Fotografia Meio e Linguagem Dentro Da Moda
Fotografia Meio e Linguagem Dentro Da Moda
Fotografia Meio e Linguagem Dentro Da Moda
1
fundamentais para se traçar um percurso do olhar, compreender melhor a relação
entre os aspectos naturais, sociais e culturais que o formam, e traçar rumos
definidores sobre o(s) regime(s) de olhar contemporâneo(s). Posteriormente, ao se
incluir a dimensão politico-ideológica – que, entende-se, não pode de modo algum ser
separada dos contextos especificados anteriormente –, os trabalhos de John Tagg e
Alan Sekula serão enorme acréscimo para a discussão.
2
I. O Olhar e a Fotografia
Para tratar dos aspectos da percepção visual que constituem o olhar, a fim de buscar
as definições de um suposto modo de ver contemporâneo, em princípio, faz-se
necessário um entendimento de como este processo de interpretação de estímulos
visuais é compreendido, hoje e historicamente. É também digno de nota que,
enquanto que o entendimento de que são as imagens que constroem nossa
interpretação do mundo e vivência cotidiana possa ser extremo, não há existência que
não seja, de algum modo, afetada pelo campo imagético.
O acto de ver nos surge, distintamente dos sentidos de tacto, olfato e paladar, de um
modo isento de esforços – fisiologicamente, dá-se de forma automática e autônoma.
Este automatismo pode vir a gerar uma certa atitude de visão “dada como certa”: de
que, já que funciona, em princípio, independente da consciência, todos vemos (e
sempre vimos) de modo igual, absorvemos a vastidão de informação visual que nos é
cotidianamente lançada de maneira homogênea (Dondis, 2001). O ponto de partida
deste trabalho será, então, esclarecer que esta aparente simplicidade do acto de ver é
enganosa; dada a complexidade de tal acto, deve-se então examinar os fatores que
constituem experiências distintas de olhar – elementos que estabelecem diferenças
nos modos de percepção visual.
3
existe independentemente de nossa consciência - e imagem mental – aquela que se
forma, em nossas mentes, a partir de estímulos que não são necessariamente visuais
(Mitchell, 1987).
1
Mitchell
relaciona
a
mudança
à
política,
mais
do
que
ao
âmbito
religioso,
e
identifica
a
luta
entre
dois
grupos:
iconófilos
e
iconoclastas;
luta
sobre
a
qual
o
autor
ainda
escreverá
em
What
do
Pictures
Want?.
4
E, finalmente, Mitchell estabelece o surgimento da perspectiva artificial como o ponto
de viragem para que finalmente “imagem” designe um objecto pictórico. A chamada
janela Albertiana2 estabelece-se como método infalível de representação, como uma
maneira de criar representações imagéticas absolutamente de acordo com o que se vê
a olho nu – assim, com o chamado “real” – iniciando a idéia de um medium
verdadeiramente transparente. A força de tal transparência, a partir de uma técnica que
nega-se a si própria enquanto artifício, é suficiente para que, a partir de então, a
semelhança inerente ao termo “imagem” passe a ser pictórica (Bolter, Grusin, 2000:
24, 25). É a conjunção entre a exactidão da matemática da óptica e a vontade de Deus
(Jay, ed. Foster, 1988: 3). E é precisamente neste instante que o olhar é dado como
natural e espontâneo, comum a todos os indivíduos. Chega-se, então, à ideia
anunciada anteriormente neste trabalho de um modo de ver objectivo, directo, e, por
sua vez, simplista: o “ponto-a-ponto” entre imagem e objecto.
2
Apesar
de
Brunelleschi
ser
apontado
como
seu
“descobridor”,
Leon
Battista
Alberti
foi
quem
sistematizou
a
perspectiva
como
modo
de
representação,
em
1455
–
no
Quattrocento
italiano.
“Na
superfície
em
que
pintarei,
desenho
um
rectângulo
(…)
que
trato
como
uma
janela
aberta
através
da
qual
vejo
o
objecto
a
ser
pintado”.
Alberti
apud
Bolter,
Grusin.
Remediation,
p.
24.
3
Manovich
cita
Norman
Byson,
para
quem
o
perspectivismo
segue
“a
lógica
do
olhar
fixo
(Gaze,
no
original)
mais
do
que
a
do
olhar
fugidio
(Glance),
assim
produzindo
um
take
visual
eternizado,
reduzido
a
um
ponto
de
vista,
e
incorporal”
(Bryson
apud
Manovich,
2001:
105).
5
À junção da perspectiva Albertiana com a ideia Cartesiana de racionalidade
subjectiva, Martin Jay chamará de perspectiva Cartesiana. Assumidamente adepto da
ideia de que a visão é o mais nobre dos sentidos, Descartes afirma que a perspectiva
que produz a experiência de uma visão correcta é alcançada através de aparelhos
ópticos que evitam uma semelhança perfeita: “(...)Seguindo as regras da perspectiva,
círculos são melhor representados por formas ovais do que por outros círculos; e
quadrados (melhor representados) por diamantes do que por outros quadrados”
(Descartes apud Jay, 1994:76). Tal conclusão fomenta o princípio da questão de qual
a relação entre o acto físico de ver e a interpretação de informação visual na mente.
Descartes examinará esta relação a fundo, chegando a conclusões sobre possíveis
distinções no processo de percepção visual de forma, tamanho, distância, posição, e
de luz e cor – as quatro primeiras categorias de informação estão no mundo e na
mente, enquanto as duas últimas, para ele, encontram-se apenas na mente (Jay,
1994:78).
6
Martin Jay, em Downcast Eyes, tece uma longa cronologia de mudanças de olhar. A
proposta de Jay, de examinar maneiras de ver diversas ao longo da história da
humanidade e seus pontos de viragem, ajuda a perceber elementos e processos que
constituem a experiência do olhar. Seu argumento principal, de que a visão é
sublevada e subvalorizada no que seria o “discurso”4 do pensamento francês ao longo
do século XX, é tecido desde a arte e filosofia gregas, passando pelo Impressionismo
francês e sua ruptura, até o chamado “sublime pós-moderno”. Jay afirma que, apesar
de os mecanismos fisiológicos de percepção visual serem há muito conhecidos,5 o
processo que transforma raios de luz em figuras pictóricas com significado ainda
permanece incógnito. A universalidade da experiência visual não existe, e não há um
“olhar de lugar-algum, mesmo do observador mais escrupulosamente
descomprometido” (Jay, 1994: 18). Mitchell acrescenta, citando Gombrich, que “o
olho inocente é cego”.
utilizados
de
nosso
tempo”;
é
uma
“textura
de
afirmações,
associações
e
metáforas
constantemente
não‐sistemáticas,
por
vezes
internamente
contraditórias,
que
nunca
fazem
sentido
de
maneira
rigorosa”.
(Jay,
2002:15).
Foucault
diz
que
“em
toda
sociedade
a
produção
de
discurso
é
ao
mesmo
tempo
controlada,
selecionada,
organizada
e
redistribuída
de
acordo
com
um
certo
número
de
procedimentos,
cujo
papel
é
prevenir
seus
poderes
e
perigos,
lidar
com
probabilidades,
evitar
sua
larga
e
maravilhosa
materialidade”
(apud
Tagg,
2009:
18)
5
Desde
Kepler
e
seu
exame
do
percurso
dos
raios
de
luz
através
do
aparelho
óptico.
7
Mais adiante, Jay assumirá que se for possível provar que nenhuma cultura no mundo
pode manter-se coerente, delimitada, sem sofrer “poluição” externa, a ideia de que
culturas diferentes produzem inúmeras visões do mundo cai por terra. Citando Bruno
Latour em We Have Never Been Modern, ele aponta que há “apenas culturas-naturais
híbridas, que são simultaneamente mundos de humanos, não-humanos e divindades”
(Jay, 2002: 274). A seguir, relembra que tão impossível quanto reduzir a experiência
do olhar à mediação cultural é dissociá-la completamente de tal mediação. A ideia de
Latour de hibridez rebate argumentos do construtivismo cultural absoluto: Jay dá o
exemplo do fenômeno do filme mudo, logo saindo da cultura em que surgiu para
obter uma popularidade global; também as imagens pornográficas, ao provocar
excitação, e as imagens de sofrimento de indivíduos, causando compaixão (Jay, 2002:
274).
6
O
estádio
do
espelho,
para
Lacan,
difere
do
teste
do
espelho,
em
que,
postos
um
infante
e
um
chimpanzé
frente
a
um
espelho,
a
criança
fica
fascinada
com
seu
reflexo,
enquanto
que
o
animal,
ao
notar
que
trata‐se
de
algo
ilusório,
perde
interesse;
tal
estádio
identifica
a
formação
do
ego
através
de
um
processo
de
identificação
(Evans,
2006:
117,
118).
