Informe C3 - Edição 11
Informe C3 - Edição 11
Informe C3 - Edição 11
Informe
C3
Revista Digital
Segredo/Curiosidade/Tempo/Espao
Esconderijos... lugares (in) acessveis que despertam a curiosidade em diferentes pocas e espaos, onde o corpo territrio para diferentes manifestaes ou manifesta diferentes possibilidades... Onde no
bate o sol quente ou frio? Onde no bate o sol iluminado pela lua? A
sombra desperta o medo por muitas vezes no se ver o que est sob ela,
ou, apresenta um espao/tempo para se camuflar, esconder e/ou descansar? Quem vive no trnsito entre a luz e a escurido? Quem guarda
segredos em lugares onde no bate o sol que podem contar diferentes
verses sobre a mesma histria? O escondido, inacessvel ou proibido
desperta a curiosidade e desejos?
04 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Prxima Edio
Colabore/contato: processoc3@yahoo.com.br
Relaes/Parcerias/Afetividade/Dilogo
Quantos eus habitam em mim? Quantos eus me constituem?
Quanto minhas relaes me constituem enquanto sujeito no(s) mundo(s)
que reconheo como meu(s) territrio(s) de pertencimento? At que ponto
minhas relaes me localizam na(s) dimenses e espaos onde (sobre)
vivo? Atravs do dilogo podem-se iniciar parcerias ou podem-se findar
relaes. Um dilogo sufocado quando uma nica fala prevalece transformando esse dilogo em um monlogo. A afetividade sobrevive ao silncio? Ser que essa pergunta faz sentido? Talvez a falta de dilogo para
elaborar em um pargrafo essa ideia faa com que Eu me d conta de
que Eu preciso do outro para tentar perceber os sentidos da existncia e
do fim dela. Eu, tu... Talvez ns com eles! Onde est o outro? Que grupo
esse? Onde est minha turma?
Informe C3 - 05
Informe
C3
Revista Digital
Capa:
Marlon Lima
Foto:
Anderson de Souza
Produo geral:
Wagner Ferraz
Local:
Porto Alegre/RS/Brasil
Edio e tratamento de imagem:
Anderson de Souza
Direo de Arte:
Wagner Ferraz
Informe C3 / n. 11, (jan./mar. 2011). Porto Alegre, RS : Processo C3, 2011. On line.
Disponvel em: http://www.processoc3.com
Trimestral
ISSN: 2177-6954
1. Cultura. 2. Artes. 3. Corpo. 4. Moda. 5. Pesquisa
CDD:
301.2
370.157
793.3
646
Classificao: 18 anos
O contedo apresentado pelos colaboradores (textos, imagens...) no so de responsabilidade do Processo C3 Grupo de Pesquisa e da Informe
C3 Revista Digital. Nem todo opinio expressa neste meio eletrnico ou em possvel vero impressa, expressam a opinio e posicionamento dos
organizadores deste veculo.
06 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Ano 03 - Edio 11
Jan/mar - 2011
EXPEDIENTE
Direo Geral e Coordenao Editorial:
Wagner Ferraz e Camilo Darsie
Pesquisa e Organizao:
Processo C3 - Wagner Ferraz
Edio de Moda e Arte
Anderson de Souza e Lu Glaeser
Projeto Grfico e Direo de Arte:
Anderson de Souza e Wagner Ferraz
Edio de Arte e diagramao:
Wagner Ferraz
Arte da Capa:
Anderson de Souza
Colaboradores/colunistas:
Rodrigo Monteiro - Porto Alegre/RS/Brasil - www.teatropoa.blogspot.com;
T. Angel - Frrrk Guys - So Paulo/Brasil- www.frrrkguys.com;
Luciane Moreau Coccaro - Porto Alegre/Rio de Janeiro;
Marta Peres - Rio de Janeiro/Brasil;
Anderson de Souza - Porto Alegre/RS/Brasil
Conselho Editorial:
Luciane Moreau Coccaro (UFRJ/RJ); Marta Peres - (UFRJ/RJ); Anderson L. de Souza (SENAC/Moda e Beleza - Processo C3); Wagner Ferraz
(Processo C3 e Terps Teatro de Dana); Rodrigo Monteiro - Critica Teatral/
Porto Alegre/RS; Luciane Glaeser - Pensando em Moda/SP.
Apoiadores/Espaos para divulgao:
Wagner Ferraz
Contatos:
Wagner Ferraz
55-51-9306-0982
wagnerferrazc3@yahoo.com.br
www.processoc3.com
www.processoc3.blogspot.com
http://processoc3.wordpress.com/
http://processoc3.tumblr.com/
http://processoc3.posterous.com
http://www.twitter.com/processoc3
www.terpsi.com.br
Informe C3 - 07
Informe
C3
Revista Digital
NDICE
- Apresentao pg. 13
- Ensaio 01 pg. 18
- Ensaio 02 - pg. 24
- X[X]Y - pg. 30
T.Angel
Fotos:Thiago Marzano
- Ensaio 03 - pg. 40
Um lugar ao sol
Virgnia Las de Souza
- Ensaio 04 pg. 60
Informe
C3
Revista Digital
- Ensaio 5 pg. 94
Informe C3 - 09
Informe C3 - 11
Informe
C3
Revista Digital
AGRADECIMENTOS
www.terpsiteatrodedanca.blogspot.com
www.frrrkguys.com
Thiago Marzano
So Paulo/Brasil
Rodrigo Monteiro
Porto Alegre/RS/Brasil
www.teatropoa.blogspot.com
Marta Peres
Rio de Janeiro/Brasil
Luciane Glaeser
Pensando em Moda
So Paulo/SP
Nati Canto
So Paulo/Brasil
Priscilla Davanzo
So Paulo/Brasil
12 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
APRESENTAO
Onde ser que no bate o sol? Ouvi
muito essa pergunta por parte de diferentes
pessoas aps lanar o ideia, para que diferentes interessados escrevessem para a Edio
11 da Informe C3.
Esclareo que o ttulo - onde no
bate sol surgiu no ano de 2010 em conversas no cotidiano e na rotina de meu antigo emprego na Coordenao de Cultura na Universidade Luterana do Brasil. s vezes quando no
encontrava algo na sala onde eu trabalhava,
costumava perguntar se algum sabia o paradeiro do objeto procurado. Ento ouvia sempre
de minha ex-colega de trabalho e amiga, Camila Dall Agnese: Tu deve ter enfiado l onde
no bate o sol!.
Achava muito engraado e ficava
pensando nos possveis lugares onde no
bate o sol. A partir disso tentei traar desdobramentos que possibilitassem que diferentes
pessoas de diferentes reas pudessem falar
deste assunto a partir do ttulo da edio, de
quatro palavras (talvez chaves) e da breve sinopse que aqui apresento.
Onde no bate o sol!!!!
Segredo/Curiosidade/Tempo/Espao - Esconderijos... lugares (in)
acessveis que despertam a curiosidade em diferentes pocas e espaos, onde o corpo territrio para
diferentes manifestaes ou manifesta diferentes possibilidades...
Onde no bate o sol quente ou
frio? Onde no bate o sol iluminado pela lua? A sombra desperta o
medo por muitas vezes no se ver
o que est sob ela, ou, apresenta
um espao/tempo para se camuflar,
esconder e/ou descansar? Quem
vive no trnsito entre a luz e a escurido? Quem guarda segredos
em lugares onde no bate o sol que
podem contar diferentes verses sobre a mesma histria? O escondido,
inacessvel ou proibido desperta a
curiosidade e desejos?
Pensei que diferentes perguntas pudessem
auxiliar. No sei dizer ao certo que auxiliaram,
mas isso pode ser acessado nas pginas desta edio e cada um poder tirar suas prprias
concluses.
O projeto desta edio esteve escondido, inacessvel e guardado durante meses, meses estes em que adiei a finalizao
desta edio por muitos motivos. Mas sempre
me lembrava da amiga Camila quando as pessoas perguntavam quando essa edio ficaria
pronta. Imaginava-me respondendo: Est edio da revista est l onde bate o sol!
Fiz um grande esfora para finalizla, pois cada edio um parto, cada edio
dolorida, cansativa, difcil, cheia de descobertas, grandes parcerias, de grandes colaboradores, de muito interessados a responder
as questes aqui lanadas e dividir isso com
outras pessoas. esse envolvimento e participao de todos os interessados que faz com
este trabalho continue.
