Dissertaaçao Eliane - Cota - Florio
Dissertaaçao Eliane - Cota - Florio
FACULDADE DE EDUCAÇÃO – FE
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – DE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – POSEDUC
MOSSORÓ/RN
MAIO - 2019
ELIANE COTA FLORIO
MOSSORÓ/RN
MAIO – 2019
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desta obra é de inteira responsabilidade do(a) autor(a), sendo o mesmo, passível de sanções
administrativas ou penais, caso sejam infringidas as leis que regulamentam a Propriedade Intelectual,
respectivamente, Patentes: Lei n° 9.279/1996 e Direitos Autorais: Lei n° 9.610/1998. A mesma
poderá servir de base literária para novas pesquisas, desde que a obra e seu(a) respectivo(a) autor(a)
sejam devidamente citados e mencionados os seus créditos bibliográficos.
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________________________
Dr.ª Ana Lúcia de Oliveira Aguiar PhD em Educação - UERN/FE/POSEDUC
(Orientadora)
_________________________________________________________________
Prof.º, Dr.º Emerson Augusto de Medeiros- UFERSA
(Examinador Externo)
__________________________________________________________________
Prof.ª, Dr.ª Normandia de Farias Mesquita Medeiros - UERN/FE/POSEDUC
(Examinadora Interna).
_________________________________________________________________
Prof.ª, Dr.ª Giovana Carla Cardoso de Amorim - UERN/FE/ POSEDUC
(Examinadora Interna).
_______________________________________________________________
Prof.ª, Dr.ª Rosa Maria Barros Ribeiro - UECE/CED/PPG
(Examinadora Externa).
A Deus, por me proporcionar a vida. Aos meus
pais, por me ensinarem a amar e adorar a
DEUS em primeiro lugar, bem como a amar e
respeitar as pessoas. Ao meu esposo, pelo
amor que demostra a cada instante por mim.
Aos meus filhos, Mateus e Lucas, que têm
mostrado que nasceram para adorar a DEUS,
sendo essa a minha maior alegria. Em especial,
à professora, Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar,
PhD em Educação, por confiar em ser minha
orientadora.
AGRADECIMENTOS
A DEUS, a razão da minha vida. “Porque dele, e por ele, e para ele são todas as coisas;
glória, pois, a ele eternamente.” (ROMANOS 11, 36).
Em especial, agradeço à minha orientadora, Ana Lúcia Oliveira Aguiar, uma mulher
dotada de valores, sábia e com uma mente e atitudes brilhantes. Usada pelo nosso Deus para
abençoar a mim e muitas pessoas, com amor e humildade, através da sua experiência na
inclusão de todos. “Você conhece alguém que faz bem o seu trabalho? Saiba que ele é melhor
que a maioria e merece estar na companhia de reis.” (PROVÉRBIOS 22, 29).
À minha amada mãe e ao meu pai, que sempre me educaram nos caminhos do Senhor.
Com muito amor, sempre me ensinaram a respeitar, amar a todas as pessoas, sem
discriminação. Cresci ouvindo deles um versículo especial, mesmo durante o mestrado.
“Entrega o teu caminho ao Senhor; confia nele, e ele tudo fará.” (SALMOS 37, 5).
Ao meu esposo, Geraldo Florio, meu melhor amigo e companheiro de todas as horas.
Sempre esteve ao meu lado, me ajudando, sem medir esforços, sempre com amor. Deus o
escolheu para mim, com todo carinho, dando-me um grandiosíssimo presente. Tenho certeza
de que: “As muitas águas não podem apagar este amor, nem os rios afogá-lo; ainda que
alguém desse todos os bens de sua casa pelo amor, certamente o desprezariam.” (CÂNTICOS
8,7).
Aos meus filhos, meu primogênito, Mateus Florio, e ao meu caçula, Lucas Florio, que
a todo instante me incentivam e me ajudam com palavras e correções sábias. Agradeço a
DEUS por ter-nos dado vocês. Não existem filhos melhores. “Os filhos são herança do
Senhor, uma recompensa que ele dá.” (SALMOS 127, 3).
Agradeço de coração a José, pelo exemplo de vida que tem me ensinado a buscar e por
me incentivar a lutar e nunca desistir dos meus sonhos. Pelos horários a mim concedidos por
ocasião das entrevistas e por sempre ser pontual, disposto a ajudar em todas as horas.
Confesso que vibrei com suas narrativas, que me proporcionaram ser uma pessoa melhor a
cada dia. Em cada encontro recebia um novo aprendizado.
Sou grata também às demais pessoas que foram entrevistadas durante a pesquisa e
contribuíram de forma direta e indireta para a construção deste trabalho.
Às professoras Lia Matos Brito de Alburqueque, Emerson Augusto de Medeiros,
Giovanna Carla Cardoso de Amorim, Rosa Maria Barros Ribeiro e Normandia de Farias
Mesquita Medeiros, que, com tanto carinho, aceitaram ser meus avaliadores.
À Prof.ª Dr.ª Ady Canário, a quem tenho prazer de ressaltar a importância em minha
vida acadêmica, pois foi ela quem me informou por WhatsApp sobre o processo de inscrição
para a primeira disciplina no POSEDUC que cursei em caráter especial, contribuindo para que
eu reencontrasse o caminho da Educação e Inclusão.
À minha amiga e prof.ª Dr.ª Márcia Betânia, que nesse percurso ministrou uma
disciplina contribuindo para o meu conhecimento.
Ao meu amigo Stênio de Brito, sempre disposto a me ajudar com suas palavras
incentivadoras. Gratidão também a minha amiga Francinilda Honorato, Magnólia Costa e a
todos os outros amigos de mestrado. Amo todos vocês.
À minha amada amiga e irmã em Cristo Ariane Linhares, que se debruçou para fazer a
correção destas escritas. “O homem de muitos amigos deve mostrar-se amigável, mas há um
amigo mais chegado do que um irmão.” (PROVÉRBIOS 18, 24).
À Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) e todos os funcionários do
Programa de Pós-graduação em Educação (POSEDUC), que me receberam de braços abertos
e contribuíram para que eu pudesse buscar uma continuidade nos meus estudos com muita
qualidade e eficácia.
Em especial, agradeço à Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas (DAIN) da UERN e
toda sua equipe, que, além de me acompanhar e incentivar a continuar meus estudos em nível
de mestrado, foram suporte durante a realização desta pesquisa.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),
fundação vinculada ao Ministério da Educação (MEC) do Brasil, que atua na expansão e
consolidação da pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) em todos os estados do
país. Sou grata por terem me proporcionado condição de investir na minha pesquisa.
Porque sou eu que conheço os planos que
tenho para vocês, diz o Senhor, planos de fazê-
los prosperar e não de lhes causar dano, planos
de dar-lhes esperança e um futuro melhor.
(JEREMIAS 29, 11).
RESUMO
The experiences relate in this study, titled Social ascension of students non-perceptible
deficiency from the popular layer: from Basic Education to the University, describes
empowerment and autonomy of people with non-perceptible deficiency struggling to achieve
the dream of entering a university and achieving social and professional success. Are stories
of the life of a student with multiple disabilities, enrolled in the administration college of the
Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN). The work presented was developed
in the Programa de Pós Educação (POSEDUC) and relates to the research Line "Educational
Practices, Culture, Diversity and Inclusion". That objective was to understand the social rise
of this student with a non-perceptible deficiency and popular layer through the studies, from
basic education to university. The approach used was qualitative and as a research method we
opted for the (auto)biographical research. As a result it has been observed that it is possible
for the student with a non-perceptible deficiency, even if he is from a popular layer and facing
difficulties and obstacles, to attend a university and to reach social ascension through studies.
This achievement can be better achieved if the universities, in accordance with the Federal
Constitution and the Brazilian Inclusion Law 13,146 / 2015 - LBI, seek to help this student by
providing support with competent professionals and technicians, as well as promoting
adjustments and adaptations in their spaces, materials and methods. By having their specific
needs met, students with this profile will remain in the university and achieve social ascension
through study.
NEM SEMPRE FOI FÁCIL, MAS CADA DESAFIO TORNOU-ME MAIS FORTE E
ADMIRADORA DA VIDA ................................................................................................................ 14
1 A LABUTA DA VIDA E A CONSTRUÇÃO DA FORMAÇÃO: VIVÊNCIAS E
PERSPECTIVAS DE UMA PEDAGOGA ....................................................................................... 23
1.1 NARRATIVAS DE EXPERIÊNCIA: INFÂNCIA, FORMAÇÃO E APRENDIZADOS ............. 24
1.2 RELATOS DE SUPERAÇÃO E ALTERIDADE DE UMA PEDAGOGA COM DEFICIÊNCIA
NÃO PERCEPTÍVEL ........................................................................................................................... 44
1.3 INCLUIR E SER INCLUÍDA: O MEU CAMINHAR COM A INCLUSÃO ......................... 50
1.4 A PESQUISA (AUTO)BIOGRÁFICA COMO PONTO DE PARTIDA PARA A (AUTO)
FORMAÇÃO ........................................................................................................................................ 60
2 A DAIN/UERN E SUAS AÇÕES INCLUSIVAS: A LUTA PELA EFETIVAÇÃO DE
DIREITOS DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA................................................................... 70
2.1 PERCURSO HISTÓRICO DA INCLUSÃO NA UERN: NAS TRILHAS EM PROL DA
EFETIVAÇÃO DE DIREITOS ............................................................................................................ 71
2.2 POLÍTICAS DE INCLUSÃO PARA ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA RUMO À
ASCENÇÃO SOCIAL .......................................................................................................................... 83
2.3 POSSIBILIDADES E CONQUISTAS: SUPERAR OBSTÁCULOS E QUEBRAR BARREIRAS
ATITUDINAIS, PROCEDIMENTAIS E ARQUITETÔNICAS ......................................................... 91
2.4 AS RODAS DE ESTUDOS SOBRE A LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO (LBI): DIÁLOGOS E
DEBATES NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO EM MOSSORÓ/RN ............................................. 99
3 OLHARES SOBRE AS EXPERIÊNCIAS INDIVIDUAIS E COLETIVAS: NARRATIVAS
DE UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL DE CAMADA POPULAR .... 114
3.1 EU NÃO SOU DEFICIENTE, SOU PESSOA COM DEFICIÊNCIA: O QUE É DEFICIÊNCIA
NÃO PERCEPTÍVEL? ....................................................................................................................... 115
3.2 FAMÍLIA, ESCOLA E RELAÇÕES SOCIAIS: DESAFIOS E SUPERAÇÕES DO ALUNO
COM DEFICIÊNCIA NÃO PERCEPTÍVEL ..................................................................................... 122
3.3 AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DO ATENDIMENTO AOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA E
A ASCENSÃO NO CAMINHAR COM OS ESTUDOS ................................................................... 133
3.4 AS NARRATIVAS (AUTO)BIOGRÁFICAS DE UM ALUNO COM DEFICIÊNCIA NÃO
PERCEPTÍVEL NA ACADEMIA: RESISTIR, PURGAR E REIVINDICAR ................................. 140
NA TRILHA DA ASCENÇÃO SOCIAL. É POSSÍVEL SONHAR ATRAVÉS DOS ESTUDOS!
............................................................................................................................................................. 151
REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS ............................................................................................... 158
Nada pode calar um adorador
(EYSHILA, 2009).
14
NEM SEMPRE FOI FÁCIL, MAS CADA DESAFIO TORNOU-ME MAIS FORTE E
ADMIRADORA DA VIDA
Algumas oportunidades na vida nos são dadas e não podemos deixar passar usando
desculpas como: não posso, não tenho tempo, não tenho dinheiro, não tenho capacidade, não
tenho experiência, ou mesmo deixarei para depois, amanhã eu faço. Precisamos de tão pouco
para ser felizes, mas até que saibamos dessa verdade, passamos por muitas experiências na
vida.
Nesta dissertação, intitulada Ascensão social de estudantes com deficiência não
perceptível de camada popular: da Educação Básica à Universidade, mostro, através do
método (auto)biográfico, a trajetória de vida de um sujeito com deficiência não perceptível
que alcançou êxito social e profissional pelos estudos. Revelo ainda a importância das
instituições que contribuem para que alunos assim alcancem esse tão sonhado sonho. Ressalto
também o que é a pessoa com deficiência não perceptível, quais os obstáculos encontrados e
quais as superações alcançadas. Mostro o trabalho dentro das instituições para dar apoio a
esses alunos.
Apoiada na Constituição Federal de 1988 e na LBI Lei Brasileira de Inclusão
13.146/2015 relato o trajeto e a busca pelos direitos e garantias fundamentais que, há anos,
com exigência do povo, vêm, de forma discreta, ajudando esses alunos a estudarem em
instituições com o objetivo de alcançar êxito social e profissional através do estudo.
O objetivo da pesquisa é compreender a ascensão social e profissional de estudantes
com deficiência não perceptível, de camada popular, por meio dos estudos, desde a educação
básica à universidade. O desejo pela temática está atrelado à minha história de vida e à minha
luta rumo a inclusão, uma vez que por ser portadora de deficiência não perceptível passei por
muitas lutas, preconceitos e discriminação. Narro o meu percurso entre o ensinar, o aprender,
o conviver através da (auto)biografia. Falo do meu nascimento, infância, adolescência,
juventude e de minha luta pela ascensão social no decorrer da vida. Conto minhas conquistas
depois de ter vencido os percalços encontrados na caminhada com a inclusão. Se necessário,
viveria todas novamente.
Na busca pelo que Deus tem me reservado, cheguei ao mestrado em Educação, no
Programa de Pós-graduação em Educação (POSEDUC) da Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte (UERN). Me deparei com uma pessoa demasiadamente humana, humilde e
cheia de sabedoria, refiro-me à professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar, PhD em Educação,
15
minha orientadora. Ela me proporcionou essa viagem linda, através da continuidade dos meus
estudos.
A Bíblia, meu livro preferido, nos fala, em Provérbios 16:3: “Consagre ao Senhor tudo
o que você faz, e os seus planos serão bem sucedidos”. Como sou uma pessoa cristã, acredito
que foi Deus quem me deu essa orientadora que não pensa em si, mas sempre nas outras
pessoas. Ela pratica inclusão com amor, dedicação e responsabilidade.
A pesquisa que exponho corrobora, então, a discussão da prática inclusiva de alunos
com deficiência não perceptível conforme a política de inclusão, através das ações da
Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas (DAIN), vinculada à Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte (UERN), para a efetivação dos direitos dos seus estudantes. Mostro,
portanto, o caminhar histórico da UERN rumo às conquistas em prol da efetivação de direitos,
políticas de inclusão para estudantes com deficiência através da ascenção social pelo estudo.
Com equipamentos e adequações para cada tipo de especificidade de deficiencia, a
DAIN possui uma equipe técnica multiprofissional que valoriza a educação e a inclusão de
forma séria e eficaz. Ela prima pelas possibilidades e conquistas para superar obstáculos e
quebrar barreiras atitudinais, procedimentais e arquitetônicas.
Para finalizar, menciono como uma das atividades da DAIN as rodas de estudos sobre
a Lei Brasileira de Inclusão (LBI): diálogos e debates na perspectiva da inclusão em
Mossoró/RN. Ademais, narro os percursos de um estudante com deficiência não perceptível,
de camada popular, que conseguiu ascender socialmente pelos estudos, desde a educação
básica à universidade.
Mediante as narrativas (auto)biográficas, que contribuem com a história de vida e
experiências de um estudante de camada popular com deficiências não perceptíveis, narro sua
incansável luta para alcançar uma ascensão social através do ensino. Mostro seu
empoderamento e esperança na conquista do seu êxito estudantil. Com uma força capaz de
superar todos os obstáculos para galgar um espaço em uma sociedade muitas vezes
preconceituosa para com a pessoa com deficiência não perceptível, o sujeito da pesquisa se
revela um ser que resistiu, purgou e reivindicou. Ele fala de sua família, amigos, trabalhos e
lugares percorridos na educação para alcançar todas as suas conquistas, as quais o fizeram
recuperar sua autoestima e confiança.
Ao refletir sobre a vida desse sujeito pude pensar sobre minha própria trajetória. Pude
conquistar esta dissertação, que emergiu da luta em mostrar a importância de incluir e ser
incluída; de aprender e doar-se para obter uma continuidade nos estudos. Pude perceber a
importância de quebrar as barreiras atitudinais e de mostrar aos outros que a ascensão social
16
formação por meio dos estudos, desde a educação básica à universidade. Também refleti
sobre minha trajetória, o que me levou a contar minhas próprias experiências e histórias de
vida através do estudo. Para dar conta dos objetivos propostos a pesquisa recebeu enfoque
qualitativo, com levantamento (auto)biográfico sobre a pessoa com deficiência não
perceptível, por meio de diálogo, registros escritos, fotográficos, narrativas e descrição de
vivências desde a educação básica à universidade. A metodologia da pesquisa
(auto)biográfica possibilita as narrativas dos sujeitos da pesquisa, o que abriu espaço para a
escuta a respeito das lições de vida, narradas pelo aluno.
Segundo Delory-Momberger (2008), os estudos que utilizam as histórias de vida vêm
crescendo fortemente no cenário educativo contemporâneo. A soma desses estudos gerou
esclarecimentos a respeito de como o cidadão constrói a própria vida e a sua história. No
campo educativo, esse método de investigação ficou conhecido como a pesquisa
(auto)biográfica, compreendida como uma maneira de explorar a subjetividade e a memória
como elementos constitutivos para o (re)conhecimento da realidade das experiências de vida
dos sujeitos em construção e que pretende buscar, nos meios alcançados, a formação contínua.
