Os Sonhadores de Bernardo Bertolucci Analisado. Um
Os Sonhadores de Bernardo Bertolucci Analisado. Um
Os Sonhadores de Bernardo Bertolucci Analisado. Um
UM
OLHAR BAKHTINIANO EM CINEMA
ISBN: 978-85-99680-05-6
REFERÊNCIA:
1 - INTRODUÇÃO
Assim como as obras poéticas dos mais antigos, como gregos e romanos que
adoravam se reportar a obras alheias para a criação das suas, o filme Os Sonhadores, a
nova obra de Bernardo Bertolucci compartilha desse gosto pela hoje tão saudada e
utilizada intertextualidade, motivo este causado pelo novo fenômeno teórico da
atualidade, Mikhail Bakhtin, que com suas teorias dialógicas fez surgir um novo campo
do conhecimento no estudo das obras literárias e que agora começa a transpor fronteiras
e adentrar no território do cinema.
No longa, o jogo de referências – objetos, cenas, falas, musicas, trechos de
filmes, situações – constitui os personagens, o Maio de 1968 e o cinema em si, e
amplifica sem lhe roubar o foco, a trama de alcova protagonizada por um belo e bizarro
triângulo amoroso encampado pelos loucos pela grande tela, Matthew (Michael Pitt),
Isabelle (Eva Green) e Theo ( Louis Garrel).
Há alusões escancaradas, tais quais uma nota de rodapé quer fossem incutidas
em diálogos explicativos, ora mais ocultas, fetiches para cinéfilos enciclopédicos como
este que vos fala. Assim, a obra do diretor italiano acaba, com isso, ganhando ares de
homenagem a arte cinematográfica e à cinefilia.
Vendo o filme por este prisma, podemos analisar aqui este sem-número de
citações que nos vem à mente e ao estudo da arte, recorrendo às teorias dialógicas de
Mikhail Bakhtin, este teórico que com suas teorias nos faz mergulhar no grande mistério
das vozes e tessituras internas que compõem as mais diversas criações do ramo literário
e agora, cinematográfico, e por outro lado, podemos ver o quanto a análise do discurso
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pode nos ajudar a identificar e costurar melhor estas referências e citações que emergem
de dentro do texto fílmico.
O glossário de citações e informações que será apresentado a seguir não tem a
pretensão de esgotar as citações que aparecem no filme, pela simples idéia de que são
muitas e que algumas deve ter passado despercebida aos olhos do analista, mas pode
ajudar o espectador e o estudioso que se propõe a ver este belo filme, a entender a teia
de referências armada por Bernardo Bertolucci.
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A linguagem desenvolveu-se, portanto, para tornar o cinema apto a
contar histórias; outras opções teriam sido possíveis, que o cinema
desenvolvesse uma linguagem cientifica ou ensaística, mas foi a
linguagem de ficção que predominou. Os passos fundamentais para a
elaboração dessa linguagem foram a criação de estruturas narrativas e a
relação com o espaço.
Note-se que o cinema então desenvolveu uma linguagem tão própria que
superou a da literatura em alguns pontos, o visual principalmente, e, portanto, pode ser
considerada uma reunião da arte literária de contar histórias e de elemento de ligação
com a mente humana ao passar para o visual esta história em si.
Veremos agora como a análise do discurso ajuda a compreender estas ligações
intertextuais que compõem o filme de Bernardo Bertolucci.
Um apartamento vazio. Dois ou três personagens que criam suas próprias leis
neste território livre. Música. Uma câmera que se move como se tivesse vida própria.
Estes são os elementos necessários para o diretor Bernardo Bertolucci revirar nossos
sentidos e usar o cinema como uma arma poderosa contra o convencionalismo. Estes
são os elementos que fazem de O último Tango em Paris e Os Sonhadores experiências
únicas na história do Cinema.
