Antologia Poética de Carlos Drummond de Andrad1
Antologia Poética de Carlos Drummond de Andrad1
Antologia Poética de Carlos Drummond de Andrad1
As palavras e as idias
Uma leitura de Antologia potica, de Carlos Drummond de Andrade
Belo Horizonte
1999
SUMRIO
O VIVIDO E O INVENTADO
A POESIA E A PROVA
A TNICA DA COMPOSIO
11
UM EU TODO RETORCIDO
12
14
16
CANTAR DE AMIGOS
17
AMAR-AMARO
19
21
POESIA CONTEMPLADA
24
NA PRAA DE CONVITES
26
27
SUPLEMENTO 5 EDIO
31
GAUCHE NA VIDA
36
OBRAS COMPLETAS
40
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
41
QUESTES
42
RESPOSTAS
55
O VIVIDO E O INVENTADO
A leitura da presente obra de Carlos Drummond de Andrade,
Antologia potica, exige que se faam algumas consideraes sobre a leitura
da poesia, e sobre sua prpria criao .
O poeta francs Paul Valry, na tentativa de definir poesia, afirmou
certa vez, em seu texto Poesia pura - notas para uma conferncia:
Todas as vezes em que a palavra mostra um certo distanciamento
em relao expresso mais direta, isto , a mais insensvel do
pensamento, e todas as vezes que esses distanciamentos fazem
pressentir, de alguma forma, um mundo de relaes distinto do
mundo puramente prtico, concebemos mais ou menos
claramente a possibilidade de aumentar este domnio de exceo,
e temos a sensao de dar ao fragmento uma substncia nobre e
viva que talvez suscetvel de desenvolvimento e de cultivo; isso
a poesia enquanto efeito de arte. (Traduo de Srgio Alves
Peixoto)
O poeta est falando sobre a utilizao da palavra como arte.
Comumente, usamos a palavra, a linguagem para comunicarmos alguma
idia, ou seja, ela tem para ns um fim utilitrio, ou pragmtico. Esse tipo de
utilizao da linguagem o que Valry chama expresso mais direta, ou
sentido puramente prtico, e portanto a expresso mais insensvel do
pensamento.
A utilizao artstica da linguagem pressupe um afastamento do uso
pragmtico, ou informativo, j que a arte no pretende ter nenhuma utilidade
prtica. Assim, quanto mais se afasta da linguagem comum, quanto mais
amplia o universo desse domnio de exceo, ou uso limitado da linguagem,
mais se aproxima da arte da palavra, ou seja, a poesia enquanto efeito de
arte.
Como a poesia feita das mesmas palavras que utilizamos no dia-adia, praticamente impossvel que ela se afaste completamente de algum
tipo de referncia ao mundo real. Entretanto, o poeta tenta, e sempre
tentar, criar com as mesmas palavras velhas (ou inventando outras) um
novo mundo, ou uma nova ordem de coisas que tenha a menor relao de
ordem prtica possvel com o chamado mundo real.
No momento em que um conjunto de palavras reunidas ultrapassa seu
mero sentido lgico que o amarra nossa realidade, agregando a si uma
substncia nobre e viva, criando uma atmosfera particular, que causa
determinados efeitos sobre os homens, teremos a o que chamam poesia.
Conseguir ultrapassar o mero entendimento das idias que as
palavras veiculam e penetrar no universo imagstico, na pluralidade de
expresso das palavras, e chegar ao encantamento que elas proporcionam,
isso ler poesia.
como reitera Paul Valry no mesmo discurso:
Um poema vale pelo contm de poesia pura, isto , de verdade
extraordinria; de perfeita adaptao ao domnio do perfeitamente
4
10
A TNICA DA COMPOSIO
Antologia potica
O indivduo;
A terra natal;
A famlia;
Amigos;
O choque social;
O conhecimento amoroso;
A prpria poesia;
Exerccios ldicos;
Uma viso, ou tentativa de, da existncia.