Com esse entendimento, deu-se a busca pelas narrativas e experiências vividas pelo
estudante investigado, de modo a perceber a contribuição da família em seu processo de
aprendizado. Para Dominicé (2010), é no convívio e nas relações familiares que surgem as
memórias muito vivas, seja na orientação escolar ou profissional. O autor pensa o universo
das relações familiares enquanto contexto de formação e chama a atenção para os
componentes relacionais do processo de formação presentes nas narrativas. Em complemento,
afirma que todos os citados nas narrativas (auto)biográficas fazem parte do processo de
formação.
Para Bogdan e Biklen (1994, p. 16), na pesquisa qualitativa, os “dados recolhidos
significa ricos em pormenores descritivos relativamente a pessoas, locais e conversas, e de
complexo tratamento estatístico”. Esses dados são, geralmente, recolhidos em contexto
naturais, sem necessariamente se levantar ou tentar comprovar hipóteses ou medir variáveis.
Buscar apreender as diversas perspectivas dos sujeitos e os fenômenos em sua complexidade
possibilita uma relação dinâmica entre o mundo real e os sujeitos, isto é, um vínculo
indissociável, entre o mundo objetivo e a subjetividade humana. A partir dessa subjetividade,
houve uma reflexão das narrativas das histórias de vida do estudante com deficiência não
perceptível, desde o ensino básico até a universidade.
Os métodos para a execução dessas reflexões foram oriundos de debates e discussões
em disciplinas e seminários de metodologia de pesquisa, sessões de orientação de
18
Acredita-se que o exemplo de ascensão social de uma pessoa com deficiência não
perceptível através do estudo, da educação básica à universidade, acompanhado da
observação dos ensinamentos, aprendizados e experiências adquiridos, será de grande
relevância para a população, sendo um assunto ainda pouco comentado por conta do
preconceito para com esses sujeitos. O intuito é, pois, favorecer o empoderamento e a
autonomia desses sujeitos para que vislumbrem um percurso de muitos saberes e construção
de aprendizados e conhecimentos.
Para deixar claros os objetivos aqui perseguidos, bem como os resultados alcançados,
segue uma síntese da estrutura desta dissertação. No primeiro capítulo, A labuta da vida e a
construção da formação: vivências e perspectivas de uma pedagoga, narro minha história
de vida. Mostro como alcancei ascensão social através dos estudos, sendo de origem popular.
Por meio das minhas narrativas de vida e de experiências, descrevo o percurso entre o ensinar
e o aprender, o conviver e o ser com a prática inclusiva, bem como a repercussão das ações
inclusivas para a efetivação dos direitos de alunos com deficiência não perceptível.
Os saberes adquiridos por meio dos estudos e vivências, ao longo dessa trajetória,
permitem-me construir minha formação continuada e o aprendizado. As contribuições para
essa formação vieram dos incentivos da minha família para não parar de estudar e prosseguir.
Com o apoio deles eu continuei a caminhar, a buscar a mudança, a lutar pelos meus estudos.
Neste primeiro capítulo minha pesquisa encontra fôlego nas lições de Paulo Freire
(1987) sobre o empoderamento transformador e sobre a construção da cidadania. Trago à tona
a memória da minha experiência como pedagoga, mãe e filha. Ressalto o meu encontro com a
inclusão através da UERN/ Universidade do Rio Grande do Norte, onde pude perceber a
importância da formação continuada, através de seminários, congressos e aulas de campo.
Conto um pouco de tudo que vivenciei e do que tenho vivenciado no decorrer das aulas como
aluna especial do mestrado em educação e depois como aluna regular. Concomitante a isso,
conto sobre os projetos de extensão e as Rodas de Estudo da LBI, com destaque para a
importância que tiveram em minha vida.
Na escrita deste capítulo mostro a importância do meu encontro com a (auto) biografia
e usei como norte teórico Josso (2010). Falo de recordações e trarei à tona minhas histórias de
vida, narradas pela memória individual, coletiva e subterrânea, recorrendo aos meus pais e
amigos. Mostro como esse encontro me permitiu ver e rever todas as histórias da minha vida;
como me ensinou a contar e narrar coisas que jamais percebi ou relatei. Ao vivenciar o
passado pelas lembranças, relato os obstáculos e percalços preciosos para nosso crescimento.
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De fato, para que haja história para contar temos que sempre provocar a nossa memória e
contar e recontar nossos casos, a fim de que nosso futuro esteja sempre vivo em nossa mente.
No segundo capítulo, ressalto o percurso da Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas -
DAIN/UERN e suas ações inclusivas: a luta pela efetivação de direitos de alunos com
deficiência. O objetivo foi discutir a prática inclusiva para alunos com deficiência na
DAIN/UERN e a ações inclusivas para a efetivação dos seus direitos.
Ressalto como a DAIN tem contribuído para a formação dos alunos com deficiência e
mostro as suas alternativas à proposta de formação discente, com o intuito de ajudar e dar
subsídios para que ocorram novas possibilidades de avanços, com benefícios para uma melhor
locomoção. Discuto a prática inclusiva de estudos de alunos com deficiência e a repercussão
da ascensão através da construção da efetivação dos direitos.
Também exploro os recursos de adaptação e avanços tecnológicos que a DAIN tem
buscado para as necessidades e especificidades de cada deficiência, no intuito de colaborar
para ascensão desses alunos dentro do campo acadêmico e social. A DAIN luta pela
promoção da acessibilidade, diversidade, permanência e continuação desses alunos na
academia. Desempenha um esforço contínuo para uma acessibilidade arquitetônica, nas
comunicações, nos sistemas de informações, bem como nos materiais didáticos e
pedagógicos. Nessa discussão, se fez necessário o diálogo com a Lei Brasileira de Inclusão da
Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a fim de ressaltar os direitos e
deveres, efetivados também pela Constituição Federal, nossa carta Magna.
No terceiro capítulo, Olhares sobre as experiências individuais e coletivas:
narrativas de aluno com deficiência não perceptível de camada popular, mediante as
contribuições das narrativas (auto) biográficas, narro a história de vida e experiências de um
estudante com deficiência não perceptível de camada popular. Busquei identificar como
conseguiu ascender pelos estudos. Detalho o percurso traçado desde a educação básica à
universidade, principalmente suas conquistas, quem o incentivou ao estudo e sua trajetória em
busca da formação continuada para alcançar seus objetivos e amadurecimento acadêmico.
Para essa discussão, tomei como fundamento teórico o estudo de Josso (2010), onde a autora
admite que o sujeito, ao narrar a sua própria vida, vive o papel principal. Para Josso, quando o
sujeito compõe suas narrativas, através da sua história, aborda, de forma simples, direta e
profunda, suas lembranças e experiências de vida. Desse modo, tem a oportunidade de revelar
sobre sua vida e seus afazeres. Esse é, pois, um exercício transformador para sua vida.
Como participante do projeto, posso dizer que essas escritas, narrativas e todos os
encontros me proporcionaram um maior amor pelo meu objeto de estudo - a ascensão social
21
de estudantes com deficiência não perceptível: da educação básica à universidade. Por meio
desses encontros, senti a necessidade de pesquisar e saber mais sobre todos os direitos
discutidos em cada encontro. Os debates e palestras me instigaram ao estudo e aprendizado.
Dentro ou fora do município de Mossoró, pude resgatar minhas memórias, com as minhas
narrativas, e ouvir a respeito das ações promovidas pela DAIN junto à população. Pude ainda
aprender a conhecer e crescer, dando continuidade ao meu estudo com o meu colaborador, o
discente José.
Em meio a tantos aprendizados com os desdobramentos escritos e narrados no
caminhar dessa pesquisa, destaco as possibilidades de luta, encorajamento, empoderamento e
alteridade, que revelam a busca pela ascensão social através dos estudos. Afinal, conforme
nossa Constituição Federal/88, nossa Carta Magna, é dado o direito de educação para todos
os brasileiros e estrangeiros que moram neste país.
22
CAPÍTULO 1
(AGUIAR, 2015).
23
A curiosidade, citada por Freire (1996) na epígrafe acima, juntamente com outros
motivos citados na introdução deste trabalho, despertou em mim o desejo de pesquisar sobre a
ascensão social de estudantes de origem popular, com deficiência não perceptível, mediante
os estudos: da educação básica à universidade, temática deste trabalho dissertativo. Para a
execução desta tarefa, é necessário descrever o percurso entre o ensinar e o aprender, entre o
conviver e o ser por meio das minhas narrativas de vida e de experiências alcançadas por
meio dos estudos. Também é indispensável a descrição da prática inclusiva e a repercussão
das ações inclusivas para a construção da efetivação dos direitos de alunos com deficiência
não perceptível, mediante estudos, possibilidades e desafios, que efetivaram sua ascensão
social.
Com o auxílio de autores como Josso (2010), Dominicé (2010), Delory-Momberger
(2008) e Souza (2006) e seus estudos voltados à temática das narrativas (auto)biográficas e
histórias de vida, objetivo responder a seguinte questão problema que norteia esta pesquisa:
como se constitui o processo de ascensão social de estudantes com deficiência não perceptível
por meio dos estudos, desde a educação básica à universidade?
O sentido que almejamos para este trabalho está relacionado à superação, pois trata da
ascensão social de uma pessoa com deficiência não perceptível, desde a educação básica à
universidade, através do estudo. Trago também minha experiência permanente com a
educação, por meio dos estudos diários da vida de meus alunos. Quero mostrar como a
reflexão sobre mim mesma e sobre minhas ações me ajudaram a aperfeiçoar os conteúdos
aplicados, a aprender com o discente e a perceber como a docência me ajudou na
transformação de atitudes e na ciência do meu saber. No exercício da docência, percebi que,
independente da classe social dos alunos, mediante as experiências de vida e aproveitamento
das suas vivências, cultura, seu lugar, suas dificuldades, é possível obter ensinamentos.
Entendi que cada um traz grandes potencialidades e evidência de transformação, por isso
devem ser valorizados não pela aparência ou com ênfase nas dificuldades, mas pelos saberes
que constroem mediante os estudos e vivências.
O objetivo deste capítulo, intitulado: A labuta da vida e a construção da formação:
vivências e perspectivas de uma pedagoga, é mostrar, por meio das minhas narrativas de
experiências e trajetórias de vida e estudo, com ênfase no meu aprendizado e nos obstáculos e
percalços vencidos, como alcancei êxito. A pesquisa (auto)biográfica como metodologia me
24
possibilitou buscar a minha (auto)formação e entender como adquiri, ao longo de uma jornada
de instrução, preparação e desafios, a permissão para construir minha formação continuada, o
aprendizado. Destaco como maior contribuição o apoio de meus pais e familiares, que sempre
me incentivaram a não parar de estudar, a prosseguir, a caminhar, a buscar sempre a
transformação continuada. Deles veio minha força para mostrar a minha trajetória de vida em
uma sociedade individualista, algo que consegui através do estudo e conhecimento do meu
espaço. Mesmo em meio às dificuldades, adquiri dimensões de (trans)formação de vida com
êxito social.
Eu nasci de um parto normal muito difícil. Minha mãe começou a sentir as dores às
20h do dia 10 de setembro de 1968 e só me teve às 5h do dia 11 de setembro 1968, em casa,
assistida por uma parteira. Nessa época, na minha cidade, ninguém nascia em casa com o
25
auxílio da parteira, mas a minha mãe não tinha o costume de ir ao hospital. Os outros três
filhos, mesmo nascidos de partos feitos em casa, não tiveram complicações. Por isso, minha
mãe pensou que o meu nascimento seria como os outros, mas foi um parto demorado e muito
sofrido. A dificuldade foi tanta que a parteira chamou o meu pai e comunicou que eu não
sobreviveria e, talvez, nem minha mãe, devido ao grande sofrimento. Entretanto, Deus agiu e
eu nasci. Sem condição financeira, meu pai sabia que não teria como remover mamãe para um
hospital particular, pois era muito caro. Também sabia que não era conveniente levá-la a um
hospital público, já que, no Rio de Janeiro, nesses hospitais nunca havia vagas.
Éramos pobres. Meu pai, na época, trabalhava na Light, Companhia Elétrica do Estado
do Rio de Janeiro. Ganhava um salário mínimo. Minha mãe era empregada doméstica. Lavava
e passava roupas para 10 (dez) famílias. Meu irmão, Rael, era pré-adolescente. Na bicicleta,
ele pegava e levava as roupas para mamãe não trazer a trouxa de roupa pesada sozinha.
Meus pais não tiveram a oportunidade de estudar. Papai perdeu sua mãe com cinco
anos e o seu pai faleceu quando ele tinha nove anos de idade. O meu avô paterno chegou a
matricular meu pai na escola por algumas semanas, porém, por ser um viúvo e ter que
trabalhar, deixou o meu pai com apenas seis anos de idade na casa dos seus filhos mais
velhos. Os irmãos do meu pai, o exploravam e o forçavam a fazer as atividades domésticas.
Ele lavava a roupa no rio, areava panelas no rio e até mesmo levava seus sobrinhos à escola.
Meu pai não foi matriculado em escola, pois tempo dele era somente para trabalhar. Falecido
há um ano e seis meses, posso lembrar suas narrativas dessa triste história, repetida diversas
vezes por ele.
Aos oito meses de vida, eu já andava pelo quintal da casa de meus pais, enquanto
mamãe lavava as roupas das famílias. Forte e trabalhadora, ela cumpria seus afazeres e
cuidava de mim. Certo dia, em minutos de distração da minha mãe, eu me debrucei para ver a
água em um poço com mais de 20 metros de profundidade e quase cai nele. Minha irmã
Leninha, a mais velha, me pegou pelos pés e me puxou para fora. Bom é ouvir as narrativas
contadas por mamãe e minha irmã.
Com um ano e seis meses, eu já gostava de refrigerante. Então, um dia eu bebi
querosene, pois, nesse tempo, o produto era colocado em uma garrafa de refrigerante. Por ser
muito nova e pela semelhança das garrafas, ingeri todo o conteúdo. Pensava ser aquela bebida
gasosa que tanto apreciava. Na hora, perdi os sentidos. O incidente aconteceu quando meu pai
estava a limpar uma jaca para eu comer. Na época, para tirar o leite da fruta das mãos as
pessoas usavam querosene. Então ele passou o querosene nas mãos e em um minuto que foi
até a pia enxaguá-las, tomei o querosene. Ao perceber que eu estava desacordada, meu pai me
26
levou para uma emergência particular, onde fiquei sete dias no Centro de Tratamento
Intensivo (CTI). Para receber alta do hospital, o pagamento da internação deveria ser
efetuado. Sem condição financeira para pagar os gastos, papai pegou o dinheiro emprestado
com um colega de serviço. Depois, para liquidar a dívida de uma só vez, papai ficou um mês
sem seu salário. Papai nunca comprava fiado ou fazia prestação, muito menos, dívida. Era um
homem de grandes valores, de boa conduta. Tinha um caráter irrepreensível e uma
experiência de vida que só Deus pode conceder, com inteligência e sabedoria brilhantes.
Quando completei um ano e oito meses, dei mais um susto em todos: dessa vez caí em
uma vala de esgoto. Existia em minha casa um cachorro mestiço chamado Dick. Ele passou
por mim e me derrubou na vala, onde fiquei submergida. Todos me procuraram e rápido me
encontraram. O que aconteceu? Fui levada para o hospital para fazer uma lavagem estomacal,
pois ingeri muita água de esgoto. Eu não era uma criança levada, apenas era muito ativa.
A situação econômica em casa não era muito boa, o que obrigava meus pais a
trabalharem, mas sempre recebi deles muito carinho e amor. Dialogávamos muito e sempre
me contavam histórias, em especial as bíblicas. Meus pais não tinham condições de comprar
muitos brinquedos, mas me presentearam com um boneco chamado “para-pedro”, todo em
plástico e que não se mexia.
Sempre ao ver a imagem do boneco, choro, não de tristeza, mas por sentir falta de um
tempo que não volta mais. Aos quatro anos de idade, brincava com pregadores de roupa como
se fossem bonecas. Eu os cobria com folhas e flores, que, na minha imaginação, eram as
roupas. Lembro-me somente de um evento comemorativo, o Natal, em que ganhei um
joguinho de madeira. Esse joguinho continha uma caminha e um guarda roupa, então, fazia
dos pregadores bonecas para brincar com esse joguinho.
Tive contato muito cedo com a inclusão. Em vários momentos de minha infância,
recordo o engajamento e força dos meus pais para estudarem, mas não tinham como
frequentar as aulas, porque precisavam trabalhar. Meu pai era analfabeto e mamãe tinha
somente a terceira série. Com o auxílio da minha mãe, conheci as primeiras letras. Como eu
era de família muito pobre, a vida não era fácil. Porém, isso nunca foi pretexto para meus pais
me tratarem mal, pois sempre me corrigiam com muito amor e carinho. Muitas vezes, não
tínhamos o que comer, no entanto, Deus sempre proveu tudo de uma maneira especial.
Minha mãe começou a me alfabetizar em casa. Primeiro, me ensinou as vogais, depois
as junções das sílabas, até formar algumas palavras e o meu nome. Ela não queria me colocar
na escola antes de me ensinar o pouco aprendido quando criança. Seu sonho era me matricular
27
na escola já com algum conhecimento. Meu pai, sabia os números e matemática. Ensinava-me
a contar com pedrinhas.
Lembro-me da cartilha com as folhas amareladas, letras grandes e um desenho com
referência a cada consoante. Achava interessante o processo de leitura, mesmo sendo muito
lento, no meu caso, pois mamãe e papai não tinham muito tempo, trabalhavam muito. Hoje,
consigo ver como eram grandes o amor e a vontade de me ensinarem, apesar de mamãe ter
apenas a terceira série e papai não saber ler. Nessa época, nem assinar o nome ele sabia.
