Jung Depressao PDF
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Jung Depressao PDF
ISSN 0103-7013
Psicol. Argum., Curitiba, v. 30, n. 71, p. 613-620, out./dez. 2012
[T]
[A]
Francisco Purcotes Júnior
[R]
Resumo
Graduado em Psicologia pela Cada vez mais, pessoas aparecem nos consultórios médicos e psicológicos com sintomas de
Faculdade Evangélica do Paraná
depressão. Dentre eles, podem ser citados a tristeza, vontade de não fazer nada, apatia, de-
(Fepar), pós-graduando em
Psicologia Analítica e Religião sinteresse, insônia, sensação de vazio, entre outros. Assim, é deveras importante que entre
Oriental e Ocidental (ICHTHYS- os profissionais haja o esclarecimento e a discussão sobre formas de tratamento, além de, se
FAVI), Curitiba, PR - Brasil,
possível, que haja novos pontos de vista sobre esse tópico. Este texto tem a finalidade de apre-
e-mail: purcotes@hotmail.com
sentar, explicar e descrever como se realiza o trabalho com pacientes depressivos segundo a
proposta teórica do psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, criador da Psicologia Analítica, e como
Recebido: 15/12/2010
esta abordagem trabalha os conteúdos e sintomas depressivos. Para isso, o texto propõe uma
Received: 12/15/2010
básica explanação sobre a depressão e como a doença é vista no âmbito médico e psicológico
Aprovado: 24/03/2011 na atualidade, além de relatar as imagens e símbolos que surgem durante a vivência dos sinto-
Approved: 03/24/2011
mas pelos pacientes que sofrem. Tudo isso será relatado por meio de uma revisão na literatura
já existente. [#]
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[A]
Abstract
Increasingly, people appear in medical and psychological offices with symptoms of depression,
including, sadness, will of doing nothing, indifference, apathy, insomnia, feeling of emptiness,
among others. So it is very important that among the professionals, there has to be a clarifica-
tion and discussion of treatment options, and if possible, the development of new points of view
about this topic. This text aims to present, explain and describe how is the work with depressed
patients according to the theoretical proposal of Swiss psychiatrist Carl Gustav Jung, the creator
of Analytical Psychology and how this approach works the content and depressive symptoms. For
this, the text offers a basic explanation of depression and how this disease is seen in the medical
and psychological fields today, in addition to reporting the images and symbols that arise during
the experience of symptoms by patients who suffer. All this will be reported through a review of
existing literature. #]
[K]
ente querido, um emprego, moradia, status ou de definem a cura da depressão como o “retorno ao
algo puramente simbólico. estado anterior”.
Jung (2008) afirma que o aumento considerável Diferentemente do modelo médico, o diagnóstico
populacional, sobretudo nas cidades grandes, exer- não é o essencial para o trabalho com a depressão para
ce sobre nós um efeito depressivo. a Psicologia Analítica. Segundo Jung (2006, p. 158),
O diagnóstico de Transtorno Depressivo Recor- “Naturalmente, é necessário que um médico tenha o
rente é dado quando, no decorrer da vida, o indiví- conhecimento dos assim chamados métodos. Mas deve
duo apresentou mais de um Episódio Depressivo, evitar o engajamento fixo de um caminho determina-
não podendo ser intercalado com episódios manía- do, rotineiro”. Carl Gustav Jung nasceu em 26 de julho
cos ou hipomaníaco (Dalgalarrondo, 2008, p. 311). de 1875 em Kesswil, na Suíça, seu pai (Johann Paul
Segundo a classificação médica, Dalgalarrondo Achilles Jung) era pastor protestante e sua mãe (Emilie
pontua alguns subtipos de síndromes e transtornos Jung) era filha de um pastor Grinberg (2003, p. 12).
depressivos: Episódio ou fase depressiva e Transtor- Segundo Grinberg (2003, p. 13), o primeiro sonho
no Depressivo Recorrente, Distimia, Depressão atípi- que Jung se recorda ocorreu quando ele tinha mais ou
ca, Depressão tipo melancólica ou endógena, Depres- menos três anos. Alguns anos mais tarde, Jung afir-
são psicótica, Estupor depressivo, Depressão agitada mou que esse primeiro sonho ocorrera “para que a
ou ansiosa e Depressão secundária ou orgânica. mais intensa luz possível se produzisse na escuridão”.