A cada uma das divises temticas acima, o poeta deu um ttulo que
exprime uma viso pessoal do agrupamento nomeado:
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
mundo
Um eu todo retorcido;
Uma provncia: esta;
A famlia que me dei;
Cantar de amigos;
Amar-amaro;
Uma, duas argolinhas;
Poesia contemplada;
Na praa de convites;
Tentativa de explorao e de interpretao do estar-no11
10.
1. UM EU TODO RETORCIDO
O ttulo dado por Drummond a esta parte sugere uma viso de si
mesmo nada simtrica, pouco equilibrada, muito imperfeita, cheia de
equvocos. Retorcido pode ser no-linear, no-conforme, no-enquadrado,
misturando um comportamento social impecvel com momentos de esprito
rebelde e chapliniano. O eu retorcido se resume na palavra gauche,
presente na primeira estrofe da primeira parte da Antologia.
Os nove poemas desta parte apontam para um eu no apenas
retorcido, mas descrente da vida, angustiado; conformado no, antes
perplexo, cheio de indagaes que revelam a inquietude do esprito do
poeta:
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu corao.
Porm meus olhos
no perguntam nada (Poema de sete faces)
Que barulho esse na escada? (Poema pattico)
Estarei mesmo sozinho? (A bruxa)
E agora, Jos? (Jos)
Escreverei sonetos de madureza?
Darei aos outros a iluso de calma?
Serei sempre louco? Sempre mentiroso?
Acreditarei em mitos? Zombarei do mundo?
(Versos boca da noite)
So freqentes nessa seo o sentimento de abandono e
desesperana, a solido em meio multido, a encruzilhada do homem, o
beco sem sada para os problemas existenciais:
Meu Deus, por que me abandonaste (Poema de sete faces)
Perdi o bonde e a esperana
Volto plido para casa. (Soneto da perdida esperana)
Estou s, sem amigo (A bruxa)
A injustia no se resolve.
sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tmido (Consolo na praia)
E como reage o indivduo a tantos reveses, a tanta incompreenso, a
tanta falta de perspectiva?
Apesar de tudo, h que resistir, h que buscar uma sada:
Voc marcha, Jos! / Jos, para onde? (Jos).
H que desabafar, pelo menos, fazer confidncias:
Companheiros, escutai-me! (A bruxa).
Ningum me far calar, gritarei sempre (Idade madura).
12
Amar-amaro, nome que o poeta deu a esta seo, que contm textos
sobre o choque social, o ttulo do ltimo poema que aparece na parte
seguinte, sobre o amor (Uma, duas argolinhas). O intrigante que Amaramaro um poema do livro Lio de coisas, de 1962, em que j no
transparece na poesia de Drummond a preocupao social, abundante nos
livros Sentimento do mundo, Jos e A rosa do povo. Em Lio de coisas,
Drummond j apresenta uma poesia mais madura, cheia de inquietaes
humanas, mais universal, despojada de engajamentos sociais.
O nome desta parte, Amar-amaro, mistura de paixo com amargura,
amor gauche, certamente remete aos seguintes versos do poema da quinta
seo:
amig (o,a) me releve
este malestar
cantarino escarninho piedoso
este querer consolar sem muita convico
o que inconsolvel de ofcio
interessante lembrar que em entrevista dada a Maria Julieta,
Drummond declarou que considerava sua poesia social como fruto de sua
fase potica mais produtiva; a decepo, entretanto, com a militncia poltica
fez com que ele reflusse (a partir de Novos poemas, 1948) para uma poesia
mais subjetiva, algo metafsica.
, portanto, esse perodo fecundo que Drummond homenageia nesta
parte da Antologia, advertindo, porm, que essa tentativa de consolo intil.
Fique, de qualquer forma, registrado o apelo/denncia do poeta.
Quase todos os poemas desta parte (com exceo de quatro) foram
escritos entre 1939 e 1945, poca da Segunda Grande Guerra. O tom,
naturalmente, de desgosto com a vida, a temtica da injustia, da
destruio, da inutilidade das coisas diante de um mundo catico, um
sistema de erros dominado por interesses capitalistas.