Minha mãe voltou a estudar aos 59 anos, fez a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Concluiu
o ensino médio com 64 anos. Conquistou êxito através dos estudos, ainda na idade avançada.
Aos cinco anos de idade, eu tive hepatite. Minha mãe trabalhava muito e quem tomava
conta de mim era minha irmã Nice, com apenas dez anos. Minha “mana”, ou Nice, como
gosto de chamá-la, era muito carinhosa comigo. Não brigávamos. Mamãe sempre falava:
Irmãos nunca brigam. Até o dia de hoje, nunca briguei com nenhum deles.
Aos sete anos, passei, talvez, pela maior dor da minha vida, ao sofrer por preconceito,
discriminação e humilhação. Tive dois furúnculos nas nádegas, um em cada lado, por conta de
uma injeção vencida. Na época, não tinha o controle de prazo de validade. Mamãe trabalhava
no apartamento de Dona Camila e Senhor João, um diretor de banco. Eles eram ricos e tinham
duas filhas com a minha idade. Eu e minha mãe subíamos pelo elevador dos funcionários e,
em seguida, entravamos pela porta da cozinha do apartamento. Não era permitido aos
empregados a entrada pela porta da sala principal. Eu ficava no corredor da cozinha, perto do
banheiro, ou no quarto das empregadas, deitada. Não havia a possibilidade de ficar sentada e
não podia ficar com meus irmãos. Era necessário fazer os curativos e trocar os drenos três
vezes ao dia e só mamãe conseguia fazer, com todo o seu carinho. Assim doía menos.
Com um tempo, comecei a entender o porquê de não poder brincar com as meninas,
nem ir até à sala, eu era a filha da empregada. Hoje, imagino o que minha mãe sentiu em seu
coração, durante o mês em que me levou com ela e via toda aquela humilhação. Nesse tempo,
no ano de 1975, comecei a estudar na Escola Ana Laura, no curso da Classe de Alfabetização.
Minha professora, Joana, era muito atenciosa e comprometida. Durante todo o tempo que
estive doente, ela me mandou as atividades de casa e as que foram ministradas em aula. Era
uma excelente professora.
No mesmo ano aprendi a ler e escrever. Minha mãe era faxineira da escola e eu não
tinha muitos amigos, era a filha da faxineira. Ninguém queria brincar com a filha da faxineira
da escola. O diretor da escola, gostava muito de mim, me colocava em seu colo e me
28
auxiliava nas lições, todos os dias, enquanto eu esperava minha mãe limpar e arrumar as salas
de aula para o outro turno. Fiquei nesta escola até o 2º semestre da quarta série.
Foi um ano de muitas lutas, mas recebi meu maior presente: fui batizada na Igreja
Batista em Centenário, RJ. Frequentei essa igreja, como membro, a partir dos meus três anos,
porque nos mudamos para perto do local onde estava instalada. Quando nasci, minha família
frequentava a Igreja da Vila São Luiz, RJ, mas, foi na Igreja Batista em Centenário que passei
todas as minhas fases: infância, adolescência, juventude e fase adulta. Gostava de tudo,
principalmente da minha professora da classe da Escola Bíblica Dominical (EBD), Dona
Beth, que, até a data de hoje, ainda é professora da classe de EBD na igreja. Essa é, para mim,
a maior e melhor escola da vida.
Nesta mesma igreja, anos mais tarde, conheci meu esposo, Geraldo. Tivemos dois
filhos, Mateus e Lucas, que também nasceram1 nesta igreja. Coincidentemente, Dona Gilsa,
foi também professora do meu esposo, Geraldo, e dos meus filhos. O conhecimento de Jesus,
que me foi ensinado desde o ventre2, e a minha educação são, para mim, a maior herança
deixada por meus pais e que repassei para meus filhos.
Ainda em 1975, minha irmã Leninha, a primogênita, casou-se. Já bem instalada, com
casa própria, ela ofereceu uma parte de seu terreno para meu pai fazer a casa dele, assim ele
não precisaria mais pagar aluguel. Com muito esforço e com a infinita graça de Deus, meu pai
fez a casa sozinho, pois não havia condição alguma de pagar um ajudante de pedreiro. A casa
era pequena e linda, na cor branca. Ela possuía quatro cômodos: um banheirinho, uma
cozinha, uma sala de estar e um quarto. Tinha um pequeno quintal com roseiras e outras
plantas, e árvores frutíferas. Antes dessa casa, nós só morávamos em avenida. No Rio de
Janeiro, avenidas são várias casas juntas em um só lugar, parede com parede, sem privacidade
alguma. Minha irmã me levava para passear. Meus pais nunca tinham condição de me levar
nem ao parque. Quando criança, nunca fui ao parque ou à praia com meus pais.
Com minha irmã Leninha e meu cunhado Moa, íamos à praia quase todos os
domingos. Com dois anos de casado, meu cunhado foi transferido para Salvador. Nessa
época, já havia nascido meu primeiro sobrinho. Foi muito triste a notícia da mudança, mas
eles partiram e nós ficamos. Continuamos no terreno até a nossa vinda para Mossoró. Hoje as
casas estão do mesmo jeito e alugadas.
1
Desde o momento em que estavam sendo gerados em meu ventre, os meus filhos já iam à mesma igreja.
2
Segundo minha mãe, ela já orava por mim e me ensinava os princípios bíblicos quando eu ainda estava em seu
ventre.
29
Já nos meus oito anos, ainda no Rio de Janeiro, meu pai construiu uma pequena venda
no quintal, para nossa manutenção. Eu ajudava a fazer as contas e a conferir as mercadorias.
Acordava às 4h30min para pegar os pães na padaria, para vender às 5h. Ficava na barraca
para atender os fregueses e, ao mesmo tempo, estudava. Mamãe explicava que eu tinha que
estudar para ser alguém na vida. A tabuada tinha que estar na ponta da língua.
Nessa época, minha brincadeira era imaginar que eu trabalhava no banco. Fazia a
borracha de carimbo e contava as moedas. Sonhava em ser caixa do banco. Mas o meu maior
sonho, realmente, quando eu era pequena, era ter um orfanato ou um asilo. No dia das
crianças, nós e as pessoas da igreja, da qual éramos membros, visitávamos o lar Batista, um
orfanato, em Rio Bonito, RJ. Havia muitas crianças no local e toda a igreja participava da
festa. O orfanato era localizado em um terreno grande, com aparência de um grande sítio e
uma enorme casa. Me sentia livre e muito alegre, brincava durante todo o dia com muitas
crianças.
Não me importava com a hora nem com o lugar, eu pulava sempre da cama, em casa,
pronta para enfrentar o dia, no começo nem sempre foi fácil, mas cada desafio apenas tornou-
me mais forte e admiradora da vida. Estudava e ajudava meus pais na pequena venda. Como
trabalhava muito, não tive tempo de gravar nomes nem imagens dos professores com quem
estudei. Durante todo o meu tempo de ensino, desde o pré-escolar até a primeira faculdade, só
me lembro de uns quatro professores. Ia à escola, mas os meus pensamentos estavam muito
longe. Estava preocupada com a pequena venda e em ajudar mamãe e papai a fazerem as
contas dos fregueses.
Aos dez anos, em 1978, fui passar alguns meses em Salvador para ajudar minha irmã,
com meus quatro sobrinhos. Ela já tinha quatro filhos: David, Priscila, Junior e Leo. Quando
cheguei, minha irmã me matriculou na escola Nossa Senhora da Luz, que tinha um ensino
muito mais desenvolvido que na escola em que estudei anteriormente. Não conseguia
acompanhar o ritmo e as diretoras eram grosseiras. Quando terminei a quarta série, retornei
para o Rio de Janeiro. Minha mãe resolveu me colocar em uma escola de porte grande e com
um excelente ensino, o colégio São José, onde cursei a quinta e a sexta série. Nessa escola,
estudavam pessoas de classe média, por isso meus pais trabalhavam dia e noite para pagar as
mensalidades e para me darem um futuro melhor. Não havia possibilidade de me matricular
em um colégio público, o ensino era muito fraco e as escolas muito perigosas, devido ao local
aonde se encontravam.
No Centro Educacional São José, em Duque de Caxias, minha experiência não foi boa.
Os alunos eram soberbos e sequer falavam comigo, eu só tinha duas amigas, Evelin e Daniele,
30
que moravam no mesmo bairro e cidade que eu. A inclusão, naquela época, não funcionava
muito bem. Fiquei nessa escola dois anos, depois voltei para a anterior, aquela em que mamãe
foi faxineira, a Escola Ana Laura. Cursei o supletivo, a sétima e oitava séries, e o curso básico
à noite, para poder trabalhar durante o dia.
Mamãe não era mais faxineira, nem empregada e não lavava roupa para fora, pois
trabalhava no seu pequeno comércio. Como eu tinha os clientes da barraca, pensei em fazer
algum artesanato para vender. Iniciei com a pintura de peças de gesso com nomes de crianças,
peças de animais e de decoração. Depois, passei a produzir cartões e enfeites para datas
comemorativas de papel vegetal. Pintava telas e fazia quadro em vidros, ainda tenho alguns
guardados. Sempre fazia essas tarefas extras no horário noturno, até às 2h da madrugada, feliz
e contente. Tinha novos projetos de vida. Me perdi na ilusão de alguns sonhos, outros ainda
estou a buscar e muitos Deus já me concedeu.
Em 1985, com 17 anos, comecei o ensino médio. Optei pelo Curso do Magistério, na
Escola Nossa Senhora Santana de Catú, na Bahia, quando fui morar com minha irmã Leninha,
agora com seus seis lindos e abençoados filhos. Fiquei lá durante um ano e meio e,
novamente, voltei para o Rio de Janeiro, quando retomei meus estudos na Associação
Fluminense de Educação (AFE). Foi uma grande luta para pagar o colégio particular, tinha
que trabalhar e estudar. Muitos professores não compreendiam as minhas faltas, porque eu
resolvia tudo para o meu pai e minha mãe. Eu queria ser professora. Como amava tudo que
fazia, aprendi a pensar em educação e a ver o que significa esforço e aprendizado. No colégio,
começamos um projeto de banda escolar para arrecadar dinheiro e permitir a oportunidade de
ajudar as crianças carentes do bairro. Era uma sensação muito boa, fazíamos ação social no
bairro e o conceito de cooperação e ajuda já era implantado em nossos dias. Já era visualizado
por nós, alunos, o desejo de cidadania, indo de encontro com tudo o que eu passei em uma
sociedade na qual tínhamos muitas lutas.
Meu êxito social veio através dos estudos. Aos dezenove anos, terminei o magistério,
mas não tinha condições financeiras para fazer uma bela festa de formatura. Em seguida
prestei vestibular para Biologia. Passei e fiquei muito alegre, mas não consegui terminar o
curso. Desisti quando faltavam seis meses para a conclusão, lamentei-me pelo tempo perdido
e desanimei um pouco. Estava sempre a lutar e o corpo não aguentava. Acordava às
05h30min, ainda madrugada. No Rio de Janeiro, a depender da estação do ano, a essa hora
ainda está muito escuro. Trabalhava manhã e tarde e estudava à noite. Chegava à minha casa
às 23h, para jantar, fazer minhas pinturas e realizar o planejamento do dia seguinte, sem
contar as compras da barraca a corrigir e dar preços.
31
3
Conjunto de habitações populares, precariamente construídas e desprovidas de infraestrutura (rede de esgoto,
de abastecimento de água, de energia, de posto de saúde, de coleta de lixo, de escolas, de transporte coletivo
etc.).
4
Selvático era o apelido do aluno, significa próprio das selvas; agreste, selvagem que não produz, não dá frutos;
bravio, sáfaro.
5
Palavras proferidas pela diretora Elisabeth em uma conversa com a autora no ano de 1987, no Colégio Estadual
Irineu Marinho, em Duque de Caxias – Rio de Janeiro.
32
apagava com saliva. Eu não sabia se chorava ou se ria, mas tinha certeza que o queria por
perto. Aos poucos, as crianças foram se chegando. Ele jamais bateu ou foi agressivo com
alguém na sala de aula. Com muita calma, conseguia aprender. Todos os dias ele me levava
até minha casa e carregava os cadernos de aula para mim. Como ninguém ia buscá-lo nem se
importavam com ele, não tinha motivo para ele querer ir para a sua casa.
Quando chegávamos a minha casa, papai sempre tinha uma garrafa de café na barraca
e pegava uns biscoitos para o garoto. Ele se sentava e comia. Ainda tenho a linda cena em
minha mente. Seus olhos brilhavam. Sua mãe nunca foi à escola e parecia ter problema
mental. Só era vista pela rua, a andar com carrinho de mercado velho, suja e com os papelões
velhos, achados no lixo, para vender. Ele não tinha pai e nunca me falaram sobre quem
poderia ser. Seu irmão era marginalizado e pulava o murro da escola, muito alto, para pegar
alimento na cozinha. Ameaçava as serventes e cozinheiras, até as professoras, mas, graças a
Deus, nunca mexeu comigo. Ao final do ano, Selvático estava asseado. Já não colocava mais
as mãos na boca e não babava, usava a borracha, não apagava mais com o dedo e a saliva. E o
mais importante, aprendeu ler e escrever, com algumas dificuldades. Mas, mediante a
situação, era um vencedor.
Mamãe e papai descobriram sobre a invasão de meninos na escola. Os garotos faziam
ameaças aos funcionários para pegarem comida, mas nunca fizeram nada comigo. Lembro-me
que, várias vezes, eu ficava com pena, pois eles invadiam a escola para pegar comida. Eu
sabia que as oportunidades não chegavam até eles, mas isso não justificava o que eles
praticavam. Eu não conhecia totalmente aqueles adolescentes, não sabia quem eram seus pais
ou se tinham pais, nem de que famílias vieram. A fome não é para roubar, quando há um
alicerce familiar muitas dessas inconveniências podem ser evitadas com amor e diálogo.
Acredito na educação familiar e que muitos dos problemas sociais são em virtude da família
desestruturada e da sociedade cheia de desigualdades sociais.
Por esses motivos, meus pais não permitiram a minha renovação do contrato para
continuar dando aula nessa escola estadual. A diretora ligou para minha mãe e disse que ia me
efetivar. Naquela época, era permitido admissão sem concurso, mesmo assim mamãe e papai
não me deixaram voltar à escola. O Selvático continuou na escola e sempre ao término do
horário escolar ia até minha casa me ver, durante anos. Já adulto, ele me encontrava e me
chamava de tia. É assim que são chamadas as professoras de classes infantis na minha cidade
do Rio de Janeiro. Selvático me dava um beijo e, nessa sua atitude, conseguia sentir o carinho
e gratidão.
33
O professor que pensa certo deixa transparecer aos educandos que uma das
bonitezas de nossa maneira de estar no mundo e como o mundo, como seres
históricos, é a capacidade de, intervindo no mundo, conhecer o mundo. Mas,
em seres históricos, como nós, o nosso conhecimento do mundo tem
historicidade.
Os anos passavam e, a cada dia, eu ficava mais animada a batalhar por mim e por
meus alunos. Mesmo diante das dificuldades enfrentadas, a superação vinha com uma força
imensa, sem fracassar pelos desdobramentos necessários para incluir em minha escola
estudantes com TDAH6, autismo e Síndrome de Down. Muitos desses alunos só conseguiriam
estudar em uma escola pequena, onde o trabalho, na época, era menor para o professor.
Entretanto, segundo Freire (1996), são as experiências e vivências de um professor em sala de
aula que proporcionam os seus avanços nos aspectos cognitivos de aprendizagem.
Com base na afirmação do autor, tinha a curiosidade, inquietude, criatividade,
humildade e persistência no processo educativo. Acreditava nas minhas convicções e
capacidade profissional. Na minha mente, vinham toda a vivência e dificuldades dos meus
pais, que acreditavam em mim e tinham a expectativa de que eu seria “alguém”, como eles
falavam, e esse alguém daria muito orgulho a eles.
Quando montei minha escola, não havia ainda a discussão em torno da inclusão, mas
eu conseguia entender a posição social dos meus alunos especiais. Eles eram sujeitos que
estavam à margem da sociedade, vistos com olhares preconceituosos ou de pena. As pessoas
agiam como se não percebessem que todos temos limitações. Toda minha trajetória deixava
visível como precisava fazer algo para esses alunos. Apesar de trabalhar todas as disciplinas,
eu me sentia na obrigação de inclui-los em todas as aulas e brincadeiras. Considerava essa
uma oportunidade de mostrar a capacidade existente em cada um, pois o meio social já era
impiedoso, haja vista a dificuldade para uma constância nos tratamentos médico, psicológico,
ortopédico, fonoaudiológico, psicopedagógico, nutricional, entre outros.
Eu proporcionava aos meus alunos aulas de teatro e as crianças com deficiência
participavam, elas eram incluídas, a fim de que fosse possível perceber as capacidades e
limitações de cada um. Tinha certeza do potencial de todos os alunos, até mesmo dos
especiais. Eles participavam dos teatros e festas com vozes e corpos, tinham a compreensão
do texto e contexto, dominavam as atividades como qualquer outro aluno e, ao final, se
sentiam seguros e com empoderamento.
