0% acharam este documento útil (0 voto)
64 visualizações164 páginas

Dissertaaçao Eliane - Cota - Florio

Dissertação de Mestrado
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
64 visualizações164 páginas

Dissertaaçao Eliane - Cota - Florio

Dissertação de Mestrado
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 164

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN

FACULDADE DE EDUCAÇÃO – FE
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – DE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – POSEDUC

ELIANE COTA FLORIO

ASCENSÃO SOCIAL DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL


DE CAMADA POPULAR: DA EDUCAÇÃO BÁSICA À UNIVERSIDADE

MOSSORÓ/RN
MAIO - 2019
ELIANE COTA FLORIO

ASCENSÃO SOCIAL DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL


DE CAMADA POPULAR: DA EDUCAÇÃO BÁSICA À UNIVERSIDADE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Educação - POSEDUC da
Universidade do Estado do Rio Grande do
Norte – UERN, como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em Educação.
Linha de pesquisa: Práticas Educativas,
Cultura Diversidade e Inclusão.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª, PHD Ana Lúcia de


Oliveira Aguiar.

MOSSORÓ/RN
MAIO – 2019
© Todos os direitos estão reservados a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. O conteúdo
desta obra é de inteira responsabilidade do(a) autor(a), sendo o mesmo, passível de sanções
administrativas ou penais, caso sejam infringidas as leis que regulamentam a Propriedade Intelectual,
respectivamente, Patentes: Lei n° 9.279/1996 e Direitos Autorais: Lei n° 9.610/1998. A mesma
poderá servir de base literária para novas pesquisas, desde que a obra e seu(a) respectivo(a) autor(a)
sejam devidamente citados e mencionados os seus créditos bibliográficos.

Catalogação da Publicação na Fonte.


Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

F638a FLORIO, ELIANE COTA


ASCENSÃO SOCIAL DE
ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA NÃO
PERCEPTÍVEL DE CAMADA POPULAR: DA
EDUCAÇÃO BÁSICA À UNIVERSIDADE. / ELIANE COTA
FLORIO. - MOSSORÓ/ RN, 2019. 161p.

Orientador(a): Profa. Dra. ANA LÚCIA DE OLIVEIRA


AGUIAR.
Dissertação (Mestrado em Programa de
Pós-Graduação em Educação). Universidade do Estado
do Rio Grande do Norte.

1. ASCENSÃO SOCIAL. DEFICIÊNCIA NÃO


PERCEPTÍVEL. INCLUSÃO. I. AGUIAR, ANA LÚCIA DE
OLIVEIRA. II. Universidade do Estado do Rio Grande do
Norte. III. Título.

O serviço de Geração Automática de Ficha Catalográfica para Trabalhos de Conclusão de Curso


(TCC´s) foi desenvolvido pela Diretoria de Informatização (DINF), sob orientação dos bibliotecários do
SIB-UERN, para ser adaptado às necessidades da comunidade acadêmica UERN.
ELIANE COTA FLORIO

ASCENSÃO SOCIAL DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL


DE CAMADA POPULAR: DA EDUCAÇÃO BÁSICA À UNIVERSIDADE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Educação - POSEDUC da
Universidade do Estado do Rio Grande do
Norte – UERN, como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em Educação.
Linha de pesquisa Práticas Educativas, Cultura
Diversidade e Inclusão.

APROVADA EM: _____/_____/_____

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________________________
Dr.ª Ana Lúcia de Oliveira Aguiar PhD em Educação - UERN/FE/POSEDUC
(Orientadora)

_________________________________________________________________
Prof.º, Dr.º Emerson Augusto de Medeiros- UFERSA
(Examinador Externo)

__________________________________________________________________
Prof.ª, Dr.ª Normandia de Farias Mesquita Medeiros - UERN/FE/POSEDUC
(Examinadora Interna).

_________________________________________________________________
Prof.ª, Dr.ª Giovana Carla Cardoso de Amorim - UERN/FE/ POSEDUC
(Examinadora Interna).

_______________________________________________________________
Prof.ª, Dr.ª Rosa Maria Barros Ribeiro - UECE/CED/PPG
(Examinadora Externa).
A Deus, por me proporcionar a vida. Aos meus
pais, por me ensinarem a amar e adorar a
DEUS em primeiro lugar, bem como a amar e
respeitar as pessoas. Ao meu esposo, pelo
amor que demostra a cada instante por mim.
Aos meus filhos, Mateus e Lucas, que têm
mostrado que nasceram para adorar a DEUS,
sendo essa a minha maior alegria. Em especial,
à professora, Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar,
PhD em Educação, por confiar em ser minha
orientadora.
AGRADECIMENTOS

A DEUS, a razão da minha vida. “Porque dele, e por ele, e para ele são todas as coisas;
glória, pois, a ele eternamente.” (ROMANOS 11, 36).
Em especial, agradeço à minha orientadora, Ana Lúcia Oliveira Aguiar, uma mulher
dotada de valores, sábia e com uma mente e atitudes brilhantes. Usada pelo nosso Deus para
abençoar a mim e muitas pessoas, com amor e humildade, através da sua experiência na
inclusão de todos. “Você conhece alguém que faz bem o seu trabalho? Saiba que ele é melhor
que a maioria e merece estar na companhia de reis.” (PROVÉRBIOS 22, 29).
À minha amada mãe e ao meu pai, que sempre me educaram nos caminhos do Senhor.
Com muito amor, sempre me ensinaram a respeitar, amar a todas as pessoas, sem
discriminação. Cresci ouvindo deles um versículo especial, mesmo durante o mestrado.
“Entrega o teu caminho ao Senhor; confia nele, e ele tudo fará.” (SALMOS 37, 5).
Ao meu esposo, Geraldo Florio, meu melhor amigo e companheiro de todas as horas.
Sempre esteve ao meu lado, me ajudando, sem medir esforços, sempre com amor. Deus o
escolheu para mim, com todo carinho, dando-me um grandiosíssimo presente. Tenho certeza
de que: “As muitas águas não podem apagar este amor, nem os rios afogá-lo; ainda que
alguém desse todos os bens de sua casa pelo amor, certamente o desprezariam.” (CÂNTICOS
8,7).
Aos meus filhos, meu primogênito, Mateus Florio, e ao meu caçula, Lucas Florio, que
a todo instante me incentivam e me ajudam com palavras e correções sábias. Agradeço a
DEUS por ter-nos dado vocês. Não existem filhos melhores. “Os filhos são herança do
Senhor, uma recompensa que ele dá.” (SALMOS 127, 3).
Agradeço de coração a José, pelo exemplo de vida que tem me ensinado a buscar e por
me incentivar a lutar e nunca desistir dos meus sonhos. Pelos horários a mim concedidos por
ocasião das entrevistas e por sempre ser pontual, disposto a ajudar em todas as horas.
Confesso que vibrei com suas narrativas, que me proporcionaram ser uma pessoa melhor a
cada dia. Em cada encontro recebia um novo aprendizado.
Sou grata também às demais pessoas que foram entrevistadas durante a pesquisa e
contribuíram de forma direta e indireta para a construção deste trabalho.
Às professoras Lia Matos Brito de Alburqueque, Emerson Augusto de Medeiros,
Giovanna Carla Cardoso de Amorim, Rosa Maria Barros Ribeiro e Normandia de Farias
Mesquita Medeiros, que, com tanto carinho, aceitaram ser meus avaliadores.
À Prof.ª Dr.ª Ady Canário, a quem tenho prazer de ressaltar a importância em minha
vida acadêmica, pois foi ela quem me informou por WhatsApp sobre o processo de inscrição
para a primeira disciplina no POSEDUC que cursei em caráter especial, contribuindo para que
eu reencontrasse o caminho da Educação e Inclusão.
À minha amiga e prof.ª Dr.ª Márcia Betânia, que nesse percurso ministrou uma
disciplina contribuindo para o meu conhecimento.
Ao meu amigo Stênio de Brito, sempre disposto a me ajudar com suas palavras
incentivadoras. Gratidão também a minha amiga Francinilda Honorato, Magnólia Costa e a
todos os outros amigos de mestrado. Amo todos vocês.
À minha amada amiga e irmã em Cristo Ariane Linhares, que se debruçou para fazer a
correção destas escritas. “O homem de muitos amigos deve mostrar-se amigável, mas há um
amigo mais chegado do que um irmão.” (PROVÉRBIOS 18, 24).
À Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) e todos os funcionários do
Programa de Pós-graduação em Educação (POSEDUC), que me receberam de braços abertos
e contribuíram para que eu pudesse buscar uma continuidade nos meus estudos com muita
qualidade e eficácia.
Em especial, agradeço à Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas (DAIN) da UERN e
toda sua equipe, que, além de me acompanhar e incentivar a continuar meus estudos em nível
de mestrado, foram suporte durante a realização desta pesquisa.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),
fundação vinculada ao Ministério da Educação (MEC) do Brasil, que atua na expansão e
consolidação da pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) em todos os estados do
país. Sou grata por terem me proporcionado condição de investir na minha pesquisa.
Porque sou eu que conheço os planos que
tenho para vocês, diz o Senhor, planos de fazê-
los prosperar e não de lhes causar dano, planos
de dar-lhes esperança e um futuro melhor.
(JEREMIAS 29, 11).
RESUMO

As experiências descritas neste trabalho, intitulado Ascensão social de estudantes com


deficiência não perceptível de camada popular: da Educação Básica à Universidade,
representam o empoderamento e a autonomia de sujeitos com deficiências não perceptíveis
que lutam pela concretização do sonho de ingressar em uma universidade e alcançar êxito
social e profissional. São histórias da vida de um aluno com deficiência múltipla, matriculado
no curso de Administração da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). O
trabalho apresentado foi desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Educação
(POSEDUC) e se relaciona à Linha de Pesquisa “Práticas Educativas, Cultura, Diversidade e
Inclusão”. Seu objetivo é mostrar a ascensão social desse estudante com deficiência não
perceptível e de camada popular por meio dos estudos, desde a educação básica à
universidade. A abordagem utilizada foi a qualitativa e como método de investigação optou-se
pela pesquisa (auto)biográfica. Como resultado observou-se que é possível o aluno com
deficiência não perceptível, mesmo sendo de camada popular e enfrentando dificuldades e
obstáculos, cursar uma universidade e alcançar ascensão social através dos estudos. É
importante frisar que essa conquista pode ser melhor alcançada se as universidades, em
conformidade com a Constituição Federal e a Lei Brasileira de Inclusão nº 13.146/2015 - LBI,
buscarem ajudar esse aluno, dando-lhe suporte com profissionais e técnicos competentes, bem
como promovendo adequações e adaptações em seus espaços, materiais e métodos. Somente
com suas necessidades específicas atendidas, os alunos com esse perfil permanecerão na
universidade e alcançarão a ascensão social através dos estudos.

Palavras-chave: Ascensão social. Deficiência não perceptível. Inclusão.


ABSTRACT

The experiences relate in this study, titled Social ascension of students non-perceptible
deficiency from the popular layer: from Basic Education to the University, describes
empowerment and autonomy of people with non-perceptible deficiency struggling to achieve
the dream of entering a university and achieving social and professional success. Are stories
of the life of a student with multiple disabilities, enrolled in the administration college of the
Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN). The work presented was developed
in the Programa de Pós Educação (POSEDUC) and relates to the research Line "Educational
Practices, Culture, Diversity and Inclusion". That objective was to understand the social rise
of this student with a non-perceptible deficiency and popular layer through the studies, from
basic education to university. The approach used was qualitative and as a research method we
opted for the (auto)biographical research. As a result it has been observed that it is possible
for the student with a non-perceptible deficiency, even if he is from a popular layer and facing
difficulties and obstacles, to attend a university and to reach social ascension through studies.
This achievement can be better achieved if the universities, in accordance with the Federal
Constitution and the Brazilian Inclusion Law 13,146 / 2015 - LBI, seek to help this student by
providing support with competent professionals and technicians, as well as promoting
adjustments and adaptations in their spaces, materials and methods. By having their specific
needs met, students with this profile will remain in the university and achieve social ascension
through study.

Keywords: Social ascension. Deficiency not noticeable. Inclusion.


LISTA DE FOTOS

Foto 1 – Eliane Cota Florio em visita à Canoa Quebrada-CE. ................................................. 22


Foto 2 – Eu, meu pai e minha mãe. .......................................................................................... 24
Foto 3 - Terreno onde foi construído o prédio da minha escola. .............................................. 36
Foto 4 - Meu casamento religioso. ........................................................................................... 37
Foto 5 - Eu e meu primeiro filho, Mateus. ............................................................................... 38
Foto 6 - Eu e meu segundo filho, Lucas. .................................................................................. 39
Foto 7 - Professora Ana Lucia Oliveira Aguiar e eu, na UERN, em sala de aula. ................... 55
Foto 8 - Grupo participante do Projeto de Extensão Histórias de vida em música, teatro e
desenhos – Vozes Silenciadas. ................................................................................................. 61
Foto 9 - Encontro dos alunos do POSEDUC com ex-aluno de Paulo Freire em Angicos. ...... 62
Foto 10 - Aula de Campo Canoa Quebrada .............................................................................. 65
Foto 11 – Prof.ª Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar em visita à Comunidade do Rosado ............ 69
Foto 12 - Lista de equipamentos necessários a pessoas com deficiência física. ...................... 76
Foto 13 – Impressora em Braille .............................................................................................. 76
Foto 14 - Máquina Perkins Brailer ........................................................................................... 77
Foto 15 - Cadeiras de Rodas ..................................................................................................... 77
Foto 16 - Bengalas .................................................................................................................... 77
Foto 17 - Materiais didáticos voltados para o trabalho com alunos com deficiências. ............ 78
Foto 18 - Palestra da DAIN – FAEF Faculdade de Educação Física/UERN ........................... 87
Foto 19 - José na UERN ......................................................................................................... 113
Foto 20 - Símbolo da deficiência não perceptível .................................................................. 117
Foto 21 - José desenvolvendo atividade no CREE- MOS ...................................................... 120
Foto 22 - Escola Estadual Jardim de Infância Modelo – Educação Infantil........................... 123
Foto 23 - Escola de Arte – Ensino Fundamental .................................................................... 123
Foto 24 - Escola Jerônimo Rosado – Ensino Médio .............................................................. 124
Foto 25 - Foto de José no CREE-MOS ................................................................................. 136
Foto 26 - José e sua orientadora e diretora do DAIN ............................................................. 138
Foto 27 – Momento de entrevista com José ........................................................................... 140
Foto 28 - Apresentação de José no I Congresso de Direito da UERN ................................... 147
LISTA DE QUADROS E GRÁFICOS

Quadro 1 - Cronograma de ações da DAIN/UERN (2017 – 2019). ......................................... 73


Quadro 2 - Cronograma de ações para a aquisição de equipamentos para a DAIN (2017-
2018). ........................................................................................................................................ 75
Quadro 3 - Cronograma de ações para aumentar o quadro de profissionais habilitados para
atuação junto aos discentes com deficiência. ........................................................................... 79
Quadro 4 - Cronograma de ações para dotar a UERN de mobiliários para pessoas com
deficiências. .............................................................................................................................. 80
Quadro 5 - Cronograma de ações para ampliar a participação dos discentes, docentes e
técnicos nos programas formativos e nas discussões voltadas para a diversidade humana. .... 81
Quadro 6 – Eventos de apresentação do Projeto de inclusão da UERN................................... 89
Quadro 7 - Rodas de estudos da LBI realizadas em Mossoró.............. .................................. 101
Quadro 8 - Rodas Itinerantes realizadas pela DAIN .............................................................. 103
Quadro 9 - Leis que beneficiam as pessoas com deficiência. ................................................ 108
Quadro 10 - Histórico Escolar de José ................................................................................... 144
Quadro 11 – Algumas produções escritas de José .................................................................. 145
Quadro 12 – Publicações de José ........................................................................................... 146

Gráfico 1 - População com deficiência auditiva ou visual, no Brasil, em 2010....................... 97


LISTA DE SIGLAS

ABNT- Associação Brasileira de Normas Técnicas


ADVM- Associação de deficiente Visual de Mossoró
AFE- Associação Fluminense de Educação
AGECOM- Agência de Comunicação da Universidade do Rio Grande do Norte
APAE- Associação de pais e amigos dos excepcionais
ASMO- Associação de Surdos de Mossoró
CADV- Centro de Apoio ao Deficiente Visual
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior
CAS- Centro Estadual de Capacitação de Educadores e Atendimento ao Surdo
CCAA- Centro de Cultura Anglo Americana
CEP- Comitê Nacional de Ética e Pesquisa
CF- Constituição Federal
CNPq- Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CDSL- Colégio Diocesano de Mossoró
CONEDU - Congresso Nacional de Educação
CONEP - Comissão Nacional de Ética e Pesquisa
CONSEPE- Sub coordenadoria de Educação Especial
CREE-MOS - Centro Regional de Educação Especial de Mossoró
CIT- Bacharelado em Ciências e Tecnologia
CTI- Centro de tratamento Intensivo
DAIN - Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas
ERNAB - Encontro Regional de Narrativas (Auto)Biográficas
FACED - Faculdade de Educação
FAEF- Faculdade de Educação Física
FAFIC - Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais
FE - Faculdade de Educação
GEPEMABI - Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação, Memórias (Auto)Biográfica e
Inclusão
IBGE- Instituto Brasileiro de Estatística
IES- Instituto de Ensino Superior
IFRN - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte
LBD- Lei Diretrizes e Bases Nacionais
LBI- Lei Brasileira de Inclusão
LEDOR- Orientação e Mobilidade
LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais
OAB- Ordem dos Advogados (subseção Mossoró)
ONU- Organizações das Nações Unidas
PAFOR- Programa Nacional de Formação de Professores da Educação Básica
PET- Programa de Educação Tutorial
PIBIC- Projeto Institucional de Iniciação Cientifica
POSEDUC/UERN - Programa de Pós-Graduação em Educação
PROEG- Nacional de Pesquisas (Auto) Biográficas e História de Vida
PROEX - Pró-reitora de Extensão
PROPEG- Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação
RJ- Rio de Janeiro
RN - Estado do Rio Grande do Norte Faculdade de educação física
SENACEM - Seminário Nacional do Ensino Médio
SENAI- Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SENAPAHV- I Seminário
STFAD- Faculdade de Direito do Rio Grande do Norte- Semana Jurídica
SUESP- Secretaria de Educação Especial
TCC - Trabalho de Conclusão de Curso
TCM- TV a cabo Mossoró
TDAH- Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade
UERJ - Universidade do Estado do Rio de Janeiro
UERN - Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
UFMA- Universidade Federal do Maranhão
UNESCO- Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
UNP- Universidade Potiguar
SUMÁRIO

NEM SEMPRE FOI FÁCIL, MAS CADA DESAFIO TORNOU-ME MAIS FORTE E
ADMIRADORA DA VIDA ................................................................................................................ 14
1 A LABUTA DA VIDA E A CONSTRUÇÃO DA FORMAÇÃO: VIVÊNCIAS E
PERSPECTIVAS DE UMA PEDAGOGA ....................................................................................... 23
1.1 NARRATIVAS DE EXPERIÊNCIA: INFÂNCIA, FORMAÇÃO E APRENDIZADOS ............. 24
1.2 RELATOS DE SUPERAÇÃO E ALTERIDADE DE UMA PEDAGOGA COM DEFICIÊNCIA
NÃO PERCEPTÍVEL ........................................................................................................................... 44
1.3 INCLUIR E SER INCLUÍDA: O MEU CAMINHAR COM A INCLUSÃO ......................... 50
1.4 A PESQUISA (AUTO)BIOGRÁFICA COMO PONTO DE PARTIDA PARA A (AUTO)
FORMAÇÃO ........................................................................................................................................ 60
2 A DAIN/UERN E SUAS AÇÕES INCLUSIVAS: A LUTA PELA EFETIVAÇÃO DE
DIREITOS DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA................................................................... 70
2.1 PERCURSO HISTÓRICO DA INCLUSÃO NA UERN: NAS TRILHAS EM PROL DA
EFETIVAÇÃO DE DIREITOS ............................................................................................................ 71
2.2 POLÍTICAS DE INCLUSÃO PARA ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA RUMO À
ASCENÇÃO SOCIAL .......................................................................................................................... 83
2.3 POSSIBILIDADES E CONQUISTAS: SUPERAR OBSTÁCULOS E QUEBRAR BARREIRAS
ATITUDINAIS, PROCEDIMENTAIS E ARQUITETÔNICAS ......................................................... 91
2.4 AS RODAS DE ESTUDOS SOBRE A LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO (LBI): DIÁLOGOS E
DEBATES NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO EM MOSSORÓ/RN ............................................. 99
3 OLHARES SOBRE AS EXPERIÊNCIAS INDIVIDUAIS E COLETIVAS: NARRATIVAS
DE UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL DE CAMADA POPULAR .... 114
3.1 EU NÃO SOU DEFICIENTE, SOU PESSOA COM DEFICIÊNCIA: O QUE É DEFICIÊNCIA
NÃO PERCEPTÍVEL? ....................................................................................................................... 115
3.2 FAMÍLIA, ESCOLA E RELAÇÕES SOCIAIS: DESAFIOS E SUPERAÇÕES DO ALUNO
COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL ..................................................................................... 122
3.3 AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DO ATENDIMENTO AOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA E
A ASCENSÃO NO CAMINHAR COM OS ESTUDOS ................................................................... 133
3.4 AS NARRATIVAS (AUTO)BIOGRÁFICAS DE UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA NÃO
PERCEPTÍVEL NA ACADEMIA: RESISTIR, PURGAR E REIVINDICAR ................................. 140
NA TRILHA DA ASCENÇÃO SOCIAL. É POSSÍVEL SONHAR ATRAVÉS DOS ESTUDOS!
............................................................................................................................................................. 151
REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS ............................................................................................... 158
Nada pode calar um adorador

Adorador é tudo o que eu sou


Adorador, assim Deus me formou
E quem poderá calar a voz de um coração?
Se eu subir aos céus, eu sei que lá estás
Se eu mergulhar no mais profundo mar
Nunca poderei me ausentar do Teu olhar

Tu és o Deus que me sonda


Tu és o Deus que me vê
Não tenho todas as respostas
Mas de uma coisa sei
Por toda a minha vida te adorarei

Adorar é o que sei


Adorar é o que sou
Nada pode calar um adorador
Não existem prisões
Que contenham a voz de quem te adora, oh, Senhor!

Se eu vencer (te adoro)


Se eu perder (te adoro)
Se eu subir (te adoro)
Se eu descer (te adoro)
Te adorar é o meu prazer
Minha força vem do Senhor
Nada pode calar um adorador

(EYSHILA, 2009).
14

NEM SEMPRE FOI FÁCIL, MAS CADA DESAFIO TORNOU-ME MAIS FORTE E
ADMIRADORA DA VIDA

Algumas oportunidades na vida nos são dadas e não podemos deixar passar usando
desculpas como: não posso, não tenho tempo, não tenho dinheiro, não tenho capacidade, não
tenho experiência, ou mesmo deixarei para depois, amanhã eu faço. Precisamos de tão pouco
para ser felizes, mas até que saibamos dessa verdade, passamos por muitas experiências na
vida.
Nesta dissertação, intitulada Ascensão social de estudantes com deficiência não
perceptível de camada popular: da Educação Básica à Universidade, mostro, através do
método (auto)biográfico, a trajetória de vida de um sujeito com deficiência não perceptível
que alcançou êxito social e profissional pelos estudos. Revelo ainda a importância das
instituições que contribuem para que alunos assim alcancem esse tão sonhado sonho. Ressalto
também o que é a pessoa com deficiência não perceptível, quais os obstáculos encontrados e
quais as superações alcançadas. Mostro o trabalho dentro das instituições para dar apoio a
esses alunos.
Apoiada na Constituição Federal de 1988 e na LBI Lei Brasileira de Inclusão
13.146/2015 relato o trajeto e a busca pelos direitos e garantias fundamentais que, há anos,
com exigência do povo, vêm, de forma discreta, ajudando esses alunos a estudarem em
instituições com o objetivo de alcançar êxito social e profissional através do estudo.
O objetivo da pesquisa é compreender a ascensão social e profissional de estudantes
com deficiência não perceptível, de camada popular, por meio dos estudos, desde a educação
básica à universidade. O desejo pela temática está atrelado à minha história de vida e à minha
luta rumo a inclusão, uma vez que por ser portadora de deficiência não perceptível passei por
muitas lutas, preconceitos e discriminação. Narro o meu percurso entre o ensinar, o aprender,
o conviver através da (auto)biografia. Falo do meu nascimento, infância, adolescência,
juventude e de minha luta pela ascensão social no decorrer da vida. Conto minhas conquistas
depois de ter vencido os percalços encontrados na caminhada com a inclusão. Se necessário,
viveria todas novamente.
Na busca pelo que Deus tem me reservado, cheguei ao mestrado em Educação, no
Programa de Pós-graduação em Educação (POSEDUC) da Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte (UERN). Me deparei com uma pessoa demasiadamente humana, humilde e
cheia de sabedoria, refiro-me à professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar, PhD em Educação,
15

minha orientadora. Ela me proporcionou essa viagem linda, através da continuidade dos meus
estudos.
A Bíblia, meu livro preferido, nos fala, em Provérbios 16:3: “Consagre ao Senhor tudo
o que você faz, e os seus planos serão bem sucedidos”. Como sou uma pessoa cristã, acredito
que foi Deus quem me deu essa orientadora que não pensa em si, mas sempre nas outras
pessoas. Ela pratica inclusão com amor, dedicação e responsabilidade.
A pesquisa que exponho corrobora, então, a discussão da prática inclusiva de alunos
com deficiência não perceptível conforme a política de inclusão, através das ações da
Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas (DAIN), vinculada à Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte (UERN), para a efetivação dos direitos dos seus estudantes. Mostro,
portanto, o caminhar histórico da UERN rumo às conquistas em prol da efetivação de direitos,
políticas de inclusão para estudantes com deficiência através da ascenção social pelo estudo.
Com equipamentos e adequações para cada tipo de especificidade de deficiencia, a
DAIN possui uma equipe técnica multiprofissional que valoriza a educação e a inclusão de
forma séria e eficaz. Ela prima pelas possibilidades e conquistas para superar obstáculos e
quebrar barreiras atitudinais, procedimentais e arquitetônicas.
Para finalizar, menciono como uma das atividades da DAIN as rodas de estudos sobre
a Lei Brasileira de Inclusão (LBI): diálogos e debates na perspectiva da inclusão em
Mossoró/RN. Ademais, narro os percursos de um estudante com deficiência não perceptível,
de camada popular, que conseguiu ascender socialmente pelos estudos, desde a educação
básica à universidade.
Mediante as narrativas (auto)biográficas, que contribuem com a história de vida e
experiências de um estudante de camada popular com deficiências não perceptíveis, narro sua
incansável luta para alcançar uma ascensão social através do ensino. Mostro seu
empoderamento e esperança na conquista do seu êxito estudantil. Com uma força capaz de
superar todos os obstáculos para galgar um espaço em uma sociedade muitas vezes
preconceituosa para com a pessoa com deficiência não perceptível, o sujeito da pesquisa se
revela um ser que resistiu, purgou e reivindicou. Ele fala de sua família, amigos, trabalhos e
lugares percorridos na educação para alcançar todas as suas conquistas, as quais o fizeram
recuperar sua autoestima e confiança.
Ao refletir sobre a vida desse sujeito pude pensar sobre minha própria trajetória. Pude
conquistar esta dissertação, que emergiu da luta em mostrar a importância de incluir e ser
incluída; de aprender e doar-se para obter uma continuidade nos estudos. Pude perceber a
importância de quebrar as barreiras atitudinais e de mostrar aos outros que a ascensão social
16

através do estudo é possível. Aprendi a considerar que a questão de educação é humanitária e


que não podemos confundir a situação social da pessoa com a sua deficiência. Devemos
entender que essa deficiência não lhe impede de alcançar êxito social. Sim, sua condição
física, motora e intelectual dificultam o caminhar, mas por meio de adaptações de materiais e
didática podemos proporcionar meios para que haja um aprendizado.
É preciso ressaltar que este trabalho traz algo novo, pois quando foi feito o Estado da
Arte, em meio a tantos conhecimentos presentes nos trabalhos pesquisados sobre a temática,
entre os anos 2013 e 2017, não encontrei nenhuma pesquisa que falasse sobre a pessoa com
deficiência não perceptível. Isso me impulsionou a dar continuidade à pesquisa e à divulgação
das deficiências não perceptíveis, para que a sociedade não tenha um olhar discriminatório ou
vexatório quando, por exemplo, vir uma pessoa sem deficiência visível em uma vaga de
deficiente, seja um cadeirante, um amputado ou mesmo alguém com deficiência não
perceptível.
Todo aprendizado e experiências adquiridos nos encontros proporcionados pelas
disciplinas cursadas no POSEDUC me permitiram conhecer mais sobre a (auto)reflexão e o
método (auto)biográfico, desenvolvidos nos estudos produzidos por pesquisadores como
Josso (2010), Bueno (2006) e Souza (2006). Discutimos ainda o conceito de cidadania, de
Norbert Elias (1994), quando mostra a tarefa da Sociologia, que é “[...] alargar nossa
compreensão dos processos humanos e sociais e adquirir uma base crescente de conhecimento
mais sólido acerca desses processos”.
Nessas discussões, é claro, não poderia faltar o grande Freire (1992), quando afirma
que muitos vivenciam situações de opressão, causadas pelas desigualdades sociais e má
distribuição de renda. De acordo com Freire (1992), na vida é necessário ter esperança, mas
esta deve ser complementada com a prática. Neste sentido, a tarefa do professor é educar para
a esperança, não importa os obstáculos. Sem a esperança, pouco se pode fazer, porque
dificilmente lutaremos.
Endossam a fala de Freire autores como Bernard Charlot (2000), Constantan Xipas
(2014), Bourdier (2007), ao comentarem que os cidadãos ganham o poder de opinião e
decisão para superar e alcançar um aprendizado e conhecimento. Na busca do saber e no
longo percurso de estudos, na convivência com os outros, o sujeito aprende e constrói a
ascensão social.
Com base nos conceitos apresentados e por meio das narrativas (auto)biográficas de
um discente com deficiência não perceptível, de camada popular, busquei interpretar como os
seus saberes advindos das suas experiências de vida lhe proporcionaram êxito na sua
17

formação por meio dos estudos, desde a educação básica à universidade. Também refleti
sobre minha trajetória, o que me levou a contar minhas próprias experiências e histórias de
vida através do estudo. Para dar conta dos objetivos propostos a pesquisa recebeu enfoque
qualitativo, com levantamento (auto)biográfico sobre a pessoa com deficiência não
perceptível, por meio de diálogo, registros escritos, fotográficos, narrativas e descrição de
vivências desde a educação básica à universidade. A metodologia da pesquisa
(auto)biográfica possibilita as narrativas dos sujeitos da pesquisa, o que abriu espaço para a
escuta a respeito das lições de vida, narradas pelo aluno.
Segundo Delory-Momberger (2008), os estudos que utilizam as histórias de vida vêm
crescendo fortemente no cenário educativo contemporâneo. A soma desses estudos gerou
esclarecimentos a respeito de como o cidadão constrói a própria vida e a sua história. No
campo educativo, esse método de investigação ficou conhecido como a pesquisa
(auto)biográfica, compreendida como uma maneira de explorar a subjetividade e a memória
como elementos constitutivos para o (re)conhecimento da realidade das experiências de vida
dos sujeitos em construção e que pretende buscar, nos meios alcançados, a formação contínua.
Com esse entendimento, deu-se a busca pelas narrativas e experiências vividas pelo
estudante investigado, de modo a perceber a contribuição da família em seu processo de
aprendizado. Para Dominicé (2010), é no convívio e nas relações familiares que surgem as
memórias muito vivas, seja na orientação escolar ou profissional. O autor pensa o universo
das relações familiares enquanto contexto de formação e chama a atenção para os
componentes relacionais do processo de formação presentes nas narrativas. Em complemento,
afirma que todos os citados nas narrativas (auto)biográficas fazem parte do processo de
formação.
Para Bogdan e Biklen (1994, p. 16), na pesquisa qualitativa, os “dados recolhidos
significa ricos em pormenores descritivos relativamente a pessoas, locais e conversas, e de
complexo tratamento estatístico”. Esses dados são, geralmente, recolhidos em contexto
naturais, sem necessariamente se levantar ou tentar comprovar hipóteses ou medir variáveis.
Buscar apreender as diversas perspectivas dos sujeitos e os fenômenos em sua complexidade
possibilita uma relação dinâmica entre o mundo real e os sujeitos, isto é, um vínculo
indissociável, entre o mundo objetivo e a subjetividade humana. A partir dessa subjetividade,
houve uma reflexão das narrativas das histórias de vida do estudante com deficiência não
perceptível, desde o ensino básico até a universidade.
Os métodos para a execução dessas reflexões foram oriundos de debates e discussões
em disciplinas e seminários de metodologia de pesquisa, sessões de orientação de
18

monografias, dissertações e teses. O estado da questão - revisão de literatura - estado da arte


têm a intenção de contribuir para uma melhor compreensão da pesquisa cujo sujeito da
pesquisa é um estudante com deficiência intelectual, de camada popular, de nome José. Ele
narrou sua história de vida em três sessões, as quais compõem os capítulos desta dissertação.
Na primeira, falou dos encontros realizados na DAIN/ UERN, bem como de suas dificuldades
enfrentadas desde a educação básica à universidade. Da fase da infância, lembrou de seu
desejo de conhecer quem eram seus amigos, professores e família; quais os obstáculos
enfrentados; como conseguiu vencer mediante tantos preconceitos; quais os mecanismos de
superação; quem estava sempre ao seu lado; qual a pessoa para contribuição desse
desenvolvimento.
No tocante à investigação da pesquisa, teve como instrumento principal a entrevista de
histórias de vida, que tem como centro de interesse o próprio indivíduo na história e a forma
como lidou com a sua trajetória de estudos da educação básica até a universidade. O intuito
foi apreender os diversos acontecimentos e conjunturas que presenciou, vivenciou. A ideia
inicial foi realizar quatro sessões de conversa, com registro de documentos e fotos fornecidos
pelo entrevistado. As narrativas foram gravadas para posterior análise e interpretação.
As narrativas do entrevistado apontam para a relevância dos Direitos Fundamentais e
Garantias através da Constituição Federal e da Lei Brasileira de Inclusão nº 13.146/2015 para
a realidade do sujeito da pesquisa e para as demais pessoas com deficiência no país. Cabe
ressaltar que os documentos legais mencionados corroboram com a pesquisa pelo fato de
buscar a efetivação de direitos e deveres dos cidadãos em geral, o que pode ser um ponto de
partida para alcançar os objetivos da pessoa com deficiência não perceptível.
A interpretação das narrativas (auto)biográficas permitiu chegar aos aspectos dos
caminhos que levaram à ascensão social pelos estudos; à reconstrução da trajetória de vida a
partir da narrativa, o que leva à autoformação. Ao narrar, o sujeito da pesquisa ergueu
aspectos criativos e reflexivos de sua trajetória que os levou à ascensão social pelos estudos.
Percorremos juntos o passo a passo da narrativa com destaque para a subjetividade do
narrador e dos seus elementos marcadores da ascensão social. A reflexividade crítica no ato
de narrar sobre a trajetória da ascensão social dos sujeitos por meio dos estudos os leva a um
papel formativo de sua experiência vivida e ao papel social na formação para a ascensão
social. A partir da leitura das narrativas escritas, elencamos recortes que apontam para uma
autorreflexão sobre a trajetória de vida do sujeito da pesquisa em seu percurso de ascensão
social pelos estudos.
19

Acredita-se que o exemplo de ascensão social de uma pessoa com deficiência não
perceptível através do estudo, da educação básica à universidade, acompanhado da
observação dos ensinamentos, aprendizados e experiências adquiridos, será de grande
relevância para a população, sendo um assunto ainda pouco comentado por conta do
preconceito para com esses sujeitos. O intuito é, pois, favorecer o empoderamento e a
autonomia desses sujeitos para que vislumbrem um percurso de muitos saberes e construção
de aprendizados e conhecimentos.
Para deixar claros os objetivos aqui perseguidos, bem como os resultados alcançados,
segue uma síntese da estrutura desta dissertação. No primeiro capítulo, A labuta da vida e a
construção da formação: vivências e perspectivas de uma pedagoga, narro minha história
de vida. Mostro como alcancei ascensão social através dos estudos, sendo de origem popular.
Por meio das minhas narrativas de vida e de experiências, descrevo o percurso entre o ensinar
e o aprender, o conviver e o ser com a prática inclusiva, bem como a repercussão das ações
inclusivas para a efetivação dos direitos de alunos com deficiência não perceptível.
Os saberes adquiridos por meio dos estudos e vivências, ao longo dessa trajetória,
permitem-me construir minha formação continuada e o aprendizado. As contribuições para
essa formação vieram dos incentivos da minha família para não parar de estudar e prosseguir.
Com o apoio deles eu continuei a caminhar, a buscar a mudança, a lutar pelos meus estudos.
Neste primeiro capítulo minha pesquisa encontra fôlego nas lições de Paulo Freire
(1987) sobre o empoderamento transformador e sobre a construção da cidadania. Trago à tona
a memória da minha experiência como pedagoga, mãe e filha. Ressalto o meu encontro com a
inclusão através da UERN/ Universidade do Rio Grande do Norte, onde pude perceber a
importância da formação continuada, através de seminários, congressos e aulas de campo.
Conto um pouco de tudo que vivenciei e do que tenho vivenciado no decorrer das aulas como
aluna especial do mestrado em educação e depois como aluna regular. Concomitante a isso,
conto sobre os projetos de extensão e as Rodas de Estudo da LBI, com destaque para a
importância que tiveram em minha vida.
Na escrita deste capítulo mostro a importância do meu encontro com a (auto) biografia
e usei como norte teórico Josso (2010). Falo de recordações e trarei à tona minhas histórias de
vida, narradas pela memória individual, coletiva e subterrânea, recorrendo aos meus pais e
amigos. Mostro como esse encontro me permitiu ver e rever todas as histórias da minha vida;
como me ensinou a contar e narrar coisas que jamais percebi ou relatei. Ao vivenciar o
passado pelas lembranças, relato os obstáculos e percalços preciosos para nosso crescimento.
20

De fato, para que haja história para contar temos que sempre provocar a nossa memória e
contar e recontar nossos casos, a fim de que nosso futuro esteja sempre vivo em nossa mente.
No segundo capítulo, ressalto o percurso da Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas -
DAIN/UERN e suas ações inclusivas: a luta pela efetivação de direitos de alunos com
deficiência. O objetivo foi discutir a prática inclusiva para alunos com deficiência na
DAIN/UERN e a ações inclusivas para a efetivação dos seus direitos.
Ressalto como a DAIN tem contribuído para a formação dos alunos com deficiência e
mostro as suas alternativas à proposta de formação discente, com o intuito de ajudar e dar
subsídios para que ocorram novas possibilidades de avanços, com benefícios para uma melhor
locomoção. Discuto a prática inclusiva de estudos de alunos com deficiência e a repercussão
da ascensão através da construção da efetivação dos direitos.
Também exploro os recursos de adaptação e avanços tecnológicos que a DAIN tem
buscado para as necessidades e especificidades de cada deficiência, no intuito de colaborar
para ascensão desses alunos dentro do campo acadêmico e social. A DAIN luta pela
promoção da acessibilidade, diversidade, permanência e continuação desses alunos na
academia. Desempenha um esforço contínuo para uma acessibilidade arquitetônica, nas
comunicações, nos sistemas de informações, bem como nos materiais didáticos e
pedagógicos. Nessa discussão, se fez necessário o diálogo com a Lei Brasileira de Inclusão da
Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a fim de ressaltar os direitos e
deveres, efetivados também pela Constituição Federal, nossa carta Magna.
No terceiro capítulo, Olhares sobre as experiências individuais e coletivas:
narrativas de aluno com deficiência não perceptível de camada popular, mediante as
contribuições das narrativas (auto) biográficas, narro a história de vida e experiências de um
estudante com deficiência não perceptível de camada popular. Busquei identificar como
conseguiu ascender pelos estudos. Detalho o percurso traçado desde a educação básica à
universidade, principalmente suas conquistas, quem o incentivou ao estudo e sua trajetória em
busca da formação continuada para alcançar seus objetivos e amadurecimento acadêmico.
Para essa discussão, tomei como fundamento teórico o estudo de Josso (2010), onde a autora
admite que o sujeito, ao narrar a sua própria vida, vive o papel principal. Para Josso, quando o
sujeito compõe suas narrativas, através da sua história, aborda, de forma simples, direta e
profunda, suas lembranças e experiências de vida. Desse modo, tem a oportunidade de revelar
sobre sua vida e seus afazeres. Esse é, pois, um exercício transformador para sua vida.
Como participante do projeto, posso dizer que essas escritas, narrativas e todos os
encontros me proporcionaram um maior amor pelo meu objeto de estudo - a ascensão social
21

de estudantes com deficiência não perceptível: da educação básica à universidade. Por meio
desses encontros, senti a necessidade de pesquisar e saber mais sobre todos os direitos
discutidos em cada encontro. Os debates e palestras me instigaram ao estudo e aprendizado.
Dentro ou fora do município de Mossoró, pude resgatar minhas memórias, com as minhas
narrativas, e ouvir a respeito das ações promovidas pela DAIN junto à população. Pude ainda
aprender a conhecer e crescer, dando continuidade ao meu estudo com o meu colaborador, o
discente José.
Em meio a tantos aprendizados com os desdobramentos escritos e narrados no
caminhar dessa pesquisa, destaco as possibilidades de luta, encorajamento, empoderamento e
alteridade, que revelam a busca pela ascensão social através dos estudos. Afinal, conforme
nossa Constituição Federal/88, nossa Carta Magna, é dado o direito de educação para todos
os brasileiros e estrangeiros que moram neste país.
22

CAPÍTULO 1

Foto 1 – Eliane Cota Florio em visita à Canoa Quebrada-CE.

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2018).

O Bom da Viagem é a Viagem!

(AGUIAR, 2015).
23

1 A LABUTA DA VIDA E A CONSTRUÇÃO DA FORMAÇÃO: VIVÊNCIAS E


PERSPECTIVAS DE UMA PEDAGOGA

A curiosidade, citada por Freire (1996) na epígrafe acima, juntamente com outros
motivos citados na introdução deste trabalho, despertou em mim o desejo de pesquisar sobre a
ascensão social de estudantes de origem popular, com deficiência não perceptível, mediante
os estudos: da educação básica à universidade, temática deste trabalho dissertativo. Para a
execução desta tarefa, é necessário descrever o percurso entre o ensinar e o aprender, entre o
conviver e o ser por meio das minhas narrativas de vida e de experiências alcançadas por
meio dos estudos. Também é indispensável a descrição da prática inclusiva e a repercussão
das ações inclusivas para a construção da efetivação dos direitos de alunos com deficiência
não perceptível, mediante estudos, possibilidades e desafios, que efetivaram sua ascensão
social.
Com o auxílio de autores como Josso (2010), Dominicé (2010), Delory-Momberger
(2008) e Souza (2006) e seus estudos voltados à temática das narrativas (auto)biográficas e
histórias de vida, objetivo responder a seguinte questão problema que norteia esta pesquisa:
como se constitui o processo de ascensão social de estudantes com deficiência não perceptível
por meio dos estudos, desde a educação básica à universidade?
O sentido que almejamos para este trabalho está relacionado à superação, pois trata da
ascensão social de uma pessoa com deficiência não perceptível, desde a educação básica à
universidade, através do estudo. Trago também minha experiência permanente com a
educação, por meio dos estudos diários da vida de meus alunos. Quero mostrar como a
reflexão sobre mim mesma e sobre minhas ações me ajudaram a aperfeiçoar os conteúdos
aplicados, a aprender com o discente e a perceber como a docência me ajudou na
transformação de atitudes e na ciência do meu saber. No exercício da docência, percebi que,
independente da classe social dos alunos, mediante as experiências de vida e aproveitamento
das suas vivências, cultura, seu lugar, suas dificuldades, é possível obter ensinamentos.
Entendi que cada um traz grandes potencialidades e evidência de transformação, por isso
devem ser valorizados não pela aparência ou com ênfase nas dificuldades, mas pelos saberes
que constroem mediante os estudos e vivências.
O objetivo deste capítulo, intitulado: A labuta da vida e a construção da formação:
vivências e perspectivas de uma pedagoga, é mostrar, por meio das minhas narrativas de
experiências e trajetórias de vida e estudo, com ênfase no meu aprendizado e nos obstáculos e
percalços vencidos, como alcancei êxito. A pesquisa (auto)biográfica como metodologia me
24

possibilitou buscar a minha (auto)formação e entender como adquiri, ao longo de uma jornada
de instrução, preparação e desafios, a permissão para construir minha formação continuada, o
aprendizado. Destaco como maior contribuição o apoio de meus pais e familiares, que sempre
me incentivaram a não parar de estudar, a prosseguir, a caminhar, a buscar sempre a
transformação continuada. Deles veio minha força para mostrar a minha trajetória de vida em
uma sociedade individualista, algo que consegui através do estudo e conhecimento do meu
espaço. Mesmo em meio às dificuldades, adquiri dimensões de (trans)formação de vida com
êxito social.

1.1 NARRATIVAS DE EXPERIÊNCIA: INFÂNCIA, FORMAÇÃO E APRENDIZADOS

Nasci no dia 11 de setembro de 1968, na cidade de Duque de Caxias, Rio de Janeiro,


em uma casa muito humilde, que abrigava minha família, constituída por meu pai, Daniel
Cota, minha mãe, Herodias Cota, minhas duas irmãs, meu irmão e eu, Eliane Cota.

Foto 2 – Eu, meu pai e minha mãe.

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2012).