O poema de abertura encena uma tentativa frustrada de suicdio que
leva o poeta, proprietrio de um Corao amoroso, a se identificar com a
cidade que ama e com seus habitantes. A guerra e a destruio so
lembrados em Sentimento do mundo e, de forma mais sutil, em Lembrana
do mundo antigo, que no tinha os perigos que o atual oferece.
Em Elegia 1938, o capitalismo, chamado pelo eu-lrico de Grande
Mquina, o inimigo, contra o qual no se pode lutar. Resta conformar-se e
adiar para outro sculo a felicidade coletiva. O agente do grande mal
depreende-se que sejam os Estados Unidos, o grande e poderoso arquiteto
e executor do capitalismo selvagem:
Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuio
porque no podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.
19
Dia,
espelho de projeto no vivido,
e contudo viver era to flamas
na promessa dos deuses (...)
As inquietaes do poeta revelam-se atravs de oposies:
antteses, fuses de contrrios, paradoxos. a velhice, por exemplo, que
traz paz, mas uma paz destroada, em oposio ao esprito agressivo da
mocidade; a vida que palmilhamos em caminho tortuoso, um dar sem
dar, viver sem viver. Vida insossa, que utilidade h em juntar os cacos do
passado, de to frgeis que eles so? So as negaes, hesitaes do ser
humano, o ser no sendo, o estar no estando, o riso das contradies da
vida:
e vendo,
eu pobre de mim no via.
(Rola mundo)
eterno tudo aquilo que vive uma frao de segundo
(Eterno)
H muito aprendi a rir,
de qu? de mim? Ou de nada?
(Cantiga de enganar)
H cinqenta anos passados,
Padre Olmpio bendizia,
Padre Jlio fornicava
(Cantiga de enganar)
Por que chora o homem?
Que choro compensa
o mal de ser homem?
(Especulaes em torno da palavra homem)
To errado, esse mundo nosso, que Deus se pergunta no cu se
teria sido certo cri-lo, e fica triste por sentir que a resposta mais para no
do que para sim. J que nosso mundo torto, pode-se tentar estar tambm
em outros mundos; no mundo, por exemplo, da poesia, levado pela
contemplao, ou no mundo da memria, como em A um hotel em
demolio:
Vai, Hotel Avenida,
vai convocar teus hspedes
no plano de outra vida.
Se o mundo no vale a pena, vale construir um outro feito de
palavras, reservando este para quem o quiser viver:
28
33
GAUCHE NA VIDA
Ele nasceu em Itabira, Minas Gerais, em 31 de outubro de 1902,
proporcionando a um anjo torto a famosa declarao-exortao: Vai, Carlos!
Ser gauche na vida (Poema de sete faces). Nascer em Itabira terra
abundante em minrio de ferro
teria, segundo o poeta, forjado seu
carter: Alguns anos vivi em Itabira. / Principalmente nasci em Itabira. / Por
isso sou triste, orgulhoso: de ferro (Confisso do itabirano). O pai era
fazendeiro, os primeiros estudos foram em Itabira, a infncia foi na fazenda:
Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha me ficava sentada cosendo.
Meu irmo pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre as mangueiras
lia a histria de Robinson Cruso.
Comprida histria que no acaba mais,
(Infncia)
Na adolescncia estudou no colgio Arnaldo, em Belo Horizonte, e no
colgio Anchieta, em Nova Friburgo, de onde foi expulso por causa de um
atrito com o professor de portugus, que o acusou de insubordinao
mental. Aos dezoito anos, muda-se com a famlia para Belo Horizonte, e
comea a escrever para vrios jornais. Conheceu em 1924, em Belo
Horizonte, Mrio de Andrade e Manuel Bandeira, com os quais se
correspondeu durante muitos anos.
Nessa poca, trava conhecimento com Milton Campos, Gustavo
Capanema, Abgar Renault, Emlio Moura, Pedro Nava, Joo Alphonsus e
outros escritores e jornalistas belorizontinos, junto com os quais passaria a
incomodar a placidez parnasiana da capital mineira. Embora no
constitusem um grupo literrio com propostas claras, eles tinham em comum
a paixo pela literatura e a vontade de fazer algo diferente do academicismo
ento vigente, o que os tornou, obviamente, antipticos aos representantes
do status quo literrio da poca.