Precisava, como cita Freire (1997), anunciar a possibilidade de uma educação
humanizadora e libertadora; uma educação que favorecesse meu olhar para o outro de modo
mais humano, na relação com ele. Com isso, havia em mim uma inquietação e uma
curiosidade de mostrar a todos a capacidade desses sujeitos. Infelizmente, algumas pessoas
que conhecemos ou mesmo familiares não conseguem enfrentar circunstâncias da vida e
6
Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade.
36
acabam por trazer para o outro suas verdades absolutas e preconceituosas. São pessoas que
pegam um texto como pretexto para seu contexto.
O tempo passou e, a cada dia, a minha escola progredia. As mães continuavam a
matricular suas crianças. Com muita luta, em janeiro no ano de 1992, adquirimos um terreno
em frente a minha casa, onde era a escola. Era um terreno muito grande, com uma mata muito
fechada. Meu pai limpou o local muito rápido e os sonhos e planos começaram a surgir em
minha mente.
Maravilhoso é poder sonhar, principalmente quando as memórias são de superação, de
esperança e consolo, de uma vida melhor. Como não tinha dinheiro para fazer a obra de
imediato, ficava a imaginar se teria condição de algum dia poder fazer o colégio, o asilo ou o
tão sonhado orfanato, aquele meu desejo de infância. A Foto 2 traz a imagem do terreno e do
local onde já funcionava minha escola. Em meio às lutas, em 1993, começamos a construir o
novo prédio do colégio. Era um sonho que se realizava. Trabalhava ainda mais para alcançar
os objetivos.
COLÉGIO E
Foto 3 - Terreno onde foi construído o prédio da minha escola.
MINHA CASA
TERRENO
PARA
CONSTRUÇÃO
BARRACA
CA
A minha preocupação era com o planejamento escolar, não podia deixar as crianças
sofrerem falta de conteúdo programático porque estava muito atarefada e minha vida tinha
uma rotina de quase 24h. Sempre me lembrava dos alunos e da sua dependência de uma
atenção específica e valiosa. Mas, Deus providenciou todas as coisas e conseguimos fazer o
muro. Depois, com muita luta dos meus pais, minha e do meu namorado, Geraldo, hoje meu
esposo, grande amigo e amor, construímos o térreo.
37
Eu e Geraldo resolvemos nos casar, então ele cuidou de providenciar nossa moradia.
Meu sogro, Geraldo Florio, e minha sogra, Maria José Florio, cederam uma casa deles para
que começássemos a vida a dois. Eles pintaram, fizeram os consertos necessários e, aos
poucos, compramos os móveis, eletros domésticos, eletros eletrônicos e tudo de necessário
em uma casa. Eu e minha mãe tratamos de confeccionar as lembranças do casamento, o que
fizemos com os olhares voltados para a escola e para a barraca de vendas.
Meu casamento ocorreu em 23 de dezembro de 1994, na Igreja Batista em Centenário
no RJ, a mesma onde fomos batizamos. Com muita luta, eu e meu esposo, ambos com a
mesma profissão de professor, fizemos a festa do casamento. Sempre fomos amigos, desde
criança, o que facilitou muito a nossa boa convivência até hoje. Crescemos na mesma igreja e
bairro. Nossas famílias se conheciam antes mesmo de nascermos. DEUS foi maravilhoso para
mim, tenho certeza que para ele também. É o que falamos todos os dias um para o outro.
Não foi nada fácil o início do casamento. Naquele período, todas as coisas eram
conquistadas com muita dificuldade. Casamo-nos praticamente na véspera do Natal, momento
das férias escolares. Como todo educador, pensamos nos alunos e não haveria nenhuma
possibilidade de atrasar o conteúdo dos discentes.
Em 1996, engravidei do meu primeiro filho. Nosso bebê Mateus Cota Florio veio
para nós e toda família como um grande presente. Comprei uma chupeta e uma mamadeira e
38
entreguei para meu esposo. Ele já sabia o motivo. Foi uma grande alegria para toda a família.
Com seis meses de gravidez, passamos algumas dificuldades financeiras e precisamos vender
o carro para ajudar na construção do colégio. Foi muito difícil ir trabalhar a pé e grávida todos
os dias, até os nove meses. Apesar de enjoar e passar mal todos os dias, sabia que a gravidez
estava tranquila e sem riscos, pois fiz um excelente pré-natal. Em 21 de abril de 1996 nasceu
o meu bebê, forte e saudável.
Foi uma emoção inexplicável, um presente de Deus. Filhos são herança do Senhor,
mas tinha ciência da responsabilidade que me aguardava: educar, amar e cuidar. A alegria
estava completa com o nosso bebê. Trabalhava todos os dias. Como tinha meu próprio
empreendimento não tive resguardo. Terminamos o primeiro andar do colégio e resolvemos
logo fazer o segundo andar, com muitas dificuldades. Algumas mães não podiam pagar as
mensalidades, mas nós tínhamos o dever de ajudar o outro, estar com outro. Graças a Deus
tudo era suprido.
Em 1999, fiquei grávida do nosso segundo bebê, Lucas Cota Florio. Nessa gravidez
passei muito mal. Enjoava e sentia tonturas, mas, como na outra gestação, trabalhei até os
nove meses. A felicidade estava completa, Deus me concedia mais uma benção e agora
seriam dois meninos para andarem um ao lado do outro. Dessa vez, eu tinha o colégio, os
alunos, a obra, um filho para tomar conta e, mesmo com todos os afazeres, tinha que superar e
seguir em frente. O bebê nasceu forte e saudável. Veio para agraciar e completar a nossa
família. Um grande presente de Deus.
39
obrigados a agir com o coração. Na verdade, a situação desses sujeitos e de todos os outros é
um problema dos cidadãos em geral, não só do Estado. A população carente é menosprezada e
vive à margem da sociedade. A todo instante podemos ver a vontade de lutar dessas pessoas e
só precisamos colaborar com as armas necessárias. Muitas vezes, um apoio é a pista que falta
para eles decolarem. Essas pessoas sofrem humilhações, preconceitos, discriminações, sem
contar com a falta de alimentação, carinho e apoio familiar.
Na escola, era visível, por exemplo, o preconceito de alguns em relação aos alunos
negros, ao ponto de não permitirem que se sentassem nas primeiras cadeiras das salas de aula.
Eu não entendia o porquê de tanta maldade. Comecei a colocar os alunos negros na frente e a
mostrar que somos todos iguais. Era comum o bullyng relacionado à cor, classe social e às
dificuldades de aprendizado. Na escola, isso era visto de uma forma discriminadora, o que
acabava por excluir alguns alunos do aprendizado, do conhecimento e do fazer. Desse modo,
o ser cidadão se distanciava daqueles que eram diferentes, bem como o empoderamento.
Com essa experiência, aprendi que a liberdade de cada um se fundamenta na
construção de sua cidadania através das suas vivências e expressões do pensar, falar e da
efetivação de seus direitos. Com a minha formação docente, colaborei para a construção do
meu saber fazer, saber ser e saber aprender. Com muito diálogo, sem me preocupar com
fronteira, nem com a distância entre o querer e o buscar, obtive meu espaço de saberes e
fazeres, bem como conhecimentos múltiplos para alcançar a ascensão social.
Precisamos respeitar as diferenças e fazer nossa parte, ou seja, ajudar, estar, sentir e
agir com a consciência de que todos nós somos diferentes. Com esse foco, continuei a ajudar
meus alunos e cada dia as implicações vinham para melhorar o local de aprendizado. Com a
perspectiva de fazer sempre o melhor, acompanhada de muita esperança, veio o resultado.
Nossa escola se tornou um lugar mais acolhedor e com grandes possibilidades de alcançar
ainda mais crianças. Queríamos incluir aqueles que buscavam recuperar o tempo retirado de
uma forma injusta, algo que somente é possível por acessibilidade humana.
O impacto social, geralmente, não possibilita a consistência do estudo, assim,
travávamos uma grande luta para a sobrevivência. Em outras palavras, ou se trabalha ou se
estuda; ou se alimenta ou se paga a escola. Mediante a minha realidade de vida, eu conhecia
muito bem essa situação. Na verdade, essa é a realidade de outros milhões de pessoas que
revelam sofrimento através de expressões nos rostos, no silêncio ou nas palavras jogadas ao
vento.
Com muita luta, comecei a cursar Pedagogia, um sonho realizado, mas continuava na
mesma rotina de trabalho na escola. Os anos passaram e a obra do colégio avançava tijolo a
41
tijolo, embolso por embolso e pintura por pintura. Graças a Deus, terminamos em parte os três
andares do colégio. Faltava a cobertura do terraço com uma certa urgência, devido a
aproximação do período de chuva, uma constância no Rio de Janeiro. A mobilha da escola
também era muito velha, ainda da antiga instalação. Na verdade, ela já foi comprada toda
velha, em um brechó de móveis. Nós consertamos e pintamos tudo, mas, com o passar de
todos esses anos estavam ainda piores.
Fomos, então, às compras das novas mobílias. Ligamos para a loja de móveis
escolares e, lembro-me como se fosse hoje, o nome do vendedor era Alfredo. Ele ficou tão
comovido com a situação da escola e das crianças, que parcelou em várias vezes. Quando
essas cadeiras e mesas chegaram, ninguém pode imaginar nossa alegria. Eu e meu esposo
colocamos tudo logo para as salas de aula, subimos as escadas e nem nos cansamos, a alegria
era imensa. E doamos as mobílias usadas.
Compramos TVs, videocassetes e muito mais. No decorrer dos anos, a luta era grande,
mas, a vontade de ver as coisas acontecerem era muito maior. Colocamos uma piscina para os
alunos e compramos uma Kombi para transporte, tudo com muito sacrifício. No período de
1993 a 2008 tudo ficou pronto. Foram 15 anos de luta para construir e equipar o prédio.
Em 2008, a obra ficou totalmente pronta, com exceção da cobertura de telhas. Fizemos
até o terraço e um lindo playground. Para ajudar nas despesas, vendemos nosso carro e
ficamos a pé novamente. Com a chegada do período das chuvas, tivemos mais um ano de luta,
porque chovia muito e, sem a cobertura, mesmo com laje, a água entrava pela escada e
molhava bastante dentro da escola. Fizemos uma linda brinquedoteca, arrumamos os
brinquedos e livros. Estava tudo lindo e eu havia me esgotado, esgotado de tudo.
Depois de tudo construído, de sonhos conquistados, no final de 2008, resolvi mudar de
lugar e profissão. Eu estava com alguns problemas de saúde, em decorrência de muita
preocupação e do peso que pegava, porque, na escola, subia e descia as escadas com cadeiras,
livros entre outros objetos. Nosso destino era a cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte.
As pessoas não compreendiam a nossa decisão de ir para outro lugar e deixar tudo para traz.
Era a cidade onde nasci e fui criada, mas a filha da empregada, a menina da barraca, depois de
tudo que passou, não aguentava mais. Saí do lugar onde tinha meu trabalho, a minha cidade
que tem as quatro estações que amo. Confesso tive muito medo e a apreensão era muito
grande. Exigia uma confiança cega e extrema em Deus.
Na realidade, a grande cidade geralmente facilita a nossa vida e eu sempre morei no
Rio de Janeiro. Na minha mente pensava: como será viver no interior e em um lugar onde
nunca estive? Como serão as pessoas? E os meus filhos irão se acostumar? Alimentava dentro
42
do meu ser a maravilha que seria esse novo lugar, mas, a dúvida era presente. A resistência
existia nas representações constituídas nos contextos e textos que construí durante toda minha
vida no mesmo lugar.
Fechamos a escola e viemos para Mossoró. Eu e meu esposo fomos contratados por
uma empresa prestadora de serviço para a empresa Petróleo Brasileiro S.A. Eu assumi a
função de administradora financeira e meu esposo de operador. Com o objetivo de uma
formação continuada, fizemos uma especialização em Engenharia de Petróleo e gás.
Entretanto, em nosso coração só existia a educação, mas precisamos aprender novas coisas.
Quanta dor deixar tudo no Rio de Janeiro, depois de tantas lutas. São incontáveis todas
as situações vividas. Mudar para o Nordeste, não foi fácil. Todos me falavam que iria
enfrentar a seca, passar fome, mas era a vontade de Deus. Deus falou para nós como falou
para Abraão em Gênesis (12, 1-3):
1 Ora, o Senhor disse a Abrão: Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa
de teu pai, para a terra que eu te mostrarei.
2 E far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome;
e tu serás uma bênção.
3 E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te
amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra.
Em 12 de fevereiro de 2009, chegamos a Mossoró eu, meus dois filhos Mateus aos
seus 13 anos e Lucas com apenas 08 anos, minha mãe e meu pai. Meu esposo ficou no Rio de
Janeiro para resolver as pendências da escola, nossas casas e as mudanças. Quando entrei na
cidade, foi uma grande novidade. Como vim de uma grande cidade, com trens, metrôs, ônibus
para todos os locais, muitas lojas e muito barulho, não sei explicar o que senti. Estava ciente
da vontade de Deus na minha vida. No olhar de meus filhos, um brilho de ansiedade como
seria viver em um local onde tudo era novo, uma diferença enorme de onde vieram. Em
pouco tempo, nos apaixonamos pela cidade. Comecei a procurar escola, um conservatório de
música e o curso de inglês. Nunca reclamei e tenho aprendido a amar e olhar com outras
lentes está preciosa cidade de Mossoró que Deus me deu. Um local onde fui muito bem
recebida.
Logo pedi a transferência de meus filhos da Escola de Música Villa Lobos, no Rio,
para o Conservatório de Música D'alva Stella Nogueira Freire, da UERN, reconhecido como
pioneiro no ensino formal de música em Mossoró e na região do alto-oeste potiguar. Nesse
local meus filhos se formaram músicos. Os transferi da Cultura Inglesa no Rio de Janeiro,
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para o Centro Cultural Anglo Americano (CCAA), em Mossoró RN, onde concluíram o curso
de Inglês. E os matriculei na escola tradicional curricular.
No início, foi uma grande luta para eu dar conta de todas as responsabilidades sozinha,
porque meu esposo estava no Rio de Janeiro e eu em Mossoró. Trabalhava e tinha que levar
meus garotos na escola e cursos. Foi desafiador, mas nunca pensei em desistir. Casualmente,
não ia pegá-los no horário certo, porque estava em serviço. Às vezes, eles esperavam algumas
horas e, quando chegava, dava muitos beijos e pedia desculpas. Tinham ciência da
necessidade dos atrasos para preparar o futuro deles. Sempre dialoguei muito com meu esposo
e filhos para um crescimento familiar.
Meu horário de expediente era das 07h às 17h. Durante as 24 horas do dia, ficava
sobre aviso. A qualquer momento, poderia ser chamada de volta ao trabalho. Não tenho como
contar quantas madrugadas meu sono foi interrompido. Não tinha dia hora, nem local. Foi
muito difícil passar 30 dias sem meu esposo, em um lugar desconhecido, mas no dia 12 de
março de 2009, ele já tinha resolvido tudo no Rio de Janeiro e veio para Mossoró.
O tempo passou e nossos filhos cresceram. Era hora de cursarem a faculdade. Ambos
foram aprovados no vestibular da Universidade Federal Rural do Semiárido, em Mossoró
mesmo. Mateus já terminou sua primeira graduação, em Bacharelado em Ciência e
Tecnologia (CIT), e está cursando Engenharia de Produção, e Lucas concluirá seu curso de
CIT – Bacharelado em Ciência e Tecnologia em 2018.2. Eu e meu esposo também fizemos
outras especializações e graduações.
Eu sentia necessidade de aprender mais e buscar novos horizontes. Em julho de 2008,
terminei o Curso de Bacharel em Direito, um percurso difícil. Era mais uma vitória sem
explicação, com alegria em dobro, porque fiz junto com meu esposo. Concluímos juntos essa
graduação. Foi um presente para nós, nossos filhos e familiares. Fizemos a formatura, porque
tanto eu como ele, na outra graduação não tivemos condição financeira de fazer as festas de
formatura.
Foi uma experiência única, vislumbramos um êxito conquistado por meio dos estudos
e a cada dia melhoramos nossos conhecimentos, aprendemos mais. Vivemos uma nova
perspectiva em limites e possibilidades, com uma visão ampla das nossas convicções. Temos
a oportunidade de fazer mudanças e buscar sempre o inacabado. Ao partir para um novo
paradigma e um novo conhecimento, muito diferente de uma pós-graduação que fiz em
petróleo e gás, somente para eu adquirir conhecimento para uma nova profissão, pude ter uma
análise muito melhor de conhecimento. As novas experiências, um novo pensar me
possibilitaram rever a minha vida e existência, me tornaram um sujeito de melhor
44
entendimento para vida. Continuo a lutar sempre, sem desistir. Tenho buscado persistir e ver o
mundo de outra maneira, mas, sempre priorizo aquilo que Deus me proporciona, porque é o
melhor.
A alegria no olhar da aluna valia a pena. Cada minuto e instante dedicado, fortalecia a
crença de que tudo ia dar certo. Valeu a pena investir não só na Juliana, mas em nosso eu, em
nosso fazer, em nosso olhar para as dificuldades como desafios. Aguardar com paciência,
dedicação e, simplesmente, com muito amor foi gratificante. Ela nos ensinou momentos
prazerosos e únicos. Devemos guardá-lo dentro do peito para compreender o verdadeiro
significado de aprender a ser, aprender a fazer, aprender a conhecer. O dia a dia na escola era
de permanente desafio para todos nós profissionais da educação, não só diretores, professores,
e ajudantes, mas também o porteiro, as merendeiras, as serventes. Crescíamos na medida em
que a responsabilidade crescia. As descobertas surgiam e, a cada dia, estávamos a nos
qualificar, a nos tornar conscientes da responsabilidade, a nos tornarmos pessoas melhores,
para um futuro de desenvolvimento e esperança, um desafio para grandes aprendizados, com
muita dificuldade.