Bertolucci tinha 32 anos quando fez O Último Tango em Paris ; e 63 quando fez
Os Sonhadores . No primeiro filme, ele mergulha com seus personagens numa viagem
sem destino certo; no outro, ele os observa de longe, quase como um pai, ou como um
irmão mais velho. Em sua época, O Último Tango foi considerado um marco. Era a
primeira vez que os limites do sexo no cinema eram testados de forma tão explícita.
Acusado de pornografia (Marlon Brando e Bertolucci chegaram a ser condenados por
um tribunal italiano) e saudado como uma “mudança na face de uma forma de arte” pela
crítica americana Pauline Kael, o filme é uma experiência que não pode ser entendida
através dos parâmetros pelos quais julgamos a maioria dos filmes (trama, personagens,
conflito, etc.) É preciso vê-lo algumas vezes para ir além de sua superfície.
Os Sonhadores é, aparentemente, a história de amadurecimento de três jovens.
Um filme menos complicado, mais palatável, e, para alguns críticos, menos efetivo e
menos ousado; a obra de um antigo revolucionário que se transformou num “velho
voyeur”. Mas esta é uma leitura empobrecedora; O Último Tango e Os Sonhadores não
são excludentes, são complementares. Um filme é a imagem invertida do outro, ambos
se complementam como um quebra-cabeça.
Vinte e um anos separam os dois filmes. O primeiro, quando foi lançado em
1972, foi considerado obsceno para alguns e revolucionário para outros. Era o auge da
Revolução Sexual, e Bertolucci levava este fenômeno aos seus extremos. No filme,
Marlon Brando é Paul, um viúvo em crise após o suicídio da mulher, e Maria Schneider
é Jeanne, uma jovem francesa prestes a se casar com um estudante de cinema, vivido
por Jean Pierre Leaud, ator fetiche de François Truffaut – a escalação do ator parece ser
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uma crítica de Bertolucci à tendência francesa de querer “intelectualizar” todas as
experiências da vida; Leaud vive quase uma caricatura de um diretor da Nouvelle
Vague francesa. Marlon Brando e Maria Schneider protagonizam cenas sem paralelo no
cinema dito “sério”: fazem sexo depois de se conhecer a apenas cinco minutos (há quem
considere esta primeira relação sexual um estupro), fazem sexo sem se verem, fazem
sexo anal enquanto falam de Deus… e o mais importante: fazem sexo sem se
conhecerem. Desde o início, Marlon Brando deixa bem claro para Maria Schneider que,
naquele apartamento, não haverá nomes, não haverá passado, não haverá história
pessoal. Apenas sexo. Mas ao contrário de uma relação entre um cliente e uma
prostituta, ninguém dará dinheiro a ninguém. É quase como um experimento científico:
pode uma relação afetiva se basear não na troca de sentimentos, mas unicamente na
troca de fluidos corporais?
Em Os Sonhadores, a questão a ser respondida é: pode o sexo ser mais que uma
troca de fluidos corporais? Ou melhor, pode esta troca de fluidos transcender o animal e
chegar ao humano? Matthew (Michael Pitt), Isabelle (Eva Green) e Theo (Louis Garrel)
são três jovens cinéfilos que se conhecem durante as manifestações de Maio de 68 em
Paris, contra a expulsão de Henri Langlois da Cinemateca Francesa. Matthew é
americano; Isabelle e Theo são dois irmãos franceses, filhos de um casal abastado, que
prefere não se envolver na atitude “revolucionária” dos filhos. Quando estes pais
viajam, Isabelle e Theo convidam (melhor dizendo, “convocam”) Matthew a se mudar
para o apartamento deles, onde realizam jogos eróticos de cinefilia. Algum deles dá uma
“dica” de um filme clássico, e se o outro não perceber a deixa, tem que pagar um
“castigo” erótico. No início, Matthew é o “excluído” do jogo, o inocente, o “americano
puritano” em contato com os “liberais europeus”. Mas depois Bertolucci embaralha
estas cartas marcadas: nem Matthew é tão inocente, nem Isabelle e Theo são tão
experientes. A jornada dos três jovens é de autoconhecimento; trata-se de explorar os
limites da própria sexualidade, algo caro à geração dos anos 60.