Eu nasci de um parto normal muito difícil. Minha mãe começou a sentir as dores às
20h do dia 10 de setembro de 1968 e só me teve às 5h do dia 11 de setembro 1968, em casa,
assistida por uma parteira. Nessa época, na minha cidade, ninguém nascia em casa com o
25

auxílio da parteira, mas a minha mãe não tinha o costume de ir ao hospital. Os outros três
filhos, mesmo nascidos de partos feitos em casa, não tiveram complicações. Por isso, minha
mãe pensou que o meu nascimento seria como os outros, mas foi um parto demorado e muito
sofrido. A dificuldade foi tanta que a parteira chamou o meu pai e comunicou que eu não
sobreviveria e, talvez, nem minha mãe, devido ao grande sofrimento. Entretanto, Deus agiu e
eu nasci. Sem condição financeira, meu pai sabia que não teria como remover mamãe para um
hospital particular, pois era muito caro. Também sabia que não era conveniente levá-la a um
hospital público, já que, no Rio de Janeiro, nesses hospitais nunca havia vagas.
Éramos pobres. Meu pai, na época, trabalhava na Light, Companhia Elétrica do Estado
do Rio de Janeiro. Ganhava um salário mínimo. Minha mãe era empregada doméstica. Lavava
e passava roupas para 10 (dez) famílias. Meu irmão, Rael, era pré-adolescente. Na bicicleta,
ele pegava e levava as roupas para mamãe não trazer a trouxa de roupa pesada sozinha.
Meus pais não tiveram a oportunidade de estudar. Papai perdeu sua mãe com cinco
anos e o seu pai faleceu quando ele tinha nove anos de idade. O meu avô paterno chegou a
matricular meu pai na escola por algumas semanas, porém, por ser um viúvo e ter que
trabalhar, deixou o meu pai com apenas seis anos de idade na casa dos seus filhos mais
velhos. Os irmãos do meu pai, o exploravam e o forçavam a fazer as atividades domésticas.
Ele lavava a roupa no rio, areava panelas no rio e até mesmo levava seus sobrinhos à escola.
Meu pai não foi matriculado em escola, pois tempo dele era somente para trabalhar. Falecido
há um ano e seis meses, posso lembrar suas narrativas dessa triste história, repetida diversas
vezes por ele.
Aos oito meses de vida, eu já andava pelo quintal da casa de meus pais, enquanto
mamãe lavava as roupas das famílias. Forte e trabalhadora, ela cumpria seus afazeres e
cuidava de mim. Certo dia, em minutos de distração da minha mãe, eu me debrucei para ver a
água em um poço com mais de 20 metros de profundidade e quase cai nele. Minha irmã
Leninha, a mais velha, me pegou pelos pés e me puxou para fora. Bom é ouvir as narrativas
contadas por mamãe e minha irmã.
Com um ano e seis meses, eu já gostava de refrigerante. Então, um dia eu bebi
querosene, pois, nesse tempo, o produto era colocado em uma garrafa de refrigerante. Por ser
muito nova e pela semelhança das garrafas, ingeri todo o conteúdo. Pensava ser aquela bebida
gasosa que tanto apreciava. Na hora, perdi os sentidos. O incidente aconteceu quando meu pai
estava a limpar uma jaca para eu comer. Na época, para tirar o leite da fruta das mãos as
pessoas usavam querosene. Então ele passou o querosene nas mãos e em um minuto que foi
até a pia enxaguá-las, tomei o querosene. Ao perceber que eu estava desacordada, meu pai me
26

levou para uma emergência particular, onde fiquei sete dias no Centro de Tratamento
Intensivo (CTI). Para receber alta do hospital, o pagamento da internação deveria ser
efetuado. Sem condição financeira para pagar os gastos, papai pegou o dinheiro emprestado
com um colega de serviço. Depois, para liquidar a dívida de uma só vez, papai ficou um mês
sem seu salário. Papai nunca comprava fiado ou fazia prestação, muito menos, dívida. Era um
homem de grandes valores, de boa conduta. Tinha um caráter irrepreensível e uma
experiência de vida que só Deus pode conceder, com inteligência e sabedoria brilhantes.
Quando completei um ano e oito meses, dei mais um susto em todos: dessa vez caí em
uma vala de esgoto. Existia em minha casa um cachorro mestiço chamado Dick. Ele passou
por mim e me derrubou na vala, onde fiquei submergida. Todos me procuraram e rápido me
encontraram. O que aconteceu? Fui levada para o hospital para fazer uma lavagem estomacal,
pois ingeri muita água de esgoto. Eu não era uma criança levada, apenas era muito ativa.
A situação econômica em casa não era muito boa, o que obrigava meus pais a
trabalharem, mas sempre recebi deles muito carinho e amor. Dialogávamos muito e sempre
me contavam histórias, em especial as bíblicas. Meus pais não tinham condições de comprar
muitos brinquedos, mas me presentearam com um boneco chamado “para-pedro”, todo em
plástico e que não se mexia.
Sempre ao ver a imagem do boneco, choro, não de tristeza, mas por sentir falta de um
tempo que não volta mais. Aos quatro anos de idade, brincava com pregadores de roupa como
se fossem bonecas. Eu os cobria com folhas e flores, que, na minha imaginação, eram as
roupas. Lembro-me somente de um evento comemorativo, o Natal, em que ganhei um
joguinho de madeira. Esse joguinho continha uma caminha e um guarda roupa, então, fazia
dos pregadores bonecas para brincar com esse joguinho.
Tive contato muito cedo com a inclusão. Em vários momentos de minha infância,
recordo o engajamento e força dos meus pais para estudarem, mas não tinham como
frequentar as aulas, porque precisavam trabalhar. Meu pai era analfabeto e mamãe tinha
somente a terceira série. Com o auxílio da minha mãe, conheci as primeiras letras. Como eu
era de família muito pobre, a vida não era fácil. Porém, isso nunca foi pretexto para meus pais
me tratarem mal, pois sempre me corrigiam com muito amor e carinho. Muitas vezes, não
tínhamos o que comer, no entanto, Deus sempre proveu tudo de uma maneira especial.
Minha mãe começou a me alfabetizar em casa. Primeiro, me ensinou as vogais, depois
as junções das sílabas, até formar algumas palavras e o meu nome. Ela não queria me colocar
na escola antes de me ensinar o pouco aprendido quando criança. Seu sonho era me matricular
27

na escola já com algum conhecimento. Meu pai, sabia os números e matemática. Ensinava-me
a contar com pedrinhas.
Lembro-me da cartilha com as folhas amareladas, letras grandes e um desenho com
referência a cada consoante. Achava interessante o processo de leitura, mesmo sendo muito
lento, no meu caso, pois mamãe e papai não tinham muito tempo, trabalhavam muito. Hoje,
consigo ver como eram grandes o amor e a vontade de me ensinarem, apesar de mamãe ter
apenas a terceira série e papai não saber ler. Nessa época, nem assinar o nome ele sabia.
Minha mãe voltou a estudar aos 59 anos, fez a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Concluiu
o ensino médio com 64 anos. Conquistou êxito através dos estudos, ainda na idade avançada.
Aos cinco anos de idade, eu tive hepatite. Minha mãe trabalhava muito e quem tomava
conta de mim era minha irmã Nice, com apenas dez anos. Minha “mana”, ou Nice, como
gosto de chamá-la, era muito carinhosa comigo. Não brigávamos. Mamãe sempre falava:
Irmãos nunca brigam. Até o dia de hoje, nunca briguei com nenhum deles.
Aos sete anos, passei, talvez, pela maior dor da minha vida, ao sofrer por preconceito,
discriminação e humilhação. Tive dois furúnculos nas nádegas, um em cada lado, por conta de
uma injeção vencida. Na época, não tinha o controle de prazo de validade. Mamãe trabalhava
no apartamento de Dona Camila e Senhor João, um diretor de banco. Eles eram ricos e tinham
duas filhas com a minha idade. Eu e minha mãe subíamos pelo elevador dos funcionários e,
em seguida, entravamos pela porta da cozinha do apartamento. Não era permitido aos
empregados a entrada pela porta da sala principal. Eu ficava no corredor da cozinha, perto do
banheiro, ou no quarto das empregadas, deitada. Não havia a possibilidade de ficar sentada e
não podia ficar com meus irmãos. Era necessário fazer os curativos e trocar os drenos três
vezes ao dia e só mamãe conseguia fazer, com todo o seu carinho. Assim doía menos.
Com um tempo, comecei a entender o porquê de não poder brincar com as meninas,
nem ir até à sala, eu era a filha da empregada. Hoje, imagino o que minha mãe sentiu em seu
coração, durante o mês em que me levou com ela e via toda aquela humilhação. Nesse tempo,
no ano de 1975, comecei a estudar na Escola Ana Laura, no curso da Classe de Alfabetização.
Minha professora, Joana, era muito atenciosa e comprometida. Durante todo o tempo que
estive doente, ela me mandou as atividades de casa e as que foram ministradas em aula. Era
uma excelente professora.
No mesmo ano aprendi a ler e escrever. Minha mãe era faxineira da escola e eu não
tinha muitos amigos, era a filha da faxineira. Ninguém queria brincar com a filha da faxineira
da escola. O diretor da escola, gostava muito de mim, me colocava em seu colo e me
28

auxiliava nas lições, todos os dias, enquanto eu esperava minha mãe limpar e arrumar as salas
de aula para o outro turno. Fiquei nesta escola até o 2º semestre da quarta série.
Foi um ano de muitas lutas, mas recebi meu maior presente: fui batizada na Igreja
Batista em Centenário, RJ. Frequentei essa igreja, como membro, a partir dos meus três anos,
porque nos mudamos para perto do local onde estava instalada. Quando nasci, minha família
frequentava a Igreja da Vila São Luiz, RJ, mas, foi na Igreja Batista em Centenário que passei
todas as minhas fases: infância, adolescência, juventude e fase adulta. Gostava de tudo,
principalmente da minha professora da classe da Escola Bíblica Dominical (EBD), Dona
Beth, que, até a data de hoje, ainda é professora da classe de EBD na igreja. Essa é, para mim,
a maior e melhor escola da vida.
Nesta mesma igreja, anos mais tarde, conheci meu esposo, Geraldo. Tivemos dois
filhos, Mateus e Lucas, que também nasceram1 nesta igreja. Coincidentemente, Dona Gilsa,
foi também professora do meu esposo, Geraldo, e dos meus filhos. O conhecimento de Jesus,
que me foi ensinado desde o ventre2, e a minha educação são, para mim, a maior herança
deixada por meus pais e que repassei para meus filhos.
Ainda em 1975, minha irmã Leninha, a primogênita, casou-se. Já bem instalada, com
casa própria, ela ofereceu uma parte de seu terreno para meu pai fazer a casa dele, assim ele
não precisaria mais pagar aluguel. Com muito esforço e com a infinita graça de Deus, meu pai
fez a casa sozinho, pois não havia condição alguma de pagar um ajudante de pedreiro. A casa
era pequena e linda, na cor branca. Ela possuía quatro cômodos: um banheirinho, uma
cozinha, uma sala de estar e um quarto. Tinha um pequeno quintal com roseiras e outras
plantas, e árvores frutíferas. Antes dessa casa, nós só morávamos em avenida. No Rio de
Janeiro, avenidas são várias casas juntas em um só lugar, parede com parede, sem privacidade
alguma. Minha irmã me levava para passear. Meus pais nunca tinham condição de me levar
nem ao parque. Quando criança, nunca fui ao parque ou à praia com meus pais.
Com minha irmã Leninha e meu cunhado Moa, íamos à praia quase todos os
domingos. Com dois anos de casado, meu cunhado foi transferido para Salvador. Nessa
época, já havia nascido meu primeiro sobrinho. Foi muito triste a notícia da mudança, mas
eles partiram e nós ficamos. Continuamos no terreno até a nossa vinda para Mossoró. Hoje as
casas estão do mesmo jeito e alugadas.

1
Desde o momento em que estavam sendo gerados em meu ventre, os meus filhos já iam à mesma igreja.
2
Segundo minha mãe, ela já orava por mim e me ensinava os princípios bíblicos quando eu ainda estava em seu
ventre.
29

Já nos meus oito anos, ainda no Rio de Janeiro, meu pai construiu uma pequena venda
no quintal, para nossa manutenção. Eu ajudava a fazer as contas e a conferir as mercadorias.
Acordava às 4h30min para pegar os pães na padaria, para vender às 5h. Ficava na barraca
para atender os fregueses e, ao mesmo tempo, estudava. Mamãe explicava que eu tinha que
estudar para ser alguém na vida. A tabuada tinha que estar na ponta da língua.
Nessa época, minha brincadeira era imaginar que eu trabalhava no banco. Fazia a
borracha de carimbo e contava as moedas. Sonhava em ser caixa do banco. Mas o meu maior
sonho, realmente, quando eu era pequena, era ter um orfanato ou um asilo. No dia das
crianças, nós e as pessoas da igreja, da qual éramos membros, visitávamos o lar Batista, um
orfanato, em Rio Bonito, RJ. Havia muitas crianças no local e toda a igreja participava da
festa. O orfanato era localizado em um terreno grande, com aparência de um grande sítio e
uma enorme casa. Me sentia livre e muito alegre, brincava durante todo o dia com muitas
crianças.
Não me importava com a hora nem com o lugar, eu pulava sempre da cama, em casa,
pronta para enfrentar o dia, no começo nem sempre foi fácil, mas cada desafio apenas tornou-
me mais forte e admiradora da vida. Estudava e ajudava meus pais na pequena venda. Como
trabalhava muito, não tive tempo de gravar nomes nem imagens dos professores com quem
estudei. Durante todo o meu tempo de ensino, desde o pré-escolar até a primeira faculdade, só
me lembro de uns quatro professores. Ia à escola, mas os meus pensamentos estavam muito
longe. Estava preocupada com a pequena venda e em ajudar mamãe e papai a fazerem as
contas dos fregueses.
Aos dez anos, em 1978, fui passar alguns meses em Salvador para ajudar minha irmã,
com meus quatro sobrinhos. Ela já tinha quatro filhos: David, Priscila, Junior e Leo. Quando
cheguei, minha irmã me matriculou na escola Nossa Senhora da Luz, que tinha um ensino
muito mais desenvolvido que na escola em que estudei anteriormente. Não conseguia
acompanhar o ritmo e as diretoras eram grosseiras. Quando terminei a quarta série, retornei
para o Rio de Janeiro. Minha mãe resolveu me colocar em uma escola de porte grande e com
um excelente ensino, o colégio São José, onde cursei a quinta e a sexta série. Nessa escola,
estudavam pessoas de classe média, por isso meus pais trabalhavam dia e noite para pagar as
mensalidades e para me darem um futuro melhor. Não havia possibilidade de me matricular
em um colégio público, o ensino era muito fraco e as escolas muito perigosas, devido ao local
aonde se encontravam.
No Centro Educacional São José, em Duque de Caxias, minha experiência não foi boa.
Os alunos eram soberbos e sequer falavam comigo, eu só tinha duas amigas, Evelin e Daniele,
30

que moravam no mesmo bairro e cidade que eu. A inclusão, naquela época, não funcionava
muito bem. Fiquei nessa escola dois anos, depois voltei para a anterior, aquela em que mamãe
foi faxineira, a Escola Ana Laura. Cursei o supletivo, a sétima e oitava séries, e o curso básico
à noite, para poder trabalhar durante o dia.
Mamãe não era mais faxineira, nem empregada e não lavava roupa para fora, pois
trabalhava no seu pequeno comércio. Como eu tinha os clientes da barraca, pensei em fazer
algum artesanato para vender. Iniciei com a pintura de peças de gesso com nomes de crianças,
peças de animais e de decoração. Depois, passei a produzir cartões e enfeites para datas
comemorativas de papel vegetal. Pintava telas e fazia quadro em vidros, ainda tenho alguns
guardados. Sempre fazia essas tarefas extras no horário noturno, até às 2h da madrugada, feliz
e contente. Tinha novos projetos de vida. Me perdi na ilusão de alguns sonhos, outros ainda
estou a buscar e muitos Deus já me concedeu.
Em 1985, com 17 anos, comecei o ensino médio. Optei pelo Curso do Magistério, na
Escola Nossa Senhora Santana de Catú, na Bahia, quando fui morar com minha irmã Leninha,
agora com seus seis lindos e abençoados filhos. Fiquei lá durante um ano e meio e,
novamente, voltei para o Rio de Janeiro, quando retomei meus estudos na Associação
Fluminense de Educação (AFE). Foi uma grande luta para pagar o colégio particular, tinha
que trabalhar e estudar. Muitos professores não compreendiam as minhas faltas, porque eu
resolvia tudo para o meu pai e minha mãe. Eu queria ser professora. Como amava tudo que
fazia, aprendi a pensar em educação e a ver o que significa esforço e aprendizado. No colégio,
começamos um projeto de banda escolar para arrecadar dinheiro e permitir a oportunidade de
ajudar as crianças carentes do bairro. Era uma sensação muito boa, fazíamos ação social no
bairro e o conceito de cooperação e ajuda já era implantado em nossos dias. Já era visualizado
por nós, alunos, o desejo de cidadania, indo de encontro com tudo o que eu passei em uma
sociedade na qual tínhamos muitas lutas.
Meu êxito social veio através dos estudos. Aos dezenove anos, terminei o magistério,
mas não tinha condições financeiras para fazer uma bela festa de formatura. Em seguida
prestei vestibular para Biologia. Passei e fiquei muito alegre, mas não consegui terminar o
curso. Desisti quando faltavam seis meses para a conclusão, lamentei-me pelo tempo perdido
e desanimei um pouco. Estava sempre a lutar e o corpo não aguentava. Acordava às
05h30min, ainda madrugada. No Rio de Janeiro, a depender da estação do ano, a essa hora
ainda está muito escuro. Trabalhava manhã e tarde e estudava à noite. Chegava à minha casa
às 23h, para jantar, fazer minhas pinturas e realizar o planejamento do dia seguinte, sem
contar as compras da barraca a corrigir e dar preços.
31

Em 1987, tive oportunidade de ensinar no Colégio Oliveira Franco, em Duque de


Caxias – Rio de Janeiro. Era uma escola muito carente, em uma favela3, onde cumpri o
contrato de um ano. Neste lugar, tive minha primeira experiência com a inclusão. Ainda não
conseguia entender por que um aluno de nome Selvático4, de uma classe da 1ª série do ensino
fundamental, só ficava na quadra, a andar de um lado para o outro, a colocar sempre os dedos
na boca. Ele sempre estava com baba a escorrer pelos cantos da boca. Era negro, magro
demais, assustado e sempre e com aparência de sujo. Em seu olhar havia muita tristeza.
Constantemente, eu me dirigia à porta da sala e ficava observando aquele menino de olhos
assustados, mas com um brilho lindo no olhar. Na hora do recreio, os professores iam para a
sala do grupo lanchar, enquanto as crianças ficavam na quadra, sob a vigilância das faxineiras
e ajudantes. Eu fazia questão de lanchar com os alunos.
Uma escola muito pobre, com crianças lindas e brilhantes, era o que eu conseguia
observar. Comecei a pedir a Selvático para ir pegar giz para mim na secretaria, só para fazer
amizade com ele. Durante alguns dias, ele nem me dava atenção, fingia que não ouvia e eu
insistia. Aos poucos, o conquistava, até que foi vencido pelo cansaço. Certo ditado que minha
mãe falava: “água mole em pedra dura tanto bate até que fura” se cumpriu nessa relação.
Selvático começou a vir para minha porta. Perguntei, então, à professora da classe onde estava
matriculado se eu podia fazer a solicitação da transferência do aluno para minha turma. Ela
permitiu e me falou que iria me arrepender. Fui até a diretora do colégio, nesta ocasião Dona
Elisabeth, e ela disse: “ele tem deficiência intelectual, a mãe dele, sobrevive catando e
vendendo papelão, é uma mulher que trabalha para manter os filhos, e não tem tempo para
ajudá-lo em suas tarefas. Economicamente não pode levá-lo para fazer um tratamento. Fica e
seu irmão é salteador. O melhor que você tem a fazer é deixá-lo na quadra, como já é de
costume de todas as professoras. Não se envolva com ele, para não adquirir problemas
futuros”5. Ao ouvir essas palavras de uma educadora, meu coração se entristeceu. Mas, meu
desafio se confirmava a cada instante.
Era tarde demais. Aquele olhar já tinha conquistado meu coração, eu tinha que fazer
alguma coisa por ele e por mim. Fui instigada a ensiná-lo. Sempre pedia que tirasse o costume
da mão na boca, porque molhava e sujava os cadernos. Para piorar, quando errava a tarefa ele

3
Conjunto de habitações populares, precariamente construídas e desprovidas de infraestrutura (rede de esgoto,
de abastecimento de água, de energia, de posto de saúde, de coleta de lixo, de escolas, de transporte coletivo
etc.).
4
Selvático era o apelido do aluno, significa próprio das selvas; agreste, selvagem que não produz, não dá frutos;
bravio, sáfaro.
5
Palavras proferidas pela diretora Elisabeth em uma conversa com a autora no ano de 1987, no Colégio Estadual
Irineu Marinho, em Duque de Caxias – Rio de Janeiro.
32

apagava com saliva. Eu não sabia se chorava ou se ria, mas tinha certeza que o queria por
perto. Aos poucos, as crianças foram se chegando. Ele jamais bateu ou foi agressivo com
alguém na sala de aula. Com muita calma, conseguia aprender. Todos os dias ele me levava
até minha casa e carregava os cadernos de aula para mim. Como ninguém ia buscá-lo nem se
importavam com ele, não tinha motivo para ele querer ir para a sua casa.
Quando chegávamos a minha casa, papai sempre tinha uma garrafa de café na barraca
e pegava uns biscoitos para o garoto. Ele se sentava e comia. Ainda tenho a linda cena em
minha mente. Seus olhos brilhavam. Sua mãe nunca foi à escola e parecia ter problema
mental. Só era vista pela rua, a andar com carrinho de mercado velho, suja e com os papelões
velhos, achados no lixo, para vender. Ele não tinha pai e nunca me falaram sobre quem
poderia ser. Seu irmão era marginalizado e pulava o murro da escola, muito alto, para pegar
alimento na cozinha. Ameaçava as serventes e cozinheiras, até as professoras, mas, graças a
Deus, nunca mexeu comigo. Ao final do ano, Selvático estava asseado. Já não colocava mais
as mãos na boca e não babava, usava a borracha, não apagava mais com o dedo e a saliva. E o
mais importante, aprendeu ler e escrever, com algumas dificuldades. Mas, mediante a
situação, era um vencedor.
Mamãe e papai descobriram sobre a invasão de meninos na escola. Os garotos faziam
ameaças aos funcionários para pegarem comida, mas nunca fizeram nada comigo. Lembro-me
que, várias vezes, eu ficava com pena, pois eles invadiam a escola para pegar comida. Eu
sabia que as oportunidades não chegavam até eles, mas isso não justificava o que eles
praticavam. Eu não conhecia totalmente aqueles adolescentes, não sabia quem eram seus pais
ou se tinham pais, nem de que famílias vieram. A fome não é para roubar, quando há um
alicerce familiar muitas dessas inconveniências podem ser evitadas com amor e diálogo.
Acredito na educação familiar e que muitos dos problemas sociais são em virtude da família
desestruturada e da sociedade cheia de desigualdades sociais.
Por esses motivos, meus pais não permitiram a minha renovação do contrato para
continuar dando aula nessa escola estadual. A diretora ligou para minha mãe e disse que ia me
efetivar. Naquela época, era permitido admissão sem concurso, mesmo assim mamãe e papai
não me deixaram voltar à escola. O Selvático continuou na escola e sempre ao término do
horário escolar ia até minha casa me ver, durante anos. Já adulto, ele me encontrava e me
chamava de tia. É assim que são chamadas as professoras de classes infantis na minha cidade
do Rio de Janeiro. Selvático me dava um beijo e, nessa sua atitude, conseguia sentir o carinho
e gratidão.
33

Depois dessa experiência, percebi que necessitava promover a minha formação


continuada como profissional da educação. Iniciei alguns cursos. Na época, era muito comum
os colégios adotarem o Construtivismo e as apostilas conceituadas do Sistema Positivo de
ensino. Essa rede de ensino oferecia muitos cursos e eu busquei participar de alguns. Tive de
cursar informática, pois estava para começar um novo período - a era da informatização. Fiz o
curso no Centro Dataduque. Estudei um programa enorme para escrever uma linha no
computador. Com o passar do tempo, percebi que a escola ganhava significado em minha
vida. Então, fundei uma escolinha para crianças de dois até sete anos com o intuito inicial de
dar aulas de reforço. Minha mãe e meu pai sempre me ajudavam e eu os ajudava. A pequena
meia água, como é chamada uma casa pequena no Rio de Janeiro, virou sala de aula. Eu não
tinha conseguido fazer o orfanato nem um asilo, como sempre sonhei, mas podia ajudar as
crianças impossibilitadas de pagar uma escola a estudar.
Essa foi mais uma batalha vencida. Ministrava aulas, estudava e ajudava na pequena
venda. Muitas lutas, muitas conquistas, felicidades e vitórias. Minha força vinha das palavras
de meus pais, que, em DEUS, buscavam sabedoria para me ensinar. Eles me lembravam
sempre: “Entrega o teu caminho ao senhor, confia nele e Ele tudo fará”. (SALMOS 37, 5).
“Ame a seu próximo como a ti mesmo” (MATEUS 22, 39). Esses versículos, durante toda
minha vida, têm me colocado aos pés do meu Salvador Jesus Cristo. Quando estou em
dificuldade, eles fazem parte das minhas petições. Assim como minha mãe, eu os recito todos
os dias para os meus filhos.
Meus pais me explicavam: sabe quem é o seu próximo? Aquele que não tem cor,
partido, religião e nem time, mas o que precisa de você. Não tinha como não ser feliz com
pais tão maravilhosos, que me educavam e ensinavam a ter princípios básicos, como o amor
ao próximo. Eles foram meus primeiros professores, com eles me conscientizei sobre
realidade neste mundo. De acordo com Freire (1996), quando o homem compreende a sua
realidade, pode levantar hipóteses sobre o desafio dessa realidade e procurar soluções,
intervindo nessa realidade. Em complemento, o autor (1996, p. 28) afirma:

O professor que pensa certo deixa transparecer aos educandos que uma das
bonitezas de nossa maneira de estar no mundo e como o mundo, como seres
históricos, é a capacidade de, intervindo no mundo, conhecer o mundo. Mas,
em seres históricos, como nós, o nosso conhecimento do mundo tem
historicidade.

Ao longo da minha trajetória educacional, busquei, através dos ensinamentos de


Freire, essa leitura de mundo que me possibilitasse uma visão ampla do conhecimento. Uma
34

continuidade de aprendizado me foi oportunizada por intermédio do diálogo com o autor.


Suas ideias possibilitaram a problematização e despertaram em mim uma visão crítica em
busca da transformação. O diálogo também prova a concepção do homem como um ser
histórico, um ser inconcluso, em busca do aprender e do estar sempre em constante
crescimento, a desenvolver-se dia a dia.
Com muita luta, obtive o registro da minha escola pelo Ministério de Educação e
Cultura (MEC), órgão responsável por esse procedimento. O nome fantasia foi Cantinho
Alegria do Saber e o símbolo era uma bota linda em forma de casinha. Fizemos uma
arrumação no local, compramos uns moveis usados e fomos à reforma. Entramos madrugada
à dentro a pintar as paredes, móveis e as salas. O lema era mãos à obra, literalmente. Aos
poucos, a cada dia eu adquiria prática em Educação. Procurei conhecer cada aluno e família
para poder aprender e contribuir com as experiências que alcançava. Encontrava-me na busca
de algumas palavras-chave: educação e amor.
Nesse período, não havia muitos esclarecimentos sobre os transtornos de
aprendizagem nem possibilidades de algumas crianças com dificuldades de aprendizagem
frequentarem uma escola grande, porque a discriminação era intensa, com múltiplos olhares
da população e dos próprios profissionais da educação. Essa escola era situada em um lugar
carente de baixa renda, cujo povo era mais calado, na verdade, silenciado pela burguesia,
devido a uma política altamente conservadora.
É oportuno lembrar que o saber docente é temporal, pois está relacionado à época e à
cultura da sociedade em que está incluído. Eu buscava ensinar com zelo, apesar do caminhar
apertado, cheio de espinhos. Conseguia também, em meio aos espinhos, colher lindas rosas
belas e muito coloridas. Aprendia com os alunos e familiares; com eles obtive experiências.
Venci os obstáculos com determinação, tolerância e atitudes positivas. Somente eu e uma
ajudante de professora começamos as aulas no Colégio Alegria do Saber em Duque de Caxias
no Rio de Janeiro com, aproximadamente, 45 alunos. Não era fácil enfrentar as lutas, mas
quando temos objetivos e a fé somos mais fortes.
Mesmo em meio aos obstáculos encontrados, precisava, além de me sustentar
financeiramente, ajudar essas crianças, porque, através do estudo, alcançariam uma vida
melhor. Eram vários os alunos não pagantes, porque não tinham boas condições financeiras.
Nesses casos, existiam duas alternativas de portas e caminhos, a primeira opção era eu ensinar
e a segunda opção era eu rejeitar a matrícula. É claro que escolhi ensiná-los e aprender com
eles, na certeza de todos nós alcançaríamos um lugar muito melhor.
35

Os anos passavam e, a cada dia, eu ficava mais animada a batalhar por mim e por
meus alunos. Mesmo diante das dificuldades enfrentadas, a superação vinha com uma força
imensa, sem fracassar pelos desdobramentos necessários para incluir em minha escola
estudantes com TDAH6, autismo e Síndrome de Down. Muitos desses alunos só conseguiriam
estudar em uma escola pequena, onde o trabalho, na época, era menor para o professor.
Entretanto, segundo Freire (1996), são as experiências e vivências de um professor em sala de
aula que proporcionam os seus avanços nos aspectos cognitivos de aprendizagem.
Com base na afirmação do autor, tinha a curiosidade, inquietude, criatividade,
humildade e persistência no processo educativo. Acreditava nas minhas convicções e
capacidade profissional. Na minha mente, vinham toda a vivência e dificuldades dos meus
pais, que acreditavam em mim e tinham a expectativa de que eu seria “alguém”, como eles
falavam, e esse alguém daria muito orgulho a eles.
Quando montei minha escola, não havia ainda a discussão em torno da inclusão, mas
eu conseguia entender a posição social dos meus alunos especiais. Eles eram sujeitos que
estavam à margem da sociedade, vistos com olhares preconceituosos ou de pena. As pessoas
agiam como se não percebessem que todos temos limitações. Toda minha trajetória deixava
visível como precisava fazer algo para esses alunos. Apesar de trabalhar todas as disciplinas,
eu me sentia na obrigação de inclui-los em todas as aulas e brincadeiras. Considerava essa
uma oportunidade de mostrar a capacidade existente em cada um, pois o meio social já era
impiedoso, haja vista a dificuldade para uma constância nos tratamentos médico, psicológico,
ortopédico, fonoaudiológico, psicopedagógico, nutricional, entre outros.
Eu proporcionava aos meus alunos aulas de teatro e as crianças com deficiência
participavam, elas eram incluídas, a fim de que fosse possível perceber as capacidades e
limitações de cada um. Tinha certeza do potencial de todos os alunos, até mesmo dos
especiais. Eles participavam dos teatros e festas com vozes e corpos, tinham a compreensão
do texto e contexto, dominavam as atividades como qualquer outro aluno e, ao final, se
sentiam seguros e com empoderamento.
Precisava, como cita Freire (1997), anunciar a possibilidade de uma educação
humanizadora e libertadora; uma educação que favorecesse meu olhar para o outro de modo
mais humano, na relação com ele. Com isso, havia em mim uma inquietação e uma
curiosidade de mostrar a todos a capacidade desses sujeitos. Infelizmente, algumas pessoas
que conhecemos ou mesmo familiares não conseguem enfrentar circunstâncias da vida e

6
Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade.
36

acabam por trazer para o outro suas verdades absolutas e preconceituosas. São pessoas que
pegam um texto como pretexto para seu contexto.
O tempo passou e, a cada dia, a minha escola progredia. As mães continuavam a
matricular suas crianças. Com muita luta, em janeiro no ano de 1992, adquirimos um terreno
em frente a minha casa, onde era a escola. Era um terreno muito grande, com uma mata muito
fechada. Meu pai limpou o local muito rápido e os sonhos e planos começaram a surgir em
minha mente.
Maravilhoso é poder sonhar, principalmente quando as memórias são de superação, de
esperança e consolo, de uma vida melhor. Como não tinha dinheiro para fazer a obra de
imediato, ficava a imaginar se teria condição de algum dia poder fazer o colégio, o asilo ou o
tão sonhado orfanato, aquele meu desejo de infância. A Foto 2 traz a imagem do terreno e do
local onde já funcionava minha escola. Em meio às lutas, em 1993, começamos a construir o
novo prédio do colégio. Era um sonho que se realizava. Trabalhava ainda mais para alcançar
os objetivos.

COLÉGIO E
Foto 3 - Terreno onde foi construído o prédio da minha escola.
MINHA CASA
TERRENO
PARA
CONSTRUÇÃO

BARRACA
CA

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Duque de Caxias/RJ, 1993).

A minha preocupação era com o planejamento escolar, não podia deixar as crianças
sofrerem falta de conteúdo programático porque estava muito atarefada e minha vida tinha
uma rotina de quase 24h. Sempre me lembrava dos alunos e da sua dependência de uma
atenção específica e valiosa. Mas, Deus providenciou todas as coisas e conseguimos fazer o
muro. Depois, com muita luta dos meus pais, minha e do meu namorado, Geraldo, hoje meu
esposo, grande amigo e amor, construímos o térreo.
37

Eu e Geraldo resolvemos nos casar, então ele cuidou de providenciar nossa moradia.
Meu sogro, Geraldo Florio, e minha sogra, Maria José Florio, cederam uma casa deles para
que começássemos a vida a dois. Eles pintaram, fizeram os consertos necessários e, aos
poucos, compramos os móveis, eletros domésticos, eletros eletrônicos e tudo de necessário
em uma casa. Eu e minha mãe tratamos de confeccionar as lembranças do casamento, o que
fizemos com os olhares voltados para a escola e para a barraca de vendas.
Meu casamento ocorreu em 23 de dezembro de 1994, na Igreja Batista em Centenário
no RJ, a mesma onde fomos batizamos. Com muita luta, eu e meu esposo, ambos com a
mesma profissão de professor, fizemos a festa do casamento. Sempre fomos amigos, desde
criança, o que facilitou muito a nossa boa convivência até hoje. Crescemos na mesma igreja e
bairro. Nossas famílias se conheciam antes mesmo de nascermos. DEUS foi maravilhoso para
mim, tenho certeza que para ele também. É o que falamos todos os dias um para o outro.
Não foi nada fácil o início do casamento. Naquele período, todas as coisas eram
conquistadas com muita dificuldade. Casamo-nos praticamente na véspera do Natal, momento
das férias escolares. Como todo educador, pensamos nos alunos e não haveria nenhuma
possibilidade de atrasar o conteúdo dos discentes.

Foto 4 - Meu casamento religioso.

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Rio de Janeiro, 1994)

Em 1996, engravidei do meu primeiro filho. Nosso bebê Mateus Cota Florio veio
para nós e toda família como um grande presente. Comprei uma chupeta e uma mamadeira e
38

entreguei para meu esposo. Ele já sabia o motivo. Foi uma grande alegria para toda a família.
Com seis meses de gravidez, passamos algumas dificuldades financeiras e precisamos vender
o carro para ajudar na construção do colégio. Foi muito difícil ir trabalhar a pé e grávida todos
os dias, até os nove meses. Apesar de enjoar e passar mal todos os dias, sabia que a gravidez
estava tranquila e sem riscos, pois fiz um excelente pré-natal. Em 21 de abril de 1996 nasceu
o meu bebê, forte e saudável.

Foto 5 - Eu e meu primeiro filho, Mateus.

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Rio de Janeiro, 1996).

Foi uma emoção inexplicável, um presente de Deus. Filhos são herança do Senhor,
mas tinha ciência da responsabilidade que me aguardava: educar, amar e cuidar. A alegria
estava completa com o nosso bebê. Trabalhava todos os dias. Como tinha meu próprio
empreendimento não tive resguardo. Terminamos o primeiro andar do colégio e resolvemos
logo fazer o segundo andar, com muitas dificuldades. Algumas mães não podiam pagar as
mensalidades, mas nós tínhamos o dever de ajudar o outro, estar com outro. Graças a Deus
tudo era suprido.
Em 1999, fiquei grávida do nosso segundo bebê, Lucas Cota Florio. Nessa gravidez
passei muito mal. Enjoava e sentia tonturas, mas, como na outra gestação, trabalhei até os
nove meses. A felicidade estava completa, Deus me concedia mais uma benção e agora
seriam dois meninos para andarem um ao lado do outro. Dessa vez, eu tinha o colégio, os
alunos, a obra, um filho para tomar conta e, mesmo com todos os afazeres, tinha que superar e
seguir em frente. O bebê nasceu forte e saudável. Veio para agraciar e completar a nossa
família. Um grande presente de Deus.
39

Foto 6 - Eu e meu segundo filho, Lucas.

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Rio de Janeiro, 1999).

Essas experiências me fizeram crescer em todos os sentidos, principalmente na vida


profissional. Apesar de todos os osbstáculos não desistia de estudar. Assim, em 1989,
comecei a me preparar para a tão sonhada Universidade na Associação Fluminense de
Educação (AFE), uma instituição de ensino superior que possui o colégio de aplicação, onde
já havia cursado o ensino médio. Eu entendia que o Curso de Pedagogia poderia me ajudar a
atender um número maior de alunos, além disso, era uma forma de continuar meu
aprendizado.
Sempre acreditei que o estudo é a base para, a cada dia, evoluirmos em todas as áreas
e para se alcançar uma formação de conhecimento qualificada, que permita atender com
maior capacidade os alunos. Nessa época, lembro-me de uma senhora do bairro Centenário
Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, onde era localizada a escola. Ela me procurou para falar
sobre seus quatro filhos. O mais velho já estava com mais de 14 anos e tinha paralisia
cerebral, por isso era cadeirante. Outras duas filhas não tinham nenhuma dificuldade, mas
ainda eram pequenas. Havia ainda a menor, que tinha dificuldades de aprendizado. Essa mãe
veio me falar que não tinha como pagar uma escola para seus filhos. Diante de tanto
sofrimento e sinceridade dessa mãe, eu não poderia me recusar a fazer a matrícula de seus
filhos. Matriculei as crianças. Acreditava que teriam uma oportunidade de ter uma vida
melhor por meio do êxito escolar, que aprenderiam a ler, escrever, conviver e ser.
Ao me deparar com essa situação, passou em minha mente um filme de minha vida,
quando sofri discriminações diversas. Por isso, lutei para estudar e galgar o meu espaço com o
objetivo de ajudar as pessoas que precisavam. Quando temos um estabelecimento de ensino
em uma comunidade carente, não temos como agir somente com a razão, muitas vezes somos
40

obrigados a agir com o coração. Na verdade, a situação desses sujeitos e de todos os outros é
um problema dos cidadãos em geral, não só do Estado. A população carente é menosprezada e
vive à margem da sociedade. A todo instante podemos ver a vontade de lutar dessas pessoas e
só precisamos colaborar com as armas necessárias. Muitas vezes, um apoio é a pista que falta
para eles decolarem. Essas pessoas sofrem humilhações, preconceitos, discriminações, sem
contar com a falta de alimentação, carinho e apoio familiar.
Na escola, era visível, por exemplo, o preconceito de alguns em relação aos alunos
negros, ao ponto de não permitirem que se sentassem nas primeiras cadeiras das salas de aula.
Eu não entendia o porquê de tanta maldade. Comecei a colocar os alunos negros na frente e a
mostrar que somos todos iguais. Era comum o bullyng relacionado à cor, classe social e às
dificuldades de aprendizado. Na escola, isso era visto de uma forma discriminadora, o que
acabava por excluir alguns alunos do aprendizado, do conhecimento e do fazer. Desse modo,
o ser cidadão se distanciava daqueles que eram diferentes, bem como o empoderamento.
Com essa experiência, aprendi que a liberdade de cada um se fundamenta na
construção de sua cidadania através das suas vivências e expressões do pensar, falar e da
efetivação de seus direitos. Com a minha formação docente, colaborei para a construção do
meu saber fazer, saber ser e saber aprender. Com muito diálogo, sem me preocupar com
fronteira, nem com a distância entre o querer e o buscar, obtive meu espaço de saberes e
fazeres, bem como conhecimentos múltiplos para alcançar a ascensão social.
Precisamos respeitar as diferenças e fazer nossa parte, ou seja, ajudar, estar, sentir e
agir com a consciência de que todos nós somos diferentes. Com esse foco, continuei a ajudar
meus alunos e cada dia as implicações vinham para melhorar o local de aprendizado. Com a
perspectiva de fazer sempre o melhor, acompanhada de muita esperança, veio o resultado.
Nossa escola se tornou um lugar mais acolhedor e com grandes possibilidades de alcançar
ainda mais crianças. Queríamos incluir aqueles que buscavam recuperar o tempo retirado de
uma forma injusta, algo que somente é possível por acessibilidade humana.
O impacto social, geralmente, não possibilita a consistência do estudo, assim,
travávamos uma grande luta para a sobrevivência. Em outras palavras, ou se trabalha ou se
estuda; ou se alimenta ou se paga a escola. Mediante a minha realidade de vida, eu conhecia
muito bem essa situação. Na verdade, essa é a realidade de outros milhões de pessoas que
revelam sofrimento através de expressões nos rostos, no silêncio ou nas palavras jogadas ao
vento.
Com muita luta, comecei a cursar Pedagogia, um sonho realizado, mas continuava na
mesma rotina de trabalho na escola. Os anos passaram e a obra do colégio avançava tijolo a
41

tijolo, embolso por embolso e pintura por pintura. Graças a Deus, terminamos em parte os três
andares do colégio. Faltava a cobertura do terraço com uma certa urgência, devido a
aproximação do período de chuva, uma constância no Rio de Janeiro. A mobilha da escola
também era muito velha, ainda da antiga instalação. Na verdade, ela já foi comprada toda
velha, em um brechó de móveis. Nós consertamos e pintamos tudo, mas, com o passar de
todos esses anos estavam ainda piores.
Fomos, então, às compras das novas mobílias. Ligamos para a loja de móveis
escolares e, lembro-me como se fosse hoje, o nome do vendedor era Alfredo. Ele ficou tão
comovido com a situação da escola e das crianças, que parcelou em várias vezes. Quando
essas cadeiras e mesas chegaram, ninguém pode imaginar nossa alegria. Eu e meu esposo
colocamos tudo logo para as salas de aula, subimos as escadas e nem nos cansamos, a alegria
era imensa. E doamos as mobílias usadas.
Compramos TVs, videocassetes e muito mais. No decorrer dos anos, a luta era grande,
mas, a vontade de ver as coisas acontecerem era muito maior. Colocamos uma piscina para os
alunos e compramos uma Kombi para transporte, tudo com muito sacrifício. No período de
1993 a 2008 tudo ficou pronto. Foram 15 anos de luta para construir e equipar o prédio.
Em 2008, a obra ficou totalmente pronta, com exceção da cobertura de telhas. Fizemos
até o terraço e um lindo playground. Para ajudar nas despesas, vendemos nosso carro e
ficamos a pé novamente. Com a chegada do período das chuvas, tivemos mais um ano de luta,
porque chovia muito e, sem a cobertura, mesmo com laje, a água entrava pela escada e
molhava bastante dentro da escola. Fizemos uma linda brinquedoteca, arrumamos os
brinquedos e livros. Estava tudo lindo e eu havia me esgotado, esgotado de tudo.
Depois de tudo construído, de sonhos conquistados, no final de 2008, resolvi mudar de
lugar e profissão. Eu estava com alguns problemas de saúde, em decorrência de muita
preocupação e do peso que pegava, porque, na escola, subia e descia as escadas com cadeiras,
livros entre outros objetos. Nosso destino era a cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte.
As pessoas não compreendiam a nossa decisão de ir para outro lugar e deixar tudo para traz.
Era a cidade onde nasci e fui criada, mas a filha da empregada, a menina da barraca, depois de
tudo que passou, não aguentava mais. Saí do lugar onde tinha meu trabalho, a minha cidade
que tem as quatro estações que amo. Confesso tive muito medo e a apreensão era muito
grande. Exigia uma confiança cega e extrema em Deus.
Na realidade, a grande cidade geralmente facilita a nossa vida e eu sempre morei no
Rio de Janeiro. Na minha mente pensava: como será viver no interior e em um lugar onde
nunca estive? Como serão as pessoas? E os meus filhos irão se acostumar? Alimentava dentro
42

do meu ser a maravilha que seria esse novo lugar, mas, a dúvida era presente. A resistência
existia nas representações constituídas nos contextos e textos que construí durante toda minha
vida no mesmo lugar.
Fechamos a escola e viemos para Mossoró. Eu e meu esposo fomos contratados por
uma empresa prestadora de serviço para a empresa Petróleo Brasileiro S.A. Eu assumi a
função de administradora financeira e meu esposo de operador. Com o objetivo de uma
formação continuada, fizemos uma especialização em Engenharia de Petróleo e gás.
Entretanto, em nosso coração só existia a educação, mas precisamos aprender novas coisas.
Quanta dor deixar tudo no Rio de Janeiro, depois de tantas lutas. São incontáveis todas
as situações vividas. Mudar para o Nordeste, não foi fácil. Todos me falavam que iria
enfrentar a seca, passar fome, mas era a vontade de Deus. Deus falou para nós como falou
para Abraão em Gênesis (12, 1-3):

1 Ora, o Senhor disse a Abrão: Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa
de teu pai, para a terra que eu te mostrarei.
2 E far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome;
e tu serás uma bênção.
3 E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te
amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra.