Recebemos outro aluno com deficiência. Seu nome era Flávio e tinha 10 anos de
idade. Ele apresentava dificuldades intelectual e motora, mas era muito alegre. Não podia ser
contrariado, porém, com muita atenção, descobrimos seu gosto pelo teatro. Para o seu melhor
aproveitamento, ele foi colocado no grupo teatral escolar e pedimos para ele estudar a matéria
que seria aplicada pelo grupo. Usamos a interdisciplinaridade entre o teatro e os conteúdos
programáticos aplicados em sala de aula. Assim ele conseguia estudar e aprender. Isso foi de
grande valia para ele e um enorme prazer para nós.
Essa experiência foi fantástica. Flávio começou a aprender através do teatro. Aos
poucos, ele construía sua educação e cidadania. Lembro-me de uma frase que ele falou:
“Agora tia, eu sou gente!”. Ele mencionou que sua mãe sempre falava isso para ele. Em nossa
conversa, expliquei a ele sobre a importância da sua vida para todos nós. Disse que ele era um
menino lindo e alegre, inteligente, e um grande ator. Ele falava muito bem sobre a matéria,
era muito estudioso e tinha uma grande capacidade de aprender, muita potencialidade.
A convivência com Flávio me permitiu perceber que a educação inclusiva deve
acolher a todas as pessoas, sem exceção, respeitando as diferenças e garantindo o direito à
educação (MANTOAN, 2006). O trabalho com esse garotinho reforçou minha concepção de
que devemos realmente lutar para que esses direitos sejam, de fato, respeitados e efetivados.
De repente, eu me vi acolhendo e incluindo crianças como meus alunos, sem discriminá-las.
Não posso deixar de falar sobre as dificuldades de muitos alunos com a matemática. Os
professores estavam preocupados como ensinar as quatro operações: somar, dividir,
multiplicar e diminuir. Como a escola ficava em um local de classe baixa, pensávamos em
alguma didática para trazer resultado e ajudar as mães, porque muitas delas não conseguiam
47
ajudar nos deveres de casa. Mandamos, então, o comunicado com o aviso de que, duas vezes
no mês, as crianças teriam aulas de matemática no supermercado. Elas iriam e voltariam com
a Kombi da escola, só seria necessário que levassem qualquer quantia em dinheiro para
comprar algo. Andávamos no mercado e as crianças escolhiam o que comprar, assim tinham o
contato direto com as quatro operações por meio do lúdico. Elas aprenderam a mexer com o
dinheiro e, ainda, utilizamos a interdicisplinaridade.
Usamos a pedagogia da matemática, a pedagogia social, de modo que os alunos
podiam usar as quatro operações na prática, como sujeitos dessas operações, com uma lista de
compras. Com os professores, trabalhamos alguns autores, entre eles Paulo Freire. Cada um
com a sua leitura, com uma linguagem significante, viva. No começo, os professores acharam
uma ideia muito delicada tirar o aluno da escola e dar aula dentro do mercado. Para eles era
algo irreal. Com o passar do tempo, se acostumaram, foi só uma questão de organização. Com
a brincadeira aliada à aprendizagem logo veio o grande resultado.
Entendo esse momento como oportuno para explicar que, às vezes, colocamos
dificuldades em tudo, como se não houvesse outras pessoas com dificuldades e impedimentos
maiores que os nossos. Falamos como se somente nossa vida fosse difícil. Esquecemo-nos de
ouvir as narrativas de outros sujeitos, de participar das histórias de outras pessoas. Ao agirmos
assim perdemos a oportunidade de saber que a vida de todos é uma constante luta, cada um
com suas dificuldades e muitas histórias diferentes das nossas.
Devemos vencer os obstáculos com zelo, dedicação, amor, alteridade e
empoderamento para chegarmos ao nosso objetivo. É necessário entender que a nossa
formação é continuada e que devemos quebrar o modelo padronizado quanto aos nossos
conceitos. Precisamos reconhecer o nosso objetivo e lugar dentro da sociedade, sabermos que
somos sujeitos da nossa história, formadores de opiniões.
A minha consciência crítica, adquirida pelas minhas experiências, me permitiu
enxergar que o educador não é somente aquele que educa, mas também o que é educado.
Segundo Freire (1981, p. 79), “[...] ninguém educa ninguém, ninguém se educa a si mesmo.
Os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo.” Freire nos conduz ao
entendimento de que somos seres inacabados e inconclusos, formados na convivência com o
outro, na relação de troca de saberes. Para ele, não sabemos tudo, sabemos algumas coisas.
Por isso, estamos sempre construindo um novo saber. Nessa construção, sempre aprendemos
alguma coisa e sempre ensinamos algo uns aos outros.
Nesse contato que tive com crianças especiais, alguns alunos com TDAH (Transtorno
do Déficit de Atenção com Hiperatividade), pude ver que eles tinham muitas dificuldades na
48
leitura, o que me motivou a tentar ajudá-los. Como ser inacabado que sou, busquei
conhecimentos nas áreas afins para aprender como lidar com esses alunos. Na tentativa de
contribuir com a superação de suas limitações, eu e os professores da minha escola
resolvemos fazer um joguinho silábico e um caderno de letras com as famílias das consoantes.
O caderno foi confeccionado com a letra de todas as consoantes em borracha EVA, para que a
criança pudesse passar o dedo formando a letra. Na mesma folha de cada letra, havia a família
de cada consoante. O joguinho, por sua vez, foi feito com uma lata de leite ninho com tampa
de plástico encapada e decorada com borracha EVA. Dentro da lata colocamos as sílabas de
cada família em pedaços de borracha para formar palavras e, no futuro, frases. Cada família
de consoante tinha uma cor. Ainda hoje guardo os modelos desses recursos.
Logo começamos a ver o resultado, as crianças desenvolveram a leitura e, depois de
alguns meses, já formavam frases. É muito bom quando agimos em favor dos outros, isso
volta como forma de benefício para a nossa própria vida e ajuda nossa autoestima. Para seguir
em frente, devemos buscar soluções para um novo aprendizado, a fim de melhorá-lo a cada
instante, isso implica na busca de uma perspectiva ampla e em uma nova leitura de mundo.
Como forma de incentivo, todos os alunos recebiam uma premiação pelos bons
resultados na aprendizagem. As premiações eram com medalhas. Cada um ganhava a sua, de
acordo com sua capacidade. Todos eram alcançados, sem discriminação ou preconceito. Nas
experiências fortalecedoras de um desdobramento enxergamos a cidadania e a cultura da paz,
sempre a colaborar com as dificuldades dos alunos e a construir um novo fazer e saber para
alcançarem um futuro melhor.
As crianças aprendiam através da música cantada e das danças, apresentadas em todas
as datas comemorativas. Buscávamos sempre trabalhar os quatro pilares da educação:
aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a viver com os outros; aprender a ser. Como
se fala, se eu quero conhecer eu desenvolvo o aprender a conviver para aprender a aprender.
Depois, aprendo a ser junto, superando muitos desafios.
A educação tem procurado um caminho no qual todos possam aprender, um modelo
universal que vise a concepção de objetos, equipamentos e estruturas do meio físico
destinados à utilização das pessoas em geral, sem necessidade de projetos adaptados ou
especializados. O objetivo é o de simplificar a vida de todos, qualquer que seja a idade,
estatura ou capacidade, bem como tornar os produtos, estruturas, comunicação/informação e o
meio edificado, utilizáveis pelo maior número de pessoas possível, a baixo custo, ou sem
custos extras. Assim, todas as pessoas, não só as que têm necessidades especiais, mesmo que
temporárias, poderão integrar-se totalmente numa sociedade inclusiva.
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A vida é muito interessante e maravilhosa quando dela não temos medo, quando
buscamos ter paz e vivemos para respeitar a Deus e a todas as pessoas. Cada um de nós temos
nossos problemas, desejos, sonhos e planos. Uns são ricos outros pobres, mesmo assim somos
todos iguais. Como cristã protestante, acredito na lei da semeadura: colhemos o que
plantamos. A luta de cada um deve ser em busca de ajudar o outro, porque cada um sabe o
quanto sofreu para alcançar seus objetivos e sonhos.
As lutas, assim como as conquistas, compõem nossas vidas e narrá-las é algo que
podemos fazer com sutil flexibilidade. Essa observação se aplica ao pensamento de Certeau
(1998), quando fala que todo relato é uma viagem, uma prática do espaço relacionada as
nossas táticas cotidianas. Toda nossa aventura, narrada de forma verdadeira ou falsa, nos faz
caminhar e produz ações e reações derivadas de lugares, na construção da cidadania. No meu
caso, as experiências vividas do meu cotidiano foram construídas em lugares que marcaram
os acontecimentos relacionados com a minha prática de ensino e aprendizagem. Nesse
sentido, a minha cidadania me constitui um sujeito de possibilidades com desejo de trabalhar
a inclusão na educação. Desse modo, não é possível falar em inclusão se não conseguimos
enxergar o ser cidadão. Não é somente estar com nossas obrigações sociais em dia,
precisamos buscar a cultura da paz, nos vermos no outro, estarmos com o outro.
Passei por vários percalços até alcançar minha inclusão, mas, movida pelas minhas
necessidades, eu tinha que lutar para alcançar os meus objetivos. Minha mãe e o meu pai
dependiam de mim financeiramente, por esse motivo tinha que estudar e me incluir. Nesse
percurso, descobri que falta na humanidade a sensibilidade e a consciência de que todos nós
temos o dever de ajudar o outro, de sermos verdadeiros cidadãos. A cidadania é entendida
como a prática do respeito aos direitos dos indivíduos e o cumprimento dos deveres no
Estado. Direitos e deveres devem andar sempre juntos. Inclusão, por sua vez, é o conjunto de
meios e ações para combater a exclusão dos benefícios da vida em sociedade, provocada pelas
diferenças de classe social, educação, idade, deficiência, preconceito social ou preconceitos
raciais. Inclusão social é oferecer a todos oportunidades iguais de acesso a bens e serviços.
51
Minha caminhada rumo à inclusão começou, de fato em 1986, quando completei meus
dezoito anos. Nesse momento, foi detectado um problema no meu joelho. Dirigi-me ao
hospital e, ao chegar, o médico me aconselhou a optar pela cirurgia, o que me obrigaria a ficar
cerca de três meses em repouso. Mas, as circunstâncias do momento não me permitiam parar
tudo para fazer a operação e ficar em repouso. Então eu desisti da cirurgia e continuei a
trabalhar e a viver. Quando sentia dor, o médico engessava a minha perna por alguns dias e
melhorava, continuava a subir e descer escadas, pois não tinha outra opção.
Na época, eu já havia aberto o meu Colégio Alegria do Saber, localizado na cidade de
Duque de Caxias - RJ, no bairro Centenário, onde nasci e vivi até os meus 41 anos. Devido a
minha rotina, a situação do meu joelho direito piorava a cada dia. Para não sentir tantas dores
comecei a sobrecarregar o joelho esquerdo. Este ainda não tinha nenhum problema, mas,
devido ao excesso de esforço, os dois joelhos foram comprometidos com condromalácia
patelar IV7. Essa doença é mais comum em mulheres e dividida, basicamente, em quatro
níveis, de acordo com a gravidade do comprometimento da patela8. Quem sofre com algum
grau de condromalácia patelar pode experimentar muita dor, independente do grau indicado
no diagnóstico. Por causar uma inflamação, as pessoas podem ter crises agudas de dor e,
nesses casos, necessitam de medicação.
Neste mundo, ou trabalhamos ou não sobreviveremos. Vivemos de fazer escolhas e, às
vezes, sofremos as consequências dessas escolhas. A vida é assim, sempre temos que optar
por alguma coisa em detrimento de outras. Naquele momento da minha vida, eu não tive outra
escolha, eu possuía sonhos e desejava concretizá-los. Então, mesmo com as dores, trabalhava.
Várias vezes, eu tinha que subir e descer as escadas do prédio da escola, no decorrer de 14
anos.
Com o tempo, ao subir as escadas, os dois joelhos estralavam e forçavam algumas
vertebras da coluna nas regiões do tórax, da cervical e da lombar. Em poucos anos veio o
resultado: braços e pernas dormentes. Pensei que estava com problema de coração. Meus
braços ficaram limitados a alguns movimentos. Desloquei-me para o hospital, com o objetivo
7
Desgaste na cartilagem do joelho, numa região chamada côndilo femoral, que acaba por ocasionar dor e
inflamação nos joelhos. Disponível em: https://www.saudecuf.pt/desporto/lesoes/lesoes-do-joelho/lesoes-da-
cartilagem-do-joelho. Acesso em: 23 out. 2018.
8
A patela é um osso de formato ligeiramente triangular, que fica na região da frente do joelho. Ela encaixa
na porção final do fêmur (tróclea do fêmur) e forma, assim, a articulação femoropatelar. A patela é ponto de
inserção para o quadríceps, o principal músculo do joelho. Pela sua localização, funciona como uma polia, que
facilita os movimentos de flexão e de extensão dessa articulação.
52
9
O diagnóstico foi: C4, C6, L2, a S1 mais acentuada nas raízes C5, C6 à direita e L4, L5, E L5 S1 bilateral.
Radiculopatia crônica: é a compressão mecânica de uma raiz nervosa dentro das vértebras ou nos forames de
conjugação.
53
tomar alguns medicamentos, porque os sintomas são fortes, relaxam os músculos e causam
muito sono. A solução era me acostumar com a dor e trabalhar, ou ficar de cama.
O medo me envolvia, mas me dava, cada vez mais, potencial para lutar, sem me
desestruturar. Em meio a toda essa luta, encontrei refrigério e descanso em Deus, que me deu
também forças para prosseguir. Acordo todos os dias com a consciência tranquila e com a
certeza da presença de Deus na minha vida. Ao mesmo tempo, sei que muitas lutas são
necessárias para as conquistas e vitórias, que têm um sabor de querer mais. A vitória é, pois,
um processo de concretização de uma intencionalidade de projetos de vida, uma
transformação permanente e, às vezes, imperceptível.
Aos quarenta e um anos de idade, em dezembro de 2008, quando tive de deixar meu
Estado, Rio de Janeiro, para trabalhar em uma multinacional em Mossoró, sentia muitas
dores. No ano de 2012, comecei a buscar soluções para os sintomas. Descobri que tais
patologias me tornavam uma pessoa com deficiência não perceptível, diagnóstico
acompanhado pelo preconceito, vindo, primeiramente, dos próprios médicos. Apesar dos
exames, como ressonâncias magnéticas, tomografia e ultrassom, me olhavam como se
deficiência fosse somente aquela aparente. As humilhações não pararam. Um dia cheguei no
consultório de um doutor, ele me mandou andar de um lado para o outro e me falou: “você
está ótima”. Com esse resultado, solicitei ao mesmo médico o atestado para eu voltar a
trabalhar, entretanto ele me falou que não seria possível me conceder o atestado, pelo simples
motivo de discordar que as patologias acusadas nos exames fossem um tipo de deficiência.
Consultei-me com vários profissionais especialistas nas áreas de ortopedia e
reumatologia. Lutava para que não fosse verdade, mas não obtive diagnósticos contrários.
Mesmo assim, a busca era constante por outro parecer, com médicos diferentes. Eu tinha
esperança de que os três médicos consultados estivessem equivocados nos laudos, ou que
falassem o que eu queria ouvir. No ano de 2015, fui a um especialista no Rio de Janeiro para
obter o resultado mais preciso, porém, o laudo foi o mesmo.
Resolvi, então, em meio a muita rejeição, admitir a minha deficiência. Quando os
médicos me proibiram de trabalhar, porque eu não podia mais subir e descer escadas, causar
impacto nos joelhos e pegar peso, fiquei muito triste. Fui acostumada a trabalhar desde os sete
anos de idade, época em que comecei a ajudar meus pais, e no auge dos quarenta e quatro
anos receber essa notícia não foi fácil para mim. Meu corpo e minha cabeça não admitiam
ficar parada sem fazer nada. Deparei-me, então, com uma luta constante de conscientização.
No início, sentia muitas dores nos joelhos, coluna e braços. Hoje, estou aprendendo a lidar
com a deficiência e com as dores. Atendo às recomendações solicitadas pelo médico e
54
procuro não forçar os joelhos e coluna para não agravar ainda mais o problema. Pelo fato de
não poder trabalhar, resolvi estudar. Foi nessa busca de uma formação continuada que se deu
o meu encontro real com a inclusão.
Ainda no ano de 2015, tentei uma vaga para aluna especial do Programa de Pós-
Graduação em Educação (POSEDUC), da Universidade do estado do Rio Grande do Norte
(UERN), que se relaciona à Linha de Pesquisa Práticas Educativas, Cultura, Diversidade e
Inclusão. De início fui aprovada para a disciplina “Memória, Formação e Pesquisa
(auto)biográfica”, que será detalhada no próximo tópico deste capítulo. A professora
responsável era Ana Lúcia Aguiar. Mas meu maior interesse era pela disciplina “Tópicos
Especiais na Perspectiva da Educação Inclusiva”10, ministrada pela mesma professora. Então,
em 2016 me inscrevi para aluna especial nessa disciplina e fui aprovada. No decorrer das
aulas, me deparei com diversas pessoas em situações mais graves que a minha. Isso fez com
que eu despertasse para um novo horizonte.
Participei de eventos como seminários, congressos, a fazer artigos. Queria só um
espaço para participar, poder ouvir, estar ali, conquistar aos poucos meu espaço com
humildade, despojamento e muita dedicação. Buscava melhorar e aprender a cada dia.