Como o bailarino e amigo Marlon
Lima que posou para a foto da capa e para
o ensaio em outras pginas da revista. No
ensaio 2 encontramos o texto da antroploga
Luciane Coccaro que faz uma reflexo sobre
um espetculo de dana. Em seguida nosso
fiel colaborador T. Angel divide suas fotos to
instigantes que podem ser interessantes para
quem pesquisa sobre gnero e sexualidade,
e para quem no pesquisa tambm. Virgnia
Las de Souza colabora pela primeira vez com
um ensaio que aponta para algumas das ditas
deficincias permitindo pensar sobre o lugar
onde estes se encontram. Seria um lugar onde
bate o sol? Logo aps nossa colaboradora de
longa data Marta Peres escreve, Microrratos
corroem por dentro, ela nos conduz por um
espao sub e nos faz chegar a um tema que
grande partes das vezes costura todos os trabalhos apresentados nesta revista o corpo.
Aline Torchia Predebon apresenta um ensaio
fotogrfico resultante do seu trabalho de concluso de curso de graduao que pode servir
de orientao para outros que se encontram
fazendo trabalhos de finalizao de curso na
mesma rea moda. A crtica teatral de Rodrigo Monteira traz O animal agonizante. Roupaginada o resultado de um trabalho de
Anderson de Souza que mistura arte e moda
apontando para um assunto to atual reaproveitamento de materiais e sustentabilidade.
Colaborando pela primeira vez encontramos
um pouco sobre o trabalho dos performers
Filipe Espindola e Sara Panamby causando
estranhamento para alguns e despertando a
admirao de tantos. Tambm pela primeira
Informe C3 - 13
Segredo/Curiosidade/Tempo/Espao
Esconderijos... lugares
medo
no se ver
um
espao/tempo para se
Quem vive no trnsito
camu-
16 - Informe C3
sol que
diferentes
verses sobre
O esdesperta a
condido,
curiosidade e desejos?
Esconderijos... lugares (in) acessveis
que despertam a curiosidade em
, onde o corpo territrio para
Onde no bate o
sol quente ou frio? Onde no bate
o sol iluminado pela lua? A sombra desperta o por muitas vezes
bate o
podem contar
a mesma histria?
inacessvel ou proibido
diferentes possibilidades...
medo
no se ver
um
espao/tempo para se
camu-
Informe C3 - 17
Informe
C3
Revista Digital
ENSAIO 01
As performances do perigoso
breves e apressados apontamentos
Andr Masseno*
Falar de esconderijos, revelar segredos, tornar transparente e direto o que parece
turvo e obtuso: estas parecem ser as palavras
de ordem do dia. Nesta sociedade de vidro na
qual atualmente vivemos, onde exigido um
discurso de si cristalino, ou se preferirmos,
sincero, o sujeito que renncia reproduo
compulsria da confisso pode ser considerado, por certas instncias sociais normativas,
extremamente perigoso e ameaador, pois a
esquiva do escrutnio de si na esfera pblica
obstrui a possibilidade de ser socialmente
rotulado pelos seus desejos, pensamentos e
sexualidade. E quando esta renncia parte de
um sujeito pblico como o artista, a situao
torna-se um pouco complicada. H um desejo
incontrolvel de estender um fio narrativo e coerente entre o sujeito-artista e sua obra, assim
como entre a figura pblica deste sujeito e o
seu comportamento na vida privada, como se
nada pudesse passar inclume ao olhar alheio,
como se no fosse possvel o resguardo, a dissimulao ou a ficcionalizao da intimidade.
Estas linhas um tanto apressadas
so para dar um breve panorama de dois anos
de pesquisa sobre performance, discurso e sexualidade em mbitos acadmicos, mais precisamente no Mestrado em Literatura Brasileira
da Universidade do Rio de Janeiro. Desde
ento, venho discutindo a ideia do que chamo
de performances do perigoso, uma estratgia
equacionada entre a figura pblica do artista
construda por declaraes, fotos e entrevistas do mesmo e a sua obra. Um dos pontos
desta noo de perigoso est no desmantelamento do registro enunciativo da confisso,
quando o artista o substitui pela encenao
de uma intimidade e da ficcionalizao de si
diante do olhar do observador. A performance
do perigoso depende tanto dos contextos histricos, culturais e sociais nos quais se insere
o artista, quanto da sua relao com o olhar
desta entidade to incerta chamada pblico.
Deste modo, se a performance do
perigoso sempre transitria e flutuante, j
que o perigoso de ontem pode no ser o mesmo de hoje, assim como o perigoso para certa
plateia no necessariamente seja para outra,
foi preciso delimitar os artistas, e seus respectivos contextos, sobre os quais se debruaria
esta hiptese. Optei, portanto, pelo estudo
daqueles que, emprica ou artisticamente, dialogaram com os anos iniciais do aparecimento e enunciao do HIV/AIDS, situados entre
18 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
prpria imagem, mas ver a imagem de um aidtico e aquilo que essa imagem representa
(BESSA, 1997, p. 109 grifos do autor) e
justamente por no querer contribuir com as
conotaes pejorativas dadas imagem dos
corpos com HIV/AIDS que Leonilson, a meu
ver, deixa cair o pano sobre o espelho e retira,
por fim, o seu rosto de cena.
Sendo assim, aproprio-me da relao do artista com a sua imagem no espelho
para refletir acerca de El Puerto, porm sob um
duplo deslocamento: ao invs de compartilhar
o pensamento de Bessa acerca do espelho,
ressalto aqui a importncia do papel da cortina
na composio da obra, separando o espelho
do ambiente externo. Ao invs de concluir a
anlise da obra no que tange imagem do
artista, estendo-me importncia do papel do
observador, que deseja levantar a cortina que
separa o espao pblico e a imagem do artista
na intimidade, que se espera representada por
detrs daquele pano. De fato, a representao
ansiada a do rosto do artista enfermo e sem
anteparos. Quando levanta o pano, o observador est movido por uma curiosidade: a de ver
a doena estampada no rosto de Leonilson,
isto , a de ver uma imagem-espelho do artista
doente, refletindo sem mediaes o seu rosto
aidtico. H um movimento mais intenso em
relao ao espelho aps o levantar da cortina,
que no somente o de fazer o espectador se
deparar com o seu prprio rosto, mas tambm
com os desejos e as expectativas que o moveram em direo obra para ver a imagem do
artista com AIDS. O foco passa ser o espectador e seu posicionamento diante da dor do
outro. Logo, o que seria o gesto de levantar a
cortina? Seria um gesto que reiteraria a produo das representaes estereotipadas acerca do sujeito soropositivo/aidtico? Este gesto
seria proveniente de um observador tambm
influenciado por tais estereotipias? Estas
questes me parecem relevantes para se pensar os movimentos tanto de reiterao quanto de resistncia produo de esteretipos
sobre o sujeito com HIV/AIDS, seja pela arte,
seja pelo pblico. Por enquanto, talvez o mais
importante a ser frisado aqui que levantar ou
no levantar a cortina trata-se de uma escolha
do observador. O gesto do espectador, assim
como o do artista, tambm , e sempre ser,
um posicionamento tico.
Enquanto a epidemia do HIV/AIDS,
de acordo com a anlise sobre o vrus feita
por Susan Sontag em AIDS e suas metforas
(2007), acarreta a retomada do discurso binrio heterossexualidade/homossexualidade,
sexo seguro/sexo de risco, figura/fundo (cf.
SONTAG, 2007, p. 138), acredito que a performance do artista (soropositivamente) perigoso, como a de Leonilson atravs de sua obra,
desmantela as performatividades de gnero
calcadas no heterossexismo e na homofobia,
sendo um modo de resistir e confrontar as
performatividades de gnero hegemnicas e
geralmente reguladoras, coercitivas e nada
condescendentes com demais manifestaes
de gnero e de sexualidade que fraturam o
seu jogo de binarismo. Corpo perigoso por resistir confisso ao optar por uma performance repleta de lacunas e (re)encenaes de si,
borrando a legibilidade esperada entre a vida
20 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Referncias Bibliogrficas:
BESSA, Marcelo Secron. Histrias positivas: a
literatura (des)construindo a AIDS. Rio de Janeiro: Record, 1997.
LAGNADO, Lisette. Leonilson: so tantas as
verdades. So Paulo: DBA Artes Grficas;
Companhia Melhoramentos de So Paulo,
1998.
