Mauroanastacio - Musicoterapia e Alzheimer
Mauroanastacio - Musicoterapia e Alzheimer
Mauroanastacio - Musicoterapia e Alzheimer
São Paulo
2019
MAURO PEREIRA AMOROSO ANASTACIO JUNIOR
Versão corrigida
Área de Concentração:
Gerontologia
Orientadora:
Profa. Dra. Deusivania Vieira da Silva Falcão
São Paulo
2019
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a
fonte.
CATALOGAÇÃO-NA-PUBLICAÇÃO
(Universidade de São Paulo. Escola de Artes, Ciências e Humanidades. Biblioteca)
CRB 8-4936
Área de Concentração:
Gerontologia
Banca Examinadora
Aos colegas e professores da EACH que fizeram parte do meu crescimento pessoal,
profissional e científico durante esse tempo.
À Profa. Dra. Deusivania Falcão, que abraçou meu projeto com tanto entusiasmo e é fonte de
inspiração, cuidado e renovação.
À Dra. Cléo Monteiro França Correia por me inspirar com sua dedicação e seriedade em seu
trabalho.
À Maria Anastácia Manzano por toda a ajuda e trabalho para que essa pesquisa se tornasse
realidade.
À Mariane Oselame, Nathalya Avelino, Luciana Frias, Marcello Santos e Alessandra Lobato
por tantos ensinamentos descontraídos e amizade.
À Mariana, Claudia, Rafael, Ana Claudia, Juliana, Cibelle, Leonardo e tantos outros amigos
que ofereceram ajuda durante esse processo.
“Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-
reflexão”.
(FREIRE, 1987, p. 78)
RESUMO
Dementia is a syndrome that affects memory, behavior and activities of daily living, and is
one of the major causes of dependence among the elderly. Often the primary caregiver of the
elderly with dementia is the spouse, which can carry a significant burden, also compromising
the quality of their relationship. This study aimed to evaluate the effects of singing in music
therapy on the marital relationship of four couples, in which one of the spouses is diagnosed
with early or moderate Alzheimer's disease. The work was carried out as a multiple case
study, being an unexplored topic, allowing for a more detailed survey of the process.
Anamnesis and the Music Therapy data were applied to collect initial information, followed
by 12 sessions of music therapy. Before and after the process, interviews with a semi-
structured script were applied and its content was interpreted through Bardin's content
analysis. From the perspective of the caregiver, the satisfaction with family and friendship
relationships and the quality of the conjugal relationship before and after the illness were also
evaluated. The results suggest that the interventions allowed pleasant moments, with benefits
mainly for the caregiver. Some testimonials indicated that the interventions offered tools so
that the caregiver could better deal with the behavioral symptoms of the spouse with
dementia, benefiting the quality of the conjugal relationship. Despite the limited number of
participants, it is expected to contribute to the reflection about the possibilities of care, with
guidelines for the more assertive application of strategies within the context studied.
AD Aspectos Desfavoráveis
AF Aspectos Favoráveis
AIVD Atividade Instrumental de Vida Diária
AN Aspectos Neutros
APM Abordagem Plurimodal de Musicoterapia
AVD Atividades de Vida Diária
CCL Comprometimento Cognitivo Leve
DA Doença de Alzheimer
EACH Ética e Pesquisa da Escola de Artes, Ciências e Humanidades
EC Estimulação Cognitiva
LCR Líquido Cefalorraquidiano
MS Ministério da Saúde
RAAMT Relações de amizade com a DA antes da Musicoterapia
RADMT Relações de amizade com a DA depois da Musicoterapia
RCAD Relacionamento conjugal antes da DA
RCAMT Relacionamento conjugal com a DA antes da Musicoterapia
RCDMT Relacionamento conjugal com a DA depois da Musicoterapia
RFAMT Relacionamentos familiares com a DA antes da Musicoterapia
RFDMT Relacionamentos familiares com a DA depois da Musicoterapia
RSM Representações Sociais Musicais
SBGG Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
SCCAMT Autopercepção de saúde do cônjuge cuidador antes da
Musicoterapia
SCCDMT Autopercepção de saúde do cônjuge cuidador depois da
Musicoterapia
SCDAMT Saúde do cônjuge com DA na perspectiva do cuidador antes da
Musicoterapia
SCDDMT Saúde do cônjuge com DA na perspectiva do cuidador depois da
Musicoterapia
TC Trabalho com Canções
TR Terapia de Reminiscências
USP Universidade de São Paulo
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...................................................................................... 16
1.1 JUSTIFICATIVA...................................................................................... 17
1.2 OBJETIVOS............................................................................................... 18
1.2.1 Geral 18
1.2.2 Específicos 18
1.3 A DOENÇA DE ALZHEIMER (DA)......................................................... 19
1.4 A INTERVENÇÃO NÃO FARMACOLÓGICA NA DOENÇA DE
ALZHEIMER.............................................................................................. 21
1.4.1 A Musicoterapia como intervenção não farmacológica........................... 23
1.4.2 A canção como estratégia em Musicoterapia........................................... 26
1.5 DOENÇA DE ALZHEIMER E MUSICOTERAPIA: REFLETINDO
SOBRE AS RELAÇÕES FAMILIARES, CONJUGAIS E DE AMIZADE. 28
1.5.1 Doença de Alzheimer, musicoterapia e relações familiares..................... 28
1.5.2 Doença de Alzheimer: refletindo sobre as relações de amizade.............. 30
1.5.3 Relacionamento conjugal, doença de Alzheimer e
musicoterapia........................................................................................... 31
2 LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO............................................. 35
3 MATERIAIS E MÉTODOS.................................................................. 45
3.1 PARTICIPANTES..................................................................................... 47
3.2 LOCAL DO ESTUDO.............................................................................. 47
3.3 INSTRUMENTOS MUSICAIS.................................................................. 47
3.4 INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO........................................................ 48
3.5 INTERVENÇÃO MUSICOTERÁPICA..................................................... 49
3.6 FORMA DE COLETA DOS DADOS........................................................ 50
3.7 ANÁLISE DE DADOS.............................................................................. 50
3.8 QUESTÕES ÉTICAS................................................................................. 51
4 RESULTADOS....................................................................................... 52
4.1 PERFIL DO CASAL Nº1.......................................................................... 52
4.1.1 Ficha musicoterápica do casal nº1............................................................ 53
4.1.2 Atividades de cuidado realizadas do casal nº1......................................... 53
4.1.3 Sentimentos e vivências diante da tarefa de cuidar do casal nº1............ 54
4.1.4 Percepção, sentimentos e vivências da conjugalidade antes e após a
doença; satisfação com as relações familiares e de amizade do casal nº1 54
4.1.5 Anotações de campo do casal nº1............................................................. 55
4.1.5.1 Sessão nº1 do casal nº1............................................................................ 55
4.1.5.2 Sessão nº2 do casal nº1............................................................................ 55
4.1.5.3 Sessão nº3 do casal nº1............................................................................ 55
4.1.5.4 Sessão nº4 do casal nº1............................................................................ 56
4.1.5.5 Sessão nº5 do casal nº1............................................................................ 56
4.1.5.6 Sessão nº6 do casal nº1............................................................................ 56
4.1.5.7 Sessão nº7 do casal nº1............................................................................ 57
4.1.5.8 Sessão nº8 do casal nº1............................................................................ 57
4.1.5.9 Sessão nº9 do casal nº1............................................................................ 57
4.1.5.10 Sessão nº10 do casal nº1.......................................................................... 57
4.1.5.11 Sessão nº11 do casal nº1.......................................................................... 58
4.1.5.12 Sessão nº12 do casal nº1.......................................................................... 58
4.1.6 Entrevista aberta com roteiro semiestruturado e questionário do casal
nº1............................................................................................................. 58
4.2 PERFIL DO CASAL Nº2........................................................................... 63
4.2.1 Ficha musicoterápica do casal nº2............................................................ 64
4.2.2 Atividades de cuidado realizadas do casal nº2......................................... 64
4.2.3 Sentimentos e vivências diante da tarefa de cuidar do casal nº2............ 65
4.2.4 Percepção, sentimentos e vivências da conjugalidade antes e após a
doença; satisfação com as relações familiares e de amizade do casal nº2 65
4.2.5 Anotações de campo do casal nº2............................................................ 66
4.2.5.1 Sessão nº1 do casal nº2............................................................................ 66
4.2.5.2 Sessão nº2 do casal nº2............................................................................ 66
4.2.5.3 Sessão nº3 do casal nº2............................................................................ 66
4.2.5.4 Sessão nº4 do casal nº2............................................................................ 67
4.2.5.5 Sessão nº5 do casal nº2............................................................................ 67
4.2.5.6 Sessão nº6 do casal nº2............................................................................ 67
4.2.5.7 Sessão nº7 do casal nº2............................................................................ 67
4.2.5.8 Sessão nº8 do casal nº2............................................................................ 67
4.2.5.9 Sessão nº9 do casal nº2............................................................................ 68
4.2.5.10 Sessão nº10 do casal nº2.......................................................................... 68
4.2.5.11 Sessão nº11 do casal nº2.......................................................................... 68
4.2.5.12 Sessão nº12 do casal nº2.......................................................................... 68
4.2.6 Entrevista aberta com roteiro semiestruturado e questionário do casal
nº2............................................................................................................. 69
4.3 PERFIL DO CASAL Nº3.......................................................................... 74
4.3.1 Ficha musicoterápica do casal nº3............................................................ 74
4.3.2 Atividades de cuidado realizadas do casal nº3......................................... 75
4.3.3 Sentimentos e vivências diante da tarefa de cuidar do casal nº3............ 75
4.3.4 Percepção, sentimentos e vivências da conjugalidade antes e após a
doença; satisfação com as relações familiares e de amizade do casal nº3 75