8
conclui que, como nossos sentidos mais primitivos (olfato e paladar), a visão nunca
deixa de ter seu componente biológico. Por fim, não somente com o fim de apaziguar
ambos os opostos mas como uma ressalva de que há ainda muito a se progredir na
questão, “podemos não escolher entre extremos e viver confortavelmente com a
negativa dialética da cultura e da natureza, sabendo que nenhum dos termos pode
bastar sem o outro” (Jay, 2002: 276)
O percurso do olhar resgatado por Jay aponta um momento em que surge uma relação
de dúvida e desconfiança para com as capacidades do olho humano: o surgimento e
conseqüente popularização da fotografia. Schaeffer, ao apontar que a imagem
formada a partir da acção de materiais sensíveis à luz nunca é uma “reduplicação do
visível humano” (Schaeffer, 1996: 20), relembra que Walter Benjamin, em Pequena
História da Fotografia, aponta a expansão de nosso universo fotográfico tanto rumo
ao demasiado pequeno – a microfotografia – quanto ao demasiado grande – a
astrofotografia. Schaeffer faz ainda a ressalva de que esses novos campos de
visualidade são devidos a dispositivos ópticos anteriores à descoberta da fotografia.
No entanto, a divulgação das imagens destes novos campos, em parte a causa de se
pôr em questão o olho humano, só é possível a partir da gravação destas imagens pelo
método fotográfico. A fotografia apresenta então esta peculiaridade de revelar uma
“realidade oculta”, de mostrar mais do que o olho alcança: “tudo o que o programa de
realismo da fotografia de fato implica é a crença de que a realidade está oculta. E,
estando oculta, é algo que deve ser desvelado” (Sontag, 2004: 137)7. Panofsky dirá
que pode-se mesmo “afirmar que, na história da ciência moderna, a introdução da
perspectiva marcou o início de um primeiro período; a invenção do telescópio e do
microscópio, de um segundo período; e a descoberta da fotografia, o início do
terceiro” (Panofsky apud Rouillé, 2009: 68, 69).
A partir desta situação em que se põe em causa a confiança na visão surge então,
aponta Jay, uma oportunidade para se tecer novos caminhos para o olhar:
7
Note‐se,
na
escrita
de
Sontag,
os
termos
“programa”
e
“crença”.
A
discussão
da
relação
entre fotografia e realidade, neste trabalho, dar‐se‐á mais adiante.
9
nomeadamente, o movimento impressionista.
Centro
Georges
Pompidou,
identifica:
“apesar
de
a
visão
ser
primária,
o
olho
da
mente
era
o
que
mais
contava,
e
a
visão
interior
era
superior
à
do
tipo
antigo.
Muitos
dos
próprios
artistas
posavam
para
fotos
com
seus
olhos
fechados.
Outro
mundo
existia
em
suas
cabeças,
e
ainda
um
outro
estava
Escondido
dentre
os
factos.
O
olhar
para
dentro
produzia
fantasias,
combinações
improváveis,
realidades
alteradas”
(Goldberg,
in
Aperture
200,
2010:
11).
10
surgimento da perspectiva cartesiana já não mais existe:
11
habitualmente secundárias ao verbal, para um modo de ver que concede à imagem um
status mais digno. Ao conceituar a tal virada pictórica, Mitchell afirma-a como uma
“redescoberta da imagem como um complexo jogo entre visualidade, aparato,
instituições, discurso, corpos e figuratividade” (Mitchell, 1995: 16), de modo a ser um
princípio para que o visual seja tratado como modo de expressão legítimo e distinto
do textual, seguindo sua própria sintaxe, e que, portanto, requer métodos e
ferramentas de análise e entendimento próprios. Ainda que, afirma o autor, o
problema da representação pictórica exista há tempos, ele apresenta-se,
contemporaneamente, de modo urgente e incontornável.
12
I.2. Espaços Discursivos e Ideológicos das Imagens
9
Terry
Eagleton:
“projectar
a
sombra
da
ausência
do
real
sobre
a
percepção
de
sua
presença”; Althusser: “dualidade especular, espelho duplo”;
13
Posteriormente, Mitchell conceituará uma relação de “dupla consciência” no modo
como se percebe as imagens: há sempre uma postura oscilante entre a idolatria e a
iconoclastia, entre uma crença quase (ou, por vezes, completamente) mágica e um
ceticismo absoluto no poder das figuras. A crença, segundo o autor, é geralmente
atribuída ao “outro”: a criança, o primitivo, a massa inculta, o incapaz. A atitude
cética, esta sim seria algo do qual se deve orgulhar; no entanto, é tão ineficaz como
método de se perceber “o que as figuras querem” quanto sua equivalente ingênua.
pertencer
a
mais
de
uma
categoria,
“dependendo
das
práticas
sociais
e
narrativas
que
as
envolvem”
(Mitchell,
2005:188).
14
potencial de agressão e ofensa destas prováveis “vidas” das imagens , ao conjecturar
sobre a destruição das Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001 e do processo de
clonagem da ovelha Dolly em 1999, Mitchell dirá que “o imperativo moral é ofender
as próprias imagens, tratá-las como se fossem agentes humanos ou pelo menos
símbolos vivos do mal, e puni-las de acordo” (Ibid: 15). O atentado, segundo ele, é
contra o World Trade Center como imagem do capitalismo global; a imagem do
atentado é uma contra-agressão ao modo de vida que a construção representaria; a
figura dos aviões chocando-se contra os blocos de concreto e metal são, elas próprias,
ídolos. Supostamente, a declaração do compositor musical Karlheinz Stockhausen de
que as imagens do 11 de setembro eram a “maior obra-prima artística de Lúcifer de
sempre” foi deliberadamente reproduzida por um repórter que omitiu o trecho “de
Lúcifer”11 (Ibid: 17). Pode-se questionar se, afinal de contas, esta suposta omissão de
atribuição da dita obra-prima muda algo efectivamente; é possível que ambos os
modos da citação, com ou sem as palavras “de Lúcifer”, não comportem tanta
diferença entre si – há a obra-prima, a imagem, a transcendência do fato em si. Seria,
possivelmente, a indagação a que esta pesquisa fará adiante: a “aderência do real” à
fotografia é obra de “Lúcifer”?
conforme citado na referência bibliográfica apontada).
15
credível – não absoluto, mas em termos fiduciais, conforme abordado adiante. Um
caminho que, embora possa parecer espontâneo e natural, dada a popularidade da
fotografia tanto comercial quanto tida como hobby por parte da camada burguesa da
população nos séculos XIX e XX, é construído a partir de mecanismos ideológicos de
poder e status, cujo funcionamento numa dinâmica de dominação e subordinação, de
vigilância e apropriação, acontece de modo quase que hegemônico. Mecanismos que
implicarão nas categorizações de modos de fotografia amadores e profissionais, em
uma hierarquia de níveis de gosto e no desenvolvimento da dita fotografia
documental, cuja história é ponto crucial deste trabalho.
John Tagg dirá que “o fato de uma fotografia poder ser uma prova (em termos legais),
por exemplo, deve-se não a fatos naturais ou existenciais, mas a um processo social,
semiótico” (1993: 4). Processo semelhante será também o que determina as
hierarquias fotográficas, i.e., as categorias de operadores amador e profissional, a
fotografia instrumental, a artística, a comercial. Como o autor aponta, o equipamento
fotográfico tornou-se (e torna-se) amplamente disponível, mas maiores detalhes sobre
o processo, um conhecimento mais aprofundado, não. O aparelho e o processo
fotográfico são falhos, plenamente suscetíveis ao erro.
16
primeiros daguerreótipos,12 até o presente; o fato de uma fotografia, digital que seja,
adquirir status de prova jurídica e como prova de propriedade, sua presença em
documentos pessoais de identificação (passaportes, bilhetes de identidade, vistos de
estrangeiro), os estatutos da fotografia fine art, a fotografia do infrator no ato da
prisão, são todos exemplos de processos que nos parecem naturais, e, no entanto, têm
uma história longa e imbricada.
seguinte.
13
“Desde
a
segunda
metade
da
década
de
70
que
a
teoria
e
a
história
fotográfica
têm
tido
dois
alvos
principais:
Modernismo
e
positivismo.
Dentro
disto,
há
quatro
areas
principais:
o
modelo
da
fotografia
e
do
poder
social(…);
descontrucionismo
crítico(…);
crítica
sociológica
(…);
e
historicismo
liberal”
(Roberts,
1998:
4).
Enquanto
que
a
leitura
de
Tagg
pertence
à
primeira
área,
seu
extremo
oposto,
de
que
a
fotografia
é
constante
e
imutável,
pode
ser
visto
na
leitura
de
Szarkowsky,
por
exemplo.