Pesquisas demonstram que 80% dos pacientes Jung cresceu e se tornou psiquiatra, percebeu
com sintomas depressivos não recebem o tratamen- que os pacientes possuem segredos, histórias que
to adequado (Cuche & Gérard, 1994, p. 16). não são contadas e que são fundamentais para que
Entre jovens e idosos, a depressão é uma doença o profissional possa ajudar.
muitas vezes mortal, e hoje é tão frequente que, segun-
do as pesquisas, uma pessoa entre cinco, ficou, fica ou Para mim, a verdadeira terapia só começa depois de exa-
minada a história pessoal. Essa representa o segredo do
ficará deprimida (Cuche & Gérard, 1994, p. 17).
paciente, segredo que o desesperou. Ao mesmo tempo,
Segundo Styron (1991) uma depressão real-
encerra a chave do tratamento. É, pois, indispensável que
mente grave não desaparece do dia para a noite, e a
o médico saiba descobri-la. Ele deve propor perguntas
maioria das pessoas sente-se pior pela manhã e vão que digam respeito ao homem em sua totalidade e não
melhorando com o decorrer do dia. limitar-se apenas aos sintomas. Na maioria dos casos, não
Para Styron, (1991, p. 63-64) a dor depressiva é é suficiente explorar o material consciente. Conforme o
como um afogamento ou sufocação. É como se o seu caso, a experiência de associações pode abrir o caminho à
raciocínio estivesse sendo inundado por uma onda interpretação dos sonhos (Jung, 2006, p. 144).
venenosa e invencível que impedia qualquer reação
ao mundo exterior. “Uma sensação de perda que De acordo com Jung (2006), apenas a formação
está ligada a uma certeza de que a vida foge a gran- psiquiátrica não é suficiente, pois não é possível tra-
de velocidade”. “Toda ideia de futuro desaparece”. tar uma psicose, por exemplo, sem compreender a
O primeiro passo para o tratamento, segundo simbologia. Ele teve então que estudar Mitologia.
esse modelo médico, “consiste em ajudar de manei- Afirma Jung: “Uma simples formação médica não é
ra ativa o paciente a gerir sua vida, seu tratamento e suficiente, porquanto o horizonte da alma humana
o conjunto de sua situação”. Esse método inclui “não vai muito além do gabinete de consulta”.
hesitar em dar conselhos e orientações e a ajuda de Para Jung (2008), as pessoas sofrem cada vez
medicamentos” (Cuche & Gérard, 1994, p. 162). mais uma sensação de terrível vazio e tédio, espe-
De acordo com o modelo médico psiquiátrico rando por algo que nunca acontece. Elas tentam se
de tratamento para os pacientes depressivos, a distrair com cinema, televisão, espetáculos esporti-
psicoterapia é aconselhada apenas num segundo vos e política, mas, cansadas, sempre voltam ao de-
momento de tratamento, visto que Cuche e Gérard serto de suas vidas.
(1994) justificam que a psicoterapia, no seu sen- Em sua vida pessoal, defrontar-se com a de-
tido clássico, exige uma capacidade de pensar, de pressão foi uma difícil tarefa que perdurou durante
dispor livremente de raciocínio, de inteligência e anos. Segundo Grinberg (2003, p. 40), a decisão de
de associação de ideias, o que, segundo os autores, Jung em enfrentar o inconsciente foi no dia 12 de
são coisas difíceis para o deprimido. Os autores dezembro de 1913.