4.3.5 Anotações de campo do casal nº3............................................................. 76
4.3.5.1 Sessão nº1 do casal nº3............................................................................ 76
4.3.5.2 Sessão nº2 do casal nº3............................................................................ 76
4.3.5.3 Sessão nº3 do casal nº3............................................................................ 76
4.3.5.4 Sessão nº4 do casal nº3............................................................................ 77
4.3.5.5 Sessão nº5 do casal nº3............................................................................ 77
4.3.5.6 Sessão nº6 do casal nº3............................................................................ 77
4.3.5.7 Sessão nº7 do casal nº3............................................................................ 77
4.3.5.8 Sessão nº8 do casal nº3............................................................................ 77
4.3.5.9 Sessão nº9 do casal nº3............................................................................ 78
4.3.5.10 Sessão nº10 do casal nº3.......................................................................... 78
4.3.5.11 Sessão nº11 do casal nº3.......................................................................... 78
4.3.5.12 Sessão nº12 do casal nº3.......................................................................... 78
4.3.6 Entrevista aberta com roteiro semiestruturado e questionário do casal
nº3.............................................................................................................. 79
4.4 PERFIL DO CASAL Nº4........................................................................... 84
4.4.1 Ficha musicoterápica do casal nº4............................................................ 84
4.4.2 Atividades de cuidado realizadas do casal nº4.......................................... 85
4.4.3 Sentimentos e vivências diante da tarefa de cuidar do casal nº4............. 85
4.4.4 Percepção, sentimentos e vivências da conjugalidade antes e após a
doença; satisfação com as relações familiares e de amizade do casal nº4 86
4.4.5 Anotações de campo do casal nº4............................................................. 86
4.4.5.1 Sessão nº1 do casal nº4............................................................................ 86
4.4.5.2 Sessão nº2 do casal nº4............................................................................ 86
4.4.5.3 Sessão nº3 do casal nº4............................................................................ 86
4.4.5.4 Sessão nº4 do casal nº4............................................................................ 87
4.4.5.5 Sessão nº5 do casal nº4............................................................................ 87
4.4.5.6 Sessão nº6 do casal nº4............................................................................ 87
4.4.5.7 Sessão nº7 do casal nº4............................................................................ 87
4.4.5.8 Sessão nº8 do casal nº4............................................................................ 88
4.4.5.9 Sessão nº9 do casal nº4............................................................................ 88
4.4.5.10 Sessão nº10 do casal nº4.......................................................................... 88
4.4.5.11 Sessão nº11 do casal nº4.......................................................................... 88
4.4.5.12 Sessão nº12 do casal nº4.......................................................................... 89
4.4.6 Entrevista aberta com roteiro semiestruturado e questionário do casal
nº4.............................................................................................................. 89
5 DISCUSSÃO............................................................................................. 95
6 LIMITAÇÕES......................................................................................... 102
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................. 103
REFERÊNCIAS....................................................................................... 104
APÊNDICE A - FICHA MUSICOTERAPÊUTICA............................ 118
APÊNDICE B – PERCEPÇÃO, SENTIMENTOS E VIVÊNCIAS
DA CONJUGALIDADE APÓS O PROCESSO
MUSICOTERAPÊUTICO...................................................................... 119
APÊNDICE C - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E
ESCLARECIDO...................................................................................... 120
ANEXO A - ANAMNESE ADULTO..................................................... 122
ANEXO B – DADOS SOCIODEMOGRÁFICOS E DE SAÚDE...... 123
ANEXO C – DADOS SOBRE O IDOSO COM ALZHEIMER........ 124
ANEXO D - REAÇÃO DIANTE DA DOENÇA DE ALZHEIMER
E ATIVIDADES DE CUIDADO REALIZADAS................................ 125
ANEXO E – SENTIMENTOS E VIVÊNCIAS DIANTE DA
TAREFA DE CUIDAR........................................................................... 126
ANEXO F – PERCEPÇÃO, SENTIMENTOS E VIVÊNCIAS DA
CONJUGALIDADE ANTES E APÓS A DOENÇA; SATISFAÇÃO
COM AS RELAÇÕES FAMILIARES E DE AMIZADE................... 127
ANEXO G - PARECER COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA........ 128
16
1 INTRODUÇÃO
1.1 JUSTIFICATIVA
as mais preditivas desse bem-estar (FALCÃO, 2016). Essas variáveis foram pouco estudadas
na literatura nacional.
Outrossim, ainda é escasso o número de pesquisas nacionais a respeito de intervenções
musicoterápicas envolvendo concomitantemente os idosos com DA e seus respectivos
cuidadores. Considera-se a importância de criar alternativas para os cuidados que contemplem
ambos para que se possa oferecer um suporte mais integral e assertivo abordando-se a
dinâmica relacional. O que se espera é contribuir com a temática utilizando estratégias
inéditas e fundamentadas pela teoria, ampliando as possibilidades de tratamento e
intervenção.
Espera-se que a aplicação sistemática do trabalho com canções em musicoterapia para
cuidadores e seus cônjuges receptores de cuidados possa interferir positivamente na
autopercepção da saúde, satisfação conjugal, qualidade do relacionamento social, familiar e
conjugal do cuidador.
Pautando-se nesse cenário, surgiram as principais questões norteadoras que
problematizaram a presente pesquisa: A Musicoterapia pode favorecer a qualidade das
relações familiares, conjugais e de amizade dos cônjuges cuidadores de idosos com
Alzheimer? A Musicoterapia pode auxiliar na promoção da saúde desses cuidadores? A
seguir, apresentam-se os objetivos e a fundamentação teórica do estudo.
1.2 OBJETIVOS
1.2.1 Geral
1.2.2 Específicos
Em 1950 a população brasileira era uma das mais jovens do mundo, com expectativa
de vida de 51 anos (FRANÇA, 2011). No ano de 2016, a expectativa de vida do brasileiro
passou a ser 75,8 anos e deve continuar expandindo até a média de 80 anos em 2040 (IBGE,
2018). Com o aumento da expectativa de vida, também aumenta a incidência de doenças
crônico-degenerativas, como a DA, que é o tipo de demência mais comum constituindo entre
50% a 70% de todos os casos (LEITE et al.,, 2014).
A DA foi descrita pela primeira vez no início do século XX pelo psiquiatra e
neuropatologista Alois Alzheimer (1864 – 1915) (PHANEUF, 2010). Atualmente, existe
mundialmente de 17 a 25 milhões de pessoas com DA, sendo que a doença já acomete de 8%
a 15% da população com mais de 65 anos (FRIDMAN, 2004). A DA pode ser descrita como
uma afecção neurodegenerativa crônica, com lesões denominadas placas neuríticas e
emaranhados neurofibrilares nas regiões do hipocampo e do córtex cerebral, causando
sintomas variados como, por exemplo, perda progressiva de memória, dificuldades na fala e
comprometimento das atividades motoras (ASSOCIAÇÃO ALZHEIMER PORTUGAL,
2009; NEWMAN et al.,, 2011; CHARCHAT et al.,, 2001).
As formações por depósito de proteína amiloide são denominadas placas neuríticas
quando este depósito é acompanhado de restos neuronais, sendo associado ao prejuízo
cognitivo. Os emaranhados neurofibrilares, também, podem ser encontrados em indivíduos
com cognição normal em estruturas para-hipocampais ou hipocampais. Nos indivíduos com
DA os emaranhados atingem estruturas límbicas e áreas corticais (FARFEL, 2014).
Até o ano de 2011, a DA era diagnosticada somente quando já havia demência.
Atualmente a DA pode ser diagnosticada em três fases ou estágios denominados: DA pré-
clínica, comprometimento cognitivo leve (CCL) devido à DA, e demência. A fase pré-clínica
é mais restrita à pesquisa e nessa fase é possível propor o diagnóstico de DA antes do
aparecimento dos sintomas com base em informações obtidas por meio da identificação direta
ou indireta de sinais de doenças neurodegenerativas, os chamados biomarcadores (FROTA et
al.,, 2011; SPERLING et al.,, 2011).
O biomarcador (abreviação de "marcadores biológicos") pode ser definido como algo
medido com precisão indicando a presença de uma doença, como a glicemia de jejum, que
indica a presença de diabetes se for de 126 mg / dL ou mais. Vários potenciais biomarcadores
estão sendo estudados por sua capacidade de indicar os estágios iniciais da DA incluindo os
níveis de beta-amilóide e tau no líquido cefalorraquidiano (LCR), bem como, alterações
20
cerebrais detectáveis. Estudos recentes sugeriram que esses indicadores podem mudar em
diferentes estágios do processo da doença. Pesquisas atuais estão investigando os
biomarcadores mais promissores na DA, como imagens cerebrais, proteínas do LCR, testes de
sangue e urina e perfis de risco genéticos (ALZHEIMER’S ASSOCIATION, 2018).
A fase denominada Comprometimento Cognitivo Leve (CCL) é um dos maiores
fatores de risco para a DA, podendo ser considerado um ponto transicional entre as alterações
presentes no envelhecimento cognitivo normal e a demência. Os portadores do CCL podem
apresentar alterações funcionais mínimas, mas sem impacto significante em suas atividades
diárias. Os sintomas podem envolver uma ou múltiplas habilidades cognitivas, podendo ser
classificado como amnéstico ou não amnéstico, de acordo com o comprometimento ou não da
memória (APRAHAMIAN et al.,, 2014).
O diagnóstico do CCL é clínico, e em situações de pesquisas podem ser utilizados
marcadores biológicos para maior probabilidade de evolução para DA. Indivíduos
inicialmente diagnosticados como CCL podem demonstrar uma estabilidade clínica dos
déficits cognitivos ou até mesmo voltar aos padrões normais ao longo do tempo. Uma
proporção substancial desses indivíduos pode ser reclassificada como cognitivamente normal
em uma avaliação posterior (APRAHAMIAN et al., 2014; FROTA et al., 2011).
No caso do estágio da demência, este pode ser descrito em três fases (inicial,
moderado e grave) sendo que pode haver grandes variações da progressão dos sintomas
dependendo do indivíduo. A fase inicial dura em média 2 a 3 anos e o indivíduo ainda pode
ser independente relatando possíveis lapsos de memória. O comprometimento da memória é,
em geral, o sintoma mais proeminente e precoce referindo-se principalmente à dificuldade
para recordar datas, nomes familiares e fatos recentes. Alguns indivíduos já podem apresentar
alterações de linguagem, desorientação progressiva com respeito ao tempo e ao espaço.
Também há chance de apresentar perda de concentração, de atenção e de iniciativa, além de
mudanças de humor (ALZHEIMER’S ASSOCIATION, 2018; MACHADO, 2016).