17
ocidental, da modernidade em diante. Embora o princípio básico do acto fotográfico,
suas componentes técnicas e operacionais sejam rigorosamente as mesmas, a
apropriação é sempre local. Tagg acrescenta: “A fotografia como tal não tem
identidade. Seu status enquanto tecnologia varia de acordo com as relações de poder
que nela investem. (...)É uma intensa movimentação através de um campo de espaços
institucionais. É este campo que devemos estudar” (Tagg, 1993: 63). Seguindo o
mesmo raciocínio, David Campany acrescenta que “a definição de um medium,
particularmente a fotografia, não é autônoma ou auto-regulatória”, e será menos
estabelecida “pelo que é tecnologicamente do que culturalmente. A fotografia é o que
fazemos com ela. E o que fazemos com ela depende do que fazemos com outras
tecnologias da imagem” (apud Price, 2004: 75).
Criado para fornecer imagens para jornais, revistas ilustradas (que, à época, gozavam
de crescente popularidade), exposições itinerantes e instâncias governamentais, o
Farm Security Administration (FSA) era forte ferramenta de propaganda para
publicizar os resultados positivos do programa de recuperação de Roosevelt.
Participaram do projecto nomes que posteriormente tornariam-se célebres no contexto
da fotografia moderna norte-americana, como Walker Evans, Dorothea Lange e
Russell Lee. De acordo com os princípios de criação de oportunidades do New Deal, é
nessa época que surgem as primeiras oportunidades para fotógrafos afro-americanos e
18
do sexo feminino.
Os “assassinatos” relatados acima eram possíveis por conta das condições pelas quais
os profissionais aceitavam trabalhar para o governo americano: “(fotógrafos) não
eram donos dos negativos, e não tinham controlo sobre como as fotografias podiam
ser reenquadradas, seqüenciadas e legendadas – situação semelhante à de
fotojornalistas trabalhando para a imprensa” (Rosenblum, 2007: 369).
no
projecto,
que
convenceu
Stryker
de
que
“fotografias
de
registro
não
eram
suficientes
para
dramatizar
os
problemas
sociais,
era
preciso
utilizar
imagens
dinâmicas
e
vibrantes,
que
capturassem
a
essência
do
deslocamento
social”
(2007:
382).
19
escassez e traços indiciais de miséria; pode-se especular, entretanto, que o requisito
indispensável era que fossem imagens de, como se verá adiante nas palavras do
próprio Stryker, pessoas que “realmente acreditam nos Estados Unidos” – por mais
vaga que seja esta frase.
O arquivo produzido pelo FSA, não pode, portanto, ser considerado “uma obra e uma
coleção. Não a de um fotógrafo em particular, porém a obra coletiva de um grupo”,
nem tampouco um “amplo projeto cultural e político” (Rouillé, 2009: 107); é, sim, o
resultado das preferências particulares de Stryker, pautadas e definidas por um
programa ideológico maior, com objectivos de ordem claramente hegemônica, e
“revela em termos claros como o espaço negociado da sociedade civil sujeita o
indivíduo a certas restrições ideológicas e materiais das regras burguesas sobre a
vontade daquele indivíduo” (Roberts, 1998: 82). Os objectivos de outros programas
20
que tomaram lugar por volta dos anos de 1930 nos Estados Unidos e na Inglaterra15
podem até estar alinhados a interesses mais transparentes , buscando resultados “para
contribuir, com a fotografia, para constituir uma memória, para conquistar um
passado da América” (Rouillé, 2009: 107); os do FSA, seguramente e de acordo com
Tagg e Roberts, não:
fotos
mostravam
crianças
em
jornadas
de
trabalho
superiores
a
doze
horas
diárias
em
minas
e
fábricas.
21
cultura pós-guerra saturada pela mídia” (Roberts, 1998: 81). As mencionadas
instruções de Stryker aos fotógrafos e seu processo de seleção são ferramentas na
busca por tal consenso. O resultado final, i.e., as fotografias publicadas e amplamente
divulgadas, segundo Price, “convidam-nos a aceitar que estas são imagens ‘honestas’
da vida, mas também o produto de fotógrafos extremamente talentosos”, que também
aponta que “algumas das principais contradições do projecto social da fotografia
documental estão aqui presentes” no sentido que as imagens são tidas como
“históricas, mas atemporais; densamente codificadas, mas transparentes;
extremamente específicas, mas universais”; que acabam por ser fotografias
“(literalmente) dos despossuídos, cuidadosamente construídas para produzir um
significado que transcende o que é mostrado” (Price ed. Wells, 2004: 96, 97).
22
O arquivo fotográfico, para os fins mencionados acima, terá origem muito antes da
época do FSA e do New Deal, alimentado por este desejo de captura e ordenação do
Estado: a partir dos primeiros registros fotográficos de prisioneiros, feitos na Grã-
Bretanha nos anos 1860 – a manifestação de um desejo que Sekula identifica já existir
desde a década de 1840, “no contexto geral destes esforços sistemáticos de regular a
crescente presença urbana das ‘classes perigosas’, de um sub-proletariado diante do
desemprego crônico” (Sekula, 1986: 5).16 Entre 1852 e 1853, uma série de duzentas e
vinte fotografias de ciganos que perambulavam por território suíço constitui um
arquivo a partir do qual tentar-se-á, por meio da divulgação de suas imagens à polícia,
fazer com que os nômades fixem-se na capital Berna (Marien, 2011: 70). Lombardi
afirma que a policia de Paris, em 1871, utilizou fotografias “para identificar, perseguir
e executar os partidários das comunas que tinham sido capturados nas barricadas”
(Lombardi, 2007: 27).
16
Precisamente
na
época
em
que,
segundo
Foucault,
ocorre
o
‘nascimento
da
prisão’.
17
Condição
fundamental
dentro
do
pensamento
positivista
do
Século
XIX.
18
Pseudo‐ciência
que
apontava
o
estudo
da
estrutura
do
crânio
como
modo
de
determinar carácter e capacidade intelectual.
23
da identificação improvável – estima-se que, por volta de 1891, a polícia parisiense
tivesse colectado, ao longo dos dez últimos anos, cerca de cem mil fotografias
(Bertillon apud Sekulla, 1986: 26). Comparar os cerca de cem presos diários da época
na capital francesa com um arquivo de tais proporções era inviável.
24
indivíduos “adequados” e “inadequados” à sociedade, Galton buscava “visualizar a
prova genérica de leis hereditárias. Seus objectivos eram teóricos, o resultado de
curiosidades ecléticas mas unilaterais de um dos últimos cavalheiros-cientistas
amadores Vitorianos” (Sekula, 1986: 19).
Primo de Charles Darwin, Galton não seguiu o rigor científico de seu parente, e
desenvolveu teorias e métodos – eugênicos19 - sempre contaminados com convicções
político-ideológicas de ordem racista e segregadora.
Os casos acima relatados, como dito anteriormente, dizem respeito ao trajeto histórico
pelo qual o documento fotográfico vai-se legitimando e constituindo para além da
mera imagem técnica e sua indiscutível semelhança visual com o referente.
19
“Eugenia
pode
ser
vista
como
uma
tentativa
de
aproximar
a
média
social
inglesa
a
uma
Atenas
imaginária
e
perdida,
e
de
afastá‐la
de
uma
África
igualmente
imaginária
e
ameaçadora”
(Sekula,
1986:
44).
20
Rouillé:
“Na
realidade,
é
preciso
esclarecer
que
nem
todo
tipo
de
natureza
é,
de
imediato,
uma
paisagem;
que
o
gênero
artístico
da
‘paisagem’
não
aparece
espontaneamente
na
história
das
imagens;
e
que
nem
toda
imagem
de
paisagem
(natureza)
pertence
obrigatoriamente
à
categoria
estética
de
‘paisagem’”
(2009:112).
25
II. O (Pós) Moderno e a Fotografia
O dia 19 de agosto de 1839 é tido mundialmente como a data em que a fotografia foi
oficialmente apresentada à civilização. Louis-Jacques-Mandé Daguerre, inventor
francês, é, para os olhos do público da época, o grande responsável por gravar e fazer
permanecer imagens a partir da acção directa da luz em um suporte bidimensional,
utilizando-se de uma câmara escura munida de lente, uma chapa coberta de sais de
prata e de elementos químicos que serviriam para fazer a imagem surgir e fixar-se – o
processo posteriormente conhecido como revelação.21
polida.
A
chapa,
como
era
chamada,
era
colocada
com
o
lado
da
prata
para
baixo
sobre
uma
caixa
contendo
iodo.
Os
vapores
de
iodo
fundiam‐se
à
prata
para
criar
iodato
de
prata,
que
é
sensível
à
luz.
A
chapa
era
então
colocada
dentro
de
uma
câmara
escura
adaptada
e
exposta
à
luz.
(…)
A
chapa,
com
sua
imagem
latente,
era
então
posta
em
uma
caixa
e
exposta
a
vapores
de
mercúrio,
que
misturavam‐se
à
prata
para
produzir
uma
imagem
visível.
A
imagem
ainda
sensível
à
luz
era
então
lavada
em
uma
solução
de
cloreto
de
sódio,
que
interrompia
a
reacção
à
luz,
e
então
cuidadosamente
enxaguada
com
água”
(Marien,
2011:
14).