A performance do artista perigoso em Leonilson mostra-se como um gesto
transitrio e malevel, podendo ou no ser
reencenado, editado, repetido (em diferena),
reorganizado. Alm disso, no calcada na
revelao do ntimo, mas sim na apropriao e
reutilizao problematizada, por parte do artista, dos signos e enunciaes conferidos pelos
discursos reguladores ao seu corpo, s suas
sexualidade e subjetividade.
Nesta exposio ao olhar alheio
atravs da performance do (soropositivamente) perigoso, ressalto que arriscado afirmarmos que os artistas que lidaram com o tema
do HIV/AIDS estivessem tirando a sua soropositividade totalmente do armrio. Nem todos
os artistas que empreenderam tal performance
estavam interessados na revelao totalizante de si tanto no campo miditico quanto na
produo artstica, mas sim na encenao de
uma confisso na qual a expectativa pblica
de ter uma declarao sincera e verdadeira
daqueles fosse frustrada pelas omisses de
fatos biogrficos, pelos acrscimos de passagens ficcionalizadas e, em certos momentos,
silenciosas.
Acompanhar durante tanto tempo as
obras e os percursos de vida dos j citados
Cazuza e Leonilson, assim como dos autores
Caio Fernando Abreu, Jean-Claude Bernardet,
Herv Guibert e a escrita ficcional de Silviano
Santiago sobre o tema mais precisamente a
sua novela Uma histria de famlia (1992) ,
remontar seus pensamentos, ler as suas obras
Informe
C3
Revista Digital
22 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 23
Informe
C3
Revista Digital
ENSAIO 02
O que temos necessidade de esconder ou inconscientemente fica escondido
em ns? Que significados adquirem, em cada
contexto, estas nossas zonas proibidas de
ns mesmos? O que sabemos destes locais?
Poderamos falar de locais ntimos em ns?
Existem territrios desconhecidos de nossa
existncia? Que valor d a nossa cultura ao
mistrio e ao segredo? O corpo vira mesmo
um local onde os significados esto ali pra ser
desvendados? E se? Quem pode traduzir tais
sentidos? Temos instrumental e ferramentas
para tal feito? Valorizamos os nossos no ditos? Qual parte de ns mesmos trazemos luz
e quando?
Nesta semana assisti ao espetculo
Fragmentos do desejo da Cia Dos a Deux, brilhante e impactante trabalho cnico-coreogrfico, definido pelos autores como teatro gestual. Trata-se de um espetculo absolutamente
sem texto falado e sem legenda de apoio, criado primorosamente por dois daqueles talentos
brasileiros radicados em Paris - um caso meio
tpico da vida de muitos artistas em nosso pas
que acontecem longe de casa: Andr Curti e
Artur Ribeiro, com excelncia cnica propem
mexer numa questo delicada e, de forma sutil, nos brindam com um espetculo arrepiante
e de muito bom gosto. Um refinamento extremo e cuidado com cada detalhe parece ser
a marca registrada da dupla, que conta para
este grande feito com uma atriz divina e outros
dois atores no menos brilhantes.
A questo tema do espetculo vem
a calhar com o assunto deste texto, ou seja,
como lidamos com fatos vividos e que, talvez
por serem to da ordem do escondido e do
tabu, preferimos deixar no mbito daquele rol
de coisas no ditas e at mesmo impronunciveis.
A vejo a arte como potncia de simbolizar, de elaborar mesmo nossos segredos
to entranhados e doloridos de uma maneira
que ao ser revelado ao pblico, torna-se capaz
de emocionar e se impor a nossa catica e padronizada viso de mundo e de ns mesmos.
A arte, assim vista como uma possibilidade de
tornar visveis elementos da cultura. Acontecimentos passados e marcantes em nossa vida
social e familiar com os quais talvez no gostaramos de ter contato, de enxergar, de deixar
a mostra, de expor. Seria mais cmodo socialmente deix-los na sombra.
24 - Informe C3
Mas a Cia Dos a Deux bancou neste
espetculo a idia de no encobrir mais a situao do incesto e do abuso sexual na infncia,
e ainda, cria uma narrativa cnica que conta
um desenrolar possvel deste evento traumtico, como algo decisivo na vida de um sujeito. O desdobramento desta narrativa explicita
como algum ao viver tal abuso no passado
significa e consegue criar um sentido pra sua
sexualidade na fase adulta, cheia de conflitos,
como me parece tudo que envolve afinal qualquer sexualidade.
O impactante a forma como o
tema abordado, o tom desta violncia est
resolvida e contada no corpo dos atores, claro
que no faltam elementos e signos pra rechear
e nos propiciar uma dimenso extrema de brutalidade, mas sem estar presente de fato como
um ato bruto. A esperteza e a riqueza da dramaturgia do corpo sugerem de forma inegvel
o feito, mas sem dramatizar, sem despencar
pra um drama corriqueiro e banal, no h
banalizao assim como no h concesso.
Apenas como algo que est presente e bem
visvel. Numa sutileza que acaba virando uma
porrada, ganhando assim, ao meu ver, ainda
mais fora cnica de verdade vivida mesmo,
na carne, o que gera ainda mais perplexidade
na platia.
De incio uma atmosfera de tenso
entre os dois atores no papel de um pai e de
um filho deixa claro que h um mistrio perturbador entre eles. Nos corpos e nas atitudes
conseguimos perceber o conflito. A ambincia,
por vezes at soturna do incio da encenao
gera uma expectativa e uma curiosidade pra
descobrir o que aconteceu entre eles. Num
simples jogo de xadrez entre os atores est
posta a tenso, a raiva, a oposio. O jogo
como metfora da ligao de disputa que nos
d pistas de estar servindo pra encobrir algo.
O pai representando a autoridade, o filho deixando escapar seu medo.
Somos enquanto pblico convidados
a olhar. No temos como fugir. O espetculo
simplesmente nos embriaga e embarcamos
nesta situao limite. A passagem do tempo na
vida do ator em cena pontua e expe sua luta
interna pra vencer uma situao: to passado e to presente nele. Da d pra pensar em
como representamos nosso passado. Como
criamos estratgias para seguir vivendo apesar de. Como em toda a nossa complexidade
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
gra social, funda a sociedade fazendo nossa passagem da natureza para a cultura e nos diferenciando dos animais. Para Lvi-Strauss esta proibio de manter relaes
sexuais com nossos parentes de sangue, nos
limita e ao mesmo tempo abre um leque das
possibilidades de mantermos relaes sexuais
com todos os outros que no so consangneos, o que para ele gera a vida em sociedade
e os laos por afinidade.
Aprendemos as regras sociais no
convvio social, determinado por nossa cultura e seus valores. Vamos crescendo e sendo
domesticados a reprimir nossos desejos. Mas
como foi dito antes, no nascemos sabendo
quem devemos ou no desejar sexualmente,
isto algo aprendido socialmente, por isto o
Tabu do incesto. Enquanto nas nossas prticas, muitas vezes no est introjetada esta
regra proibitiva. No estou aqui justificando
o incesto, mas afirmando a la Lvi-Strauss a
complexidade de relacionar nossos desejos
frente a uma regra social. Tentando investigar
as discrepncias entre nossos discursos regrados socialmente e nossas prticas.
E a entendo o Fragmentos do desejo como revirando explicitamente aspectos
simblicos e fundantes da nossa vida em sociedade, cerceada e controversa. Um espetculo que atualiza nossos mitos. O ator-filho se
reinventa e vive um rito de passagem. Numa
cena densa destes aspectos viscerais nossos,
nos reconhecemos e libertamos.
Este texto um exerccio no sentido
de organizar a casa mesmo. As palavras so
insuficientes pra descrever um espetculo to
radicalmente fabuloso. A ordem simblica do
no dito indescritvel. Fragmentos do desejo Imperdvel e impressionante. Um luxo ver
dois atores diretores to precisos, na potica
e na dramaturgia do corpo.
Nota:
(1) LVI-STRAUSS, Claude. 1981 [1947]. Les
structures lmentaires de la parent. Paris:
Mouton.
*Luciane Coccaro
Rio de Janeiro/Porto Alegre/Brasil
Mestre em Antropologia Social/UFRGS;
Bacharel em Cincias Sociais/UFRGS; Professora Assistente do curso de Bacharelado
em Dana Departamento de Arte Corporal
UFRJ; Foi Professora Adjunta do Curso de
Graduao Tecnolgica de Dana/ULBRA;
Foi Professora Adjunta da Faculdade Decision de Administrao de Empresa/FGV;
Foi Professora do Curso de Ps-Graduao
em Enfermagem/IAHCS; Bailarina Prmio
Aorianos 2000; Atriz Prmio Volkswagen
2003; Coregrafa de dana contempornea; Diretora da Cia LuCoc e do Grupo Experimental de Dana da ULBRA de 2006
at 2008; Diretora e intrprete do Espetculo Estados Corpreos em 2009.