Em 12 de fevereiro de 2009, chegamos a Mossoró eu, meus dois filhos Mateus aos
seus 13 anos e Lucas com apenas 08 anos, minha mãe e meu pai. Meu esposo ficou no Rio de
Janeiro para resolver as pendências da escola, nossas casas e as mudanças. Quando entrei na
cidade, foi uma grande novidade. Como vim de uma grande cidade, com trens, metrôs, ônibus
para todos os locais, muitas lojas e muito barulho, não sei explicar o que senti. Estava ciente
da vontade de Deus na minha vida. No olhar de meus filhos, um brilho de ansiedade como
seria viver em um local onde tudo era novo, uma diferença enorme de onde vieram. Em
pouco tempo, nos apaixonamos pela cidade. Comecei a procurar escola, um conservatório de
música e o curso de inglês. Nunca reclamei e tenho aprendido a amar e olhar com outras
lentes está preciosa cidade de Mossoró que Deus me deu. Um local onde fui muito bem
recebida.
Logo pedi a transferência de meus filhos da Escola de Música Villa Lobos, no Rio,
para o Conservatório de Música D'alva Stella Nogueira Freire, da UERN, reconhecido como
pioneiro no ensino formal de música em Mossoró e na região do alto-oeste potiguar. Nesse
local meus filhos se formaram músicos. Os transferi da Cultura Inglesa no Rio de Janeiro,
43

para o Centro Cultural Anglo Americano (CCAA), em Mossoró RN, onde concluíram o curso
de Inglês. E os matriculei na escola tradicional curricular.
No início, foi uma grande luta para eu dar conta de todas as responsabilidades sozinha,
porque meu esposo estava no Rio de Janeiro e eu em Mossoró. Trabalhava e tinha que levar
meus garotos na escola e cursos. Foi desafiador, mas nunca pensei em desistir. Casualmente,
não ia pegá-los no horário certo, porque estava em serviço. Às vezes, eles esperavam algumas
horas e, quando chegava, dava muitos beijos e pedia desculpas. Tinham ciência da
necessidade dos atrasos para preparar o futuro deles. Sempre dialoguei muito com meu esposo
e filhos para um crescimento familiar.
Meu horário de expediente era das 07h às 17h. Durante as 24 horas do dia, ficava
sobre aviso. A qualquer momento, poderia ser chamada de volta ao trabalho. Não tenho como
contar quantas madrugadas meu sono foi interrompido. Não tinha dia hora, nem local. Foi
muito difícil passar 30 dias sem meu esposo, em um lugar desconhecido, mas no dia 12 de
março de 2009, ele já tinha resolvido tudo no Rio de Janeiro e veio para Mossoró.
O tempo passou e nossos filhos cresceram. Era hora de cursarem a faculdade. Ambos
foram aprovados no vestibular da Universidade Federal Rural do Semiárido, em Mossoró
mesmo. Mateus já terminou sua primeira graduação, em Bacharelado em Ciência e
Tecnologia (CIT), e está cursando Engenharia de Produção, e Lucas concluirá seu curso de
CIT – Bacharelado em Ciência e Tecnologia em 2018.2. Eu e meu esposo também fizemos
outras especializações e graduações.
Eu sentia necessidade de aprender mais e buscar novos horizontes. Em julho de 2008,
terminei o Curso de Bacharel em Direito, um percurso difícil. Era mais uma vitória sem
explicação, com alegria em dobro, porque fiz junto com meu esposo. Concluímos juntos essa
graduação. Foi um presente para nós, nossos filhos e familiares. Fizemos a formatura, porque
tanto eu como ele, na outra graduação não tivemos condição financeira de fazer as festas de
formatura.
Foi uma experiência única, vislumbramos um êxito conquistado por meio dos estudos
e a cada dia melhoramos nossos conhecimentos, aprendemos mais. Vivemos uma nova
perspectiva em limites e possibilidades, com uma visão ampla das nossas convicções. Temos
a oportunidade de fazer mudanças e buscar sempre o inacabado. Ao partir para um novo
paradigma e um novo conhecimento, muito diferente de uma pós-graduação que fiz em
petróleo e gás, somente para eu adquirir conhecimento para uma nova profissão, pude ter uma
análise muito melhor de conhecimento. As novas experiências, um novo pensar me
possibilitaram rever a minha vida e existência, me tornaram um sujeito de melhor
44

entendimento para vida. Continuo a lutar sempre, sem desistir. Tenho buscado persistir e ver o
mundo de outra maneira, mas, sempre priorizo aquilo que Deus me proporciona, porque é o
melhor.

1.2 RELATOS DE SUPERAÇÃO E ALTERIDADE DE UMA PEDAGOGA COM


DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL

Quando resolvi cursar o ensino superior em pedagogia, ainda no Rio de Janeiro, no


ano 2001, eu já tinha uma escola, por isso, sentia a necessidade de dar continuidade à
aquisição de novos conhecimentos e de um olhar voltado para as descobertas. O desafio era
grande, porque eu já trabalhava e tinha dois filhos. Havia muitos empecilhos. Eu sabia que
teria que vencer todos os obstáculos. Não podia voltar atrás.
Determinada e sonhadora resolvi enfrentar todas as barreiras, pois, como afirma Freire
(1999, p. 38), “educar exige risco”, o risco desafiador e constante, com muita dedicação e
ensinamentos para ambos. Sim, é preciso correr riscos para educar, ensinar e abrir
possibilidades de ensino de modo a facilitar a aprendizagem do aluno. Comigo não foi
diferente, para educar tinha primeiro que continuar meus estudos. Não podia parar no tempo,
nem muito menos cruzar os braços e ver o tempo passar, até mesmo porque essa nunca foi a
minha filosofia de vida.
Considerava a educação um direito prioritário para o meu crescimento intelectual e
também para ajudar mais meus alunos, que dependiam de mim. A sociedade mostra uma
necessidade de aperfeiçoar, buscar voar mais alto para uma postura mais ética. Tinha
necessidade do trabalho pedagógico e de metodologias novas para permitir aos meus alunos
que experimentassem um olhar diferenciado em busca de sonhos, conquistas e aprendizados.
Como propõe Freire (1996), a educação deve ser cheia de afetividade, sem deixar algo
interferir no cumprimento moral e no dever do docente em seu domínio. Deve constituir-se
numa relação pedagógica cultural. Não se trata apenas de gerar a educação como transmissão
de conteúdos curriculares por parte do educador. É necessário motivação no educar e a
consideração da sua autonomia. Deve-se estabelecer com a escola uma maneira de dialogar.
Precisava realizar, apropriar-me, inserir-me em um novo espaço, proporcionar-me
desafios para um melhor aprendizado e experiências. Afinal, não é na história aprendida que
se apoia nossa memória, é na história vivida. A formação diária é o princípio de busca e
compreensão, precisamos ter consciência e nos qualificar a cada dia para conquistar uma
prática de um novo olhar.
45

Ao relembrar passagens vividas, percebo que foram verdadeiras lições de


aprendizagem que, ainda hoje, marcam minha vida. Destaco a convivência com os meus pais,
irmãos, igreja, escola e com o meio em que estou inserida. Essa convivência possibilitou o
meu autoconhecimento sobre a educação e a cidadania. Por meio dela adquiri uma maior
dimensão da construção de formação e práticas educativas do meu pensar e refletir.
Um dos primeiros desafios como pedagoga, em uma época cheia de preconceito e
discriminação, foi aceitar uma mãe matricular sua filha, Juliana, de quatro anos, com
Síndrome de DOW, na turma do Jardim de Infância I. A primeira reação da professora da
turma foi falar que não tinha nenhuma formação para dar aula para a aluna, pois essa mordia,
batia e nada entendia. A professora pensava assim.
Nas atitudes e palavras da professora, sentia que sua concepção era de que a criança
deveria ficar em casa, que ela era um problema da mãe. Não pensava que a aluna seria uma
responsabilidade da escola, de cada professor, de cada pedagogo, e de todos que ali estavam.
Como dona da escola, busquei proporcionar a todos os profissionais que trabalhavam para
mim uma educação continuada. Os incentivei a realizarem vários minicursos e cursos
voltados à inclusão, diversidade, acessibilidade. Eles precisavam fazer novas leituras. Não
poderiam tentar justificar o injustificável. Deveriam buscar, dentro de si, um encontro e
promover aprendizado mútuo. Os docentes precisam empoderar-se, acreditar na capacidade
existente em cada um, ter consciência e confiar em si. Precisavam se condicionar a dias
melhores, a dar liberdade à mente no processo de ensino e aprendizagem.
Após o minicurso com o tema “Leitura Infantil: como superar as dificuldades”, tudo
melhorou. A compreensão e o convívio com a aluna se tornaram um pouco mais fácil. Ela já
participava de todas as atividades em sala de aula e até das aulas extras. Com o tempo, se
adaptou às normas da escola. Aos poucos, Juliana foi aprendendo e todos os profissionais da
escola tinham a responsabilidade de amá-la e educá-la. A cada progresso, a cada traçado e
letrinha, todos vibrávamos juntos.
Não falávamos em outra coisa a não ser na alegria do progresso dela através do seu
esforço, infinitamente maior do que a sua deficiência. Em um ano, ela já escrevia seu nome,
sabia algumas cores e vogais. Às vezes, fazia algumas confusões, mas o grande avanço
superava tudo. No percurso da sua história de vida, foi fazendo a diferença com os
coleguinhas e agora não mordia mais ninguém, não batia, já brincava, cantava do seu jeito
especial, e tinha seu lugar de destaque. Uma caixinha de surpresas agradáveis a cada minuto.
46

A alegria no olhar da aluna valia a pena. Cada minuto e instante dedicado, fortalecia a
crença de que tudo ia dar certo. Valeu a pena investir não só na Juliana, mas em nosso eu, em
nosso fazer, em nosso olhar para as dificuldades como desafios. Aguardar com paciência,
dedicação e, simplesmente, com muito amor foi gratificante. Ela nos ensinou momentos
prazerosos e únicos. Devemos guardá-lo dentro do peito para compreender o verdadeiro
significado de aprender a ser, aprender a fazer, aprender a conhecer. O dia a dia na escola era
de permanente desafio para todos nós profissionais da educação, não só diretores, professores,
e ajudantes, mas também o porteiro, as merendeiras, as serventes. Crescíamos na medida em
que a responsabilidade crescia. As descobertas surgiam e, a cada dia, estávamos a nos
qualificar, a nos tornar conscientes da responsabilidade, a nos tornarmos pessoas melhores,
para um futuro de desenvolvimento e esperança, um desafio para grandes aprendizados, com
muita dificuldade.
Recebemos outro aluno com deficiência. Seu nome era Flávio e tinha 10 anos de
idade. Ele apresentava dificuldades intelectual e motora, mas era muito alegre. Não podia ser
contrariado, porém, com muita atenção, descobrimos seu gosto pelo teatro. Para o seu melhor
aproveitamento, ele foi colocado no grupo teatral escolar e pedimos para ele estudar a matéria
que seria aplicada pelo grupo. Usamos a interdisciplinaridade entre o teatro e os conteúdos
programáticos aplicados em sala de aula. Assim ele conseguia estudar e aprender. Isso foi de
grande valia para ele e um enorme prazer para nós.
Essa experiência foi fantástica. Flávio começou a aprender através do teatro. Aos
poucos, ele construía sua educação e cidadania. Lembro-me de uma frase que ele falou:
“Agora tia, eu sou gente!”. Ele mencionou que sua mãe sempre falava isso para ele. Em nossa
conversa, expliquei a ele sobre a importância da sua vida para todos nós. Disse que ele era um
menino lindo e alegre, inteligente, e um grande ator. Ele falava muito bem sobre a matéria,
era muito estudioso e tinha uma grande capacidade de aprender, muita potencialidade.
A convivência com Flávio me permitiu perceber que a educação inclusiva deve
acolher a todas as pessoas, sem exceção, respeitando as diferenças e garantindo o direito à
educação (MANTOAN, 2006). O trabalho com esse garotinho reforçou minha concepção de
que devemos realmente lutar para que esses direitos sejam, de fato, respeitados e efetivados.
De repente, eu me vi acolhendo e incluindo crianças como meus alunos, sem discriminá-las.
Não posso deixar de falar sobre as dificuldades de muitos alunos com a matemática. Os
professores estavam preocupados como ensinar as quatro operações: somar, dividir,
multiplicar e diminuir. Como a escola ficava em um local de classe baixa, pensávamos em
alguma didática para trazer resultado e ajudar as mães, porque muitas delas não conseguiam
47

ajudar nos deveres de casa. Mandamos, então, o comunicado com o aviso de que, duas vezes
no mês, as crianças teriam aulas de matemática no supermercado. Elas iriam e voltariam com
a Kombi da escola, só seria necessário que levassem qualquer quantia em dinheiro para
comprar algo. Andávamos no mercado e as crianças escolhiam o que comprar, assim tinham o
contato direto com as quatro operações por meio do lúdico. Elas aprenderam a mexer com o
dinheiro e, ainda, utilizamos a interdicisplinaridade.
Usamos a pedagogia da matemática, a pedagogia social, de modo que os alunos
podiam usar as quatro operações na prática, como sujeitos dessas operações, com uma lista de
compras. Com os professores, trabalhamos alguns autores, entre eles Paulo Freire. Cada um
com a sua leitura, com uma linguagem significante, viva. No começo, os professores acharam
uma ideia muito delicada tirar o aluno da escola e dar aula dentro do mercado. Para eles era
algo irreal. Com o passar do tempo, se acostumaram, foi só uma questão de organização. Com
a brincadeira aliada à aprendizagem logo veio o grande resultado.
Entendo esse momento como oportuno para explicar que, às vezes, colocamos
dificuldades em tudo, como se não houvesse outras pessoas com dificuldades e impedimentos
maiores que os nossos. Falamos como se somente nossa vida fosse difícil. Esquecemo-nos de
ouvir as narrativas de outros sujeitos, de participar das histórias de outras pessoas. Ao agirmos
assim perdemos a oportunidade de saber que a vida de todos é uma constante luta, cada um
com suas dificuldades e muitas histórias diferentes das nossas.
Devemos vencer os obstáculos com zelo, dedicação, amor, alteridade e
empoderamento para chegarmos ao nosso objetivo. É necessário entender que a nossa
formação é continuada e que devemos quebrar o modelo padronizado quanto aos nossos
conceitos. Precisamos reconhecer o nosso objetivo e lugar dentro da sociedade, sabermos que
somos sujeitos da nossa história, formadores de opiniões.
A minha consciência crítica, adquirida pelas minhas experiências, me permitiu
enxergar que o educador não é somente aquele que educa, mas também o que é educado.
Segundo Freire (1981, p. 79), “[...] ninguém educa ninguém, ninguém se educa a si mesmo.
Os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo.” Freire nos conduz ao
entendimento de que somos seres inacabados e inconclusos, formados na convivência com o
outro, na relação de troca de saberes. Para ele, não sabemos tudo, sabemos algumas coisas.
Por isso, estamos sempre construindo um novo saber. Nessa construção, sempre aprendemos
alguma coisa e sempre ensinamos algo uns aos outros.
Nesse contato que tive com crianças especiais, alguns alunos com TDAH (Transtorno
do Déficit de Atenção com Hiperatividade), pude ver que eles tinham muitas dificuldades na
48

leitura, o que me motivou a tentar ajudá-los. Como ser inacabado que sou, busquei
conhecimentos nas áreas afins para aprender como lidar com esses alunos. Na tentativa de
contribuir com a superação de suas limitações, eu e os professores da minha escola
resolvemos fazer um joguinho silábico e um caderno de letras com as famílias das consoantes.
O caderno foi confeccionado com a letra de todas as consoantes em borracha EVA, para que a
criança pudesse passar o dedo formando a letra. Na mesma folha de cada letra, havia a família
de cada consoante. O joguinho, por sua vez, foi feito com uma lata de leite ninho com tampa
de plástico encapada e decorada com borracha EVA. Dentro da lata colocamos as sílabas de
cada família em pedaços de borracha para formar palavras e, no futuro, frases. Cada família
de consoante tinha uma cor. Ainda hoje guardo os modelos desses recursos.
Logo começamos a ver o resultado, as crianças desenvolveram a leitura e, depois de
alguns meses, já formavam frases. É muito bom quando agimos em favor dos outros, isso
volta como forma de benefício para a nossa própria vida e ajuda nossa autoestima. Para seguir
em frente, devemos buscar soluções para um novo aprendizado, a fim de melhorá-lo a cada
instante, isso implica na busca de uma perspectiva ampla e em uma nova leitura de mundo.
Como forma de incentivo, todos os alunos recebiam uma premiação pelos bons
resultados na aprendizagem. As premiações eram com medalhas. Cada um ganhava a sua, de
acordo com sua capacidade. Todos eram alcançados, sem discriminação ou preconceito. Nas
experiências fortalecedoras de um desdobramento enxergamos a cidadania e a cultura da paz,
sempre a colaborar com as dificuldades dos alunos e a construir um novo fazer e saber para
alcançarem um futuro melhor.
As crianças aprendiam através da música cantada e das danças, apresentadas em todas
as datas comemorativas. Buscávamos sempre trabalhar os quatro pilares da educação:
aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a viver com os outros; aprender a ser. Como
se fala, se eu quero conhecer eu desenvolvo o aprender a conviver para aprender a aprender.
Depois, aprendo a ser junto, superando muitos desafios.
A educação tem procurado um caminho no qual todos possam aprender, um modelo
universal que vise a concepção de objetos, equipamentos e estruturas do meio físico
destinados à utilização das pessoas em geral, sem necessidade de projetos adaptados ou
especializados. O objetivo é o de simplificar a vida de todos, qualquer que seja a idade,
estatura ou capacidade, bem como tornar os produtos, estruturas, comunicação/informação e o
meio edificado, utilizáveis pelo maior número de pessoas possível, a baixo custo, ou sem
custos extras. Assim, todas as pessoas, não só as que têm necessidades especiais, mesmo que
temporárias, poderão integrar-se totalmente numa sociedade inclusiva.
49

Ao mudar a nossa prática, mudamos nossos pensamentos e nos tornamos capazes de


realizar uma leitura de mundo, bem como reflexões. Aprender sob qualquer Foto que seja é,
para mim, mais um aprendizado em um momento de minha história e, também, de outras
histórias da humanidade da sociedade na qual eu vivo, do espaço no qual eu aprendo, das
pessoas que estão encarregadas de me ensinar. Eu gosto de desafios, amo pessoas, gosto de
falar, brincar e respeitar o próximo como ele é. É claro que tenho as minhas convicções.
Todavia, acredito que nossa função é ajudar a todo o tempo, com isso nos tornamos mais
fortes e ganhamos voz. Precisamos buscar o dinamismo para um aprendizado e uma
autonomia cuidadosa.
Nessa minha caminhada, aprendi que devemos lutar contra pensamentos negativos,
presentes em diversos argumentos, tais como: “não estou preparado”, “não estudei para isso”.
Eu continuo a aprender a cada dia. Estudar tem me feito muito bem. Ainda estou muito longe
do final desta trajetória que apenas comecei. Na verdade, preciso fazer uma nova leitura de
mundo a toda hora, ver por vários ângulos e mudar as lentes, melhorar sempre.
Lembro-me do meu primeiro estágio, em um Centro Integrado de Educação Pública
(Brizolão), na favela do Lixão, em Duque de Caxias - RJ. Quando cheguei no local, fiquei
encantada com a estrutura, um prédio lindo, com um refeitório com televisão e salas para
descanso com camas. O projeto de Darcy Ribeiro e Brizola era colocar a criança na escola em
turno integral, mas a inclusão estava muito longe dali. As crianças não eram tratadas com
igualdade. Umas eram mais limpinhas, outras não. Aquelas com deficiência, dificilmente
conseguiam uma vaga, e quando conseguiam ficavam jogadas no pátio. O que valia era a
máxima “Lugar de criança é na escola”. Não discordo dessa máxima, mas devo esclarecer que
se a inclusão não ocorrer de forma efetiva nas escolas as camadas populares estarão sempre
oprimidas dentro do sistema e, desse modo, a minoria nunca será fortalecida.
Acredito em estímulos e desafios provedores da capacidade de encontrarmos uma
nova sociedade. Tenho esperanças da formação de uma nova escola, através do ouvir o outro,
pensar no outro, estar com outro, ser o outro, buscar o outro, conhecer o outro, conviver com
o outro. Aprendemos mesmo sem querer e, nesse processo, podemos fortalecer a cidadania,
podemos fazer com que todos tenham direitos iguais, nas dimensões da construção, centradas
na vida do sujeito cidadão.
Com a prática do aprendizado, consigo perceber o quanto me superei. A educação me
ajudou a transformar a minha vida, a ir além dos meus limites e possibilidades de
empoderamento. Mudei o meu olhar, agora ampliado para uma diversidade. A cada dia tenho
alcançado o ascensão social através dos meus estudos, desde a educação básica até a
50

universidade, com destaque para a formação de saberes, experiências e memórias, vividas no


decorrer da transferência mútua de conhecimento. Construo a cada dia a esperança de estudar
para mudar.

1.3 INCLUIR E SER INCLUÍDA: O MEU CAMINHAR COM A INCLUSÃO

A vida é muito interessante e maravilhosa quando dela não temos medo, quando
buscamos ter paz e vivemos para respeitar a Deus e a todas as pessoas. Cada um de nós temos
nossos problemas, desejos, sonhos e planos. Uns são ricos outros pobres, mesmo assim somos
todos iguais. Como cristã protestante, acredito na lei da semeadura: colhemos o que
plantamos. A luta de cada um deve ser em busca de ajudar o outro, porque cada um sabe o
quanto sofreu para alcançar seus objetivos e sonhos.
As lutas, assim como as conquistas, compõem nossas vidas e narrá-las é algo que
podemos fazer com sutil flexibilidade. Essa observação se aplica ao pensamento de Certeau
(1998), quando fala que todo relato é uma viagem, uma prática do espaço relacionada as
nossas táticas cotidianas. Toda nossa aventura, narrada de forma verdadeira ou falsa, nos faz
caminhar e produz ações e reações derivadas de lugares, na construção da cidadania. No meu
caso, as experiências vividas do meu cotidiano foram construídas em lugares que marcaram
os acontecimentos relacionados com a minha prática de ensino e aprendizagem. Nesse
sentido, a minha cidadania me constitui um sujeito de possibilidades com desejo de trabalhar
a inclusão na educação. Desse modo, não é possível falar em inclusão se não conseguimos
enxergar o ser cidadão. Não é somente estar com nossas obrigações sociais em dia,
precisamos buscar a cultura da paz, nos vermos no outro, estarmos com o outro.
Passei por vários percalços até alcançar minha inclusão, mas, movida pelas minhas
necessidades, eu tinha que lutar para alcançar os meus objetivos. Minha mãe e o meu pai
dependiam de mim financeiramente, por esse motivo tinha que estudar e me incluir. Nesse
percurso, descobri que falta na humanidade a sensibilidade e a consciência de que todos nós
temos o dever de ajudar o outro, de sermos verdadeiros cidadãos. A cidadania é entendida
como a prática do respeito aos direitos dos indivíduos e o cumprimento dos deveres no
Estado. Direitos e deveres devem andar sempre juntos. Inclusão, por sua vez, é o conjunto de
meios e ações para combater a exclusão dos benefícios da vida em sociedade, provocada pelas
diferenças de classe social, educação, idade, deficiência, preconceito social ou preconceitos
raciais. Inclusão social é oferecer a todos oportunidades iguais de acesso a bens e serviços.
51

Minha caminhada rumo à inclusão começou, de fato em 1986, quando completei meus
dezoito anos. Nesse momento, foi detectado um problema no meu joelho. Dirigi-me ao
hospital e, ao chegar, o médico me aconselhou a optar pela cirurgia, o que me obrigaria a ficar
cerca de três meses em repouso. Mas, as circunstâncias do momento não me permitiam parar
tudo para fazer a operação e ficar em repouso. Então eu desisti da cirurgia e continuei a
trabalhar e a viver. Quando sentia dor, o médico engessava a minha perna por alguns dias e
melhorava, continuava a subir e descer escadas, pois não tinha outra opção.
Na época, eu já havia aberto o meu Colégio Alegria do Saber, localizado na cidade de
Duque de Caxias - RJ, no bairro Centenário, onde nasci e vivi até os meus 41 anos. Devido a
minha rotina, a situação do meu joelho direito piorava a cada dia. Para não sentir tantas dores
comecei a sobrecarregar o joelho esquerdo. Este ainda não tinha nenhum problema, mas,
devido ao excesso de esforço, os dois joelhos foram comprometidos com condromalácia
patelar IV7. Essa doença é mais comum em mulheres e dividida, basicamente, em quatro
níveis, de acordo com a gravidade do comprometimento da patela8. Quem sofre com algum
grau de condromalácia patelar pode experimentar muita dor, independente do grau indicado
no diagnóstico. Por causar uma inflamação, as pessoas podem ter crises agudas de dor e,
nesses casos, necessitam de medicação.
Neste mundo, ou trabalhamos ou não sobreviveremos. Vivemos de fazer escolhas e, às
vezes, sofremos as consequências dessas escolhas. A vida é assim, sempre temos que optar
por alguma coisa em detrimento de outras. Naquele momento da minha vida, eu não tive outra
escolha, eu possuía sonhos e desejava concretizá-los. Então, mesmo com as dores, trabalhava.
Várias vezes, eu tinha que subir e descer as escadas do prédio da escola, no decorrer de 14
anos.
Com o tempo, ao subir as escadas, os dois joelhos estralavam e forçavam algumas
vertebras da coluna nas regiões do tórax, da cervical e da lombar. Em poucos anos veio o
resultado: braços e pernas dormentes. Pensei que estava com problema de coração. Meus
braços ficaram limitados a alguns movimentos. Desloquei-me para o hospital, com o objetivo

7
Desgaste na cartilagem do joelho, numa região chamada côndilo femoral, que acaba por ocasionar dor e
inflamação nos joelhos. Disponível em: https://www.saudecuf.pt/desporto/lesoes/lesoes-do-joelho/lesoes-da-
cartilagem-do-joelho. Acesso em: 23 out. 2018.
8
A patela é um osso de formato ligeiramente triangular, que fica na região da frente do joelho. Ela encaixa
na porção final do fêmur (tróclea do fêmur) e forma, assim, a articulação femoropatelar. A patela é ponto de
inserção para o quadríceps, o principal músculo do joelho. Pela sua localização, funciona como uma polia, que
facilita os movimentos de flexão e de extensão dessa articulação.
52

de fazer uma consulta, e o médico diagnosticou, mediante exames, problemas na minha


coluna e o comprometimento dos miótomos9.
Como consequência dessa doença, o nervo é tracionado (esticado) e, ao mesmo tempo,
os vasos sanguíneos da região também são prejudicados. Essas circunstâncias levam ao
sofrimento da raiz nervosa, que se manifesta por uma dor que se inicia no pescoço e se irradia
para a escápula e para um dos membros superiores, seguindo um trajeto bem definido.
Somado a isso há uma sensação de formigamento ou de dormência no percurso do nervo
comprometido, podendo ser sentida desde o ombro até determinados dedos da mão. Por
vezes, há, também, perda de força de um ou mais grupos musculares que dependem de uma
ou mais raízes comprometidas, as quais prejudicam determinadas funções dos membros
superiores, como a flexão ou extensão do antebraço.
Entre uma descoberta e outra, recebi mais uma notícia: estava sofrendo de
fibromialgia, uma síndrome comum em que a pessoa sente dores por todo o corpo durante
longos períodos, com sensibilidade nas articulações, músculos, tendões e em outros tecidos
moles. Os principais pontos afetados pela fibromialgia estão localizados, principalmente: na
parte da frente e de trás do pescoço; na parte de trás dos ombros; na parte superior do peito;
nos cotovelos; na parte superior das nádegas; no quadril; e nos joelhos.
No início, não foi fácil conviver com essas dores, mas, sempre que eu olhava ao meu
redor via pessoas em pior estado que o meu, por isso seguia em frente, a trabalhar, com meus
objetivos sempre determinados. A experiência, a cada dia, me proporcionou uma visão
condicionada a viver sempre, a aprender e fazer algo que pudesse me ajudar a contribuir com
o outro. Não podia parar. Tomava o remédio e seguia em frente. A vida segue. A verdade é
que sempre fui muito feliz, mesmo na dor. Nunca ficava e nem fico triste. Amo o que faço. A
melhor coisa é fazer o nosso trabalho com prazer, vontade, garra e muito sonho.
Mesmo fragilizada, considerei todas as oportunidades alcançadas como únicas na
minha vida. Em meio a todos os impedimentos no percurso com a inclusão, aprendi,
conforme as palavras de minha orientadora, Ana Lúcia Aguiar, que “precisamos viver todos
os dias como se fossem únicos”. Comecei a lutar, sem cessar, para vencer as dores, trabalhava
muito e continuei a estudar. Ao me deparar com algumas dificuldades de acesso aos lugares
que costumava frequentar, por falta de rampas, calçadas, uma ajuda para descer do carro, ou
apenas uma palavra de força e superação, despertei para a importância da inclusão. Não podia

9
O diagnóstico foi: C4, C6, L2, a S1 mais acentuada nas raízes C5, C6 à direita e L4, L5, E L5 S1 bilateral.
Radiculopatia crônica: é a compressão mecânica de uma raiz nervosa dentro das vértebras ou nos forames de
conjugação.
53

tomar alguns medicamentos, porque os sintomas são fortes, relaxam os músculos e causam
muito sono. A solução era me acostumar com a dor e trabalhar, ou ficar de cama.
O medo me envolvia, mas me dava, cada vez mais, potencial para lutar, sem me
desestruturar. Em meio a toda essa luta, encontrei refrigério e descanso em Deus, que me deu
também forças para prosseguir. Acordo todos os dias com a consciência tranquila e com a
certeza da presença de Deus na minha vida. Ao mesmo tempo, sei que muitas lutas são
necessárias para as conquistas e vitórias, que têm um sabor de querer mais. A vitória é, pois,
um processo de concretização de uma intencionalidade de projetos de vida, uma
transformação permanente e, às vezes, imperceptível.
Aos quarenta e um anos de idade, em dezembro de 2008, quando tive de deixar meu
Estado, Rio de Janeiro, para trabalhar em uma multinacional em Mossoró, sentia muitas
dores. No ano de 2012, comecei a buscar soluções para os sintomas. Descobri que tais
patologias me tornavam uma pessoa com deficiência não perceptível, diagnóstico
acompanhado pelo preconceito, vindo, primeiramente, dos próprios médicos. Apesar dos
exames, como ressonâncias magnéticas, tomografia e ultrassom, me olhavam como se
deficiência fosse somente aquela aparente. As humilhações não pararam. Um dia cheguei no
consultório de um doutor, ele me mandou andar de um lado para o outro e me falou: “você
está ótima”. Com esse resultado, solicitei ao mesmo médico o atestado para eu voltar a
trabalhar, entretanto ele me falou que não seria possível me conceder o atestado, pelo simples
motivo de discordar que as patologias acusadas nos exames fossem um tipo de deficiência.
Consultei-me com vários profissionais especialistas nas áreas de ortopedia e
reumatologia. Lutava para que não fosse verdade, mas não obtive diagnósticos contrários.
Mesmo assim, a busca era constante por outro parecer, com médicos diferentes. Eu tinha
esperança de que os três médicos consultados estivessem equivocados nos laudos, ou que
falassem o que eu queria ouvir. No ano de 2015, fui a um especialista no Rio de Janeiro para
obter o resultado mais preciso, porém, o laudo foi o mesmo.
Resolvi, então, em meio a muita rejeição, admitir a minha deficiência. Quando os
médicos me proibiram de trabalhar, porque eu não podia mais subir e descer escadas, causar
impacto nos joelhos e pegar peso, fiquei muito triste. Fui acostumada a trabalhar desde os sete
anos de idade, época em que comecei a ajudar meus pais, e no auge dos quarenta e quatro
anos receber essa notícia não foi fácil para mim. Meu corpo e minha cabeça não admitiam
ficar parada sem fazer nada. Deparei-me, então, com uma luta constante de conscientização.
No início, sentia muitas dores nos joelhos, coluna e braços. Hoje, estou aprendendo a lidar
com a deficiência e com as dores. Atendo às recomendações solicitadas pelo médico e
54

procuro não forçar os joelhos e coluna para não agravar ainda mais o problema. Pelo fato de
não poder trabalhar, resolvi estudar. Foi nessa busca de uma formação continuada que se deu
o meu encontro real com a inclusão.
Ainda no ano de 2015, tentei uma vaga para aluna especial do Programa de Pós-
Graduação em Educação (POSEDUC), da Universidade do estado do Rio Grande do Norte
(UERN), que se relaciona à Linha de Pesquisa Práticas Educativas, Cultura, Diversidade e
Inclusão. De início fui aprovada para a disciplina “Memória, Formação e Pesquisa
(auto)biográfica”, que será detalhada no próximo tópico deste capítulo. A professora
responsável era Ana Lúcia Aguiar. Mas meu maior interesse era pela disciplina “Tópicos
Especiais na Perspectiva da Educação Inclusiva”10, ministrada pela mesma professora. Então,
em 2016 me inscrevi para aluna especial nessa disciplina e fui aprovada. No decorrer das
aulas, me deparei com diversas pessoas em situações mais graves que a minha. Isso fez com
que eu despertasse para um novo horizonte.
Participei de eventos como seminários, congressos, a fazer artigos. Queria só um
espaço para participar, poder ouvir, estar ali, conquistar aos poucos meu espaço com
humildade, despojamento e muita dedicação. Buscava melhorar e aprender a cada dia.
Precisava estar no meio da educação novamente, sentia muita falta de estar em sala de aula, a
ensinar e aprender.
Através das aulas e seminários sobre Paulo Freire, bem como das narrativas
autobiográficas de sujeitos com deficiência que vinham participar das aulas e seminários,
pude ver a transformação. Eles me mostraram um novo caminhar dentro do ensino e
aprendizado de vida e pude compreender como os sujeitos com deficiência são capazes de
construir sua cidadania, conscientes de seus direitos. O exemplo desses sujeitos me fez ver
que o ser humano está inacabado, podendo aprender sempre, além do que se espera.
Conforme Freire (1996, p. 55): “Na verdade, o inacabamento do ser inconcluso é próprio da
experiência vital. Onde há vida, há inacabamento. Mas só entre homens e mulheres o
inacabamento se tornou consciente. O inconsciente do ser humano.”
Ao participar das aulas do Mestrado, tomei consciência desses ensinamentos para o
meu crescimento. Estudar foi uma forma de superar minhas dificuldades, de estar viva, pois
nada estava acabado. As dores faziam parte das aulas alegres ministradas pela Professora Dr.

10
Mestrado em Educação, do Programa de Pós-Graduação em Educação (POSEDUC) da Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte (UERN) que se relaciona à Linha de Pesquisa Práticas Educativas, Cultura,
Diversidade e Inclusão.
55

Ana Lúcia Aguiar, responsável pela disciplina. Muitas vezes, as dores foram esquecidas e
superadas pelas diversidades de aprendizado.

Foto 7 - Professora Ana Lucia Oliveira Aguiar e eu, na UERN, em sala de aula.

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró, outubro de 2015).

Eu me superava a cada aula, como também nos congressos, seminários e minicursos


sobre a Lei Nº 13.146, de 6 de julho de 2015 - Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Não acreditava no que estava vendo. A
capacidade de superação das pessoas com deficiência me dava força para prosseguir e lutar.
Aqueles dias tristes acabaram. Eu tinha muito a fazer e aprender. Vivenciava um processo de
liminaridade e encontrava-me diante do sujeito empoderado, no momento de revisar, repensar
e voltar fortalecido.
É bem verdade que ainda há muitos obstáculos e preconceitos a serem vencidos para a
inclusão. É necessário que muitas pessoas contribuam para um novo pensar, não apenas, para
uma nova postura. Para Sassaki (1997), a inclusão social é um processo pelo qual a sociedade
se adapta para poder incluir em seus sistemas sociais gerais pessoas com necessidades
especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade. Mas,
para que a inclusão ocorra é necessária uma sociedade mais justa e consciente sobre o que
vem a ser incluir e ser incluído, somada à oportunidade de aprender a cada dia com outro, de
sermos o outro e estarmos com o outro para um novo entendimento.
56

Em novembro de 2015, participei do II Seminário Potiguar: Educação, Diversidade,


Acessibilidade e Direitos Humanos, realizado na Universidade Estadual do Rio Grande do
Norte (UERN), como monitora de duas oficinas, uma de Libras e outra de Braille. Por ocasião
dessa experiência, comecei a entender que ali na academia junto com as pessoas era o meu
lugar. Um momento único para mim foi a oportunidade de ver um cego em contato com a
linguagem das Libras Tátil – Sistema que consiste na Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)
adaptada ao surdocego, por meio do movimento das mãos do surdocego em cima das mãos do
interlocutor.
O seminário foi grandioso. Proporcionou-me o contato e diálogo com diferentes
sujeitos e suas particularidades. Foi uma experiência histórica para o meu aprendizado; um
encontro com a capacidade de tudo que poderia ser e fazer. Somada a isso surgiu uma vontade
enorme de apressar-me a conhecer mais da inclusão, de perseguir, buscar e encontrar, cada
dia, a concretização marcante de afirmação da minha legitimidade, de alcançar meus objetivos
mesmo diante de tantos obstáculos.
O momento ficou gravado em minha memória. Um presente que não seria possível
sem uma verdadeira conversão, uma revolução mental, uma mudança de toda a visão de
mundo social. A partir desse seminário, comecei a buscar minha dignidade e a resgatar minha
autonomia e cidadania. Obtive um novo olhar e passei a assimilar melhor o meu exercício de
vislumbrar novos sonhos, novas realizações, novas conquistas que esperavam por mim.
Em novembro de 2015, também participei do II Encontro Regional de Narrativas
(auto)biográficas (ERNARB). Foi maravilhoso. Pude experimentar saberes, tradições e povos
diferentes, mas unidos e felizes. Pude perceber de perto a Educação Inclusiva proposta por
Mantoan (2006), isto é, uma educação que deve acolher todas as pessoas, sem exceção, que
busca respeitar as diferenças e garantir o direito à educação. Essa é a perspectiva valorizada
na Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, que conta com a DAIN - Diretoria de
Políticas e Ações Inclusivas, dirigida pela prof.ª Ana Lúcia Aguiar.
Graças à visão inclusiva da universidade, fui recebida de braços abertos pelo Programa
de Pós-graduação POSEDUC/UERN, sem discriminação e com aceitação. Todos me
acolheram e me ajudaram a superar tudo aquilo que pensava estar perdido. As experiências
proporcionadas pelo programa, muito instrutivas e de rico aprendizado, proporcionaram uma
conversão de valores não só a mim, mas a todos os envolvidos.
O resultado desses encontros foi a percepção de que podemos vencer todas as
expectativas. A implicação disso foi a busca pelo conhecimento, alinhamento da identidade, a
luta de um pelo outro, o debruçar de um sobre o outro, não o outro quanto sujeito, mas como
57

produção desse outro. É um caminho que vai pelo toque do coração para ensinar a não pensar
só em nossa individualidade.
Aprendi que preciso dar voz aos sujeitos esquecidos, que preciso ouvi-los e fazer com
que haja mudanças em seu favor. Algumas leis sobre a inclusão das pessoas com deficiência
já foram aprovadas, como a garantia da Constituição Federal de 1988 e, agora, para melhor
fundamentação e aplicabilidade, foi criada a Lei N. º 13.146, Lei Brasileira de Inclusão (LBI),
de 06 de julho de 2015. Entretanto, podemos fazer muito mais por esses sujeitos contribuindo
uns com os outros. Considero importante a inclusão ser exercitada em todas as dimensões da
vida, seja pelo ato de oportunizar encontros, palestras, projetos, bem como pela adesão de
todos aqueles inseridos no processo inclusivo de educação.
Segundo Mantoan (2006, p. 19), “[...] na perspectiva inclusiva, suprime-se a
subdivisão do sistema de ensino. As instituições educacionais atendem às diferenças sem
discriminar ou trabalhar à parte com alguns alunos [...]”. Nesse processo, é de grande valia
ver todos engajados para o alcance de objetivos únicos: aprender a aprender; aprender a ser;
aprender a fazer.
Ainda com base nas lições de Mantoan, no decorrer da minha caminhada, tenho
percebido que a via do estudo e da educação inovadora e produtiva tem contribuído para uma
inclusão transformadora do mundo. A esperança de lutar é o caminho para adquirir uma
igualdade social, cultural e democrática, a fim de que os direitos e deveres sejam efetivados;
para que haja oportunidades para todos, sem discriminação.
No ano de 2017, no segundo semestre, com 49 anos de idade, consegui entrar para o
mestrado na UERN como aluna regular. Ainda penso estar a sonhar com essa conquista, mas
estou aqui a escrever a minha dissertação e espero não decepcionar minha orientadora e nem
todos que apostaram em mim, a felicidade é grande. A vitória de alcançar algo sonhado, não
para um melhor salário, mas para aprender. Sinto uma necessidade enorme de buscar
conhecimento.
Obtive a aprovação na proficiência, me debrucei muitas noites sobre os livros e assisti
a muitos vídeos. Foi uma emoção alcançar essa vitória, chorei muito. As conquistas têm sido
muitas. Penso em praticar a cada dia o aprender, através da leitura de mundo, e refletir os
saberes dentro do meu próprio pensamento.
As pessoas perguntam por que estou a estudar e esquentar a cabeça com estudo e eu
digo que estou vivendo cada minuto desse grande presente. Caminho e encontro a cada dia
uma razão para adquirir conhecimento e crescer sem medo. O contexto da minha vida mudou
58

ao entrar no mestrado em educação, mudanças, determinações e transformações tem


acontecido na minha vida de uma maneira inovadora e determinada.
Sinto uma vontade grande de estar a cada dia a esquadrinhar condições para que possa
contribuir e obter contribuição de relevantes meios da educação para mim e para o outro, na
busca por uma sociedade na qual a cidadania seja sempre um princípio básico; uma sociedade
em que haja êxito social para um futuro melhor. Entretanto, preciso sempre exercitar a crítica
sobre o meu pensar em transformar primeiramente a minha pessoa, depois o sujeito que está
ao meu lado.
Minhas memórias são recheadas de fotos. Sempre gostei de registrar os momentos da
minha trajetória em fotos e vídeos. Existe um ditado que diz: a foto faz o seguinte efeito para
a mente lembrar quando o coração esquecer. Mas, a vida não é feita apenas de bons
momentos. Quando eu ainda estava a cursar uma disciplina em caráter especial no Mestrado,
meu pai faleceu. Estava em um dos dias mais felizes da minha vida, conhecendo os tão
sonhados alunos do nosso amado Paulo Freire, em uma aula de campo com a prof.ª Ana Lucia
Oliveira Aguiar, na cidade de Angicos.
Perdi-me muitas vezes em alguns sonhos, alguns passageiros, e muitos ainda estão em
meu pensamento, embalados pela esperança de alcançá-los. Não importa, sempre estou a
sonhar. Conquistei muitas coisas. Deus está presente em todas as fases e dias da minha vida,
até mesmo no dia 19 de março de 2015, quando perdi meu pai. Deus levou aquele que
brincava comigo com os dedos das mãos, porque não tinha como me comprar brinquedos.
Aquele sempre passava as mãos pelo meu cabelo e dizia: “minha caçula”. Estava pronto a me
ajudar, em todos instantes. Orava todo momento por mim, pedia a Deus para que me fizesse a
mulher mais feliz do mundo.
Meu pai me ensinou a lutar e a nunca desistir, me falava que porque já tínhamos o não,
temos que buscar o sim. Ele me ensinou amar a DEUS acima de todas as coisas e de todos os
seres. Foi escolhido por Deus para me ensinar sobre justiça, caráter, dignidade, honestidade,
palavra, prioridade, família, amigos, entre outros valores. Deixou um legado que poucos
homens conseguem deixar para esposa, filhos, netos e bisnetos. Foi muito triste, a saudade
ainda dói muito. Homem íntegro, alegre, de palavra, sincero, o meu super-herói. Ele nunca
havia ficado doente, nem sequer uma febre. Não consigo lembrar-me de uma gripe. Adoeceu
e morreu pela enfermidade denominada Chikungunya. Ficou onze dias na UTI e faleceu em
uma manhã de sábado.
Nunca havia perdido ninguém na família, não tenho explicação para os meus
sentimentos. Até hoje a dormência me invade para que a dor não me consuma. Ele se foi, não
59

tem mais jeito, quando Deus quer é assim. Respeitei e só adorei ao Senhor. Cantei durante
todo o velório, desde o recebimento do corpo até a hora do enterro, um lindo louvor de bela
letra que há muitos anos eu cantava, que foi parte da minha vida nesse momento. O louvor
restaura os corações e tranquiliza a alma e o que eu cantei assim dizia: “Tua presença me
aquieta a alma, me faz ninar como um bebê que não precisa se preocupar a minha vida
escondida em tuas mãos está. Oh, meu Deus! Em Ti eu posso descansar” (Diante do Trono-
2004). Com essa mensagem eu tive o conforto.
Nada nunca apagará as suas mãos a passarem em meus cabelos, seus beijos fraternos
e sua doce voz a me chamar de sua caçula. Gostaria que estivesse com vida e pudesse estar
aqui agora. Graças a Deus, fiz tudo por ele enquanto estava vivo. Acredito que temos que
fazer algo pelas pessoas enquanto estão vivas. Meu pai sempre falava isso.
Quando faleceu tinha 64 anos de casados. Isso me faz recordar de quando ele e mamãe
completaram 62 anos de casados. Foi um dia lindo. Fizemos-lhe uma linda homenagem no
Hotel Garbos, em Mossoró. Vieram filhos netos e bisnetos entre outros familiares. Meu pai
sentia muito orgulho da sua família. Muito tranquilo, carinhoso e de grande sabedoria, sempre
tinha uma palavra para nos ensinar, ou bastava um olhar.
Minha família é benção do Senhor, gosto muito de estar juntinho de todos eles. Não
resisto a uma conversa e a sorrisos. Amo fazer comidas e doces. Sentar-me com todos na
cama e no chão do quarto para relembrar o passado ou falar do presente e planejar o futuro.
Gosto de sair com meus sobrinhos e estar sempre junto a eles. Acredito que é isso que a gente
deixa aqui na terra quando morre: as boas lembranças, as gargalhadas a alegria de viver. Amo
estar com todos juntos no Final de ano, Natal e Ano Novo. Gosto de festas em família.
Quando papai faleceu, deixou três filhas, um filho, quatorze netos, oito bisnetos, os
esposos e esposas dos netos e netas, que também considerava netos, dois genros e uma nora.
Uma família linda, todos protestantes, até mesmo os casados com filhos e netos. Como ele
falava: “Não existe família mais linda e abençoada que a minha”.
Essa família foi constituída por um casal vindo da roça do interior do Rio de Janeiro,
da cidade de Campos, em meio aos canaviais. Pessoas simples de trabalhos braçais, como
lavoura e pesca. Quando se casaram, ele tinha vinte e um anos, sem pai e mãe. Minha mãe se
casou com dezesseis anos, sem sua mãe, tinha somente o seu pai, que continuou no interior.
Minha mãe teve a primeira filha com dezessete anos. Deus foi agiu com bondade e
misericórdia durante a vida dos dois.
Quando falo da minha família, me sinto em constante mudança, pois cada sujeito a
passar por minha vida deixa um legado. Isso implica dizer que preciso me ver nesses sujeitos
60

perto de mim. Em outras palavras, preciso exercer a cidadania, que, para mim, é fazer uma
leitura de mundo culturalmente adquirida por cada pessoa. É necessário no ser humano
respeito e dignidade, cada um com suas diferenças e trajetórias de vida totalmente inversas.
Entretanto, mesmo com as diferenças, cada um tem o direito social de viver, através da leitura
de mundo, sempre a visar seus ensinamentos adquiridos no decorrer da sua vida, desde
nascimento.
Construí uma cidadania de formação e autoconhecimento como alternativa para minha
vida, em um território de disputa, onde muitos gostariam de estar em meu lugar e não tiveram
a oportunidade. Portanto, vou abraçar essa oportunidade com prazer, satisfação e muita
vontade de vencer.