O Alzheimer moderado é tipicamente o estágio mais longo, podendo durar
aproximadamente 10 anos, e é caracterizada por deterioração mais acentuada dos déficits de
memória e pelo aparecimento de sintomas como afasia, apraxia, agnosia, alterações
visuoespaciais e visuoconstrutivas. Os sintomas podem causar frustração e/ou raiva. Os danos
podem dificultar a expressão de pensamentos e a execução de tarefas rotineiras com
empobrecimento do vocabulário e dificuldade de compreensão. Comumente, o indivíduo
ainda se considera apto a realizar tarefas complexas, por vezes, subestimando riscos
21
que a EC não só beneficia a cognição, mas também o bem-estar relatado, a qualidade de vida,
a comunicação e a interação social.
Além das terapias não farmacológicas, algo que vem ganhando destaque em relação ao
envelhecimento é a importância do envolvimento dos idosos em atividades que geram
sentimentos positivos (FERREIRA, 2011). Foi durante os anos 60 que aumentou o número de
pesquisas relacionando atividade e satisfação, principalmente em decorrência do crescimento
da população idosa. A partir de 1970, a atividade começou a ser considerada como um
determinante da satisfação, uma vez que permitia que o indivíduo experimentasse um domínio
sobre o ambiente e sobre os eventos de sua vida (NERI, 1993).
Alguns instrumentos já foram desenvolvidos para a avaliação da frequência da prática
de atividades e do prazer subjetivo experimentado na prática de atividades, por idosos. Um
desses instrumentos é o de Planejamento de eventos prazerosos (The Pleasant Events
Schedule): uma escala norte-americana com 53 itens que descrevem eventos e atividades para
idosos com DA. As atividades foram escolhidas para cobrirem duas dimensões primárias: (1)
atividades passivas e ativas; e (2) atividades sociais e não-sociais. Algumas exigem maior
grau de habilidade cognitiva (ex.: montar quebra-cabeças) do que outras (ex.: escutar música).
A escala mensura frequência e disponibilidade das atividades e o quão agradável foi envolver-
se em cada uma delas durante o último mês (TERI, 1991).
A música exerce influência na vida humana nas atividades mais usuais, tais como,
acordar, celebrar, viajar, praticar esportes, adormecer, relaxar. Dentre vários fatores, a música
é um estímulo que favorece: a) respostas físicas, por meio das qualidades sedativas ou
estimulantes que influenciam aspectos fisiológicos (ex.: respiração, pressão arterial,
tolerância à dor, etc.); b) oportunidades para integração social, comunicação e
desenvolvimento de habilidades sociais; c) respostas emocionais que atingem o estado
afetivo de quem a ouve, eliciando sentimentos e sensações que podem estar associadas com
vivências agradáveis ou desagradáveis e; d) associações extramusicais com épocas, pessoas,
lugares, experiências vividas, evocando emoções ou informações guardadas na memória
(ANASTACIO JUNIOR; CHUBACI; FALCÃO, 2018).
A Musicoterapia é uma forma de terapia não farmacológica que dialoga com as
citadas anteriormente, uma vez que pode contribuir para a melhora de condições físicas,
sociais e comunicativas do indivíduo. (WORLD FEDERATION OF MUSIC THERAPY,
24
Além do cantar, a composição de canções também pode ser uma forma de utilizar a
canção como recurso terapêutico (HEATH; LINGS, 2012). Em um programa de composição
de canções, Hong e Choi (2011) tiveram como objetivo avaliar os efeitos da utilização da
composição nas funções cognitivas de idosos institucionalizados com demência. O programa
visava realizar composições com os participantes. O grupo experimental obteve uma melhora
geral nos parâmetros de orientação espaço/temporal, memória, atenção e cálculo, função da
linguagem, compreensão e julgamento.
As estratégias com canções mencionadas acima são descritas por diferentes
abordagens e modelos na Musicoterapia, entre elas, a Abordagem Plurimodal de
Musicoterapia (APM). A APM integra diferentes teorias e modelos para fundamentar o
trabalho com indivíduos em diferentes contextos, incluindo a pessoa idosa com demência,
sendo que sua principal questão é o comprometimento do terapeuta dentro do processo
terapêutico (SCHAPIRA et al., 2007).
A APM se fundamenta no conceito do indivíduo como uma unidade biopsicossocial-
espiritual, validando as diferentes dimensões do indivíduo (SCHAPIRA et al., 2007) e
humanizando o cuidado. Além disso, a APM também considera importante o conceito de “Ser
na Música” (ROBBINS, 2005), ou seja, quando se escuta um indivíduo cantar, não é apenas
uma produção sonora, mas sim a identidade dela se manifestando. Sendo assim, a canção
oferece uma possibilidade de ampliação das formas de expressão.
Outro conceito considerado pela APM é o de Representações Sociais Musicais (RSM),
que descreve a respeito da dimensão presencial da música na sociedade, constituindo um
sistema de valores, noções e práticas inerentes ao meio social (SCHAPIRA et al., 2007).
Nesse sentido, as canções de uma época, de uma comunidade ou de uma faixa etária
apresentam inúmeros significados e memórias que podem ser resgatados, exteriorizados e
transmitidos através do fazer musical.
Na APM a prática musicoterápica pode se dar através da improvisação, da escuta
musical, da utilização de música gravada ou através da canção. A utilização da canção na
APM está descrita no Trabalho com Canções (TC) que conta com uma variedade de
estratégias que são selecionadas a partir do objetivo terapêutico determinado pelo terapeuta,
levando em consideração o histórico e as preferências individuais do paciente. Entre as
estratégias descritas pela APM estão: a dedicatória de canções, a gravação e audição de
canções, a exploração de repertório, o resgate de canções, e a composição.
28
afetivas. Para os autores, o suporte social envolve afeto, afirmação e ajuda, sendo importante
para o indivíduo pela habilidade em moderar os efeitos do estresse, incluindo os que estão
relacionados ao envelhecimento.
No que se refere à Musicoterapia e os relacionamentos afetivos ao longo da vida,
Pasiali (2013) detectou que as intervenções com músicas podem fortalecer o apego através da
reconstrução da capacidade de formar ou restabelecer relações; reduzir perturbações de
estresse e de humor; apoiar interações saudáveis de parceiros por meio do reforço das
capacidades de comunicação; fornecer apoio social e; construir habilidades de enfrentamento
entre famílias e indivíduos que estão vivenciando circunstâncias desafiadoras.
No contexto demencial, as intervenções musicoterápicas podem contribuir com a
qualidade das relações visto que o indivíduo com DA tende a enfrentar perdas em sua rede de
suporte social à medida que a doença avança. No caso do cuidador, estudos indicaram que
quanto mais satisfatória for a percepção em relação à sua rede de suporte sociofamiliar,
melhores serão seus sentimentos de satisfação com a vida. Além disso, os níveis baixos de
suporte podem ter como consequência a solidão, ansiedade, vulnerabilidade ao estresse e falta
de propósito na vida. Nesse sentido, para que o cuidador se torne mais resiliente é importante
que o suporte seja uma das estratégias de enfrentamento (INOUYE et al., 2010; KEYES et al.,
2002; GARCIA; FALCÃO, 2018).
Aproximadamente 70% dos cuidadores informais são casados com a pessoa para quem
prestam cuidados (BOULDIN; ANDRESEN, 2014). Nestes casos, com o avanço da demência
a dinâmica conjugal é afetada, pois a comunicação se torna progressivamente mais difícil e a
32
em um relacionamento quando se avalia a diferença entre o que uma pessoa espera da outra
(na relação) e o que esta mesma pessoa está recebendo da outra (STERNBERG, 1986).
O relacionamento conjugal satisfatório caracteriza-se, essencialmente, por sentimentos
de apego, proximidade, paixão, intimidade, compreensão, alegria, autonomia, reconhecimento
de que ninguém pode suprir todas as necessidades da outra pessoa e que nenhum
relacionamento é livre de problemas. Casais satisfeitos são funcionais, conseguem manter
fortes laços emocionais, desenvolvem padrões de comunicação adequados e alteram a
estrutura de poder, papéis e regras de seu relacionamento diante de crises e ao longo da vida
(MINUCHIN, 1982; OLSON et al., 1979).
De uma forma geral, a satisfação conjugal é influenciada por variáveis como: gênero;
história pessoal de cada cônjuge; estado de saúde; atitudes; valores; fatores de personalidade;
as expectativas e as características individuais percebidas ou idealizadas tanto do parceiro
como da relação; aspectos biopsicossociais, históricos, culturais, econômicos, familiares e
educacionais; qualidade da relação sexual; grau de afinidade entre a díade conjugal; lócus de
controle; presença de filhos; comunicação; resiliência; tempo de relacionamento; quantidade e
qualidade de tempo que o casal passa junto; trabalho remunerado e experiência sexual anterior
ao casamento; momento atual do ciclo de vida e do ciclo vital da família (FALCÃO, 2016).
No caso do aparecimento de uma demência, a satisfação conjugal pode ter uma correlação
negativa com a carga do cônjuge cuidador (BRAUN et al., 2009; SIMONELLI et al., 2008).
A percepção dos cônjuges também é importante em relação à satisfação conjugal e os
cuidados. Estudos indicaram que considerar o casamento como algo sagrado está relacionado
positivamente com a satisfação conjugal, podendo ajudar os casais a enfrentarem o desafio de
cuidar um do outro, especialmente na velhice (STAFFORD et al., 2014). Nesse sentido, a
literatura fala sobre o “amor compassivo”, por vezes definido como um amor centrado no bem
do outro, principalmente quando o outro está em sofrimento ou necessitando de cuidados.
Pesquisas (RAUER et al., 2013) envolvendo o amor compassivo revelaram que os benefícios
deste tipo de amor são principalmente para o doador, podendo resultar em menos depressão e
estresse para o cuidador, mesmo em face de demandas crescentes de cuidado.