Precisava estar no meio da educação novamente, sentia muita falta de estar em sala de aula, a
ensinar e aprender.
Através das aulas e seminários sobre Paulo Freire, bem como das narrativas
autobiográficas de sujeitos com deficiência que vinham participar das aulas e seminários,
pude ver a transformação. Eles me mostraram um novo caminhar dentro do ensino e
aprendizado de vida e pude compreender como os sujeitos com deficiência são capazes de
construir sua cidadania, conscientes de seus direitos. O exemplo desses sujeitos me fez ver
que o ser humano está inacabado, podendo aprender sempre, além do que se espera.
Conforme Freire (1996, p. 55): “Na verdade, o inacabamento do ser inconcluso é próprio da
experiência vital. Onde há vida, há inacabamento. Mas só entre homens e mulheres o
inacabamento se tornou consciente. O inconsciente do ser humano.”
Ao participar das aulas do Mestrado, tomei consciência desses ensinamentos para o
meu crescimento. Estudar foi uma forma de superar minhas dificuldades, de estar viva, pois
nada estava acabado. As dores faziam parte das aulas alegres ministradas pela Professora Dr.
10
Mestrado em Educação, do Programa de Pós-Graduação em Educação (POSEDUC) da Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte (UERN) que se relaciona à Linha de Pesquisa Práticas Educativas, Cultura,
Diversidade e Inclusão.
55
Ana Lúcia Aguiar, responsável pela disciplina. Muitas vezes, as dores foram esquecidas e
superadas pelas diversidades de aprendizado.
Foto 7 - Professora Ana Lucia Oliveira Aguiar e eu, na UERN, em sala de aula.
produção desse outro. É um caminho que vai pelo toque do coração para ensinar a não pensar
só em nossa individualidade.
Aprendi que preciso dar voz aos sujeitos esquecidos, que preciso ouvi-los e fazer com
que haja mudanças em seu favor. Algumas leis sobre a inclusão das pessoas com deficiência
já foram aprovadas, como a garantia da Constituição Federal de 1988 e, agora, para melhor
fundamentação e aplicabilidade, foi criada a Lei N. º 13.146, Lei Brasileira de Inclusão (LBI),
de 06 de julho de 2015. Entretanto, podemos fazer muito mais por esses sujeitos contribuindo
uns com os outros. Considero importante a inclusão ser exercitada em todas as dimensões da
vida, seja pelo ato de oportunizar encontros, palestras, projetos, bem como pela adesão de
todos aqueles inseridos no processo inclusivo de educação.
Segundo Mantoan (2006, p. 19), “[...] na perspectiva inclusiva, suprime-se a
subdivisão do sistema de ensino. As instituições educacionais atendem às diferenças sem
discriminar ou trabalhar à parte com alguns alunos [...]”. Nesse processo, é de grande valia
ver todos engajados para o alcance de objetivos únicos: aprender a aprender; aprender a ser;
aprender a fazer.
Ainda com base nas lições de Mantoan, no decorrer da minha caminhada, tenho
percebido que a via do estudo e da educação inovadora e produtiva tem contribuído para uma
inclusão transformadora do mundo. A esperança de lutar é o caminho para adquirir uma
igualdade social, cultural e democrática, a fim de que os direitos e deveres sejam efetivados;
para que haja oportunidades para todos, sem discriminação.
No ano de 2017, no segundo semestre, com 49 anos de idade, consegui entrar para o
mestrado na UERN como aluna regular. Ainda penso estar a sonhar com essa conquista, mas
estou aqui a escrever a minha dissertação e espero não decepcionar minha orientadora e nem
todos que apostaram em mim, a felicidade é grande. A vitória de alcançar algo sonhado, não
para um melhor salário, mas para aprender. Sinto uma necessidade enorme de buscar
conhecimento.
Obtive a aprovação na proficiência, me debrucei muitas noites sobre os livros e assisti
a muitos vídeos. Foi uma emoção alcançar essa vitória, chorei muito. As conquistas têm sido
muitas. Penso em praticar a cada dia o aprender, através da leitura de mundo, e refletir os
saberes dentro do meu próprio pensamento.
As pessoas perguntam por que estou a estudar e esquentar a cabeça com estudo e eu
digo que estou vivendo cada minuto desse grande presente. Caminho e encontro a cada dia
uma razão para adquirir conhecimento e crescer sem medo. O contexto da minha vida mudou
58
tem mais jeito, quando Deus quer é assim. Respeitei e só adorei ao Senhor. Cantei durante
todo o velório, desde o recebimento do corpo até a hora do enterro, um lindo louvor de bela
letra que há muitos anos eu cantava, que foi parte da minha vida nesse momento. O louvor
restaura os corações e tranquiliza a alma e o que eu cantei assim dizia: “Tua presença me
aquieta a alma, me faz ninar como um bebê que não precisa se preocupar a minha vida
escondida em tuas mãos está. Oh, meu Deus! Em Ti eu posso descansar” (Diante do Trono-
2004). Com essa mensagem eu tive o conforto.
Nada nunca apagará as suas mãos a passarem em meus cabelos, seus beijos fraternos
e sua doce voz a me chamar de sua caçula. Gostaria que estivesse com vida e pudesse estar
aqui agora. Graças a Deus, fiz tudo por ele enquanto estava vivo. Acredito que temos que
fazer algo pelas pessoas enquanto estão vivas. Meu pai sempre falava isso.
Quando faleceu tinha 64 anos de casados. Isso me faz recordar de quando ele e mamãe
completaram 62 anos de casados. Foi um dia lindo. Fizemos-lhe uma linda homenagem no
Hotel Garbos, em Mossoró. Vieram filhos netos e bisnetos entre outros familiares. Meu pai
sentia muito orgulho da sua família. Muito tranquilo, carinhoso e de grande sabedoria, sempre
tinha uma palavra para nos ensinar, ou bastava um olhar.
Minha família é benção do Senhor, gosto muito de estar juntinho de todos eles. Não
resisto a uma conversa e a sorrisos. Amo fazer comidas e doces. Sentar-me com todos na
cama e no chão do quarto para relembrar o passado ou falar do presente e planejar o futuro.
Gosto de sair com meus sobrinhos e estar sempre junto a eles. Acredito que é isso que a gente
deixa aqui na terra quando morre: as boas lembranças, as gargalhadas a alegria de viver. Amo
estar com todos juntos no Final de ano, Natal e Ano Novo. Gosto de festas em família.
Quando papai faleceu, deixou três filhas, um filho, quatorze netos, oito bisnetos, os
esposos e esposas dos netos e netas, que também considerava netos, dois genros e uma nora.
Uma família linda, todos protestantes, até mesmo os casados com filhos e netos. Como ele
falava: “Não existe família mais linda e abençoada que a minha”.
Essa família foi constituída por um casal vindo da roça do interior do Rio de Janeiro,
da cidade de Campos, em meio aos canaviais. Pessoas simples de trabalhos braçais, como
lavoura e pesca. Quando se casaram, ele tinha vinte e um anos, sem pai e mãe. Minha mãe se
casou com dezesseis anos, sem sua mãe, tinha somente o seu pai, que continuou no interior.
Minha mãe teve a primeira filha com dezessete anos. Deus foi agiu com bondade e
misericórdia durante a vida dos dois.
Quando falo da minha família, me sinto em constante mudança, pois cada sujeito a
passar por minha vida deixa um legado. Isso implica dizer que preciso me ver nesses sujeitos
60
perto de mim. Em outras palavras, preciso exercer a cidadania, que, para mim, é fazer uma
leitura de mundo culturalmente adquirida por cada pessoa. É necessário no ser humano
respeito e dignidade, cada um com suas diferenças e trajetórias de vida totalmente inversas.
Entretanto, mesmo com as diferenças, cada um tem o direito social de viver, através da leitura
de mundo, sempre a visar seus ensinamentos adquiridos no decorrer da sua vida, desde
nascimento.
Construí uma cidadania de formação e autoconhecimento como alternativa para minha
vida, em um território de disputa, onde muitos gostariam de estar em meu lugar e não tiveram
a oportunidade. Portanto, vou abraçar essa oportunidade com prazer, satisfação e muita
vontade de vencer.
Recicriança e O Circo da Criança. Por meio desses projetos observei que ética, respeito e
dignidade são o exercício para a cidadania, construída aos poucos, no decorrer da vida.
No local do projeto Recicriança, encontramos a proposta sugerida para as crianças
participantes: aulas sobre a conservação ambiental, feitas por intermédio de replantações
nativas e reciclagem; confecção de papéis; uma linda fábrica de bonecas e bonecos usados
para orientação sexual das adolescentes. Ao sair do recicriança, direcionamo-nos ao circo da
criança, uma instituição de ensino de circo, com trapezistas, palhaços, entre outros. Através
das narrativas de um dos responsáveis, percebi a necessidade de fazer sempre mais pelas
pessoas. Narrava, com amor, todo o acontecido sobre os alunos, pais e funcionários. O projeto
atente alunos de 7 a 13 anos. Não é permitido celular, nem WhatsApp, mas o responsável
falou algo que ficou guardado em minha mente: “aqui não formamos artistas, formamos
cidadãos” (Informação verbal)11.
11
Fala proferida pelo responsável do projeto circo da criança, em Canoa Quebrada, Ceará, em 30 de outubro de
2017.
66
aprendemos florescerá, por isso, não podemos desperdiçar os conhecimentos. Temos que
acreditar sempre na educação e priorizar/ valorizar o aprendizado.
Em 2015, em todo o município de Mossoró, começaram as rodas de estudos da LBI -
Lei Brasileira de Inclusão Nº 13.146/2015, intitulada Estatuto da pessoa com deficiência.
Essas reuniões eram feitas em lugares diversos e com vários parceiros colaboradores, entre
eles entidades de educação, a associação dos deficientes, entidades municipais, estaduais e
federais.
Em 2017, com uma nova roupagem, foram ofertadas aos outros municípios as rodas de
estudo itinerantes, por meio das quais tenho aprendido sobre a LBI- Lei Brasileira de Inclusão
Nº 13.146/2015. Essa é uma ação realizada pela DAIN/UERN em muitos municípios. Trata-
se de uma oportunidade de levar pessoas competentes para falar sobre a Lei Brasileira de
Inclusão para os povos silenciados. Os encontros são realizados uma vez por mês e neles pude
perceber muitos obstáculos e preconceitos a serem vencidos, muito embora algumas pessoas
contribuam para um novo pensar e não apenas para uma nova postura.
É preciso discursar sobre educação inclusiva, o que pressupõe novas relações de
práticas pedagógicas, centradas nos modelos de aprender das diferentes crianças, jovens e
adultos. É necessário valorizar a diversidade em todas as atividades, espaços e formas de
convivência e trabalho. A cada dia que participo do projeto LBI Itinerantes percebo a
necessidade de adquirir mais conhecimentos. Tenho, também, alguns objetivos a serem
conquistados e um desejo enorme de seguir em frente, de buscar atividades cotidianas, e,
coletivamente, construir um saber de necessidades a serem conquistadas.
A Lei Nº 13.146, de 6 de julho de 2015, Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
Deficiência, assegura, em seu art. 1o,, a promoção, em condições de igualdade, do exercício
dos direitos e das liberdades fundamentais para pessoa com deficiência, visando a sua
inclusão social e cidadania. Essa lei reforça todos os direitos e garantias constitucionais. Com
efeito, precisamos nos respaldar para que haja efetivação dos direitos e as reuniões da LBI
têm me ajudado a compreender os tipos de deficiências e como, a cada instante, posso ajudar
o deficiente a galgar seu espaço como cidadão de deveres e direitos.
A LBI e a pesquisa (auto)biográfica como ponto de partida para a minha (auto)
formação, presentes em todos os eventos que narrei e muitos outros, contribuíram para o meu
crescimento, aprendizado e experiência. As aulas que cursei como aluna especial, na UERN,
na área de Formação Humana e Desenvolvimento Profissional Docente, ofertadas pelo
POSEDUC, foram essenciais para meu desenvolvimento, minha aceitação e aceitação do
outro. A primeira disciplina, “Memória, Formação e Pesquisa (auto)biográfica”, mostrou-me
67
quem sou, para que estou nesse mundo, e reativou a minha memória e vontade de pesquisar.
A segunda disciplina, “Tópicos Especiais em Educação I: Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva”, e a terceira, “Tópicos Especiais em Educação I: Educação Especial
na Perspectiva Inclusiva para a Cultura da Paz”, foram temáticas voltadas para a educação
inclusiva. A professora Dra. Ana Lúcia Oliveira Aguiar ministrou essas disciplinas que me
permitiram, através da mudança das lentes, construir uma nova leitura de mundo, em busca da
luta e do fazer.
Me encontro a cada dia com a minha (auto) biografia. Sou um ser inacabado, ainda
com muitas coisas a aprender. Alimento a conquista e a visão sonhadora para alcançar o meu
objetivo de adquirir uma percepção para maiores êxitos através dos estudos. Almejo uma
ascensão social com a busca de muitos aprendizados. A pesquisa (auto)biográfica como ponto
de partida para a (auto)formação desenvolveu em mim uma docência crítica e (auto) formação
para o aprender e o fazer. Por meio dela aprendi a vivenciar emoções e a equilibrar-me; a
transferir autonomia e identidade, com vistas a um crescimento ainda melhor da minha
conquista, do meu êxito social através dos estudos, alcançados no decorrer da minha vida.
No dia 11 de janeiro deste ano 2018, fui a Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, minha
terra Natal. Nessa viagem pude rever os amigos e encontrar uma professora da minha
juventude. Pude tirar fotos com ela, meus amigos e com alguns ex-alunos de minha escola,
hoje, casados e com filhos, bem como com os pais dos ex-alunos. Eu não tinha nenhuma
lembrança impressa dos meus professores do passado. Também encontrei com a minha
professora da EBD, Gilsa. Estive ainda na Escola Ana Laura e passei no Colégio São José.
Enquanto eu passava por esses lugares e via todas as pessoas, passava um filme em
minha memória, sobretudo sobre o que aprendi em Mossoró, na UERN, com as disciplinas do
mestrado. Todos aqueles conteúdos foram revisados por meio de tudo o que acontecia nesses
reencontros. Lembrei-me, por exemplo, dos momentos charneiras12 de descontração e alegria
mencionados por Josso (2010), que trata da (auto)biografia. Os gestos de retribuição de
carinho dos pais e mães para comigo também me relembraram o que, Halbwacchs (1999) fala
sobre a memória e instigaram-me a buscar minhas memórias subterrâneas.
Recordei os meus alunos me abraçando e o quanto eram felizes e me faziam felizes.
As preocupações, aflições e ansiedades de ajudar os meus pais, de construir meu futuro
através dos meus estudos, também foram revividas, bem como o conceito de empoderamento
12
Situações que nos levam a questionamentos quanto às mudanças na vida pessoal e/ou profissional, durante o
desenrolar de todo o processo de aprendizado.
68
mencionado por Freire (1992). Lembrei-me que, através do estudo e de todo aprendizado
venci e consegui ajudar as pessoas e ser ajudada, consegui alcançar o meu êxito social. As
lembranças passavam em minha mente como num piscar de olhos. Lembrei-me, ainda, que
aprendemos a apontar os capítulos da nossa trajetória nos momentos mais tristes e felizes da
nossa vida, e que o inacabado é necessário para uma continuação de buscar o saber.
Pude registrar, por meio de fotos, todo o momento que vivi no meu estado e cidade
onde nasci, para comparar com as fotos passadas. Desta vez, a vinda ao Rio de Janeiro teve
um olhar e experiência diferentes. Sabia a importância de cada detalhe vivido. Estive na
minha antiga casa e no meu Colégio Alegria do Saber, onde passei a maior parte da minha
vida. Muitas lembranças vieram à minha mente.
Essa viagem confirmou, em meu coração, que uma nova história Deus tem escrito na
minha vida, desde quando ele falou para mim: “Sai-te da tua terra do Rio de Janeiro, da tua
parentela para a terra que eu te mostrarei, que é Mossoró”. Nessa terra, tenho sido abençoada.
Eu não poderia contar e nem imaginar as bênçãos recebidas, tudo aquilo que Ele (Deus)
sonhou para mim. Suas mãos sempre estiveram sobre a minha vida. Tenho certeza que uma
nova história, um novo tempo Deus tem para mim. Tudo aquilo que perdi tem sido restituído.
Ouvi dele falando: Te abençoarei sempre!
Durante toda a viagem e escrita deste capítulo, percebi a importância do meu encontro
com a (auto)biografia, essa disciplina me proporcionou a ver e rever todas as histórias da
minha vida, ensinando-me a contar e narrar coisas que jamais percebi ou relatei. A
(auto)biografia me oportunizou uma viagem que jamais será apagada da memória, estando
guardada pelas linhas, fotos e contos narrados nesta dissertação.
Ao vivenciar o passado pelas lembranças, percebi que a vida é passageira e que,
muitas vezes, os obstáculos e percalços contribuem para nosso crescimento e, por isso, não
podem ser apagados da nossa memória e história. Desse modo, é importante que sempre
provoquemos a nossa memória a contar e recontar nossos casos, para que nosso futuro seja
sempre vivo em nossa mente. Para a memória lembrar quando o coração esquecer!
69
CAPÍTULO 2
Foto 11 – Prof.ª Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar em visita à Comunidade do Rosado
Neste segundo capítulo, objetivo discutir a prática inclusiva para estudantes com
deficiência e as ações da Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas (DAIN) da Universidade
Estadual do Rio Grande do Norte (UERN) para a efetivação dos direitos desses estudantes.