1.4 A PESQUISA (AUTO)BIOGRÁFICA COMO PONTO DE PARTIDA PARA A (AUTO)


FORMAÇÃO

O ponto de partida para o encontro com a (auto)biografia, no sentido teórico e prático,


ocorreu em 2015, quando cursei, como aluna especial do POSEDUC, a disciplina “Memória,
Formação e Pesquisa (auto)biográfica”. Essa disciplina, focada nas narrativas, não só minhas,
mas de outros, provocou em mim uma enorme vontade de falar sobre as lacunas que
considero importantes para o entendimento do meu eu e para a prática da pesquisa. Fazer uma
análise e uma leitura da minha vida em outro tempo, por uma nova perspectiva, bem como
olhar as narrativas (auto)biográficas em relação ao sujeito, despertou em mim muitas
indagações sobre minhas implicações e me fez repensar toda a minha trajetória de vida.
Quando iniciei as aulas, em 2015.2, ministrada pela prof.ª. Drª Ana Lucia Oliveira
Aguiar, eu não tinha nenhum contato, nem sabia o que era a pesquisa (auto)biográfica. Não
tinha nenhuma leitura nem fundamentação sobre o que era história de vida, autobiografia
como prática de falar de si, do outro e para o outro, nem mesmo entendia o que seria o
trabalho. Comecei a estudar, sem perspectiva de entendimento, e pude estreitar a relação com
os conceitos. Dei continuidade ao aprendizado através de autores que falavam sobre memória
e formação (auto)biográfica.
Nesse percurso, surgiu o Projeto de Extensão da UERN. Com muita vontade de
praticar tudo que aprendi, a convite da professora Dra. Ana Lúcia Oliveira Aguiar, entrei no
Projeto na Penitenciária Agrícola Doutor Mario Negócio, intitulado “Histórias de vida em
música, teatro e desenhos – Vozes Silenciadas”. Senti o desejo de aprender e percebi
61

notoriamente a necessidade de um aprendizado. Entendi que preciso enxergar-me nos outros a


todo o instante, (auto) formei-me a cada dia, aprendi a conhecer, a fazer e a ser.
Esse projeto ainda está em execução e sinto o meu crescimento a cada dia. Hoje, como
aluna regular do POSEDUC, na Linha de Pesquisa de Práticas Educativas, Cultura,
Diversidade e Inclusão, estou a cursar as disciplinas “Educação e Cidadania” e “Pesquisa em
Educação”. Estou a enxergar uma leitura de como seria ouvir essas purgações e como seria
estar no lugar dos presidiários, viver aquele momento. Tenho buscado me qualificar para
enxergar com outras lentes tudo que vejo pela primeira vez na vida. Uma experiência
inexplicável e única.

Foto 8 - Grupo participante do Projeto de Extensão Histórias de vida em


música, teatro e desenhos – Vozes Silenciadas.

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, março de 2017).

As narrativas (auto)biográficas podem ser entendidas como uma continuação de


mudança do ser humano; uma reflexão sobre o pensar, falar e escrever sobre si. O
esclarecimento acontece no contexto intelectual ativo, pelo próprio conhecer do eu e do
engrandecer das experiências individuais, por meio das memórias (POLLAK, 1999). Observei
mais de perto as considerações do autor ao ouvir as experiências silenciadas narradas pelos
presidiários e muitas memórias subterrâneas, as quais provocaram em mim uma mudança de
caráter e um fortalecimento, com ênfase no equilíbrio do ensinamento e da aprendizagem.
Referindo à memória individual, evidencia que: “A memória é, em parte, herdada, não se
refere apenas à vida física da pessoa.” (POLLAK, 1992: 2004). A memória também sofre
flutuações que se dão em função do momento em que ela é articulada, em que ela está sendo
expressa.
62

Outra experiência em decorrência da disciplina em caráter especial, em 2015.2, foi a


visita à comunidade em Redonda, Icapuí, no Ceará, onde a atividade econômica principal é a
pesca. Existem outras atividades essenciais à garantia para as condições de vida, como o
artesanato. O artesanato é um meio de sobrevivência, as mulheres fazem cesto de palha e
almofadas de pano. Os homens pescam e plantam. Um lugar cheio de dunas bem coloridas,
altas. Uma vista linda para o mar, entre dunas, vegetação nativa e águas. Somente quem tem a
oportunidade de aprender esses saberes consegue visualizar tanta beleza. Infelizmente,
algumas pessoas passam a vida, sem ter a oportunidade de viver experiências exitosas. Os
filhos do lugar, apesar de aceitarem e lutarem pela identidade, buscam ascensão social por
meio do estudo.
A cada oportunidade concedida pelo POSEDUC, aproveito e vou aos lugares de
pesquisa. Sou grata por vivenciar diferentes experiências, com oportunidade de me dedicar a
viver com os sujeitos, para aprender cada dia mais. Vivo a importância de exercer o outro e de
me colocar no lugar do outro. Estou aberta para novos lugares. As pesquisas me ajudam, as
narrativas me qualificam e enriquecem a minha vida. A partir dessas vivências, tenho a
oportunidade de integrar investigação e (auto)formação no mesmo processo, com clareza e
fundamentação; de realizar uma proposta de saberes, teoria, prática, realidade e intenção,
sujeito e objeto, de modo que se tornem uma só possibilidade.
Em 19 de março de 2016, participei de uma aula de campo em Angicos, aquela em que
recebi a notícia da morte de pai, em Mossoró, conforme narrado no tópico anterior. Fomos em
busca das narrativas (Auto)Biográficas de ex-alunos de Paulo Freire, “40 Horas na Memória”.

Foto 9 - Encontro dos alunos do POSEDUC com ex-aluno de Paulo


Freire em Angicos.

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Angicos/RN, junho de 2016).


63

No resgate da memória, a primeira testemunha a quem podemos sempre apelar é a nós


mesmos (HALBWACHS, 1990). Isso ficou muito claro para mim durante a pesquisa de
campo em Angicos, quando observei que a memória era estendida a todos os alunos de Freire,
por meio da oralidade, dos costumes e valores narrados em suas histórias como se estivessem
vivendo naquele momento. Falavam do seu individual com propriedade. Isso ficou perceptível
nas histórias contadas pelos ex-alunos de Paulo Freire. Verificamos a seleção da memória e a
narrativa organizada de suas aprendizagens naquele momento histórico. Muitas lembranças
estão ainda bem vivas em cada um deles.
As pessoas estão em cada lugar e sua importância, sua origem, possibilitam o construir
e reconstruir das memórias (HALBWACHS, 1990). Quando nos possibilitamos viver a
acuidade do nosso lugar, dos saberes e fazeres, conseguimos e adquirimos mudanças;
alcançamos nossa identidade. Em todos esses lugares que conheci encantei-me com a
diversidade de culturas. Obtive grandes aprendizados, conhecimentos e experiência, de cada
uma dessas aulas de campo.
Da visita à Redonda, por exemplo, não tenho como exprimir, por meio de palavras,
toda análise surgida em minha mente por meio das narrativas (auto)biográficas (JOSSO,
2010) dos saberes e fazeres dos povos do mar, contribuintes para formação e transformação
do cotidiano de homens e mulheres daquele pequeno vilarejo. Conhecer homens e mulheres
do mar permitiu-me aprender ainda mais que somos sujeitos de conhecimentos e culturas
diversificadas. Vi que muitos sujeitos pertencentes àquele lugar, na formação e transformação
de si mesmos, na relação com o outro, já alcançaram êxito nos seus estudos, através da busca
de construção de saberes.
Aponto as narrativas (auto)biográficas como caminhos para a reflexão da prática
cotidiana. Através do dia a dia, os sujeitos se confirmam, modificam e ampliam os diferentes
saberes sobre os outros. Desse modo, é possível reconstruir o passado, na conciliação da
memória individual com a memória coletiva. Precisamos, com uma vontade enorme
investigativa, pensar e viver a história. Entender as nossas próprias narrativas e de outros
sujeitos diferentes de nós é o melhor exercício de construção do conhecimento e aprendizado,
nos permite conhecer lugares e o meio social diverso.
As narrativas (auto)biográficas são caminhos para a reflexão da prática cotidiana.
Através da prática confirmada, modificada e ampliada, bem como dos diferentes saberes, o
sujeito reconstrói o passado, na conciliação da memória individual com a memória coletiva.
Com o aprendizado contínuo, através das aulas ministradas pela professora Ana Lúcia
Oliveira Aguiar, adquiri desempenho e experiência na busca de novos horizontes. Participei
64

do Congresso Internacional de Educação Inclusiva (CINTEDI) e II Jornada Chilena, em


Campina Grande. Apresentamos trabalho com a seguinte temática “Igualdade e desigualdade
dentro dos Direitos e Garantias Fundamentais de pessoas com deficiências não aparentes”.
Levamos o discurso de que é importante atentar para as pessoas com deficiências aparentes e
não perceptíveis.
Enfatizamos que o sentido de deficiência não deve ser limitado, aos olhos da
sociedade, a um cadeirante, deficiente visual ou auditivo, por exemplo. Também foi dito que a
atuação de pessoas com deficiências não perceptíveis em busca dos seus direitos é limitada.
Portanto, para que elas alcancem os demais, é preciso que exponham suas limitações. Vale
salientar que a deficiência não perceptível também sofre a discriminação pela sociedade e
familiares. Todavia, a conscientização da sociedade quanto a essa questão tem aumentado.
A superação e o meu encontro comigo mesma era notório a cada dia. Aprendi que a
(auto) biografia faz parte de todos os momentos de nossas vidas. Ao adquirir essa
conscientização eu vi a possibilidade de me colocar dentro do meu próprio eu; de analisar os
meus próprios comportamentos, atitudes; de me tornar um ser muito melhor.
Todos os conhecimentos compartilhados através das narrativas (auto)biográficas
deram-me condição de fazer produção de textos, especialmente a respeito da condição
humana e do crescimento como sujeito. Para algumas pessoas, contar história foi e é a forma
encontrada para atribuir sentido à experiência vivida, para construir explicações ou previsões,
para projetarem novas experiências. Possibilita o criar e recriar da cultura e da cidadania de
muitos.
Através dos seminários ofertados pelo mestrado, encontrei-me com a (Auto)Biografia.
As mesas de conversa, minicursos, palestras, se fazem presentes no meu desenvolvimento e
aprendizado. Deparei-me com a perspectiva da minha própria formação. Tecnicamente, eu
estava construída dentro do meu ser, a anuência do meu eu sobressaía. A cada conceito
aprendido fui moldada. Através das narrativas do outro, busquei tirar todo o círculo vicioso de
rejeição e aceitação da mudança. Devo ressaltar ainda a ausência de vocação para este
determinado campo de estudo, com temas desconhecidos e aceitados. Entretanto, fui
condicionada a uma visão ampla por meio do ouvir e ver. Assim, adquiri uma nova ótica
docente, intimamente ligada ao papel da ciência humana.
No dia 31 de outubro de 2017, por intermédio de uma aula de campo em Canoa
Quebrada, Ceará, em companhia de meus colegas alunos do mestrado, tive a oportunidade de
observar e adquirir conhecimento por intermédio de dois grandes projetos educacionais:
65

Recicriança e O Circo da Criança. Por meio desses projetos observei que ética, respeito e
dignidade são o exercício para a cidadania, construída aos poucos, no decorrer da vida.
No local do projeto Recicriança, encontramos a proposta sugerida para as crianças
participantes: aulas sobre a conservação ambiental, feitas por intermédio de replantações
nativas e reciclagem; confecção de papéis; uma linda fábrica de bonecas e bonecos usados
para orientação sexual das adolescentes. Ao sair do recicriança, direcionamo-nos ao circo da
criança, uma instituição de ensino de circo, com trapezistas, palhaços, entre outros. Através
das narrativas de um dos responsáveis, percebi a necessidade de fazer sempre mais pelas
pessoas. Narrava, com amor, todo o acontecido sobre os alunos, pais e funcionários. O projeto
atente alunos de 7 a 13 anos. Não é permitido celular, nem WhatsApp, mas o responsável
falou algo que ficou guardado em minha mente: “aqui não formamos artistas, formamos
cidadãos” (Informação verbal)11.

Foto 10 - Aula de Campo Canoa Quebrada

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Canoa Quebrada/CE, outubro de 2017).

A consolidação da cidadania na perspectiva de engajamento mútuo para ajudar


corrobora com o que prega Freire (1987, p. 68), ao afirmar que “[...] não é saber mais ou saber
menos, são saberes diferentes.” Todos somos agentes de oportunidades e não devemos olhar
as dificuldades, mas a possibilidade de cada sujeito. Não somos iguais, mas, ao entrelaçar
nossos saberes variados, contribuímos para inclusão social e intelectual de todos. O que

11
Fala proferida pelo responsável do projeto circo da criança, em Canoa Quebrada, Ceará, em 30 de outubro de
2017.
66

aprendemos florescerá, por isso, não podemos desperdiçar os conhecimentos. Temos que
acreditar sempre na educação e priorizar/ valorizar o aprendizado.
Em 2015, em todo o município de Mossoró, começaram as rodas de estudos da LBI -
Lei Brasileira de Inclusão Nº 13.146/2015, intitulada Estatuto da pessoa com deficiência.
Essas reuniões eram feitas em lugares diversos e com vários parceiros colaboradores, entre
eles entidades de educação, a associação dos deficientes, entidades municipais, estaduais e
federais.
Em 2017, com uma nova roupagem, foram ofertadas aos outros municípios as rodas de
estudo itinerantes, por meio das quais tenho aprendido sobre a LBI- Lei Brasileira de Inclusão
Nº 13.146/2015. Essa é uma ação realizada pela DAIN/UERN em muitos municípios. Trata-
se de uma oportunidade de levar pessoas competentes para falar sobre a Lei Brasileira de
Inclusão para os povos silenciados. Os encontros são realizados uma vez por mês e neles pude
perceber muitos obstáculos e preconceitos a serem vencidos, muito embora algumas pessoas
contribuam para um novo pensar e não apenas para uma nova postura.
É preciso discursar sobre educação inclusiva, o que pressupõe novas relações de
práticas pedagógicas, centradas nos modelos de aprender das diferentes crianças, jovens e
adultos. É necessário valorizar a diversidade em todas as atividades, espaços e formas de
convivência e trabalho. A cada dia que participo do projeto LBI Itinerantes percebo a
necessidade de adquirir mais conhecimentos. Tenho, também, alguns objetivos a serem
conquistados e um desejo enorme de seguir em frente, de buscar atividades cotidianas, e,
coletivamente, construir um saber de necessidades a serem conquistadas.
A Lei Nº 13.146, de 6 de julho de 2015, Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
Deficiência, assegura, em seu art. 1o,, a promoção, em condições de igualdade, do exercício
dos direitos e das liberdades fundamentais para pessoa com deficiência, visando a sua
inclusão social e cidadania. Essa lei reforça todos os direitos e garantias constitucionais. Com
efeito, precisamos nos respaldar para que haja efetivação dos direitos e as reuniões da LBI
têm me ajudado a compreender os tipos de deficiências e como, a cada instante, posso ajudar
o deficiente a galgar seu espaço como cidadão de deveres e direitos.
A LBI e a pesquisa (auto)biográfica como ponto de partida para a minha (auto)
formação, presentes em todos os eventos que narrei e muitos outros, contribuíram para o meu
crescimento, aprendizado e experiência. As aulas que cursei como aluna especial, na UERN,
na área de Formação Humana e Desenvolvimento Profissional Docente, ofertadas pelo
POSEDUC, foram essenciais para meu desenvolvimento, minha aceitação e aceitação do
outro. A primeira disciplina, “Memória, Formação e Pesquisa (auto)biográfica”, mostrou-me
67

quem sou, para que estou nesse mundo, e reativou a minha memória e vontade de pesquisar.
A segunda disciplina, “Tópicos Especiais em Educação I: Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva”, e a terceira, “Tópicos Especiais em Educação I: Educação Especial
na Perspectiva Inclusiva para a Cultura da Paz”, foram temáticas voltadas para a educação
inclusiva. A professora Dra. Ana Lúcia Oliveira Aguiar ministrou essas disciplinas que me
permitiram, através da mudança das lentes, construir uma nova leitura de mundo, em busca da
luta e do fazer.
Me encontro a cada dia com a minha (auto) biografia. Sou um ser inacabado, ainda
com muitas coisas a aprender. Alimento a conquista e a visão sonhadora para alcançar o meu
objetivo de adquirir uma percepção para maiores êxitos através dos estudos. Almejo uma
ascensão social com a busca de muitos aprendizados. A pesquisa (auto)biográfica como ponto
de partida para a (auto)formação desenvolveu em mim uma docência crítica e (auto) formação
para o aprender e o fazer. Por meio dela aprendi a vivenciar emoções e a equilibrar-me; a
transferir autonomia e identidade, com vistas a um crescimento ainda melhor da minha
conquista, do meu êxito social através dos estudos, alcançados no decorrer da minha vida.
No dia 11 de janeiro deste ano 2018, fui a Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, minha
terra Natal. Nessa viagem pude rever os amigos e encontrar uma professora da minha
juventude. Pude tirar fotos com ela, meus amigos e com alguns ex-alunos de minha escola,
hoje, casados e com filhos, bem como com os pais dos ex-alunos. Eu não tinha nenhuma
lembrança impressa dos meus professores do passado. Também encontrei com a minha
professora da EBD, Gilsa. Estive ainda na Escola Ana Laura e passei no Colégio São José.
Enquanto eu passava por esses lugares e via todas as pessoas, passava um filme em
minha memória, sobretudo sobre o que aprendi em Mossoró, na UERN, com as disciplinas do
mestrado. Todos aqueles conteúdos foram revisados por meio de tudo o que acontecia nesses
reencontros. Lembrei-me, por exemplo, dos momentos charneiras12 de descontração e alegria
mencionados por Josso (2010), que trata da (auto)biografia. Os gestos de retribuição de
carinho dos pais e mães para comigo também me relembraram o que, Halbwacchs (1999) fala
sobre a memória e instigaram-me a buscar minhas memórias subterrâneas.
Recordei os meus alunos me abraçando e o quanto eram felizes e me faziam felizes.
As preocupações, aflições e ansiedades de ajudar os meus pais, de construir meu futuro
através dos meus estudos, também foram revividas, bem como o conceito de empoderamento

12
Situações que nos levam a questionamentos quanto às mudanças na vida pessoal e/ou profissional, durante o
desenrolar de todo o processo de aprendizado.
68

mencionado por Freire (1992). Lembrei-me que, através do estudo e de todo aprendizado
venci e consegui ajudar as pessoas e ser ajudada, consegui alcançar o meu êxito social. As
lembranças passavam em minha mente como num piscar de olhos. Lembrei-me, ainda, que
aprendemos a apontar os capítulos da nossa trajetória nos momentos mais tristes e felizes da
nossa vida, e que o inacabado é necessário para uma continuação de buscar o saber.
Pude registrar, por meio de fotos, todo o momento que vivi no meu estado e cidade
onde nasci, para comparar com as fotos passadas. Desta vez, a vinda ao Rio de Janeiro teve
um olhar e experiência diferentes. Sabia a importância de cada detalhe vivido. Estive na
minha antiga casa e no meu Colégio Alegria do Saber, onde passei a maior parte da minha
vida. Muitas lembranças vieram à minha mente.
Essa viagem confirmou, em meu coração, que uma nova história Deus tem escrito na
minha vida, desde quando ele falou para mim: “Sai-te da tua terra do Rio de Janeiro, da tua
parentela para a terra que eu te mostrarei, que é Mossoró”. Nessa terra, tenho sido abençoada.
Eu não poderia contar e nem imaginar as bênçãos recebidas, tudo aquilo que Ele (Deus)
sonhou para mim. Suas mãos sempre estiveram sobre a minha vida. Tenho certeza que uma
nova história, um novo tempo Deus tem para mim. Tudo aquilo que perdi tem sido restituído.
Ouvi dele falando: Te abençoarei sempre!
Durante toda a viagem e escrita deste capítulo, percebi a importância do meu encontro
com a (auto)biografia, essa disciplina me proporcionou a ver e rever todas as histórias da
minha vida, ensinando-me a contar e narrar coisas que jamais percebi ou relatei. A
(auto)biografia me oportunizou uma viagem que jamais será apagada da memória, estando
guardada pelas linhas, fotos e contos narrados nesta dissertação.
Ao vivenciar o passado pelas lembranças, percebi que a vida é passageira e que,
muitas vezes, os obstáculos e percalços contribuem para nosso crescimento e, por isso, não
podem ser apagados da nossa memória e história. Desse modo, é importante que sempre
provoquemos a nossa memória a contar e recontar nossos casos, para que nosso futuro seja
sempre vivo em nossa mente. Para a memória lembrar quando o coração esquecer!
69

CAPÍTULO 2
Foto 11 – Prof.ª Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar em visita à Comunidade do Rosado

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2018).

O trabalho da DAIN compreende um exercício de


reflexão e de crítica sobre processos formativos que
envolvem os sujeitos nos espaços educacionais e não
educacionais, pensando numa inserção mais
acurada desses sujeitos na realidade. (AGUIAR,
2018).
70

2 A DAIN/UERN E SUAS AÇÕES INCLUSIVAS: A LUTA PELA EFETIVAÇÃO DE


DIREITOS DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA

Neste segundo capítulo, objetivo discutir a prática inclusiva para estudantes com
deficiência e as ações da Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas (DAIN) da Universidade
Estadual do Rio Grande do Norte (UERN) para a efetivação dos direitos desses estudantes.
Em um primeiro momento, mostrarei o percurso histórico da inclusão na UERN: nas trilhas
em prol da efetivação de direitos, políticas de inclusão para estudantes com deficiência
através da ascenção social. Na sequência, refletirei a respeito das Políticas de inclusão para
estudantes com deficiência rumo à ascenção social. Uma vez conhecidas tais políticas, será o
momento de discutir as possibilidades e conquistas: superar obstáculos e quebrar barreiras
atitudinais, procedimentais e arquitetônicas. Por fim, falarei das “Rodas de Estudos sobre a
Lei Brasileira de Inclusão (LBI): Diálogos e Debates na Perspectiva da Inclusão em
Mossoró/RN”, promovidas pela DAIN.
Neste capítulo pretendo ressaltar como a DAIN tem contribuído para a formação dos
estudantes com deficiência e quais as suas alternativas à proposta de formação discente, com
o intuito de ajudar e oferecer subsídios para que ocorram possibilidades de avanços no
aprendizado e socialização desses sujeitos. Discutirei a prática inclusiva direcionada a
estudantes com deficiência e a repercussão dessa proposta na ascensão social, através da
efetivação dos seus direitos. Também explorarei os recursos de adaptação e os avanços
tecnológicos que a DAIN tem buscado para as necessidades e especificidades de cada
deficiência, no intuito de colaborar para ascensão desses estudantes dentro do campo
acadêmico e social.
A DAIN trabalha pela promoção da acessibilidade, diversidade, permanência e
continuação desses estudantes na academia. Desempenha um esforço contínuo para garantir a
acessibilidade de todos, o que exige a quebra de barreiras, sejam arquitetônicas, de
comunicações, nos sistemas de informações, bem como aquelas relacionadas aos materiais
didáticos e pedagógicos.
Sem medir esforços, a cada dia a DAIN implementa uma equipe especializada para
promover a inclusão e igualdade social no processo seletivo da Universidade do Estado do
Rio Grande do Norte. Com foco nas Garantias Constitucionais que a diretoria tem buscado
para amparar o docente com deficiência de forma acolhedora, emancipatória e incentivando
uma conquista para sua ascensão e êxito social através dos estudos, buscarei estabelecer um
diálogo de suas ações com o que determina a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
71

Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a fim de ressaltar os seus direitos e deveres,
também efetivados pela Constituição Federal de 1988, nossa carta Magna.

2.1 PERCURSO HISTÓRICO DA INCLUSÃO NA UERN: NAS TRILHAS EM PROL DA


EFETIVAÇÃO DE DIREITOS

Os caminhos históricos percorridos pela UERN para a inclusão de estudantes com


deficiência são o destaque deste tópico. Ao mesmo tempo, mencionarei os obstáculos
enfrentados pela instituição ao buscar alcançar os direitos garantidos a essas pessoas por meio
da Constituição Federal/ 88 (BRASIL, 1988) e da Lei Nº 13.146/2015, Lei Brasileira de
Inclusão (BRASIL, 2015). Meu intuito é revelar suas ações inclusivas nos processos seletivos,
sem desigualdades educacionais e sociais, a fim de garantir a ascensão social de estudantes
com deficiência de camada popular por meio do estudo. Atrelado ao caminhar e às conquistas
desses estudantes está o vislumbrar dos sonhos futuros, por isso a UERN tem buscado o
melhor para todos os alunos, permitindo que alcancem os próximos degraus do êxito social
através do estudo.
Com base na afirmação da autora, é possível admitir que a DAIN tem contribuído para
assessorar todos os estudantes da UERN, no momento em que lhes constrói potencialidade de
empoderamento. Ao trabalhar a diversidade, a DAIN proporciona ao aluno com deficiência
buscar uma nova cultura. Através do ensino e do conhecimento, permite que esses estudantes
construam a responsabilidade social, enfrentem os desafios diários e quebrem barreiras. Em
outras palavras, a DAIN tem promovido o ensino e o acompanhamento dos processos de
aprendizagem sem distinção de pessoas, vislumbrando que a educação é para todos, sem
distinção.
Com efeito, é de grande valia ver todos engajados na luta para alcançar objetivos
únicos: aprender a aprender; aprender a ser; aprender a fazer. Com esse intuito a DAIN busca
desenvolver ações dentro e fora da UERN, com abrangência local, em Mossoró/ RN, em
cidades vizinhas como: Baraúnas, Caraúbas, Areia Branca, Serra do Mel, Apodi e até em
outros países Peru, Chile, Cuba, Argentina. Suas ações têm sido fundamentais na formação e
efetivação dos direitos e garantias de Recursos Humanos e de Políticas Sociais, através de
uma gestão diferenciada nas áreas de conhecimento e aprendizagem. Sem medir esforços,
prima pela qualidade de suas atividades e promove eficácia no ensino, pesquisa e extensão,
com ações que efetivam a consolidação de inclusão de todos os discentes com deficiência.
72

A história da DAIN começou no ano de 2014, quando vários profissionais interessados


nessa proposta se comprometeram com as atividades e discussões entrelaçadas à diversidade e
inclusão. A Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas - DAIN/REITORIA/UERN foi
estabelecida oficialmente pela Resolução N° 2/2008 do Conselho Universitário - CONSUNI,
de 18 de abril de 2008 (UERN, 2008). Em 2010, passou a ser Diretoria, através da Resolução
Nº 31.2014 – CD (UERN, 2014). Posteriormente, foi nomeada Diretoria de Políticas e Ações
Inclusivas (DAIN), através da Resolução Nº 5/2015 – CD (UERN, 2015).
A DAIN está ligada à Administração Superior da UERN e desenvolve um trabalho
conjunto com a Pró-Reitoria de Ensino de Graduação – PROEG, a Pró-Reitoria de Pesquisa e
Pós-Graduação – PROPEG e a Pró-Reitoria de Extensão – PROEX. São suas atribuições:
desenvolver ações fundamentais na formação de recursos humanos; elaborar políticas e gestão
da educação em diferentes áreas de conhecimento; promover a inclusão de estudantes com
deficiência nas áreas de ensino, pesquisa e extensão; viabilizar a quebra de barreiras e a
promoção da acessibilidade, fortalecida pelo entendimento da pertinência da perspectiva de
inclusão no âmbito da coletividade. O que a DAIN objetiva com essas ações é: atender,
acompanhar e apoiar os discentes com deficiência, docentes e técnicos administrativos, tendo
como base a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva,
bem como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional; garantir um espaço de ensino,
pesquisa e extensão que consolide ações e práticas voltadas às diferenças, à inclusão
educacional, social e à inserção no mercado de trabalho.
O trabalho sistemático da DAIN consubstancia-se nas propostas gerais de ação com
respaldo nos fundamentos Jurídicos da Constituição Federal, Leis e Decretos Nacionais e
Internacionais da Educação Especial. Desse modo, oportuniza o aumento do número de
estudantes com necessidades educacionais especiais e com deficiência na UERN, conquista
que é fruto, sobretudo, de um esforço coletivo de apoio aos discentes.
Vale frisar que o ingresso de estudantes com deficiências na UERN é apenas uma das
preocupações da DAIN, acompanhada da persistência pela continuidade do estudo desses
estudantes com qualidade. Desenvolver pesquisas relacionadas à Educação Inclusiva é outro
de seus objetivos com vistas a proporcionar um caminhar leve para a inclusão. Nesse sentido,
é de sua responsabilidade (educacional e social) acompanhar os estudantes com deficiências,
dispondo de profissionais adequados que permitam o desenvolvimento de saber, conhecer e
fazer, isto é, formando cidadãos.
Importante ressaltar que a missão de resistir pela efetivação da política de educação
inclusiva se estende a toda a sociedade. Precisamos estar em constante batalha para fazer valer
73

aquilo que está determinado na Lei Nº 13. 146/2015 (BRASIL, 2015), conforme transcrito
abaixo:

Art. 28. Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver,


implementar, incentivar, acompanhar e avaliar:
I - sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades, bem
como o aprendizado ao longo de toda a vida;
II - aprimoramento dos sistemas educacionais, visando a garantir condições
de acesso, permanência, participação e aprendizagem, por meio da oferta de
serviços e de recursos de acessibilidade que eliminem as barreiras e
promovam a inclusão plena;
III - projeto pedagógico que institucionalize o atendimento educacional
especializado, assim como os demais serviços e adaptações razoáveis, para
atender às características dos estudantes com deficiência e garantir o seu
pleno acesso ao currículo em condições de igualdade, promovendo
a conquista e o exercício da autonomia.

Com base nesses pressupostos legais, muitos são os programas e projetos de extensão
que a DAIN vem desenvolvendo em favor da inclusão na UERN, acrescidos das Convenções
Internacionais sobre a Educação Inclusiva das quais tem participado. Em seu relatório de
políticas e ações inclusivas referentes ao período de 2013 a 2017 (DAIN/UERN, 2013), está
registrado seu plano de trabalho, que tem como objetivo geral “[...] possibilitar aos estudantes
com deficiências acesso e participação, de forma independente, de todas as dimensões da vida
acadêmica (ensino, pesquisa e extensão) em igualdade de oportunidades como os demais
discentes, com a promoção de eliminação de obstáculos e barreiras à acessibilidade”. Visa,
portanto, a realização e efetivação de obras cujo objetivo é: promover a acessibilidade aos
estudantes com deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a superação de barreiras e
de obstáculos na construção de reformas em todos os prédios da universidade.
De acordo com o plano mencionado, a meta da DAIN é ampliar os serviços de obras
para a acessibilidade dos estudantes com deficiência em 100% até agosto de 2019, seguindo
as etapas transcritas no quadro 1, logo a seguir.

Quadro 1 - Cronograma de ações da DAIN/UERN (2017 – 2019).


(Continua)
Código Tipo Nº Ações Inc/ Ter.
Previsto Previsto
Plano ação 1 Efetivação de obras.

Plano Etapa 1.1 Elaboração do projeto de 1/06/2017 31/07/2018


acessibilidade, rampas,
passarelas, sinalizações, faixa de
pedestres.
74

Quadro 1 - Cronograma de ações da DAIN/UERN (2017 – 2019).


(Conclusão)
Plano Etapa 1.2 Execução de orçamento e 1/08/2017 31/08/2018
elaboração do cronograma físico
da obra.
Plano Etapa 1.3 Capitação de recursos para 7/11/2017 22/12/2018
construção de obras físicas.

Plano Etapa 1.3 Realizar processo licitatório para Sem


construção do prédio da DAIN e previsão
outras obras finais.

Plano Etapa 1.4 Projeto arquitetônico para prédio, 1/08/2017 30/08/2018


para realização das atividades da
diretoria, sala para
acompanhamento técnico
pedagógico, diretoria, secretaria,
atendimento psicosocial, sala
para ledores, sala para biblioteca
setorial, sala de vídeo, sala de
leitura, mini auditório, sala para
práticas educacionais inclusivas,
sala para fonoaudiologia, sala
para terapia, ocupacional, uma
copa, banheiros adaptados,
laboratórios de informática.

Plano Etapa 1.5 Construção, na área da UERN, 30/08/2017 30/08/2019


(campos central e campos) de
passarelas, rampas, pisos,
banheiros adaptados, circulação
horizontal, escadas, comunicação
visual sonora.

Plano Etapa 1.6 Definição de salas de recursos 30/08/2017 30/08/2019


multifuncionais nos campos.

Fonte: DAIN/UERN (2017).

A necessidade das obras arquitetônicas é constante em qualquer espaço onde circulam


pessoas com deficiência. Na UERN, a DAIN tem colaborado e elaborado projetos para que o
direito de ir e vir do aluno com deficiência seja realmente efetivado. Atualmente, as condições
de acessibilidades são metas diárias na DAIN, proporcionando, tanto ao cadeirante como a
todos os estudantes com outros tipos de deficiência, a locomoção na universidade. Até mesmo
nos corredores tem-se o cuidado para que não tenham obstáculos (cadeiras, mesas ou
quaisquer outros objetos) dificultando ou prejudicando o trânsito dos estudantes. Nos
corredores foram construídas rampas. Essa e todas as obras têm dado uma qualidade de vida
75

para os estudantes com deficiência. No quadro 2, logo a seguir, é possível contemplar as


ações já realizadas pela UERN no que diz respeito ao atendimento das pessoas com
deficiências.
Aliadas às ações descritas no cronograma acima, a DAIN busca a concretização de
outras ações contínuas no que diz respeito à adequação dos espaços e à promoção da
aprendizagem e socialização dos estudantes com deficiências. A seguir, listo as principais
ações e os cronogramas de execução de cada uma.
A primeira delas é Aquisição de equipamentos, com o objetivo de adotar a compra de
equipamentos e tecnologia assistiva para a superação de barreiras de acessibilidade que
comprometam a qualidade do ensino e da vida acadêmica dos discentes. Sua meta é garantir a
aquisição de equipamentos e tecnologia assistiva até 22 de dezembro de 2018.
Para melhor desenvolvimento de todo um trabalho em equipe, a DAIN faz uma
previsão de todas as ações a serem executadas, o que torna a organização da Diretoria eficaz.
Isso deixa nítido o zelo com e um olhar crítico para as necessidades de uma Educação de
qualidade, através de estratégias e datas de cumprimento de metas. Atualmente, a DAIN
possui equipamentos, materiais didáticos e objetos de equação para que todos os estudantes
com deficiência sejam atendidos e assistam às suas aulas com acessórios que permitam o
desenvolvimento, alcançando uma ascensão social através do estudo.

Quadro 2 - Cronograma de ações para a aquisição de equipamentos para a DAIN (2017-


2018).
Código Tipo Nº Ações Inc. Previsto Ter. Previsto

Plano Etapa 2.1 Mapeamento das deficiências 30/05/2018 30/06/2018


no âmbito da UERN, para
aquisição de equipamentos de
acordo com as necessidades
especiais individuais.
Plano Etapa 2.2 Identificar os sistemas e 30/05/2018 30/06/2018
tecnologia de informação e
comunicação.

Plano Etapa 2.3 Levantamento e participação 14/04/2018 15/06/2018


em editais específicos para
captação de recursos.

Plano Etapa 2.4 Processo licitatório para 09/05/2018 11/06/2018


aquisição de equipamentos.

Plano Etapa 2.5 Aquisição dos equipamentos 30/08/2018 30/11/2018


listados no plano de ação.
Fonte: DAIN/UERN (2017).
76

Atualmente, a DAIN tem investido em materiais para acessibilidade e adequação dos


espaços e aulas destinados aos estudantes com deficiência física, com vistas a facilitar seu
aprendizado. A foto 12 traz uma lista dos equipamentos necessários às pessoas com
deficiência adquiridos pela DAIN. Na sequência, apresento as imagens de alguns
equipamentos utilizados para o bem-estar, locomoção e desenvolvimento desse público.
Vale ressaltar que os equipamentos auxiliares ao aprendizado são utilizados pelas
pessoas com deficiência, mas com a ajuda de um profissional habilitado, membro da equipe
da DAIN. Esse acompanhamento permite o diagnóstico das dificuldades dos estudantes e
facilita o aprendizado de cada um, conforme suas necessidades.

Foto 12 - Lista de equipamentos necessários a pessoas com deficiência física.

Fonte: DAIN/UERN (2017).

Foto 13 – Impressora em Braille

Fonte: DAIN/UERN (2018).


77

Foto 14 - Máquina Perkins Brailer

00

Fonte: DAIN/UERN (2018).

Foto 15 - Cadeiras de Rodas

Fonte: DAIN/UERN (2018).

Foto 16 - Bengalas

Fonte: DAIN/UERN (2018).


78

A DAIN também investe constantemente na aquisição de materiais didáticos que


auxiliam tanto os professores quanto os estudantes e que comprovam a preocupação da
diretoria e da UERN com todos os seus estudantes. A foto 17, logo a seguir, traz alguns
exemplos.

Foto 17 - Materiais didáticos voltados para o trabalho com alunos com


deficiências.

Fonte: DAIN/UERN (2018).

Outra ação a ser destacada é a Contratação de Recursos Humanos, cujo objetivo é


assegurar concurso público e contratação de profissionais habilitados para atuação junto às
pessoas com deficiência, considerando suas especificidades, capacitando profissionais para
promoção de igual participação no sistema de ensino e garantindo suporte técnico
especializado. Tem como meta aumentar o quadro de profissionais habilitados para atuação
junto aos estudantes com deficiência em 100% até agosto 2019.
Durante a realização desta pesquisa, tive o prazer participar da equipe da DAIN,
através das pesquisas que fiz para escrever a dissertação, através das programações do VIVA
UERN. A cada dia, pude ver o crescimento dos profissionais que compõem a equipe, maior a
cada dia, graças aos concursos que, atualmente, priorizam a inclusão. Um desses profissionais
é a LEDORA da Divisão de Deficiência Visual, que cede a sua voz para os surdocegos,
através da linguagem em libras. Também ajuda, quando necessário, a pessoa com baixa visão,
como o sujeito desta pesquisa, que faz uso das lupas adquiridas pela diretoria. Esse suporte o
79

tem ajudado a alcançar seus objetivos, tornando possível uma melhora em seus
desenvolvimentos. Não só a ele, mas a todos os estudantes com deficiência.
Há também os intérpretes de LIBRAS que, com zelo, desenvolvem a linguagem dos
sinais para os surdos, dando a eles o direito de estarem na graduação. Esses profissionais têm
um papel fundamental para os alunos surdos, pois sem intérpretes não seria possível esses
alunos assistirem às aulas e entenderem os conteúdos aplicados. No quadro abaixo, é possível
ver a necessidade e eficácia da formação continuada e constante na DAIN.

Quadro 3 - Cronograma de ações para aumentar o quadro de profissionais habilitados


para atuação junto aos discentes com deficiência.
Código Tipo Nº Ações Inic. Previsto Ter. Previsto

Plano Ação 3 Contratação de recursos


humanos.

Plano Etapa 3.1 Formação e qualificação 20/09/2018 20/12/2018


continuadas de recursos
humanos nas diversas
deficiências.

Plano Etapa 3.2 Realizar concurso Público. 30/06/2018 30/07/2018

Contratação de profissionais 30/08/2018


habilitados para a língua
brasileira de sinais, para o
sistema braile, LEDOR,
transcritor, instrutor,
monitor, cuidador de alunos,
guias, psicopedagogo,
pedagogo, psicólogo
educacional, assistente
social, assistente
ocupacional, profissional da
ciência da computação.
Plano Etapa 3.3 Levantamento de recursos 15/05/2018 15/06/2018
humanos disponíveis na
DAIN e na UERN com
possibilidade para atuação no
atendimento educacional
especializado.
Plano Etapa 3.4 Aquisição de recursos 10/09/2018 10/12/2018
pedagógicos.

Plano Etapa 3.5 Aquisição de livros didáticos 05/05/2018 30/04/2018


em braile, áudio, língua
Brasileira de sinais.
Fonte: DAIN/UERN (2017).
80

A próxima ação é Aquisição de Mobiliário Inclusivo, com o objetivo de dotar a UERN


de acessibilidade aos mobiliários, com vistas à participação. Locomoção, utilização, uso a
locomoção de todas as pessoas com deficiência em todos os aspectos e espaços acadêmicos. A
meta é garantir que o mobiliário esteja adaptado às condições de participação, locomoção,
utilização, uso e locomoção para todos os estudantes com deficiência em 100% até dezembro
de 2019.
A DAIN é uma equipe que pensa e sente a necessidade de cada pessoa com
deficiência. Com um olhar visionário, luta para que os estudantes prossigam com seus
estudos. Desse modo, os estudantes com deficiência da UERN vêm sendo agraciados com
todo aparato necessário para uma comodidade e aprendizado de excelência. O quadro 4 traz o
plano de ações da DAIN para aquisição de mobiliário adequado a esse público.

Quadro 4 - Cronograma de ações para dotar a UERN de mobiliários para


pessoas com deficiências.
Código Tipo Nº Ações Inic. Previsto Ter. Previsto

Plano Etapa 4 Compra de mobiliário


acadêmico.
Plano Etapa 4.1 Levantamento do 30/08/2018 30/09/2018
mobiliário existente na
UERN para discentes com
deficiência.

Plano Etapa 4.2 Identificação do mobiliário 30/08/2018 30/09/2018


adequado para o
atendimento às
especificidades.
Fonte: DAIN/UERN (2017).

Há também a ação de Elaboração de programas, projetos e estudos de políticas e ações


para a diversidade e inclusão, cujo objetivo é promover a ampliação de estudos, pesquisas e
extensão, com vistas ao respeito pelos princípios da diversidade humana para o pleno
desenvolvimento do potencial humano e do senso de dignidade e autoestima, além do
fortalecimento e respeito pelos direitos humanos, liberdades individuais e plenas, bem como
pela diversidade humana. Tem como meta ampliar a participação dos discentes, docentes e
técnicos nos programas formativos e nas discussões voltadas para a diversidade humana em
100% até 12/2021.
Na UERN, os estudantes com deficiência participam de eventos como o Encontro
Regional de Narrativas (Auto)Biográficas (ERNAB) e Seminário Potiguar, entre muitos
81

outros. Esses eventos procuram respeitar a cultura e as comunidades, bem como os diferentes
modos de agir e ser. Para um conhecimento plural são promovidos cursos para que todos
participem e possam buscar, a cada dia, êxito através do estudo. Os eventos fazem parte de
um cronograma de atividades para ampliar o envolvimento de todos com a educação
inclusiva, registrado no quadro 5, a seguir.

Quadro 5 - Cronograma de ações para ampliar a participação dos discentes,


docentes e técnicos nos programas formativos e nas discussões voltadas
para a diversidade humana.
Código Tipo Nº Ações Inic.Previsto Tér.Previsto
Plano Ação 8 Política de Progressão
Academica.
Plano Etapa 8.1 Levantar os discentes e as 30/08/2018 30/09/2018
diversidades culturais por
curso.
Plano Etapa 8.2 Levantar junto à 30/08/2018 30/09/2018
comunidade acadêmica as
diferentes comunidades
culturais.
Plano Etapa 8.3 Elaborar projetos, eventos, 30/08/2018 30/09/2018
políticas e ações com
molde na pluralidade
cultural para os cursos de
graduação, programas de
pós-graduação e
formativos, na busca pela
inserção social
Plano Etapa 8.4 Acompanhar a elaboração 30/08/2018 30/09/2018
dos editais para chamada a
comunidade
Fonte: DAIN/UERN (ano 2017).