Informe C3 - 27
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 29
Informe
C3
Revista Digital
X
[X]
Y
T. Angel
Fotos:
Thiago Marzano
Informe C3 - 30
ESPAO LIVRE 01
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 31
Informe
C3
Revista Digital
32 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 33
Informe
C3
Revista Digital
34 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 35
Informe
C3
Revista Digital
36 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 37
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 38
Informe
C3
Revista Digital
Ficha tcnica:
*T.Angel
Tiago Soares - So Paulo/Brasil
Tcnico em moda pelo SENAC e acadmico
em Histria pela Universidade FIEO, integra o
staff do site argentino Piel Magazine e diretor geral do website Frrrk Guys, que aborda as
temticas da modificao corporal e da beleza
masculina oriunda dessa prtica. Desde 2005
vem atuando no cenrio da performance art.
Nos ltimos anos, Thiago Ricardo Soares vem
colaborando com artigos para diversas revistas nacionais e internacionais. Tem experincia na rea de Histria, atuando principalmente nos seguintes temas: body art, performance
e modificao corporal. Como pesquisador
histrico, interessa-se pelos seguintes temas:
body art, performance e modificao corporal.
Endereo para acessar este CV: http://lattes.
cnpq.br/2319714073115866
Informe C3 - 39
Informe
C3
Revista Digital
ENSAIO 03
Um lugar ao sol
Virgnia Las de Souza*
E quem h de duvidar do ditado:
O escondido mais gostoso? Usa-se para
quase tudo, dos complexos casos de romance
aos riscos que envolvem estar dentro e fora da
lei. Porm, sabe-se que parte do que foi (ou
) escondido no necessariamente se encaixa nesse ditado. No XIX os circos expunham
pessoas como aberraes para conquistar o
pblico. Mostrar a mulher coberta de pelos, as
crianas siamesas e o homem com deformidade fsica era um negcio interessantssimo.
Os donos do circo ao encontrar uma
pessoa fora do padro imaginavam um verdadeiro alavancar em sua carreira. Exibindo
uma aberrao no circo, ele poderia ganhar
muito dinheiro e ser conhecido como o nico
na regio que era dono de algum em uma
situao X.
Para o pblico significava diverso
garantida para os finais de semana. Por alguns trocados, era possvel ter acesso a um
show de horrores. Ao mesmo tempo, olhar o
outro no papel de estranho traz uma sensao
de conforto, a afirmao de que eu sou normal.
Quanto ao motivo da existncia do
show... bom, isso pouco interessava. A pessoa
tinha deformidades, era incapaz de conseguir
trabalho e respeito da sociedade e muitas vezes tinha sido abandonada pela famlia. O que
resta a essa pessoa? Aceitar esse emprego
do circo como nica e caridosa forma de sobreviver. Em contrapartida tem lugar para morar e ainda comida... o que mais algum pode
querer?
A relao criada nesses casos era
completamente questionvel e ao mesmo tempo se justificava pela curiosidade alheia. As
pessoas queriam ver algum diferente, algo
que realmente beirasse estranheza. O ato
de pagar comprava a razo dessa atitude em
relao ao outro. E, ainda, num momento onde
essas pessoas eram marginalizadas e segregadas, no restava outro jeito de conhecer
uma deficincia, por exemplo, que no fosse
buscando no circo. O circo, ento, esse lugar
que mata a curiosidade e mostra aquilo que
estava escondido... longe do sol!
Esse comportamento foi bastante
comum, especialmente em cidades como Paris e Londres. Leva-se um tempo at que algu40 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Alguns padres de corpos foram
incorporados no senso comum ao longo dos
anos e, por mais que muita coisa se transforme, alguns continuam existindo. No conseguimos olhar o outro com as singularidades
que possui, mas olhamos sempre em comparao a outro, a mim, a maioria e isso nos leva
ao problema de criar dicotomias entre normalidade x anormalidade.
Podemos ainda pensar em todos os
casos que ocupam essa posio antes ocupada pelos circos. Quais so os lugares que atualmente nos instigam? Talvez o reality show
que mostra uma pessoa famosa em seus momentos de higiene dos quais nunca teramos
acesso se no fosse por esse formato de programa (e afinal, como viver sem saber se uma
atriz escova os dentes de baixo para cima ou
de cima para baixo?). Esses lugares escondidos, que no esto prximos de nosso olhar,
continuam gerando todo tipo de especulao.
E a pessoa, como se comporta a essa exposio? Pode variar, claro, mas muitas acabam
vendo essa exposio como fonte de renda.
Mostra-se o corpo e as plsticas, porm ganha-se dinheiro e fama. Temos que concordar
que nesses casos os negcios so um pouco
mais justos e conscientes: a pessoa escolhe
entrar no reality show e entra sabendo de sua
exposio. No obrigada a fazer nada e
pode sair quando quiser pelo menos assim
temos notcia que os acordos acontecem.
E o que acontece quando essas
pessoas so finalmente expostas ao sol? No
caso do reality show ela ter duas opes: ou
esquecida rapidamente pelo pblico e perde essa posio que desperta sentimentos no
outro ou ento ser realmente lanada ao sol
e continuar gerando curiosidades capazes
de fazer com que o pblico a acompanhe por
anos.
Mas e nos casos do sculo XIX... o
que aconteciam com as aberraes que saam
do circo? Possivelmente muitos foram abandonados e morreram sem ter com quem ou o que
contar na busca de uma vida comum, outros
conseguiram algum emprego que fizesse com
que suas vidas se aproximassem do restante
da sociedade (embora muito faltasse para que
a vida fosse realmente igual do ponto de vista de direitos), outros, sem encontrar opo,
continuaram vendendo suas caractersticas
para os amantes do circo, mas que desta vez
encontravam-se em becos e espaos alternativos diferentes do original, e outros foram o
Homem Elefante.
Joseph Carey Merrick (1862-1890)
diagnosticado como portador de elefantase
existem controvrsias em relao a doena
- ficou conhecido como Homem Elefante por
conta de caractersticas fsicas que causaram
deformidades em seu rosto e corpo. Em 1980
David Lynch dirigiu o filme O Homem Elefante
Informe
C3
Revista Digital
ESPAO LIVRE 02
Onde no b
42 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
bate o sol!
Informe C3 - 43
Informe
C3
Revista Digital
44 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 45
46 - Informe C3
Informe C3 - 47
48 - Informe C3
Informe C3 - 49
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 50
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 51
52 - Informe C3
Informe C3 - 53
54 - Informe C3
Informe C3 - 55
56 - Informe C3
Informe C3 - 57
58 - Informe C3
Informe C3 - 59
Informe
C3
Revista Digital
ENSAIO 04
Informe
C3
Revista Digital
Sobre o drama da dona do bichinho,
materializado nessa situao esdrxula, no
vou contar. S pegando o filme para assistir.
Ao utilizar a metfora dos `microrratos` - a fim de sintetizar aqui a idia do texto,
apresentado logo no Mxico, onde existe uma
concepo bastante peculiar da morte - desejava discutir o avano no campo dos dispositivos mdicos de exames de imagem enquanto
ferramentas para lidar com medos do que est
escondido dentro do corpo., tal qual a lanterna
apontada para o subterrneo, que em parte
ilumina, em parte, ao no permitir tudo mostrar, deixa solta a imaginao.
Anlogas aos sistemas de vigilncia
dos espaos videomonitorados, que os defendem de supostos `bandidos`, essas microcmeras pesquisam, para evitar sua presena,
os microrratos toda a sorte de microorganismos e comportamentos celulares indesejveis
que acabam por concretizar a imagem da investida da morte sobre qualquer ser vivo. Em
certo sentido, as maneiras de lidar com os microrratos varia desde o horror, a domesticao,
at a ritualizao espetacular, dizendo muito a
respeito de como se lida com a morte. No Mxico, aprendi algumas piadas e vi simpticas
caveiras coloridas que demonstram que eles
gostam de se relacionar com `ela` pelo caminho do humor.
Diariamente assistimos, pelos jornais, impressos, televisivos, internet, a violentas imagens de assassinatos, roubos, agresses fsicas, logo, o fato de estarem sendo
gravadas no os evitou. Sem defender um
retorno ao passado, nos perguntamos em que
medida isso tambm pode ocorrer com a tecnologia mdica?
