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INTRODUO
A discusso sobre o desenvolvimento sustentvel tem estado presente em diversos setores
da sociedade, sendo objeto de estudos, reflexes e debates presentes tanto no mbito
acadmico, como nos movimentos sociais, ONGs e mdia.
A idia de desenvolvimento sustentvel tem sido construda a partir de distintas
perspectivas, em contraponto viso tradicional de desenvolvimento herdada do sculo
XIX, que privilegia o crescimento econmico e a industrializao como sinnimos de
desenvolvimento, desconsiderando o carter finito dos recursos naturais.
Nesse sentido, o desenvolvimento sustentvel resgata as premissas de eqidade social,
responsabilidade ecolgica e a participao cidad como partes indissociveis do
desenvolvimento. Nessa perspectiva, a participao cidad uma possibilidade para a
gesto das polticas pblicas direcionadas ao desenvolvimento economicamente vivel,
socialmente justo e ecologicamente equilibrado.
Um consenso bastante propagado nos ltimos anos o da necessidade de metodologias
pragmticas capazes de avaliar o impacto social dessas novas orientaes sobre o modelo
de desenvolvimento convencionado e que vem sendo adotado nas ltimas dcadas, pois as
discusses so muitas, todavia existem grandes dilemas no aspecto de avaliar os resultados
das experincias realizadas at agora nos pases, regies e municpios. Existe uma grande
distncia entre o discurso propagado acerca do desenvolvimento sustentvel que vem
acontecendo mais significativamente a partir da publicao do Relatrio Brundtland em
1987 e reforado pelos inmeros tratados e convenes das Naes Unidas e, a forma de
implementao dessas resolues.
O presente artigo discute, em primeira instncia, o processo de construo da noo de
desenvolvimento sustentvel, apontando assim, os princpios da sustentabilidade
econmica, poltica, demogrfica, geogrfica, cultural e social necessrios ao processo de
gesto de polticas e programas.
Em seguida, aponta os critrios de avaliao eficcia, eficincia e efetividade de polticas
necessrios para apreender quais os resultados obtidos nos distintos momentos de sua
constituio e implementao. Pois existem ainda muita dificuldade em estabelecer
procedimentos metodolgicos que apreendam os resultados das polticas pblicas e que
possibilitem dizer por que determinadas polticas foram, ou no, exitosas e por que
chegaram, ou no a certos resultados.
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A Comisso Brundtland, presidida por Mansour Khalid e pela ento primeira-ministra da Noruega Gr Harlem Brundtland, da qual
originou o nome do relatrio, foi organizada pela ONU em 1983, para estudar a relao entre o desenvolvimento e o meio ambiente e
criar uma nova perspectiva para abordar estas questes. O Relatrio Nosso Futuro Comum, produzido pela Comisso sobre Meio
Ambiente e o Desenvolvimento UNCED, veio ao pblico em 1987.
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Sociedade Sustentvel
Harmonia com a natureza.
Natureza constituda por seres vivos com
direito vida, independentemente do seu
valor de uso.
Objetivos materiais/crescimento econmico Objetivos no materiais/sustentabilidade
ecolgica.
Recursos naturais ilimitados
Recursos finitos
Solues baseadas exclusivamente na Solues adaptadas a cada situao e
tecnologia avanada/consumismo
ecossistema/satisfao das necessidades
bsicas/reciclagem.
Centralizao/grande escala
Descentralizao/pequena escala
Autoritarismo/estruturas
Estruturas democrticas/participao
repressivas/desigualdade
social/igualdade.
Fonte: DIEGUES, A. C. (1992) citado por HELENA & BICUDO (1994).
Estes princpios aliados necessidade de um processo endgeno de mudana a partir do
mbito local praticamente um consenso entre os que discutem o desenvolvimento
sustentvel. A proposta desse tipo de processo de gerar inovaes adequadas s
necessidades especficas de cada lugar e, na mesma medida, dar respostas aos problemas
globais da cidade, do municpio ou do espao de vida local, tendo como parmetros,
princpios sustentveis.
Essa mudana de atitudes, quando inseridas nas instituies polticas, possibilita uma
transformao substancial nas relaes polticas entre o Estado e as comunidades. O
respeito autonomia comunitria transforma os atores de objeto em sujeito do seu prprio
desenvolvimento, conferindo, no apenas maior efetividade aos processos de gesto, mas,
sobretudo, a to desejada sustentabilidade, atravs do debate pblico entre as foras que se
complementam e se contrapem numa realidade vista como possvel de ampliar o espao
democrtico nas sociedades.