Casou com Dolores em 1925, e formou-se em Farmcia no mesmo
ano, mas nunca exerceu a profisso, para preservar a sade dos outros.
Retornou a Itabira em 1926 para tentar ser fazendeiro, o que naturalmente
no deu certo, pois como o prprio Drummond dizia, no sabia distinguir um
cavalo baio de um alazo. Passou ento a dar aulas de geografia e
portugus (um farmacutico!) no ginsio Sul-Americano, de Itabira. Em 1928
nasce Maria Julieta, sua filha, que se tornou sua grande amiga e confidente,
a quem o poeta se referiu como meu verso melhor ou nico, / meu tudo
enchendo meu nada (A mesa). No ano anterior, havia nascido o filho Carlos
Otvio, que viveu apenas meia hora.
Estreou em livro em 1930, com Alguma poesia, impresso na Imprensa
Oficial, onde trabalhava, e seu custo foi descontado mensalmente no salrio
do poeta. O livro contm experincias diversas, desde o poema-piada at
construes mais elaboradas; apresentava acabamento grfico de primeira
qualidade, ao encargo de Eduardo Frieiro, anti-modernista de carteirinha.. .
Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1934, ao ser nomeado chefe de
gabinete de Gustavo Capanema, ento ministro da Educao e Sade; onze
34
Sobre a felicidade:
No fui feliz, nem infeliz, porque a felicidade um estado transitrio e
os momentos de plenitude so seguidos de uma dor de barriga, uma
dor de dente, a conta por pagar. No fiz fora para viver, a minha vida
construiu-se ao sabor do acaso, quase minha revelia, sem um
projeto arquitetnico, sem estudo. Mas tive a sorte de rodear-me de
amigos excelentes, que me ajudaram, incentivaram e me salvaram do
desnimo. Nesse sentido, posso dizer que sou um homem feliz.
37
OBRAS COMPLETAS
1930 Alguma poesia
1934 Brejo das almas
1940 Sentimento do mundo
1942 Poesias
1944 Confisses de Minas
1945 A rosa do povo
1948 Poesia at agora
1951 Claro enigma
1951 Contos de aprendiz
1952 Viola de bolso
1952 Passeio na ilha
1954 Fazendeiro do ar & Poesia at agora
1955 Poemas
1957 Fala, amendoeira
1962 Lio de coisas
1962 A bolsa e a vida
1966 Cadeira de balano
1967 Versiprosa
1968 Boitempo
1970 Caminhos de Joo Brando
1972 O poder ultra juvem
1973 As impurezas do branco
1973 Menino antigo
1974 De notcias e no-notcias faz-se a crnica
1975 Amor, amores
1977 Discursos de primavera
1977 Os dias lindos
1978 70 historinhas
1979 Esquecer para lembrar
1980 A paixo medida
1981 Contos plausveis
1983 Nova reunio
1983 O elefante
1984 Corpo
1984 Boca de luar
1985 O observador no escritrio
1985 Amar se aprende amando
1985 Histria de dois amores
1986 Tempo, vida, poesia
Obras publicadas postumamente:
1987 Moa deitada na grama
1988 O avesso das coisas
1989 Auto-retrato e outras crnicas
1990 Arte em exposio
1992 O amor natural
1996 Farewell
38
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. So Paulo: Cultriz, 1976
CLAUDEL, Paul. Animus et anima. In: Pages de prose. Paris:
Gallimard, 1944.
DRUMMOND DE ANDRADE, Carlos. Antologia potica. Rio de
Janeiro: Jos Olmpio, 1978.
LIMA, Lus Costa. Lira e antilira. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira,
1966.
MARITAIN, Jacques et Rassa. Sentido e falta de sentido em poesia
(traduo de Srgio Alves Peixoto). In: Situation de la posie. Bruges:
Descle de Brower, 1964.
PARAIZO, Maringela de Andrade. Verso e avesso. Belo Horizonte:
Universidade, 1995.