Assim como as cmeras de vigilncia no so capazes de `impedir` que sejam
cometidos crimes, as microcmeras at so
capazes de identificar precocemente, mas no
podem impedir o surgimento de doenas muito
menos que chegue, um dia, a morte. Tanto a
obsesso pelo escaneamento do organismo,
e a consequente iluso de controle total de
seu funcionamento o que um dos mdicos
que entrevistei chamou de `espetculo da imagem` -, quanto o anseio pelo prolongamento
da vida, ante a dificuldade de se lidar com a
morte, levam a uma verdadeira proliferao da
indstria dos pedidos de exame. Obviamente,
Diariamente
assistimos, pelos jornais, impressos, televisivos, internet,
a violentas imagens de assassinatos,
roubos, agresses
no esquecendo do velho ditado que diz que
`a clnica soberana`, eles trazem vantagens
em termos de preciso e celeridade do diagnstico.
Por outro lado, em geral, os mdicos
no tm outra escolha seno solicit-los, ainda
que no sejam exatamente indispensveis, tamanha a presso dos pacientes, da mdia, da
sociedade, dos processos na justia.
Fica lanada a provocao: microcmeras a vigiarem `microrratos que corroem
por dentro`. A maneira de lidar com a morte e
o medo acaba por dizer muito a respeito de
como se lida, em determinado contexto cultural, com a vida, com o corpo, com a sade.
Informe
C3
Revista Digital
ESPAO LIVRE 03
Old School
Aline Torchia Predebon
Fotos: Nati Canto
Informe C3 - 62
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 63
Informe
C3
Revista Digital
64 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Trabalho de
Concluso de Curso
Publico Alvo
Release
A coleo Old School busca resgatar o fascnio das antigas tatuagens e seus
simbolismos. Num estilo quase marinheiro e
de velha guarda os sapatos tem formas simplificadas, dando mais glamour a suas estampas.
Os tons so fortes como o azul marinho, vermelho, amarelo, laranja, entre outras cores.
As ferragens so parte integrante da coleo
que possui fivelas e botes de presso em
tons dourados. Os saltos so em madeira e
facheta natural e em alguns casos vazados.
So grossos em sua maioria para proporcionar maior conforto. A coleo busca
a descontrao e a irreverncia, trazendo muitas cores e desenhos para o Look.
Jovens, caracterizadas por uma
marcada sofisticao sensorial que se manifesta atravs de suas escolhas cotidianas de
consumo e atravs de cdigos de comunicao originais dos produtos. Mulheres altamente sensveis ao mundo externo aquele que
lhes imposto, demonstram uma forte conscincia de si mesmas e sabem o que querem
encontrar. A riqueza interior dessas mulheres
passa atravs dos sentidos. Elas esto em
busca de novos equilbrios e da natural harmonia. Os produtos e os servios solicitados por
essas mulheres devem se tornar facilitadores
para definir novas linguagens e cdigos estticos. Para elas conta o cuidado extraordinrio
e o toque artstico. Em relao tecnologia,
apreciam o estilo nico e a esttica romntica.
Buscam uma beleza que no nunca superfcie, mas sempre expresso de harmonia
entre mundo externo e interno. So atradas por lugares onde o consumo encontra
a cultura. Refinadas, sensveis e exticas...
Ficha Tcnica
Stylist: Aline Torchia Predebon
Produo de Moda: Aline Torchia Predebon
Looks: Aline Torchia & Marcelo Sommer
Assistente de Fotografia: Aline Torchia Predebon & Diego
Fotgrafa: Nati Canto
Locao: Ruas prximas ao Ibirapuera/SP
Make & Hair: Aline Torchia Predebon
Assistentes: Mauri Predebon ,Filipe Sartorio,
Diego, Lzaro
Carro: Ford Galaxy 1974/ Proprietrio:
Lzaro Humberto
Casting: Paula Abreu
Informe C3 - 64
Informe
C3
Revista Digital
CRTICA TEATRAL
O animal agonizante
Para Roth
Rodrigo Monteiro*
David Kepesh aparece pela terceira
vez em O animal agonizante, romance publicado em 2001, pelo escritor norte americano
vivo mais importante, Philiph Roth (1933). As
outras duas vezes foram nos romances The
Breast (1972) e The professor of desire (1977).
Em Porto Alegre, ele aparece na pele de Luiz
Paulo Vasconcellos, grande professor e coordenador do Departamento de Artes Dramticas
da UFRGS, alm de um dos melhores e mais
importantes diretores da histria do nosso estado. O espetculo homnimo uma verso
livremente inspirada no romance dirigida por
Luciano Alabarse, nacionalmente conhecido
como diretor gacho e internacionalmente
lembrado como o idealizador e coordenador
do Porto Alegre em Cena. O texto um monlogo em que o personagem, um professor
universitrio, expe seus sentimentos sobre
uma aluna. Ele fala consigo mesmo, fala com
o pblico, fala sozinho, mas, sobretudo, constri imagens. Consuela Catillo uma filha de
cubanos com quem o professor teve um caso,
findas as aulas. A conquista, o relacionamento,
o sexo, o cime, o fim, o desfecho so situaes dramticas descritas pelas mos hbeis
e j muitas vezes premiadas de Roth. Alabarse/Vasconcellos sabiam que estavam diante
de algo bastante desafiador. Se o melhor de
Roth o modo como ele descreve, como atualizar isso usando os signos teatrais, esses to
diferentes da literatura?
A nica coisa realmente importante
na hora de atualizar algo saber o como isso
ser feito. Dentre as muitas, mas finitas, possibilidades do artista, cada escolha sempre
de total responsabilidade dele. E, sendo Roth
conhecido pela forma como ele trata sobre
sexo, sobre desejo, sobre excitao e suas
circunstncias diante da diferena de idades,
da doena, da morte, das convenes sociais,
qualquer gesto no sentido de diminuir a importncia disso levaria a obra, que tambm j
foi um filme (Elegy, 2008) para um lugar que
no digno dela. Felizmente, no isso que
acontece. Em cena, o que a plateia v muito
mais retrica do que interpretao: os signos
teatrais foram trabalhados bastante modestamente, timidamente, mas no de forma pobre.
H pouco espao para o teatro em O animal
agonizante. Mas o que h foi plenamente utilizado.
66 - Informe C3
As palavras de Roth so, como j
se disse, as coisas mais importantes da obra.
Poucos atores na nossa cidade sabem valorizar as palavras to bem como Luiz Paulo Vasconcellos. (Marcelo Adams, Jos Baldissera,
Mauro Soares so outros.) Quando bem dita,
a fala se torna um ato. H nela, assim, duas
potencialidades cnicas importantes: o ato de
dizer e o ato que dito. Vasconcellos diz as
palavras com uma dico perfeita e uma tonalidade que, sem importar o volume, o teatro
inteiro compreende cada slaba do texto sem
faltar uma s. Alm disso, bem dirigido, seu
texto tem corpo, tem cor, tem intensidade.
A interpretao de Kepesh se desenha sem formas fixas. O personagem livre
e se mostra de vrias maneiras. Diante de
uma cultura invejvel, o professor fictcio , no
fundo, um animal selvagem vtima de seus impulsos. Vasconcellos, embora ainda no tenha
conseguido se desvencilhar de seu sotaque
carioca e tenha explorado pouco ou nada a sua
tonalidade a fim de encontrar a voz de Kepesh,
se utiliza do ritmo, da mtrica para construir as
imagens que belamente constri, mantendo o
seu jeito natural de falar tantas vezes ouvido
nos palcos gachos, tanto na boca de personagens como nas palestras e aulas que d. s
vezes, rpido, s vezes, devagar, danando ou
completamente preso em si, o ator se utiliza
desses instrumentos vocais para nos fazer ver
a grande quantidade de nuances que h em
cada passagem da histria que, sozinho, conta. A produo acerta por ser humilde, por ser
discreta.
Uma poltrona, um piano, uma mesa
de trabalho, uma mesa de centro, uma cadeira
e um telefone. Os movimentos cnicos acontecem nesse espao nobre, muitas vezes, tido
como a caverna onde esse animal se esconde.
quando o espectador v o ator alternar-se
pelos ambientes, cavando buracos e descansando. Pouco histrinico, Vasconcellos sabiamente se coloca abaixo do texto, preocupando-se em oferecer muito mais de Roth do que
Alabarse, o que o maior ganho dessa produo.