Em uma revisão sistemática, EGILSTROD, RAVN e PETERSEN (2018)
apresentaram uma visão geral de estudos qualitativos sobre experiências vividas pelos
cônjuges, com respeito a mudanças e ao gerenciamento de mudanças no convívio com uma
pessoa com demência. O estudo mostrou que, em geral, os cônjuges tentam sustentar ou
reconstruir a relação, evitando possíveis conflitos e permitindo que seus parceiros mantenham
34
as tarefas domésticas e acrescentando alegria e valor à sua vida cotidiana, tentando manter
antigos rituais e rotinas. No entanto, devido à solidão, alguns se voltam para amigos em busca
de apoio e se envolvem em atividades promovidas por instituições especializadas em
Alzheimer.
35
2 LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO
avaliaram principalmente os casais neste formato, mas também incluíram outras díades. Por
outro lado, as pesquisas de Berger (2004), Rio (2018), Ugur (2018) e Tamplin (2018)
envolveram idosos com demência e cuidadores familiares e/ou formais.
O estudo de Chatterton (2010) versou sobre uma revisão sistemática acerca da
utilização do canto no tratamento da demência, e detectou trabalhos que também focalizaram
essas díades. Já em seu estudo, Beer (2016) avaliou a utilização de um modelo de treinamento
direcionado a enfermeiros, cuidadores ou membros da comunidade que tinham contato com
pessoas com demência, indicando a importância dos musicoterapeutas nesse contexto. Na
mesma direção, McDermott (2018) descreveu a importância da prática de “musicoterapia
indireta”, ou seja, quando o musicoterapeuta compartilha do que acontece em uma sessão de
musicoterapia com cuidadores, familiares e demais profissionais.
Em seu estudo, Beer (2016) descreveu treinamentos oferecidos a outros profissionais
da saúde demonstrando como o musicoterapeuta utiliza o tom de voz, o ritmo e a melodia, e
as nuances do gesto como habilidades que podem ser utilizadas com o idoso com demência. A
autora relatou que a musicoterapia chama a atenção de organizações de saúde por seus
benefícios e por se tratar de uma intervenção econômica. Os treinamentos oferecidos tinham
60 minutos de duração para que pudessem ser facilmente incorporados em uma reunião típica
de equipe. O módulo consistiu em diferentes elementos, tais como: fatos e estatísticas sobre
demência; interação e trocas de informações entre os presentes; dramatizações curtas com
feedback; lições sobre como ouvir a natureza comunicativa de qualquer som que um paciente
faz; e um folheto que continha dicas específicas sobre formas alternativas de comunicação.
Em relação ao desenho dos estudos, todos utilizaram abordagens diversas, sendo que a
maioria buscou resultados quantitativos e qualitativos através da aplicação de instrumentos de
avaliação, gravação de vídeos, registro de diários e entrevistas. As pesquisas relataram os
resultados do cuidador em relação ao fardo, a ansiedade, a depressão e a satisfação do cuidar,
assim como outros aspectos ligados ao bem-estar, como energia, concentração e tristeza. No
caso do idoso com demência, foram avaliados os sintomas neuropsiquiátricos e
comportamentais, as habilidades cognitivas, pressão arterial sistólica e diastólica, frequência
cardíaca, taxa de respiração e as atividades de vida diária.
A qualidade do relacionamento também foi avaliada (TAMPLIN, 2018) assim como a
qualidade percebida da relação conjugal (BAKER, 2012) e a frequência de toques iniciados e
responsivos nas duplas (CLAIR, 1997). Nos trabalhos com intervenção, as estratégias
41
utilizadas incluíram tocar instrumentos de percussão, canto, audição musical, jogos musicais,
composição e o movimento aliado à música, como a dança.
Dos resultados encontrados, Clair (1997) relatou benefícios na satisfação com os
encontros, e que a díade se beneficiou social e emocionalmente das interações musicais,
incluindo dança, canto e tocar instrumentos sendo que o maior envolvimento aconteceu na
prática rítmica. Já em outra pesquisa realizada por Clair (2002), houve aumento do
envolvimento mútuo mesmo em visitas sem a musicoterapia e os cuidadores relataram
facilidade em aprender e utilizar as atividades com os idosos.
No estudo de Brotons e Marti (2003) mais da metade dos cuidadores familiares de sua
amostra relataram melhorias positivas no funcionamento físico, social e emocional dos idosos
cuidados. Dos cuidadores, 33% detectaram melhoria na área físico-motora, e todos os
participantes relataram que as intervenções ajudaram a relaxar. Além disso, 66%
mencionaram a atividade como sendo prazerosa uma vez que podiam dividir e expressar
sentimentos. Foram verificadas melhoras na atenção, linguagem expressiva e memória do
idoso com demência. Não foram detectadas diferenças significativas entre os grupos de
intervenção e controle no estudo de Berger (2004). Os autores sugeriram que talvez um
programa de intervenções em grupo não seja o formato mais efetivo para dar suporte a
pacientes com demência e seus cuidadores.
Na revisão sistemática realizada por Chatterton (2010) foi verificado que o canto
individual apareceu como o mais efetivo em contextos sociais, facilitando a comunicação e
promovendo comportamentos sociais positivos. Os atendimentos de musicoterapia tiveram
sucesso em reduzir sintomas psicológicos e comportamentais na agitação e a utilização do
canto favoreceu o acesso a habilidades cognitivas. A revisão ressaltou que o musicoterapeuta
é o profissional habilitado a utilizar elementos sutis da música, incluindo as respostas vocais
para validar a expressividade do paciente e oferecer suporte.
No estudo de Hanser (2011), as díades apresentaram benefício no que se refere ao
relaxamento e ao conforto e felicidade. Os cuidadores apresentaram melhores resultados que
os receptores de cuidado, com mudanças estatisticamente comprovadas. Apesar dos
resultados positivos, foi relatado por cuidadores que as atividades de musicoterapia eram mais
uma exigência somada à grande demanda de cuidados.
No estudo de Baker (2012), após a aplicação inicial dos instrumentos de avaliação, os
cuidadores não apresentaram depressão ou ansiedade e não estavam insatisfeitos com o
relacionamento. No pós-teste as avaliações não apresentaram diferenças significativas, apesar
42
geral a intervenção em pacientes com demência em domicílio reduziu a carga de cuidado dos
cuidadores.
O estudo de McDermott (2018) sobre a musicoterapia indireta indicou alguns pontos
importantes, tais como: a importância de tomar decisões clínicas sobre quando a
musicoterapia direta é necessária e quando a musicoterapia indireta é apropriada; a
necessidade de um musicoterapeuta dar suporte para a transição da musicoterapia direta para a
musicoterapia indireta; os potenciais riscos e encargos da prática de musicoterapia indireta. Já
no estudo de Tamplin (2018) as altas taxas de participação indicaram que a intervenção foi
recebida favoravelmente pelos participantes. Escores favoráveis na linha de base sobre a
qualidade do relacionamento e medidas de bem-estar foram mantidos durante a intervenção
de 20 semanas. O estudo demonstrou boa viabilidade para um protocolo de pesquisa e
intervenção de canto de grupo terapêutico para pessoas com demência e seus cuidadores.
Em relação à utilização específica da canção nos estudos, na pesquisa de Baker (2012)
foi incluído o cantar de canções conhecidas/preferidas sem o acompanhamento ou com o
acompanhamento de gravações. No estudo de Tamplin (2018) os autores elaboraram um
protocolo com aquecimento vocal seguido de cantar canções conhecidas (requisitadas pelos
participantes), além do aprendizado de novas canções, harmonia, e introdução de habilidades
vocais.
O estudo de McDermott (2018) mencionou atividades como: cantar junto com idosos
institucionalizados, canto grupal, cantar durante outras atividades (ex.: banho), cantar canções
conhecidas utilizando gravações e o cantar como um suporte para amenizar possíveis
sintomas comportamentais do idoso (ex.: agitação). Já Rio (2018) discutiu sobre a utilização
do cantar canções conhecidas e desconhecidas em grupos com o acompanhamento de piano e
violão, canções conhecidas para encerrar o encontro, além de cantar os nomes dos
participantes no início das sessões.
No estudo de Clair (1997), o canto é indicado como uma das atividades avaliadas, mas
não especifica sua utilização, porém, no estudo posterior, Clair (2002) recomendou ao
cuidador cantar canções familiares e mencionou a canção “Home on the Range” como
exemplo. Além disso, destacou a utilização da canção acompanhada por violão e piano. No
estudo de Berger (2004) foi utilizado o cantar e assoviar canções conhecidas.
O canto também é referido como uma das atividades do estudo de Brotons e Marti
(2003), incluindo o “cantar junto”. No caso de Hanser (2011), os autores recomendaram a
utilização do cantar junto oferecendo acompanhamento rítmico com percussão e/ou outros
44
3 MATERIAIS E MÉTODOS
conclusões analíticas mais contundentes, sem pretensão de generalização estatística, mas com
possibilidade de generalização analítica, através da expansão e criação de teorias (YIN, 2015).
O presente trabalho baseou-se nas orientações de Yin (2015) para as etapas de construção de
estudos de casos múltiplos. Um fluxograma com as etapas realizadas pode ser observado a
seguir:
Figura 2: Etapas do estudo de casos múltiplos, adaptado de Yin, 2015
3.1 PARTICIPANTES
O estudo de caso costuma envolver diferentes métodos para coleta de dados, podendo
incluir, também, os dados quantitativos, embora os dados qualitativos sejam predominantes
(ROBSON, 2002). Para este trabalho, os instrumentos de avaliação foram aplicados por uma
avaliadora cega, sem envolvimento com as intervenções. Os instrumentos adaptados e
utilizados na coleta de dados foram:
• Anamnese: realizada por meio de uma entrevista como a primeira fase do processo
com o objetivo de identificar problemas, conhecer diagnósticos, planejar e implementar a
assistência ao paciente (PORTO, 2001);
• Ficha Musicoterápica (modelo adaptado para os participantes): foi aplicada com o
objetivo de investigar a vivência sonora dos pacientes (sonoridades, músicas, cantores,
instrumentos musicais de preferência), com seus aspectos sociais e culturais (BENENZON,
1985, p. 72-73.);
• Entrevista aberta com roteiro semiestruturado e questionário: elaborados a partir da
revisão de literatura e de pesquisas anteriores (FALCÃO, 2006; GARCIA, 2018). Na
entrevista semiestruturada o informante deve discorrer sobre suas experiências a partir de um
foco principal proposto pelo pesquisador, ao mesmo tempo em que permite respostas
espontâneas do informante, levando em consideração o embasamento teórico da investigação
(TRIVIÑOS, 1987).