26
O aparelho necessário para capturar as imagens a partir da incidência da luz, e as
imagens subseqüentes, foram denominados, pelo próprio inventor, de daguerreótipos.
O encontro de agosto de 1839 é resultado, dentre outros factos, de um receio de
Daguerre de ter seu método de fotografar copiado, uma vez que não havia nada de
incrivelmente extraordinário nele - e este mesmo método já havia sido apresentado ao
público em janeiro daquele ano22 – além do interesse já mencionado por parte dos
ingleses de também eles serem conhecedores do processo fotográfico, muito por conta
de uma rivalidade histórica.
22
“Já
em
8
de
junho
de
1839,
o
jornal
inglês
The
Athenaeum
reclamava
que
‘não
passa
um
dia
sem
que
recebamos
cartas
sobre
uma
suposta
descoberta
ou
melhora
na
arte
do
desenho
fotogênico”
(Batchen,
1999:
38).
27
“Vós todos sabem, e alguns de vós senhores talvez já tenham tido a
oportunidade de convencerem-se do facto que, após quinze anos de
trabalho custoso e perserverante, o Sr. Daguerre obteve pleno êxito
em descobrir um processo capaz de fixar os diferentes objectos
reflectidos em uma câmara escura... O método do Sr. Daguerre é de
sua própria invenção, e é distinto do de seu predecessor, tanto em
seu procedimento quanto em seus efeitos” (Arago apud Batchen,
1999: 25).
Manifesta uma postura defensiva que parece uma tentativa de legitimar o processo de
Daguerre por uma suposta longa busca (quinze anos, alegadamente) e esforços
desmedidos. A declarada admissão da existência de um predecessor (Niepce) tenta
assegurar que, apesar de a ideia não ser original, todo o processo que a tornou viável
foi – e, consequentemente, a melhoria e o aprimoramento do que, apesar de prévio,
era, em sua opinião, falho e incapaz.
23
“Henry
Brougham
(Inglaterra,
1794),
Elizabeth
Fulhame
(Inglaterra,
1794),
Thomas
Wedgwood
(Inglaterra,
c.1800),
Anthony
Carlisle
(Inglaterra,
c.1800),
Humphry
Davy
(Inglaterra,
c.1801–1802),
Thomas
Young
(Inglaterra,
1803),
Nicéphore
and
Claude
Niépce
(França,
1814),
Samuel
Morse
(Estados
Unidos,
1821),
Louis
Daguerre
(França,
1824),
Eugène
Hubert
(França,
c.1828),
James
Wattles
(Estados
Unidos,
1832),
Hercules
Florence
(França/Brasil,
1832),
Richard
Habersham
(Estados
Unidos,
1832),
Henry
Fox
Talbot
(Inglaterra,
1833),
Philipp
Hoffmeister
(Germany,
1834),
Friedrich
Gerber
(Switzerland,
1836),
John
Draper
(United
States,
1836),
Vernon
Heath
(Inglaterra,
1837),
Hippolyte
Bayard
(França,
1837),
José
Ramos
Zapetti
(Espanha,
1837)”
(Batchen,
2002:
6).
28
“Considerando-se que o conhecimento dos químicos, assim como
dos princípios ópticos da fotografia, eram razoavelmente difundidos
após o experimento de Schulze24 (em 1725)... as circunstâncias
pelas quais a fotografia não fora inventada mais cedo permanecem o
grande mistério em sua história... Aparentemente, nunca ocorreu a
nenhum dos vários artistas dos séculos XVII e XVIII que utilizavam
frequentemente a câmara escura tentar fixar sua imagem
permanentemente” (Gernshein apud Batchen, 1999: 24).
Em 1833, o pintor inglês John Constable, sobre seu trabalho de pintura de paisagens:
“foi feita uma tentativa de aprisionar a aparência abrupta e fugidia do
CHIAR´OSCURO NA NATUREZA... proporcionar a ‘um breve momento capturado
do tempo passageiro’ uma existência sóbria e perene” (Constable apud Batchen,
2002: 13). Ainda, o poeta Samuel Taylor Coleridge, em 1817, ao tentar descrever seus
objectivos pela manifestação poética: “Criação mais do que pintura, ou, se pintura,
ainda tal, e com tal co-presença da imagem por completo exibida de súbito ao olho,
como o sol pinta em uma câmara escura” (Coleridge apud Batchen, 2002: 15).
24
Johan
Heinrich
Schulze,
em
1727,
tentou
repetir
um
experimento
alquimista
a
fim
de
produzir
matéria
luminescente.
Um
dos
elementos
da
experiência
estava
contaminado
com
prata,
produzindo,
dentre
outros
subprodutos,
carbonato
de
prata,
sensível
à
luz
(Newhall,
2009:
10).
Também,
os
experimentos
de
Carl
Wilhelm,
publicado
em
1777,
e
de
Jean
Senebier,
de
1782,
tratavam
da
transformação
da
prata
pela
luz
(Marien,
2011:
10).
29
Um clérigo, um pintor e um poeta (além de, claro, os vinte protofotógrafos
mencionados, e mais Daguerre), em um espaço de tempo pouco superior a cinqüenta
anos. Fica, então, explícito que a vontade (o “desejo”) de fotografar existe de forma
ampla, dentre variadas áreas de actuação e ofícios – não somente pelos meios
científico e artístico.
30
execução e pelos preços módicos” (Id: 16).
Freund faz a seguinte leitura das técnicas de retrato no período anterior ao surgimento
da fotografia:
Pela leitura de Rosenblum, a pressa e a falta de preparo artístico deste novo nicho de
31
mercado alimentavam a disseminação das imagens de produção rápida e fácil
compreensão:
Nos mesmos termos, Newhall afirma que “a classe média desejava retratos; aparelhos
mecânicos que eliminavam a necessidade de uma longa formação artística foram
disponibilizados, de modo que qualquer um poderia tornar-se um desenhista, se não
um artista” (Newhall, 2009: 11). Pode-se afirmar que começa, precisamente neste
momento em que as ferramentas técnicas facilitam de tal modo a elaboração de
representações visuais, uma resistência aristocrática à fotografia como forma legítima
de expressão artística.
De uma nova e ascendente classe social, capaz e desejosa de pagar para ser retratada,
e de um momento histórico em que amplamente manifesta-se o desejo de um modo de
congelamento imediato do tempo e do espaço, surgem, ao início do século XIX,
condições plenas de nascimento da fotografia, ao que Rouillé corrobora: “os lugares,
as datas, os usos, os dispositivos, os fatos: tudo comprova que a invenção da
fotografia se insere na dinâmica da sociedade industrial nascente” (Rouillé, 2009: 31).
Como suas bases científicas, como visto anteriormente, já eram conhecidas da
humanidade, as principais questões que permaneciam em aberto eram, sobretudo,
metodológicas. E, do grupo dos acima mencionados protofotógrafos, Joseph
Nicéphore Niépce é quem primeiro consegue estabelecer um método capaz de, além
de capturar uma imagem pela ação directa dos raios de luz, fazê-la permanecer.
32
causada pela luz em um papel coberto por cloreto de prata. Contudo, a qualidade da
imagem era péssima, e não havia modo eficaz de tornar a prata insensível à luz, i.e.,
de fixar a imagem (Marien, 2011: 10). Em 1826, finalmente, Niépce consegue
capturar uma imagem a partir do contacto com a luz, e, mais importante e inédito até
então, fazê-la permanecer, ao conseguir estabilizar o material depois da gravação da
imagem desejada. O inconveniente, a este ponto, era o longo tempo de exposição –
durou cerca de oito horas. A “chapa fotográfica”, feita de asfalto da Judéia, foi
posteriormente banhada em petróleo e óleo de lavanda, e exposta a vapores de iodo
(Id: 13). Este processo químico posterior – a hoje chamada revelação – inverteu os
tons da imagem, negativos em princípio, aumentou o contraste e assegurou sua
fixação.
33
para designar tanto o processo quanto as fotografias geradas por ele - , sobre seu
manuseio e sua condição de imagem, Batchen acrescenta que “a maioria dos
daguerreótipos foram feitos para serem vistos à mão, e seus tamanhos são
determinados de acordo”, mas que somente quando a imagem é removida de sua
moldura, somente quando “agimos de acordo com a demanda do objecto, é que
encontramos a verdadeira imagem dentro” e que ele (daguerreótipo) é
“simultaneamente um negativo e um positivo, então, para tornar-se legível enquanto
figura, a chapa prateada deve ser posta a um ângulo de quarenta e cinco graus da luz”
(Batchen, 2002: 61).
Ao saber dos resultados obtidos por Daguerre em seu país natal, do anúncio oficial da
suposta descoberta da fotografia em 19 de agosto de 1839 e da consagração de seu
25
Processo
de
reprodução
de
imagens
em
cores
feito
a
partir
do
contacto
de
uma
chapa
impressora
com
o
próprio
papel,
também
inventado
por
Florence,
semelhante
ao
mimeógrafo
(Turazzi,
2008:
20).