Sentado em meu escritório, considerei mais uma vez físico ou interior, nessa hora ninguém pode confor-
os temores que sentia, depois me abandonei à queda. tar-nos. Todas as coisas que dávamos importância,
O solo pareceu ceder aos meus pés e fui como que pre- inclusive os afetos, passam para um segundo plano,
cipitado numa profundidade escura. Não pude evitar assim descobrimos a solidão. Nesse deserto, somos
um sentimento de pânico. Mas de repente, sem que conduzidos novamente a nossa essência, à raiz, e
tivesse atingido uma grande profundidade, encontrei- corremos o grande risco de ter vivido em vão, se ig-
-me – com grande alívio – de pé, numa massa mole e
norarmos essa fonte. Podemos ter companheiros de
viscosa. A escuridão era quase total; pouco a pouco
viagem, mas nenhum pode caminhar por nós, ou no
meus olhos se habituaram a ela, que parecia um cre-
púsculo sombrio. Diante de mim estava a entrada de
nosso lugar.
uma caverna obscura (Jung, 2006, p. 206). Lyra (2001, p. 137) apresenta a ideia que todo
movimento de aumento de clareza e consciência
De acordo com Jung, (1986, p. 370), o homem começa com uma traumática separação. No caso da
precisa conhecer toda essa horrível dúvida, todo depressão, essa separação do mundo e busca pelo
o desespero e confusão da alma, pois ele só está seu próprio caminho serve, ao fim, para o encontro
ligado às imagens que ele mesmo cria, e não a da luz, eis o porquê desse momento não poder ser
algo externo como partidos e credos. “Toda con- ignorado, mas vivido. Lyra (2001, p. 124) comenta
vicção da minha vida agora repousa na crença de que “tudo aquilo que representa algum perigo para
que a solidão, longe de ser um fenômeno raro e nós, é, da mesma forma, o único caminho que con-
curioso, é o fato central e inevitável da existência duz à salvação”.
humana”. Os símbolos e imagens que aparecem num esta-
Moustakis (citado por Lyra, 2001, p. 138) afir- do depressivo são efetivamente importantes para
ma que “A solidão é uma condição da vida humana, o processo terapêutico, visto que é por meio deles
uma experiência do ser humano que possibilita ao que o paciente encontrará as suas formas de lidar
indivíduo sustentar, estender e aprofundar sua qua- com a depressão. Não há um padrão de imagens
lidade humana ...” Todas as tentativas de fugir dessa e símbolos para cada transtorno ou doença, cada
experiência existencial da solidão resultam em au- pessoa manifestará seus sintomas de uma forma
toalienação. Quando o homem foge de uma verdade diferente, fato que torna a psicoterapia necessária
fundamental da vida e nega essa solidão, ele se fe- nesse tratamento, já que o modelo médico não fo-
cha para um importante passo rumo ao seu cresci- cará a parte simbólica da psique, como a Psicologia
mento pessoal. Analítica propõe.
Lyra (2001, p. 134) diz que “quando seguimos as Outra imagem recorrente que os pacientes depres-
pegadas dos caminhos que nos conduzem à comple- sivos trazem para a terapia simbolizando seu estado
tude, saberemos que este caminho sempre desembo- psíquico e como se sentem é a queda ou a descida. Essa
cará na Fonte Espiritual, que é um lugar de solidão”. imagem é antiga e vem da mitologia grega.