Considerando que uma das principais dificuldades num processo de sustentabilidade
democrtica est no confronto entre interesses privados e interesses pblicos, vale a
ressalva de que nem sempre o Estado ou uma associao civil representam os interesses
pblicos, garantindo melhores resultados. Isso significa, segundo Carvalho (1992, p.36
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apud Guimares, 2001, p. 189), uma: ... inverso do espao pblico, submetendo-o a
interesses privados. Esse desinteresse pelo que comum e pblico, beneficia a
apropriao privada do que , por direito, de todos, descaracterizando a esfera pblica.
Por riscos ambientais compreendem-se aqueles eventos, sejam naturais ou mesmo
causados pelo homem (antrpicos), mas que pem em risco a sade humana e os
ecossistemas, produzindo efeitos que repercutem em escala global. Esses riscos que podem
ser tanto originados em pases desenvolvidos como nos pases em desenvolvimento,
podendo atravs dessa disseminao, causar efeitos globais.
Ignacy Sachs (1993, p. 11-55), prefere usar a expresso ecodesenvolvimento em lugar de
desenvolvimento sustentvel e identifica no modelo cinco dimenses de sustentabilidade
de que, segundo ele, todo planejamento de desenvolvimento precisa levar em conta: 1) a
sustentabilidade social, que se entende como criao de um processo de desenvolvimento
que seja sustentado por um outro crescimento e subsidiado por uma outra viso do que seja
uma sociedade boa. A meta construir uma civilizao com maior eqidade na
distribuio de renda e de bens, de modo a reduzir o abismo entre os padres de vida dos
ricos e dos pobres; 2) a sustentabilidade econmica, que deve ser tornada possvel atravs
da alocao e do gerenciamento mais eficiente dos recursos e de um fluxo constante de
investimentos pblicos e privados. Nessa dimenso, a eficincia econmica deve ser
avaliada em termos macrossociais, sistmicos na relao com as partes, e no apenas
atravs do critrio da rentabilidade empresarial de carter macroeconmica; 3) a
sustentabilidade ecolgica, que pode ser melhorada se seguidos os seguintes princpios:
ampliar a capacidade de renovao dos ciclos ecolgicos da Terra, intensificando o uso do
potencial de recursos dos diversos ecossistemas, com um mnimo de danos aos sistemas de
sustentao da vida; limitar o consumo desordenado dos recursos naturais e respeito
biodiversidade ecolgica; intensificar a pesquisa para a obteno de tecnologias de baixo
teor de resduos e eficientes no uso de recursos para o desenvolvimento urbano, rural e
industrial; definir formas de uma adequada proteo ambiental; 4) a sustentabilidade
espacial, que deve ser dirigida para a obteno de uma configurao rural-urbana mais
equilibrada e uma melhor distribuio territorial dos assentamentos humanos e das
atividades econmicas; e 5) sustentabilidade cultural, incluindo a procura de razes
endgenas de processos de modernizao e de sistemas agrcolas integrados, processos que
busquem mudanas dentro da continuidade cultural e que, traduzam o conceito normativo
de ecodesenvolvimento como conjunto de solues especficas para o ecossistema, a
cultura e o espao de vida local, respeitando a diversidade biolgica e cultural.
O esforo que a comunidade internacional est desenvolvendo para alterar o rumo atual da
degradao ambiental e as conseqncias sociais, atravs das conferncias de cpula da
Organizao das Naes Unidas ONU2 serve para balizar as aes humanas no espao de
suas comunidades.
As discusses tornam-se cada vez mais freqentes e abrangem vrias temticas como: as
riquezas naturais; a poluio do ar, da gua e do solo; o efeito estufa decorrente da
agresso camada de oznio; o espao urbano; o destino das florestas tropicais; a
modernizao agrcola, o crescimento da populao; a biodiversidade; a qualidade de vida
e organizao poltica (Brseke, 1995).
2
Nas ltimas dcadas, a ONU realizou vrias conferncias, tais como: Infncia, em Genebra (1990), Meio Ambiente e Desenvolvimento
Humano, no Rio de Janeiro (1992); Populao e Desenvolvimento, no Cairo (1994); Pobreza e Desenvolvimento Social, em
Compenhague (1995); Assentamentos Humanos Habitat II, em Istambul (1996) e tantas outras, estimulando o debate global acerca da
questo ambiental. Na realidade preciso uma mudana radical nas formas de relacionamento com os outros e o meio ambiente, pois se
no agirmos responsavelmente, em breve teremos fracassado enquanto espcie.
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objetivos da poltica pblica em questo; como vem sendo, ou foi implementada; quem , e
como vem sendo beneficiada a populao-alvo dos programas e projetos pblicos que
ancoram o modelo de desenvolvimento em curso.
Esses critrios se diferenciam de autores para autores, dependendo de vrios aspectos que
norteiam o estudo realizado, como o momento da avaliao, que pode ser durante a
execuo ou ex-post, ou seja, quando da concluso da implementao do programa ou
parte dele, sendo uma avaliao que acompanha a implementao ou execuo do
programa.