34
compatriota, Florence demonstra resignação e conformismo:
Acrescenta ainda, com o mesmo tom resignado, que havia iniciado seus experimentos
“sete anos antes de saber que havia outras pessoas desenvolvendo a mesma pesquisa,
e tendo mais sucesso do que eu”, e que “não irei disputar minha descoberta com
ninguém, porque duas pessoas podem ter a mesma ideia” (Florence apud Batchen,
1999: 45).
35
disputa identificado no capítulo anterior, a partir dos trabalhos de Tagg e Sekula, já
existe desde o nascimento da imagem fotográfica.
36
II.2. Fotografia, Documento e Modernidade
26
“You
press
the
button
–
we
do
the
rest”.
37
de produto, como a Hawkeye e a P.D.Q.27, já devidamente nomeada para este
mercado formado pela curiosa classe média, desejosa de fotografar de modo
confortável e descompromissado. Medeiros observa que “a vigilância do dia-a-dia
estava agora acessível a qualquer um a qualquer hora, permitindo captar o instante e
instituindo a recordação como uma das dimensões irreversíveis de um novo
quotidiano” (2008: 31).
27
Photography
Done
Quickly
–
Fotografia
feita
rapidamente.
28
Barthes
acrescenta
ainda:
“chamo
de
‘referente
fotográfico’,
não
a
coisa
facultativamente
real
a
que
remete
uma
imagem
ou
um
signo,
mas
a
coisa
necessariamente
real
que
foi
colocada
diante
da
objetiva,
sem
a
qual
não
haveria
fotografia.
(…)
Na
Fotografia
jamais
posso
negar
que
a
coisa
esteve
lá.
(…)
O
que
intencionalizo
em
uma
foto
não
é
nem
a
Arte,
nem
a
Comunicação,
é
a
Referência,
que
é
a
ordem
fundadora
da
fotografia”
(1984:
114,
115).
38
Desta relação com o real, do facto de “sempre trazer consigo seu referente”, Dubois
identificará a existência de três momentos históricos dos modos de representação do
real com a imagem fotográfica: dela como “espelho do real”, como “transformação do
real” e como “traço de um real”. O que interessará particularmente à presente
pesquisa são os dois primeiros momento, e, mais importante, a aparente relação entre
eles.
39
2009: 51). O corte fotográfico torna-se uma transcrição visual impensada, condenável
no campo da produção artística. É uma leitura, que, segundo Rouillé, “em termos
platônicos, Delacroix considera a pintura como uma cópia e a fotografia-documento
como um simulacro. Enquanto a primeira pode pretender à semelhança, a segunda
estaria irremediavelmente condenada à dessemelhança” (2009: 74).
Como visto, este momento histórico apontado por Dubois, o “discurso da mimese”,
identifica questionamentos acerca do status da fotografia em relação à produção
artística de então. Não há, no entanto, uma leitura neste instante de que seja o “real”
absoluto e imaculado que será representado pela imagem fotográfica, como pode
sugerir, em princípio, o termo “espelho do real”. A mimese, embora sugerida, não é –
nunca foi – dada como certa. Embora, como ver-se-á, surja o que se chamará de
fotografia-documento, com forte apelo de verossimilhança a um real, o inocente olho
que perceberá a imagem como o real espelhado, tal e qual, não existirá. Mesmo que a
fotografia funcione na forma de uma janela Albertiana enquanto modo de
representação, conforme visto no capítulo anterior, nunca funcionará conforme o
“ponto-a-ponto” anunciado por Mitchell. Mais coerente é o texto de Brecht apontado
40
por Benjamin, em que declara
41
A fotografia intitulada The Two Ways of Life, produzida pelo sueco Oscar Rejlander
em 1857, contou com dezesseis modelos – na imagem, aparecem vinte e uma pessoas
(Busselle, 1998: 34). Foi originada de trinta negativos distintos, “os quais ele
(Rejlander) mascarou para que encaixassem-se tal como um quebra-cabeças. (...) a
cópia final demorou seis semanas para ser feita” (Newhall, 2009: 74). A obra torna-se
exemplo clássico de uma fotografia que não reflete o real, um exemplo que, de facto,
depõe contra qualquer abordagem mimética do recém-criado suporte.
À mesma época, Fading Away, de Henry Peach Robinson, foi produzida a partir de
cinco negativos, simulando uma jovem adolescente em seu leito de morte. O jornal
Literary Gazette, quando da publicação da foto, escreve: “Olhe-a fixamente por um
minuto, e toda a realidade irá ‘esvaecer’ (fade away) enquanto que a maquilagem
chama mais e mais atenção para si” (Id: 76). Não é, no caso, a imagem fotográfica em
si que desperta a desconfiança, são elementos outros inseridos dentro de uma
realidade fotografada: a pose, a jovem atriz, a maquilagem. Contudo, é sobre a
fotografia que se deposita a dúvida: é o suporte o elemento enganador. Tal postura
ecoa a identificada por Mitchell, de que o imperativo moral é ofender as próprias
imagens, tais como, conforme mencionado anteriormente, seres humanos.
Estas informações, estes processos acima relatados, não eram secretos; as técnicas de
montagem utilizadas eram, de modo geral, conhecidas do público. Logo, por mais que
se pense em uma fotografia tida como mimética, abundam exemplos de desconstrução
desta crença. Como, então, estabelecer um caminho que leva a imagem fotográfica a
alcançar o estatuto de documento? Do tido como obrigatório processo de codificação
da fotografia, o que se verá é, por vezes, um paradoxo: por mais que se conheçam os
códigos, o apelo da imagem fotográfica ao real é intenso; e mesmo ao ignorar
processos de codificação e elaboração da imagem, a desconfiança surge.
42
ferramenta da ciência:
Pode-se concluir, então, que o caminho mencionado acima está mais próximo dos
traçados político-ideológicos identificados no capítulo anterior do que de uma
percepção geral por parte da sociedade; como já dito, se uma fotografia pode vir a
servir, hoje, como prova judicial, é por conta destes espaços de disputa referidos
anteriormente. Rouillé afirma que a imagem fotográfica depende, dentre outros
fatores, de um regime fiduciário29 para funcionar.
A frase de Rouillé, “foi renovando o regime da verdade, nutrindo a crença de que suas
imagens são ‘a exatidão, a verdade, a própria realidade’, que a fotografia pôde
suplantar o desenho e a gravura em suas funções documentais” (2009: 51), deve ser,
portanto, tomada com uma certa desconfiança; como o próprio autor dirá, a fotografia
“não se apóia somente em seu dispositivo técnico”: o contexto social de
“racionalidade instrumental”, de “urbanização”, de aproximação de fronteiras, de
“espírito do capitalismo” que criará novas formas de troca, além de uma recém-
surgida e incutida desconfiança nos modos de representação documental manual
existentes até então, tudo isto cimentará as bases para a legitimação da fotografia (Id:
51, 52). Contudo, se tomar-se como parâmetro o campo do retrato, pode-se dizer,
como já visto anteriormente, que o preço, a facilidade e rapidez na produção e a
possibilidade de se multiplicar tomaram parte na popularização do retrato fotográfico
tanto quanto sua semelhança com o sujeito representado.
29
Que
funciona
tendo
como
base
a
confiança,
a
fé.
43
subprodutos, o movimento impressionista, passa-se agora a uma tensão entre a
imagem fotográfica como documento de um real e como imagem codificada.
Conforme indica Rouillé, “em 1910, o V Congresso Internacional de Fotografia, em
Bruxelas, decidiu reservar o termo ‘documento’ somente às imagens que poderm ‘ser
utilizadas em estudos de naturezas diversas’” (Id: 61). Mais do que a relação com o
referente abordada por Barthes e que, segundo ele, define a fotografia, o que é
relevante na fotografia-documento é “alguma coisa palpável, material, preexistente, a
uma realidade desconhecida, em que se fixa com a finalidade de registar as pistas e
reproduzir fielmente a aparência”, que depende das “capacidades analógicas do
sistema óptico” e da “lógica de impressão do dispositivo químico” (Id: 62). É uma
conceituação baseada intensamente no princípio fotográfico de reprodução do
referente de modo mecânico somado a um outro, o de extensão do olho.
30
Em
termos
gerais.
31
Em
um
contexto
que
Hilton
Kramer
chamou
de
“feitiço
da
‘museumização’”,
ao
longo
da década de 1980 (Grundberg, 1999: 166).
44
contexto colonialista praticado pelos países anglo-saxões, ao passo em que as pinturas
registravam o exotismo da população colonial de modo possivelmente influenciado
por uma consciência civilizatória superior, “a fotografia alegava ser capaz de de criar
registros objectivos, ‘científicos’, livres do filtro da imaginação humana” (Price in
Wells, 2004: 83). A busca pelo ideal moderno da objectividade científica são, como
afirma Jill Loyd, assessorados pela “fotografia como medium e pela antropologia
como disciplina”, ajudando a mascarar “seus pontos de vista ideológicos e seu
potencial conotativo” (Loyd apud Price, 2004: 83).