Na sequência, cito alguns programas, projetos e estudos de políticas e ações para a


diversidade e inclusão internacionalização/inserção internacional da Diretoria de Políticas e
Ações Inclusiva em parceria com Programa de Pós-Graduação em Educação pensados para o
Quadriênio 2017/2021, conforme consta no Relatório de atividades da DAIN/UERN (2013):
XI Encuentro Nacional y V Congreso Internacional de História Oral de la República
Argentina: História, Memórias y Fuentes Orales, 2014, Córdoba/Argentina (com a
participação de 06 mestrandos do POSEDUC/UERN); IX Encontro Internacional Paulo
Freire, 2016, Cienfuegos Havana e Cienfuegos/Cuba – 6 estudantes (POSEDUC/UERN);
Internacionalização/Inserção Internacional do Programa de Pós-Graduação Em
82

Educação/Quadriênio 2017/2021, Portugal – Almada 2013- III Congresso Internacional de


Inclusão e Equidade. Almada: Pró-Inclusão - Associação Nacional de Docentes de Educação
Especial. (com a participação de 03 mestrandos); Internacionalização/Inserção Internacional
do Programa de Pós-Graduação Em Educação/Quadriênio 2017/2021 Peru – Universidade de
ULMCH/Lima - 2018 Formação Continuada – Práticas Educativas, Cultura, Diversidade e
Inclusão. Chile (com a participação de 7 alunos); XI Congresso Internacional de História
Oral, promovido pela Associação Mexicana de História oral (AHMO), na cidade do México
outubro de 2017 – (com a participação de 7 alunos)
Em busca de levar a inclusão para outros países, a DAIN tem feito e participado de
Congressos, como os citados acima. Para enriquecimento das pesquisas sobre inclusão, leva
uma continuidade do aprendizado e, com isso, busca, nas diversas culturas, conhecimento,
trazendo em sua bagagem vastas sabedorias adquiridas por cada povo. Os estudantes também
têm a oportunidade de “compartilhar”, através dos seminários que são feitos depois de cada
viagem da equipe da diretoria. Esses eventos enriquecem o aprendizado e tornam possível a
vivência de tudo que é contado e visto através dos relatos e fotos.
A DAIN tem sido pioneira em galgar recursos e efetivar os direitos e garantias
fundamentais do aluno com deficiência não aparente. Com ações pautadas nas referidas
diretrizes e com planejamentos e organização de uma equipe profissionalizada, a DAIN
conquistou uma Educação Emancipadora Inclusiva, com diversidade de recursos, serviços e
com acessibilidade arquitetônica, nas comunicações e nos sistemas de informação. Ademais,
busca processos seletivos e o desenvolvimento de atividades que envolvam o ensino, pesquisa
e extensão. É outra conquista almejada pela diretoria a contratação de intérpretes de LIBRAS
em todas as áreas do conhecimento científico que a Universidade possui, a fim de ajudar
docentes, discentes e técnicos bem como as entidades que necessitam desse auxílio.
Ao dar condição especial aos estudantes com deficiências na perspectiva da inclusão,
seja na graduação ou na pós-graduação, a DAIN oferece a esses discentes o amparo de que
necessitam para continuarem seus estudos e conseguirem uma ascensão social. Desse modo,
ampliam sua aprendizagem e conhecimento através da inclusão. Esses são apenas alguns dos
inúmeros os benefícios que a DAIN, juntamente com a sua diretora e equipe, tem
proporcionado aos discentes dentro e fora da Universidade, pessoas antes desacreditadas, não
só pelas Instituições educacionais, mas pela sociedade e, até mesmo, pela família e parentes.
Com a orientação da Diretora e Professora Dr. Ana Lúcia Oliveira Aguiar, PhD em Educação,
três surdos já se tornaram Mestres pela UERN.
83

2.2 POLÍTICAS DE INCLUSÃO PARA ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA RUMO À


ASCENÇÃO SOCIAL

Decerto, são muitas as dificuldades enfrentadas pelos estudantes de camada popular


com deficiência, seja ela aparente ou não, desde o ensino básico até a academia. Dito isto,
busco, a conhecer as principais barreiras com as quais os discentes da UERN se deparam bem
como o acompanhamento recebido por profissionais capacitados para o seu amparo,
juntamente com o corpo docente, de modo a garantir um aprendizado eficaz em seu trajeto
acadêmico.
Mantoan (2006) contribui com essa discussão, ao propor que a educação inclusiva
deve acolher a todas as pessoas, sem exceção, com a garantia do respeito às diferenças e do
direito à educação. A autora destaca que os estudos promovem a capacidade de aprender com
potencialidade. Em complemento às suas observações, convém citar a seguinte fala de Freire
(1987, p. 68) sobre a inclusão: “[...] não é saber mais ou saber menos, são saberes diferentes”.
Importante ressaltar que somos agentes de oportunidades e que não devemos olhar
para as dificuldades, mas para a possibilidade de contribuir com o outro. É necessário
esclarecer que, ao juntarmos os nossos aprendizados variados, contribuímos para inclusão
social e intelectual de todos, oportunizando a busca do êxito social através do estudo. Na vida,
aprendemos, florescemos e não podemos desperdiçar os conhecimentos. Temos que acreditar
sempre na educação pelo estudo, e priorizar/ valorizar o aprendizado. Corrobora essa visão a
Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promulgada pelo
DECRETO Nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, (BRASIL, 2009), nestes termos:

Artigo 3º. Princípios gerais. Os princípios da presente Convenção são: a. O


respeito pela dignidade inerente, a autonomia individual, inclusive a
liberdade de fazer as próprias escolhas, e a independência das pessoas. b. A
não-discriminação; c. A plena e efetiva participação e inclusão na sociedade;
d. O respeito pela diferença e pela aceitação das pessoas com deficiência
como parte da diversidade humana e da humanidade; e. A igualdade de
oportunidades; f. A acessibilidade; g. A igualdade entre o homem e a
mulher; h. O respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças
com deficiência e pelo direito das crianças com deficiência de preservar sua
identidade.

Em respeito a esses princípios, a DAIN possui uma equipe multiprofissional composta


por psicólogo clínico, psicólogo educacional, ledor, assistente social, intérprete de Libras,
sociólogo e antropólogo. Todos estão envolvidos no acompanhamento das necessidades e
dificuldades encontradas pelos estudantes, sejam elas individuais ou coletivas. São
84

acompanhados pela equipe da DAIN: pessoas de baixa visão entre outras deficiências - que
desde a educação básica vêm sendo prejudicadas por falta de acompanhamento e profissionais
capacitados e ausência da educação adequada, pessoas com deficiência múltipla - que, ao
mesmo tempo, apresentam deficiência intelectual, baixa visão, cegos, surdos, autistas,
paralisia cerebral, deficiência física e ostomizados. Esses estudantes precisam das avaliações
ampliadas, mais tempo para responder suas provas e, muitas vezes, do acompanhamento de
um ledor, intérprete de libras, guia vidente para os cegos.
Devido ao trabalho desempenhado por essa equipe de profissionais, os estudantes
reconhecem a importância da DAIN e lamentam o fato de, na educação básica, não terem
recebido acompanhamento adequado para voarem bem mais alto. De fato, um tratamento
adequado a esses estudantes torna a academia um ambiente mais prazeroso, faz com que se
sintam amparados e, por consequência, os incentiva a buscarem uma ascensão social através
do estudo.
O ingresso desses estudantes na universidade é apenas uma das preocupações da
DAIN, acompanhada do esforço pela garantia da continuidade do estudo com qualidade. Esta,
pois, tem sido a meta da diretoria: atender estudantes com necessidades educacionais
especiais e com deficiência na instituição. Sua visão está traduzida no seguinte trecho de
Mantoan (1997, p. 121):

As escolas inclusivas propõem um modo de se constituir o sistema educacional que


considera as necessidades de todos os alunos e que é estruturado em função dessas
necessidades. A inclusão causa uma mudança na perspectiva educacional, pois não
se limita a ajudar somente os alunos que apresentam dificuldades na escola, mas
apoia a todos: professores, alunos, pessoal administrativo, para que obtenham
sucesso na corrente educativa geral.

A política de Inclusão da DAIN floresce a cada dia, quando concede, por meio do
respeito às garantias constitucionais, a oportunidade de estudantes com deficiência trilharem
uma trajetória de aprendizado e conhecimento até obterem sua ascensão social. A fim de
manter firme seu propósito, a diretoria investe constantemente em projetos e ações de
capacitação para técnicos, discentes, docentes a fim de prepará-los para atuarem com a
Educação especial na perspectiva da educação inclusiva. Tudo é feito com uma visão global e
interdisciplinar, considerando os aspectos que permeiam a educação e temas emergentes que
constituem a sociedade e despontam como desafios no cotidiano acadêmico.
Os projetos, na verdade, são para o crescimento geral da sociedade, com o intuito de
tornar a inclusão um alvo de todos, de modo a vivermos livres da discriminação e com a
85

possibilidade de uma sociedade mais justa e igualitária, desde a educação básica à


universidade.
O planejamento de contribuição da formação continuada oferecido pela DAIN tem
por meta abrir um horizonte de planos e ações propostas, as quais estão elencadas em seu
relatório de atividades (DAIN/UERN, 2013 a 2017):

• Formação de Gestores, educadores e técnicos administrativos para a


educação inclusiva.
• Cursos para o aprendizado da comunicação tátil do braile, cursos de
libras, cursos de extensão de ledor.
• Oficina para acompanhamento e cuidador de alunos com deficiência
física que precisam de cadeiras de rodas.
• Minicurso sobre diversidade e inclusão - A palavra mundo camponês
no curso de pedagogia: o doce saber e troca na dança dos saberes na
universidade.
• Minicurso História oral e pesquisa (auto)biográfica.
• Ciclo de palestras - Diversidade e inclusão: memória, saberes e
tradição dos povos do campo.
• Roda de Estudos da Lei brasileira de Inclusão. LEI - 13.145/2015
• Projeto Histórias de vida em música, teatro e desenho - vozes
silenciadas.
• Seminário Potiguar, Educação, Diversidade e Acessibilidade.
• E palestras.

Dentre as ações citadas, destaco aquelas das quais tive oportunidade de participar e
que muito contribuíram para minha formação. A primeira foi o I Seminário Potiguar:
Educação, Diversidade, Acessibilidade e Direitos Humanos, realizado na Universidade
Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), realizado em 2016, coordenado pela prof.ª Dra.
Ana Lúcia Oliveira Aguiar, que junto com toda a equipe da diretoria, oportunizando-me
aprender e participar.
Este seminário e suas outras edições, tanto as anteriores como as que ainda serão
realizadas, têm como foco principal o tema “Povos do Mundo – por (entre) lugares e sujeitos
na construção de teias de significados (auto) formativos”. Com a proposta, pretende-se
abranger, de maneira intercultural, a diversidade de lugares e sujeitos com suas histórias e
trajetórias de vida e formação, página do (ERNAB).
Também participei de uma palestra da DAIN durante meu estágio com a turma do
primeiro período do curso de Pedagogia no (PARFOR/ ASSU). O curso é presencial e
destinado aos professores da rede pública da educação básica, em exercício sem formação
adequada à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB. Os professores devem se
inscrever nos cursos correspondentes às disciplinas que ministram na rede pública. A palestra
foi ministrada durante a disciplina de Gestão dos Processos Educativos da Faculdade de
86

Educação/Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Foi ofertada no Estágio


de Docência, que é uma atividade curricular para estudantes de Pós-graduação stricto sensu
(mestrado e doutorado), sendo definida como a participação do/a aluno/a em atividades de
ensino na instituição, sob a supervisão de seu orientador (Resolução nº 02/2009 do CEPE).
O evento foi realizado no dia 23/03/2018, pela manhã e à tarde, no Campus Central da
UERN, em Mossoró, e contou com a presença dos estudantes de Assú, que chegaram ao local
logo pela manhã. Foi reservado o auditório da Faculdade de Educação Física (FAFEF) para a
realização da aula, cujo objetivo foi buscar a construção dos saberes apreendidos no
transcurso da unidade trabalhada até o momento e para conhecer sobre a inclusão escolar,
uma gestão emancipadora.
Os estudantes de Assú saíram do seu cotidiano e vivenciaram uma gestão inovadora,
com experiências de uma educação contínua, ministrada na perspectiva da inclusão,
diversidade e acessibilidade para a pessoa com deficiência. Essa experiência foi
proporcionada pela DAIN, dirigida pela professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar, que também
deu as boas-vindas aos participantes e, em seguida, explicou como seria a programação
daquele lindo dia.
A primeira atividade foi uma palestra ministrada pela própria professora Ana Lúcia
Oliveira Aguiar, com exposição de slides para apresentação da Universidade do Estado Rio
Grande do Norte UERN, de sua trajetória e nova fase com a entrada do novo reitor, bem
como da Diretoria de Ações Inclusivas - DAIN. Sobre a diretoria foi dito que consolida todo
o trabalho do ensino da pesquisa, sendo uma diretoria transversal, que passa por todo
território físico e humano da Universidade. Seu objetivo é trabalhar a inclusão de pessoas
com deficiência, mostrando e conscientizando sobre o crescimento de um trabalho sólido
sobre a inclusão, apesar das barreiras encontradas.
Em seguida, a palestrante deu oportunidade de fala a alguns membros da equipe de
gestão multiprofissional, constituída de secretária, auxiliares de secretaria, pedagogas,
assistentes sociais, intérpretes de Libras, ledores, transcritores de braile, instrutoras de Libras
e psicólogas. Explicou ainda sobre projetos de extensão da DAIN, como o projeto de Libras,
intitulado “LEDOR, orientação e mobilidade, Seminário Potiguar: Educação, Diversidade,
Acessibilidade e Direitos Humanos, ciclo de debates”. A diretoria revelou ainda a previsão de
sua ampliação, com a implementação do projeto de extensão do Sistema Braille, intitulado
“Deficiência Física, Deficiência Intelectual, Roda de conversa, deficiência, diversidade e
inclusão”. O momento foi concluído com a participação dos estudantes, que puderam tirar
suas dúvidas sobre tudo o que ouviram.
87

No período da tarde, todos os estudantes tiveram a oportunidade de conhecer o


espaço da DAIN. A professora Ana Lúcia Aguiar, diretora, fez uma breve explanação sobre
os equipamentos e materiais didáticos utilizados: 1 Impressora Braille, Cadeiras de Roda, 6
Scanners de Mesa, 7 Thermoforms, 8 Bengalas dobráveis, 9 Lupas, 10 Livros em Braille, 11
Jogos Pedagógicos (Braille e Libras), 12 Apostilas em Libras e dicionários, 13 Coletâneas
em CDs e DVDs (Educação para surdos e cegos).
Após a fala da professora sobre todos os recursos utilizados, com exposição e
explicação do papel da DAIN, alguns representantes dos setores da diretoria (Direção,
Secretaria, Divisão Pedagógica, Divisão Visual, Divisão de Deficiência Auditiva)
explicaram suas funções, destacando as suas principais responsabilidades. Em seguida,
houve uma troca de diálogos entre a Diretoria e os estudantes.
Logo depois da visita à Diretoria de Políticas e Ações inclusivas, nos dirigimos
novamente para o auditório da FAEF, na Faculdade de Educação Física, onde ouvimos as
narrativas de trajetórias de vida de quatro pessoas com deficiência: uma cadeirante, um cego,
uma pessoa com deficiência múltipla e eu, pessoa com deficiência não aparente.

Foto 18 - Palestra da DAIN – FAEF Faculdade de Educação


Física/UERN

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2018).

Finalizada a explanação das narrativas, José, sujeito da pesquisa, continuou como o


palestrante da tarde. Ele falou sobre sua ascensão social através dos estudos e destacou suas
dificuldades e êxito. Ao final de sua apresentação, os estudantes do PARFOR tiveram a
oportunidade de fazer suas interversões. A José perguntaram: qual era sua maior dificuldade?
Ele respondeu que era a falta de adequação dos professores, porém, isso sempre era
88

solucionado com a DAIN, que ia ao discente e o orientava. O momento enriqueceu suas


aprendizagens e conhecimento.
As socializações estabelecidas pelos estudantes de Assú com os palestrantes e demais
participantes do evento lhes trouxeram experiências de riqueza ampla, possibilitando uma
melhor compreensão do conteúdo trabalhado pela professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar com
eles, em sala de aula. Todo o evento teve a cobertura da TV Mossoró, ou TCM (sediada no
município de Mossoró, no estado do Rio Grande do Norte) e da Agência de Comunicação da
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (AGECOM). Ambas foram veículos de
comunicações para o evento e colaboraram com a divulgação do trabalho que a DAIN/UERN
vem prestando aos estudantes da Universidade UERN, a Mossoró e municípios vizinhos, e até
mesmo a outros países, através de seminários e congressos. O impacto de eventos como esse
para uma ascensão social e um êxito escolar é tão efetivo que a sociedade sente o dever de
fazê-los repercutir através dos meios de comunicação.
Com projetos e ações coletivamente planejados, a DAIN tem conquistado seus
objetivos. Com muito zelo e preocupação, cumpre todas as metas em seu tempo. Desse modo,
tem contribuído para a inclusão dentro e fora da universidade. Todas as palestras, seminários
e trabalhos planejados e executados são destinados a familiares e profissionais, que adquirem
uma formação continuada, ajudando no crescimento de todas as pessoas com deficiência,
independente de idade e grau de estudo. Seu grande desafio, então, é garantir o acesso,
permanência e aprendizagem de estudantes que apresentam especificidades sensoriais,
cognitivas, físicas e psíquicas desde a Educação Básica à Universidade.
Com planejamentos de curto, médio e longo prazo, a DAIN/UERN tem diminuído as
barreiras para uma educação inclusiva na UERN e favorecido não só os acadêmicos, mas
também a população em geral. Interessada no pleno desenvolvimento do potencial humano e
do senso de dignidade e autoestima, além do fortalecimento e respeito pelos direitos humanos,
liberdades individuais e plena diversidade humana, a diretoria elaborou uma política de
progressão acadêmica com o objetivo de, até o ano de 2019, promover a acessibilidade dos
discentes com deficiência aos programas de pós-graduação e de extensão universitária, bem
como aos programas formativos Projeto Institucional de Iniciação Científica (PIBIC), ,
MONITORIA, Programa de Educação Tutorial (PET).
As ações planejadas pela DAIN para o período de 2013 a 2017, conforme exposto em
seu relatório de atividades (DAIN/UERN 2013, p?), foram:
89

• Política de produção acadêmica.


• Mapear os discentes com deficiência por curso.
• Listar os programas de pós-graduação e os programas formativos.
• Enviar memorandos para os respectivos programas de pós-graduação e
formativos na busca pela ascensão social.
• Acompanhar a elaboração dos editais para chamada à comunidade.

Vale ressaltar a realização de projetos e programas para uma política de


internacionalização da inclusão UERN. Essa política visa promover sua visibilidade junto aos
programas de graduação e de extensão universitária, como também aos programas formativos
de universidades no exterior, com vistas ao compartilhamento, troca de experiências e
intercâmbio acadêmico do ensino, da pesquisa e da extensão para o desenvolvimento do
potencial de docentes e discentes. Esse projeto já foi levado a vários países, conforme se vê
no quadro a seguir:

Quadro 6 – Eventos de apresentação do Projeto de inclusão da UERN


29/10/2013 a 07/11/2013 – Almada/Portugal III Congresso Internacional de Inclusão e Equidade.
Almada: PRó-Inclusão - Associação Nacional de Docentes de Educação Especial.
21 a 28 de setembro de 2014 – Córdoba/Argentina XI Encuentro Nacional y V Congreso
Internacional de História Oral de la República Argentina “HISTÓRIA, MEMORIAS Y FUENTES
ORALES”.
06 a 13 de setembro de 2015 – Buenos Aires/Argentina II Seminário Internacional Paulo Freire “ La
educación popular como práctica de descolonización” 2 a 6 de maio de 2016 – Havana e
Cienfuegos/Cuba IX Encontro Internacional Paulo Freire, 2016, Cienfuegos
15, 16, 17 de outubro de 2017 – Cidade do México XI Congresso Internacional de História Oral,
promovido pela Associação Mexicana de História oral (AHMO), na cidade do México
15 a 17 de janeiro de 2018 – Lima/Peru Formação Continuada- Práticas Educativas, Cultura,
Diversidade e Inclusão entre UERN e ULMCH
04 a 06 de julho de 2018 – Santiago/Chile Jornada Pedagógica Internacional Chilena de Educação
Inclusiva: práticas educativas, cultura, diversidade e inclusão”, realizada em Universidad del Chile
Fonte: DAIN/UERN (2018).

A meta é que até dezembro de 2021 seja ampliada a participação dos estudantes,
docentes e técnicos junto aos programas de graduação e pós-graduação. Com essa
perspectiva, as ações propostas são, conforme exposto no relatório da DAIN/UERN (2013,
2017):
Por meio da DAIN, nos últimos anos, a UERN implementou a promoção da Educação
Inclusiva, tendo em vista o acesso de estudantes com deficiência e/ou necessidades
educacionais especiais, aprovados, pelo Processo Seletivo Vocacionado (PSV) e pelo
ENEM/SISU, nos diversos cursos por ela oferecidos. Hoje já são cadastros na DAIN 188
90

acadêmicos com necessidades educacionais distintas, distribuídos entre o Campus Central


(Mossoró), os 05 Campi (Caicó, Assú, Patu, Pau dos Ferros e Natal) e os 11 Núcleos da
universidade. Segundo a prof.ª, Dr.ª Ana Lúcia Aguiar, diretora da DAIN:

Diante de um novo modo de fazer educação, em que a informação e o


conhecimento são o arrimo do desenvolvimento das nações em processo de
globalização mundial, a inclusão universitária se constituiu um significante
instrumento para a participação de todos os cidadãos no processo de tomada
de decisões. Como alternativa de superação, a educação nos convoca, e é
inadiável mexer, inquietar, interrogar, espantar toda a comunidade
escolar/acadêmica no sentido de construir ações para a melhoria do
atendimento a todos os estudantes. Devemos ter em mente a vontade política
de trilhar o caminho que leve da exclusão à inclusão. (Narrativa de Ana
Lúcia Aguiar, Mossoró, 2018).

É bem verdade que devemos estar sempre atentos para o processo de incluir e ser
incluído. Observar-se as políticas públicas e as atitudes para cada ação inclusiva. Nesse
sentido, Viola (2008, p.55) adverte ser preciso [...] “para garantir a paz, a justiça social e a
efetivação da igualdade dentro da diferença (...) construir culturas sociais que garantam a
conquista e a preservação dos direitos de todos e de cada um”. A DAIN tem sido referência
para garantir os direitos fundamentais de todos os alunos com deficiência, ampliando a
política pública de inclusão entre municípios, estados e outros países.
Em complemento, a diretora da DAIN, Ana Lúcia Aguiar, afirma:

Direitos de todos e de cada um seria, na visão da DAIN e nossa, o acesso à


permanência com qualidade, e não uma simples inserção em sala de aula,
rodeada por pilares, barreiras, prisões, barricadas, embaladas por nossos
limites, por nossa falta de vontade, por não nos lançarmos à busca da
formação continuada. Que o nosso saber, saber/ser e saber/fazer sejam,
portanto, voltados à inclusão com dignidade para todos, buscando
alternativas, novas construções e outros caminhos via sujeitos envolvidos
diretamente no processo. Para a concretização da política elaborada pela
DAIN, é de sua responsabilidade educacional e social acompanhar e
estimular as demandas internas, formar pessoal qualificado para o exercício
de atividades de ensino e pesquisa no campo da Educação Especial e na
Perspectiva da Educação Inclusiva, oferecendo oportunidades de formação
em serviço e formação continuada. Entretanto, somente quando toda a
sociedade se mobilizar, e não apenas os profissionais que lidam com sujeitos
com deficiência, é que serão extintas as práticas de exclusão adquiridas ao
longo da história. (Narrativa de Ana Lúcia Oliveira Aguiar, Mossoró 2018-
DAIN, sede II)

A cada dia ocorrem novas possibilidades e avanços fundamentais à busca por verdades
da inclusão com serenidade e planejamentos. A esse respeito Freire (1979, p. 30-31) explica:
91

Quando o homem compreende a sua realidade, pode levantar hipóteses sobre


o desafio dessa realidade, e procurar soluções. Assim pode transformá-la e
com seu trabalho pode criar um mudo próprio: seu eu e suas circunstâncias.
[...]. A educação não é um processo de adaptação do indivíduo à sociedade.
O homem deve transformar a realidade para ser mais

O percurso é longo e a cultura da Inclusão nos consente sermos seres sociais,


participantes, criadores, transformadores e responsáveis pelo fato de nós, primeiramente seres
humanos, estarmos sempre abertos ao conhecimento, dotados de potencialidades. A
aprendizagem tem muito mais valor no momento em que concede uma reflexão para a
ampliação das possibilidades, para o desenvolvimento de um olhar transformador para uma
inclusão ética da formação social, capaz de uma efetiva emancipação, a qual se dá através de
uma prática de conhecimentos atitudinais e que contribui para um progresso mútuo entre
discente com deficiência e docente.

2.3 POSSIBILIDADES E CONQUISTAS: SUPERAR OBSTÁCULOS E QUEBRAR


BARREIRAS ATITUDINAIS, PROCEDIMENTAIS E ARQUITETÔNICAS

Uma vez conhecida a DAIN e suas ações em favor da inclusão e continuidade dos
estudos para alunos com deficiência desde a educação básica até à universidade, me
proponho, neste momento, a analisar a trajetória da proposta inclusiva no Brasil, com ênfase
nas conquistas já efetivadas e nas possibilidades de outras ações com vistas à garantia dos
direitos das pessoas com deficiências e à sua ascensão social por meio dos estudos.
Como base teórica para essa análise me servirá a Lei Nº 13.146/2015 (BRASIL,
2015), que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa
com Deficiência) e que norteia sobre barreiras a serem superadas pelos sujeitos com
deficiências: barreiras arquitetônicas (calçadas, rampas, vagas para carros, banheiros
adaptados); barreiras comunicacionais (a falta de sinalização urbana, sinalizações internas
dos edifícios, ausência de legendas e áudio descrição na TV, entre outras); barreiras sociais
(inclusão/exclusão social de grupos ou categorias de pessoas); e barreiras atitudinais, as quais
impedem a realização de ações que promovem o aprendizado e o conhecimento humanizador,
responsável por contemplar a toda a sociedade. A lei em comento é de grande relevância para
o estudo, que tramita entre o direito do aluno com deficiências em diversas áreas: saúde,
educação, trabalho, habilitação e reabilitação, transporte, turismo, lazer e acessibilidade em
suas mais amplas especificidades.
92

De modo mais específico, busco perceber as barreiras atitudinais e, para isso, mais
uma vez recorrerei à realidade dos estudantes com deficiência acompanhados pela
DAIN/UERN. Esse objetivo perpassa pela compreensão dos processos de mudanças ocorridos
em meio a tantas necessidades para uma locomoção e um aprendizado melhor mediante as
técnicas assistivas. Nesse sentido, é importante entender que para auxiliar diretamente uma
pessoa com deficiência é necessária a aquisição de recursos definidos de acordo com a
especificidade de cada um. Lidar com o outro à sua maneira lhe proporciona maior
independência, qualidade de vida e inclusão social, haja vista que terá sua comunicação
ampliada, bem como maior mobilidade, controle de seu ambiente, habilidades de seu
aprendizado, trabalho e integração com a família, amigos e sociedade. Tudo isso pode ser
conquistado com o auxílio das novas tecnologias “adaptativas” e com “adaptações”13
necessárias.
Podemos ter como exemplo de quebra de barreiras atitudinais a DAIN. Como foi dito
nos tópicos anteriores, o objetivo geral da DAIN é possibilitar às pessoas com deficiência
acesso e participação, de forma independente, em todas as dimensões da vida acadêmica
(ensino, pesquisa e extensão), com igualdade de oportunidades entre todos os discentes e com
a promoção de eliminação de obstáculos e barreiras à acessibilidade. O modelo educacional
almejado pela Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas da UERN segue, pois, a Convenção
dos Direitos das Pessoas com Deficiência de 2006, estabelecida pela ONU (2006) que assim
determina:

Artigo 9º. Acessibilidade. 1. A fim de possibilitar às pessoas com deficiência


viverem de forma independente e participarem plenamente de todos os
aspectos da vida, as Estadas Partes tomarão as medidas apropriadas para
assegurar às pessoas com deficiência o acesso, em igualdade de
oportunidades com as demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à
informação e comunicação, inclusive aos sistemas e tecnologias da
informação e comunicação, bem como a outros serviços e instalações abertos
ao público ou de uso público, tanto na zona urbana como na rural. Essas
medidas, que incluirão a identificação e a eliminação de obstáculos e
barreiras à acessibilidade, serão aplicadas, entre outros, a: a. Edifícios,
rodovias, meios de transporte e outras instalações internas e externas,
inclusive escolas, residências, instalações médicas e locais de trabalho; b.
Informações, comunicações e outros serviços, inclusive serviços eletrônicos
e serviços de emergência;

13
Áreas do conhecimento e características interdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias,
estratégicas e serviços que dão mais autonomia, independência, qualidade de vida as pessoas com deficiência.
incapacidade ou mobilidade reduzida. Disponível em: www.brasil.gov.br/noticias/educação-e-
ciencias/2010/tecnologia/assistivas. Acesso em: set. 2018.
93

O documento citado veio para ratificar os direitos e garantias da pessoa com


deficiência. Seu texto versa sobre alguns direitos que, no Brasil, em 2015, foram reforçados
com a Lei Nº 13.146, Lei Brasileira de Inclusão - LBI, de julho de 2015. Sua escrita traçou
um caminho para consolidação da democracia brasileira, com a crença e a certeza de que cada
um de nós é um coletivo E que o coletivo é um todo dentro de cada um de nós.
Com efeito, aprendemos com a vida, mas as leis existem para que possamos
formalizar os direitos garantidos pela Constituição da República Federativa do Brasil (1988),
a qual, por sua vez, trata da Educação Especial. Em seu Capítulo II – Da União, art.23, no
inciso II, afirma que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios “cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas
portadoras de deficiência” (BRASIL, 1988). Já no Capítulo III, intitulado Da educação, da
cultura e do desporto, na Seção I – Da educação, diz:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será


promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho. [...] Art.208. O dever do Estado com a
educação será efetivado mediante à garantia de: [...] III. Atendimento
educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente
na rede regular de ensino.

A evidência da Lei é clara, precisamos refletir sobre a efetivação desses direitos,


segundo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010)14, 45,6
milhões de pessoas declararam ter ao menos um tipo de deficiência, o que corresponde a
23,9% da população brasileira. A maior parte dessas pessoas (38.473.702) vive em áreas
urbanas, enquanto as demais (7.132.347) vivem nas áreas rurais. Esses números são bem
significativos e apontam para a necessidade de uma maior ênfase na luta pela superação dos
obstáculos que impedem as pessoas com deficiência de viverem seu dia a dia e de
conquistarem êxito. Eliminar essas barreiras significa, portanto, favorecer o desenvolvimento
das pessoas com deficiência desde a educação básica à universidade, é permitir que, através
dos estudos, surjam possibilidades e conquistas de superação do aprendizado e a ascensão
social.

14
Esse foi o último censo divulgado pelo IBGE com estatística sobre a população brasileira com algum tipo de
deficiência, entretanto encontramos dados mais recentes no site do instituto referentes ao ano de 2013. Cf.:
https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pns.
94

Com a consciência de que somos todos responsáveis uns pelos os outros, Sassaki
(1997, p. 12) faz um apelo à sociedade para uma mudança de postura frente às pessoas com
deficiências.

[...] havia aquele olhar: vamos fazer as coisas pelo deficiente, porque ele é
incapaz e inferior, então vamos dar uma mãozinha, vamos fazer-lhe um
favor, para ajudar ele fazer parte da sociedade (modelo médico) e hoje é
preciso eliminar as barreiras físicas, programáticas e atidudinais, a fim de
que as pessoas com deficiência possam ter acesso a serviços e bens
necessários ao seu desenvolvimento pessoal, social, educacional e
profissional (modelo social)

Para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, é preciso começarmos,


então, pela quebra de barreiras atitudinais, representadas por atitudes e comportamentos de
pessoas que constroem barreiras o ir e vir da pessoa com deficiência. Esse tipo de barreira
podemos ver no dia a dia, quando, por exemplo, alguém indevidamente ocupa as vagas
reservadas para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, ou ainda quando, de forma
intencional ou não, alguém estaciona o veículo em frente à rampa que dá acesso a essas
pessoas, impedindo que cheguem ao local desejado.
A quebra de barreiras atitudinais ocorre à medida que a sociedade se conscientiza e se
transforma, estabelecendo novos contextos. Ela pode ser iniciada com simples atitudes, como:
ajudar alguém a atravessar a rua; não discriminar o outro por suas diferenças; evitar o olhar
penalizado; apreciar e fomentar a ideia de que as pessoas com deficiência devem ter acesso às
instituições de ensino, com a garantia de que se sintam, de fato, discentes e com a presença de
profissionais e tecnologias assistivas para cada deficiência. Atitudes como essas certamente
promoverão a integração e alavancarão a inclusão.
Todavia, como já foi dito, existem outras barreiras que necessitam ser vencidas, como
as barreiras arquitetônicas. Exemplos são lojas, museus, teatros, pontos de ônibus, bancos,
mercados, calçadas e corredores de locais sociais sem rampa de acesso, somente com degraus;
rampas com inclinação fora dos parâmetros; portas estreitas; entre outras que impedem o
direito de “ir e vir livremente” da pessoa com deficiência, direito este garantido pela
Constituição Brasileira, art. 5º (BRASIL, 1988). É importante destacar que tais barreiras
caracterizam o desrespeito e, muitas vezes, até o desconhecimento das necessidades das
pessoas com deficiência aparente ou não aparente.
No Brasil, a estimativa é de que pelo menos 14% da população possua algum tipo de
comprometimento físico, um número bem maior do que o esperado. Para propiciar mais
95

qualidade de vida a esse contingente de cidadãos, a Associação Brasileira de Normas


Técnicas (ABNT), em parceria com o Comitê Brasileiro de Acessibilidade, estabeleceu a
Norma NBR 9050/2004, com parâmetros técnicos a serem respeitados na construção,
instalação e adaptação de edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Em
respeito a essa norma, hoje, os locais públicos devem possuir elevador, rampa ou escadas com
equipamento associado eletronicamente.
Esse documento corrobora um olhar mais apurado para a acessibilidade, priorizando
não só a quebra de barreiras atitudinais, mas também das arquitetônicas. No caso das
escolas, a norma determina que devem possuir salas de aula com mobiliário adequado e a
presença de profissionais preparados para cada tipo de deficiência (ABNT, 2004, p.87).
Mesmo com tantas leis e normas em favor das pessoas com alguma deficiência, elas
continuam a andar pelas ruas com a preocupação de se depararem com obstáculos e com
lugares inadequados à sua acessibilidade e permanência. Nesse sentido, é fundamental a
inclusão, visto que prima pelo fim do preconceito e da discriminação e pelo respeito à
dignidade, permitindo autonomia, possibilidades de conquistas e participação efetiva da
pessoa com deficiência na sociedade. Sobre a inclusão, Mantoan (2002, p.86) enfatiza que
“[...] é um conceito que emerge da complexidade, dado que a interação entre as diferenças
humanas, o contato e o compartilhamento dessas singularidades compõem a sua ideia matriz”.
Não há dúvida de que a sociedade precisa se preparar para receber pessoas com deficiência, e
não o contrário, a pessoa com deficiência se adaptar à sociedade. Nesse sentido, as
instituições educacionais, desde a educação básica à universidade, têm papel importantíssimo,
pois são espaços de formação e aquisição de conhecimentos, bem como de socialização. De
acordo com Fonseca (1995, p. 202):

Como instituição social, não poderá continuar a agir no sentido inverso,


rejeitando, escorraçando ou segregando “aqueles que não aprendem como os
outros”, sob a pena de negar a si própria. Não se pode continuar a defender
que tem de ser a criança a adaptar-se às exigências escolares, mas sim o
contrário. Efetivamente, a escola, ou melhor, o sistema de ensino, não pode
persistir excluindo sistematicamente as crianças deficientes, estigmatizando-
as com a desgraça, rotulando-as com uma doença incurável ou marcando-as
com um sinal de inferioridade permanente

Conforme os dispositivos legais e argumentos aqui levantados, a pessoa com


deficiência, desde a educação básica à universidade, tem o direito a um ambiente de interação
e aprendizagem com todos os estudantes, sem distinção. É necessário, então, que esse
ambiente se torne favorável e de qualidade. Este é um fator relevante para que a inclusão
96

transcorra e para que os discentes e docentes consigam alargar as suas capacidades, havendo
aprendizado e crescimento para ambos.
É claro que a inclusão, seja nas instituições de ensino ou em outros ambientes sociais,
não vai ocorrer de um dia para o outro, mas dia a dia, com a quebra de alguns paradigmas e
com a busca por mudanças e por um olhar plural. Essas mudanças, entretanto, não vêm
descritas em um manual, cada pessoa deve buscá-las. No caso de professores e profissionais
da educação, devem recorrer à formação continuada para aprenderem a lidar com a
diversidade.
Na sua atuação diária, é mister que esses profissionais procurem pôr em prática ideias
que promovam uma educação qualitativa, com o desenvolvimento de atividades conjuntas e
que favoreçam o aprendizado de todos. Isso inclui a adaptação da metodologia e linguagem
utilizadas, de modo a atingir as necessidades de todos. O resultado desse esforço será a quebra
das barreiras comunicacionais e o estabelecimento de uma boa relação professor-aluno.
É evidente que para haver troca de conhecimentos é necessária uma boa comunicação
entre as pessoas, por isso a Lei Brasileira de Inclusão 13.146/2015 (BRASIL, 2015) ou
Estatuto para pessoa com deficiência ressalta:

Art. 28. Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver,


implementar, incentivar, acompanhar e avaliar:
XI – formação e disponibilização de professores para o atendimento
educacional especializado, de tradutores e intérpretes da Libras, de guias
intérpretes e de profissionais de apoio;
XII – oferta de ensino da Libras, do Sistema Braille e de uso de recursos de
tecnologia assistiva, de forma a ampliar habilidades funcionais dos
estudantes, promovendo sua autonomia e participação;

De acordo com o exposto na lei citada, caracteriza-se barreira comunicacional a


informação transmitida em vídeo sem as legendas ou sem um intérprete de libras (para
pessoas com deficiência auditiva), ou ainda com a ausência da audiodescrição (para pessoas
com deficiência visual).
No que se refere à população com surdez no Brasil, em censo realizado no ano de
2010, o IBGE entrevistou um total de 190.755.799 pessoas, das quais 5,1% declararam ter
algum tipo de deficiência auditiva, um total de 9.717.318 pessoas, na época. Como
demonstrado no gráfico 1, o mesmo censo registrou um percentual de 37,4% pessoas com
deficiência visual, o que equivale a 35 milhões.
97

Gráfico 1 - População com deficiência auditiva ou visual no Brasil em 2010.

Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados do IBGE (2010, p. 76).

Desde a educação Básica até a Universidade, muitas são as dificuldades geradas a


esse público pela falta de comunicação. Infelizmente, muitas instituições educacionais não
possuem espaços adaptados às suas necessidades, lhes falta, por exemplo, mapa e piso tátil e
as placas com as comunicações visuais ficam suspensas, de difícil acesso. Em apresentações
de slides e cartazes, as cores são desproporcionais, sem acesso de visualização para todos.
Na UERN, essa realidade tem mudado graças aos esforços da DAIN, que tem
realizado ações para mostrar a essa população o valor que possuem para a sociedade.
Destaque dessas ações foi o II Seminário Potiguar Educação, Diversidade e Acessibilidade na
UERN – Universidade do Rio Grande do Norte, evento em que foi realizado, na sala de
práticas do POSEDUC, um minicurso para discutir sobre as necessidades e direitos das
pessoas com deficiência. Um dos cursos realizados foi o de Libras-tátil15. Esse sistema de
comunicação é utilizado para pessoas que possuem deficiência audiovisual.
Sem dúvida, na discussão sobre o processo inclusivo nas escolas e universidades
merecem atenção especial as políticas públicas para promoção de debates em que seja

15
Sistema que consiste a Língua Brasileira de Sinais ( LIBRAS ) adaptada ao surdocego. É realizada com a mão
do surdocego em cima das mãos do interlocutor. Disponível em:
https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/a-lingua-de-sinais-tatil-como-comunicacao-e-
inclusao-da-pessoa-surdocega/37672. Acesso em: 16 mar. 2018.
98

possível ouvir os discentes com deficiência, bem como a implantação de um diálogo voltado
às suas necessidades. Tais políticas são fundamentais para a garantia de um ensino
continuado, sem que haja desistência desse discente na instituição de ensino, são, em outras
palavras, passo essencial para a quebra da barreira social.
É natural que nós, seres humanos, em nossas relações pessoais, tenhamos afinidades,
mas precisamos estar atentos à exclusão, especialmente no que se refere às chamadas
“minorias”, como os autistas e as pessoas com deficiências intelectuais. Precisamos quebrar
as barreiras e procurar estabelecer um novo olhar, respeitando e valorizando o outro e suas
limitações. Potencializar a identidade das pessoas com deficiência sem restringir-lhes as
possibilidades de desenvolvimento dos estudos para alcançar ascensão social não é apenas
papel das instituições de ensino, mas da sociedade em geral. Entretanto, as instituições
educacionais devem proporcionar uma metodologia dinâmica e com acessibilidade a todos,
dispondo de equipamentos e mobílias assistivas. Deve contar ainda com profissionais que
buscam uma educação continuada, se adequando às mudanças necessárias. Para Charlot
(2005, p.41), é preciso:

[...] compreender como o sujeito categoriza, organiza seu mundo, Como ele
dá sentido à sua experiência e especialmente à sua experiência escolar [...],
como o sujeito aprende o mundo e, com isso, como se constrói e transforma
a si próprio.

A contribuição da aprendizagem permite o avanço a cada dia, para uma adequação e


caminhada efetiva na educação inclusiva ao experimentar e conquistar novas didáticas
pedagógicas. Com efeito, há um longo caminho a percorrer para um ensino inclusivo de
verdade, mas importantes passos já foram dados. Nesse percurso, percebemos que a exclusão,
a segregação, a integração deixaram suas contribuições para que, hoje, haja possibilidades e
conquistas de superar obstáculos e quebrar barreiras atitudinais, procedimentais e
arquitetônicas e para conquistarmos, a cada dia, a inclusão.
Com uma educação libertadora, conforme a realidade da pessoa com deficiência,
podemos contribuir para o seu empoderamento, até que haja, através dos estudos, a ascensão
social. Nessa caminhada, é importante que os estudantes com deficiência estejam dispostos a
estudar e passar por alguns percalços, não por entusiasmo, mas por vontade. É preciso que
sejam estimulados a vencer os medos, a rejeição, a inferioridade e a incapacidade para que
permaneçam nos estabelecimentos de ensino e não haja desistência. Nesse sentido, se faz
necessário, que os agentes da educação incentivem o êxito social através dos estudos,
99

ajudando o aluno com deficiência a desenvolver, a cada dia, suas habilidades, a vencer
desafios e efetivar conquistas, a acreditarem em si mesmos.
Precisamos, acreditar na sociologia do improvável, que estuda estatisticamente
improvável no sentido da raridade, conforme Berdier e Xypas (2013). Isso implica dizer que,
através dos estudos, as pessoas com deficiências, de famílias de camada social, podem ler o
mundo com aprimoramento de uma condição de vida educacional, com expectativas de buscar
novos horizontes. Não se tornando impossível uma pessoa de classe menos favorecida e pais
analfabetos alcance a ascensão social através dos estudos. O percurso das dificuldades são
muitos, mas com determinação e vontade de quebrar os obstáculos encontrados a cada dia é
possível chegar à ascensão social através do estudos, mesmos os menos favorecidos.

2.4 AS RODAS DE ESTUDOS SOBRE A LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO (LBI):


DIÁLOGOS E DEBATES NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO EM MOSSORÓ/RN

As Rodas de estudos sobre a Lei Brasileira de Inclusão (LBI): diálogos e debates


na perspectiva da inclusão em Mossoró/RN constituem um recurso da DAIN/UERN em
prol da divulgação dos direitos e garantias da pessoa com deficiências estabelecidas pela LBI
- Lei Brasileira de Inclusão, Nº 13.146/2015, intitulada Estatuto da Pessoa com Deficiência.
As Rodas de Estudos permitem uma reflexão sobre as experiências e êxitos de pessoas com
deficiências em todo o município de Mossoró/RN. Seu objetivo é mostrar que por meio de
uma luta coletiva podemos ser melhores, sem nos calarmos diante das injustiças.
Esses encontros iniciaram em agosto 2015 e são realizados em lugares diversos, com
a colaboração de diferentes entidades municipais, estaduais e federais, entre elas: Centro
Estadual de Capacitação de Educadores e Atendimento ao Surdo (CAS), Centro de Apoio ao
Deficiente Visual (CADV), Associação do Deficiente Visual de Mossoró (ADVM),
Faculdade Católica do Rio Grande do Norte16, Associação de Surdos de Mossoró (ASMO),
Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), Centro Regional de Educação
Especial de Mossoró (CREE_MOS), Instituto Federal de Educação e Tecnologia (IFRN),
Conselho tutelar de Mossoró R.N, Ordem dos Advogados OAB (Subseção Mossoró) e
Associação da Pessoa com Deficiência, CAADIS (UFERSA, AMOR, CAENE (UFRN) UNP-
Universidade Potiguar,

16
Instituição antes nomeada Faculdade Diocesana de Mossoró. A nova nomenclatura passou a vigorar em 2019.
100

Voltadas para a realização de ações de aprendizados sobre a Lei Nº 13.146/2015, Lei


Brasileira de Inclusão – LBI, as Rodas de Estudos Itinerantes são realizadas todos os meses,
sempre em uma cidade diferente do Rio Grande do Norte, são realizadas em Apodi, Serra do
Mel. Areia Branca, Baraúnas e Caraúbas. A mentora do projeto é a professora e diretora do
DAIN, Dra. Ana Lucia Oliveira Aguiar, que conduz tudo com muito zelo e eficiência.
Uma vez descrito o projeto, destaco, na sequência, as conquistas e lutas da DAIN
para levar o conhecimento em vários municípios, com o auxílio de palestrantes capacitados
em cada área proposta, de acordo com a lei Nº 13.146.2015, Lei Brasileira de Inclusão - LBI.
Ressalto também os saberes, aprendizados e atitudes para eficácia dos direitos e deveres de
cada município, bem como os resultados dessas ações.
Como participante do projeto, posso dizer que esses encontros me proporcionaram
um maior amor pelo meu objeto de estudo - A ascensão social de estudantes com
deficiência não perceptível: da educação básica à universidade. Por meio desses
encontros, senti a necessidade de pesquisar e saber mais sobre todos os direitos relatados em
cada encontro. Os debates e palestras me instigaram ao estudo e aprendizado. Dentro ou fora
do município de Mossoró, pude ouvir a respeito das ações promovidas pela DAIN junto à
população.
A diversidade de temas para as palestras, descritos nos quadros abaixo, tem
despertado interesse da população e obtido grande relevância social. Os locais para reunião
são escolhidos de acordo com a demanda por conhecimento da LEI- LBI Lei Brasileira de
Inclusão, 13.145/julho 2015, o que significa que a população tem buscado sair da inércia
jurídica.
As Rodas de Estudos da Lei Brasileira de Inclusão, Lei Nº 15.146/2015, promovem
estudo e conhecimento para que as pessoas possam buscar a efetivação dos seus direitos junto
aos órgãos competentes. Esses encontros, entretanto, são momentos de conversas para o
estudo da Lei, dos direitos, dos deveres e dos esclarecimentos sobre as instâncias que estão na
soma para a efetivação dos direitos das pessoas com deficiência. As Rodas de Estudos
Itinerantes têm esclarecido a população para que, caso não sejam atendidas suas necessidades,
que deve agir, possibilitando a conquista do que precisam. Em outras palavras, as Rodas de
Estudos Itinerantes da LBI têm levantado a bandeira de que juntos podermos ser mais fortes.
Seu lema é: a luta por políticas públicas para a efetivação dos direitos das pessoas com
deficiência. Temos Direito à vida e, por isso, faz-se necessário uma luta constante para
adquirir o direito a uma vida digna, sem discriminação e sem interrogações que ferem a alma.
101

Consciente da importância das Rodas de Estudos Itinerantes, não só para meu


aprendizado e conhecimento, mas para minha formação continuada e de outros, trago no
quadro 7 a descrição das Rodas de Estudos da LBI já realizadas em Mossoró.

Quadro 7 - Rodas de estudos da LBI realizadas em Mossoró (Continua)


Roda de estudo LBI Tema Data e local de
realização
I Roda de estudo da LBI Lei Brasileira de Inclusão – 04/08/2015.
Parte I. Contou com a Faculdade de Educação
presença de muitas pessoas e da UERN. (FE/UERN).
fez uma explanação do que
seria o Estatuto da Pessoa
com Deficiência, recém
aprovado, uma Lei muito
nova que faria a diferença.