Em um primeiro momento, mostrarei o percurso histórico da inclusão na UERN: nas trilhas
em prol da efetivação de direitos, políticas de inclusão para estudantes com deficiência
através da ascenção social. Na sequência, refletirei a respeito das Políticas de inclusão para
estudantes com deficiência rumo à ascenção social. Uma vez conhecidas tais políticas, será o
momento de discutir as possibilidades e conquistas: superar obstáculos e quebrar barreiras
atitudinais, procedimentais e arquitetônicas. Por fim, falarei das “Rodas de Estudos sobre a
Lei Brasileira de Inclusão (LBI): Diálogos e Debates na Perspectiva da Inclusão em
Mossoró/RN”, promovidas pela DAIN.
Neste capítulo pretendo ressaltar como a DAIN tem contribuído para a formação dos
estudantes com deficiência e quais as suas alternativas à proposta de formação discente, com
o intuito de ajudar e oferecer subsídios para que ocorram possibilidades de avanços no
aprendizado e socialização desses sujeitos. Discutirei a prática inclusiva direcionada a
estudantes com deficiência e a repercussão dessa proposta na ascensão social, através da
efetivação dos seus direitos. Também explorarei os recursos de adaptação e os avanços
tecnológicos que a DAIN tem buscado para as necessidades e especificidades de cada
deficiência, no intuito de colaborar para ascensão desses estudantes dentro do campo
acadêmico e social.
A DAIN trabalha pela promoção da acessibilidade, diversidade, permanência e
continuação desses estudantes na academia. Desempenha um esforço contínuo para garantir a
acessibilidade de todos, o que exige a quebra de barreiras, sejam arquitetônicas, de
comunicações, nos sistemas de informações, bem como aquelas relacionadas aos materiais
didáticos e pedagógicos.
Sem medir esforços, a cada dia a DAIN implementa uma equipe especializada para
promover a inclusão e igualdade social no processo seletivo da Universidade do Estado do
Rio Grande do Norte. Com foco nas Garantias Constitucionais que a diretoria tem buscado
para amparar o docente com deficiência de forma acolhedora, emancipatória e incentivando
uma conquista para sua ascensão e êxito social através dos estudos, buscarei estabelecer um
diálogo de suas ações com o que determina a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
71
Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a fim de ressaltar os seus direitos e deveres,
também efetivados pela Constituição Federal de 1988, nossa carta Magna.
aquilo que está determinado na Lei Nº 13. 146/2015 (BRASIL, 2015), conforme transcrito
abaixo:
Com base nesses pressupostos legais, muitos são os programas e projetos de extensão
que a DAIN vem desenvolvendo em favor da inclusão na UERN, acrescidos das Convenções
Internacionais sobre a Educação Inclusiva das quais tem participado. Em seu relatório de
políticas e ações inclusivas referentes ao período de 2013 a 2017 (DAIN/UERN, 2013), está
registrado seu plano de trabalho, que tem como objetivo geral “[...] possibilitar aos estudantes
com deficiências acesso e participação, de forma independente, de todas as dimensões da vida
acadêmica (ensino, pesquisa e extensão) em igualdade de oportunidades como os demais
discentes, com a promoção de eliminação de obstáculos e barreiras à acessibilidade”. Visa,
portanto, a realização e efetivação de obras cujo objetivo é: promover a acessibilidade aos
estudantes com deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a superação de barreiras e
de obstáculos na construção de reformas em todos os prédios da universidade.
De acordo com o plano mencionado, a meta da DAIN é ampliar os serviços de obras
para a acessibilidade dos estudantes com deficiência em 100% até agosto de 2019, seguindo
as etapas transcritas no quadro 1, logo a seguir.
00
Foto 16 - Bengalas
tem ajudado a alcançar seus objetivos, tornando possível uma melhora em seus
desenvolvimentos. Não só a ele, mas a todos os estudantes com deficiência.
Há também os intérpretes de LIBRAS que, com zelo, desenvolvem a linguagem dos
sinais para os surdos, dando a eles o direito de estarem na graduação. Esses profissionais têm
um papel fundamental para os alunos surdos, pois sem intérpretes não seria possível esses
alunos assistirem às aulas e entenderem os conteúdos aplicados. No quadro abaixo, é possível
ver a necessidade e eficácia da formação continuada e constante na DAIN.
outros. Esses eventos procuram respeitar a cultura e as comunidades, bem como os diferentes
modos de agir e ser. Para um conhecimento plural são promovidos cursos para que todos
participem e possam buscar, a cada dia, êxito através do estudo. Os eventos fazem parte de
um cronograma de atividades para ampliar o envolvimento de todos com a educação
inclusiva, registrado no quadro 5, a seguir.
acompanhados pela equipe da DAIN: pessoas de baixa visão entre outras deficiências - que
desde a educação básica vêm sendo prejudicadas por falta de acompanhamento e profissionais
capacitados e ausência da educação adequada, pessoas com deficiência múltipla - que, ao
mesmo tempo, apresentam deficiência intelectual, baixa visão, cegos, surdos, autistas,
paralisia cerebral, deficiência física e ostomizados. Esses estudantes precisam das avaliações
ampliadas, mais tempo para responder suas provas e, muitas vezes, do acompanhamento de
um ledor, intérprete de libras, guia vidente para os cegos.
Devido ao trabalho desempenhado por essa equipe de profissionais, os estudantes
reconhecem a importância da DAIN e lamentam o fato de, na educação básica, não terem
recebido acompanhamento adequado para voarem bem mais alto. De fato, um tratamento
adequado a esses estudantes torna a academia um ambiente mais prazeroso, faz com que se
sintam amparados e, por consequência, os incentiva a buscarem uma ascensão social através
do estudo.
O ingresso desses estudantes na universidade é apenas uma das preocupações da
DAIN, acompanhada do esforço pela garantia da continuidade do estudo com qualidade. Esta,
pois, tem sido a meta da diretoria: atender estudantes com necessidades educacionais
especiais e com deficiência na instituição. Sua visão está traduzida no seguinte trecho de
Mantoan (1997, p. 121):
A política de Inclusão da DAIN floresce a cada dia, quando concede, por meio do
respeito às garantias constitucionais, a oportunidade de estudantes com deficiência trilharem
uma trajetória de aprendizado e conhecimento até obterem sua ascensão social. A fim de
manter firme seu propósito, a diretoria investe constantemente em projetos e ações de
capacitação para técnicos, discentes, docentes a fim de prepará-los para atuarem com a
Educação especial na perspectiva da educação inclusiva. Tudo é feito com uma visão global e
interdisciplinar, considerando os aspectos que permeiam a educação e temas emergentes que
constituem a sociedade e despontam como desafios no cotidiano acadêmico.
Os projetos, na verdade, são para o crescimento geral da sociedade, com o intuito de
tornar a inclusão um alvo de todos, de modo a vivermos livres da discriminação e com a
85
Dentre as ações citadas, destaco aquelas das quais tive oportunidade de participar e
que muito contribuíram para minha formação. A primeira foi o I Seminário Potiguar:
Educação, Diversidade, Acessibilidade e Direitos Humanos, realizado na Universidade
Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), realizado em 2016, coordenado pela prof.ª Dra.
Ana Lúcia Oliveira Aguiar, que junto com toda a equipe da diretoria, oportunizando-me
aprender e participar.
Este seminário e suas outras edições, tanto as anteriores como as que ainda serão
realizadas, têm como foco principal o tema “Povos do Mundo – por (entre) lugares e sujeitos
na construção de teias de significados (auto) formativos”. Com a proposta, pretende-se
abranger, de maneira intercultural, a diversidade de lugares e sujeitos com suas histórias e
trajetórias de vida e formação, página do (ERNAB).
Também participei de uma palestra da DAIN durante meu estágio com a turma do
primeiro período do curso de Pedagogia no (PARFOR/ ASSU). O curso é presencial e
destinado aos professores da rede pública da educação básica, em exercício sem formação
adequada à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB. Os professores devem se
inscrever nos cursos correspondentes às disciplinas que ministram na rede pública. A palestra
foi ministrada durante a disciplina de Gestão dos Processos Educativos da Faculdade de
86
A meta é que até dezembro de 2021 seja ampliada a participação dos estudantes,
docentes e técnicos junto aos programas de graduação e pós-graduação. Com essa
perspectiva, as ações propostas são, conforme exposto no relatório da DAIN/UERN (2013,
2017):
Por meio da DAIN, nos últimos anos, a UERN implementou a promoção da Educação
Inclusiva, tendo em vista o acesso de estudantes com deficiência e/ou necessidades
educacionais especiais, aprovados, pelo Processo Seletivo Vocacionado (PSV) e pelo
ENEM/SISU, nos diversos cursos por ela oferecidos. Hoje já são cadastros na DAIN 188
90
É bem verdade que devemos estar sempre atentos para o processo de incluir e ser
incluído. Observar-se as políticas públicas e as atitudes para cada ação inclusiva. Nesse
sentido, Viola (2008, p.55) adverte ser preciso [...] “para garantir a paz, a justiça social e a
efetivação da igualdade dentro da diferença (...) construir culturas sociais que garantam a
conquista e a preservação dos direitos de todos e de cada um”. A DAIN tem sido referência
para garantir os direitos fundamentais de todos os alunos com deficiência, ampliando a
política pública de inclusão entre municípios, estados e outros países.
Em complemento, a diretora da DAIN, Ana Lúcia Aguiar, afirma:
A cada dia ocorrem novas possibilidades e avanços fundamentais à busca por verdades
da inclusão com serenidade e planejamentos. A esse respeito Freire (1979, p. 30-31) explica:
91
Uma vez conhecida a DAIN e suas ações em favor da inclusão e continuidade dos
estudos para alunos com deficiência desde a educação básica até à universidade, me
proponho, neste momento, a analisar a trajetória da proposta inclusiva no Brasil, com ênfase
nas conquistas já efetivadas e nas possibilidades de outras ações com vistas à garantia dos
direitos das pessoas com deficiências e à sua ascensão social por meio dos estudos.
Como base teórica para essa análise me servirá a Lei Nº 13.146/2015 (BRASIL,
2015), que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa
com Deficiência) e que norteia sobre barreiras a serem superadas pelos sujeitos com
deficiências: barreiras arquitetônicas (calçadas, rampas, vagas para carros, banheiros
adaptados); barreiras comunicacionais (a falta de sinalização urbana, sinalizações internas
dos edifícios, ausência de legendas e áudio descrição na TV, entre outras); barreiras sociais
(inclusão/exclusão social de grupos ou categorias de pessoas); e barreiras atitudinais, as quais
impedem a realização de ações que promovem o aprendizado e o conhecimento humanizador,
responsável por contemplar a toda a sociedade. A lei em comento é de grande relevância para
o estudo, que tramita entre o direito do aluno com deficiências em diversas áreas: saúde,
educação, trabalho, habilitação e reabilitação, transporte, turismo, lazer e acessibilidade em
suas mais amplas especificidades.
92
De modo mais específico, busco perceber as barreiras atitudinais e, para isso, mais
uma vez recorrerei à realidade dos estudantes com deficiência acompanhados pela
DAIN/UERN. Esse objetivo perpassa pela compreensão dos processos de mudanças ocorridos
em meio a tantas necessidades para uma locomoção e um aprendizado melhor mediante as
técnicas assistivas. Nesse sentido, é importante entender que para auxiliar diretamente uma
pessoa com deficiência é necessária a aquisição de recursos definidos de acordo com a
especificidade de cada um. Lidar com o outro à sua maneira lhe proporciona maior
independência, qualidade de vida e inclusão social, haja vista que terá sua comunicação
ampliada, bem como maior mobilidade, controle de seu ambiente, habilidades de seu
aprendizado, trabalho e integração com a família, amigos e sociedade. Tudo isso pode ser
conquistado com o auxílio das novas tecnologias “adaptativas” e com “adaptações”13
necessárias.
Podemos ter como exemplo de quebra de barreiras atitudinais a DAIN. Como foi dito
nos tópicos anteriores, o objetivo geral da DAIN é possibilitar às pessoas com deficiência
acesso e participação, de forma independente, em todas as dimensões da vida acadêmica
(ensino, pesquisa e extensão), com igualdade de oportunidades entre todos os discentes e com
a promoção de eliminação de obstáculos e barreiras à acessibilidade. O modelo educacional
almejado pela Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas da UERN segue, pois, a Convenção
dos Direitos das Pessoas com Deficiência de 2006, estabelecida pela ONU (2006) que assim
determina:
13
Áreas do conhecimento e características interdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias,
estratégicas e serviços que dão mais autonomia, independência, qualidade de vida as pessoas com deficiência.
incapacidade ou mobilidade reduzida. Disponível em: www.brasil.gov.br/noticias/educação-e-
ciencias/2010/tecnologia/assistivas. Acesso em: set. 2018.
93
14
Esse foi o último censo divulgado pelo IBGE com estatística sobre a população brasileira com algum tipo de
deficiência, entretanto encontramos dados mais recentes no site do instituto referentes ao ano de 2013. Cf.:
https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pns.
94
Com a consciência de que somos todos responsáveis uns pelos os outros, Sassaki
(1997, p. 12) faz um apelo à sociedade para uma mudança de postura frente às pessoas com
deficiências.
[...] havia aquele olhar: vamos fazer as coisas pelo deficiente, porque ele é
incapaz e inferior, então vamos dar uma mãozinha, vamos fazer-lhe um
favor, para ajudar ele fazer parte da sociedade (modelo médico) e hoje é
preciso eliminar as barreiras físicas, programáticas e atidudinais, a fim de
que as pessoas com deficiência possam ter acesso a serviços e bens
necessários ao seu desenvolvimento pessoal, social, educacional e
profissional (modelo social)
transcorra e para que os discentes e docentes consigam alargar as suas capacidades, havendo
aprendizado e crescimento para ambos.
É claro que a inclusão, seja nas instituições de ensino ou em outros ambientes sociais,
não vai ocorrer de um dia para o outro, mas dia a dia, com a quebra de alguns paradigmas e
com a busca por mudanças e por um olhar plural. Essas mudanças, entretanto, não vêm
descritas em um manual, cada pessoa deve buscá-las. No caso de professores e profissionais
da educação, devem recorrer à formação continuada para aprenderem a lidar com a
diversidade.
Na sua atuação diária, é mister que esses profissionais procurem pôr em prática ideias
que promovam uma educação qualitativa, com o desenvolvimento de atividades conjuntas e
que favoreçam o aprendizado de todos. Isso inclui a adaptação da metodologia e linguagem
utilizadas, de modo a atingir as necessidades de todos. O resultado desse esforço será a quebra
das barreiras comunicacionais e o estabelecimento de uma boa relação professor-aluno.
É evidente que para haver troca de conhecimentos é necessária uma boa comunicação
entre as pessoas, por isso a Lei Brasileira de Inclusão 13.146/2015 (BRASIL, 2015) ou
Estatuto para pessoa com deficiência ressalta:
Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados do IBGE (2010, p. 76).
15
Sistema que consiste a Língua Brasileira de Sinais ( LIBRAS ) adaptada ao surdocego. É realizada com a mão
do surdocego em cima das mãos do interlocutor. Disponível em:
https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/a-lingua-de-sinais-tatil-como-comunicacao-e-
inclusao-da-pessoa-surdocega/37672. Acesso em: 16 mar. 2018.
98
possível ouvir os discentes com deficiência, bem como a implantação de um diálogo voltado
às suas necessidades. Tais políticas são fundamentais para a garantia de um ensino
continuado, sem que haja desistência desse discente na instituição de ensino, são, em outras
palavras, passo essencial para a quebra da barreira social.
É natural que nós, seres humanos, em nossas relações pessoais, tenhamos afinidades,
mas precisamos estar atentos à exclusão, especialmente no que se refere às chamadas
“minorias”, como os autistas e as pessoas com deficiências intelectuais. Precisamos quebrar
as barreiras e procurar estabelecer um novo olhar, respeitando e valorizando o outro e suas
limitações. Potencializar a identidade das pessoas com deficiência sem restringir-lhes as
possibilidades de desenvolvimento dos estudos para alcançar ascensão social não é apenas
papel das instituições de ensino, mas da sociedade em geral. Entretanto, as instituições
educacionais devem proporcionar uma metodologia dinâmica e com acessibilidade a todos,
dispondo de equipamentos e mobílias assistivas. Deve contar ainda com profissionais que
buscam uma educação continuada, se adequando às mudanças necessárias. Para Charlot
(2005, p.41), é preciso:
[...] compreender como o sujeito categoriza, organiza seu mundo, Como ele
dá sentido à sua experiência e especialmente à sua experiência escolar [...],
como o sujeito aprende o mundo e, com isso, como se constrói e transforma
a si próprio.
ajudando o aluno com deficiência a desenvolver, a cada dia, suas habilidades, a vencer
desafios e efetivar conquistas, a acreditarem em si mesmos.
Precisamos, acreditar na sociologia do improvável, que estuda estatisticamente
improvável no sentido da raridade, conforme Berdier e Xypas (2013). Isso implica dizer que,
através dos estudos, as pessoas com deficiências, de famílias de camada social, podem ler o
mundo com aprimoramento de uma condição de vida educacional, com expectativas de buscar
novos horizontes. Não se tornando impossível uma pessoa de classe menos favorecida e pais
analfabetos alcance a ascensão social através dos estudos. O percurso das dificuldades são
muitos, mas com determinação e vontade de quebrar os obstáculos encontrados a cada dia é
possível chegar à ascensão social através do estudos, mesmos os menos favorecidos.