A traduo literal da expresso ex-post facto a partir do fato passado. Isso significa que
esse tipo de avaliao ou pesquisa d-se aps a ocorrncia do programa ou parte dele. O
desafio para o pesquisador, nesse tipo de estudo, reconstituir e identificar situaes que
se desenvolveram e trabalhar sobre elas como se estivessem submetidas a controles e
anlises em tempo real, ou seja, vivenciando o processo de implementao.
Para muitos autores, o estudo de avaliao de polticas pblicas deve considerar os desafios
e possibilidades de operacionalizao de uma metodologia de avaliao que leve em conta
a natureza do programa e os meios disponveis. Dessa forma, a importncia de avaliar est
na possibilidade de uma maior eqidade e sustentabilidade, ou seja, garantir a capacidade
de continuidade dos efeitos benficos dos programas, permitindo uma distribuio de
maneira justa, compatvel e tornando mais sensato e efetivo os gastos pblicos e aes de
polticas diante das presses sobre o Estado.
Arretche (1999) faz distino entre avaliao poltica; avaliao de uma dada poltica
pblica; e, anlise de polticas pblicas, concordando que cada uma das distintas
abordagens avaliativas mencionadas supe distintos instrumentos de operao e, por
conseqncia, abordagens e concluses de diferente natureza.
Para essa autora, a avaliao poltica concentra-se na anlise e elucidao do critrio ou
critrios que fundamentam determinada poltica: as razes que a tornam prefervel a
qualquer outra; a avaliao de uma dada poltica pblica procura atribuir uma relao de
causalidade entre um programa x e um resultado y, ou ainda, que na ausncia do programa
x, no teramos o resultado y; finalmente, na anlise de polticas pblicas, dedica-se ao
exame da engenharia institucional e dos traos constitutivos dos programas.
Ainda segundo Arretche (1999), nos ltimos anos vm se sofisticando os mecanismos de
avaliao da eficincia em polticas e programas pblicos. Em primeiro lugar, porque a
escassez de recursos pblicos exige maior racionalidade de planejamento dos gastos; e em
segundo, pelas demandas sociais. Outra varivel que se deve considerar da apropriao
de recursos pblicos e a sua captao. A gesto dos mesmos traduz por um lado o processo
de racionalizao dos recursos pblicos e o nvel de democratizao dessas gestes,
agregando a participao da populao. Afinal, vivemos uma poca na qual o controle
social palavra-chave no processo de confiana pblica. Da:
... a probidade, competncia e eficincia no uso de recursos
publicamente apropriados constituem, em regimes democrticos,
uma das condies para a confiana pblica (public confident) no
Estado e nas instituies democrticas. O desperdcio de recursos,
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A efetividade de uma poltica pblica est ligada relao dos objetivos de sua
implementao e aos resultados. De fato, constatamos a efetividade de uma dada poltica
pblica quando ela atinge os objetivos definidos em sua implementao e os seus impactos
e/ou resultados, ou seja, seu sucesso ou fracasso, em termos de uma efetiva mudana nas
condies sociais da vida das populaes atingidas pelo programa (Arretche, 1999).
guisa de concluso
No Brasil, os estudos relacionados com a temtica das polticas pblicas ainda no
constituiu uma tradio no que se refere avaliao. A crescente necessidade de realizar a
avaliao de polticas pblicas pode ser um fator impulsionador para a consolidao desta
tradio.
Assim, a avaliao de polticas pblicas em mbito local possibilita, por exemplo, a
reflexo sobre qual padro de desenvolvimento vem sendo implementado em determinada
localidade ou municpio, a partir da obteno de informaes que indiquem quais os
objetivos da poltica pblica em questo; como vem sendo, ou foi implementada; quem , e
como vem sendo beneficiada a populao-alvo dos programas e projetos pblicos que
ancoram o modelo de desenvolvimento em curso.
Portanto, o desafio desse momento o da implementao de metodologias capazes de
garantir a eqidade e sustentabilidade do desenvolvimento, a partir da capacidade de
continuidade dos efeitos benficos dos programas e polticas, permitindo tambm, uma
distribuio de maneira justa, compatvel e tornando mais sensato e efetivo os gastos
pblicos. E a participao de diversos atores sociais uma condio essencial, pois como
diz um provrbio africano: ns no herdamos o mundo dos nossos pais, mas tomamos
emprestado dos nossos filhos. Isto significa dizer, que alm da participao, temos o
desafio de sair da esfera do discurso para sermos mais pragmticos, no sentido da
implementao de metodologias capazes de possibilitarem o alcance de resultados
desejados e que esses resultados sejam aqueles desejados por todas as sociedades presentes
e futuras.
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