II Roda de Estudo da LBI Lei Brasileira de Inclusão: Do 17/09/2015.


Direito à Educação - dos Faculdade de
conceitos fundamentais. Educação Física da
UERN (FAEF/UERN).

III Roda de Estudo da LBI Lei de e Marraqueche: acesso 22/ 10/2015


à cultura para pessoas com Centro de Atendimento
deficiência visual. ao Surdo (CAS/
Mossoró).

IV Roda de Estudo da LBI Lei Brasileira e Inclusão – 26/11/2015


reflexões sobre processos UFERSA
exitosos.

V Roda de Estudo da LBI Lei Brasileira de Inclusão – 15/12/2015


Direito à Habitação. Colégio Diocesano Santa
Luzia.
VI Roda de Estudo da LBI Direito Previdenciário na LBI 22/02/2016
de Inclusão. Faculdade de
enfermagem na UERN
VII Roda de Estudo da LBI Lei Brasileira de Inclusão – da 21/03/2016
Educação e do Intérprete da Instituto Federal do Rio
Língua Brasileira de Sinais. Grande do Norte de
Mossoró
VIII Roda de Estudo da LBI Direito da Educação. 19/04/2016
Ocorreu no Colégio
Mater Christi,
102

Quadro 7 - Rodas de estudos da LBI realizadas em Mossoró (Conclusão)


IX Roda de Estudo da LBI Direito à Educação. 23/05/2016
Instituto Federal do Rio
Grande do Norte
X Roda de Estudo da LBI Aspectos Gerais da LBI. 21/06/2016
Colégio Diocesano Santa
Luzia
XI Roda de Estudo da LBI O Desenho Universal na 26/08/2016
perspectiva da LBI. Universidade Potiguar
UNP
XII- Roda de Estudo da LBI A Saúde na perspectiva da 27/09/2016
LBI. Faculdade de Ciências da
UERN (FAFIC/UERN).
XIII Roda de Estudo da LBI Do Direito à Assistência 24/10/2016
social na perspectiva da LBI. OAB, Subseção Mossoró

XIV - Roda de Estudo da LBI Habilitação e Reabilitação na 30/11/2016


Perspectiva da LBI. Colégio Diocesano de
Santa Luzia
XV Roda de Estudo da LBI Saúde Inclusiva na Esteira da 20/12/2016
Perspectiva da LBI Universidade Potiguar –
UNP
XVI Roda de Estudo da LBI Modos de saber e de fazer na 20/03/2017
perspectiva das Instituições Local
locais.

XVII Roda de Estudo da LBI A perspectiva da Educação na 19/04/2017


LBI, Transtorno do Espectro Instituto Federal do Rio
Autista. Grande do Norte

XVIII- Roda de Estudo da A Perspectiva da Educação na 24/05/2017


LBI LBI, Transtorno do Espectro Faculdade de
Autista. Enfermagem da UERN

XIX Roda de Estudo da LBI Um Diálogo com os conselhos 21/6/2017


Municipais dos Direitos das CREEMOS
pessoas com deficiência.

Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados divulgados pela DAIN (2018).

Os temas propostos estão ressaltados nos artigos da LBI Lei 13.146/2015, quando
remetem a buscar avanços e conhecimentos para todos que participam dessas palestras com
consciência da necessidade de divulgação dos direitos e garantias das pessoas com deficiência
e sua família, amigos e a quem interessar. Em 2017, essas Rodas de Estudos receberam uma
nova roupagem e se transformaram em Rodas de Estudos Itinerantes, que são propostas em
outras cidades próximas como Apodi/RN, Caraúbas/RN, Areia Branca/RN, Baraúna/RN,
103

Serra do Mel/ RN e Mossoró/RN. Estamos na sexta Roda de Estudos Itinerantes da LBI. Todo
mês, esse evento é realizado em um município vizinho, com uma participação significativa e
com várias solicitações de retorno. A meta é levar o conhecimento a todas as cidades vizinhas
de Mossoró. Algumas são realizadas durante todo o dia, entre elas já fomos a Caraúbas, Porta
Alegre, Serra do Mel, Apodi e Baraúnas, Areia Branca, com a seguinte programação. Pela
manhã, realizamos várias oficinas, com temas variados e almoço. Na parte da tarde,
terminamos as oficinas e vamos todos para um salão, onde há uma apresentação do que foi
ministrado em cada oficina. Depois temos uma palestra e finalizamos. Geralmente
começamos às 9h e terminamos às 17h.
A promoção dessas de Estudos Itinerantes da LBI tem suas contribuições para a
educação inclusiva no momento em que oferece palestras sobre os direitos da pessoa com
deficiência e oferece mediações entre população e judiciário. Elas permitem a aquisição de
conhecimento e busca perspectivas melhores para uma emancipação do discente com
deficiência.
A ação realizada pela DAIN e seus integrantes nos municípios vizinhos a Mossoró
representa um avanço social para todos. No quadro 8 estão as rodas itinerantes já realizadas:

Quadro 8 - Rodas Itinerantes realizadas pela DAIN (Continua)


Roda Itinerante Tema Data e local de realização
I Roda de Estudo Itinerante Dos Direitos dos Transportes 23/08/2017
e a Mobilidade na Sindicato dos
perspectiva da LBI. Trabalhadores Rurais de
Apodi /RN.
II Roda de Estudo Itinerante Educação, Acessibilidade e 11/ 09/2017.
efetivação de direito na UFERSA – Caraúbas/RN.
perspectiva na LBI.
III Roda de Estudo Itinerante Educação na Perspectiva da 19/10/2017
LBI. Um olhar da Psicologia Câmara Municipal de
Educacional. Areia Branca/RN.

IV Roda de Estudo Itinerante Do direito do Transporte e a 23/11/2017


Mobilidade na perspectiva da Câmara Municipal de
LBI Baraúna.
V Roda de Estudo Itinerante Formação Continuada. 24/05/2018
Identificando o Transtorno Serra do Mel/RN
do Espectro Autista
Fonte: Elaborado pela autora com base em informações cedidas pela DAIN (2018).
104

No dia 25/06 2018, tive, mais uma vez, a oportunidade de participar de uma
formação continuada em Serra do Mel, realizada durante todo o dia. Palestramos em um
Minicurso sobre a Lei Nº 13.146/2015, Lei Brasileira de Inclusão - LBI.
A DAIN/UERN vem lutando pelos discentes com deficiências da UERN e por uma
sociedade na qual todos possam usufruir de oportunidades e de constante aprendizado. Os
parceiros desse projeto têm abraçado a bandeira levantada pela professora Ana Lucia Oliveira
Aguiar, é uma guerreira incansável neste trabalho, sem esmorecer um dia sequer para
assegurar o cumprimento dos direitos existentes na LBI.
Essa lei é resultado de um processo histórico, iniciado em 1989, com a criminalização
da discriminação de pessoa com deficiência no ambiente do trabalho. Em seguida, no ano de
1991, foi reforçado pela implementação do sistema de cotas (Começo de ações afirmativas).
Mais tarde, em 2008, através das Nações Unidas (ONU), foi formada a Comissão
Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência. A partir daí teve início, no Brasil, a
formulação do Estatuto da Pessoa com deficiência, a Lei Brasileira de Inclusão, aprovada no
ano de 2015.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência é um conjunto de leis que visa a inclusão
através das medidas de caráter social para a pessoa com deficiência. Passaram-se 15 anos
desde 2000 á 2015 para ela entrar em vigor. Foram realizados mais de 1.500 encontros
(audiências públicas, seminários, consultas, conferências nacionais e regionais) com ampla
participação da sociedade, de entidades e do movimento de pessoas com deficiência (LBI-
Comentada).
Cerca de 146 milhões de brasileiros são beneficiados por essa Lei, por isso a
importância das rodas da LBI avançarem a cada mês, orientando as pessoas em diversas áreas
(educação, saúde, trabalho, habilitação e reabilitação, previdência social, transporte e
acessibilidade) em sua ampla especificidade.
A equipe da DAIN/UERN tem levado esclarecimento sobre aquilo que é garantido
pela referida lei, a saber: atendimento prioritário, das estações e terminais com inclusão de
transportes coletivos de passageiros e a garantia de segurança no embarque e desembarque;
frotas de taxi com 10% de veículos acessível à pessoa com deficiência; locadoras, hotéis e
pousadas com disponibilidade de 10% dos dormitórios com acessibilidade; 3% das unidades
habitacionais públicos; 10% das vagas nas universidades para pessoas com deficiência.
Apesar dos avanços que a legislação trouxe, a luta pelas pessoas com deficiência está
se cumprindo, trata-se de uma lei nova, com muitas mudanças. Ela proporcionou alteração no
código civil brasileiro nos arts. 3º e 4º, que anteriormente narrava que as pessoas com
105

deficiências eram absolutamente incapazes de praticar os atos civis. A Lei ainda traz sanções
penais para quem descumpri-la e seus objetivos são assegurar à pessoa com deficiência
direitos, oportunidades, promoção e equiparação, acessibilidade e autonomia.
O primeiro relator da LBI foi Paulo Parim .Ele propôs a matéria em 2003. Em seguida,
a lei foi relatada por Mara Cabrilli em 2006. Em 2015 a Lei é aprovada na Câmara dos
deputados Federais por Romário Farias e segue para o senado. Segundo Farias (2015):

A Lei Brasileira de Inclusão abre um novo paradigma no país. A sociedade,


através do estatuto da pessoa com deficiência, vai se preparar para receber a
pessoa com deficiência e não mais a pessoa com deficiência terá que se
adaptar a uma sociedade que não está apta a recebê-la.

Na LBI (BRASIL, 2015), o Conceito de Pessoa com deficiência está no seguinte


trecho:

ART. 2º. Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento
de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. § 1º
A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial,
realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:
(Vigência) I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo; II - os
fatores socioambientais, psicológicos e pessoais; III - a limitação no
desempenho de atividades; e IV - a restrição de participação.

Não importa a limitação ou o grau de limitação. Se a pessoa tem algum tipo de


impedimento físico, intelectual, mental ou sensorial para realizar suas atividades ou encontra
alguma barreira, essa pessoa é considerada como pessoa com deficiência.
No artigo 5º da mesma lei, inciso LXVIII, que mostra que todos temos direitos sem
descrição, encontramos eficácia das garantias fundamentais da nossa Constituição Federal.
Apesar de saber que os Institutos Constitucionais são pouco respeitados no dia a dia, mesmo
sendo considerados legais, precisamos lutar para que essas garantias tenham eficácia.
Temos em nossas mãos possibilidades para uma grande luta, mas, possível de vencer.
Com essa perspectiva a DAIN promove os avanços da roda da LBI – Itinerantes e acredita
que por meio dos estudos podemos alcançar uma sociedade salutar a respeito dos direitos da
pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida. Na sequência destaco alguns artigos da LBI
(BRASIL, 2015) usados nas Rodas itinerantes.
106

Do Direito à Educação

Art. 27º A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados


sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de
toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus
talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas
características, interesses e necessidades de aprendizagem.
Parágrafo único. É dever do Estado, da família, da comunidade
escolar e da sociedade assegurar educação de qualidade à pessoa com
deficiência, colocando-a a salvo de toda forma de violência, negligência e
discriminação.
Art. 28. Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver,
implementar, incentivar, acompanhar e avaliar:
XII - oferta de ensino da Libras, do Sistema Braille e de uso de
recursos de tecnologia assistiva, de forma a ampliar habilidades funcionais
dos estudantes, promovendo sua autonomia e participação;
XIII - acesso à educação superior e à educação profissional e
tecnológica em igualdade de oportunidades e condições com as demais
pessoas;

As determinações da LEI são completas e eficientes. Elas possibilitam a todas às


pessoas com deficiência o acesso à educação, com aparato a suas necessidades e
possibilidades. Com base na LBI, Mantoan (2006) propõe que a educação inclusiva deve
acolher a todas as pessoas, sem exceção, respeitando as diferenças e garantindo o direito a
educação. O tratamento igualitário deve ser cumprido sem restrições, e a diversidade e
inclusão feita através de toda sociedade.
Freire (1996), por sua vez, diz que uma das tarefas da educação popular progressista é
procurar, por meio da compreensão crítica de como se dão os conflitos sociais, ajudar o
processo no qual a fraqueza dos oprimidos se vai tornando força capaz de transformar a força
dos opressores em fraqueza. Esperançar é a esperança que nós temos de sonhar e buscar a
felicidade, um mundo mais justo, mesmo existindo tantas dificuldades. Esperanças por
melhores condições principalmente de incitar a esperança no sentido de luta e nas
possibilidades de mudanças e melhorias em suas vidas.
Também consta na LBI (BRASIL, 2015):

Do Direito à assistência social

Art. 39. Os serviços, os programas, os projetos e os benefícios no


âmbito da política pública de assistência social à pessoa com deficiência e
sua família têm como objetivo a garantia da segurança de renda, da acolhida,
da habilitação e da reabilitação, do desenvolvimento da autonomia e da
convivência familiar e comunitária, para a promoção do acesso a direitos e
da plena participação social.
107

Art. 40. É assegurado à pessoa com deficiência que não possua


meios para prover sua subsistência nem de tê-la provida por sua família o
benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei no 8.742, de 7
de dezembro de 1993.

Do Direito ao transporte e à mobilidade

Art. 46. O direito ao transporte e à mobilidade da pessoa com


deficiência ou com mobilidade reduzida será assegurado em igualdade de
oportunidades com as demais pessoas, por meio de identificação e de
eliminação de todos os obstáculos e barreiras ao seu acesso.
Art. 47. Em todas as áreas de estacionamento aberto ao público, de
uso público ou privado de uso coletivo e em vias públicas, devem ser
reservadas vagas próximas aos acessos de circulação de pedestres,
devidamente sinalizadas, para veículos que transportem pessoa com
deficiência com comprometimento de mobilidade, desde que devidamente
identificados.

Com efeito, essas normas modificaram de forma bastante profunda as incapacidades


do ordenamento jurídico brasileiro. Antes da LBI ou Estatuto da Pessoa com Deficiência -
EPD, havia uma confusão no Código Civil Brasileiro. No documento estava expresso que a
pessoa com deficiência era incapaz e acreditávamos, equivocadamente, que deficiência era
sinônimo de incapacidade. Nesses termos, a pessoa com deficiência já era automaticamente
enquadrada como incapaz.
A LBI veio para preencher essa lacuna histórica, para que possamos não mais
considerar a pessoa com deficiência como incapaz. Hoje, o incapaz, no Brasil, é somente o
menor de 16 anos, somente ele será representado e terá nulo os atos errados por ele
praticados. As mudanças nos artigos 3º e 4º do código civil brasileiro foram feitas entre os
anos 2015 e 2016, recentemente. A priori, a pessoa com deficiência é capaz como qualquer
outra, por isso outra modificação ocorreu no código civil, em seu art. 1550, § 2º, que
determina que a pessoa com deficiência pode contrair casamento, manifestando vontade
própria.
O direito das pessoas com deficiências envolve as deficiências física, mental, visual,
auditiva e múltiplas, descritas no Decreto Nº 5296/04 (BRASIL, 2004). Essas pessoas têm um
impedimento de longo prazo e encontram barreiras e muitos obstáculos que dificultam seu
pleno exercício na sociedade. Essa realidade, no entanto, foi alterada pela LBI, que mudou até
mesmo a nomenclatura de pessoa portadora de deficiência para pessoas com deficiência,
excluindo a ideia de portar a deficiência. Por essa visão, as deficiências deixam de ser
meramente médicas, clínicas, e passam a possuir aspectos biopsicossociais. Essa mudança foi
108

implementada por uma equipe multiprofissional e interdisciplinar, após uma análise mais
completa.
Dentro dos Direitos Fundamentais, a LBI traz artigos, quais sejam: Direito à vida,
Direito à Habilitação e à Reabilitação, Direito à Saúde, Direito à Educação, Direito à
Moradia, Direito ao trabalho, Direito à assistência Social, Direito à previdência social, Direito
à cultura, ao esporte, ao turismo e ao Lazer, Direito ao Transporte e à mobilidade. Amparados
por esse dispositivo legal e pelo apoio da sociedade, precisamos lutar pela efetivação da
inclusão e, como afirma Aguiar (2018): “[...] em meio a todos os impedimentos temos que
viver todos os dias como se fosse único”.
A Inclusão é, na verdade, um desafio, porém um desafio possível de ser divulgado.
Contudo, necessita de pessoas que queiram buscar e estar abertas às transformações
atitudinais, com melhoras a cada dia. Muitas barreiras já foram ultrapassadas, mas ainda
existem muitas que se tornam obstáculo à inclusão. Em vista disso, as Rodas da LBI- Lei
Brasileira de Inclusão Nº 13.146/julho 2015 (Estatuto da Pessoa com deficiência) vêm
orientar as atitudes de pessoas, para que sejam inclusivas, e proporcionar um ambiente
igualitário a todos, seja em família, amigos, ambientes educacionais, com atividades que
favoreçam a aprendizagem de discentes e pessoas com deficiência. Dentre as leis que
beneficiaram e beneficiam a Inclusão de pessoas com deficiências devem ser citadas:

Quadro 9 - Leis que beneficiam as pessoas com deficiência.


(Continua)
Lei Benefícios
Lei Nº 8.383, de 30 de dezembro de Isenta do imposto sobe operações financeiras -
1991, art. 72. IOF as operações de financiamento para a
aquisição de automóveis de passageiros de
fabricação nacional quando adquiridos por
pessoas com deficiência física, entre outros que
menciona.

Lei Nº 8.687, de 20 de julho de 1993. Isenta do pagamento do imposto sobre a renda


os benefícios auferidos pelos deficientes
mentais.

Lei Nº 8.883, de 08 de junho de 1994. Dispensa licitação para a contratação de


associação de portadores de deficiência, que
não tenha fins lucrativos e de comprovada
idoneidade, por órgãos ou entidades da
Administração Pública, para prestação de
serviços ou fornecimento de mão-de-obra,
desde que o preço contratado seja compatível
com o praticado no mercado.
109

Quadro 9 - Leis que beneficiam as pessoas com deficiência.


(Continua)
Lei Nº 8.899, de 29 de junho de 1994. Concede passe livre às pessoas portadoras de
deficiência no sistema de transporte coletivo
interestadual e isenta de imposto sobre produtos
industrializados - IPI os veículos adquiridos por
pessoas com deficiência.

Lei Nº 9.250, de 26 de dezembro de Permite dedução da base de cálculo do imposto


1995. de renda pessoa física, sem limite de abatimento,
as despesas realizadas com médicos, dentistas,
psicólogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos,
terapeutas ocupacionais e hospitais, bem como as
despesas com exames laboratoriais, serviços
radiológicos, aparelhos ortopédicos e próteses
ortopédicas e dentárias. Isenta da incidência do
referido imposto os rendimentos auferidos pelas
pessoas físicas decorrentes de seguro-
desemprego, auxílio- natalidade, auxílio-funeral
e auxílio-acidente, pagos pela previdência oficial
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios e pelas entidades de previdência
privada. Inclui a fibrose cística (mucoviscidose)
na relação das moléstias que implicam
rendimentos de aposentadoria ou pensão isentos
do imposto de renda pessoa física e define como
dependente, para fins da permissão de
abatimento da base de cálculo do imposto de
renda, a filha, o filho, a enteada ou o enteado, até
vinte e um anos, ou de qualquer idade quando
incapacitado física ou mentalmente para o
trabalho.

Lei Nº 9.533, de 10 de dezembro de Prevê apoio financeiro a municípios que


1997. instituírem programas de renda mínima
associados a ações socioeducativas, tais como
programas de assistência em horário
complementar ao da frequência escolar no ensino
fundamental, para os filhos e dependentes das
famílias beneficiárias, inclusive portadores de
deficiência ou programas de educação especial
para pessoa com deficiência.

Lei Nº 9.656, de 03 de junho de 1998. Proíbe que haja qualquer impedimento em razão
de idade ou de condição de deficiência no que se
refere à participação em planos de seguros
privados de assistência à saúde.
110

Quadro 9 - Leis que beneficiam as pessoas com deficiência.


(Conclusão)
Lei Nº 9.867, de 10 de Prevê a instituição das Cooperativas Sociais, visando a
novembro de 1999. integração social das pessoas em desvantagem no
mercado, nestas incluídas as pessoas com deficiência.
Lei Nº 10.048, de 08 de Dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica.
novembro de 2000 No artigo 4º determina que os logradouros e sanitários
(regulamentada pelo Decreto públicos, bem como os edifícios de uso público, terão
Nº 5.296, de 02 de dezembro normas de construção para efeito de licenciamento das
de 2004). respectivas edificações, baixadas pela autoridade
competente, destinadas a facilitar o acesso e uso desses
locais pelas pessoas portadoras de deficiência. No artigo
5º estabelece que os veículos de transporte coletivo a
serem produzidos após doze meses da publicação desta
lei serão plantados de forma a facilitar o acesso a seu
interior das pessoas com deficiência.
Lei Nº 10.098, de 19 de Estabelece normas gerais e critérios básicos para a
dezembro de 2000 promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência
(regulamentada pelo Decreto ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências.
nº 5.296, de 02 de dezembro Em seu artigo 1º Define seus objetivos de estabelecer
de 2004). normas gerais e critérios básicos para a promoção da
acessibilidade das pessoas com deficiência ou com
mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e
de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário
urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios
de transporte e de comunicação.

Lei Nº 10.182, de 12 de Dispõe sobre a isenção do imposto sobre produtos


fevereiro de 2001, que industrializados - IPI na aquisição de automóveis
restaura a vigência da Lei Nº destinados ao transporte autônomo de passageiros e ao
8.989, de 24 de fevereiro de uso de pessoa com deficiência física, reduz o imposto de
1995. importação para os produtos que especifica.

Lei Nº 10.226, de15 de maio Determina a expedição de instruções sobre a escolha de


de 2001. locais para a votação de mais fácil acesso para o eleitor
com deficiência.

Lei Nº 10.436, de 24 de abril Garante apoio ao uso e difusão da Língua Brasileira de


de 2002. Sinais - Libras, por parte do Poder Público e das
empresas concessionárias de serviços públicos. Garante
atendimento adequado pessoa com deficiência auditiva,
por parte do Poder Público e das empresas
concessionárias de serviços públicos. Inclui a "Libras"
nos cursos de formação de Educação Especial,
Fonoaudiologia e de Magistérios, nos níveis Médio e
Superior das Instituições de Ensino Federais e Estaduais.

Fonte: Elaborado pela autora com base nos dispositivos legais citados. (BRASIL, 1991, 1993, 1994a,
1994b, 1995, 1997, 1998, 1999, 2000a, 2000b, 2001a, 2001b, 2002).
111

Com efeito, muitas são as leis que, a partir da Constituição Federal de 1988,
pretendem promover eficazmente a inclusão das pessoas com deficiência na escola, na família
e na sociedade. Segundo Eugênica Augusta Gonzaga Fávero (2006, p. 165) “[...] bastariam os
dispositivos constitucionais relacionados ao tema para que as pessoas com deficiência fossem
efetivamente incluídas na sociedade.” Contudo, é indispensável a busca constante pelas
políticas públicas no âmbito da educação inclusiva.
Sancionada mais recentemente, a Lei Nº13.146.2015 foi elaborada para uma Educação
Especial no Brasil. Ela trouxe inúmeras transformações que visam o progresso e jamais o
retrocesso. Mas, os debates, as discussões, os planejamentos são necessários não só no que se
refere à Educação, mas com relação a outras questões, como: atendimento prioritário,
habitação e reabilitação, saúde, moradia, trabalho, habitação profissional e reabilitação
profissional, inclusão da pessoa no trabalho, assistência social, cultura, esporte, turismo e
lazer, transporte e mobilidade, acessibilidade, informação à comunicação, tecnologia
assistida, participação na vida pública e política, a justiça, o reconhecimento igual perante a
lei, Ciência e tecnologia. Se faz necessário, portanto, que a divulgação do Estatuto da Pessoa
com Deficiência, com todos esses dispositivos de eficiência e eficácia para a pessoa com
deficiência, seja divulgado.
Hoje, em todos os estados do Brasil, há ações públicas no poder judiciário para que os
direitos de pessoas com deficiência física sejam efetivados, tornando os resultados dessa
política visíveis. A proteção constitucional da dignidade da pessoa com deficiência, está
pautada na dignidade da pessoa humana, com igualdade para todos. Como expõem Botelhos,
esteve e Pinho (2002)

Reafirme-se que ‘o princípio da igualdade se apresenta como igualdade,


perante todos os atos do poder público e não apenas perante a lei’. Consiste
em um ‘princípio estruturante do Estado de Direito Democrático e do
sistema constitucional global’ e implica que ‘as decisões administrativas
sejam tomadas segundo critério objetivos [igualdade objetiva]’, ou seja, ‘se
agiu de uma forma para um terá de agir da mesma forma para outro, se os
elementos de ponderação de ambos são iguais’, obviamente que processado
dentro da legalidade. Por isso, do princípio da igualdade dimana ‘um direito
subjetivo em favor do cidadão e uma obrigação aos poderes públicos’,
sempre nos limites da legalidade.

Transformando em um valor supremo as necessidades das pessoas com deficiência,


que foram ignoradas e rejeitadas por décadas e décadas, os direitos democráticos no Brasil
devem estar presentes para todos, sem distinção e não somente na ordem jurídica, econômica
e social. Nesse sentido, podemos notar o valor supremo das rodas da LBI, que divulgam a
112

Proteção das Pessoas Portadoras de Deficiência no Contexto da CF/1988. No texto


constitucional brasileiro em vigor, o princípio da dignidade humana é tratado, de um lado,
como fundamento (artigo 1º) e, de outro, como princípio fundamental de garantia de direitos
humanos (artigo 5º).
As rodas de estudos da LBI, através da DAIN/ UERN, com a pertinência da Diretora
Ana Lúcia Oliveira Aguiar, têm promovido mudanças em Mossoró RN, nos municípios
vizinhos e no mundo. Por meio de congressos, a DAIN e sua equipe, juntamente com seus
estudantes e parceiros, vêm incansavelmente promovendo a divulgação da inclusão, não
medindo esforços nem obstáculos e sendo os principais atores desse processo.
Decerto, não basta implementar, é preciso dialogar intensamente para construir uma
inclusão de qualidade para todos, garantindo não só o acesso à lei, mas o sucesso e a
permanência da inclusão. Como membro da DAIN, a cada instante aprendo, participando das
atividades desenvolvidas, das explicações e palestras, que têm grande reprodução sociológica
para instaurar uma política afirmativa para todas as classes sociais, em especial para os
estudantes de camada popular.
113

CAPÍTULO 3

Foto 19 - José na UERN

Fonte: Arquivo da autora (Mossoró/RN, 2018).

Com a mesma perspectiva de crescimento o estudante


desenvolve seus estudos entendendo-se como, da
mesma forma, responsável por praticar a superação e
respeito ao engajamento que se faça necessário,
mesmo diante de dificuldades que vivencia no
cotidiano de sua trajetória de vida e da academia.
(AGUIAR, 2018).
114

3 OLHARES SOBRE AS EXPERIÊNCIAS INDIVIDUAIS E COLETIVAS:


NARRATIVAS DE UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL DE
CAMADA POPULAR

Mediante as contribuições das narrativas (auto)biográficas, será narrada, nesta seção, a


história de vida e experiências de um estudante de camada popular com deficiências não
perceptíveis. No decorrer do texto, ele será identificado por José17, nome escolhido em razão
de sua incansável busca para alcançar uma ascensão social através do ensino. No papel de
personagem principal, mostra estar caminhando por uma estrada com muitos espinhos, mas
que vem sendo regada por várias rosas, representadas por pessoas que contribuíram para seu
êxito estudantil. Tais pessoas também ganharão voz neste espaço. Sempre a gritar por ajuda e
a mostrar sua capacidade de querer fazer, querer ser, querer saber e querer continuar, José
revela uma força capaz de superar todos os obstáculos para galgar um espaço no meio
educacional.
Os olhares sobre as experiências individuais e coletivas: narrativas de aluno com
deficiência não perceptível de camada social têm como meta identificar como José
conseguiu ascender socialmente e profissionalmente pelos estudos. Será detalhado, neste
terceiro capítulo, o percurso por ele traçado, desde a educação básica à universidade,
principalmente suas conquistas, quem o incentivou ao estudo e sua trajetória em busca da
formação continuada para alcançar seus objetivos e amadurecimento acadêmico, bem como
para buscar a efetivação dos seus direitos, cumprindo com os seus deveres.
Para essa discussão, o fundamento teórico será o estudo de Josso (2010). A autora
admite que o sujeito, ao narrar a sua própria vida, vive o papel principal. Explica ainda que ao
compor suas narrativas, através da sua história, o sujeito aborda, de forma simples, direta e
profunda, suas lembranças e experiências de vida. Desse modo, tem a oportunidade de revelar
sobre sua vida e seus afazeres. Esse é, pois, um exercício transformador para sua vida.
Ao mesmo tempo, será tratado o conceito de deficiência não perceptível18, com a
apresentação de algumas deficiências não perceptíveis, como também os preconceitos
sofridos, perceptíveis nos olhares direcionados aos sujeitos que as possuem. A capacidade de
integração do aluno em meio à sociedade é mais um ponto a ser discutido neste tópico, assim
como os cuidados fundamentais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN)
Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas para a inclusão desse aluno, por meio da

17
Nome de nascimento do entrevistado.
18
São aquelas que não podem ser notadas. Disponível em: http:/www.nossacausa.com/deficiências-não-visiveis.
115

acessibilidade humana e do amparo a todas as suas necessidades. Essa é, na verdade, uma


importante contribuição de afeto e amor a favor do comprometimento da permanência desses
discentes na instituição e da continuidade de seu aprendizado, de modo que, mesmo sendo de
camada popular, possam alcançar a ascensão social através dos estudos.

3.1 EU NÃO SOU DEFICIENTE, SOU PESSOA COM DEFICIÊNCIA: O QUE É


DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL?

José foi escolhido pela sua história de vida, persistência e vontade de seguir em frente,
sem olhar para traz. Representa um aluno com deficiência múltipla que lutou e luta para
conquistar seu espaço em uma sociedade ainda muito preconceituosa quando se trata de
deficiência não perceptível.
Sempre em busca da ascensão social através dos estudos, ele tem procurado superar os
olhares estigmatizantes. Ele assim se descreve:

Eu sou uma pessoa normal, para chegar aonde cheguei, passei por muitos
preconceitos, as pessoas nem sempre acreditam que eu posso chegar aonde
cheguei, algumas pessoas não acreditava em mim. Mais ainda a pessoas que
me ajudam uma prima e dois primos. Esses meus dois primos eles venceram
através dos estudos, alcançando a ascensão social. Um é advogado bem
sucedido outro já foi reitor de uma Universidade. Chegaram a Mossoró sem
nada. São exemplos para mim. (Narrativas deJosé, Mossoró, 2018).

Com deficiência múltipla não perceptível, José faz parte da população mundial que
convive com algum tipo de deficiência, seja ela física, visual, auditiva, intelectual, etc. Ele e
tantos outros têm batalhado por um lugar numa sociedade que enxerga como pessoa com
deficiência apenas os cadeirantes, amputados, isto é, a pessoa com deficiência perceptível.
Essa postura revela, na verdade, o desconhecimento das pessoas sobre a existência de
deficiências imperceptíveis, registradas no censo do IBGE de 2010. Segundo os dados da
referida pesquisa realizada pelo instituto, 23,9% da população possui alguma deficiência,
umas com deficiências perceptíveis, outras com deficiências imperceptíveis (IBGE, 2010).
Em pesquisa mais recente19, realizada no ano de 2013, que dá continuidade à
divulgação dos resultados da Pesquisa Nacional de Saúde, em convênio com o Ministério da
Saúde, o IBGE revelou novos Indicadores de Saúde e Mercado de Trabalho. O instituto
divulgou um plano tabular, agrupado por temas, com informações do Brasil e suas grandes

19
Pesquisa disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pns. Acesso em: 25 nov. 2018.
116

regiões sobre os indicadores e respectivos intervalos de confiança, como também os valores


absolutos e os coeficientes de variação das estimativas. Segundo o IBGE (2013, online):

Com a disponibilização de mais essa base de dados, o Ministério da


Saúde e o IBGE ampliam consideravelmente o conhecimento sobre as
características de saúde da população brasileira, oferecendo às
instâncias executivas e legislativas, aos profissionais e pesquisadores,
aos Conselhos de Saúde e aos demais agentes interessados no tema
um amplo conjunto de informações necessárias à formulação,
acompanhamento e avaliação das políticas relacionadas a esse
importante setor.

Importante se faz destacar que a Constituição Federal de 1988 já amparava as pessoas


com deficiência, por meio do seu art. 24, que diz: “Compete à União, aos Estados e ao
Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (...) XIV - proteção e integração social das
pessoas portadoras de deficiência.” (BRASIL, 1988). A partir daí surgiram vários conceitos
do que é uma pessoa com deficiência.
A Organização das Nações Unidas (ONU, 2006) também conceitua a pessoa com
deficiência, admitindo que são aquelas que tem impedimento de natureza física, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e
efetiva do sujeito na sociedade, com as demais pessoas, em igualdade de condições.
Após quinze anos de tramitação, a Lei Brasileira de Inclusão ou Estatuto da Pessoa
com Deficiência - Lei 13.146, de 06 de julho de 2015 - Promulgada em 06 de julho de 2015, a
Lei 13.146/2015 instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da
Pessoa com Deficiência), procurando adaptar o Ordenamento Jurídico Brasileiro as
disposições contidas na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de Nova
York de 2007. Após o decurso da vacacio legis de 180 dias, a Lei 13.146/2015 passou a viger
no Brasil. (LBI- Comentada). Conforme seu art. 2º (BRASIL, 2015):

Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo


prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade com as demais pessoas em igualdade de condições.

O aluno com deficiência não perceptível sofre o preconceito ainda maior quando as
pessoas não conseguem enxergar suas necessidades. De fato, é difícil a compreensão, o
entendimento e conhecimento de que nem tudo o que olhamos é o que temos que ver. Alguns
117

julgam pessoa com deficientes não perceptíveis como se estivessem mentindo todo o tempo.
São seguidas pelos olhares desconfiados.
Geralmente, as pessoas com deficiências possuem dificuldades visíveis, ou seja,
fáceis de serem identificadas, pode ser um membro amputado ou mais curto, a cegueira, sendo
necessário o auxílio de uma bengala, entre outros problemas que contam com o bom senso e a
boa vontade da sociedade e, muitas vezes, dos órgãos protetores para identificarem e
ajudarem a melhorar a qualidade de vida e a efetivar os direitos dessas pessoas.
Existem, entretanto, pessoas com deficiências menos ou não conhecidas e também
aquelas com deficiência não perceptível, mas com os mesmos direitos de qualquer pessoa
com deficiência perceptível. Isso não as tornam nem mais nem menos importantes, e elas
também requerem adequações fundamentais para melhor realizarem as suas atividades diárias.
Muitas possuem patologias crônicas e degenerativas que causam dores e desconforto,
tornando-se insuportáveis algumas atividades. Portanto, não podemos nem devemos qualificar
e quantificar as pessoas com deficiência apenas pelo olhar clínico ou crítico.

Foto 20 - Símbolo da deficiência não perceptível

Fonte: Portal Agência Nossa Causa (2018)20.

As pessoas com deficiência não perceptível são aquelas que possuem uma deficiência
diferente, cujo estado de avaliação e transtorno não pode ser notado nem diagnosticado
apenas pelo olhar. Algumas deficiências não perceptíveis acarretam transtornos e requerem
cuidados especiais como quaisquer outras deficiências perceptíveis, cada uma dentro das suas
especificidades. A seguir, são descritas as principais deficiências registradas na literatura
específica sobre o tema e sobre o sujeito da pesquisa.

20
Disponível em: http://nossacausa.com/deficiencias-nao-visiveis. Acesso em: 25 jun. 2018.
118

Deficiência Visual – De acordo com a Fundação Dorina21 ([s/d], online), “[...] essa
deficiência é definida como a perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da visão. O nível
de acuidade visual pode variar, o que determina dois grupos de deficiência”:

Cegueira – há perda total da visão ou pouquíssima capacidade de enxergar, o


que leva a pessoa a necessitar do Sistema Braille como meio de leitura e
escrita.
Baixa visão ou visão subnormal – caracteriza-se pelo comprometimento do
funcionamento visual dos olhos, mesmo após tratamento ou correção. As
pessoas com baixa visão podem ler textos impressos ampliados ou com uso
de recursos óticos especiais.

Deficiência Intelectual - A deficiência intelectual é caracterizada pelo funcionamento


cognitivo que não corresponde à média esperada, ou seja, que esteja abaixo do que é
considerado normal. A dúvida de pais e mães se deve aos campos que podem ser direta ou
indiretamente afetados pelo desempenho cerebral da criança, por exemplo. (NEURO-SABER,
2017).

A questão em si não deve se pautar pela suposição, mas pela certeza de um


diagnóstico que seja certificado por um profissional de saúde. Por se tratar
de uma limitação que atinge determinadas habilidades da pessoa, é sempre
bom lembrar que os casos devem ser analisados de forma isolada pelas
peculiaridades que cada paciente tem. (NEURO-SABER, 2017).

Ouvir as narrativas de José, sujeito desta pesquisa e com deficiência não perceptível,
permitiu-me conhecer mais de perto sua peleja pela superação e transformação aplicadas à sua
autoestima e ao reconhecimento de suas limitações visual e intelectual. Sempre atualizado e a
buscar informação, ele me contou sobre o seu percurso formativo, desde a educação básica ao
ensino superior. Revelou-me ainda os processos de adequações e amparos da equipe
multidisciplinar da instituição de Ensino Superior em que cursa o 7º período de
Administração de Empresa, a Universidade Estadual do Rio Grande do Norte.
A equipe denominada DAIN Diretoria de políticas e Ações Inclusivas não mede
esforços para ajudar no que se faz necessário. É composta pelo Setor Administrativo, que
conta com a Diretora, a Secretária Geral, Auxiliares de Secretaria; e pelo Setor de

21
A Fundação Dorina Nowill para cegos é uma organização sem fins lucrativos
e de caráter filantrópico que, há mais de 70 anos, tem se dedicado à inclusão social de pessoas com deficiência
visual. A fundação leva o nome de sua idealizadora, Dorina Gouveia Nowill, que mais do que uma fundação,
deixou a oportunidade de viver com dignidade à pessoa com deficiência visual e, às pessoas que enxergam, uma
lição de vida. Disponível em: https://www.fundacaodorina.org.br/a-fundacao/quem-somos/. Acesso em: 22 jun.
2018.
119

Atendimento Especializado, formado por Técnicos de Apoio à Deficiência Visual e Ledores,


Técnicos de Apoio à Deficiência Auditiva e Surdez, Instrutora de LIBRAS,
Tradutores/Intérpretes de LIBRAS; Setor de Suporte Pedagógico, com o apoio de uma
Pedagoga e de uma Psicopedagoga; pelo Setor de Serviço Social, composto por uma
Assistente Social; e pelo Setor de Psicologia, amparado por duas Psicólogas.
A diretora da DAIN, a quem José chama de mãe, é uma orientadora dele, tanto na
Universidade quanto é orientadora dele no PIBIC, que tem como título do projeto: Ascensão
Social de estudantes com deficiências: da Educação Básica até a Universidade – Parte II, ele
que cumpre a sua função com zelo, determinação e de forma contínua, sem o proteger em
excesso, e sim nos limites da sua deficiência.
O desejo de superação esteve presente em todas as nossas caminhadas juntos. Seus
relatos são de resiliência, possuindo, em cada área, um significado próprio, adaptado ao
estudo que dele se faz. José sempre agiu, direcionou sua vida para ter um desempenho acima
da média, indo sempre além das expectativas. Sempre motivado, a superação está de mãos
dadas com as ações que desenvolve no seu dia a dia.
Com determinação e vontade, ele tem resistido para mostrar ao mundo que não é um
deficiente e sim uma pessoa com deficiência. Sua limitação não o impede de prosseguir e de
ter uma vida igual a todos em busca de um êxito. Tem plena convicção que só pode alcançar
uma ascensão social através do estudo, portanto, não tem medido esforços para alcançar os
seus objetivos. Já pensa em ser professor e em, logo que terminar sua graduação, fazer uma
especialização e mestrado. Trabalhando na adversidade, com resultados surpreendentes, sente
a necessidade de enfatizar a importância da inclusão em suas falas. Uma das oportunidades
que teve de se pronunciar sobre essa questão ocorreu em um Congresso de Direito realizado
na UERN, em setembro de 2018.

Quando estou construindo um artigo minha orientadora acredita em mim, os


artigos são escritos por nós dois. Ela é muito zelosa e me orienta a fazer as
alterações de acordo com o que achamos melhor , porque ela sabe o que faz.
Igual a ela não existe. Faço, Mando para ela através de e-mail e ela volta
com os balões. As vezes volta muitas vezes. Mas eu sei que é para o meu
bem. Com ela eu vou chegar longe até o mestrado. Quero ser professor.
Enquanto Professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar estiver aqui eu tenho
esperança que alcançarei a ascensão através do estudo. O orientador é tudo.
(Narrativas de José, Mossoró, 2018).

Sempre com a representação do eu na vida cotidiana, José sonha com uma leitura de
mundo com um olhar diferente, com respeito e saberes, desconstruindo a ideia de que a
120

pessoa com deficiência não é capaz. Muitas vezes, o preconceito que muitas pessoas possuem
as fazem não acreditar naqueles que lutam incansavelmente para a quebra de muitos
paradigmas sobre a deficiência. Assim, são vetadas as possibilidades do empoderamento e
autonomia para que seja observado o quanto a pessoa com deficiência é capaz.
A luta que vem sendo desbravada pelas pessoas com deficiência não tem sido
invalidada. Vivemos vários períodos até chegar à inclusão. O preço pago por muitas pessoas
com deficiência foi alto, mas não inútil. Somente depois da persistência foi conquistada a
vitória e não tem sido diferente desde a Constituição Federal, resoluções, decretos e leis
medindo forças para se alcançar a inclusão.

Foto 21 - José desenvolvendo atividade no CREE- MOS

Fonte: Arquivo do CREE-MOS (Mossoró/RN, 2010).

Conforme informações disponibilizadas pelo IBGE, no ano de 2013, mais acima, a


cada dia tem crescido o número de pessoas com deficiências, sendo necessário descobrir
novos caminhos para que a pessoa com deficiência consiga chegar à sala de aula, a qual deve
possuir adequações que lhes possibilitem as novas conquistas e superações.
Hoje, a legislação que ampara a pessoa com deficiência é a Lei nº 13.146/2015, Lei
Brasileira da Pessoa com deficiência — LBI. Ela destaca as possibilidades de amparo e ajuda a
todos que desejam alcançar uma educação de qualidade. Logo, é necessário que o rótulo de
coitadinho dado para a pessoa com deficiência seja quebrado e que lhes sejam garantidos seus
direitos, para que possam cumprir seus deveres como cidadãos.
Acreditar na capacidade de todos e proporcionar meios para exercermos o direito do ir
e vir é algo a ser implantado dentro de cada um de nós. Isso ajudará a tornar as pessoas com
121

deficiência emancipadas, libertas de preconceitos sobre o seu potencial. É necessária a


consciência de que as incapacidades podem ser superadas e nunca taxarmos as pessoas com
deficiências absolutamente incapazes. Desde 2015, o Código Civil Brasileiro, em seu artigo
3º, sofreu a alteração, ressaltando que as pessoas com deficiências não mais seriam
absolutamente incapazes. Limitações todos nós temos.
Em tempos de busca pela igualdade de direitos, se faz necessário esquecer os tempos
passados e se voltar às novas metas para a inclusão. Estabelecer e criar formas de
independência e emancipação permitirá um crescimento em potencialidade dos estudantes
com deficiência. A origem da raça humana prova que somos diferentes. A diversidade
manifesta-se na própria fragilidade do ser humano, e o fato de uma pessoa ter limitação para o
desempenho de algumas atividades não prova sua incapacidade física, sensorial e cognitiva.
Portanto, não se deve aceitar a exclusão nem a segregação, ambas manifestações do
preconceito, da discriminação e da desvalorização das pessoas com deficiência.
É preciso compreender e seguir em frente, emancipando alguns pensamentos e
verdades absolutas. Devemos procurar ver a pessoa com deficiência com um outro olhar, com
potencialidades, capacidades e muita vontade de participar, sendo autores de uma nova
história, de um olhar visionário de quebra de paradigmas sobre o que é ser pessoa com
deficiência e deficiência não perceptível. É necessário buscar meios para uma educação
inclusiva, contribuindo para a construção de políticas públicas efetivas e afirmativas, cujas
propostas contribuam para que as pessoas com deficiência consigam alcançar, através dos
estudos, a ascensão social. A pessoa com deficiência não perceptível de camada popular
passa a vida provando que não é a deficiência e sim as barreiras atitudinais que permitem um
comportamento de pessoas com olhares discriminatórios e constantemente vexatórios, por não
ser algo visível.

Muitas pessoas que não me conhece não sabe que eu tenho minhas
limitações, minhas dificuldades e acreditam em mim. Outras que me
conhece pensa que eu jamais chegaria onde cheguei, minhas limitações não
me impedem de querer a cada dia buscar os meus objetivos. Mesmo com
uma sociedade preconceituosa eu não desanimo, sigo em frente e sei que vou
conseguir. Mas já está bem melhor, com a Diretoria de Políticas e Ações
Inclusivas, tenho visto um grande avanço. A cada semestre vem me
ajudando. (Narrativas de José, Mossoró, 2018).

A capacidade não deve ser medida pela deficiência e sim pela potencialidade e
oportunidades que são dadas por meio de políticas públicas efetivadas pelos órgãos sociais,
educacionais e governamentais. O olhar deve ser de grande aprendizado e oportuno para
122

incluir o aluno de modo que tenha acessibilidade humana, com a contribuição de amor, afeto e
busca conciliação dos direitos e garantias em toda a trajetória percorrida por este aluno. Com
igualdade, dando a ele superação em meios aos obstáculos vividos.