Ambos os filmes têm um ponto em comum: o estilo de Bertolucci. A maneira
como ele move a câmera ou usa a música, por exemplo. Contra todos os manuais de
cinema, Bertolucci não compõe estes elementos para “acompanhar a trama”. Os
personagens às vezes vão para um lado, a câmera para outro. A música sobe em
momentos que não deveria ser tão alta, e desaparece quando menos se espera. É como
se a câmera fizesse uma coreografia com as emoções dos personagens; um tango
imaginário, onde, como na dança argentina, na maioria das vezes, é não vendo o
parceiro de dança que o descobrimos melhor, que adivinhamos seu movimento, que nos
jogamos em seus braços.
Os atores também não “representam”; Bertolucci parece não pedir a eles que
adotem os nomes que ele lhes dá, mas que lutem contra a personagem. Reside aí a
principal superioridade de Último Tango em relação a Os Sonhadores. No primeiro
filme, Bertolucci pôde contar com um dos mais inteligentes e instintivos atores do
cinema. Marlon Brando se joga sem amarras em seu personagem, se transforma nele;
podemos afirmar que O Último Tango em Paris é um filme tanto de Bertolucci quanto
de Brando. Já os atores que encarnam os Sonhadores (talvez por sua pouca experiência)
não voam tão alto. A diferença entre Brando e Michael Pitt, o ator americano que faz
Matthew, é a mesma diferença entre um Fusca e um Mercedes; se podemos medir a
performance de um ator a partir da sua capacidade de “mergulhar” no personagem,
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podemos dizer que Michael Pitt apenas enfiou sua cabeça na água de uma banheira,
enquanto Brando deu um mergulho em alto-mar.
Mas ainda assim, ambos são complementares. Extrapolando um pouco, podemos
considerar Paul e Matthew como o mesmo personagem, em fases diferentes de sua vida.
Matthew é o menos “engajado” do trio de Sonhadores. Ele se recusa a falar de política:
para ele, a revolução deve acontecer dentro de cada um, em relação à arte, ao cinema.
Paul, o personagem de Brando, é como se fosse um Matthew mais velho, fracassado em
sua vida, no casamento, em sua revolução pessoal; um homem que se fecha entre quatro
paredes para continuar a experiência interrompida daquele outro apartamento de sua
juventude. No apartamento de Os Sonhadores, crianças brincam de ser adultos; no
apartamento de O Último Tango, adultos brincam de ser crianças. O homem
revolucionário, fracassado, nega o nome, o relacionamento, o namoro; Paul não quer
saber o nome de Jeanne, quer voltar ao estado animal, negando a sociedade, a
civilização, vivendo longe de si mesmo, de sua dor, de seu passado.
O filme Os Sonhadores se apresenta como uma utopia. O apartamento é um
“paraíso” onde os jovens se refugiam da realidade, da guerrilha que explode lá fora. Em
Último Tango, o apartamento é o próprio palco da guerra contra a civilização; Paul e
Jeanne destroem todos os pilares sobre os quais a sociedade se sustenta: a família, a
religião, o amor romântico. Para Paul, é o fim da linha, o fim de sua história pessoal
para o retorno de uma nova; para Jeanne, é o início de uma nova história, sem nomes,
sem cultura, sem a obsessão de captar a realidade pela lente de uma câmera, sem
guardar a realidade como um porta-retratos, a única alternativa que seu namorado lhe
oferece. Quando Paul se recupera de suas cicatrizes, quando quer iniciar um
relacionamento formal com Jeanne, aí é ela quem se recusa: para Paul, a esperança
renasce, mas em Jeanne o cenário é de terra arrasada, não há mais o que construir.
