Acreditação Hospitalar Como Estratégia de Melhoria PDF
Acreditação Hospitalar Como Estratégia de Melhoria PDF
Acreditação Hospitalar Como Estratégia de Melhoria PDF
636-648, 2015
http://dx.doi.org/10.1590/0104-530X1226-14
1 Introduo
A rede hospitalar no Brasil diversificada em
termos de infraestrutura, tipos de servios e nveis
de qualidade dos servios prestados. Embora existam
hospitais considerados de excelncia, a grande maioria
ainda precisa avanar em termos de qualidade dos
servios prestados (Burmesteretal., 2007; Forgia &
Couttolenc, 2008).
Iniciativas de melhoria da qualidade nos servios
hospitalares so relatadas em diversos pases (Malik
& Teles, 2001; Leeetal., 2002; Hasan & Kerr, 2003;
Manaf, 2005; Macinati, 2008; Alavi & Mahamoud,
2008; Olstico & Toledo, 2013). Uma das estratgias
adotadas para melhorar a qualidade e a produtividade
nas organizaes de sade a criao de programas
de acreditao hospitalar (Pomeyetal., 2010).
Fortesetal. (2011) analisaram o sistema de
acreditao em diferentes pases e concluram que
no h um nico modelo. As polticas nacionais e os
1
Departamento de Engenharia de Produo, Universidade Federal de So Carlos - UFSCar, Rod.Washington Lus, Km 235, Caixa
Postal 676, CEP 13565-905, So Carlos, SP, Brasil, e-mail: glauco@dep.ufscar.br; thaysemirandola@hotmail.com
2 Reviso terica
2.1 Acreditaohospitalar
A acreditao hospitalar surgiu nos Estados Unidos.
Sua origem est relacionada a uma iniciativa do
Colgio Americano de Cirurgies, que em 1924 criou
o Programa de Padronizao Hospitalar. Oobjetivo
foi estabelecer um conjunto de padres para garantir
a qualidade da assistncia aos pacientes. Em 1950, o
nmero de avaliaes j superava os trs mil hospitais
(Feldmanetal., 2005).
Na dcada de cinquenta, o programa de acreditao
americano foi delegado a Joint Commission on
Accreditation of Hospitals (nomeada posteriormente
de Joint Commission), uma organizao de natureza
privada. Na dcada seguinte, como a maioria dos
hospitais americanos j havia atingido os padres
mnimos de qualidade, a Joint Commission elevou o
grau de exigncia. Em 1970, publicou o Accreditation
637
638 Mendesetal.
639
3 Mtodo de pesquisa
Foi adotada a abordagem qualitativa de pesquisa e
o mtodo de casos mltiplos. A pesquisa tem natureza
qualitativa e descritiva, o que tambm conduz
estratgia do estudo de caso devido natureza dos dados
nesse tipo de abordagem. A anlise dos dados seguiu
o mtodo indutivo, no qual, a partir de constataes
particulares, pode-se chegar a concluses genricas,
ainda que respeitadas as limitaes deste tipo estudo.
Para Yin (2001), o estudo de caso uma estratgia
de pesquisa emprica que investiga um fenmeno
dentro do contexto da vida real. A escolha dessa
abordagem foi justificada em funo da necessidade
de se compreender um fenmeno social complexo e
cujo contexto relevante, pois se busca analisar os
impactos da acreditao em hospitais paulistas. Ainda
segundo o autor, o mtodo de casos mltiplos segue
a mesma estrutura metodolgica do estudo de caso
e deve ser utilizado quando se buscam replicaes
literais ou tericas sobre um determinado contexto.
No artigo, seguiu-se a lgica das replicaes literais
(Yin, 2001).
Figura 1. Sntese dos principais impactos da acreditao. Fonte: elaborado pelos autores.
640 Mendesetal.
4 Estudo de casos
4.1 Caracterizao dos hospitais da pesquisa
Os casos no sero descritos isoladamente, mas
de forma conjunta, o que permite uma melhor
comparao entre os hospitais pesquisados. Asprincipais
caractersticas dos hospitais esto sintetizadas no
Quadro1.