À parte de uma utópica neutralidade ideológica imaginada por Grierson, que hoje
parece ser um inocente deslumbre alimentado por uma intensa influência socialista,
registra-se que, entre 1928 e 1939, foram produzidos na Inglaterra cerca de trezentos
documentários. A ideia de que o número é pequeno se considerar-se um período de
onze anos deve ser relativizada por conta da imensa competição com os filmes
produzidos em Hollywood, cuja indústria cinematográfica crescia exponencialmente à
época. Neste intervalo, Grierson esteve à frente da Empire Marketing Board, um
estúdio de produção documental que funcionou de 1930 a 1933, ano em que ele então
criou o General Post Office, nos moldes do estúdio anterior. (Id: 61).
45
desenvolvimento do documental no cinema, ajudando, assim, a solidificar o uso do
termo. Compartilhando das mesmas ideias e princípios quase que poéticos de seu
correspondente inglês, Vertov declara que seu Cine-olho trata da “possibilidade de
tornar visível o invisível, de iluminar a escuridão, de desmascarar o que está
mascarado, de transformar o que é encenado em não-encenado, de fazer da mentira a
verdade” (Vertov apud Lombardi, 2007: 33), de “ver os processos da vida em
qualquer ordem temporal ou em qualquer velocidade inacessível ao olho humano”
(apud Roberts, 1998: 24). Vertov acreditava, assim como Sergei Eisenstein,
Aleksander Rodchenko e El Lissitzky, que “a montagem representa a elaboração
activa do sujeito revolucionário e, assim, de um novo mundo” (Id: 20).
46
classificação: Price estabelece que a fotografia “documental está intimamente
associada a outros modos de fotografia, como de guerra, viagem e fotojornalismo”;
pode-se afirmar, portanto, que “não há linhas claras demarcando estes gêneros, nem é
possível encontrar descrições excludentes deles” (In Wells, 2004: 67). Sousa faz uma
tentativa de distinguir um fotojornalismo lato sensu, que incluiria o documental, de
um stricto sensu. Tem-se, por exemplo, que as atribuições dadas por ele ao
fotojornalismo em seu sentido restrito,
além de bastante amplas, não restringem nem acomodam de modo que se separe a
fotografia jornalística dos demais gêneros acima mencionados. Sua observação de que
uma possível distinção “reside mais na prática e no produto do que na finalidade” (Id:
Ibid.) quase que determina que é o suporte que fará a diferença: uma categoria é de
uso de jornais e periódicos; as outras, não. William Stott, em uma leitura de 1973,
propõe um modo absoluto de documental:
47
Posteriormente, após a segunda guerra mundial, as revistas ilustradas de grande
circulação provocaram uma profissionalização do documental no contexto do
jornalismo, “e começou seu curto caminho rumo à uma bem-sucedida incorporação
aos centros dominantes de poder burguês, radicalmente reestruturando a relação entre
cultura fotográfica e sua audiência no mundo pós-guerra” (Roberts, 1998: 71). As
revistas americanas Time, Look e Life, as francesas Paris/Match, Vu e Le Fígaro e as
inglesas Illustrated e Picture Post são os principais veículos em que o fotojornalismo
tem sua produção escoada. As verbas dedicadas à realização de fotorreportagens são
altíssimas – na edição de cinco de fevereiro de 1965, a cobertura do funeral de
Winston Churchill pela Life custou duzentos e cinqüenta mil dólares, e envolveu
dezessete fotógrafos e a transformação de um avião em redação do jornal com
laboratório de fotografia em seu interior. Os sete milhões de exemplares em
circulação foram distribuídos via aérea, e não terrestre, como de costume. Como
havia sido estabelecida a proibição de fotografar durante a cerimônia, os gastos para
que toda a operação permanecesse incógnita aumentaram significativamente o total
das despesas (Freund, 2002: 130, 131).
De uma crise provocada tanto pelos suntuosos valores acima apontados como pelo
surgimento da televisão, a fotografia passa a aproximar-se do campo da arte, tanto em
seu modo de expressão, tentando descolar-se da por vezes incômoda obrigatoriedade
de representação do referente, como em termos de mercado: “fotojornalistas tiveram
de encontrar novas saídas para seus trabalhos e novas estratégias de modo a continuar
suas actividades” (Price in Wells, 2004: 71). A partir de tal mudança e na busca das
ditas novas estratégias, buscando a inserção nos quadros da arte, Rouillé identifica um
cenário em que, “incessantemente, a arte dos fotógrafos ficou entre o fogo cruzado da
fotografia dos artistas, de um lado, e o do documento e da expressão fotográficas, do
outro” (2009: 235). Moholy-Nagy, já em 1925, declara que a disputa entre fotografia
e arte
48
Benjamin desenvolverá tal relação entre as ferramentas técnicas, o meio sócio-cultural
e o olhar. O trecho
É nos anos 1980 que, segundo Rouillé, ocorre finalmente a plena e controversa junção
entre a arte e a fotografia, já anunciada, como dito anteriormente, por Moholy-Nagy e
pelas fotomontagens e fotogramas dos anos 1920: “a arte-fotografia”, termo utilizado
pelo autor para identificar esta aliança, “rompe radicalmente com todas as práticas
artísticas anteriores, para apoiar-se no emprego da fotografia, enquanto confere à
fotografia um status original de material artístico” (Rouillé, 2009: 335). A
mencionada ruptura atinge primordialmente as práticas modernistas, como explicita
Rouillé ao abordar o trabalho do francês Christian Boltanski, figura representativa de
um movimento “que vai na contracorrente da concepção modernista segundo a qual o
artista deve purificar sua arte de todos os elementos emprestados, e dela extrair a
especificidade, a essência” (Id: 340).
49
da arte, “mal dissimulam a distância que as separam do mundo”; crise por uma
abundância de objectos visuais no cotidiano, cuja profundidade “mede-se por uma
falta” (Miranda, 2008: 44). É então que surge este novo produto híbrido, “para
preencher parcialmente o vazio deixado pela pintura; para restituir o impulso a um
certo mercado da arte; para salvar os principais valores do mundo da arte” (Rouillé,
2009: 350). Deste modo, a arte-fotografia “perfaz a representação (ao mesmo tempo,
leva-a a seu apogeu e acaba com ela), reduzindo-a a uma apresentação e
mecanizando-a” pelo aparato fotográfico; ela “desloca para os conceitos as
finalidades do projecto estético da realidade”, e “transfere a fabricação das imagens
da mão do artista para uma máquina” (Id: 342).
Lê-se, assim, que a aceitação de um suporte sempre tido como maldito pelo campo da
arte é, de facto uma conveniência – e para ambos os lados. Como bem resume
Rouillé, “melhor um quase-objeto de arte (de material fotográfico) do que nenhum
objeto” (Id: 351).
50
III. Fotografia Documental, Benditos e a Contemporaneidade
51
criar um visual desconcertante” (Id: 174). Sobre o que se reconhece como os
chamados novos paradigmas, e os métodos pelos quais são alcançados –
especificamente no caso de Santana –, falar-se-á adiante. Por ora, deve-se dizer que o
caminho percorrido por este grupo é consonante com a trajectória da fotografia
documental descrita neste trabalho, de uma actividade ligada à area do jornalismo, da
profissionalização do fotógrafo e de sua inserção no mercado ligado às artes visuais.
52
partir de então, não houve questionamentos. Não era o único
exemplo do tipo, senão vários outros. Nem os protestos do senhorio
nem os apelos dos moradores ‘foram’ à face da prova da câmera, e
eu fiquei satisfeito” (Riis apud Price, 2004: 78)
Dois dos traços característicos da fotografia documental desde os tempos de Riis são,
notadamente, a espontaneidade do acto fotográfico e uma não-interferência: a
chamada candid photo, um modo de fotografia “não posada e não protocolar” (Sousa,
2004: 74), e a straight photo, a “fotografia ‘pura’ que recorria unicamente aos meios
fotográficos (enquadramento, luz...) para gerar sentido, recusando os procedimentos
‘artísticos’ – como os pictóricos –, avaliados como supérfluos” (Id: 63). Pelos
preceitos modernistas já relacionados anteriormente, é desta forma que a fotografia
deve agir, para o bem da humanidade e por objectivos maiores.
53
transformando a concepção naturalista da fotografia como transcrição neutral das
aparências no seu exacto oposto” (2008: 183). A encenação, como já exemplificado
anteriormente, está presente na fotografia desde seu surgimento; sua reaparição em
forma de uma expressiva ‘escola’ artístico-fotográfica, no entanto, é o que chama a
atenção. Para Roberts, as produções fotográficas de Wall são
54
(Charles Baudelaire), um espaço de hiperestimulação dos sentidos
(Georg Simmel), ou de interiorização de experiências de choque
(Walter Benjamin). Combinando movimento e observação,
proximidade e distanciamento, o fotógrafo de rua foi
frequentemente apresentado (muitas vezes por críticos apressados)
como o equivalente do flâneur, o tipo que Benjamin apresentou
como o supremo habitante da grande cidade” (Jacobs in Medeiros,
174).