Mazzocchi, Forzani e Tallarico (1995, p. 27-30) Os gregos denominavam uma queda como catá-
explicam: “Nascemos sós, morremos sós, caminha- base. Essa decida representa um “ir sem saber para
mos sós: sós no sentido de que ninguém pode fazê- onde”, sem rumo, é o retomar o contato com suas
-lo por nós. A nossa unicidade é o nosso deserto e, raízes, e geralmente leva o indivíduo ao isolamento,
ao mesmo tempo, o sinal da unidade de cada ser”. pois separa a pessoa daqueles com quem caminha-
Assim, retirar o paciente da experiência de solidão, va, ele vai para o “porão”, para um lugar mais baixo,
equivale a retirá-lo de sua busca pessoal, de uma inferior (Lyra, 2001, p. 163).
experiência única. De acordo com Cuche e Gérard
Aprender a suportar o insuportável, eis a tarefa que
(1994), quando dizemos a um deprimido para se
nos é exigida se queremos tratar a ferida originária da
animar, é como se estivéssemos dizendo a um ho-
dor da separação e do abandono, em que experiencia-
mem sem pernas correr mais, o que agravará seu mos a máxima solidão. Não é possível evitar a solidão,
sentimento de culpa. pois a sentimos mesmo quando rodeados de pessoas.
A definição simbólica dos comportamentos de- Só podemos vencê-la indo ao seu encontro, aprenden-
pressivos, segundo Mazzocchi, Forzani e Tallarico do a suportá-la, ainda que comecemos com pequenas
(1995, p. 27-30), em nossas vidas também experi- doses. O veneno em pequenas doses é o antídoto do
mentamos esse “deserto”, seja ele por um sofrimento próprio veneno (Lyra, 2001, p. 161).
Segundo Hollis, (1999, p. 121-122) “O tormento as etapas de transformação psíquicas que ocorrem
do inferno é a única maneira de atravessar a abertu- durante o desenvolvimento de sua personalidade.
ra que Dante divisou depois de sua temível jornada. A alquimia descreve as etapas de transformação
Somente a descida ao Hades é capaz de nos libertar dos elementos químicos. Jung demonstra como es-
do Hades”. ses mesmos processos podem ser aplicados para
Hades é um deus antigo, ele é o soberano do sub- os elementos psicológicos e como ocorrem essas
mundo, seu reino também é conhecido como Hades transformações de energia psíquica.
(Johnson & Ruhl, 2010, p. 64). Segundo Jung (1991, p. 244, § 334), a Nigredo é
Hades e o submundo não são apenas símbolos a primeira fase, é a fase do caos, da confusão e da es-
de perda e da morte, mas também de riqueza. Se- curidão, é a morte do produto químico, de forma que
gundo Johnson e Ruhl (2010, p. 65), possa haver a transformação. O metal que representa
essa fase é o chumbo. A partir dessa morte psicológica,
O senhor do submundo é uma figura criativamente ocorre a segunda fase, a Albedo; é a aurora, a lavagem,
transformadora, o correspondente masculino de De- o batismo, o embranquecimento, a alma morreu e foi
meter, a deusa da fertilidade que gera os grãos e frutos liberta, o preto se transforma em branco, ressuscitou,
da terra. De fato, a imersão nesse reino propicia uma segundo alguns alquimistas é a meta do processo, é a
fecundidade interna. Falando de maneira psicológica, fase Lunar; o metal que simboliza é a prata. Mas o nas-
precisamos ir ao submundo para recuperar as riquezas. cer do sol não é essa fase, o branco se transforma em
brilho, é a elevação do fogo à sua maior intensidade.
Johnson e Ruhl (2010, p. 77) reforçam que “Ha- Essa fase se chama Rubedo, e, quando o indivíduo vol-
des não é apenas a morada da perda, dos lamentos ta a brilhar, ele já passou pelo escuro, pela morte, res-
e da depressão; é um reino transformativo, pleno de suscitou, ficou claro, enxergou a luz e, no fim, se tornou
riquezas, que promete uma nova colheita de poten- a luz, sua energia foi transformada.
cial de vida”. Associando a Alquimia com a Psicologia, podemos
A mitologia também retrata esse tema quando fala entender as fases da depressão sentidas pelo paciente.