Quanto ao porte, os hospitais H1, H2 e H5
so considerados de mdio porte, pois possuem
entre 50 e 149 leitos. Os hospitais H3, H4 e H6
so considerados hospitais de grande porte por
possurem mais de 150 leitos. Todos os hospitais so
Caractersticas
HOSPITAIS
H3
H4
Grande
Grande
Geral
Geral
Pblico
Pblico
1.459
1.579
243 leitos
319 leitos
38 UTI
20 UTI
Acreditado
Acreditado
(2011)
(2004)
H1
Mdio
Geral
Privado
523
90 leitos
10 UTI
Acreditado
(2005)
Acreditado
com
excelncia
(2013)
H2
Mdio
Geral
Cooperativa
350
56 leitos
10 UTI
Acreditado
(2012)
Acreditado
(2012)
Acreditado
Pleno
(2013)
Acreditado
(2012)
Apoio de consultoria
externa
Sim
Sim
Sim
Cargo do Entrevistado
Consultora
Interna da
Qualidade
Supervisora
de
Enfermagem
Gerente da
qualidade
Porte
Tipo
Natureza
Colaboradores
Atendimento
Leitos Totais
Primeira Acreditao
Acreditao
atual
H5
Mdio
Geral
Privado
474
87 leitos
22 UTI
Acreditado
(2001)
Acreditado
com
excelncia
(2012)
H6
Grande
Geral
Privado
834
201 leitos
28 UTI
Acreditado
(2010)
Sim
Sim
No
Coordenadora
da Qualidade
Gerente da
Qualidade
Coordenador
da Qualidade
Acreditado
Pleno
(2012)
641
DIMENSES DA ACREDITAO
Estrutura
Processos
HOSPTIAIS
Gerenciamento do
Risco
Criao de protocolos
Ampliao do pronto
Implantao de
H1
assistenciais e
atendimento
barreiras preventivas
diretrizes clnicas
nfase nos processos
para notificaes e
Implantao de
H2
No houve
anlise de eventos
protocolos
adversos
Estmulo cultura
Adequao de reas
Documentao
de gerenciamento de
H3
para pacientes e postos
fsica dos padres e
risco, que no estava
de enfermagem
capacitao
disseminada
Programa de gesto
de risco j estava
nfase na gesto de
H4
No houve
implantado, mas houve processos
reforo das aes
Ampla reforma e
Criao do comit de
Descrio de
H5
ampliao dos espaos gerenciamento
Todos os processos e
internos
de risco
procedimentos internos
Identificao do risco
Adequao dos setores
nos pacientes e normas nfase em protocolos
H6
do almoxarifado e
para notificao de
multidisciplinares
farmcia
eventos adversos
Estrutura
Infraestrutura
Resultados
Acompanhamento
dos resultados dos
processos
nfase na implantao
de melhorias da
instituio
Implantado o sistema
de gesto estratgica
Constantes mudanas
de gestores
Planejamento
estratgico baseado em
resultados operacionais
Gesto por indicadores
e planejamento
estratgico da
instituio
642 Mendesetal.
H1
H2
H3
H4
H5
H6
Mdia
5
4
5
5
5
4
4
5
4
4
5
4
5
5
4
4
4
5
5
5
5
5
5
5
5
4
4
4
4
4
4,50
4,17
4,83
4,67
4,50
Desvio
padro
0,55
0,41
0,41
0,52
0,55
4,33
0,52
5
4
4
3
5
4
4
3
5
3
4
3
4,50
3,33
0,55
0,51
Mdia Desvio
padro
4,50
0,55
3,50
1,05
4,00
0,63
4,33
0,82
1,66
0,51
H1
H2
H3
H4
H5
H6
4
4
4
5
1
5
4
4
5
2
5
5
5
4
2
4
2
4
4
2
5
3
4
5
1
4
3
3
3
2
643
Categorias Profissionais
Alta Direo
Corpo de Enfermagem
Corpo Mdico
Corpo Administrativo
H1
Alto
Alto
Regular
Alto
644 Mendesetal.
645
5 Implicaes gerenciais
Este trabalho traz implicaes gerenciais.
Aprimeira refere-se aos retornos da acreditao.
A investigao sobre os impactos da acreditao
uma questo importante devido escassez de
pesquisas no cenrio nacional. Em consonncia com
a bibliografia, os resultados deste estudo ratificaram
que a acreditao capaz de gerar mudanas
organizacionais (Greenfieldetal., 2012a; Alkhenizan
& Shaw, 2011). Entre essas, foram destacadas no
estudo: a melhoria da organizao interna por meio da
gesto de processos (Pomeyetal., 2010), a melhoria
da qualidade assistencial (AlTehewyetal., 2009) e o
reconhecimento pblico (Greenfield & Braithwaite,
2008). Entretanto, tais benefcios no tm sido
suficientes para gerar uma adeso mais significativa
dos hospitais brasileiros ao programa de acreditao.