• Percepção, sentimentos, vivências da conjugalidade e qualidade do relacionamento
antes e após a doença: para avaliar a qualidade do relacionamento com o receptor de
cuidados, foram feitas duas perguntas (FALCÃO, 2006; MARKS et al 2008): “Como você
avalia a qualidade do seu relacionamento com a pessoa que você cuida antes da doença?” e
“Como você avalia, atualmente, a qualidade do seu relacionamento com a pessoa que você
cuida?” Para ambas as questões, o entrevistado deveria responder de acordo com as opções:
muito ruim, ruim, regular, boa ou muito boa.
• Satisfação geral com as relações familiares e de amizade: foram aplicados dois itens
escalares com cinco pontos cada um avaliando a satisfação com as relações familiares e de
amizade (FERRING et al 2004).
49
O número de doze atendimentos foi determinado a partir de uma média calculada com
base em pesquisas semelhantes mencionadas na revisão. Os atendimentos foram oferecidos
entre os meses de janeiro e agosto do ano de 2018.
50
Nos estudos de casos múltiplos, a análise dos dados pode ser realizada por meio de
diferentes estratégias. Os pesquisadores podem utilizar programas de computador, tabulações,
categorização, testes e combinação de evidências (YIN, 2015).
No presente estudo, as entrevistas semiestruturadas foram analisadas a partir do
método de análise de conteúdo de Bardin (2006), sendo este um conjunto de técnicas que
utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens. A
partir desta análise, é possível compreender o sentido das comunicações, seu conteúdo
manifesto ou latente e as significações explícitas ou ocultas (CHIZZOTTI, 2006). A análise é
caracterizada por três períodos distintos: a pré-análise, a exploração do material e o
tratamento dos resultados.
Ao reunir as entrevistas transcritas, foi constituído o corpus da pesquisa. Na fase da
pré-análise, realizou-se uma leitura flutuante. Na exploração do material foram seguidas as
regras de: (a) exaustividade – esgotando-se a totalidade da comunicação das participantes, não
se omitindo informação alguma; (b) representatividade – os conteúdos representaram a
amostra deste estudo; (c) homogeneidade – os dados referiram-se ao mesmo tema, sendo
obtidos por técnicas iguais e aplicadas em indivíduos semelhantes; (d) pertinência – as
entrevistas foram adaptadas de acordo com os objetivos da pesquisa; e (e) exclusividade – os
elementos não estiveram classificados em mais de uma categoria.
51
Em seguida foram criadas categorias analíticas que permitiram abarcar a totalidade das
entrevistas em eixos temáticos e, então, subcategorias puderam ser identificadas. Assim
sendo, o tratamento dos resultados pode ter interpretações compreendidas em frequência
simples das unidades de análise. A direção dos conteúdos analisados poderá ser classificada
como: favorável (aspectos positivos das afirmações), desfavorável (aspectos negativos das
informações) ou neutra (conteúdo indefinido, vago, indeterminado, indiferente ou imparcial,
não expressando partido nem a favor nem contra).
Durante o processo da análise de conteúdo proposto por Bardin (2006), pode-se
realizar uma análise quantitativa a partir do número de respostas. Nesta pesquisa isso não foi
efetivado por haver um número limitado de participantes. Para o relatório de cada caso foram
selecionados exemplos das falas mais frequentes em cada categoria/subcategoria.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Escola de Artes, Ciências e
Humanidades (EACH), da Universidade de São Paulo (USP) em dezembro de 2017 com o
CAAE: 81491517.0.0000.5390 (ANEXO). As intervenções e a coleta de dados foram
realizadas mediante aceite, autorização e assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (ANEXO) pelo cônjuge cuidador, apresentando o objetivo da pesquisa e
autorizando o uso dos dados com finalidades científicas. O termo foi impresso e fornecido em
duas vias, das quais uma foi deixada com o participante e a outra recolhida pelos
pesquisadores, compondo o acervo de documentos da pesquisa.
Inicialmente o autor da pesquisa explicou detalhadamente o trabalho para os
participantes, apresentando a proposta de estudo e suas etapas. Em alguns casos a explicação
se estendeu aos demais familiares, tais como, filhos e netos. O autor pesquisador se colocou à
disposição dos envolvidos para sanar quaisquer outras dúvidas, sendo que estes poderiam
recusar-se a participar da pesquisa em qualquer etapa.
Foi especificado aos casais que a participação neste estudo poderia oferecer riscos
mínimos de natureza psicológica, sendo que estes puderam interromper ou se recusar a
participar em qualquer momento, sem que isto acarretasse em qualquer penalidade ou prejuízo
ao estudo. Entre os possíveis benefícios oferecidos pela participação nesta pesquisa, foram
citados: melhora do relacionamento e dos níveis de satisfação conjugal.
Visando assegurar o anonimato dos participantes, o nome dos indivíduos de cada casal
foi modificado, assim como nomes dos demais familiares citados.
52
4 RESULTADOS
Em três dos casos o cônjuge com DA era o marido, e em um era a esposa. Seus
respectivos cônjuges eram os cuidadores principais. Segundo os relatos dos cuidadores, seus
cônjuges se encontravam no estágio inicial/moderado da doença, e no momento da realização
da pesquisa os casais haviam completado 42, 27, 50 e 54 anos de casados respectivamente.
Em relação à escolaridade, dentre os cônjuges cuidadores, três completaram curso superior, e
um tinha curso técnico. Dos cônjuges com DA, três tinham curso superior e uma tinha curso
clássico.
Seguindo o método de análise de conteúdo descrito por Bardin (2006), as falas dos
cônjuges cuidadores foram classificadas em 11 categorias abarcando: relação conjugal;
relações familiares; relações de amizade; e saúde e bem estar dos cônjuges. A partir de cada
categoria os relatos foram separados em: com aspectos favoráveis (AF); com aspectos
desfavoráveis (AD); com aspectos neutros (AN). Cada categoria e subcategoria serão
descritas nos resultados com seus receptivos códigos. Será utilizado “Casal Nº1”, “Casal
Nº2”, “Casal Nº3” e “Casal Nº4” para identificar os casos. Cada relato apresentado foi
transcrito exatamente como a fala dos participantes.
A descrição dos casos foi realizada na seguinte sequência:
a) Breve perfil do casal obtido a partir da anamnese e dados sociodemográficos;
b) Breve descritivo obtido a partir da Ficha Musicoterápica;
c) Atividades de cuidado realizadas;
d) Sentimentos e vivências diante da tarefa de cuidar;
e) Percepção, sentimentos e vivências da conjugalidade antes e após a doença; satisfação
com as relações familiares e de amizade;
f) Anotações de campo (com breve descrição de cada sessão);
g) Entrevista aberta com roteiro semiestruturado e questionário.
Maria e Antônio residiam na zona sul de São Paulo/SP. Maria tinha 74 anos, brasileira
com ascendência japonesa, possuía curso técnico e apresentava 11 anos de escolaridade no
total. Antônio tinha 76 anos, era brasileiro e possuía curso superior. No período de realização
da pesquisa estavam casados há 42 anos, sendo que namoraram por um ano e meio e tiveram
uma filha. O casal usufruía de uma renda média de 15 mil reais. Antônio foi diagnosticado
53
O casal sempre teve contato com música, porém, nunca receberam ensino musical
formal. Antônio cresceu ouvindo os familiares tocarem instrumentos musicais em rodas de
samba e canções sertanejas. Durante o tempo em que trabalhava, ele pesquisava letras de
canções de preferência e junto com os amigos cantavam em grupo amador.
O casal relatou gostar muito de canções sertanejas, sambas e músicas do cantor
Roberto Carlos. Maria relatou que compartilhava as preferências musicais do companheiro,
que se incomodava muito com o som de trompete por se lembrar de “toques de funerais” e
que, apesar de sua ascendência japonesa, não teve muito convívio com a música.
Ajudar financeiramente
Dar apoio emocional X
Não desenvolve nenhuma atividade
Fonte: Mauro Pereira Amoroso Anastacio Junior (2019)
Respondendo a respeito de como se sentia cuidando do seu esposo, Maria disse que se
sentia bem, relatando: “sentimento de gratidão pela vida que tivemos”. Nesta parte da
entrevista Maria deixou claro que não recebia a ajuda de alguém para auxiliá-la na tarefa de
cuidar do cônjuge.
Abaixo podem ser observadas breves descrições das sessões obtidas a partir das
anotações de campo:
Neste encontro foi proposta a canção “Meu primeiro amor” e o casal se emocionou ao
cantar. Antônio relembrou e descreveu o local no qual trabalhava. Após o final do
atendimento, Maria enviou a seguinte mensagem: “Oi Mauro, boa noite, tudo bem? Obrigada
por ontem, fez muito bem ao Antônio, depois que você saiu nós continuamos cantando e ele
continuou ficando muito emocionado. Ele carregou aquelas folhas o tempo todo como se
fosse um troféu. Ele adorou. Hoje pegamos para cantar e ele continua se emocionando toda
vez que canta, acho que está mexendo bastante com ele e, o interessante é que ele lembra que
você veio. Obrigada, vai ser muito bom pra ele.”. O seguinte repertório foi utilizado: A Praça
(Carlos Imperial); Meu Primeiro Amor (Herminio Jimenez); Lampião de gás (Zica Bergami);
O trem das Onze (Adoniram Barbosa).
No início, Maria relatou que Antônio cantou sozinho durante a semana em diversos
momentos. O casal foi ao show da banda “Demônios da Garoa”. O repertório usufruído nesta
sessão foi: A praça (Carlos Imperial); Lampião de gás (Zica Bergami); Saudosa maloca
(Adoniram Barbosa); Coração de Papel (Antônio Reis); Maringá (Joubert de Carvalho).
Foi relatado pela cuidadora que eles estavam cantando com o auxílio da pasta todos os
dias e que Antônio passou a se lembrar de coisas que havia esquecido. Foram cantadas as
canções “Ronda” (Paulo Vanzolini) e “Beijinho Doce” (João Alves dos Santos). Para encerrar
a sessão, o casal e o pesquisador cantaram a paródia juntos.