sobre a jornada do herói: a descida ao inconsciente é A Nigredo, fase escura, em que não há saídas e não
uma das etapas necessárias para o seu desenvolvi- existe luz, o paciente se sente realmente no fundo do
mento. Segundo Campbell (2008, p. 138), a aventura poço e pensa em morrer. O ser não suporta mais a
do herói é sempre perigosa, pois se distancia da es- dor, mas não foge dela, e, enfim, ocorre a morte psi-
fera conhecida da consciência rumo ao grande des- cológica do Sujeito que sofre. Como na Alquimia, as
conhecido. É a travessia do mundo consciente para transformações dos metais ocorriam da mesma for-
o inconsciente e é representado por muitas imagens. ma que as transformações psíquicas, e como o sujeito
Pode-se mergulhar no oceano, entrar no deserto, suportou a dor e não correu dela, agora pode nascer
perder-se numa floresta escura ou uma cidade es- um novo ser, já livre da dor, que foi integrada.
tranha. Pode ser uma ascensão ou uma descida... é o A segunda fase alquímica, a Albedo, representa
caminho rumo ao desconhecido, por um portão, por esse renascimento; o peso e a dor não mais existem,
uma caverna ou por rochas que se chocam. Vários e o que pode definir o novo ser é o alívio.
heróis da mitologia, como Ulisses, Orfeu e Hércules Na terceira fase, a Rubedo, existe um novo ser que
desceram ao Hades para completar sua aventura. agora precisa viver. Ele parte rumo à vida, volta a sor-
A literatura também traz imagens que relatam rir e agora pode desfrutar da felicidade e alegria que o
o sentimento que o depressivo passa durante essa Sujeito que sofre nunca imaginou voltar a sentir.
fase. Na obra “Memórias do subssolo”, o autor diz: De acordo com Lyra (2001, p. 164), a depressão
“Quanto mais o bem e todas as coisas ‘belas e subli- é parte de uma angústia e representa uma descida,
mes’ se tornavam claras à minha consciência, mais uma puxada para baixo, para onde não queremos
profundamente eu me afundava na minha lama, ir, entretanto é uma dor necessária, só então, algo
mais eu me sentia capaz de me enterrar definitiva- novo pode surgir em nós, e, quando entendemos
mente” (Dostoievski, 2004, p. 70). isso, podemos até pedir para “afundar”.
Um dos temas exaustivamente estudados por Segundo Jung (2008), para que a pessoa possa
Jung para desenvolver sua psicologia foi a alqui- perceber esses fatos, é quase sempre necessária que
mia, que também retrata o processo depressivo e haja uma crise em sua vida.
De acordo com Da Silva (2011), todos nós temos ente querido, por exemplo). Segundo Chalub
nossos momentos depressivos. Ele cita a frase de (2010), o homem não aceita mais sentir coisas
Jung para demonstrar como pode ser realizado um humanas, como a tristeza. Ficar triste, em geral,
trabalho psicológico com a depressão. não justifica o uso de medicamentos. Para o en-
Grun (citado por Da Silva, 2011) afirma: trevistado, os médicos atualmente precisam su-
prir a demanda. Assim, em geral, um paciente que
[...] as depressões são um estímulo para se per-
diga em uma consulta que está triste, se for acon-
correr novos caminhos, seguir o caminho interior.
selhado uma psicoterapia, não sairá satisfeito e
Entretanto, muitas pessoas recusam-se a dar esse
passo a frente. Elas ficam presas ao seu passado e procurará outro médico; este receitará um anti-
procuram dar prosseguimento aos padrões de vida depressivo, o que fará o paciente se sentir melhor,
da primeira metade da vida. e voltar outras vezes.