Em ambos os filmes, os personagens não dançam conforme a música; é
exemplar a cena em que Paul e Jeanne vão a um salão de danças e, em meio a bailarinos
de tango, executam uma coreografia inventada, original, dodecafônica, sem ritmo. Para
Bertolucci, aqueles que ousam dançar fora do corpo de baile da sociedade, dos
parâmetros do certo e do errado, estão condenados a ser expulsos do salão.
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Os Sonhadores se enquadra nesse quesito ao encerrar em si vários tipos de
discursos que formam uma ideologia básica que montam a estrutura intertextual da obra
e lhe dão forma e sentido. Todas as citações, referenciais e elementos intertextuais
presentes no filme são totalmente inteligíveis porque as formações discursivas que estão
presentes no filme estão interligadas pela história em si, em suma, estão coesas e
coerentes.
O plano da heterogeneidade mostrada funda-se na suposição de várias vozes
possíveis numa mesma fala, sinaliza as condições de suas ocorrências e, com isto,
radicaliza essa relação dentro/fora do discurso. É nele mesmo que dois sentidos se
anunciam. Basta afinar a escuta ou a leitura. O enunciado não é instância única de
evidenciamento de tais vozes que divergem; e não se pode dizer que uma é exterior e a
outra é interior. Portanto, numa mesma fala de Os Sonhadores, o discurso nos remete
aos mais diversos entendimentos e sentidos. Uma citação pode fazer parte do interior da
trama ou do discurso ou resgatar algo que lhe é exterior e incuti-lo na sua tessitura.
O conceito de vozes que aqui empregamos é o mesmo que Bakhtin utilizou para
criar as análises literárias que hoje dão o tom nos estudos lingüísticos da
intertextualidade. No filme, estas diversas vozes compõem uma obra concisa e coesa, e
que resgatam diversos sentidos correlatos ou diversos à intenção original da trama.
Mikhail Bakhtin em sua extensa obra teórica nos deixou os pressupostos para
uma melhor análise da literatura e a compreensão do dialogismo como fator de
composição destas obras literárias. O que hoje tentamos fazer é passar estas teorias ao
campo do estudo e análise fílmicos, visto que a obra do teórico russo é tão abrangente
que atinge nossas expectativas em relação à análise do cinema pelo dialogismo.
Citarei aqui alguns trechos da obra de Bakhtin que servem de base a este
trabalho. Nosso teórico estuda as várias nuances do discurso utilizaremos aqui este
conhecimento. Ao analisar as relações dialógicas no discurso diz o teórico:
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recebe. Este é o poder do cinema como difusor de cultura e conhecimento. Não
precisamos nos debruçar em estudos para entende-lo. Precisamos apenas vê-lo.
Listarei aqui as referências e citações que estão presentes no filme e que fazem
parte do esquema que faz uma homenagem ao cinema mundial e retrata um período
histórico de grande importância no mundo contemporâneo, que é a Revolução estudantil
de 1968 na França. O diretor Bernardo Bertolucci utilizou vários elementos, falas,
objetos e filmes que compõem o enredo do filme somente enriquecendo-o e dando-lhe
nuances de obra de arte. Veremos agora estas citações:
Os cartazes colados a paredes homenageiam Jean-Luc Godard ( A Chinesa,
1967) e Nicholas Ray ( Amargo Triunfo, 1957), um dos diretores americanos
que inspiraram a Nouvelle Vague .
A grande dama da chanson francesa Edith Piaf fecha o filme cantando Non, Je
ne Regrette Rien e o fou chantant Charles Trenet comparece com La mer.