Foram assistidos vídeos com as canções que haviam sido cantadas. Antônio
emocionou-se e reconheceu a cantora Inezita Barrozo. Maria relatou que durante a semana ele
escondeu a pasta com as canções.
A cuidadora relatou que durante a semana assistiram aos vídeos. Antônio recordou e
descreveu a canção “Conversa de Botequim” de Noel Rosa, explicando a letra. Foram
resgatadas canções sobre o amor e que os faziam lembrar-se da infância e juventude. As
músicas foram: A praça (Carlos Imperial); Lampião de gás (Zica Bergami); Índia (José
Fortuna); Conversa de botequim (Noel Rosa); Ciranda cirandinha; O balão vai subindo
(Alberto Ribeiro); Encosta sua cabecinha (Paulo Borges); Ele é o bom (Carlos Imperial); As
curvas da estrada de santos (Erasmo Carlos e Roberto Carlos).
No início do encontro foram gravadas (áudio) três canções preferidas cantadas pelo
casal. Em seguida, ouviram-se as gravações. Iniciou-se uma Composição a partir das
memórias a respeito dos encontros de casais cristãos que frequentavam. Foi trabalhado o
repertório: Luar do sertão (Catulo da Paixão Cearense e João Pernambuco); Lampião de gás
(Zica Bergami); Maringá (Joubert de Carvalho).
A sessão foi novamente iniciada com a escuta da gravação do casal cantando. Logo
em seguida, continuou-se a composição. Foi explorada a canção Asa Branca (Humberto
Teixeira e Luiz Gonzaga). A composição foi intitulada “Somos todos iguais”:
58
A cuidadora relatou que Antônio estava menos agitado e que as músicas o entretêm
durante um bom tempo, dando-a tempo para fazer suas atividades. Foram cantadas as canções
“Carinhoso” (João de Barro e Pixinguinha) e “Trem das Onze” (Adoniram Barbosa).
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das respostas dos cuidadores
Silvia e Joaquim residiam na zona sul de São Paulo/SP. Silvia tinha 74 anos, era
brasileira com ascendência japonesa e tinha curso superior. Joaquim tinha 90 anos, era
brasileiro com ascendência hispânica, e possuía curso superior. No período de realização da
pesquisa, Silvia e Joaquim estavam casados há 27 anos, e namoraram por 05 meses. O casal
64
Quando respondeu em relação a como se sentia cuidando do seu esposo, Silvia relatou
que se sentia bem, e especificou que não contava com a ajuda de terceiros para lhe auxiliar na
tarefa de cuidar diretamente do cônjuge, apenas em tarefas secundárias, explicando: “Coisas
externas, levar ao médico, comprar orgânicos a sobrinha ajuda”.
impacto da DA na sua vida a dois foi: “ele tentar esconder e controlar a perda de memória.
Ele escondia as contas e não sabia onde colocava”.
A entrevistada se considerava muito satisfeita com as relações familiares e de amizade
e percebia como sendo boa a sua condição de saúde.
Abaixo podem ser observadas breves descrições das sessões obtidas a partir das anotações
de campo:
No início da primeira sessão apenas Silvia cantou com o pesquisador e aos poucos
Joaquim se aproximou e repetiu algumas vezes: “Isso é do meu tempo”. Foi solicitado que o
casal resgatasse e anotasse canções durante a semana. Foram cantadas as canções: Meu
primeiro amor (Herminio Jimenez); India (José Fortuna); Solamente una Vez (Agustin Lara) e
Trem das onze (Adoniram Barbosa).
No momento que foi cantada a música “Eu sonhei que tu estavas tão linda”, Joaquim
emocionou-se e abraçou a esposa cantando. Ambos pediram a canção “Dio comme ti amo”.
Enquanto as músicas eram cantadas, Joaquim marcava o ritmo das canções com as mãos de
forma adequada. As músicas trabalhadas como repertório nesta sessão foram: Eu sonhei que
tu estavas tão linda (Lamartine Babo); Santa Lucia (Teodoro Cottrau); Dio come ti amo
(Domenico Modugno).
Nesta seção foram cantados boleros e Joaquim contou a história do sobrenome dele
(Gonzalez) para explicar a pronúncia da letra Z. Os boleros trabalhados foram: Solamente una
Vez (Agustin Lara); El dia que me quieras (Carlos gardel e Alfredo Le Pera); Quizas
(Osvaldo Farrés).
67
No início da sessão, Silvia relatou que Joaquim estava fechado e não participativo por
motivo de mudança da medicação. À medida que as músicas eram cantadas ficava mais
participativo, principalmente, na canção italiana, corrigindo a pronúncia da língua. Foram
cantadas: Carinhoso (Pixinguinha e João de Barro); El dia que me quieras (Carlos Gardel e
Alfredo Le Pera); Quizas (Osvaldo Farrés); Parlami d’amore Mariu (Ferruccio Dagliavini).
Foi feita a sugestão de alguns vídeos para o casal assistir junto durante a semana. Foi
gravado o áudio de algumas canções cantadas pelo casal para serem ouvidas em conjunto. As
canções utilizadas foram: Santa Lucia (Teodoro Cottrau); Quizas (Osvaldo Farrés); O sole
Mio (Eduardo di Capua e Alfredo Mazzucchi).
Silvia relatou que durante a semana assistiram juntos aos vídeos no computador e que
Joaquim participou atentamente dessa atividade. O pesquisador convidou Joaquim para ajudar
na pronúncia italiana das músicas e, a partir de então, começou a cantar. A gravação do casal
cantando juntos foi escutada e Joaquim relembrou sobre a juventude vivida no Rio de
Janeiro/RJ. O repertório utilizado foi: Santa Lucia (Teodoro Cottrau); Parlami d’amore Mariu
(Ferruccio Dagliavini); O sole Mio (Eduardo di Capua e Alfredo Mazzucchi); Champagne
(Mimmo di Francia); La Barca (Roberto Cantoral).
Durante a sessão, resgataram-se canções que fizeram parte da vida pessoal e conjugal
do casal, incluindo canções relacionadas ao Rio de Janeiro e canções orientais. Silvia relatou
que a canção “Pai Herói” a fazia lembrar de Joaquim, por sua dedicação como Pai. As
seguintes canções foram cantadas e refletidas: Garota de Ipanema (Antonio Carlos Jobim);
Cidade maravilhosa (André Filho); La Barca (Roberto Cantoral); Usagi to Kame (Aki
Toyosaki); Ue Wo Muite Arukou (Kyu Sakamoto); Mariato Itsumademo (Yuzo Kayama).
Foram gravadas outras canções que apareceram nas sessões anteriores e em seguida,
elas foram escutadas em conjunto. Joaquim emocionou-se ao ouvir a canção “Pai Herói” e
aparentou reconhecer as canções orientais. Por sua vez, Silvia cantava as canções orientais e
as traduzia para o marido e o pesquisador.
No início da sessão, Silvia relatou que durante a semana escutaram as músicas juntos.
Foi cantada a canção “Kami San” e Silvia a traduziu para Joaquim. Joaquim ensinava a
pronúncia de canções em espanhol e ensinava a canção “Serra da boa esperança” para Silvia
que não a conhecia. Foi trabalhado o repertório: Usagi to Kame (Aki Toyosaki); Aquellos
ojos verdes (Nilo Menendez); La Barca (Roberto Cantoral); Serra da Boa Esperança
(Lamartine Babo).
Algumas das canções que o casal mais se identificou foram cantadas, conversando-se
em seguida sobre cada uma elas. Silvia ressaltou que estava buscando as letras na internet e
estudando-as durante a semana. Foram cantadas: Aquellos ojos verdes (Nilo Menendez) e; O
sole Mio (Eduardo di Capua e Alfredo Mazzucchi).
Após o 11º atendimento houve uma ocorrência. Durante a semana o casal voltava para
casa de um passeio e Joaquim sofreu uma queda ao subir à calçada, perdendo parcialmente a
69
visão. Apesar de sua esposa pedir para que fosse realizado o 12º atendimento normalmente,
Joaquim estava muito sonolento e não permaneceu na última sessão.
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das respostas dos cuidadores
Marlene e José residiam na zona Oeste de São Paulo/SP. Marlene tinha 70 anos, era
brasileira com curso superior. José tinha 78 anos, era brasileiro do estado do Acre, também
com curso superior. O casal tinha renda média de 15 mil reais. Namoraram por cinco anos, e
durante a pesquisa completaram cinquenta anos de casados. O casal tinha três filhos e quatro
netos.
José recebeu o diagnóstico da doença de Alzheimer em 2013, sendo que a esposa
relatou que relutaram por algum tempo a ir ao hospital e iniciar o tratamento. Os sintomas
ficaram mais perceptivos quando José começou a realizar transações bancárias equivocadas,
segundo os relatos de Marlene. A principal queixa dela era o comportamento de José, que
tendia a ser contrário às suas propostas, constantemente diminuindo as atividades sociais do
casal.
Natural do Acre, José cresceu acompanhando a carreira de músico do pai que tocava
instrumentos de sopro em banda marcial durante cerimônias importantes de sua cidade natal.
Quando questionado sobre canções, relatou gostar dos cantores Nelson Gonçalves e Roberto
Carlos, destacando que morava próximo ao cantor Roberto em meados dos anos de 1960. A
cuidadora mencionou que José cantava constantemente pela casa e apesar do convívio com o
pai, ele não recebeu ensino musical formal.
Marlene ressaltou que gostava muito de bolero e demais canções dançantes, pois o
casal costumava dançar frequentemente. Durante a infância escutou cantores de língua
espanhola, como Libertad Lamarque e Lucho Gatica. O casal destacou os estilos musicais de
preferência, mas relatou gostar de todo tipo de música.
75
A cuidadora relatou que se sentia bem cuidando do esposo e destacou que o “filho do
meio” a ajudava nas tarefas diárias do cuidar.
No que concerne às relações familiares, a cuidadora disse que estava satisfeita e que
conta com a ajuda de familiares próximos quando necessário. Marlene indicou estar mais ou
menos satisfeita com as relações de amizade, pois seu convívio social estava mais limitado
devido aos comportamentos atuais emitidos pelo marido.