O psicólogo Frederic Flach diz que: “a depressão As raízes da depressão estão na infância. Os aconteci-
mentos atuais não levam à depressão verdadeira, só
é sempre uma chance de vida, ela nos presta um ser-
muito raramente. Justamente o contrário do que se
viço, pois nos induz de forma natural à recuperação
imagina. Mas mexer na infância é muito doloroso. Não
do tempo e reflexão sobre o nosso objetivo da vida”
tem remédio para isso. Precisa de terapia, de análise,
(Da Silva, 2011). mas as pessoas não querem fazer, não querem mexer
Em entrevista para a revista Istoé, Chalub (2010) nas feridas. Então é melhor colocar um esparadrapo,
afirma que hoje em dia tanto pacientes quanto médi- para não ficar doendo, e pronto. É a solução mais fácil
cos confundem tristeza com depressão. O autor afir- (Chalub, 2010).
ma. “Não se pode mais ficar triste, entediado, porque
isso é imediatamente transformado em depressão”. O desamparo é uma condição humana, e é o que
Chalub (2010), sobre a conduta médica adotada ocorre hoje em dia, as pessoas estão cada vez mais
quando em contato com pacientes depressivos, afir- desamparadas, mas precisamos enfrentar esse de-
ma: “É a medicalização de uma condição humana, a samparo, assim como o fracasso, o isolamento e a
tristeza. É transformar um sentimento normal, que solidão Chalub (2010).
todos nós devemos ter, dependendo das situações, Assim, a felicidade não se baseia apenas em coisas
numa entidade patológica”. positivas, mas também compreende aceitar as limita-
A procura dos pacientes por médicos psiquiatras ções, o sofrimento, as incompetências e fracassos. “É
para tratar a depressão, sem a participação do psicó- também ficar triste de vez em quando” (Chalub, 2010).
logo e da psicoterapia, psicologicamente falando, os
leva a um caminho mecânico e altamente não tera-
pêutico, já que de, acordo com os métodos médicos Considerações finais
apresentados, apenas reprimirá os conteúdos “tris-
tes” e sombrios, deixando o paciente mais vulnerável De acordo com o trabalho apresentado e com a re-
e à mercê do inconsciente, o que pode ser perigoso. visão na literatura existente, fica evidente a necessida-
Segundo Jung (2011, p. 28), quando fala sobre o de de, hoje em dia, os profissionais que trabalham com
papel do médico: a mente humana, se atualizarem a respeito de méto-
dos e propostas para o trabalho com a depressão.
Os conhecimentos que se exigem do médico não É evidente como cada dia mais pessoas vão
constaram do seu currículo na faculdade. Não foi pre- aos consultórios médicos e psicológicos com tris-
parado para cuidar da alma humana, pois ela não é
teza, tédio ou vazio, sintomas do que se chama
problema psiquiátrico ou fisiológico, e muito menos
biológico. É um problema psicológico. A alma é um
de depressão.
território em si, com leis que lhe são próprias. A es- Demonstra-se como há diversas formas de
sência da alma não pode ser derivada de princípios de trabalho com os pacientes depressivos, e como são
outros campos da ciência, caso contrário violar-se-ia diferentes as propostas médico-psiquiátricas e a
a natureza particular do psiquismo. psicológica de orientação analítica.
Na proposta médica, há a inclusão de medicamen-
Se não ficarmos tristes em algumas situações, tos, e são evidenciados os critérios diagnósticos se-
isto sim, é um problema (quando perdemos um gundo o Manual de Transtornos Mentais (DSM IV), e
por meio de um diagnóstico é definido um plano de Chalub, M. (2010). O homem não aceita mais ficar triste.
tratamento, busca-se o alívio da dor e do sofrimento. Revista Istoé, Ed. 2115. Recuperado em 17 set. 2011,
Na proposta psicológica, pela abordagem Analí- em http://www.istoe.com.br/assuntos/entrevista/de-
tica, o alívio da dor e do sofrimento vem com o en- talhe/74405_O+HOMEM+NAO+ACEITA+MAIS+FICAR
frentamento dessas situações. Não se busca “fugir”, +TRISTE
ou retirar uma dor, pelo contrário, a pessoa, por
Chopra, D. (2009). O terceiro Jesus: O Cristo que não
meio do processo de psicoterapia, vai ganhando
podemos ignorar. Rio de Janeiro: Rocco.
forças para entrar em sua depressão, para enfrentar
seus medos, dores e sofrimentos. Cuche, H., & Gérard, A. (1994). Não aguento mais. Cam-
Esse processo faz parte do que Jung chama pinas: Papirus.