3.2 FAMÍLIA, ESCOLA E RELAÇÕES SOCIAIS: DESAFIOS E SUPERAÇÕES DO


ALUNO COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL

Mediante muitas batalhas, José ergueu-se como um gigante, cheio de vontade de


desbravar um mundo. Nasceu em uma família de camada popular. Cedo perdeu o pai e, com o
falecimento de sua mãe, em 2008, começou a enfrentar situações ainda piores.
Em nossas conversas, senti que, muitas vezes, José selecionava as memórias,
silenciando aquilo que, talvez, trouxesse sofrimento a sua alma. Nem falava, e quando eu lhe
perguntava algo, dizia: “sobre isso não quero falar”. Sinto que sua memória só se faz presente
nas suas narrativas a partir do momento em que ele resolveu entrar para Universidade.
Conforme Pollak (1992) e Halbwachs (1990), há dois tipos de memória, a individual e a
coletiva. A primeira admite que a memória pode ser seletiva, pois nem tudo fica gravado, nem
tudo fica registrado.
Nesse caso, a memória é, em parte, herdada, não se refere apenas à vida física da
pessoa. Corroboro com o autor ao lembrar do processo de escuta de José. Ele parava e
pensava, como se selecionasse o que deveria me contar ou mesmo o que ficou registrado. É
bem verdade que ainda há muito a saber sobre sua vida. Como todos nós, ele possui o silêncio
da memória que não quer trazer a fala e a mente para não se magoar.
Dos parentes o entrevistado falou muito pouco, apenas citou um primo e uma prima.
Conta que tem como exemplo de vida esse seu primo, que chegou à sua cidade somente com
uma muda de roupa, porém se dedicou aos estudos e chegou ao cargo de Reitor de
Universidade. Seu primo sempre lhe fala: “Quer vencer na vida estude, estude e você
conseguirá a ascensão social.” Esse é um bom exemplo de que, mesmo sendo de camada
popular, é possível alguém alcançar a ascensão através do estudo.
José começou sua vida escolar na Escola Estadual Jardim de Infância Modelo, não
gostava muito de ir à escola. A diversidade não se fazia presente quando criança. Não tinha
muitos amigos e os que tinham não implicavam com ele. Nessa fase, já tinha muita
dificuldade no aprendizado, mas ninguém, nem mesmo José, percebia. Hoje, a escola foi
desativada e José não tem nenhuma foto dessa época, nem muitas lembranças em sua
memória.
123

Foto 22 - Escola Estadual Jardim de Infância Modelo – Educação Infantil

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2018).

José repetiu de série várias vezes e não lembra os anos em que estudou em cada
escola. Seu ensino fundamental foi na Escola Municipal Joaquim da Silveira Borges,
atualmente Escola de Arte.

Foto 23 - Escola de Arte – Ensino Fundamental

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2018).


124

Do 1º ao 9º ano foram as séries mais difíceis, porque repetia quase todos os anos. As
professoras não se importavam com José, mas seus amigos eram bons. Com tantas
dificuldades e sem apoio pedagógico, didático, nosso sujeito encontrava muitas barreiras
atitudinais, por isso não sentia vontade de ir à escola.
O reencontro com a Escola Municipal Joaquim da Silveira Borges permitiu a José
olhar para a instituição com um olhar que talvez nunca tenha tido. Enxergou que o local fez
parte de sua vida e não hesitou em falar: “eu estudei aqui, mas não era assim não. Hoje essa
escola é Escola da Arte.”
Também visitamos a Escola Estadual Jeronimo Rosado, onde José cursou o ensino
médio. Nessa época, buscou sozinho o estudo e começou a ver que tinha que fazer algo para
si. Queria vencer na vida e empoderar-se, tornando-se capaz de romper os obstáculos e chegar
à universidade. Começou, então, a sonhar e a colocar em prática seus projetos.

Foto 24 - Escola Jerônimo Rosado – Ensino Médio

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2018).

Com dificuldades financeiras e muita determinação, prosseguia em uma busca


incansável para vencer. Sua única arma era sua própria força. Resolveu, então, seguir em
frente. O jovem, sozinho, sem apoio de ninguém, começou a desbravar seus sonhos, adotando
uma postura de compromisso, reconstruindo sua identidade e seus espaços, enquanto buscava
alternativas para chegar à universidade tão sonhada.
125

As vivências solitárias de José lhe deram força para a caminhada e para, a cada
instante, escrever sua história. Ao terminar seu ensino médio, começou, então, a despertar
para prestar o exame vestibular e para a conquista de emprego, mas, com o passar do tempo,
não conseguiu bom desempenho nos estudos.
Preocupado com sua dificuldade de aprendizado, o jovem procurou um médico para
tirar suas dúvidas. Pela dificuldade de aprendizado, não conseguiu fazer o exame, porque o
médico deixou de atender. Ficou muito triste com a informação dada pelo SUS (Sistema
Único de Saúde) em Mossoró e, decepcionado, ao pedirem para ir para Natal. Sem condição
financeira, resolveu procurar, em fevereiro, a prática jurídica local, para conseguir realizar os
exames pelos meios judiciais.

Ao chegar à prática jurídica, o rapaz, ao me receber, pediu o atestado de


pobreza (termo usado no passado), endereço residencial, grau de
escolaridade, e documentos dos órgãos públicos. Procurei um médico, que é
meu amigo, contei tudo para ele o que havia acontecido. Ele falou que eu
tinha que fazer um exame para saber se eu tinha algum problema de
dificuldade de aprendizado. Fiz os exames pelo SUS, em Mossoró, porque a
justiça mandou. Demorou. Levou uns seis meses para eu fazer os testes com
o neuropsicólogo. Fiz seis testes e os mesmos demostraram que eu tinha
pouca deficiência. O resultado saiu e o médico me mandou procurar outros
profissionais como: terapeuta educacional, psicopedagogo, e um psicólogo e
para tratar meu problema. (Narrativas de José, Mossoró/RN, julho 2018).

Durante toda essa trajetória de luta, mesmo com as discriminações e preconceitos


vividos a cada dia, no ano de 2011, prestou vestibular pela primeira vez em uma instituição de
ensino particular, em Mossoró, onde desejava estudar, mas não obteve aprovação. Em 2013,
não quis mais tentar o vestibular. Desistiu porque achou que não seria aprovado nunca. Essa
faculdade, na verdade, não estava preparada para receber uma pessoa como José, um
batalhador, persistente, guerreiro, aquele que não desiste. Ficou profundamente desestimulado
com a atitude daquela Faculdade que sonhava que iria prepará-lo para uma ascensão social
através dos estudos. Assim ele narrou essa experiência:

Quando falei que tinha necessidade especial, não queriam deixar eu entrar.
Não me davam atenção. E diziam que não tinha como fazer adequações só
para mim. No vestibular de 2013, vi minha necessidade em solicitar uma
sala especial, e um fiscal e uma banca de avaliação especial, mesmo assim
não consegui ser aprovado, os critérios foram os mesmos utilizados
anteriormente. Com muita tristeza, desisti dessa instituição. (Narrativas de
José. Mossoró/RN, julho de 2018)
126

Diante desse relato, é mister um olhar apurado para as adequações necessárias a cada
tipo de deficiência, a fim de possibilitar aprendizagens e a permanência de todos dentro do
estabelecimento de Ensino. Graças a esse olhar por parte da DAIN, o sonho de cursar a
faculdade começou aquecer o coração de José. Nesse mesmo período, arrumou um emprego
como corretor de imóveis por dois anos, mas teve que dar uma pausa para estudar. Diante das
dificuldades para estudar, apontadas por José em suas narrativas, deve ser ressaltado o apoio
recebido por alguns professores. Assim disse: “Tinha ajuda de alguns professores que se
dedicavam muito e davam uma atenção especial”.
Como Mantoan (2006, p.7) alerta, “[...] esses ambientes educativos desafiam as
possibilidades de aprendizagem de todos os alunos e as estratégias de trabalho pedagógico são
adequadas às habilidades e necessidades de todos.” Sim, é necessário que as instituições de
ensino, seja em nível básico ou superior, estejam aptas a atender as necessidades de todos os
alunos, oferecendo-lhes condições adequadas de aprendizado.
A faculdade, para José, era, novamente, o sonho de todos os dias. Sua rotina era
intensa. Acordava cedo, cuidava de sua higiene pessoal e alimentação e partia em busca do
seu sonho. Estudava no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), mas também
frequentava o Centro Regional de Educação Especial (CREE-MOS) e muitos outros lugares.
Na tentativa de compreensão do caminho percorrido e do seu cotidiano escolar, com as
suas dificuldades e possibilidades, José lembrou-se de Rosa22, uma de suas professoras nos
seus primeiros anos no ensino fundamental e, depois, no médio. A educadora lhe serviu como
uma âncora, quando, apesar de todas as decepções, resolveu mudar suas ideias e prosseguir
com a certeza de que sem estudo não ia conseguir chegar onde queria.
Sobre o estudante José, a professora Rosa proferiu as seguintes palavras:

José, eu conheço desde pequeno, ele é um vencedor, um batalhador que


nunca desistiu dos sonhos dele, que era cursar uma faculdade. Na realidade,
ele chegou à faculdade a duras penas. A primeira faculdade ofereceu uma
bolsa para ele, mas não teve um olhar sensível à inclusão. Ele fez quatro
vestibulares nessa instituição. Um eu fui para analisar a prova, e percebi que
a análise foi feita por uma pessoa que não tinha nenhum conhecimento sobre
inclusão, não tinha menor conhecimento sobre deficiência, era uma Doutora
em Letras, mas não conhecia sobre incluir. Ela me falou que não tinha
semântica e nem argumentação. Eu falei para ele não adianta você entrar
nessa instituição, porque eles não sabem incluir. Você vai entrar e sair. Você
tem que ir para um lugar que tenha inclusão, vai para UERN, você vai ter a
oportunidade de crescer. Graças a Deus que um dia ele foi. José é uma
pessoa que vai buscar o crescimento para superar as dificuldades que ele
tem. (Narrativa da Professora Rosa. Mossoró/RN, setembro 2018).

22
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
127

A professora Rosa mostrou a José o caminho para ascensão social através do estudo,
dando-lhe a oportunidade de prosseguir, galgando seu espaço e o encorajando através dos
aprendizados que ela mesma estava tendo através do ensino a ele direcionado. Pelo caminho
da superação e da perseverança, José cursou o ensino básico e médio até chegar à UERN. Em
seu percurso foi acompanhado e assistido por vários profissionais, alguns presentes em sua
memória até hoje. Outros não se fizeram notar, devido à falta de conhecimento de uma
educação continuada voltada para a inclusão. Estes deixaram de ser contemplados com a
oportunidade de fazer parte da luta em favor da igualdade de direitos aos que almejam
estudar, mas que possuem alguma limitação.
Com efeito, ainda é preciso um grande exercício reflexivo da sociedade para se obter
um olhar inclusivo. Por essa perspectiva: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as
possibilidades para a sua própria construção” (FREIRE, 2010, p.47). Essa é uma das frases de
Paulo Freire, entre tantas outras, que utiliza para apregoar uma educação para todos.
Precisamos não só escrever ou ler essa frase, mas colocá-la em prática para oportunizar aos
alunos com deficiência experiências exitosas no seu percurso educacional.
Foi por uma iniciativa inclusiva de alguns profissionais e instituições, mesmo que
embrionária, bem como pela sua persistência e propósito, que José superou obstáculos e
conquistou o êxito em seus estudos. Após identificar sua dificuldade de aprendizado,
começou a buscar recursos para realizar o sonho de entrar na Universidade, pessoas que
poderiam contribuir de alguma forma para o seu crescimento educacional. Com planejamento
e organização vislumbrou que se fazia necessário disponibilizar mais tempo para trabalhar
suas dificuldades no Português, principalmente a escrita e interpretação e organização de
textos. Procurou, então, um professor de Redação, o qual o ajudou incansavelmente para que
pudesse fazer a redação do tão sonhado vestibular.
Hoje, José é muito grato ao professor Salvador23 pela atenção e carinho. Alguém que,
pela primeira vez, teve sensibilidade e um olhar inclusivo na vida de José. Com essas aulas
particulares, juntamente, é claro, com todos os atendimentos do CREE-MOS, ele cresceu em
aprendizados. Tornou-se dono de uma força e determinação inquestionáveis. Sua ascensão
social através dos estudos era ele mesmo quem buscava, por meio de um processo de
transformação do sujeito, do seu pensar, aprender, fazer e buscar.
Ao partir em busca de uma educação continuada, de um professor particular para
atender seus anseios em aprender, de conhecimentos, ao não desistir, José tornou-se exemplo

23
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade do entrevistado.
128

a ser seguido por todos. Não esperou que alguém fosse até ele. Mesmo possuindo deficiência
múltipla e sendo de camada popular, mesmo sem apoio da família está sempre a superar
barreiras para alcançar seu êxito. A esperança que possui o mantem alegre e muda seus
sofrimentos em coragem, amor, além de lhe proporcionar as expectativas da busca de ser
feliz.
A vida de José é como uma câmera, tem foco no que almeja para o futuro. O que lhe
importa são os estudos e a busca por boas experiências através dos seus estudos. As coisas
negativas, as trata como as fotos queimadas, que, há um tempo não podiam ser vistas, por isso
não tínhamos como sentir sua falta. Para o estudante, as circunstâncias melhores são aquelas
que ficam na memória e as coisas que não fazem sentido não se prende. Não tem medo de
trocar o roteiro e desvendar vários horizontes.
Sua mente só tem pensamentos para o futuro, o passado ficou para traz. Não há quem
possa cortar as suas asas, pois sua mente voa para a aprendizagem. Escolheu estudar e ir ao
encontro da sua ascensão social através dos estudos. Os tropeços o ajudam a crescer a cada
dia e com maturidade vai descobrindo a sua autonomia e seu empoderamento.

Eu preciso de um professor que saiba passar conhecimentos. O Professor


tem que saber não só ensinar, mas, aceitar as pessoas. Tudo que já passei me
ajudou a chegar até aqui, eu cresci com as coisas ruins que me aconteceram.
Repeti várias vezes e isso me ajudou a estudar mais. As piores barreiras que
já enfrentei foram as atitudinais. As pessoas não querem ver o bem das
outras. Tantas discriminações me fez as vezes nem ver. (Narrativas de José,
Mossoró, 2018).

Para entender um pouco mais o papel do Professor Salvador, que, coincidentemente,


ajudou José com suas dificuldades com o Português, buscamos conversar com o próprio
professor. Nosso encontro aconteceu na UERN, o que despertou no entrevistado um
sentimento de satisfação em saber que ajudou na continuação de um processo educacional
para um melhor aprendizado de José.
Em nosso momento juntos, o professor Salvador narrou as seguintes palavras sobre
seu ex-aluno José:

Quando José chegou em minha casa, me falou que tinha muita dificuldade
em redação e que precisava passar no Enem. Eu disse que ia ver a
possibilidade. A primeira coisa que fiz foi ir no local onde ele era atendido,
no CREE-MOS, para buscar informações. Lá me informei do que precisava
e resolvi dar aulas de redação para ele. A necessidade dele me deu motivos
para ajudá-lo. Ele é uma pessoa esforçada, um exemplo bonito para todos
nós. O esforço, a luta é tudo que nós precisamos nesse Brasil. Nunca se dar
por vencido, sempre indo à luta. São esses tipos de pessoas que são
129

essenciais para nós. Esse rapaz é um exemplo para ser mostrado aos nossos
filhos. Ele nunca desistiu de lutar. Não vê obstáculos que ele não possa
transpor. Que coisa bonita! Isso enche a alma da gente de orgulho, saber que
existe pessoa assim e que temos a esperança de que o mundo tem jeito. Fui
buscar um método de ensino para ele. Ele teria que praticar parágrafo por
parágrafo, sem repetir a frase. Nós não podemos ver apenas um pedaço das
pessoas, temos que ver um todo. (Narrativa do professor Salvador,
Mossoró/RN, setembro de 2018).

A ação do professor Salvador nos remete ao método freiriano de educação, quando as


finalidades, os conteúdos, as ações estão articuladas para possibilitar os meios de
ensinamentos e, com isso, libertar os sujeitos. O professor contribuiu na orientação da redação
de José, facilitando-lhe a construção de um novo horizonte de possibilidades e emancipação
humana e lhe instigando a buscar sua graduação e alcançar a ascensão social através desse
estudo.
Chegou o momento de ressaltar como aconteceu o ingresso do nosso personagem na
Universidade, isto é, a concretização de seu sonho, momento marcante na sua vida e bem
arquivado em sua memória. Sobre a memória, onde são guardadas as nossas lembranças e
recordações, Halbwachs (1990) defende a ideia de que a memória é, ao mesmo tempo,
coletiva e individual. Isso implica dizer que na passagem de toda memória há uma vida,
momentos de experiências, pessoas significativas, lugares, tempos, cheiros, sabores, cores,
momentos marcantes, dolorosos, edificantes. Todas as lembranças fazem parte da memória,
dando à nossa identidade uma orientação.
Por meio das narrativas de José, é possível perceber que guarda em sua memória
coletiva os momentos vividos com amigos. Por ser uma pessoa amável para todos, é difícil
também esquecê-lo. Quanto à memória individual, escolheu falar somente do período de sua
vida em que começou a despertar para a faculdade, quando, para sua alegria, foi aprovado na
UERN para o curso de Administração de Empresas.

Na infância eu tinha alguns amigos, eu brincava na rua com as crianças, eles


não riam de mim não. Quando cheguei na Universidade senti um
pouco de medo, mas arrumei muitos amigos, hoje quase todos me
tratam bem. Tenho amigos de todos os cursos, tenho uma amiga do
curso de Direito que converso muito com ela, ela é muito legal. Vou
mostrar para todas as pessoas que não acreditam em mim que vou
chegar a ter ascensão social através dos estudos. (Narrativas de José,
Mossoró, 2018).

José ingressou na universidade no ano de 2014, após ter prestado o vestibular através
do sistema de cotas para pessoas com deficiências. Durante a realização das avaliações, com
130

uma hora a mais e em sala especial, contou com ajuda de uma ledora e de um transcritor24.
Uma vez aprovado, passou pela Junta Multiprofissional25, prevista no regulamento dos cursos
de graduação e útil para analisar a situação de alunos com deficiência, para saber se estão
enquadrados na lei de cotas durante a seleção de graduandos, e para os alunos regulares que
precisam ampliar o prazo de conclusão de curso por necessidade educacional especial.
Também são analisados pela junta os pedidos de prorrogação do regime domiciliar para
alunos doentes e alunas com licença maternidade. A Junta Multiprofissional faz a perícia do aluno
uma equipe com médicos de várias áreas, pedagogos e assistente social, psicólogo e a Diretora da
DAIN a Profª Drª Ana Lúcia Oliveira Aguiar, competentes para avaliar o aluno com deficiência
nas suas especificidades dando o parecer deferido ou indeferido. A primeira portaria da Junta
Multiprofissional foi expedida nº 128/2014 - GR/UERN em cumprimento aos arts. 74, § 1º e 152
do Regulamento dos Cursos de Graduação da UERN e foi aprovada recentemente pelo Conselho
Superior de Ensino Pesquisa e Extensão da UERN - CONSEPE. (UERN, 2018).
O aluno para passar por essa Junta Multiprofissional tem que solicitar. Ao passar por
essa equipe José foi diagnosticado como pessoa com deficiência múltipla, o que exigiu da
instituição um aparato para o seu acompanhamento, de modo que pudesse dar continuidade
aos estudos com adequações para um aprendizado continuado.
É importante salientar a visão inclusiva da UERN, preocupada em garantir o direito de
educação a todos, postura que deveria ser assumida por toda e qualquer instituição
educacional, principalmente as de base. Mesmo com o apoio da DAIN, Diretoria de Políticas
e Ações Inclusivas da UERN, os desafios no primeiro semestre foram grandes, mas, a cada
semestre, essas dificuldades (ampliações das provas ou ajuda da ledora, conteúdos a serem
explicados por professores que se dispõem a dar aulas extras após o horário para uma melhor
aprendizagem e explanação dos conteúdos) estão sendo superadas. Com o comprometimento
e seriedade da DAIN, que une forças com os professores e a vontade de estudar, José está hoje
no 7º período e faz parte dos grupos de estudo de iniciação científica pelo Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Trata-se de um órgão público que tem
o objetivo de incentivar a pesquisa no Brasil e Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica (PIBIC), financiado pelo CNPq ou pela Universidade. (PIBIC).

24
Ledores são pessoas que emprestam a sua voz para decodificar os livros para os deficientes visuais, visão
monocular, deficiência intelectual, autismo, déficit de atenção, dislexia ou discalculia. Quanto aos transcritores,
são aqueles que auxiliam pessoas com impossibilidades de escrever. Ambos podem atuar sozinhos ou em
conjunto.
25
Equipe com vários profissionais da área de saúde, abrangendo todas as deficiências, psicólogos, pedagogos,
psicopedagogos e assistente social. Cabe a essa juntar verificar o direito dos alunos que solicitam a perícia darem
o parecer do diagnóstico sobre a deficiência ou não.
131

José é orientando da professora Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar, diretora da DAIN, e
já elaborou vários trabalhos científicos Internacionais e Nacionais e Minicursos, III
CINTEDI- Congresso Internacional de Educação Inclusiva – III Jornada Chilena Brasileira de
Educação Inclusiva e Direitos Humanos. IV Seminário Potiguar – Educação, Diversidade e
Diálogos e Práticas Inclusivas, no III Encontro Regional de Narrativas (Auto) Biográficas –
ERNAB, I Seminário Nacional de Pesquisas (Auto) Biográficas e Histórias de Vida -
SENAPAHV. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - Faculdade de Direito I
Semana Jurídica da Faculdade de Direito – SJFAD/UERN Ministração - Minicurso - Direitos
e Garantias de Estudantes com Deficiência no Ensino Superior: Alcançando a Ascensão
Social nos quais ressalta a importância do conhecimento e aprendizado através do estudo.
Com o intuito de conhecer o cotidiano de José na universidade, debruçamo-nos sobre
as narrativas de uma de suas professoras no curso de Administração de Empresas, a qual nos
concedeu uma entrevista cheia de surpresa. Segue a sua narrativa:

José foi o meu primeiro aluno com deficiência, mesmo tendo muitos
anos já na profissão. No primeiro momento, quando olhei José, eu
fiquei muito preocupada, achei que ele não tinha condição, achei que
seria difícil ele acompanhar. E era curioso que ele me falava que eu
não li o decreto, e sempre me falava isso. Aí, sim, eu fui ver e comecei
a ler. A minha preocupação era pelo próprio curso de Administração,
pela responsabilidade de colocar no mercado um administrador que,
ao sair da faculdade, exerça suas funções com competência. Este
aluno é formado pela UERN, minha preocupação era muito grande.
Depois eu fui vendo o interesse dele, o seu esforço, e fui buscar meios
para ensiná-lo. Graças à DAIN, que me ajudou a compreender a
questão, a cada dia eu via que se eu fizesse as adequações necessárias
ele seria capaz. Inclusive, eu passei uma atividade para todos da sala,
um cronograma. E expliquei para ele como fazia. Para minha surpresa,
que achava que ele ia ter dificuldade, porque é difícil, ele acertou e
outros erraram. Hoje ele não tem inibição, quando passo atividades em
seminário ele vai e fala muito bem. (Narrativas da professora Flor26,
Mossoró/RN, 2018).

Após conversar com Flor, percebi o quanto a professora se interessa em estimular o


aprendizado de José. Seus pensamentos estão sempre voltados para uma melhor forma de
fazê-lo conquistar sua independência, não como uma pessoa com deficiência, mas como
sujeito de crescimento em todas as áreas como profissional.

26
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
132

Durante a conversa com Flor, observei que sua preocupação com José é que, ao
terminar o curso, seja um profissional competente e que zele pelo nome de sua Instituição de
Ensino. A capacidade e superação de José vêm sendo, a cada dia, uma vitória. Como Charlot
(2005) fala, é difícil o discente de camada popular chegar à universidade, mas, se ele quer
estudar ele consegue. Charlot (2005, p. 41) complementa:

A relação com o saber e busca ‘compreender como o sujeito categoriza,


organiza seu mundo, como ele dá sentido à sua experiência e especialmente
à sua experiência escolar [...], como o sujeito apreende o mundo e, com isso,
como se constrói e transforma a si próprio’.

Nas entrevistas com José, nem sempre ele demonstrou gostar das correções da
professora, da maneira que ela pede para que ele faça e refaça, mas ele tem ciência que é para
o seu êxito escolar. Através das experiências e aplicações de métodos didáticos e adaptações
diferenciadas, a professora busca oferecer-lhe uma melhor compreensão da disciplina. A
força, determinação e compromisso de José, um discente de camada popular e com
deficiência múltipla, foram e são fundamentais para que ele siga buscando, através dos
estudos, a sua ascensão social.
Nesse processo também tem sido essencial o acompanhamento da DAIN e sua equipe
multidisciplinar, que oferecem o acompanhamento aos docentes e alunos com deficiências, de
forma que todos que fazem parte da universidade do Rio grande do Norte a UERN estejam
preparados para receber esses alunos. De fato, o companheirismo dos colegas de turma tem
ajudado José a superar os desafios de cada dia, fazendo-o sentir acolhido e em condições de
realizar as atividades assim como os demais.
A família tem um papel em destaque para que esse aluno tenha um apoio pautado no
amor e confiança. José, por exemplo, teve algumas pessoas como espelho e prosseguiu em
frente a buscar escrever uma nova história para sua vida. E a cada dia vem adentrando em
suas trajetórias cheias de desafios e superações. Em meio a todas as dificuldades as relações
sociais o têm ajudado a conviver e crescer com as experiências vividas com o outro.
Dentro da Universidade tem alcançado êxito por meio do caminhar juntamente com
toda equipe da DAIN e Discentes. Mas ainda são grandes os desafios para cada necessidade
que surge a cada semestre. É preciso entender que família, educação, relações sociais são
destaques em harmonia para um processo de aprendizagem e para que uma pessoa com
deficiência não perceptível alcance a ascensão social através dos estudos. José superou suas
133

dificuldades e tem consolidado suas metas de reflexão para despertar suas potencialidades e
empoderamento.

3.3 AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DO ATENDIMENTO AOS ALUNOS COM


DEFICIÊNCIA E A ASCENSÃO NO CAMINHAR COM OS ESTUDOS

Ao caminhar pelas trilhas da inclusão, percebi que os atendimentos sociais à pessoa


com deficiência, na Educação, são fundamentados na legislação brasileira mediante a
exigência de grupos de apoio e atendimentos especializados. Devido à obrigatoriedade, as
pessoas com deficiência têm sido matriculadas nas escolas para que possam ser atendidas
pelos centros de atendimentos. A inclusão, nesse sentido, compreende as contribuições sociais
que permitem a pessoa com deficiência alcançar êxito social, mediante o empoderamento e
autonomia.
O direito à educação das pessoas com deficiência é garantido pela Constituição
Federal de 1988 (BRASIL, 2001). Para conferir cumprimento às disposições constitucionais
referentes à inclusão da pessoa com deficiência, vigora, desde 1989, a lei nº 7.853 (BRASIL,
2008a). Entretanto, envolver o estudante com deficiência não é fácil, as instituições têm suas
dificuldades. A primeira barreira a ser vencida é a própria família do aluno, que, muitas vezes,
não acredita na potencialidade da pessoa com deficiência. A inclusão dessas pessoas não é
uma tarefa simples, requer esforço e dedicação para que permaneçam na escola e aproveitem
a oportunidade de aprender.
As mudanças de hábitos levam o aluno com deficiência a buscar mais conhecimentos,
a sentir a necessidade de permanecer sempre a aprender. Isso permite que processem e
armazenem novas informações para uma vida que os libertem da dependência e lhe permita
ampliar o seu conhecimento, aperfeiçoando suas atividades para que possam tomar suas
decisões e escolhas, e buscando suas capacidades e conhecimentos necessários para a sua
formação.
Nessa caminhada em favor da compreensão da educação inclusiva, pude perceber que
as instituições buscam estratégias para promover a socialização e aprendizagem dos alunos
com deficiências. Ademais, procuram meios para favorecer a esses alunos o desenvolvimento
de habilidades para aquisição de conhecimentos em diferentes áreas, principalmente no que se
refere à sua integração com as atividades de produção de saber, conhecer e buscar a sua
autonomia. A diversidade está presente nas instituições inclusivas, sendo encontrados nelas
discentes com diferentes deficiências, cada um com suas particularidades.
134

Em todo o Brasil temos instituições que ajudam ao discente com deficiência a


despertar para novas conquistas. Muitas dão apoio e suporte tanto para a pessoa com
deficiência como para suas famílias. Geralmente, o público alvo são crianças, adolescentes,
jovens e adultos, cada um com suas limitações. Há também escolas especializadas em
somente uma deficiência específica. Essas instituições são responsáveis por propagar e
conscientizar a sociedade sobre a realidade desses discentes e por permitir que ingressem e
permaneçam dentro das instituições de ensino.
José, por exemplo, começou a se desenvolver nos estudos e a pensar em fazer uma
universidade através dos atendimentos dessas instituições. Uma das primeiras instituições
frequentada por ele foi o Centro Regional de Educação Especial (CREE-MOS). Ele mesmo
teve o desejo de buscar mais conhecimento. Com muita dificuldade, procurou sozinha a
instituição, que, dia após dia, ajudou-lhe a superar suas limitações. Um guerreiro com
persistência e que resistiu aos obstáculos da vida. Um exemplo de aluno, disciplinado,
atencioso, respeitador e comprometido com a educação.
Para conhecer mais sobre o Centro Regional de Educação Especial (CREE-MOS), na
condição de mestranda, fui até a instituição, sendo recebida pela educadora Sonhadora27, que
me apresentou todo o espaço. Segundo ela, um dos critérios para receber atendimento no
CREE-MOS é estar matriculado em uma instituição educacional, de preferência municipal ou
estadual. O atendimento é para todas as idades de pessoas com deficiência, com exceção de
alunos cegos e surdos, que, na cidade de Mossoró RN, recebem atendimento exclusivo de
uma instituição específica para essas duas deficiências.
O CREE-MOS é uma instituição pública do governo do Estado, coordenada pela
Secretaria de Educação Especial (SUESP). O objetivo geral do CREE-MOS é proporcionar
diferentes alternativas de atendimento às necessidades específicas desses estudantes, público
alvo da educação especial. Incentiva a livre expressão e a criatividade, bem como o acesso ao
conhecimento e a participação e interação dos alunos nas atividades desenvolvidas,
respeitando sempre seu nível de aprendizagem e valorizando as suas potencialidades. O
CREE-MOS é um centro de suporte pedagógico e não substitui a escola regular, apenas
completa o conteúdo do aluno com deficiência ou suplementa as altas habilidades de
superdotação.
A instituição age em parceria com os professores das escolas e conta com a
participação de profissionais como terapeutas, psicólogos, neuropediatras, fonoaudiólogos e

27
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
135

outras especialidades. Também atua como sua parceira a Secretaria de Educação Especial
(SUESP) que oferece o apoio técnico e profissionais da educação especial. O horário de
atendimento é sempre no turno em que o aluno não estiver estudando no ensino regular. O
atendimento é preferencialmente para alunos que residem em Mossoró e cidades vizinhas, na
zona rural e urbana, como Serra do Mel, Baraúnas, Grossos, Tibal, Governador Dix Rosado,
essas cidades ficam no Estado do Rio Grande do Norte, entre outras. Portanto, só atende
alunos de escolas particulares se houver vaga.

O ideal é que o trabalho com esse público seja realizado conforme o que está
sendo desenvolvido na sala de AEEE, na escola em que o aluno está
matriculado, com o acompanhamento dos professores auxiliares. O público
alvo são pessoas de baixa renda, por isso há muita ausência nas aulas, pois
nem sempre são disponibilizados os transporte. Muitos até mesmo deixam de
frequentar o espaço, fazendo com que venham a optar pela escola regular
‘vulnerabilidade financeira’. O centro funciona no período matutino e
vespertino, tendo matriculados no período matutino 51 alunos e no
vespertino 61 alunos. Os alunos podem ser atendidos duas vezes por semana.
Esse atendimento pode ser individual ou coletivo, sempre considerando a
especificidade do aluno. O progresso dos alunos é individual, uns
conseguem melhor desenvolvimento outros não. O horário de atendimento é
de 07h00min às 11h30min e de 13h00minh às 17h30minh. Quando
solicitado pelas instituições regulares de ensino, a equipe do CREE-MOS faz
visitas a esses locais para promover palestras e minicursos ou para dar cursos
de capacitação para os professores. O centro tem orientação para familiares
professores e alunos. Em sua estrutura pedagógica possui o núcleo de apoio
pedagógico (NAP), composto por salas de recurso para produção de material
de arte e educação, informática educativa, brinquedoteca e sala de recurso
multifuncional. (Narrativas da professora Sonhadora, do CREE-MOS,
Mossoró/RN, 2018).

Para conhecer melhor o trabalho desenvolvido pelo CREE-MOS, marquei um retorno


para uma entrevista também com a professora Esperança28, que muito incentivou José. Em
sua fala, surpreendeu-me com tanta amabilidade e carinho para com o ex-aluno. Em meio à
curiosidade, pude ouvir alguém que o acompanhou na busca do sonho de entrar em uma
universidade, mesmo enfrentando todos os obstáculos e preconceitos. Essas foram suas
palavras sobre José:

José chegou aqui sozinho. É um jovem de muitas amizades, sempre está em


roda de pessoas. Ele tem uma visão de mundo muito grande e bons
relacionamentos como médicos, advogados e engenheiros. Ele sempre me
falava que ia ao SESC bem cedinho para ver o jornal e revista, para se
manter atualizado. Disse que faz parte do município de Mossoró. Ele está
sempre informado e buscando informação. O sonho dele era ir para

28
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
136

faculdade e conseguiu. Nós sempre dávamos muita força para ele. Quando
ele foi aprovado na UERN foi uma alegria para todos nós. Depois de tentar
para uma faculdade 4 vezes, particular, nós insistimos para ele ir para a
UERN, que teria o apoio para ele. O processo da Universidade particular as
vezes não tem apoio nem os meios para fazer a avalição dele. Quando eu
encontro com ele, pergunto: ‘Como está?’ Ele fala: ‘É um pouco difícil, às
vezes tenho que chegar até o professor para fazer valer meus direitos.’ José é
um estudante educado, respeitador, inteligente, disciplinado, esforçado e vai
muito longe. (Narrativas da professora Esperança, do CREE-MOS,
Mossoró/RN, 2018).

Consequentemente, José buscou o seu empoderamento sozinho, com uma força e


determinação que falta em muitos seres humanos pela ausência do amor. Na minha visão, ele
transformou a ausência desse amor em vontade de sobreviver. Nessa busca, encontrou e
frequentou o CREE-MOS durante muito tempo, mas, atualmente, tem recebido todo o suporte
pedagógico, psicológico, técnico e social da UERN, universidade onde encontra-se
matriculado.

Foto 25 - Foto de José no CREE-MOS

Fonte: Arquivo do CREE-MOS (Mossoró/RN, 2009).

Outra instituição que contribuiu para ascensão social de José através do estudo foi o
Centro de Apoio ao Deficiente Visual (CADV), R. Ferreira Itajubá - Santo Antônio, Mossoró
- RN, 59611-070, local para onde me dirigi para ver de perto suas contribuições para com
José. Desde 1987, o local oferece atendimento a esse público, visando habilitá-los ou
reabilitá-los, facilitando, assim, seu processo de inclusão social, que requer: orientação e
mobilidade, atividade da vida autônoma, soroban, escrita cursiva, ensino do sistema braile,
137

estratégia de enriquecimento curricular, intervenção precoce, serviço itinerante e capacitação


de recursos humanos.
A visita à instituição aconteceu em setembro de 2018. Lá, fui recebida por Rosa29,
uma profissional competente e alegre que foi professora de José durante algum tempo. Falou
sobre a instituição (CADV) e sua missão: priorizar aos seus alunos com deficiência visual,
com características definidas como cegueira e baixa visão, um ensino de qualidade de forma
complementar ou suplementar. Quando indagada sobre José, a entrevistada proferiu a seguinte
narrativa:

A busca e o desejo de superação que ele tem são inquestionáveis. Ele


procura ajuda em todas as suas dificuldades. É uma busca incansável e
determinada. Hoje ele quase não vem. De certa forma fico feliz por ele estar
suprindo todas as dificuldades na UERN, isso é sinal que ele tem buscado e é
modelo para muitos alunos. Ele é um dos que me deu força para eu fazer o
mestrado. Incrível como falava todos os dias: Você tem que fazer mestrado.
Não foi eu que o ajudava, ele sempre me incentivando a voltar a estudar. E
eu fiz o mestrado. Ele está sempre muito bem informado em tudo. Com
certeza ele vai ser uma pessoa que vai dar prosseguimento a sua vida. Vai ter
uma vida acadêmica muito próspera. Ele tem metas, visão, sonhos e planos.
E ele é que luta para conquistá-los, tem uma superação de luta e conquista.
(Narrativa da professora Rosa, Mossoró/RN,2018).

A inquietação do aprender a ser, aprender a fazer, aprender a aprender levou José a


buscar mais uma instituição, o CADV, que colaborou com o acesso e permanência dos
estudos de José, ajudando-o a se inserir no sistema regular de ensino, tanto na rede pública
quanto na privada, e a agir de forma consciente para o efetivo exercício de sua cidadania.
Além das instituições frequentadas por José, aqui apresentadas, convém descrever
algumas parcerias da DAIN/UERN que valorizam o aprendizado e conhecimento das
necessidades das pessoas com deficiências por meio de uma troca de experiência que permite
estabelecer melhores formas de interação com a sociedade. Essas parcerias proporcionam a
capacidade de raciocinar, interagir, produzir ideias, comparar e formar uma pessoa com
alteridade, autonomia e empoderamento social ou educacional.
Depois de passar por todos esses lugares, José chegou A UERN, onde recebe apoio da
Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas (DAIN), que vem suprindo as necessidades de seus
discentes com deficiências e daqueles matriculados em outras instituições. A DAIN dá total
assistência para José. Atualmente, o aluno conta com a assistência de uma Ledora: pessoa
(como eu) que faz leitura para deficientes visuais ou gravação de leitura de livros.

29
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
138

Com suas tecnologias assistivas para alunos, professores e técnicos, a DAIN tem
proporcionado um relacionamento sem barreiras entre todos que compõem a universidade.
Desse modo, os discentes com deficiências têm tido acesso garantido à informação e ao
conhecimento, bem como seus direitos respeitados. Através dos estudos e do
acompanhamento adequado proporcionado pela DAIN, os estudantes com deficiência da
UERN têm alcançando êxito acadêmico e profissional.
No anseio de conhecer mais de perto o acompanhamento oferecido pela diretoria a
José, fui até a DAIN para entrevistar sua orientadora. A entrevista com a Prof.ª Dr.ª e PhD
em Educação, também diretora da DAIN, Ana Lúcia Oliveira Aguiar, aconteceu no dia 13 de
setembro de 2018. Foi um momento de muito aprendizado.

Foto 26 - José e sua orientadora e diretora do DAIN

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN,2018).

Ao ouvir suas palavras sabias e amorosas, a todo instante me vinha à memória a frase
de José: “Ah se eu tivesse uma Ana antes! Eu estaria muito longe.” E eu faço das palavras
dele as minhas: “Na minha vida e na de muitos, a professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar tem
sido referência de possibilidades e autonomia, oferecendo-nos, com amor, zelo e
compreensão, o aprendizado de um mundo novo, cheio de experiências e saberes exitosos.”
Sobre o atendimento direcionado a José pela DAIN desde a seleção no vestibular até o
momento atual, em que cursa o 7º período do curso de Administração de Empresas, a
professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar teceu este comentário:

José é atendido pela DAIN desde 2014. Entrou na UERN ainda no sistema
PSV - Vestibular. Para o vestibular teve atendimento dos técnicos da DAIN,
para que tivesse as adequações no sentido da efetivação dos seus direitos.
139

Inicialmente, como todos os alunos que não tiveram a escolaridade no tempo


exato de cada idade, José entrou na Universidade com várias lacunas. Eu
digo isso não no sentido de moralismo ou de absurdo, mas no sentido de
entender as lacunas e trabalharmos no ensino superior. Foram lacunas de
conteúdos defasados. Eu acredito que essas lacunas foram também pela falta
de adequações na escolaridade básica. Além disso, nós somos como José, de
camada popular e com muitas dificuldades. As superações dele mais visíveis
são a autonomia e o empoderamento. Aqui na DAIN, nós desenvolvemos
com os alunos um trabalho de construção, cotidianamente. Antes era um
aluno muito recuado, hoje tem autonomia. A partir dos trabalhos
desenvolvidos pelos profissionais e técnicos da DAIN, tem alcançado
empoderamento para se reconhecer como sujeito e cidadão. Outra virtude de
José é a forma de se dirigir e solicitar algo a alguém. Antes ele não
conseguia, mas é natural, depois de tantas descriminações que passou. As
pessoas são tão massacradas, estigmatizadas que já criam um perfil de ir de
encontro de forma forte, mas nós trabalhamos isso com José, de saber dos
seus direitos. Crescimento da aprendizagem também deve ser destacado.
Quando entrou na UERN tinha receio de não conseguir êxito, hoje já
reconhece que, com disciplina, planejamento e força isso é possível. E todas
essas dimensões ele tem melhorado a cada dia. José é cidadão em potencial,
é um filho, é uma dádiva de Deus para mim. (Narrativa da Profª Drª Ana
Lúcia Aguiar, diretora da DAIN, Mossoró/RN, 2018).

A orientadora me explicou ainda que são feitas adequações no ponto de vista


pedagógico, psicológico e educacional, não só para José, mas para todo aluno com deficiência
que tem atendimento pela DAIN. José tem atendimento sistemático com vários profissionais,
em diferentes áreas, ressaltando as suas especificidades. Isso favorece não só o crescimento de
José, mas um olhar múltiplo, diversificado dos professores para com ele, a cada dia. Hoje os
professores, através do trabalho da DAIN, não veem mais José como um aluno com
deficiência, mas como sujeito de potencialidades. Como os semestres possuem professores
diferentes, crescemos todos juntos. Ele contribui para uma formação continuada dos
professores e de toda uma sociedade e nós contribuímos para seu êxito pessoal e profissional.
O desenvolvimento dos alunos depende das contribuições sociais que essas
instituições produzem a cada passo desses alunos. É preciso buscar a sensibilidade para ouvir
as vozes silenciadas de alunos com deficiência, considerados por essas instituições com
grande potencial de aprendizado e reflexão. Esses espaços devem primar pelo
desenvolvimento em todas as áreas a serem trabalhadas, entendendo o papel e a pertinência de
cada um, com suas particularidades. Assim é possível consolidar uma sociedade consciente de
que todos somos responsáveis uns pelos outros, dando suporte educacional e social,
possibilitando o êxito social.
140

3.4 AS NARRATIVAS (AUTO)BIOGRÁFICAS DE UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA


NÃO PERCEPTÍVEL NA ACADEMIA: RESISTIR, PURGAR E REIVINDICAR

Pelas narrativas de alguém, podemos conhecer seus sofrimentos, alegrias, esperança,


planos e percalços. Assim ocorreu quando ouvi José. Ao falar, ele não fixava seu olhar em
mim. Parecia estar longe, mas podia notar seus olhos cheios de lágrimas e desilusões. Quando
comecei a ouvi-lo, conheci o sofrimento de uma pessoa com deficiência não aparente, mas
cheia de alegria e planos para o futuro. Refleti, então, sobre minha própria vida e a arte do
ouvir, provocando minha pessoa a reinventar o meu percurso e a aprender com os
depoimentos do narrador que despertou em mim a vontade de viver ouvindo suas histórias.
Suas reflexões vivenciadas me tornaram uma pessoa melhor, que enxerga as dificuldades de
outros também como suas.
Minhas conversas com José aconteceram na cidade de Mossoró, na Universidade
Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), nos Jardins do POSEDUC, de julho a novembro
de 2018.

Foto 27 – Momento de entrevista com José

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2018).

Mossoró é o local onde ele sempre morou, pequena em tamanho, mas grande em
recepção aos que chegam de outros lugares, como eu. Uma cidade cujas riquezas de produção
são o sal e o melão. Neste lugar, ele viveu todas as suas exitosas experiências como um aluno
141

com deficiência, superando e saltando todas as barreiras encontradas em sua trajetória de vida,
buscando sempre alcançar a ascensão social através do estudo. Seguem suas palavras:

Falar da minha vida não é fácil, passei muitas dificuldades para chegar até
aqui. Comecei a estudar cedo, quando criança, mas não tinha muitos amigos.
Tive minha mãe e meu pai e dois irmãos já falecidos. Hoje tenho um irmão,
minha cunhada e duas sobrinhas. Repeti várias vezes nos primeiros anos e na
educação fundamental, não conseguia aprender, tinha muita dificuldade e os
professores não se interessavam muito para me ensinar. Não lembro muito
dos meus professores. (Narrativas de José. Mossoró/RN, junho de 2018).

A narrativa de José me remete ao passado, quando também não me lembro dos meus
professores e culpava minha memória. Até que no dia 07 de maio de 2018 a prof.ª, Dr.ª Lia
Matos Brito de Albuquerque me disse, na qualificação de minha dissertação de mestrado, que
eu não me culpasse, porque foram os meus professores que não marcaram minha vida. Na
narrativa de si, na reflexão retroagida no tempo, José descreve a decepção com a falta de
pessoas que poderiam tê-lo ajudado em estudos até o ensino médio. A falta de apoio dessas
pessoas e dos professores está presente em toda a vida escolar de José desde a educação
infantil até o ensino médio. Mas, como teve uma vida abençoada por DEUS, ele conseguiu
muitas pessoas em sua vida que substituíram essa falta e lhe proporcionaram oportunidades de
realizações e muitas conquistas. O personagem fala dessa parte da vida como se fosse uma
página virada, não devendo as lembranças serem relembradas. Sua atitude ressalta o que
afirma Halbwachs (1945, p. 49):

[...] as lembranças que nos são mais difíceis de evocar são aquelas que não
concernem a não ser a nós, que constituem nosso bem mais exclusivo, como
se elas não pudessem escapar aos outros senão na condição de escapar
também a nós próprios.

José preferiu mostrar a construção de sua autonomia e empoderamento a partir do


término do ensino médio, construindo um novo ser e se fortalecendo no seu cotidiano a buscar
ser alguém sem medir esforços. Mesmo diante de tantos obstáculos e preconceitos, ele afirma:

Quando entrei no ensino médio, não repeti mais. Com o falecimento da


minha mãe, vi que teria que trabalhar. Fiz um curso no SENAI de corretor e
fui trabalhar, foi quando vi que teria que voltar a estudar. Eu gosto de
pessoas que pensam positivo, pessoas negativas eu não gosto que ficam ao
meu lado. Foi quando conheci a professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar, na
UNP, em um evento para pessoas com deficiência. Eu já tinha tentado o
vestibular várias vezes em uma universidade particular, e contei para ela
todos os problemas que encontrei da discriminação e as não adequações
142

necessárias para mim. Ela me falou: ‘Porque você não vai para UERN?’ E
me explicou sobre a DAIN. Resolvi fazer o vestibular na UERN, procurei o
professor Salvador para me ajudar na redação e fui aprovado no vestibular
para Administração de Empresas. Já teve pessoas que me falaram que o meu
curso não tem futuro. Mas o mercado está aí para todo mundo, basta você ter
disciplina, objetivo e compromisso. (Narrativas de José. Mossoró/RN, junho
de 2018).