A mesma modstia tem Luciana
boli, atriz que interpreta Consuela. Sua figura
vem menos para aparecer e mais para aliviar
Informe
C3
Revista Digital
Ficha tcnica
Elenco:
Luiz Paulo VasconcellosDavid Kepesh
Luciana boli.Consuela Castillo
Thales de Oliveira..Kenny Kepesh
Adaptao e cenografia: Luciano Alabarse
Cortes e ajustes: Luiz Paulo Vasconcellos
Iluminao: Cludia de Bem
Trilha sonora: Moyss Lopes
Seleo trilha: Luciano Alabarse
Figurinos: Equipe
Design grfico: Ddi Juc e Fernando Zugno
Fotos: Jlio Appel
Operao de luz: Cludia de Bem e Joo Dadico
Operao de som: Moyss Lopes
Produo executiva: Fernando Zugno e Miguel
Arcanjo Coronel
Coordenao de produo: Luciano Alabarse
Informe
C3
Revista Digital
ESPAO LIVRE 04
Informe
C3
Revista Digital
ROUPAGINADA
Anderson de Souza*
*Anderson Luiz de Souza - Brasil/RS/Canoas Bacharel em Moda. Especializando em Arte Contempornea e Ensino da Arte e atualmente Docente no
SENAC Moda e Beleza / Canoas-RS no Curso Tcnico em Produo Moda e
em cursos livres nas reas de pesquisa, design e processo criativo em moda
e cultura, Pesquisador do Processo C3 Grupo de Pesquisa e idealizador e
responsvel pelo site www.processoc3.com. Tambm desenvolve trabalhos
como estilista, figurinista, vitrinista, artista plstico e ilustrador de moda.
Informe C3 - 69
Informe
C3
Revista Digital
70 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 71
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 75
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 79
Informe
C3
Revista Digital
80 - Informe C3
ESPAO LIVRE 05
Informe
C3
Revista Digital
PROLAS
AOS
PORCOS
Ficha tcnica:
Performers: Filipe Espindola e Sara Panamby
Fotos: Pedro Spagnol e Leandro Pena
Construmos nosso trabalho em
performance, a partir da criao de roteiros de
aes e criao de imagens buscando poticas
e polticas atravs do corpo. Pensamos o momento da performance como um tempo-espao ritual, onde a fruio de nossas criaes se
do pela instaurao de ambincias imersivas,
como potncias de atravessamento sgnico.
A performance Prolas aos Porcos,
trata da construo de corpos surreais a partir
da alterao dos contornos corporais. A pesquisa fundamenta-se em questes referentes
body art, a manipulao do corpo enquanto
suporte e mdia artstica de modo a provocar
o espectador atravs das sensaes corpreas reverberadas por este tipo de interveno.
Com influncias diretas dos freak
shows do sclo XIX e incio do sculo XX,
e do performer norte-americano Matthew
Barney, procuramos desenvolver atravs do
processo de costura corporal e de reconfigurao atravs de materiais diversos imagens
impactantes e poticas, criando corpos simbiticos entre o humano primitivo ancestral e
seres ps-humanos, ps-orgnico. Esta relao aparentemente dicotmica revela um carter visvel no mundo contemporneo, onde
resgatam-se prticas ancestrais de rituais a
fim de reorganizar o corpo de maneira a inserilo num contexto ficcional e extra-ordinrio,
criador de possibilidades, prximo de seres
simbiticos entre orgnico e no-orgnico.
Sara Panamby e Filipe Espindola
Informe C3 - 81
Informe
C3
Revista Digital
82 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
nforme C3 - 83
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
86 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe
C3
Revista Digital
88 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 89
Informe
C3
Revista Digital
90 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 91
Informe
C3
Revista Digital
92 - Informe C3
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 93
Informe
C3
Revista Digital
ENSAIO 05
Introduo
A proposta de um mundo globalizado ocasionou significativas transformaes em
relao sociedade contempornea. Fatores
como o desenvolvimento tecnolgico, o fluxo
de informaes, as fuses entre grandes empresas, entre outros, ocasionaram impactos
relevantes no que se refere economia mundial abrindo espao para grandes debates. No
entanto a influncia desse fenmeno atingiu de
forma intensa, tambm, as relaes sociais em
diferentes nveis, fazendo com que novas maneiras de se viver em sociedade emergissem
e, com isso, novos desafios no que se refere
s relaes interpessoais.
possvel se argumentar que vivemos em um tempo de incertezas no qual
discursos e valores sociais, outrora inquestionveis, so colocados em dvida e, com isso,
(re)significados. Esse momento histrico, nomeado por muitos estudiosos como Ps-modernidade teve como ponto de partida a frustrao em relao s propostas de evoluo e
progresso que definiram a Modernidade. Como
forma de esclarecer, definimos aqui a Modernidade como um ideal ou um projeto de vida em
nvel social que teve como objetivo um futuro
melhor para todas as pessoas. Esse ideal foi
impulsionado pela crena de que os avanos,
cientfico e tecnolgico, poderiam garantir de
forma uniforme, melhores condies de vida
aos habitantes do planeta.
Assim o projeto da Modernidade
buscou padronizar as sociedades atravs da
amenizao das diferenas existentes entre
indivduos, da imposio de uma ordem no
que se refere ao convvio social e da propagao de valores culturais considerados ideais,
com o intuito de garantir o progresso. Mesmo
que estejamos nos referindo a Modernidade
como algo do passado, relevante se entender que tais ideais no foram suprimidos completamente. Vestgios dessa forma de se entender o mundo podem ser identificados ainda
hoje no que se refere, entre outros possveis
exemplos, a textos publicitrios, projetos arquitetnicos, discursos mdicos e, at mesmo,
em algumas relaes interpessoais.
Mesmo considerando-se que as intenes do projeto da Modernidade tenham
94 - Informe C3
sido boas foram as melhores possveis, considerando-se a poca em que se estabeleceram importante ressaltar que o progresso
e a evoluo esperados no contemplaram
de forma equivalente os diferentes lugares do
mundo tampouco as diferentes sociedades e
indivduos. Devido a isso, surgiram movimentos de resistncia, formados por grupos sociais que no foram includos no privilgio das
melhorias modernas, ou que, de algum modo
foram considerados desviantes e suprfluos
(BAUMAN, 1998).
A partir disso toma forma se
que podemos considerar alguma forma para
a Ps-modernidade a sociedade ps-moderna, fruto do descontentamento em relao
aos ideais modernos. Essa forma de se viver
em sociedade pode ser caracterizada a partir
de suas relaes interpessoais em que as diferenas existentes entre os sujeitos servem
como significaes que podem ser trocadas e
modificadas. As inter-relaes culturais, impulsionadas pelo carter voltil e efmero de tempos ps-modernos, alm do intenso fluxo de
informaes e da possibilidade de mobilidade
em diferentes espaos faz com que as fronteiras contemporneas sejam instveis e com
isso, desestabilizam-se, ainda mais, os entendimentos sobre a vida em sociedade e, mais
especificamente, sobre as relaes sociais no
contexto das grandes cidades e seus impactos
em termos de desenvolvimento urbano.
Constitudas e significadas a partir
das relaes em que nelas ocorrem, as cidades contemporneas podem servir como espaos em que a troca e o fluxo cultural e identitrio se estabelecem com mais freqncia. Pires
(2008) refere que a busca pela compreenso
das diversas e complexas relaes urbanas
leva necessidade de se discutir a construo
dos espaos cotidianos que consolidam representaes scio-culturais a partir dos desejos
e necessidades de seus integrantes. Assim a
autora argumenta que na dinmica urbana,
grande parte da populao ocupa espaos
marginalizados o que acaba por acarretar em
segregaes em nvel social e espacial.
