As - Loucuras Raciocinantes - O Delirio de Interpretaçâo 1,2
As - Loucuras Raciocinantes - O Delirio de Interpretaçâo 1,2
As - Loucuras Raciocinantes - O Delirio de Interpretaçâo 1,2
, X, 2, 340-345
As "loucuras raciocinantes".
1,2
O delirio de interpretaçâo
R Sérieux e J. Capgras
Introduçâo
se: o coçar a cabeça, o esfregar as mâos, uma mulher que levanta sua saia. À noite
fazem ranger portas e janelas com a intençâo premeditada de lhe tirar todo o sono.
Ele recebe catálogos de aparelhos ortopédicos: como avisar mais claramente que
querem aleijá-lo? Por que as pessoas obstinam-se em permanecer agrupadas dian-
te de uma banca de jornal: é para lhe esconder um artigo, uma imagem que o in-
téressa. Trabalho inútil! A imprensa, repleta de alusôes sobre sua pessoa, sob
pseudónimos revelam seu passado e seu destino; as ilustraçôes reproduzem seu
retrato; chegam até aos anuncios que falam dele! Ele conheceu as aclamaçôes do
povo, a tropa lhe rende honras, um ministro inclinou-se diante dele, uma grande
dama o olhou com olhar maternal: houve uma troca de filho. Nega-nos em vâo
sua verdadeira origem; é preciso render-se à evidencia.
Os fatos clínicos, percebidos na Franca por alguns observadores, que
correspondem ao delirio de interpretaçâo permanecem dispersos em grupos
nosológicos diversos, segundo a predominancia de determinado síntoma. Constata-
se - ou acredita-se constatar - a existencia de perturbaçôes sensorials que sâo
classificadas nos delirios de sistematizaçôes alucinatórias. Se sobrevêm reaçôes
agressivas, reivindicaçôes obstinadas, diagnostica-se "loucura de perseguidos-
perseguidores". Enfim, atribui-se à degenerescencia mental os casos nos quais nao
se pode contestar a originalidade.
Ora, se é legítimo considerar os interpretadores desequilibrados, nao é menos
verdade que eles constituem um grupo homogéneo, merecendo um lugar
diferenciado na multidâo proteiforme dos degenerados. Eles devem ser
radicalmente separados dos delirantes alucinados. Quanto à loucura dos
perseguidos-perseguidores, os casos que na realidade sâo dispares estâo reunidos
arbitrariamente, devido à analogía de reaçôes. Entre outros tipos heterogéneos,
essa loucura incluí alguns interpretadores: aqueles que, prontos para o ataque, nao
cessam de perseguir seus pretensos inimigos; - deixando de lado os
interpretadores resignados, sem reaçôes agressivas. Esses desequilibrados
englobam aínda os que, sem a imposiçâo de uma idéia obsédante, empregam toda
sua inteligencia e toda sua atividade anormal, nâo para a construçâo de um
romance delirante, mas para a satisfaçâo de sua paixâo mórbida. A esses últimos
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reservamos o nome de "reivindicadores" {delirio de reivindicaçâo).
3. É nessas duas especies clínicas: delirio de interpretaçâo e delirio de reivindicaçâo, que convém
circunscrever a "Paranoia". Coloca-se assim em evidencia as afinidades nosológicas dessas
perturbaçôes e aínda se permanece de acordó com a etimología do vocábulo que indica nâo uma
aboliçâo ou uma diminuiçâo da atividade psíquica, mas um desvio das faculdades intelectuais,
uma perversâo: de alguma forma a paranoia é para o estado normal o que o paradoxo é em relaçâo
à verdade.
CLÁSSICOS DA
PSICOPATOLOGIA
ano X, n. 2, ¡un/2007
4. Esse trabalho apóia-se em cerca de sessenta observaçôes, das quais mais ou menos quarenta
sâo pessoais, seguidas durante varios anos, freqüentemente dez anos e algumas vezes até vinte
anos. Devemos seis casos à cortesía do professor Régis a quem agradecemos profundamente.
Nâo pudemos publicar mais que vinte casos, dos quais varios estâo resumidos e somente alguns
estâo detalhados. Notemos finalmente que para evitar repetiçôes, nâo assinalaremos em cada
observaçâo a ausencia de perturbaçôes sensorials: sempre pesquisamos com cuidado as
alucinaçôes, mesmo quando esse ponto nâo estiver mencionado de forma explícita.
As indicaçôes bibliográficas estâo reunidas, em sua maior parte, no capítulo VII (histórico).