VALRY, Paul. Calepin dun pote; Posie pure (notes pour une
confrence) (Traduo de Srgio Alves Peixoto). In: Oeuvres, I., Paris,
Gallimard, 1957.
39
QUESTES
Questo 1
Todas as alternativas apresentam afirmaes aceitveis sobre o conjunto de
poemas de Drummond contido na Antologia potica, EXCETO
A) Nos temas abordados na obra, h um pouco de biografia e de bibliografia,
um pouco da sua histria e da de sua terra, seus amigos e seus livros,
e reflexes sobre o fazer potico.
B) O fluir do tempo, o questionamento da prpria identidade e consideraes
metalingsticas so ncleos temticos presentes em poemas de vrias
partes do livro.
C) O eu-lrico utiliza vrios artifcios para burlar o tempo. Coloca-se fora dele,
atravs da atitude de contemplao, tenta congel-lo em imagens que
se eternizam pela arte, ou tenta fugir mais depressa do que ele.
D) O poeta guarda o segredo do tempo, que s revelado quando a
mquina do mundo se abre para ele, propondo-lhe a restituio dos
sentidos e intuies, da riqueza e da cincia de viver.
Questo 2
Leia atentamente a seguinte passagem, tirada da Antologia potica, de
Carlos Drummond de Andrade:
Convvio
Cada dia que passa incorporo mais essa verdade, de que
eles no vivem seno em ns
e por isso vivem to pouco; to intervalado; to dbil.
Fora de ns que talvez deixaram de viver, para o que
se chama tempo.
E essa eternidade negativa no nos desola.
Pouco e mal que eles vivam, dentro de ns, vida no
obstante
E j no enfrentamos a morte, de sempre traz-la conosco.
Mas, como esto longe, ao mesmo tempo que nossos atuais
habitantes
e nossos hspedes e nossos tecidos e a circulao nossa!
A mais tnue forma exterior nos atinge.
O prximo existe. O pssaro existe.
E eles tambm existem, mas que oblquos! E mesmo
sorrindo, que disfarados...
..............................................
Todas as alternativas contm interpretaes aceitveis sobre o trecho acima,
EXCETO
40
41
44
desejado,
poeta de uma poesia que se furta e se expande
maneira de um lago de pez e resduos letais...
s nosso fim natural e somos teu adubo,
tua explicao e tua mais singela virtude...
poro
Um inseto cava
cava sem alarme
perfurando a terra
sem achar escape.
Que fazer, exausto,
em pas bloqueado,
enlace de noite,
raiz e minrio?
Eis que o labirinto
(oh razo, mistrio)
presto se desata:
em verde, sozinha,
antieuclidiana,
uma orqudea forma-se.
Carlos Drummond de Andrade, em sua Antologia potica, classificou
tematicamente sua poesia em nove compartimentos. Assinale aquele no qual
se encaixa o poema acima.
A)
B)
C)
D)
a prpria poesia
amigos
o choque social
exerccios ldicos
Questo 17
Leia os dois trechos de poemas de Drummond.
E j tarde da noite
volta meu elefante,
mas volta fatigado,
as patas vacilantes
se desmancham no p.
Ele no encontrou
o de que carecia,
o de que carecemos,
eu e meu elefante,
em que amo disfarar-me.
Exausto de pesquisa,
caiu-lhe o vasto engenho
como simples papel.
A cola se dissolve
e todo o seu contedo
de perdo, de carcia,
O ciclo do dia
ora se consuma
e o intil duelo
jamais se resolve.
O teu rosto belo,
palavra, esplende
na curva da noite
que toda me envolve.
Tamanha paixo
e nenhum peclio.
Cerradas as portas,
a luta prossegue
nas ruas do sono.
(O lutador)
49
de pluma, de algodo,
jorra sobre o tapete,
qual mito desmontado.
Amanh recomeo.
(O elefante)
REDIJA um texto ASSOCIANDO os dois trechos acima e EXPLICANDO a
temtica que os aproxima.