Nesse contexto, problemas relacionados desigualdade social e dinmica
urbana ganharam novas dimenses considerando grupos sociais que podem ser conside-
Informe
C3
Revista Digital
A cidade transcultural
A partir de estudos contemporneos, as cidades so consideradas, alm da materialidade que as constituem, o resultado das
relaes humanas dos indivduos que nelas
se encontram. Pesavento (2008) informa que
as cidades so compostas por suas materialidades e sociabilidades, pois a materialidade
projetada, construda e modificada por aes e
intenes dos homens que agem coletivamente de acordo com suas polticas, necessidades
e intenes. A cidade para a autora reduto
de vida social. Sendo assim, possvel se
pensar que a cidade contempornea, est em
constante modificao, como resultado de inmeras disputas culturais e identitrias. A cidade se constitui a partir de paradoxos culturais
que fazem surgir diferentes estilos de vidas,
diferentes comportamentos, diferentes subjetividades, diferentes formas de se entender e
de se viver os espaos urbanos. (FORTUNA e
SILVA, 2002)
Se a cidade contempornea constituda por relaes sociais que constituem paradoxos culturais, so essas mesmas relaes
que dividem o espao urbano em pequenos
territrios que se diferenciam pelas especificidades dos sujeitos que se relacionam sobre
eles. Com isso, trona-se cada vez mais difcil
o entendimento do espao urbano como algo
uniforme. No entanto, Canclini (2005) argumenta que uma nova maneira de se entender
a cidadania se d a partir de comunidades que
esto desvinculadas de lugares o que acaba
por determinar um espao urbano no qual, jovens estabelecem territrios demarcados por
fronteiras identitrias oriundas de suas constituies culturais, cuja principal caracterstica
sua efemeridade.
Portanto, na atualidade, principalmente no ambiente urbano, no mais possvel o estabelecimento de fronteiras fixas entre
grupos de sujeitos e, tambm, entre aquilo que
se acredita ser cultura e as diversas manifestaes originadas por aspectos identitrios (YDICE, 2006). Assim, podem ser consideradas,
no espao urbano, negociaes e cruzamentos entre cultura local, cultura global, cultura
juvenil, cultura surda, cultura ouvinte e outras.
Como argumenta Arfuch (2006), a multiplicidade, a sobreposio de tempos, os diferentes
espaos, a flexibilidade de fronteiras faz com
que possamos considerar que nos encontramos em uma poca transcultural.
Informe
C3
Revista Digital
Assim, possvel se observar que,
atualmente, as manifestaes sociais de jovens surdos no espao urbano ocorrem com
maior ou menor intensidade de acordo com
as possibilidades de acessibilidade que cada
localidade proporciona e, tambm, de acordo
com o comportamento e conhecimento sobre o assunto por parte de seus habitantes.
Sobre isso, interessante ressaltar que dentro dos espaos urbanos, estabelecimentos
comerciais que se encontram em reas que
circundam locais de encontro de jovens surdos, como as escolas de surdos, por exemplo,
tendem criar condies de atendimento como
forma de dar conta desse pblico, da mesma
forma que, algumas vezes, o poder pblico
acaba por investir em sinalizao adequada e
adaptao de estrutura para contemplar essa
parcela da populao.
O conceito de territorialidade toma
forma a partir de um pensamento que considera que, contemporaneamente, no possvel
se estabelecer territrios homogneos no que
diz respeito s identidades culturais dos sujeitos que neles esto, ou seja, existe uma grande
confuso e miscelnea promovidas, por exemplo, pelos grupos de jovens que, no entanto,
a partir critrios especficos, se subdividem
formando as tribos urbanas que estabelecem
determinadas identificaes espaciais, mesmo que momentneas (MAFFESOLI, 2006).
A formao das territorialidades se d a partir de pessoas que se apropriam de espaos
materiais e estabelecem fronteiras identitrias
enquanto ocupam tais espaos, aqui considerados como territrios, formando assim grupos
que produzem diferentes posies de sujeitos
frente aos outros.
No entanto, quando observadas em
uma escala maior, as grandes cidades, deixam
a desejar no que se refere ao reconhecimento
desses jovens. Essa questo pode ser comprovada ao se constatar que a grande maioria dos espaos urbanos, sequer reconhece a
existncia desses sujeitos como possveis consumidores no que se refere aos ambientes de
lazer ou, tambm, consumo de mercadorias.
Essa falta de preparao para o atendimento
e/ou recebimento de jovens surdos no espao
urbano reflete o desconhecimento da maioria
das pessoas em relao esses sujeitos o
que pode, muitas vezes oportunizar manifestaes de estranhamento e enfrentamento, por
ambos os lados, que acabam por estipular o
distanciamento social entre surdos e ouvintes,
bem como a falta de condies de permanncia de surdos em determinados locais.. Assim
as cidades contemporneas como refere Bauman (2009), se caracterizam como campos de
batalha nos quais tendncias globais, como a
idia de multiculturalismo, se chocam com diferentes identidades e valores locais.
Portanto, a territorialidade est ligada, antes de tudo, aos sujeitos que a promovem, podendo ser esses indivduos independentes, classes sociais ou grupos sociais.
Assim, esse movimento de territorializao
da sociedade pode ser considerado como a
conjuno desses mltiplos sujeitos, sendo
fundamental considerar as especificidades
das aes de cada um deles bem como as
representaes sobre o outro. (HAESBAERT,
2004)
Dito isso, podemos pensar que os
jovens surdos acabam se organizando em
grupos, nomeados pelo Bauman (op.cit.) como
comunidades de semelhantes as quais garantem aos sujeitos que as formam, seno, o
sentimento de pertencimento a dinmica urbana em geral, pelo menos a possibilidade de
fazerem parte de um, ou mais, grupos em que
a convivncia entre iguais garanta o sentimento de segurana. a partir dessa tendncia
que jovens surdos se aproximam, em busca
da convivncia entre iguais para que de certo modo, mesmo que momentaneamente, tenham fora enquanto comunidade cultural em
busca de oportunidades e transformaes nas
estruturas polticas e sociais das cidades, ou
ento, apenas para conviver entre amigos.
No caso desta anlise, conveniente mencionar que, algumas vezes, em determinados locais da cidade, geralmente prximos
a instituies que oferecem servios especializados a esses jovens, podem ser identificadas territorializaes de jovens surdos que,
em momentos especficos, se contrapem
aos agregados sociais formados por jovens
ouvintes, estabelecendo limites relacionados,
principalmente, a forma de comunicao.
Analisando essas territorialidades e, tambm,
os grupos que os compem, vemos que em
ambos os conceitos o outro sempre visto a
partir de si prprio e, a partir de suas prprias
concepes, portanto, manifestaes de resistncia em relao alteridade podem ocorrer.
(DARSIE e CECLIO, 2009)
Territrios juvenis e
o caso dos surdos
Ao se analisar a disposio espacial
de diferentes grupos juvenis em uma cidade,
possvel se perceber o fenmeno da apro96 - Informe C3
Considerando-se que o pressuposto
primeiro de toda a territorializao a forma-
Informe
C3
Revista Digital
A partir dessa lgica, possvel se
pensar que diversos ambientes pblicos ou
comerciais em diferentes cidades poderiam
investir em treinamento de funcionrios, em
caracterizao de ambientes e, at mesmo,
no uso de diferentes lnguas ou linguagens
de modo a garantir o conforto de jovens surdos, da mesma maneira como se preparam
para atender e garantir a freqncia de outros
consumidores juvenis. No entanto, retomamos
que possvel se perceber certa falta de interesse, ou de conhecimento, no que se refere
ao uso de lnguas de sinais por prestadores de
servios relacionados ao lazer e aos espaos
pblicos urbanos, o que refora situaes de
segregao em relao aos jovens surdos.
De acordo com depoimentos, esses jovens, mesmo quando organizados em
grupos, tendem a sentirem-se intrusos em espaos destinados a outros jovens como eles.
O que se pretende dizer que mesmo considerando-se a existncia de diferentes grupos
juvenis, no caso dos surdos existem barreiras
lingsticas, em seus prprios pases, que os
impedem, muitas vezes, de estabelecerem relaes espaciais urbanas de forma plena. Tal
situao marca, ainda mais, a diferena existente entre surdos e ouvintes, estabelecendo
fronteiras identitrias e demarcando espaos
de convivncia de formas ainda mais intensas.
A constituio e fortalecimento da
Cultura Surda so altamente influenciados
pelos Estudos Culturais, os quais surgiram na
dcada de 1950, na Universidade de Birmingham, Inglaterra. Estudiosos como Richard
Hoggart, Stuart Hall e Richard Johnson deram
incio a esses estudos dando nfase as subculturas urbanas, que podem ser relacionadas
aqui ao caso dos jovens surdos que se relacionam a partir de lnguas de sinais com outros surdos, ou tambm aqueles que mesmo
atravs de tcnicas oralistas(3) formam grupos
juvenis que compartilham identidades em comum.
