Quem Tem Medo Das Professoras Negras PDF
Quem Tem Medo Das Professoras Negras PDF
Quem Tem Medo Das Professoras Negras PDF
Professora da Escola José Pedro Varela (RJ) em sala de aula. No quadro negro, pode-se observar a data: 08/10/1923.
Fonte: Museu AfroDigital.
Não vou me demorar em responder a pergunta que intitula o presente texto, visto
que a própria História da Educação não hesitou em apontar os homens e as mulheres
brancas enquanto temerosas à ascensão profissional de professoras negras. No século
XIX, quando a educação foi utilizada para pavimentar o projeto nacional de civilização e
progresso brasileiro, foram criadas as primeiras Escolas Normais para a formação de
professores, as quais eram majoritariamente compostas por homens. Ainda naquele
período era possível notar a forte presença de homens negros atuando nas escolas
profissionais e como diretor escolar (DÁVILA, 2006), entretanto, no inicio do século XX, “o
número de homens de cor envolvidos no ensino público diminuiu, seguido por um
decréscimo no número de mulheres de cor, até que a década de 1930 e 1940 a
Revista África e Africanidades - Ano 8 – n. 20 , jul. 2015 – ISSN 1983-2354
www.africaeafricanidades.com.br
Revista África e Africanidades - Ano 8 – n. 20 , jul. 2015 – ISSN 1983-2354
www.africaeafricanidades.com.br
principais responsáveis pela alfabetização das crianças: Dona Cleonice, que ainda hoje
tem uma escola, com infraestrutura totalmente fora dos parâmetros nacionais de
qualidade estabelecidos pelo MEC, mas que para algumas mães do bairro ainda é
alternativa frente ao processo de expulsão dos seus filhos da rede pública de ensino.
Pode-se registrar outras educadoras do bairro como, por exemplo, Luh, Cleusa e
Val, as quais mantêm uma Banca (reforço escolar) em suas próprias casas. A falecida
Dona Dasdores, também fora uma figura importante na alfabetização das crianças. Mas
Dona Adelaide, a temida professora que dava bolo (palmatória) e colocava no castigo do
sapo quem errasse a tarefa, foi a responsável pela alfabetização da maioria das crianças
da comunidade.
Essas mulheres tiveram papel importante na educação das crianças da
comunidade, tendo em vista que a definição da educação como direito subjetivo, em que
se garante acesso ao ensino gratuito e obrigatório, e a expansão da educação, são
políticas educacionais recentes, data da constituição de 1988. Antes disso, as varandas e
quintais das senhoras, pelo menos nos bairros periféricos de Salvador, foram os principais
locais de educação. As histórias dessas mulheres precisam ser resgatadas, contadas e
registradas. Essa pesquisa será realizada em outro momento.
Como havia mencionado, neste breve texto não tenho pretensão de iniciar uma
discussão aprofundada sobre a presença/ausência de mulheres negras no magistério,
algumas pesquisas cumpriram esse propósito. Vale a pena ler o livro “Cor e Magistério”
organizado por Iolanda Oliveira e o livro “A cor da Escola” de Maria Lúcia Rodrigues
Müller.
Certa vez fui provocada com uma crítica sobre o ingresso de mulheres negras em
curso de menor prestígio social, na perspectiva do provocador, os negros precisam
ingressar em cursos de maior prestígio social, como, por exemplo, Direito, Medicina,
Engenharias etc. Considero um importante ponto de problematização, tendo em vista o
cenário educacional, todavia vale ponderar que tal crítica pode deslegitimar a luta
histórica e protagonismo de mulheres negras pelos espaços educacionais, como fizeram
as Rosas Negras, Antonieta de Barros, Tereza Santos, as mães de Santos e muitas
outras anônimas.
Sim, o curso de Pedagogia é atravessado por muitos problemas políticos,
estruturais e epistemológicos, e as observações são provocações válidas, pois têm a
intenção de instigar as meninas negras a criarem diferentes estratégias para melhor
Revista África e Africanidades - Ano 8 – n. 20 , jul. 2015 – ISSN 1983-2354
www.africaeafricanidades.com.br
Revista África e Africanidades - Ano 8 – n. 20 , jul. 2015 – ISSN 1983-2354
www.africaeafricanidades.com.br
Tais críticas têm forte cunho racial e são direcionadas a estudantes negros/as,
principalmente mulheres negras, visto o crescente acesso dessas mulheres no ensino
superior, provocado, também, pelas políticas de Ações Afirmativas.
Entretanto, apesar de observarmos uma mudança na composição das
universidades públicas, no que concerne a atuação em escolas da educação básica ao
ensino superior, o perfil docente no Brasil é majoritariamente branco, e as assimetrias
raciais tornam-se mais acentuadas à medida que se aumenta os níveis de escolaridade,
ou seja, na educação infantil identifica-se um número expressivo (mas ainda é menor que
o número de professoras brancas) de professoras negras atuando, no entanto, esse
contingente mina quando se analisa o ensino superior que tem expressivamente a
presença de homens e mulheres brancas.
Os reflexos do projeto político de branqueamento da profissão docente do século
XX podem ser identificados por meio dos dados do Censo da Educação Básica e numa
breve observação dos bancos das salas de aulas e departamentos universitários. E mais,
a política de branqueamento projetada no século XX não repercutiu apenas no perfil do
professorado, os currículos escolares são eugênicos e eurocêntricos.
1
Sinopses Estatísticas da Educação Básica- Sinopse do Professor http://portal.inep.gov.br/basica-censo-
escolar-sinopse-sinopse.
Revista África e Africanidades - Ano 8 – n. 20 , jul. 2015 – ISSN 1983-2354
www.africaeafricanidades.com.br
Revista África e Africanidades - Ano 8 – n. 20 , jul. 2015 – ISSN 1983-2354
www.africaeafricanidades.com.br
Referências
DÁVILA, Jerry. Diploma de brancura: política social e racial no Brasil (1917-1945). Trad. Claudia
Sant‟Ana Martins. São Paulo: Editora Unesp, 2006. 400p.
DURHAM, Eunice. Fábrica de maus professores. Revista Veja, São Paulo, v. 41,
Educação antirracista caminhos abertos para a lei 10.639/03. Brasília: SECAD, 2005, p. 39-62.
GHIRALDELLI JR, Paulo. Era uma vez Eunice Durham tropeçando e a esquerda esperando a
revolução. Disponível em: https://ghiraldelli.wordpress.com/2008/11/25/era-uma-vez-eunice-
durham-tropecando-e-a-esquerda-esperando-a-revolucao/ Acesso em 20/03/2015.