A Cinemateque Française, Meca dos cinéfilos, é citada no filme. Criada por
Henri Langlois e Georges Franju nos anos 1930, se constituiu em ponto de
convergência de nomes como Godard, François Truffaut, Eric Rohmer e Claude
Chabrol, criadores, no final dos anos 1950, da Nouvelle vague, movimento que
desprezava certa cinematografia francesa conformista e agregava influencias
americanas. Os sonhadores encena os protestos pelo afastamento do excêntrico
Langlois do comnado da instituição por André Malraux, ministro da Cultura de
Charles de Gaull, em fevereiro de 1968.
Grandes divas do cinema mundial foram citadas no filme. De brincadeira,
Isabelle tenta fazer o irmão Theo, adivinhar que a musica que murmura é a de A
Vênus Loira (1932), estrelado pela alemã Marlene Dietrich. Ao perder o jogo de
citações cinéfilas, Theo é obrigado a se masturbar na sua frente contemplando a
foto de Dietrich em O Anjo Azul (1930). Em outra cena, ao acordar Matthew,
Isabelle imita a passagem de Rainha Cristina (1933) em que a sueca Greta Garbo
memoriza os contornos de um quarto.
A musa dos anos 1960 Françoise hardy canta a música Tous lês Garçons et lês
filles (1962), o hino de quem é gauche na vida.
Jean-Luc Godard é o cineasta mais homenageado do filme. A cena em que se
apregoa o New York Herald Tribune alude a O Acossado (1959), e os
protagonistas homenageiam o diretor ao tentar quebrar o recorde estabelecido
pelos personagens de seu Bande à Part (1964), percorrendo o Louvre em
disparada. Godard é referência para Bertolucci, que considera a língua francesa
o idioma oficial do cinema.
Jean-Pierre Léaud, o ator que encarnou o mítico personagem do cinema francês
Antoine Doinel a partir dos 15 anos em Os Incompreendidos (1959) filme de
Truffaut e marco zero da Nouvelle Vague, aparece em cena original de 1968
lendo um panfleto contra o afastamento de Langlois assinado por Godard e refaz
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a cena como ficção, mais de 30 anos depois. Outro ator histórico, Jean-Pierre
Kalfon, que atuou em De Repente, num Domingo (1983), despedida do mesmo
Truffaut, também interpreta a si mesmo nos protestos no filme de Bertolucci.
O quadro de Eugéne Delacroix de 1830, La Liberte Guidant le Peuple, aparece
na casa de Theo e Isabelle. Aparece subvertido o original, pois o rosto de
Marilyn Monroe, ícone de Hollywood e da Pop Art, substitui o da Liberdade
sublevada.
Personagem de muitos filmes italianos, A lambreta aparece em Os Sonhadores.
Filmes como Roma Cidade Aberta (1945) de Rosselini, e Nós que nos
Amávamos Tanto (1974) de Ettore Scola que dão importância à lambreta, ela
aqui é homenageada em uma Paris Sessentista.
O maio de 1968 foi o ano de ebulição estudantil em todo o mundo. O evento de
1968 na França conseguiu balançar o governo de Charles De Gaulle. A revolta
começou na Universidade de Nanterre, com os estudantes questionando as
estruturas do ensino superior. Maio viu confrontos com a polícia, barricadas, a
adesão do operariado e uma greve geral. A violenta agitação se arrastou até
meados de junho, quando De Gaulle triunfou nas eleições que convocou após
dissolver a Assembléia Nacional.
Mao Tsé Tung é muito citado e aparece muito no filme. O livro Vermelho, um
cartaz e um busto de Mao lembram o prestigio que a revolução permanente
proposta pelo Maoismo obteve entre jovens intelectualizados europeus e até
mesmo cineastas – Godard foi um dos que aderiram ao preceito. Criticado pelos
que pendiam para a União Soviética e temendo perder o poder, mão
desencadeou em 1966 a chamada Revolução Cultural, que pretendia reorientar
os rumos revolucionários da China e rechaçar opositores. Ela durou até sua
morte em 1976 e cooptou jovens estudantes e trabalhadores, o que Bertolucci
retrata em O Ultimo Imperador (1987).