Apesar das dificuldades, algo notório na vida de José, que prosseguiu sozinho, com
muita persistência e determinação conseguiu ser aprovado no vestibular da UERN. Ele
desbravou caminhos com a esperança de alcançar o êxito através dos estudos e a ascensão
social. Conquistou essa vitória. Hoje, com a ajuda de amigos e profissionais qualificados está
a buscar novos horizontes. Sempre a desenvolver bons relacionamentos, inclusive com
pessoas que alcançaram a ascensão social através dos estudos, como advogados, engenheiros,
procura aprender cada vez mais, com o cuidado de, a cada dia, ser: prudente, independente,
autoconfiante, corajoso, otimista, carinhoso, atencioso, compreensivo, responsável,
determinado e persistente.
A política de ação inclusiva da UERN/DAIN vem disponibilizando para todos os
alunos com deficiência as tecnologias assistidas, com equipamentos especiais, softwares bem
como ajudas técnicas e profissionais multidisciplinares. É visível o crescimento dos alunos
assistidos pela DAIN, que contribui também com a sociedade, ao oferecer cursos e
profissionais capacitados para uma educação continuada.
Como se pode ver, José percorreu um longo e difícil caminho para chegar onde está.
Em uma de nossas conversas, revelou que as maiores barreiras enfrentadas por ele para a
conquista de seu sonho de ingressar na universidade foram as atitudinais, principalmente de
pessoas mais chegadas, que não acreditava nele. Já na universidade, enfrentou e continua a
enfrentar dificuldades com alguns professores, que, não acreditam que ele é capaz ou
dificultam seu aprendizado, não fazendo as adequações necessárias. Ele disse:

Ao entrar na Universidade UERN, eu tive muita luta porque no começo os


professores não faziam adaptações. Com o tempo foi melhorando. Mas todo
semestre começa tudo novamente, porque entra professor novo. Eu preciso
de um professor que saiba passar conhecimento. Agora que passei e estou
estudando na faculdade, tudo mudou, minha vida mudou através do meu
esforço. Mas muitos professores contribuíram e contribuem para eu estar
aqui. Já tenho até propostas de emprego. Mas quero estudar. Estou no grupo
de pesquisa PIBIC e fico nele com bolsa ou sem bolsa. As dificuldades vêm
para desanimar, mas eu tenho objetivo e vou até o fim. Sou persistente e não
desisto fácil. Todos nós temos problemas, mas temos que estar preparados
para lutar e vencer. Eu sonhava em fazer a faculdade, agora estou aqui e vou
realizar meu sonho. Tenho minhas obrigações e busco com responsabilidade
143

cumprir todas elas, como: fazer todas as tarefas ir a DAIN pedir ajuda a
LEDORA, tenho os horários da ajuda com a assistente social, psicóloga e
procuro não faltar a nenhum horário marcado. Já que eu cumpro meus
deveres e obrigações fazendo minha parte, preciso que os professores façam
as deles também que são minhas adaptações. As vezes preciso de horário
extra com o professor para uma explicação devagar. Quando eles marcam eu
estou lá sempre. (Narrativas de José. Mossoró/RN, junho de 2018).

Nosso personagem ressalta a importância da DAIN para a superação dessas


dificuldades e para a sua permanência na universidade. Diz que todos são competentes e
agradáveis, sempre dispostos a ajudá-lo. Confessa que, no começo, logo no primeiro semestre,
cursou cinco matérias. Diz que foi muito difícil e que foi reprovado em algumas matérias,
porque estava cursando toda grade curricular. Por ocasião das reprovações em algumas
matérias, a DAIN juntamente com a equipe multiprofissional, analisaram a melhor
possibilidade de didática e pedagogicamente ajudá-lo, aconselhando-o a fazer somente três
matérias por semestre.

Quando entrei para Universidade, queria fazer todas as matérias, mais


reprovei em algumas. Fui até a DAIN e conversei com da Diretora Ana
Lúcia Oliveira Aguiar que ia desistir, ela me fez continuar e fazer menos
matéria, com algumas dificuldades fui indo fazendo as matérias, fiquei em
recuperação em algumas, mais ia sendo aprovado. Melhorou muito, porque
dava para eu estudar aquelas matérias e tirar notas melhores. (Narrativas de
José. Mossoró/RN, 2018).

Em seguida, em conversa com a equipe da DAIN, chegou à conclusão que seria


melhor fazer somente três matérias por semestre. A estratégia funcionou muito bem e José
pode avançar nos estudos. As avaliações de José sempre foram realizadas em sala de aula,
juntamente com os outros alunos, mas, agora, quando precisa ele conta com a ajuda de uma
ledora. Ele gostou da experiência, porque não consegue fazer as atividades quando tem muito
barulho, falta-lhe concentração. O estudante utiliza a sala de apoio de atendimento
especializado da DAIN para suas atividades, o que reflete sua autonomia.
Conforme Freire (1996), alunos devem ser acrescidos de conhecimento para que
possam se empoderar e alcançar sua autonomia. No caso de José essa autonomia veio por seu
esforço e com a ajuda da DAIN, que está sempre junto dele com o propósito de inclui-lo entre
os demais alunos, de modo que possa estar com o outro, a interagir com o outro.
Segundo Mantoan (2005, p. 26), “[...] inclusão é a nossa capacidade de entender e
reconhecer o outro e, assim, ter o privilégio de conviver e compartilhar com pessoas
diferentes de nós”. Para a autora, a educação inclusiva acolhe todas as pessoas, sem exceções.
144

Assim, graças a iniciativa da DAIN e do trabalho de conscientização que tem realizado entre
os que compõem a UERN, José tem alcançado médias melhores na universidade e recebido
um conteúdo programático normal.

Quadro 10 - Histórico Escolar de José


Ano/Semestre /2014.1 Média/Situação

Fundamentos da Psicologia 7,6/AP


Fundamentos da Filosofia 8,3/AP
Introdução à Administração 7,2/AP
Introdução à Economia 7,9/AP
Sociologia Geral 8,7/AP
Ano/Semestre/ 2014.2 Média/Situação

Contabilidade Geral 8.1/AP


Estatística I 7,1/AP
Instituto do Direito Público e Privado 7,2/AP
Metodologia Científica 2,8/AP
Teoria Geral da Administração I 1,3/AP
Ano/Semestre/2015.1 Média/Situação

Contabilidade Geral II 8,7/AP


Direito Administrativo I 7.3/AP
Relações Públicas e Humanas 8,6/AP
Ano/Semestre/2015.2 Média/ Situação

Iniciação Empresarial 7,3/AP


Matemática Comercial e Financeira 9,7/AP
Teoria Geral da Administração 6.8/AP
Ano/Semestre/2016.1 Média/Situação

Auditoria I 7,5/AP
Iniciação ao Processamento de Dados 8,3/AP
Teoria Geral da Administração 7,7/AP
Ano/Semestre/2016.2 Média/Situação

Contabilidade Aplicada à Administração 9,3/AP


Informática Aplicada à Administração 7,0/AP
Teoria das Organizações 7,8/AP
Ano/Semestre/ 2017.1 Média/Situação

Administração Mercadológica 8,2/AP


Chefia e Liderança 8,6/AP
Sistemas de Informações Empresárias 9,2/AP
Fonte: Sistema de Administração Escolar (SAE/UERN, 2018) – Cópia liberada pelo aluno.

Ao verificar o quadro de notas acima, que fornece as notas do sujeito, podemos


perceber que ele tem superação com as adequações implementadas a cada período. Notamos
que o exercício de buscar a inclusão com formas didáticas e pedagógicas diversas, com apoio
145

da equipe multidisciplinar, tem gerado o êxito dos alunos com deficiência. Ao fazer uma
análise do quadro de notas de José, é possível verificar que, apesar de todas as dificuldades
enfrentadas ao chegar à Universidade, ele tem vencido. Mesmo com suas deficiências
múltiplas, tem mostrado mudanças e alcançado o aprendizado sempre. Segundo ele:

As dificuldades encontradas foram principalmente em relação às


adequações dos professores, todos os dias eu falava para o professor:
‘leia o documento que a DAIN, mandou.’ Mas o professor não sabia
qual era o documento, ele não tinha lido. Por isso, não fazia as
adequações que eu precisava. Hoje, ainda tenho esse tipo de
problemas, mas com os professores novos, os antigos já estão
acostumados comigo e já sabem. Alguns ainda esquecem, às vezes, de
fazer. Eu tenho que cumprir minhas obrigações, se não, eu sou punido.
Mas, não há punição para os professores. Há lei, mas eles não
cumprem e fica por isso mesmo. Tenho crescido muito em minhas
produções cientificas, já fiz vários artigos, apresentei minicursos e
participei de várias mesas redondas. Eu tenho uma orientadora que é
uma orientadora, é a Professora Ana. Nós construímos os artigos
juntos. Quando fui conversar com ela, ela me falou: ‘Eu não trabalho
com qualquer pessoa, tem que ter compromisso.’ Aí mandou eu
escrever minhas ideias e eu ia até ela e ela me mandava ir melhorando
o que eu escrevi. Isso levava muito tempo. (Narrativas de José.
Mossoró/RN, junho de 2018).

Mesmo com problemas encontrados com as adequações, José está a cada dia
alcançando êxito a cada dia. A seguir, no quadro 11, trago algumas das produções de José,
resultado de uma educação com visão inclusiva e da determinação de um sujeito que busca a
ascensão social por meio dos estudos. Os artigos foram apresentados em eventos científicos
acadêmicos.

Quadro 11 – Algumas produções escritas de José (Continua)


Título do artigo/ Capítulo de Livro Ano de Autor/es Evento
publicação

ARTIGO: Acessibilidade e José Bezerra Neto, III Seminário


efetivação de direito das pessoas com 2017 Ana Lúcia Oliveira Potiguar –
deficiência intelectual: experiências Aguiar e Evandro UERN
exitosas no processo de adequação da Fernandes Figueira
avaliação dos conteúdos.

ARTIGO: Acessibilidade e 2018 José Bezerra Neto, III- ERNAB/


efetivação de Direito das Pessoas Ana Lúcia Oliveira UERN
com Deficiência Intelectual: Aguiar e Evandro
146

Quadro 11 - Algumas produções escritas de José (Conclusão)


Experiências Exitosas no Processo de Fernandes Figueira
Adequação da Avaliação dos
Conteúdos.

Capítulo de Livro: Percurso de um 2019 José Bezerra Neto, Premissas da


estudante em Formação: Uma Dupla Ana Lúcia Oliveira Iniciação
Entrada Entre o Biográfico e o Aguiar, Eliane Científica
Educativo. Cota Florio e CAPÍTULO
Geraldo Mendes 18 – Pág.171
Florio
Fonte: Elaborado pela autora com base em informações retiradas do currículo lattes de José30.

José tem sido um exemplo de aluno bem sucedido, o que pode ser comprovado por
meio de suas publicações, artigos e também um capítulo do livro intitulado A iniciação
cientifica como prática de reflexão crítica no ensino superior: construções e superações,
contribuindo para uma sociedade inclusiva. Tais conquistas têm dado a José e aos outros a
oportunidade de conhecer e efetivar os direitos da pessoa com deficiência. Seguem exemplos
de publicações de José:

Quadro 12 – Publicações de José


(Continua)
Os trabalhos: “ História e Oralidade: Construindo narrativas de Saberes em Lições de sala
de aula” do(s) autor(es): José Bezerra Neto, Ana Lúcia Oliveira Aguiar e Evandro
Fernandes Figueira, Apresentado no II Seminário Potiguar 2015
“Acessibilidade e Efetivação de Direito das Pessoas Com Deficiência Intelectual
Experiências Exitosas no Processo de adequação da Avaliação da dos conteúdos” do(s)
autor(es): José Bezerra, Ana Lúcia Oliveira Aguiar e Evandro Fernandes Figueira,
Apresentado no III seminário Potiguar 2018
Percurso de um estudante em formação: uma dupla entrada entre o biográfico e o
educativo" do(s) autor(es): José Bezerra Neto, Ana Lúcia Oliveira Aguiar , foi apresentado
na modalidade Comunicação Oral (CO) no III CONGRESSO INTERNACIONAL DE
EDUCAÇÃO INCLUSIVA & III JORNADA CHILENA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO
INCLUSIVA E DIREITOS HUMANOS, evento realizado no Centro de Convenções
Raymundo Asfora no Garden Hotel na cidade de Campina Grande - PB, no período de 29 a
31 de Agosto de 2018.

30
Disponível em: http://lattes.cnpq.br/6001240326756040. Acesso em: 12 set. 2018.
147

Quadro 12 – Publicações de José


(Conclusão)
I Congresso de Direito da UERN como palestrante de um minicurso intitulado “Direitos e
Garantias de Estudantes com Deficiência no Ensino Superior: alcançando a Ascensão
Social”.
12 de setembro de 2018, o aluno participou como palestrante junto com a professora Ana
Lúcia Oliveira Aguiar e O Advogado Geraldo Mendes Florio.

Fonte: Elaborado pela autora com base em informações retiradas do currículo lattes de José

O exemplo de José me faz refletir sobre como temos que aprender com esse discente,
com seu esforço, determinação e persistência. Permitir as mudanças e praticá-las em nossas
vidas é uma alternativa para adquirir significativo espaço para exercitarmos, no nosso
cotidiano, o processo de aprendizagem. Como diz Mantoan (2005 p. 91): “A escola prepara o
futuro e, de certo que, se aprenderem a valorizar e a conviver com as diferenças nas salas de
aula, serão adultos bem diferentes de nós, que temos de nos empenhar tanto para atender e
viver a experiência da inclusão.”

Foto 28 - Apresentação de José no I Congresso de Direito da UERN

Fonte: Arquivo pessoal de Eliane Cota. (Mossoró/RN, 2018).

José, apesar das suas dificuldades, tanto pelas suas deficiências como pela sociedade
preconceituosa, está desbravando seus estudos. Mediante sua narrativa, entendi que para
148

construir a ascensão social através dos estudos e uma educação continuada e consistente é
preciso desenvolver um coração grato, destruir a semente dos preconceitos e viver com
sabedoria. O sucesso do discente com deficiência depende de visão inclusiva, clareza e
planejamento com as adequações de um plano detalhado e concretizado. São necessárias
ainda a esperança e a definição de metas a serem alcançadas, bem como agir com dedicação,
zelo e comprometimento.
Ter muita atenção com as palavras proferidas é um cuidado indispensável na relação
com pessoas com deficiência, pois as palavras têm o poder de incentivar ou destruir sonhos e
conquistas. Conselhos, ensinamentos e críticas são necessários, mas devem ser repassados
com amor e respeito. Dessa forma os alunos alcançam seus objetivos e o relacionamento entre
discente e docente melhora, aumentando a capacidade de comunicação, conquista e
independência da pessoa com deficiência.
Durante toda a pesquisa José ressalta sua orientadora, a Professora Ana Lucia Oliveira
Aguiar, como uma mãe. Diz que "[...] se não fosse ela, não teria tido força para permanecer na
faculdade”. Para reforçar seu carinho e admiração pela profissional a chama de mãe.
As vitórias e desilusões mostram o caminho da experiência de vida, nos tornando
fortes, mas compartilhar, ser solidário com os outros sempre traz um grande crescimento para
ambos. Este é o sentido de incluir, a vontade de promover a acessibilidade humana, com
barreiras a serem superadas a cada minuto e com prontidão a servir o outro. A pessoa sensível
às necessidades do próximo desenvolve elevado senso de valorização do outro,
comprometendo-se em empenhar sua vida na realização do melhor para a inclusão. Essas
qualidades José enxergou na diretora do DAIN, também sua orientadora. Sobre ela teceu as
seguintes palavras:

Em especial, falar da professora Ana Lúcia é assim. Eu nem sei o que vou
dizer de Ana. As qualidades que ela tem eu não tenho palavras (se
emociona) para o que eu quero dizer. Eu conheço uma amiga minha que eu
tenho que levar ela para conhecer a professora Ana Lúcia, ela faz direito,
disse que tem interesse em fazer artigo, e eu disse: ‘Eu vou arrumar para
você uma pessoa que chama MÃE.’E eu disse: ‘Uma MÃE que chama Ana
Lúcia, Ana é uma orientadora, Ana é uma mãe.’ E ela falou: ‘Você fala tanto
que Ana Lúcia é uma mãe.’ E eu falei, ‘é minha orientadora MÃE’. Quem
tem Ana não precisa de ninguém, é uma pessoa que tem várias qualidades.
Não tenho palavras para dizer, descrever. Se eu tivesse tido uma Ana
antigamente eu tinha evoluído muito e voado muito alto. Ana é tudo.
(Narrativas de José. Mossoró/RN, jun. de 2018).
149

Com a arte do saber, a professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar, militante da inclusão,
não só de teoria, mas de prática de vida e espelho que reflete para todos que estão a sua volta,
mostra a necessidade de o professor, a cada instante, buscar a formação continuada para
compreender o que é incluir. A “pureza” dessa palavra representa e acrescenta um valor
moral, social e ético, por isso é preciso aprender a amar de todas as formas e com todas as
forças. As características que possuímos são diferentes, fazem parte da condição humana.
Temos características, habilidades e práticas de aprendizagem diferentes. É a natureza do ser
humano.
Embora a inclusão seja citada a todo instante no meio educacional, ainda falta muito
para que essa proposta seja de fato efetivada. Assim, temos que ter a sabedoria de a estar
sempre divulgando, para todas as pessoas, a fim de que haja um conhecimento social.
Devemos conscientizar a sociedade quanto à riqueza da inclusão, mostrando-lhes alguns dos
princípios constitucionais que a regem, como direito à vida, à educação, entre outros que estão
acima de todo preconceito, que é um crime instituído em nosso código penal e esclarecido
também na lei de inclusão.
Relatar todo trajeto formador de potencialidade e o uso de seus direitos, ressaltando
diferentes espaços de saberes, aprendizados e conhecimentos, tem como objetivo ajudar o
sujeito a transpor os obstáculos na trajetória de estudo e a alcançar a recuperação das suas
potencialidades. Como aponta Freire (1996), através das narrativas sobre todo o percurso feito
durante toda a trajetória vivida, o aluno tem a possibilidade de alcançar o empoderamento e
autonomia. Afinal, aquele que quer aprender deve tornar-se capaz de não ceder, mas de
recuperar sua autoestima e sua confiança, valorizando as suas experiências e as dos outros
com muito respeito (FREIRE, 1996). É necessária uma conscientização de que é possível
mudar o mundo a partir si, de que é sim possível vencer e superar desafios, o atraso, através
do estudo, aprendizado e educação e gerar mudanças e (re)significação de vida.
Concluo este capítulo resgatando de minha memória uma aula da professora Dr.ª Ana
Lúcia Oliveira Aguiar, ministrada à turma do mestrado, na qual cada aluno tinha que levar
uma pessoa da terceira idade. A professora falou sobre Eclea Bosi, que incentiva à “[...]
leitura de mundo dos outros de forma leve, com suavidade e respeito”. Dessa forma a
professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar olha para José, com seus limites e ações de
empoderamento, mas com potencialidade, viabilizando uma educação inclusiva, com percurso
cheio de expectativa para uma ascensão social através do estudo.
150

No final do semestre, tive a oportunidade de, junto com José, redigir uma carta para a
professora Ana Lúcia. No tempo de convivência com essa profissional maravilhosa, pude
perceber que ela é como mãe de todos nós, que tem orado e pedido a Deus força. Lembrei-me
disso porque no dia dessa aula a pessoa de terceira idade que levei foi a minha mãe. Ela falou
uma frase que jamais irei esquecer: “Mãe de joelho, filhos de pé.”
A experiência que podemos adquirir com a vida de José é de lutar sempre, apesar das
dificuldades. Como diz Ana Lúcia Aguiar: “Em meio a todos os impedimentos temos que
viver todos os dias como se fosse único.” Devemos vivenciar alteridade e expressão da
qualidade do que é do outro ou do que é diferente, um dos princípios fundamentais do homem
na sua vertente social. Essa é a relação de interação e dependência com o outro.
151

NA TRILHA DA ASCENÇÃO SOCIAL. É POSSÍVEL SONHAR ATRAVÉS DOS


ESTUDOS!

Foram tantos sonhos realizados e trajetórias percorridas. Tudo com luta, mas
transformado em muita alegria. Viveria tudo novamente. Percorrer o caminho da inclusão,
mediante o resgate da história de experiências de vida de José, uma pessoa com deficiência
não aparente, foi, certamente, uma oportunidade ímpar de proporcionar esperança de êxito
social e profissional por meio dos estudos para as pessoas com esse perfil.
As histórias do seu cotidiano de vida revelam a importância de múltiplos olhares para
o outro e suas necessidades, bem como para uma educação transformadora, capaz de alinhar
teoria e prática e de romper barreiras. Por essa razão, apaixonei-me por essa joia de trabalho
que DEUS e minha orientadora, Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar, colocaram em minhas mãos.
Este trabalho me permitiu falar dessas experiências de José, mas também me permitiu
a oportunidade de conscientizar a sociedade em geral de que é preciso a emancipação de
alguns pensamentos e verdades absolutas. Devemos procurar ver as pessoas com deficiência
com potencialidades, sendo elas autoras de uma nova história, de um olhar visionário de
quebra de paradigmas. Nesse sentido, lembro que ainda é preciso percorrer caminhos para
chegar a uma educação de fato inclusiva, que coopere para a construção de políticas públicas
efetivas e afirmativas, cujas propostas contribuam para que as pessoas com deficiência
consigam alcançar, através dos estudos, a ascensão social.
Este trabalho dissertativo mostra que ainda há muitos obstáculos e preconceitos a
serem vencidos para a inclusão verdadeira. Nesse sentido, retomo as palavras de Sassaki
(1997), quando diz que a inclusão social é um processo pelo qual a sociedade se adapta para
poder incluir em seus sistemas sociais gerais pessoas com necessidades especiais.
Simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade.
Para que a inclusão ocorra é necessária uma sociedade mais justa e consciente sobre o
que vem a ser incluir e ser incluído. Soma-se a isso a oportunidade de aprender a cada dia
com o outro, de sermos o outro e de estarmos com o outro para um novo entendimento. O
resultado desta pesquisa traz, portanto, grandes aprendizados para a sociedade. Com efeito, a
cada dia precisamos adornar os propósitos que temos com a inclusão.
No percurso do texto dissertativo palmilhei as trilhas da minha infância, adolescência
e juventude, tempos nada fáceis, visto que o meu processo educativo foi sempre conciliado ao
trabalho e estudo. Entretanto, tal situação me estimulou a prosseguir. Filha de pessoas de
classe popular, morando em um lugar onde todos eram praticamente iguais socialmente,
152

busquei a ascensão social através do estudo. Fiz minha primeira graduação em Pedagogia e
uma segunda em Direito. No curso das leis, aprendi que temos de buscar a efetivação dos
nossos direitos através da Constituição Federal, aquela que garante os direitos fundamentais.
É através da Carta Magna que nascem as leis, como a LBI 13.146/2015, cujo propósito é
ajudar a fundamentar todas as necessidades da pessoa com deficiência, lutando pela inclusão,
o que implica uma amplitude maior para as necessidades de cada tipo de deficiência.
Detalhar o percurso traçado desde a educação básica à universidade, principalmente as
conquistas e desafios, bem como quem me incentivou ao estudo e à trajetória em busca da
formação continuada para alcançar meus objetivos e amadurecimento acadêmico, foi me
despertando para novos desafios e dando-me uma satisfação enorme em escrever. Saliento
nesse processo a importância da Diretoria de políticas e ações inclusivas - DAIN/UERN, que
tem adaptado os meios e materiais necessários para ajudar as pessoas com deficiências em
seus estudos, disponibilizando, por exemplo, a LEDORA para pessoa com deficiência visuais
ou cegos. O auxílio dessa profissional proporciona provas ampliadas e a integração entre
docente e discente. A DAIN também oferece Intérpretes da Lei brasileira de Sinais LIBRAS
para pessoa com deficiência auditiva ou o surdo. Nas divisões de atendimento também há
pedagoga, psicóloga clínica e educacional.
As informações de todas as ações da DAIN e sua equipe estão fundamentadas por
documentos que dão o norte para todos os alunos com deficiências efetivarem seus direitos.
Alguns desses documentos são indispensáveis, como a ficha de observação do docente, a
iniciativa do discente, política de inclusão da UERN, Relatórios da DAIN, documentos da
junta multiprofissional.
A UERN é uma das primeiras Universidades a se preocupar com o direito religioso,
através da Resolução Sabática nº 01/2017/ CONSEPE. Com o apoio da DAIN, o município de
Mossoró, entre outros próximos a ele, e até mesmo para além das nossas fronteiras, ou seja,
em outros países, a inclusão tem sido conhecida pela força dos estudos da LBI, realizados pela
DAIN e sua equipe. O projeto faz reuniões itinerantes e congressos com trabalhos
internacionais, a fim de apresentar a LBI.
Para a realização do diagnóstico da pessoa com deficiência ou doença, a DAIN/UERN
conta com a Junta Multiprofissional, sobre seu cuidado, mas sujeita à reitoria da UERN. O
aluno é quem faz o requerimento da perícia, pois ele tem que ter autonomia para isso. O
parecer é dado e avaliado para cada especificação.
Os projetos de extensão da DAIN são muitos, com destaque aqui para o de Libras, de
ledor, de orientação e mobilidade, que ajudam os alunos a se manterem na universidade, sem
153

desistir, buscando alcançar meios para que haja um aprendizado e para que cheguem à
ascensão social através dos estudos. Todos os que fazem a universidade têm se espelhando
nesse trabalhando, o que tem contribuído para o rompimento das barreiras atitudinais, as mais
recorrentes para aqueles que esperam uma ajuda.
Por meio de projetos de seminários, como o Seminário Potiguar, já na quinta versão,
as Rodas de Estudos - LBI e as reuniões com as famílias, a DAIN mostra que a família é a
base do apoio, compreensão e amor para alunos com deficiências. Busquei relatar essas ações
na tentativa de compreender os espaços frequentados pelo estudante de graduação da
Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN). Falei especificamente de José, de
origem popular e com deficiência não perceptível, atendido pela DAIN/UERN e que alcançou
êxito social e profissional por meio dos estudos. Sua trajetória serviu como um referencial
para a conscientização da importância dos estudos para o aprendizado, o êxito e a satisfação.
As narrativas de José revelam a não desistência do aluno com deficiência da sua
caminhada e da profunda necessidade de uma junta multiprofissional e de técnicos
qualificados que desenvolvam um trabalho de divulgação da inclusão através das atividades
realizadas em Mossoró, no estado do RN, em todo Brasil e em outros países. Com capacitação
e planejamentos, a DAIN realiza um trabalho de ponta com os alunos com deficiência
matriculados na UERN, no total 187 alunos.
O estudo mostra, pois, como são eficazes e necessárias políticas públicas locais, bem
como no estado, no país e no mundo. Ao mesmo tempo, revela os grandes esforços da UERN
e da DAIN em contribuir com essas políticas, realizando e participando de congressos em
vários países, a fim de divulgar o que é a verdadeira inclusão, sem medir esforços em lutar
pela causa do aluno e pessoa com deficiência.
Descrever a essência da DAIN é falar da inclusão, a mola mestra que transforma a
vida da pessoa com deficiência em aprendizado e conhecimento, com apoio a todo instante,
desenvolvendo o seu potencial. De fato, temos que estar atentos e ter um olhar mais amplo
para a inclusão, além de divulgar para a sociedade que, independente do curso, as pessoas
com deficiência podem e devem enfrentar o desafio de estudar. Isso exige a ampliação das
ações que divulgam novas leis, as quais amparam esses alunos em diálogo não só com as
famílias, mas com a comunidade.
Vemos, portanto, que o objetivo da DAIN é apresentar a proposta pertinente para
viabilizar meios que conduzam esses alunos ao alcance do êxito na universidade. Seus planos
estratégicos são de ações de realização e efetivação de obras, aquisição de equipamentos,
contratação de recursos humanos, cursos, minicursos, ciclo de palestras, oficinas, aquisição de
154

mobiliário inclusivo, elaboração de programa e uma política de progressão acadêmica,


elaboração de projetos: municipais, estaduais, nacionais e internacionais. Com essas práticas a
Diretoria de ações políticas inclusivas, a DAIN, vem levando o modelo ideal de inclusão ao
mundo.
Esta pesquisa, que nasceu do método (auto)biográfico e do incentivo da professora
Ana Lúcia Oliveira Aguiar, tornou-se espaço onde foram inseridas atividades de docentes e
discentes com vistas à institucionalização da inclusão universitária. São atividades que
revelam a busca de contribuições que efetivamente conduzam à melhoria da qualidade de vida
e autonomia dos discentes com deficiências. Essa iniciativa sinaliza os ensinamentos de Freire
(1996) sobre autonomia e empoderamento do sujeito. Tais conceitos fortalecem as palavras de
Bernard Charlot (2000), quando diz que é difícil, mas não impossível, um aluno de camada
popular alcançar a ascensão social através dos estudos.
De acordo com o Código de Ética da Pesquisa, impresso na RESOLUÇÃO Nº 466, de
12 de dezembro de 2012, saliento que a pesquisa foi realizada com total segurança, eficiência,
sigilo e ética. Tornamos cientes todos os entrevistados da seriedade do trabalho dissertativo,
das disposições preliminares, dos termos de definição, dos aspectos éticos da pesquisa
envolvendo seres humanos, do processo de consentimento de livre esclarecimento, dos riscos
e benefícios, do protocolo de pesquisa, do Sistema Comitê Nacional de Ética e Pesquisa
CEP/ Comissão Nacional de Ética e Pesquisa CONEP, de seus sistemas e suas atribuições, do
procedimento da análise ética, das análises das competências, das disposições comuns, do
pesquisador responsável, de outras disposições, das resoluções das normas específicas, e das
disposições finais. Apontamos os termos de autorização para que a pesquisa fosse elaborada
como texto dissertativo a todos os entrevistados, que os assinaram prontamente.
Nos espaços dos jardins da UERN, sob o brilho do sol, ao som dos pássaros,
aconteceram as entrevistas com o protagonista José, momentos em que foram delineadas as
narrativas, por meio do método (auto)biográfico. A cada entrevista um aprendizado, uma
novidade, uma enorme força de purgar tudo aquilo que se havia vivido e ainda tem a viver.
A pertinência de José traz marcas em minha mente. O que mais me marcou foi a sua
vontade, persistência e responsabilidade com os estudos. Durante todas as entrevistas, ele
nunca chegou atrasado ou descumpriu o combinado. Pude perceber que sua ascensão social
por meio dos estudos veio do próprio sujeito, com base em exemplos como os de seus dois
primos e consciente de que a pessoa com deficiência tem suas limitações mais pode obter seu
êxito través do estudo.
155

Quando comecei a pesquisa, não sabia se a ascensão social através do estudo de um


aluno era fruto do apoio da família, amigos, parentes ou professores. Para percorrer o
caminho, comecei a buscar respostas em suas narrativas. Foram várias entrevistas.
Aproximei-me de algumas pessoas que o conheciam e falavam sobre ele. Percebi que
mudanças são feitas a cada dia, no cotidiano. Basta querer e construir o seu lugar na
sociedade.
Com as narrativas de José, observei que pessoas o ajudaram a ser incluído, como o
senhor Salvador, um ex-professor dele, e dona Sonhadora, a orientadora Ana Lúcia Aguiar,
entre outros citados nesta dissertação. Todavia, foi ele quem quis, a todo instante, ele que
buscou e abriu caminho para sua inclusão e ascensão, sem fraquejar, acreditando em si.
Com deficiência não perceptível, José sofreu preconceito, às vezes maior do que para
com o deficiente aparente, aquele que é amputado cadeirante, porque a sociedade está
acostumada a enxergar somente aquilo que alcança a olhos nus. Na verdade, quando o que
move as pessoas em relação a esses sujeitos é a compaixão fica quase impossível de se ver o
potencial e as oportunidades oferecidas. É necessário enxergar as pessoas com deficiências
como sujeitos de possibilidade e transformação. Temos que romper paradigmas e construir
integração e meios de socializar e amparar os alunos com deficiência.
Na convivência com as narrativas de José, veio a mim a conscientização da
importância dos estudos para seu êxito social e profissional. Ele me revelou que sentiu a
necessidade de buscar a formação continuada; de adquirir conhecimento; de obter um
aprendizado contínuo para que fosse capaz de conquistar uma melhor formação. Autor de
vários artigos e de capítulo de livro, ele ministra minicurso e tem um zelo pelas aulas da
universidade, mantendo seu sonho de ser professor. Relata que sua ascensão social veio
através do estudo e que sempre lutou e lutará contra o preconceito.
Na construção dos dias lindos da pesquisa, com base na experiência de José e na
minha, também presente no texto, compreendi que para entender as diferenças é preciso lidar
com cada uma delas. Ao criarmos condições na direção de agir e enfrentar situações adversas;
ao buscarmos mudanças e inovações; ao conhecermos, entendermos e aprendermos sobre o
outro e suas necessidades estamos contribuindo para uma sociedade mais igualitária.
As narrativas de José contribuíram para a percepção de sua busca incessante pela a
formação continuada, aprofundando seus conhecimentos, lutando por uma especialização ou
ampliação dos saberes e das práticas para buscar e resgatar sua autonomia. Com sua história
aprendi que é a aplicabilidade fascinante da vontade de melhorar a cada dia que constrói uma
156

trajetória em busca da formação continuada para alcançar seus objetivos e amadurecimento


acadêmico.
As narrativas de José evidenciam que a prática de incluir é, para todos, sem
discriminação, o caminho para preencher todas as lacunas que estão em nós mesmos,
buscando meios para que outros possam alcançar êxito através dos estudos. Não podemos
transferir responsabilidades, mas devemos ficar atentos à responsabilidade solidária. Não
devemos aceitar o conformismo, mas buscar alternativas para que as pessoas com deficiência
não perceptível, como os surdos, deficientes intelectuais, autistas, entre outros garantam sua
ascensão através do estudo.
No cotidiano de José há muitos segredos e vitórias. Ainda existe um mundo de
descobertas para José e, com apoio e investimento educacional, ele realizará todos os seus
sonhos, mantendo respeito e afeto à sua individualidade, como tem feito. Suas vontades,
sentimentos e inteligência são indiscutíveis na busca pela continuidade e permanência na
Universidade. Suas decisões demostram crescimento e discernimento de suas escolhas,
sempre tomando suas decisões pelo estudo. Seus valores e desafios são grandes, mas ele
confia e promove um futuro promissor. Busca capacitar-se sempre e superar seus desafios.
As reflexões marcadas pelo seu objetivo o revelam como exemplo vivo de que não
devemos julgar as pessoas por sua aparência ou limitações; comprovam que mesmo pessoas
com deficiência podem conquistar seus objetivos quando respeitadas e tratadas
adequadamente. O empoderamento e a autonomia são essenciais para o fortalecimento e
ampliação dessa verdade, ajudando na efetivação da política de inclusão, a chave para uma
sociedade igualitária e libertadora.
No calcorrear desta dissertação esbarrei em algumas questões que, neste momento,
não receberam maior atenção, mas que me despertaram para futuras pesquisas, talvez em
outras oportunidades. Debruçando-me sobre a curiosidade que me move, deparei-me, por
exemplo, com a existência de programas e incentivos para a pessoa com deficiência nas
universidades públicas e que proporcionaram um aumento da busca de formação em nível
superior. Sem dúvida, o Estado, com intuito de diminuir a desigualdade social, tem oferecido
diversos projetos e bolsas que foram criados e modernizados para que o maior número de
pessoas com deficiência de camada popular possam ser beneficiadas e venham a conseguir
uma ascensão social através do estudo e não fiquem à margem da sociedade. No entanto, será
que essa ajuda financeira e todos os programas de alimentação, moradia, entre outros, podem
de fato ajudar no ingresso e permanência dos sujeitos com deficiência na Universidade?
157

Notei ainda que alguns professores não estão preparados para lidar com as adequações
necessárias a cada especificidade. Será esse o motivo da desistência do aluno com deficiência
das Universidades de forma geral?
Enfim, essas são questões para serem respondidas em outros estudos, realizados por
mim, quem sabe, ou por outros pesquisadores que se interessem pelo tema. O certo é que os
caminhos e reflexões realizadas nesta dissertação são de grande valia e contribuição para a
sociedade, pois revelam que, a partir da equidade, deve prevalecer sempre a humanização.
Este sentimento deve ser proporcional e implica em humildade, gentileza, amor e serviço ao
próximo. Em outras palavras, é preciso enxergar o outro com potencialidade. Devemos nutrir
a alma e o corpo de conhecimento e aprendizado para transformar e tornar a inclusão
realmente possível, garantindo, assim, os direitos e deveres de todos.
158

REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS

AGUIAR, A. L. O Tese: Título: Morte, Drama e Vida dos órfãos de Pau de Colher: rito,
memória e identidade - uma história do percurso de voltar à terra. Universidade Federal
da Paraíba, UFPB, Brasil, 2008.

AGUIAR, A. L. O.; Barbosa, J. B. ; Florio, Eliane. C. ; Florio, Geraldo. M. . Percurso de um


Estudante em Formação: uma dupla entrada entre o biográfico e o educativo. In: Anna
Maria Gouvea de Souza Melero. (Org.). Premissas da iniciação científica, 1. ed. Ponta
Grossa/OR: Atena, 2019, v. 1, p. 171-181.

ALBERTI, Verena. Manual de história oral. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005.

BERGIER, B.; XYPAS C. Para uma sociologia do improvável. Percursos atípicos e sucessos
inesperáveis na escola francesa. Revista educação em questão, v.47, n.33, set./dez. 2013, pp. 36-58.

BIBLIA SAGRADA, tradução João Ferreira Almeida. São Paulo: Sociedade Bíblica do
Brasil, v. 2, 1969

BOGDAN, Roberto C.; BIKLEN, Sari Knopp. Investigação qualitativa em educação.


Tradução Maria João Alvarez, Sara Bahia dos Santos e Telmo Mourinho Baptista. Porto:
Porto Editora, 1994.

BOURDIEU, P.; PASSERON J. C. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino.
Lisboa: Editorial Veja, 1978/2007.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1988. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 25
set. 2017.

BRASIL. Lei n.º 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da
Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência. Publicado no Diário Oficial da
União – DOU. Brasília, DF, 07 jul. de 2015. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm. Acesso em: 20 set.
2017.

BUENO, Belmira Oliveira. O método autobiográfico e os estudos com histórias de vida de


professores: a questão da subjetividade. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 28, n.1,
p. 11-30, jan./jun. 2002. Universidade de São Paulo. Disponível em: http://www.scielo.br/.
Acesso em: 19 set. 2017.

CÂNTICOS. In: BIBLIA SAGRADA, tradução João Ferreira Almeida. São Paulo: Sociedade
Bíblica do Brasil, v. 2, 1969.

CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber, elementos para uma teoria. 1. ed. Porto
Alegre: ARTMED, 2000.

CHARLOT, Bernard. Relação com a escola e o saber nos bairros populares. Revista
Perspectiva, v. 20, n. Especial, jul./dez. 2002.
159

COSTA, E. O.; XYPAS, C. A narrativa de relação com o saber: elementos para a compreensão de
recursos escolares atípicos longos. Revista SODEBRAS, v.8, n.96, dez. 2013, p. 25-29.

DELORY-MOMBEGER, Chistine. Biografia, Corpo, Espaço. Tendências da pesquisa


(auto) biográfica. In: PASSEGI, Maria da Conceição Passegi. Título do livro. Natal, RN:
EDUFRN, 2008.

DIRETORIA DE POLÍTICAS E AÇÕES INCLUSIVAS – DAIN. Universidade do Estado do rio


Grande do Norte – UERN. Relatório de atividades 2013 a 2017. Mossoró, 2013.

DIRETORIA DE POLÍTICAS E AÇÕES INCLUSIVAS – DAIN. Universidade do Estado do rio


Grande do Norte – UERN. Plano de trabalho 2017 a 2019. Mossoró, 2017.

DOMINICÉ, Pierre. O processo de formação e alguns de seus componentes relacionais. In:


NÓVOA, Antônio; FINGER Mathias. O método (auto) biográfico e a formação. Natal, RN:
EDUFRN; São Paulo: Paulus, 2010.

ELIAS, Norbert; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das


relações de poder a partir de uma comunidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000.
Disponível em: https://producoeseconhecimentos.files.wordpress.com/. Acesso em: 09 set.
2016.

EYSHILA. Nada pode calar um adorador. Intérprete: Eyshila. In: EYSHILA, Nada pode
calar um adorador. MK Music, 2009. CD, faixa 4.

FARIAS, I. M. S.; NÓBREGA-THERRIEN, S.M.; NUNES, J.B.C. (Org.). Pesquisa


científica para iniciantes: caminhando no labirinto. Fortaleza: EdUECE, 2011, v. 1, p. 33-
51.

FERREIRA. Norma Sandra de Almeida. As pesquisas denominadas “estado da arte”.


Educação & Sociedade, ano XXIII, n. 79, agosto/2002. Disponível em: www.scielo.br/.
Acesso em: 09 out 2016.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 9. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.

FREIRE. Paulo. Pedagogia do oprimido. 19. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
Disponível em: www.dhnet.org.br. Acesso em: 25 ago. 2017.

FREIRE. Paulo. A Educação na Cidade. São Paulo: primavera, 1991.

FREIRE. Paulo. Medo e ousadia: cotidiano do professor. 5. edição. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1986.

GÊNESIS. In: BIBLIA SAGRADA, tradução João Ferreira Almeida. São Paulo: Sociedade
Bíblica do Brasil, v. 2, 1969.

HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Presses Universitaires de France, 1990.

JOSSO. Marie-Christine. Experiência de vida e formação. 2. ed. rev. e amp. Natal, RN:
EDUFRN, São Paulo: Paulus, 2010.
160

LUNA. Sergio V. Planejamento de pesquisa: uma introdução. São Paulo: Educ, 2009.

MINAYO, Maria Cecília de Souza (Org.). Pesquisa Social. Teoria, método e criatividade. 18
ed. Petrópolis: Vozes, 2001.

MANTOAN, M. T. E. Caminhos pedagógicos da inclusão. São Paulo: Memnon Edições


Científicas, 2001.

NETO, José Bezerra; AGUIAR, Ana Lúcia Oliveira; FIGUEIRA, Evandro Fernandes.
Acessibilidade e Efetivação de Direito das Pessoas Com Deficiência Intelectual Experiências
Exitosas no Processo de adequação da Avaliação da dos conteúdos. In: III SEMINÁRIO
POTIGUAR. Comunicação Oral (CO). Mossoró - RN, 2018.

NETO, José Bezerra; AGUIAR, Ana Lúcia Oliveira. Percurso de um estudante em formação:
uma dupla entrada entre o biográfico e o educativo. In: III CONGRESSO
INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA & III JORNADA CHILENA
BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA E DIREITOS HUMANOS. Comunicação
Oral (CO). Campina Grande - PB, 2018.

NETO, José Bezerra; AGUIAR, Ana Lúcia Oliveira. História e Oralidade: Construindo
narrativas de Saberes em Lições de sala de aula. In: II SEMINÁRIO POTIGUAR.
Comunicação Oral (CO). Mossoró - RN, 2015.

POLLAK, Michael. Memória e identidade social. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 5, n.


10, 1992, p. 200-212. Disponível em: www.slideshare.net/FrancilisEnes/memria-e-identidade-
social-michael-pollak. Acesso em: 15 set. 2015.

PRIBERAM. Dicionário da Língua Portuguesa On-Line. Disponível em:


https://www.priberam.pt/dlpo/. Acesso em: 10 set. 2017.

PROVÉRBIOS. In: BIBLIA SAGRADA, tradução João Ferreira Almeida. São Paulo:
Sociedade Bíblica do Brasil, v. 2, 1969.

ROMANOS. In: BIBLIA SAGRADA, tradução João Ferreira Almeida. São Paulo: Sociedade
Bíblica do Brasil, v. 2, 1969.

ROMANOWSKI. Joana Paulin; ENS. Romilda Teodora. As pesquisas denominadas “estado


da arte” em educação. Revista diálogo educacional, vol. 6, n. 19, Curitiba, 2006. Disponível
em: https://docente.ifrn.edu.br/. Acesso em: 09 out 2016.

SALMOS. In: BIBLIA SAGRADA, tradução João Ferreira Almeida. São Paulo: Sociedade
Bíblica do Brasil, v. 2, 1969.

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: Construindo uma Sociedade para Todos. Rio de
Janeiro: WVA, 1997.

SOUZA, Elizeu Clementino de. A Arte de Contar e Trocar Experiências: reflexões teórico-
metodológicas sobre história de vida em formação. Disponível em: EC Souza. Revista
Educação em Questão, 2006. Disponível em:
161

https://periodicos.ufrn.br/educacaoemquestao/article/viewFile/8285/5958. Acesso em: 10 set.


2017.

UNESCO. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas


especiais. Disponível em: http://www.educacaoonline.pro. Acesso em: 10 set. 2017.

THERRIEN, J.; NÓBREGA-THERRIEN, S. Os trabalhos científicos e o estado da questão:


reflexões teórico-metodológicas. Estudos em avaliação educacional, v.15, n. 30, jul./dez.
2004.

XYPAS, C. Análise do discurso de alunos e de famílias da zona rural portalegrense sobre o êxito
escolar. In: 1° Colóquio Nacional de Análise de Discursos (CNAD). Anais [...]. Pau dos Ferros,
UERN, p. 1158-1171, 2014. -ILSON/ISSN 9788581120959.

XYPAS, C.; SAMPAIO, M. L. P. Sucesso escolar inesperado de alunos com histórico de fracasso. In:
Silva Carvalho A.; Milreu I.; Stevenson S.; Tavares T. Políticas públicas de formação e avaliação de
leitores, ensino de literatura e leituras. Campina Grande: EDUFCG, 2015, p. 43-62. ISBN:
9788580011586.

Você também pode gostar