3 e
16.
PINTO, Oliveira. Um certo colonialismo cultural nos festivais de
competio - advertncia e lamento de Srgio Ricardo. (24.03.1971),
p. 3 e 22.
PINTO, Oliveira. O cinema fundamentalmente arte e cultura (no
indstria): posio mantida e assumida pelo Cinema Novo.
(28.03.1971), p. 3.
Dirio de Notcias
PINA, Carlos. A partir de hoje o importante saber ver. (13 03.1971), p.
8.
PINA, Carlos. De surpresa em surpresa: Glauber Rocha encerra o
festival. (18.03.1971), p. 8.
TOCANTINS, Leandro. Brasil, trpico e cinema (reproduo da
conferncia proferida pelo adido cultural da embaixada do Brasil em
Lisboa). (08.03.1972), p. 8.
Repblica
Crticas a jornal de crtica: e o critrio, onde est? . (23.03.1971), p. 7.
Expresso
BASTOS, Jorge Henrique. Olhares distantes: uma semana preenchida
com filmes brasileiros at hoje inditos em Portugal. (19.12.1998), p.
307
12-13.
Revistas
Plateia
Glauber Rocha em Portugal atrado pelo 25 de Abril. (18 de Maio de
1974), no 694, p. 24.
MATOS-CRUZ, Jos. Entrevista com Afonso Cautela. (27 de Agosto de
1974), no 708, p. 56-61.
MATOS-CRUZ, Jos. Entrevista com Lauro Antnio. (3 de Setembro de
1974), no 709, p. 12-15.
MATOS-CRUZ, Jos. Entrevista com Joo Lopes. (17 de Setembro de
1974), no 711, p. 20-22.
MATOS-CRUZ, Jos. Entrevista com Fernando Pernes. (8 de Outubro de
1974), no 714, p. 26-27.
MATOS-CRUZ, Jos. Entrevista com Eduardo Geada. (15 de Outubro de
1974), no 715.
MATOS-CRUZ, Jos. Entrevista com Jos Vieira Marques. (29 de
Outubro de 1974), no 717, p. 10-13.
MATOS-CRUZ, Jos. Entrevista com Tito Lvio. (12 de Novembro de
1974), no 719, p. 24-27.
MATOS-CRUZ, Jos. Entrevista com Rui Afonso. (3 de Dezembro de
1974), no 722, p. 16-18.
308
Celulide
DUARTE, Fernando. Congresso da crtica. (Julho de 1961), n 43, p. 1.
DUARTE, Fernando. Cineclubismo: Brasil e Portugal. (Novembro de
1961) n 47, p. 10.
VIEIRA, Carlos et al . Crtica cinematogrfica brasileira. (Novembro de
1961) n 47, p. 1-16.
309
Cinema 15
A pornografia, a vida e o cinema: documentos para uma anlise que no
pode ser arbitrria nem descuidada. (1 de Abril de 1976), n 6, p. 6-9.
310
O Tempo e o Modo
Teses sobre o cineclubismo. (Maio de 1974), no 104, p. 26.
Seara Nova
CAPDENAC, Michel. Descobertas dos cinemas da fome. (Julho de
1964), no 1437, p. 216-217.
311
Referncias cientficas
Lista dos livros, captulos de livros, teses, revistas cientficas e
documentos eletrnicos citados e consultados na investigao.
ADORNO, T. W. (1993) Mnima moralia: reflexes a partir da vida danificada.
So Paulo : tica, 1993.
312
313
314
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