Comparecem á trilha sonora do filme, ídolos americanos que morreram cedo,
depois de enformar uma poética da transgressão que acabou em overdose; Jimi
Hendrix (1942-1970), Janis Joplin (1943-1970) e Jim Morrison (1943-1971).
Outro que compõe a trilha sonora de artistas maericanos no filme é Bob Dylan.
As pichações que tomaram Paris no maio de 1968 aparecem no filme em duas
lapidares: “A liberdade é o direito ao silêncio” e Gozem sem Entraves”.
A revista criada por cineastas na França na década de 1950, Cahiers du Cinema,
é citada brevemente no filme.
Sobre a mesa do quarto de matthew, O livro Tri to Hanói (1968) de Susan
Sontag, compõe uma discreta homenagem à ensaísta e escritora norte-americana
sempre politicamente engajada.
A guerra do Vietnã é citada, quando o francês Theo cobra uma posição ciritica
do visitante norte-americano Matthew acerca do conflito que envolve o país
deste. A guerra do Vietnã foi um revés bélico que durou de 1964 a 1975, e
iniciou-se quando a artilharia do Vietnã do Norte comunista atingiu dois
destróieres dos Estados Unidos.
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O filme Paixões que Alucinam, de Sam Fuller é o primeiro filme a ser citado na
obra de Bertolucci.
Theo e Matthew discutem sobre Chaplin e Keaton, dois grandes comediantes
norte americanos; uma singela homenagem ao cinema de comédia.
Citação a Jerry Lewis na fala de Theo.
O grande dançarino e ator Fred Astaire é citado em um dos jogos de cinefilia de
Theo e Isabelle por sua aparição no filme, O Picolino.
O filme Scarface (1932) de Howard Hawks é citado em outro jogo de cinefilia
de Theo e Isabelle.
Isabelle se veste como a Estatua grega Vênus de Milo em passagem do filme.
Aqui citamos a maioria dos elementos referenciais que aparecem estão visualmente
claros na tela de Os Sonhadores. Um trabalho mais profundo reconheceria outros tantos,
mas ficaremos por aqui nesta análise intertextual e dialógica.
7 - CONCLUSÃO.
Esperamos que este trabalho tenha feito suscitar na mente dos estudiosos a
possibilidade do estudo dialógico e da lingüística textual acerca do trabalho de análise
fílmica. Sempre que vemos um filme e nos deparamos com algo conhecido, seja uma
fala, uma imagem, um objeto, por menor que seja o detalhe, este detalhe não está ali
naquela cena sem um motivo aparente.
Os estudos de Bakhtin bem provam que a dialogicidade de uma obra não permite
que elementos estejam soltos no contexto de uma obra e sem uma razão ou sentido
aparente. O que aqui fizemos foi levantar os diversos elementos que compões a tessitura
dialógica e discursiva do filme Os Sonhadores. Portanto, ao se analisar um filme
ganhamos sempre que nos dispomos a vê-lo com outros olhos, com olhos de críticos e
de analistas da linguagem que somos.
A linguagem é riquíssima no cinema e é nosso dever resgata-la á luz da ciência
lingüística, como profissionais que somos e como amantes de uma arte que necessita ser
divulgada e ainda mais estudada. Filmes como Os Sonhadores são um bom exemplo de
como podemos extrair sentido de uma obra cinematográfica. Esperamos que outras
análises venham e que mais e mais o cinema venha a ser analisado como referencial
discursivo e lingüístico. Este é o nosso objetivo.
REFERÊNCIAS
BERNADET, Jean Claude. O que é Cinema. 5ª Ed. São Paulo. Ed. Brasiliense. 1983
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BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à Análise do Discurso. 8ª Ed.
Campinas,SP . Editora da Unicamp. 2002.
CLARK, Katerina & HOLQUIST, Michael. Mikhail Bakhtin. São Paulo. Ed.
Perspectiva. 1998.
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