Seus adeptos costumam utilizar dois conceitos desenvolvidos por Henri Cartier-
Bresson: o de invisibilidade, no qual o fotógrafo tinha de permanecer incógnito e
passar pelas cenas sempre o mais despercebidamente possível, e o de momento
decisivo, em que determinava-se que a imagem devia ser capturada no instante único
no qual todos os componentes visuais apresentavam-se absolutamente harmônicos e
que, somada a esta hamonia visual, a carga de informação contextual necessária
estaria presente: “o fotojornalista deveria, ao fotografar, esperar pelo instante em que
os elementos compositivos da fotografia se congregassem na imagem de forma a
gerar o sentido pretendido” para que, quando chegasse ao espectador, “a imagem,
tanto quanto possível, fosse eloqüente, fosse expressiva por ela própria” (Sousa, 2004:
88). A espera pelo momento crucial, de acordo com o próprio Cartier-Bresson, “podia
às vezes ser de segundos; podia também ser de horas ou dias. Mas não há um plano
padrão, um modelo pelo qual se guiar” (Cartier-Bresson, 1999: 24). E complementa:
“Eu andava o dia inteiro, a mente tensa, buscando nas ruas tirar ao vivo fotos como
flagrantes delitos. Eu tinha, principalmente, o desejo de captar numa só imagem o
essencial de uma cena que surgisse” (apud Soulages, 2010: 39, 40). É curiosa, ainda,
sua observação sobre a ainda em sua época rivalidade entre fotografia e pintura: “nós
(fotógrafos) atingimos uma coisa menos permanente que os pintores” (Soulages,
2010: 43).
55
escutá-lo sem refletir: nada de instante decisivo, evidentemente, para essas paisagens!
Cartier-Bresson é cartesiano quando não fabula” (Id: 39-41). À observação citada
anteriormente sobre a relação pintura-fotografia, Soulages identifica a situação
paradoxal na qual a heroína central de sua fábula não é a fotografia, mas a pintura: seu
suporte de escolha de manifestação pessoal é sempre uma arte menor em comparação
com outro modo de expressão, superior, mais nobre – faz parte da fantasia pensar
assim.
Passa-se, portanto, a um outro modelo de fotografia urbana, em que não mais são
retratados encontros espontâneos, situações inusitadas e cenas curiosas do cotidiano:
56
“em contraste com o culto do instante irrepetível da fotografia urbana, toda a
dimensão particular é banida e a cidade é submetida a um princípio de seriação,
indiferente a pontos específicos” (Id: 175), rumo às áreas periféricas, os subúrbios.
Novamente, o trabalho de Wall é lembrado, e a fotografia é o registro de uma
performance, i.e., passa a conter elementos de outros media, e como resultado de uma
manipulação digital – actores fotografados em estúdio e posteriormente inseridos em
outras fotos fora do estúdio33. O argumento de Cartier-Bresson contra a encenação é
precisamente a perda da identidade fotográfica e da mistura com outra forma de
expressão: em uma das quatro exigências que Soulages identifica como as
conseqüências prático-estéticas da fábula, uma determina que é dever do fotógrafo
“nunca encenar, senão não se trata mais de fotografia, mas de teatro” (Soulages, 2010:
46).
33
Procedimento
que,
junto
à
fotocolagem,
vem
também
a
descaracterizar
o
pensamento
de
Dubois,
que
estabelece
que
“no
espaço
literalmente
talhado
de
uma
vez
e
ao
vivo
pelo
ato
fotográfico,
haja
ou
não
encenação,
tudo
acontece
por
inteiro
de
uma
só
vez”
(Dubois,
1994:
178).
57
(Lombardi, 2007: 39).
Da análise estética para uma que trata da metodologia de criação, Roberts afirma que
o processo de digitalização sai “menos favorecido entre aqueles fotógrafos que vêem
esta figuração ‘artística’ como mais uma diminuição da relação primária da fotografia
com o evento”, e declara que, mesmo sendo extremamente circunscrito, “este não é
um regresso à prática documental concebida de forma tradicional”, mas, na verdade,
“uma fotografia do evento na qual o evento é deslocado das suas condições de
proximidade. Com efeito, podemos afirmar que essa é uma fotografia do evento
depois-do-evento” (2008: 183). O momento decisivo passa, portanto, a não mais
existir – as imagens são na verdade posteriores a este momento, desde os trabalhos de
Alexander Gardner e Charles Marville, possíveis precursores desta prática, até as
obras de Richard Misrach e Joel Meyerowitz. Para além de uma reinserção dos
métodos da tradicional fotografia modernista, a captura do pós-momento decisivo
envolve uma tentativa de reposicionamento de sua relação com o evento, em busca de
uma nova função documental: “num mundo de imagens difusas e mutáveis, de
instantâneos digitais, a fotografia só pode chegar – e só deve chegar – atrasada”, para
ser “mais potente e vívida quando reclama o restabelecimento do compromisso com
58
os efeitos destemporalizadores da experiência estética (...) e não com as
descontinuidades e contigências do ‘evento singular’” (Id: 184, 185). O autor
denomina este “atraso” da fotografia, este aspecto tardio da recente produção
fotográfica, de evento-como-rescaldo.
Por fim, Roberts indaga a que modelo artístico deve a fotografia alinhar-se de modo a
articular uma reacção à renúncia a uma mais antiga cultura documental:
Roberts afirma que, durante os anos 1920 e 30, o uso do fotolivro constituía uma
estratégia simultaneamente política e formal: “ao recusar separar a forma verídica da
recepção artística, um realismo do evento e um modernismo da forma eram vistos
59
como independentes e, por isso, serviam como forma exemplar de politização
cultural” (2008: 187). Apesar de passar por um “eclipse histórico”, o fotolivro é tido
como formato que garante a perenidade da obra fotográfica, mesmo os de tiragem
reduzida, produzidos quase que artesanalmente. É de fácil circulação, e de longa vida
útil. Seu formato permite, ainda, que o conteúdo “veredictório” seja transportado “de
forma não-mediada para a sua audiência. Nas condições políticas em que o luto pelo
evento perdido da fotografia e a crise da indexicalidade fotográfica se conjugam, e,
como tal, são levadas a representar o fim do fotodocumento”, Roberts enfatiza que é
importante que isto seja lembrado (Id: Ibid).
60
III.2. Benditos
A leitura é corroborada pelo próprio fotógrafo, que afirma ter desenvolvido interesse
pela expressão visual “por conviver com esse universo visualmente tão forte”, e
acrescenta, definindo tal universo: “Por que lá, realmente, é um celeiro de cultura
popular, arte popular, grupos folclóricos. Sem falar na questão da religiosidade, das
romarias em si. É uma coisa muito rica, e isso influenciou muito na minha infância”
(Santana apud Alencastro, 2007).
61
outro: “em relação ao Benditos, é quase que ser como um romeiro. Dividir com eles
aquele momento. A partir daí, as coisas acontecem. A fotografia vem quase que como
uma conseqüência disso” (apud Alencastro, 2007).
35
“O
sujeito
que
posa
é
assombrado
por
todos
os
fantasmas
de
uma
presença,
incerta
para ele próprio, flutuante, ainda virtual” (Dubois, 1994: 228).
62
fotografado é roubada, de uma camada corporal que se esvai a cada clique36: crenças,
segundo o autor, que estão distantes de serem “simplesmente a(s) das sociedades
tradicionais, ditas ‘primitivas’. Seria antes o que há de mais primário, ou seja, de mais
essencial à fotografia” (Id: 222). Medeiros identifica, ao mesmo tempo em que o
positivismo e o cientismo afirmavam-se, é que a fotografia era também “objecto de
materialização e prova nos círculos espíritas, a partir dos anos (18)60 e até ao início
do século XX”, estabelecendo uma relação entre imagem fotográfica e espírito que
“oscilava entre uma recepção dramática e séria e uma outra, mais lúdica e
conscientemente manipulativa, que culminaria na invenção fotográfica de fadas e
outros objectos não acessíveis por uma pecepção sensorial” (Medeiros, 2008: 28).
36
A
ideia
de
corpo
humana
como
uma
cebola:
“Segundo
Balzac
(…),
cada
corpo
na
natureza
é
composto
de
séries
de
espectros
em
camadas
sobrepostas
ao
infinito
(…)
E,
é
claro,
cada
operação
daguerriana,
cada
fotografia
vem
surpreender,
destacar
e
reter
aplicando‐se
nela
uma
das
camadas
do
corpo
revelado”
(Nadar
apud
Dubois,
2004:
227,
228).
63
Sobre o ensaio de Barthes, Medeiros acrescenta que “se o (não) pensamento da Morte
na cultura contemporânea é esse ‘segredo público’, não admira que o seu autor acabe
por atacar a origem deste texto, uma antiga imagem de sua mãe, libertando, em parte,
o ‘não-dito’” (Medeiros, 2008: 37). Esta imagem, que Barthes acaba por não mostrar,
é a morte duas vezes: uma pela fotografia, uma pelo aspecto biológico, uma vez que
ela – mãe – de facto morreu.