Outra importante questo que emerge dessas situaes mencionadas, est relacionada s possibilidades de desenvolvimento
social desses jovens tanto momentaneamente
quanto no futuro. interessante se pensar que
a partir do pouco interesse investido no que se
refere aos grupos juvenis surdos, prev-se que
tais jovens encontram/encontraro as mesmas
dificuldades em relao s oportunidades em
nvel de formao universitria, de mercado de
trabalho, de condies financeiras, entre outras.
Pelo que tudo indica a surdez ainda
fortemente representada enquanto doena,
ou seja, a sociedade ainda observa jovens
surdos como pessoas que devem ser reabilitadas para que possam garantir um futuro digno,
mesmo que isso signifique aceitar empregos
inferiores como prmio de consolao.
Lopes (2004) argumenta que a partir
da perspectiva dos Estudos Culturais os surdos so considerados sujeitos que possuem
uma cultura prpria, a Cultura Surda, que se
estabelece atravs do uso da lngua de sinais.
Assim ao se conduzir estudos e discusses
sobre jovens surdos atravs de pressupostos
culturais, dentro de um contexto antropolgico
e lingstico compe-se o que chamamos de
Estudos Surdos. O que se pretende com isso,
explicando de maneira mais direta, deslocar
os conhecimentos sobre a surdez para uma
Informe C3 - 97
Informe
C3
Revista Digital
Consideraes finais
As cidades contemporneas passam por constantes transformaes ocasionadas, entre outras coisas, pela concepo
98 - Informe C3
Referncias Bibliogrficas
Arfuch, Leonor (2006), La esfera ntima contempornea: espacios y narrativas, in Sommer, Luis Henrique e Bujes, Maria Isabel. E.
(orgs), Educao e cultura contempornea
articulaes, provocaes e transgrees em
novas paisagens, Editora da ULBRA, pg. 1122.
Bauman, Zygmunt (1998) [1997], O mal-estar
da Ps-modernidade, Jorge Zahar Ed, Rio de
Janeiro, 272 pg.
Canclini, Nestor Garcia (2000), Consumidores
e Cidados, EdUERJ, 228 pg.
Costa, Benhur Pins (2002), Territorializaes: aes de agregados sociais, Caesura,
v. 21, n.2, jul/dez, pg. 67-71.
Informe
C3
Revista Digital
Notas
Informe
C3
Revista Digital
Espao Livre 06
100 - Informe
Informe
C3
Revista Digital
Informe C3 - 101
Informe
C3
Revista Digital
102 - Informe C3
Projeto:
Atravs deste projeto sero realizadas 10 apresentaes no Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso e outros 5
apresentaes em local a definir ainda. As atividades acontecero a partir de abril de 2011.
Informe C3 - 103
Informe
C3
Revista Digital
ENSAIO 06
Informe
C3
Revista Digital
Em meio aos corredores do prdio
da Fundao Bienal de So Paulo, durante a
29 edio da SPFW, Jum Nakao ergueu e
(re)vestiu um bar. No se tratava de um bar
comum, convencional, nada estava sendo
comercializado ali, tratava-se de uma representao de bar para ser (em um primeiro
momento) observada, contemplada. Um bar
qualquer, desses bem populares, simples e
pitorescos espalhados por beiras de estradas,
lugares que para muitos pode servir de refgios ou esconderijos, localizados em cidades
do interior, bairros bomios, palcos das mais
variadas acontecimentos. Enfim poderia ser
um bar, um boteco, um botequim de qualquer
lugar do pas.
A estrutura intitulada de Vestgios
Bar tratava-se de um espao performtico que
foi sendo construda diariamente em paralelo
aos desfiles da So Paulo Fashion Week. O
espao possua duas arquibancadas, um de
frente para outra, onde qualquer pessoa que
estivesse transitando pelo interior da Bienal
pudesse se acomodar e observar o bar em
transformao localizado entre estas arquibancadas. Segundo Jum este espao fazia
aluso a uma sala de desfile, em que a passarela foi substituda por um palco cenogrfico,
praticamente uma caixa cnica de um teatro
de arena.
Nas palavras de seu prprio criador,
a performance correspondia a um work in
progress que culminou com a transformao
completa daquele ambiente cenogrfico ao
longo dos seis dias do evento.
A cenografia inicial do espao reflete o ambiente de um bar vazio,
ps-festa, de cores vvidas e objetos
dispostos de forma indisciplinada,
anrquica, trazendo a ideia de que
ali acaba de acontecer um encontro
entre pessoas animadas, eufricas,
alegres. A TV, ponto focal do cenrio, permanece solitria, transmitindo em mute imagens de jogos de
futebol. Acmulo de copos e pratos
na mesa, garrafas vazias, cadeiras
apoiadas na mesa, outras cadas:
vestgios da euforia coletiva, da
anima das pessoas que antes ocupavam o ambiente, mas que ainda
so presentes na sonoplastia das
reaes e vibraes de uma torcida
invisvel. Os ndices de animao
estticos ali presentes possibilitam
a interao em um nvel individual, mais particular, usufrudo em
silncio, mapeando uma estranha
noo de pertencimento e reflexo
sobre a relao do olhar com esse
entorno(1). NAKAO, 2010
Vale lembrar que o perodo em que
aconteceu esta performance correspondia a
poca de copa de mundo, onde assistir uma
partida de futebol com amigos em uma mesa
de bar acaba se tornando uma atividade obriInforme C3 - 105
Informe
C3
Revista Digital
ENSAIO 06
Informe
C3
Revista Digital
Os passantes e quem assistia tudo
da arquibancada observavam o processo, a
gradativa transformao daquele espao, com
curiosidade, possivelmente se questionando
sobre os porqus a respeito daquela obra,
evidenciando uma importante caracterstica da
arte contempornea, a de questionar e levar
reflexo.
E a partir da remoo dos primeiros
pedaos de tecido que at ento (re)vestiam
todo Bar, deu-se incio ao ato de despir o que
antes estava vestido, a nica regra era que s
poderia remover um pedao a partir de um ponto que j estivesse despido. Assim aos poucos
todos interessados poderiam intervir na instalao dando a ela uma nova roupagem, j que
conforme iam sendo removidas as camadas
de tecido, desenhos iam se formando sobre as
superfcies atribuindo uma nova imagem a instalao, que novamente ia sendo transformada pelas mos de pessoas estranhas quela
cena ali representada.
Notas:
Para que acontecesse esta transfigurao do espao, dentro do que j havia
sido planejado e projetado, Jum precisou se
reorganizar dentro do fator tempo, sendo necessrio em alguns momentos correr contra o
tempo. Pois a obra era efmera, temporria,
com dia e hora marcados para iniciar e deixar
de existir, e tudo precisava ser (re)vestido a
tempo. A tempo de seu gran-finale.
Aps todo bar ter sido (re)coberto e
(re)vestido, ao final de uma exaustiva semana
para todos os envolvidos neste trabalho, no
ultimo dia daquela edio da SPFW, reluzia
dentro das dependncias da Bienal aquele
espao inerte e inteiramente branco, e o que
parecia ter chegado ao fim, cumpria apenas
parte da proposta de seu autor, pois j que se
tratava de uma instalao, faltava uma maior
interao com o pblico, uma vez que segundo
Santaela:
Nas instalaes, o receptor penetra no interior de um espao, habita
esse espao participando nele de
corpo inteiro. Faz parte integrante das instalaes a explorao do
espao pelo espectador atravs do
E cada pedacinho que ia sendo retirado, pedacinho que antes ajudara a transformar aquela superfcie que at ento recobrira,
de acordo com aquele que o retirava, cada pedao de tecido ia sendo carregado de uma srie de simbolismos e significados, nas mos de
quem o retirou. Assim como sofria uma nova
transformao, deixava de ser um hexgono
colado sobre uma superfcie para ser um souvenir, um trofu, uma lembrana, uma memria, um vestgio daquilo que um dia fez parte e
um dia representou.
Informe
C3
Revista Digital
*Anderson Luiz de Souza - Brasil/RS/Canoas Bacharel em Moda. Especializando em Arte Contempornea e Ensino da Arte e atualmente Docente no SENAC Moda e Beleza / Canoas-RS no Curso Tcnico em Produo Moda e em cursos livres nas reas de pesquisa, design e processo
criativo em moda e cultura, Pesquisador do Processo C3 Grupo de Pesquisa e idealizador e responsvel pelo site www.processoc3.com. Tambm
desenvolve trabalhos como estilista, figurinista, vitrinista, artista plstico e ilustrador de moda.
108 - Informe
www.processoc3.com
www.terpsi.com.br