Questo 18
No poema A um hotel em demolio, o eu-lrico relembra os velhos tempos
do Hotel Avenida, que ser derrubado. Leia o seguinte trecho do poema:
(Pois eras bem longevo, Hotel, e no teu bojo
o que era nojo se sorria, em p, contigo.)
O tardo e rubro alexandrino decomposto.
REDIJA um texto INTERPRETANDO as imagens contidas nos versos acima.
Questo 19
Leia o soneto abaixo, da Antologia potica de Drummond.
Entre o ser e as coisas
Onda e amor, onde amor, ando indagando
ao largo vento e rocha imperativa,
e a tudo me arremesso, nesse quando
amanhece frescor de coisa viva.
As almas, no, as almas vo pairando,
e, esquecendo a lio que j se esquiva,
tornam amor humor, e vago e brando
o que de natureza corrosiva.
Ngua e na pedra amor deixa gravados
seus hierglifos e mensagens, suas
verdades mais secretas e mais nuas.
E nem os elementos encantados
sabem do amor que os punge e que , pungindo,
uma fogueira a arder no dia findo.
A partir da leitura do soneto, REDIJA um texto EXPLICANDO a concepo
de amor revelada no poema.
50
Questo 20
Leia o poema abaixo, da Antologia potica de Drummond.
Congresso internacional do medo
Provisoriamente no cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraos,
no cantaremos o dio porque esse no existe.
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertes, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mes, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos tmulos nascero flores amarelas e medrosas.
A partir da leitura do poema, REDIJA um texto RELACIONANDO a ausncia
do amor presena do medo e EXPLICANDO as causas da situao
retratada pelo eu-lrico no texto.
51
RESPOSTAS
A)
B)
C)
D)
10 - 12 - 14
2-3-7
4 - 5 - 11 - 13
1 - 6 - 9 - 15
Questo 8
No trecho do item B), a imagem predominante a metonmia. bvio
que as pernas que aparecem no bonde possuem um corpo sobre elas; o
autor toma a parte pelo todo, num processo de contigidade, como se as
pessoas fossem s pernas. O mesmo se pode dizer do corao que
pergunta e dos olhos que no perguntam nada.
No item A), por exemplo, flor liga-se a dia, sugerindo juventude,
claridade, promessa de vida, sem que o substantivo flor tenha alguma
contigidade visvel com dia. A relao , pois, de associao livre, mais
subjetiva, portanto.
Questo 17
Pode-se relacionar a temtica dos dois textos criao potica. O
elefante potico sai pelo mundo sem ter encontrado o que queria; podendose associar o seu fracasso ao fracasso do poeta, que com ele se identifica.
No texto de O lutador, o poeta batalha para conseguir transformar as
palavras em alguma produo potica, mas o intil duelo jamais se resolve.
Entretanto, em ambos os casos, a luta continua.
Questo 18
O hotel, que ento se demolia, era bem antigo, e era to acolhedor
que pulverizava a tristeza em alegria: sorria, em p. Toda essa classe e
magnanimidade do ambiente evocada pelo tardo e rubro alexandrino
decomposto. O verso alexandrino um verso clssico que se decompe em
doze slabas mtricas, com acentuao na sexta slaba. a associao do
hotel ao clssico, ao erudito, ao refinado.
Questo 19
O amor das coisas da natureza e das coisas inanimadas parece ter
maior significado interior e maior pureza do que o dos homens, que tendem
a banaliz-lo, ou o tratam com superficialidade. Mas mesmo os elementos,
que conseguem apreender a natureza corrosiva do amor, deixando-o
registrado, no alcanam a profundidade maior do efeito pungente que o
amor lhes provoca.
52
Questo 20
O amor no acabou, mas est provisoriamente fora de circulao.
Quem o retirou do convvio dos homens foi o medo da nova ordem do mundo
moderno, o medo do capitalismo, da guerra, da opresso, e de tudo o que
nos rodeia. O medo to contagiante que ele ser assunto de todos os
cantos, e quando o homem morrer de medo, ele ainda deixar uma herana
de medo, metaforizada nas flores amarelas e medrosas.
53