Processo de Individuação: o indivíduo entra em
Da Silva, A. A. A crise existencial da meia idade e o va-
contato com ele mesmo, muitas vezes com seu
lor da depressão como um sinal de transforma-
pior lado, com aquilo que odeia, que não suporta,
ção. Recuperado em 17 set. 2011, em http://www.
que não é aceito socialmente. Para Jung, deixar de
mitranh.org.br/s2/index.php/gerais/753-a-crise-
lado esses conteúdos obscuros pode piorar o es-
-existencial-da-meia-idade-e-o-valor-da-depressao-
tado da pessoa. Ela reprime ou “anestesia” esses
-como-um-sinal-de-transformacao.html
conteúdos, entretanto, eles não deixarão de exis-
tir, mas voltarão ao sujeito em forma de sintoma, Dahklke, R. (2009). Depressão: Caminhos de supera-
sonhos, fantasias. Assim, se dá a importância de ção da noite escura da alma. São Paulo: Cultrix.
não ignorar-se as fantasias, os sonhos e as ima-
Dalgalarrondo, P. (2008). Psicopatologia e semiologia
gens que aparecem à pessoa quando esta passa
dos transtornos mentais. Porto Alegre: Artmed.
por uma fase negra, por uma depressão.
A psicoterapia é indicada apenas num segun- Dostoievski, F. (2004). Noites brancas e outras histó-
do momento ao sujeito diagnosticado depressivo. rias. São Paulo: Martin Claret.
A prioridade do médico é trabalhar os sintomas e ali-
Grinberg, L. P. (2003). Jung: O homem criativo. São Paulo: FTD.
viar a dor. Entretanto, fica claro como afastar o sujeito
de SUA dor é algo tão destrutivo quanto retirar o so- Hollis, J. (1999). Os pantanais da alma. São Paulo: Paulus.
frimento dele. Ao contrário da opinião médica sobre a
Johnson, R., & Ruhl, J. M. (2010). Viver a vida não vivida.
psicoterapia, o psicólogo precisa saber o momento em
Petrópolis: Vozes.
que o paciente precisa de medicamentos e de auxílio
psiquiátrico, já que há inúmeros casos em que isso se Jung, C. G. (1986). Símbolos da transformação. Petrópolis:
torna necessário. Caso haja necessidade, não há pro- Vozes.
blema em encaminhar o paciente para um trabalho
Jung, C. G. (1991). Psicologia e Alquimia. Petrópolis: Vozes.
com o médico paralelamente.
Quando o médico retira a dor, a ansiedade e o so- Jung, C. G. (2006). Memórias, sonhos, reflexões. Rio de
frimento do paciente, ele está tirando também algo Janeiro: Nova Fronteira.
que pertence ao paciente, que faz parte de sua his-
Jung, C. G. (2008). O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro:
tória e que, com certeza, faz parte do seu processo
Nova Fronteira.
de desenvolvimento, de individuação. “Somente a
descida ao Hades é capaz de nos libertar do Hades”. Jung, C. G. (2011). A prática da psicoterapia. Petrópolis:
Vozes.
American Psychiatric Association, (APA), 2002. Manual Mazzocchi, L., Forzani, J., & Tallarico, A. (1995). Il vange-
Didático e Estatístico de Transtornos Mentais. lo secondo Mateo e lo zen. Bologna: Dehoniane.
(4ª. ed.). Porto Alegre, RS: Artmed.
Sanford, J. A. (1987). Parceiros invisíveis: O masculino e o
Campbell, J. (2008). Mito e transformação. São Paulo: Ágora. feminino dentro de cada um de nós. São Paulo: Paulus.