A fotografia dos mortos, durante seu velório, como uma última lembrança, uma
última imagem daquele corpo, mesmo que sem vida, é prática comum ainda hoje -
inclusive em Juazeiro do Norte. 37 Disdéri declara ser adepto da prática em 1885, não
sem desgosto: “fizemos uma multidão de retratos após o falecimento; mas
confessamos com franqueza, com uma certa repugnância”, e discorre sobre a técnica
mais adequada, fazendo a recomendação que “lhe deixassem os olhos abertos, (…)
aguardamos sete a oito horas. Dessa maneira, conseguimos captar o momento em que,
tendo as contrações da agonia desaparecido, era-nos possível reproduzir uma
aparência de vida” (Disdéri apud Dubois, 1994: 231). Publicadas no British Journal
of Photography de julho de 1873, as instruções abaixo são ainda mais específicas:
Uma maquilhagem para dar aspecto de vida. Medeiros também identifica o paradoxo
entre tal resultado, ou pelo menos a busca dele, e a situação oposta, i.e., os vivos que,
ao serem fotografados, parecem mortos: “Devido à longa exposição, a rigidez a que
37
Titus
Riedl,
pesquisador
alemão
radicado
no
Ceará,
tem
a
pesquisa
sobre
imagens
de
cadáveres
no
ato
de
seus
velórios,
realizada
entre
1999
e
2001.
Ver:
Riedl,
Titus.
Últimas
lembranças.
Annablume:
São
Paulo,
2002.
64
eram forçados os retratados dava-lhes no final um estranho ou macabre ar de
esquifes” (Medeiros, 2008: 29).
Nas imagens de Benditos, a morte é bastante presente na fé, na lembrança dos finados
que estão no céu cristão, pelos actos e gestos registrados. Ela nunca aparece
literalmente, mas sempre implícita – ou, pelo menos em princípio, dado que, como se
viu, há sempre a possibilidade de se fotografar os mortos com seus olhos abertos –
cria-se, assim, uma dubiedade. Há várias figuras humanas retratadas de modo
peculiar, assombroso, assustador: tais figuras poderiam ser imagens não de mortos,
mas da morte, de seres fantasiosos ligados a ela. As inúmeras cruzes – símbolo maior
do cristianismo – retratadas dão uma dimensão quase que surreal às fotografias, pela
repetição, pelo excesso e pela plástica. Muitas delas, marcando os túmulos, são
incontestáveis símbolos (e índices) da morte.
38
Que
necessita
de
pouca
luz
para
graver
uma
imagem
fotográfica
tecnicamente
adequada, próxima dos índices técnicos de uma exposição tida como ideal.
65
bastante iluminados – as fotografias de interiores, em espaços de pouca luminosidade
ou à noite encontram-se em menor quantidade –, pode-se portanto concluir que a
inserção do grão é proposital, deliberada, uma escolha estética; Mitchell, ao analisar o
ensaio de Robert Frank The Americans, percebe em sua também vasta granulação
uma tentativa do fotógrafo de “buscar um padrão visual no mundo que servisse como
resposta às características materiais e ópticas de seu medium” (Mitchell, 2005: 285).
A textura granular, também, distancia ainda mais do que se percebe a olho nu: dentro
de um contexto de reprodução mecânica da realidade, surge um novo elemento, antes
inexistente.
66
muda: ponho-me a posar, fabrico-me instantaneamente um outro corpo,
metamorfoseio-o antecipadamente em imagem” (1984: 22). Os cortes bruscos de
Santana quebram qualquer tentativa de fazer-se imagem – não se sabe, não se imagina
nada próximo do enquadramento de facto. A lente do tipo grande-angular, que
proporciona amplo campo de visão, cede apenas uma remota noção do que o
fotograma compreenderá. São os cortes, segundo Dubois, que determinam, na
fotografia, o que pertence ao campo e o que está fora-de-campo: “qualquer fotografia,
pela visão parcial que nos apresenta, duplica-se assim necessariamente de uma
presença invisível, de uma exterioridade de princípio, significada pelo próprio gesto
de recorte que o ato fotográfico implica” (1994: 180).
Para além do corte das bordas, há muito presente nas imagens de Benditos espaços
que, em princípio, não estão contidos dentro do corte inicial. Este recurso, chamado
por Dubois de fora-de-campo por cenário, é amplamente utilizado por Santana.
“Tudo o que pode indicar ou introduzir dentro do espaço homogêneo e fechado do
campo fragmentos de outros espaços, em princípio contíguos e mais ou menos
exteriores ao espaço principal” (Id: 187): são espelhos, janelas, reflexos, vãos, portas,
e outros de difícil distinção, fazendo referência a um outro espaço dentro do espaço
inicial. Outras cenas que estão sempre contidas, em um universo espaço-temporal
cujo procedimento é sempre conter: a fracção de tempo determinada pelo obturador, e
o recorte espacial estabelecido pelo visor.
67
Ainda, o grotesco como categoria estética tem suas idas e vindas, seus altos
momentos e instantes de discrição - sua proliferação é inconstante. Storr aponta que
seu (res)surgimento acontece em épocas em que a esterilidade toma conta dos estilos-
padrão de expressão artística. Passando pela situação de crise já mencionada
anteriormente, o mundo-imagem produz férteis condições para um novo momento em
que o grotesco possa retomar seu selvagem e desordenado crescimento. A chamada
ruína da perfeição.
Por fim, Benditos é repleto de momentos decisivos: são mãos que sobem à face,
expressões corporais estranhas – que conduzem ao grotesco –, interacções
improváveis, momentos que beiram o surrealismo. O olho de Santana funciona de
modo semelhante ao de Cartier-Bresson, induzindo o dedo ao clique no instante
preciso em que o inusitado surge.
68
identifica são sucessões de modos de ver que tendem a apresentar uma quebra, uma
ruptura com o modo anterior, como se sair de um momento em que, ao invés de
romper com seu(s) predecessor(es), funciona a partir de um princípio de conciliação?
A pergunta de Foster, “como uma reconexão com um hábito (artístico) passado apoia
uma desconexão de um hábito presente e/ou o desenvolvimento de um novo?” (1996:
x), é crucial para este entendimento.
Conclusão
69
Após uma longa, mas necessária, recapitulação de alguns pontos da história da
fotografia – de seu início ao presente, de perspectivas de relação com o real ao
instante da transformação da imagem-documento para a imagem-arte, e para o híbrido
imagem-arte-documento, sempre ao avaliar factores sociais, culturais, políticos e
ideológicos que sempre circundam a imagem fotográfica – o que se percebe é que a
obra apresentada como amostra de um olhar característico da contemporaneidade, na
verdade, é produzida por um modo muito semelhante a diversas outras que
representam a época moderna da fotografia. O método de trabalho, o material
utilizado, os procedimentos do acto fotográfico, o suporte fotográfico escolhido, as
técnicas de pós-produção – todos estes elementos já são utilizados há tempos, desde o
princípio do século XX.
Não é paradoxal. O facto de Santana utilizar tais ferramentas para produzir Benditos –
e a continuar a utilizá-las, ainda onze anos após sua publicação – é essencial para que
se perceba que, na contemporaneidade fotográfica, há essencialmente duas questões:
uma é a diversidade de materiais fotográficos a serem utilizados (câmeras digitais,
backs digitais, câmeras de médio e grande formato, lentes das distâncias focais mais
diversas, lentes de plástico, câmeras de plástico, modelos de daguerreótipos
semelhantes aos comercializados no século XIX, etc.), que, em princípio, geram os
mesmos tipos de imagens de sempre. A outra questão é que não há, nunca houve,
produção artística sem referência no passado; a história da arte – não a área de estudo,
tão acusada pela cultura visual, mas a cronologia da arte – está recheada de exemplos
em que uma ruptura representa, na verdade, um retorno.
70
experimentalismo, é esse aqui (apontando para uma de suas fotos), no
enquadramento39”.
O assunto está longe de ser esgotado; esta pesquisa é somente uma modesta
contribuição para que, em primeiro lugar, e sobretudo, atente-se para – como diria
Mitchell – a incontornável questão das imagens em nossas vidas. Uma pedagogia da
imagem, já há muito, é necessária. Não nos termos actuais em que ela é apresentada
como complemento ao texto, mas como uma linguagem que é autônoma, tem sintaxe
própria, funções e propósitos característicos.
A segunda contribuição esperada diz respeito ao tempo. Em uma época em que exige-
se sobretudo imediaticidade, observar que as coisas, de modo geral, precisam de
tempo para amadurecer é reconfortante. A caracterização de um modo de ver
contemporâneo, certamente, demorará mais tempo ainda até – se um dia – ser
concluída.
39
Entrevista
com
o
autor.
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