A seguir, podem ser observadas breves descrições das sessões obtidas a partir das
anotações de campo:
Foram cantadas as canções “Sinceridad” e “La Barca” e José descreveu que sempre
cantou “de ouvido”, não tendo recebido ensino musical formal. Ele explicou como se dançava
bolero e o casal falou sobre quando moravam próximo a Roberto Carlos, no Bairro Bela
Vista. Pediu a canção “Distância”. Foram trabalhadas as canções: Sinceridad (Rafael Gastón
Pérez); La Barca (Roberto Cantoral); Distância (Roberto Carlos).
77
Marlene expôs que durante a semana buscou canções via internet e pediu para cantar
“Tuyo es mi corazon”. José pediu a canção “Sentimental eu sou” e o casal relembrou
novamente quando moravam no bairro Bela Vista. Foram exploradas as canções: Tuyo es mi
corazon (Lorenzo Barcelata); Besame mucho (Consuelo Velázquez); La Paloma (Sebastian
Iradier); Sentimental demais (Evaldo Gouveia).
Nesta sessão foram cantadas as mesmas canções indicadas pelo casal no encontro
anterior, além da música “Como vai você” (Antônio Marcos). Marlene constantemente
estimulava, verbalmente, José a cantar mais alto.
Nesta sessão, o casal pediu músicas do cantor Bienvenido Granda, além das
solicitadas por eles anteriormente. Também, foram exploradas as canções: Tuyo es mi
corazon (Lorenzo Barcelata); O Portão (Roberto Carlos); Perfume de Gardênia (Rafael
Hernandez); Porto Solidão (Zeca Bahia); Perfídia (Alberto Dominguez). Durante o
atendimento o casal se abraçou e permaneceu de braços dados.
Neste encontro foram resgatados os boleros cantados por Bienvenido Granda. Marlene
falou sobre as gravações do bolero Quizas que ouviram durante a semana e mencionou uma
canção que José sempre cantava, porém, nunca encontraram a gravação. Através da letra
cantada por ele detectou-se a canção que se chamava “Cem anos atrás”. O pesquisador
comprometeu-se a levar a letra no próximo encontro. Foram trabalhadas as músicas: Quizas
(Osvaldo Farrez); Perfidia (Alberto Dominguez).
Iniciou-se a sessão com a canção “cem anos atrás” e José a ensinou para a esposa. Em
seguida, cantou-se “Perfume de gardênia” e o casal relatou mais sobre os bailes que gostavam
78
de frequentar. Foram cantadas: Cem anos atrás (Benedito Lacerda); Perfume de Gardênia
(Rafael Hernandez); Porto Solidão (Zeca Bahia).
No início foram relembradas canções clássicas da preferência do casal. José falou mais
sobre a banda de seu pai, e que tocavam a marcha “Cisne Branco”. O pesquisador
comprometeu-se a levar a referida canção. Foram trabalhadas as canções: Carinhoso
(Pixinguinha e João de Barro); Fascinação (Maurice de Feraudy); Eu sonhei que tu estavas tão
linda (Lamartine Babo); Cisne branco (Antonio Manoel do Espírito Santo).
Na última sessão, o pesquisador levou todas as canções mais cantadas pelo casal
durante os atendimentos. Marlene relatou espontaneamente sobre a experiência vivenciada
com a musicoterapia destacando que apesar de José, no geral, ser uma pessoa fechada para
atividades em grupo, foi participativo e se animava ao dar continuidade ao processo.
79
RELACIONAMENTO CONJUGAL
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das respostas dos cuidadores
RELACIONAMENTOS FAMILIARES
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das respostas dos cuidadores
familiares do casal depois da anos... ela ainda era pequena quando ele
Musicoterapia a partir da percepção do cantava”.
cuidador. b) Com aspectos desfavoráveis (AD):
Não foi identificado
c) Com aspectos neutros (NA):
Ex.: “já era tranquilo né”
Fonte: Mauro Pereira Amoroso Anastacio Junior, 2019.
RELAÇÕES DE AMIZADE
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definições e Códigos códigos; exemplos de trechos extraídos
das respostas dos cuidadores
Definição: Nessa categoria estão presentes castelhano, porque acho que a gente teve
os conteúdos inerentes à saúde do cônjuge uma fase assim muito forte com essas
com DA depois da Musicoterapia na músicas (...). A música vale muito... é
perspectiva do cuidador. como se as pessoas trabalhassem todos os
sentidos: o olfato, o tato, tudo é fazer
voltar a memória! Sentimos alegria,
também, né, porque a gente relembra o
nosso passado...”
b) Com aspectos desfavoráveis (AD):
Ex.: “se ele tá num lugar, que tenha
música que tenha tudo, ele aproveita, ele
se sente bem. Mas, para se deslocar pra ir
pra uma reunião numa boa, ele diz: não...
não prefiro.”
c) Com aspectos neutros (NA):
Ex.: Não foi identificado.
Beatriz e Ricardo residiam na zona oeste de São Paulo/SP. Ricardo tinha 82 anos, era
brasileiro e possuía nível superior de escolaridade. Beatriz tinha 77 anos, era brasileira e havia
estudado até o curso clássico. O casal tinha renda média de 14 mil reais. Conheceram-se no
ambiente de trabalho, namoraram durante um ano e casaram-se em 1964. Tinham quatro
filhos e quatro netos, sendo que um dos filhos residia com eles.
Beatriz recebeu o diagnóstico da doença de Alzheimer em 2015, sendo Ricardo seu
principal cuidador com o suporte de uma funcionária da família. Eles caminhavam
esporadicamente pelas dependências do condomínio, mas não faziam outras atividades.
O casal relatou que nunca recebeu ensino musical formal e que gostava de todo tipo de
música. Todavia, Ricardo mencionou que não apreciava as canções do cantor Roberto Carlos
85
e que cresceu ouvindo diversas canções antigas, como as do cantor Vicente Celestino, pois,
seus tios gostavam muito de cantar quando estavam reunidos. O casal resgatou alguns boleros
antigos, sinalizando que gostavam de ouvir e dançar quando jovens. Resgataram também as
canções do compositor Adoniram Barbosa.
Quando questionado sobre como se sentia cuidando de sua esposa, Ricardo relatou que se
sentia bem e que recebia ajuda das filhas e da secretária para cuidar da esposa.
86
Abaixo podem ser observadas breves descrições das sessões obtidas a partir das anotações
de campo:
A secretária da família mencionou que o casal havia cantado as canções com a letra
durante a semana. As principais músicas que fizeram parte da história do casal foram
87
contempladas nesta sessão, a saber: Quizas (Osvaldo Farrés); Solamente una Vez (Agustin
Lara); Lampião de gás (Zica Bergami).
No início do encontro foi recebida uma carta da filha agradecendo pelos atendimentos
e relatando que seus pais cantavam durante a semana. Nesta sessão, foi utilizado o seguinte
repertório: Ave Maria no morro (Herivelto Martins); Sertaneja (Rene Bittencourt); Peguei um
ita no norte (Dorival Caymmi); Trem das Onze (Adoniram Barbosa); Samba do Arnesto
(Adoniram Barbosa).
acompanhando o ritmo das seguintes músicas: Quizas (Osvaldo Farrez); O samba da minha
terra (Dorival Caymmi).
Durante a semana o pesquisador recebeu uma mensagem da filha do casal, que relatou
estar satisfeita com o trabalho de musicoterapia, e que há algum tempo havia estado com seus
pais, e ao colocar algumas músicas para ouvirem percebeu que sua mãe acompanhava de
forma adequada as canções colocadas marcando o ritmo em sua perna. A filha acrescenta que
isso não acontecia já há muito tempo. Por fim, completa que acredita que os objetivos dos
atendimentos foram alcançados.
Durante a sessão, Ricardo corrigiu a melodia e a letra das canções. Beatriz sentou-se
próxima ao marido e permaneceu abraçada com ele enquanto cantava as músicas: Aquarela do
Brasil (Ary Barroso); Quizas (Osvaldo Farrés); Solamente una Vez (Agustin Lara).
Durante o encontro Beatriz repetiu algumas vezes que o casal teve quatro filhos.
Ricardo falou sobre a temática das canções trabalhadas, a saber: Maringá (Joubert de
Carvalho); Eu sonhei que tu estavas tão linda (Lamartine Babo); Sertaneja (Rene Bittencourt).
89
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5 DISCUSSÃO
Ainda sobre a conjugalidade antes da DA, a cuidadora do casal nº2 relatou: “Não tem
assim mudança, digamos assim né? Porque a gente nunca foi de tá discutindo muito”. Em
outros momentos, a cuidadora também indicou que o que importava para seu marido sempre
foi a educação dos filhos e que durante o tempo de casados costumavam viajar
frequentemente. Nessa direção, a cuidadora do casal nº 3 mencionou que a relação conjugal
era boa, e complementou: “a gente discutia até chegar em termo, ele adorava viajar comigo,
com as crianças”.
Após o surgimento da DA, as queixas citadas pelos cuidadores foram relacionadas à
agitação, repetição de comportamentos e falas, isolamento social e a não participação de
encontros, reuniões sociais, etc. Durante as sessões de musicoterapia ficou claro que esses
sintomas comportamentais eram entendidos como desafios tanto para o relacionamento
conjugal como para os demais relacionamentos sociofamiliares, dificultando o convívio entre
eles e sobrecarregando o cuidador.
A cuidadora do casal nº1 queixou-se principalmente da demanda constante de atenção,
que estava comprometendo o tempo que passavam juntos. No caso do casal nº2, o cônjuge
com DA negava-se a participar de atividades e terapias, o que limitava o convívio
sociofamiliar deles e as possibilidades de momentos recreativos. Também, o cuidador do
casal nº3 se queixava do isolamento, sentindo falta da participação em eventos familiares. Por
outro lado, o cuidador do casal nº4 relatou que eles permaneciam a maior parte do tempo
sozinhos, apesar das visitas constantes das filhas.