Para a intensificao da acreditao como ferramenta
de melhoria da qualidade hospitalar, seria importante
a adoo, por parte das autoridades competentes, de
estratgias que tornassem a acreditao mais atraente
aos hospitais. Por exemplo, fazendo com que as
principais fontes pagadoras dos servios hospitalares
(planos de sade e o Estado) passassem a vincular
a acreditao como condio de credenciamento ou
remunerao dos servios de sade. Outra estratgia
seria estimular o uso de prticas para quantificar
economicamente os ganhos dos hospitais com a
acreditao. Tais medidas foram adotadas com sucesso
em outros pases.
A segunda implicao refere-se necessidade
da mudana cultural imposta pela acreditao
hospitalar. Como evidenciado nos resultados, um
desafio para um hospital que busca a acreditao
conseguir o engajamento dos profissionais de sade.
Neste sentido, o comprometimento da alta direo
torna-se imprescindvel, cabendo a ela dar o exemplo
a ser seguido pelas demais categorias profissionais
(Macinati; 2008). Para Bergamini (1994), a liderana
atribui significados s aes desenvolvidas pelos
liderados, atuando como um agente de transformao.
No hospital, coexistem diferentes categorias
profissionais de sade que formam subculturas.
Essadiversidade de grupos impe desafios
implantao da acreditao. Enquanto os profissionais de
enfermagem mostram possuir vnculos comprometidos
com a acreditao, a categoria mdica, dada a sua
formao especialista e a precariedade de vnculos de
contratao (em muitos hospitais), mostra-se menos
comprometida. Assim, cabe liderana reconhecer
essa diversidade de interesses e descobrir maneiras
de levar os mdicos a participarem mais ativamente
do processo de acreditao. Muitas vezes ser preciso
que o hospital repense seus processos de contratao,
remunerao e avaliao de desempenho. Todavia,
importante que no s os hospitais, mas tambm
os prprios organismos de acreditao desenvolvam
estratgias para aumentar o engajamento mdico.
646 Mendesetal.
6 Consideraes finais
O trabalho contribui ao ampliar os estudos sobre
acreditao no Brasil. Para o setor hospitalar, cujo
cenrio revela tendncias de modernizao, de
aumento da concorrncia e de maior exigncia dos
clientes, a pesquisa se mostra relevante por buscar
conhecer as prticas e impactos da acreditao nos
hospitais estudados. Para cumprir este objetivo foi
feito um levantamento da literatura existente sobre
o tema. Adicionalmente, foram realizados casos em
seis hospitais acreditados.
Os resultados mostraram que a acreditao hospitalar
tem capacidade de gerar melhorias organizacionais
quanto gesto de processos, ao aumento da segurana
aos pacientes, ao desenvolvimento dos profissionais
de sade e contribui tambm para a melhoria de
imagem pblica dos hospitais acreditados. Entretanto,
a capacidade de a acreditao gerar benefcios
financeiros aos hospitais pesquisados no pode ser
evidenciada.
Um aprofundamento do estudo sobre os impactos da
acreditao essencial para se garantir mais adeses
ao Programa Brasileiro de Acreditao. Asegunda
concluso que a acreditao, como qualquer
iniciativa de qualidade, um processo de mudana
cultural, o qual deve ser cuidadosamente gerenciado
pela liderana dos hospitais. Compromissos devem
ser firmados para se garantir o envolvimento de todas
as subculturas existentes no hospital.
O estudo apresenta limitaes. Uma primeira
limitao pode ser atribuda ao perfil dos hospitais
pesquisados, que se diferenciavam em termos do porte,
natureza, nvel de acreditao e tempo j dedicado
acreditao hospitalar. Tais elementos podem ter
influenciado as percepes dos entrevistados. Uma
segunda limitao refere-se ao estgio de evoluo
do processo de acreditao brasileiro, que ainda
recente em comparao ao de outros pases como
Frana e Estados Unidos. Assim, pode-se inferir que
seria necessrio mais tempo para se refletir sobre os
reais impactos da acreditao no Brasil. Uma ltima
limitao pode ser atribuda ao mtodo (pesquisa
qualitativa por meio de estudos de casos) adotado
para esta pesquisa.
Espera-se, com o desenvolvimento do presente
estudo, acrescentar evidncias sobre os impactos da
acreditao hospitalar e, assim, motivar e subsidiar o
desenvolvimento de novas pesquisas sobre o tema.
Referncias
Al Tehewy, M., Salem, B., Habil, I., & El Okda, S. (2009).
Evaluation of accreditation program in non-governmental
organizations health units in Egypt: short-term outcomes.
International Journal for Quality in Health Care, 21(3),
183-189. http://dx.doi.org/10.1093/intqhc/mzp014.
PMid:19439444.
647
648 Mendesetal.