Quanto aos benefícios identificados após as sessões de musicoterapia, a cuidadora do
casal nº1 relatou que as atividades ofereceram ferramentas para amenizar o comportamento
agitado de seu marido, como por exemplo, na fala “ele ficou assim, mais fácil de lidar (...) eu
sei como fazer ele acalmar”. Da mesma forma, a cuidadora do casal nº3 relatou que o resgate
de canções, que fizeram parte da vida do casal, ampliou as possibilidades de interação com
seu marido: “a gente tem mais paciência pra conversar”.
Observou-se que à medida que as canções eram lembradas e cantadas, as memórias
eram resgatadas e compartilhadas. Dessa forma, os cônjuges cuidadores puderam cantar seus
próprios sentimentos, seus conflitos, permitindo a reflexão desses conteúdos e até mesmo em
alguns momentos, a busca de soluções para os problemas vivenciados. Conforme a cuidadora
do casal nº2, a musicoterapia proporcionou momentos prazerosos favorecendo o resgate de
histórias, como pode ser observado nas falas: “A gente sai daquela, da mesmice da coisa, e
desvia um pouco a atenção”; “um monte de músicas que tava adormecido quase que no meu
97
inconsciente”. Nessa direção, o cuidador do casal nº4 relatou que as atividades amenizavam o
isolamento de forma prazerosa, destacando que a musicoterapia “ajudava a preencher o nosso
tempo, no tempo que a gente fica muito sozinho. Alivia a dor...”.
De acordo com os depoimentos, as atividades oferecidas também podem ser
entendidas como uma forma de cuidado ao cuidador, favorecendo uma autopercepção
favorável da saúde, conforme sugeriu a fala da cuidadora do casal nº1: “eu sentia assim, que
tinha tirado um peso de mim”. Da mesma forma, a cuidadora do casal nº 3 disse que a
musicoterapia lhe ofereceu “uma sensação de tranquilidade e paz”. Por outro lado, a
cuidadora do casal nº2, falando sobre o resgate das canções que fizeram parte de sua
biografia, mencionou: “eu acho que foi mais benéfica pra mim do que pra ele”. Já o cuidador
do casal nº4 relata: “era uma atividade que naquela hora eu me sentia assim, o paciente.
Melhorou minha saúde”.
Conforme pesquisas anteriores (e.g. SANTOS, 2018) no decorrer do processo
musicoterapêutico, as experiências musicais promovem uma ressignificação do papel de
cuidador, favorecendo a saúde e o bem-estar por meio do extravasamento de vários conflitos,
emoções e sentimentos num espaço apropriado e permissivo com o apoio do terapeuta. Dessa
maneira, a Musicoterapia sendo uma terapia auto expressiva com forte atuação nas funções
cognitivas, colabora diretamente para o desenvolvimento pessoal e proporciona aos
cuidadores, benefícios que fortalecem estratégias de enfrentamento diante do estresse. Além
disso, a Musicoterapia colabora com o contato intergeracional com seu poder criativo,
potencialidades, memórias e histórias de vida.
Quanto aos depoimentos pertinentes às demais relações sociofamiliares, a cuidadora
do casal nº1 sugeriu que amigos e familiares passaram a convidá-los para apresentações
musicais ao perceberem que a música lhes ofereceu benefícios. Já a cuidadora do casal nº3
relatou que a musicoterapia despertou o interesse de amigos e familiares que começaram a
indicar a musicoterapia como tratamento. No caso do casal nº4, ouve uma participação
indireta das filhas, que passaram a colocar as músicas preferidas do casal para ouvirem e
cantarem quando estavam juntos. Apenas a cuidadora do casal nº2 relatou que não observou
benefícios específicos quanto às relações de amizade e familiares, sugerindo um projeto com
maior duração.
Pesquisas anteriores indicaram que a prática musicoterápica reduziu
consideravelmente a apatia e agitação de indivíduos com demência (DILEO; BRADT, 2005;
HELMES; WIANCKO, 2006; HOLMES et al.,, 2006; LEDGER; BAKER, 2007) além de
98
6 LIMITAÇÕES
Este estudo teve como objetivo favorecer a reflexão acerca da temática trabalhada,
ampliando as possibilidades de cuidado ao idoso com DA e seu cuidador. Porém, o número
reduzido de participantes pode ser indicado como uma limitação. Para resultados
generalizáveis e mais robustos, sugere-se que pesquisas posteriores trabalhem com um
número maior de participantes.
Em relação às estratégias utilizadas, este estudo limitou-se à utilização de canções.
Pesquisas posteriores poderão ampliar as possibilidades e avaliar a utilização de outras
possíveis estratégias como: improvisação musical, movimentos corporais, dança, ou audição
musical. Isso poderá sugerir formas mais assertivas de se trabalhar nesse contexto.
Quanto aos participantes, sugere-se que as estratégias futuras também incluam os
cuidadores formais, demais familiares e/ou amigos, avaliando-se mais diretamente os
possíveis benefícios para estes grupos. Também se sugere avaliar as funções cognitivas dos
participantes com DA indicando se as estratégias neste modelo oferecem benefícios
significativos. Da mesma forma, pode-se incluir nos instrumentos que avaliem outras
variáveis da conjugalidade que não foram contempladas nesta pesquisa.
O local do estudo foi o ambiente domiciliar do casal. Isso contribuiu com alguns dos
benefícios encontrados, porém, também trouxe inconveniências, tais como, possíveis sons e
ruídos externos, visitas desavisadas, telefonemas, e animais domésticos. Futuras pesquisas
poderão ser realizadas em instituições frequentadas por cuidadores e idosos com demência,
para um ambiente mais controlado.
103
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados da pesquisa sugeriram que a utilização de canções foi uma estratégia que
possibilitou um engajamento ativo dos participantes nas estratégias, mesmo com as limitações
causadas pela DA. Os depoimentos dos cuidadores indicaram que as intervenções
possibilitaram momentos prazerosos, que amenizaram os sintomas comportamentais dos
cônjuges com DA e proporcionaram o resgate e a troca de lembranças pessoais através do
repertório utilizado. Resultados contemplando as relações familiares e de amizade indicaram
interesse e participação de pessoas próximas aos casais, porém, sugere-se uma prática mais
direta com esses membros visando avaliar resultados mais significativos.
Como musicoterapeuta, foi possível observar que as intervenções foram assertivas ao
gerar interesse e um maior engajamento do casal em atividades prazerosas, e, mesmo fora dos
atendimentos, os casais passaram a buscar músicas, discutir letras, cantar e assistir vídeos.
Intervenções futuras poderão focar mais nas queixas específicas do cuidador, como os
sintomas comportamentais mencionados, oferecendo ferramentas de escuta e intervenção que
possibilitem a melhor convivência.
Pesquisas posteriores também poderão aprofundar o conceito de musicoterapia
indireta, incentivando musicoterapeutas a compartilharem a visão da musicoterapia com
outros profissionais de uma equipe e familiares, o que poderá beneficiar a qualidade de vida
de pessoas com demência. Apesar da presença do musicoterapeuta ter se mostrado
importante, em sua ausência algumas estratégias podem facilitar o cuidado e o engajamento.
O que se espera é que intervenções mais assertivas voltadas para a qualidade das relações
sejam desenvolvidas e avaliadas, contribuindo com a saúde e bem-estar dos envolvidos de
forma integrativa e multidimensional.
104
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118
Nome: .........................................................................................................................
Idade: ............................................... Data: .......................................
Impressões do entrevistador:
Convidamos você para participar de uma pesquisa que tem o objetivo geral de verificar os
efeitos do trabalho com Canções em Musicoterapia na dinâmica conjugal de casais nos quais
um indivíduo é diagnosticado com demência no estágio inicial ou moderado. Você foi
convidado(a) a participar deste estudo porque tem mais de 18 anos, é responsável pelos
cuidados relacionados ao seu cônjuge que possui o provável/possível diagnóstico da doença
de Alzheimer e estar cuidando há 6 meses ou mais dele ou dela em domicílio.
Sua participação é voluntária e se dará por meio de um questionário e entrevista sem nenhum
tipo de pagamento por parte dos pesquisadores ou das instituições a que pertencem. Os
pesquisadores se comprometem a: estar disponíveis para responder perguntas, esclarecer
dúvidas e assegurar a manutenção do sigilo e privacidade dos participantes durante todas as
fases da pesquisa. Seu nome não será identificado. O preenchimento de todo o questionário e
entrevista deve levar aproximadamente 20 minutos a ser respondido antes e após as
intervenções musicoterapêuticas a serem realizadas uma vez por semana durante doze
semanas. Participar desta pesquisa poderá envolver riscos mínimos de natureza psicológica,
sendo que você poderá interromper ou se recusar a participar em qualquer momento, sem que
isto acarrete em qualquer penalidade ou prejuízo ao estudo. Para minimizar qualquer
desconforto e manter sua privacidade, o questionário será anônimo e deverá ser respondido
individualmente.
Possíveis benefícios oferecidos a partir da participação na pesquisa incluem: melhora dos
níveis de satisfação conjugal e satisfação com a vida; melhora dos níveis de positividade;
melhora do engajamento mútuo dos casais participantes. Se você aceitar participar, estará
favorecendo um maior conhecimento e auxílio para a ciência e para o aperfeiçoamento de
atendimentos a casos clínicos envolvendo a doença de Alzheimer. Os resultados da pesquisa
serão analisados e publicados apenas por propósitos acadêmicos e científicos (ex.: congressos,
artigos científicos).
Em caso de dúvidas sobre a pesquisa, você poderá obter informações com a professora Dra.
Deusivania Falcão e o pós-graduando Mauro Anastacio pelos correios eletrônicos:
deusivania@usp.br; mauroanastacio@gmail.com. Você também poderá entrar em contato
com o Comitê de Ética em Pesquisa da USP-EACH. O presente documento será assinalado
em duas vias, sendo que uma irá ficar com o participante e outra com o pesquisador
responsável. Ao assinalar a opção “aceito participar”, a seguir, você atesta sua anuência com
121
esta pesquisa, declarando que compreendeu seus objetivos, a forma como ela será realizada,
conforme descrição aqui efetuada.
___________________________
Assinatura do pesquisador
Declaro que, após convenientemente esclarecido pelo pesquisador e ter entendido o que me
foi explicado, consinto em participar do presente Projeto de Pesquisa e estou ciente que ficarei
com uma cópia desse Termo.
_________________________________
Assinatura do participante