16
Instituição antes nomeada Faculdade Diocesana de Mossoró. A nova nomenclatura passou a vigorar em 2019.
100
Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados divulgados pela DAIN (2018).
Os temas propostos estão ressaltados nos artigos da LBI Lei 13.146/2015, quando
remetem a buscar avanços e conhecimentos para todos que participam dessas palestras com
consciência da necessidade de divulgação dos direitos e garantias das pessoas com deficiência
e sua família, amigos e a quem interessar. Em 2017, essas Rodas de Estudos receberam uma
nova roupagem e se transformaram em Rodas de Estudos Itinerantes, que são propostas em
outras cidades próximas como Apodi/RN, Caraúbas/RN, Areia Branca/RN, Baraúna/RN,
103
Serra do Mel/ RN e Mossoró/RN. Estamos na sexta Roda de Estudos Itinerantes da LBI. Todo
mês, esse evento é realizado em um município vizinho, com uma participação significativa e
com várias solicitações de retorno. A meta é levar o conhecimento a todas as cidades vizinhas
de Mossoró. Algumas são realizadas durante todo o dia, entre elas já fomos a Caraúbas, Porta
Alegre, Serra do Mel, Apodi e Baraúnas, Areia Branca, com a seguinte programação. Pela
manhã, realizamos várias oficinas, com temas variados e almoço. Na parte da tarde,
terminamos as oficinas e vamos todos para um salão, onde há uma apresentação do que foi
ministrado em cada oficina. Depois temos uma palestra e finalizamos. Geralmente
começamos às 9h e terminamos às 17h.
A promoção dessas de Estudos Itinerantes da LBI tem suas contribuições para a
educação inclusiva no momento em que oferece palestras sobre os direitos da pessoa com
deficiência e oferece mediações entre população e judiciário. Elas permitem a aquisição de
conhecimento e busca perspectivas melhores para uma emancipação do discente com
deficiência.
A ação realizada pela DAIN e seus integrantes nos municípios vizinhos a Mossoró
representa um avanço social para todos. No quadro 8 estão as rodas itinerantes já realizadas:
No dia 25/06 2018, tive, mais uma vez, a oportunidade de participar de uma
formação continuada em Serra do Mel, realizada durante todo o dia. Palestramos em um
Minicurso sobre a Lei Nº 13.146/2015, Lei Brasileira de Inclusão - LBI.
A DAIN/UERN vem lutando pelos discentes com deficiências da UERN e por uma
sociedade na qual todos possam usufruir de oportunidades e de constante aprendizado. Os
parceiros desse projeto têm abraçado a bandeira levantada pela professora Ana Lucia Oliveira
Aguiar, é uma guerreira incansável neste trabalho, sem esmorecer um dia sequer para
assegurar o cumprimento dos direitos existentes na LBI.
Essa lei é resultado de um processo histórico, iniciado em 1989, com a criminalização
da discriminação de pessoa com deficiência no ambiente do trabalho. Em seguida, no ano de
1991, foi reforçado pela implementação do sistema de cotas (Começo de ações afirmativas).
Mais tarde, em 2008, através das Nações Unidas (ONU), foi formada a Comissão
Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência. A partir daí teve início, no Brasil, a
formulação do Estatuto da Pessoa com deficiência, a Lei Brasileira de Inclusão, aprovada no
ano de 2015.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência é um conjunto de leis que visa a inclusão
através das medidas de caráter social para a pessoa com deficiência. Passaram-se 15 anos
desde 2000 á 2015 para ela entrar em vigor. Foram realizados mais de 1.500 encontros
(audiências públicas, seminários, consultas, conferências nacionais e regionais) com ampla
participação da sociedade, de entidades e do movimento de pessoas com deficiência (LBI-
Comentada).
Cerca de 146 milhões de brasileiros são beneficiados por essa Lei, por isso a
importância das rodas da LBI avançarem a cada mês, orientando as pessoas em diversas áreas
(educação, saúde, trabalho, habilitação e reabilitação, previdência social, transporte e
acessibilidade) em sua ampla especificidade.
A equipe da DAIN/UERN tem levado esclarecimento sobre aquilo que é garantido
pela referida lei, a saber: atendimento prioritário, das estações e terminais com inclusão de
transportes coletivos de passageiros e a garantia de segurança no embarque e desembarque;
frotas de taxi com 10% de veículos acessível à pessoa com deficiência; locadoras, hotéis e
pousadas com disponibilidade de 10% dos dormitórios com acessibilidade; 3% das unidades
habitacionais públicos; 10% das vagas nas universidades para pessoas com deficiência.
Apesar dos avanços que a legislação trouxe, a luta pelas pessoas com deficiência está
se cumprindo, trata-se de uma lei nova, com muitas mudanças. Ela proporcionou alteração no
código civil brasileiro nos arts. 3º e 4º, que anteriormente narrava que as pessoas com
105
deficiências eram absolutamente incapazes de praticar os atos civis. A Lei ainda traz sanções
penais para quem descumpri-la e seus objetivos são assegurar à pessoa com deficiência
direitos, oportunidades, promoção e equiparação, acessibilidade e autonomia.
O primeiro relator da LBI foi Paulo Parim .Ele propôs a matéria em 2003. Em seguida,
a lei foi relatada por Mara Cabrilli em 2006. Em 2015 a Lei é aprovada na Câmara dos
deputados Federais por Romário Farias e segue para o senado. Segundo Farias (2015):
ART. 2º. Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento
de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. § 1º
A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial,
realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:
(Vigência) I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo; II - os
fatores socioambientais, psicológicos e pessoais; III - a limitação no
desempenho de atividades; e IV - a restrição de participação.
Do Direito à Educação
implementada por uma equipe multiprofissional e interdisciplinar, após uma análise mais
completa.
Dentro dos Direitos Fundamentais, a LBI traz artigos, quais sejam: Direito à vida,
Direito à Habilitação e à Reabilitação, Direito à Saúde, Direito à Educação, Direito à
Moradia, Direito ao trabalho, Direito à assistência Social, Direito à previdência social, Direito
à cultura, ao esporte, ao turismo e ao Lazer, Direito ao Transporte e à mobilidade. Amparados
por esse dispositivo legal e pelo apoio da sociedade, precisamos lutar pela efetivação da
inclusão e, como afirma Aguiar (2018): “[...] em meio a todos os impedimentos temos que
viver todos os dias como se fosse único”.
A Inclusão é, na verdade, um desafio, porém um desafio possível de ser divulgado.
Contudo, necessita de pessoas que queiram buscar e estar abertas às transformações
atitudinais, com melhoras a cada dia. Muitas barreiras já foram ultrapassadas, mas ainda
existem muitas que se tornam obstáculo à inclusão. Em vista disso, as Rodas da LBI- Lei
Brasileira de Inclusão Nº 13.146/julho 2015 (Estatuto da Pessoa com deficiência) vêm
orientar as atitudes de pessoas, para que sejam inclusivas, e proporcionar um ambiente
igualitário a todos, seja em família, amigos, ambientes educacionais, com atividades que
favoreçam a aprendizagem de discentes e pessoas com deficiência. Dentre as leis que
beneficiaram e beneficiam a Inclusão de pessoas com deficiências devem ser citadas:
Lei Nº 9.656, de 03 de junho de 1998. Proíbe que haja qualquer impedimento em razão
de idade ou de condição de deficiência no que se
refere à participação em planos de seguros
privados de assistência à saúde.
110
Fonte: Elaborado pela autora com base nos dispositivos legais citados. (BRASIL, 1991, 1993, 1994a,
1994b, 1995, 1997, 1998, 1999, 2000a, 2000b, 2001a, 2001b, 2002).
111
Com efeito, muitas são as leis que, a partir da Constituição Federal de 1988,
pretendem promover eficazmente a inclusão das pessoas com deficiência na escola, na família
e na sociedade. Segundo Eugênica Augusta Gonzaga Fávero (2006, p. 165) “[...] bastariam os
dispositivos constitucionais relacionados ao tema para que as pessoas com deficiência fossem
efetivamente incluídas na sociedade.” Contudo, é indispensável a busca constante pelas
políticas públicas no âmbito da educação inclusiva.
Sancionada mais recentemente, a Lei Nº13.146.2015 foi elaborada para uma Educação
Especial no Brasil. Ela trouxe inúmeras transformações que visam o progresso e jamais o
retrocesso. Mas, os debates, as discussões, os planejamentos são necessários não só no que se
refere à Educação, mas com relação a outras questões, como: atendimento prioritário,
habitação e reabilitação, saúde, moradia, trabalho, habitação profissional e reabilitação
profissional, inclusão da pessoa no trabalho, assistência social, cultura, esporte, turismo e
lazer, transporte e mobilidade, acessibilidade, informação à comunicação, tecnologia
assistida, participação na vida pública e política, a justiça, o reconhecimento igual perante a
lei, Ciência e tecnologia. Se faz necessário, portanto, que a divulgação do Estatuto da Pessoa
com Deficiência, com todos esses dispositivos de eficiência e eficácia para a pessoa com
deficiência, seja divulgado.
Hoje, em todos os estados do Brasil, há ações públicas no poder judiciário para que os
direitos de pessoas com deficiência física sejam efetivados, tornando os resultados dessa
política visíveis. A proteção constitucional da dignidade da pessoa com deficiência, está
pautada na dignidade da pessoa humana, com igualdade para todos. Como expõem Botelhos,
esteve e Pinho (2002)
CAPÍTULO 3
17
Nome de nascimento do entrevistado.
18
São aquelas que não podem ser notadas. Disponível em: http:/www.nossacausa.com/deficiências-não-visiveis.
115
José foi escolhido pela sua história de vida, persistência e vontade de seguir em frente,
sem olhar para traz. Representa um aluno com deficiência múltipla que lutou e luta para
conquistar seu espaço em uma sociedade ainda muito preconceituosa quando se trata de
deficiência não perceptível.
Sempre em busca da ascensão social através dos estudos, ele tem procurado superar os
olhares estigmatizantes. Ele assim se descreve:
Eu sou uma pessoa normal, para chegar aonde cheguei, passei por muitos
preconceitos, as pessoas nem sempre acreditam que eu posso chegar aonde
cheguei, algumas pessoas não acreditava em mim. Mais ainda a pessoas que
me ajudam uma prima e dois primos. Esses meus dois primos eles venceram
através dos estudos, alcançando a ascensão social. Um é advogado bem
sucedido outro já foi reitor de uma Universidade. Chegaram a Mossoró sem
nada. São exemplos para mim. (Narrativas deJosé, Mossoró, 2018).
Com deficiência múltipla não perceptível, José faz parte da população mundial que
convive com algum tipo de deficiência, seja ela física, visual, auditiva, intelectual, etc. Ele e
tantos outros têm batalhado por um lugar numa sociedade que enxerga como pessoa com
deficiência apenas os cadeirantes, amputados, isto é, a pessoa com deficiência perceptível.
Essa postura revela, na verdade, o desconhecimento das pessoas sobre a existência de
deficiências imperceptíveis, registradas no censo do IBGE de 2010. Segundo os dados da
referida pesquisa realizada pelo instituto, 23,9% da população possui alguma deficiência,
umas com deficiências perceptíveis, outras com deficiências imperceptíveis (IBGE, 2010).
Em pesquisa mais recente19, realizada no ano de 2013, que dá continuidade à
divulgação dos resultados da Pesquisa Nacional de Saúde, em convênio com o Ministério da
Saúde, o IBGE revelou novos Indicadores de Saúde e Mercado de Trabalho. O instituto
divulgou um plano tabular, agrupado por temas, com informações do Brasil e suas grandes
19
Pesquisa disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pns. Acesso em: 25 nov. 2018.
116
O aluno com deficiência não perceptível sofre o preconceito ainda maior quando as
pessoas não conseguem enxergar suas necessidades. De fato, é difícil a compreensão, o
entendimento e conhecimento de que nem tudo o que olhamos é o que temos que ver. Alguns
117
julgam pessoa com deficientes não perceptíveis como se estivessem mentindo todo o tempo.
São seguidas pelos olhares desconfiados.
Geralmente, as pessoas com deficiências possuem dificuldades visíveis, ou seja,
fáceis de serem identificadas, pode ser um membro amputado ou mais curto, a cegueira, sendo
necessário o auxílio de uma bengala, entre outros problemas que contam com o bom senso e a
boa vontade da sociedade e, muitas vezes, dos órgãos protetores para identificarem e
ajudarem a melhorar a qualidade de vida e a efetivar os direitos dessas pessoas.
Existem, entretanto, pessoas com deficiências menos ou não conhecidas e também
aquelas com deficiência não perceptível, mas com os mesmos direitos de qualquer pessoa
com deficiência perceptível. Isso não as tornam nem mais nem menos importantes, e elas
também requerem adequações fundamentais para melhor realizarem as suas atividades diárias.
Muitas possuem patologias crônicas e degenerativas que causam dores e desconforto,
tornando-se insuportáveis algumas atividades. Portanto, não podemos nem devemos qualificar
e quantificar as pessoas com deficiência apenas pelo olhar clínico ou crítico.
As pessoas com deficiência não perceptível são aquelas que possuem uma deficiência
diferente, cujo estado de avaliação e transtorno não pode ser notado nem diagnosticado
apenas pelo olhar. Algumas deficiências não perceptíveis acarretam transtornos e requerem
cuidados especiais como quaisquer outras deficiências perceptíveis, cada uma dentro das suas
especificidades. A seguir, são descritas as principais deficiências registradas na literatura
específica sobre o tema e sobre o sujeito da pesquisa.
20
Disponível em: http://nossacausa.com/deficiencias-nao-visiveis. Acesso em: 25 jun. 2018.
118
Deficiência Visual – De acordo com a Fundação Dorina21 ([s/d], online), “[...] essa
deficiência é definida como a perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da visão. O nível
de acuidade visual pode variar, o que determina dois grupos de deficiência”:
Ouvir as narrativas de José, sujeito desta pesquisa e com deficiência não perceptível,
permitiu-me conhecer mais de perto sua peleja pela superação e transformação aplicadas à sua
autoestima e ao reconhecimento de suas limitações visual e intelectual. Sempre atualizado e a
buscar informação, ele me contou sobre o seu percurso formativo, desde a educação básica ao
ensino superior. Revelou-me ainda os processos de adequações e amparos da equipe
multidisciplinar da instituição de Ensino Superior em que cursa o 7º período de
Administração de Empresa, a Universidade Estadual do Rio Grande do Norte.
A equipe denominada DAIN Diretoria de políticas e Ações Inclusivas não mede
esforços para ajudar no que se faz necessário. É composta pelo Setor Administrativo, que
conta com a Diretora, a Secretária Geral, Auxiliares de Secretaria; e pelo Setor de
21
A Fundação Dorina Nowill para cegos é uma organização sem fins lucrativos
e de caráter filantrópico que, há mais de 70 anos, tem se dedicado à inclusão social de pessoas com deficiência
visual. A fundação leva o nome de sua idealizadora, Dorina Gouveia Nowill, que mais do que uma fundação,
deixou a oportunidade de viver com dignidade à pessoa com deficiência visual e, às pessoas que enxergam, uma
lição de vida. Disponível em: https://www.fundacaodorina.org.br/a-fundacao/quem-somos/. Acesso em: 22 jun.
2018.
119
Sempre com a representação do eu na vida cotidiana, José sonha com uma leitura de
mundo com um olhar diferente, com respeito e saberes, desconstruindo a ideia de que a
120
pessoa com deficiência não é capaz. Muitas vezes, o preconceito que muitas pessoas possuem
as fazem não acreditar naqueles que lutam incansavelmente para a quebra de muitos
paradigmas sobre a deficiência. Assim, são vetadas as possibilidades do empoderamento e
autonomia para que seja observado o quanto a pessoa com deficiência é capaz.
A luta que vem sendo desbravada pelas pessoas com deficiência não tem sido
invalidada. Vivemos vários períodos até chegar à inclusão. O preço pago por muitas pessoas
com deficiência foi alto, mas não inútil. Somente depois da persistência foi conquistada a
vitória e não tem sido diferente desde a Constituição Federal, resoluções, decretos e leis
medindo forças para se alcançar a inclusão.
Muitas pessoas que não me conhece não sabe que eu tenho minhas
limitações, minhas dificuldades e acreditam em mim. Outras que me
conhece pensa que eu jamais chegaria onde cheguei, minhas limitações não
me impedem de querer a cada dia buscar os meus objetivos. Mesmo com
uma sociedade preconceituosa eu não desanimo, sigo em frente e sei que vou
conseguir. Mas já está bem melhor, com a Diretoria de Políticas e Ações
Inclusivas, tenho visto um grande avanço. A cada semestre vem me
ajudando. (Narrativas de José, Mossoró, 2018).
A capacidade não deve ser medida pela deficiência e sim pela potencialidade e
oportunidades que são dadas por meio de políticas públicas efetivadas pelos órgãos sociais,
educacionais e governamentais. O olhar deve ser de grande aprendizado e oportuno para
122
incluir o aluno de modo que tenha acessibilidade humana, com a contribuição de amor, afeto e
busca conciliação dos direitos e garantias em toda a trajetória percorrida por este aluno. Com
igualdade, dando a ele superação em meios aos obstáculos vividos.
José repetiu de série várias vezes e não lembra os anos em que estudou em cada
escola. Seu ensino fundamental foi na Escola Municipal Joaquim da Silveira Borges,
atualmente Escola de Arte.
Do 1º ao 9º ano foram as séries mais difíceis, porque repetia quase todos os anos. As
professoras não se importavam com José, mas seus amigos eram bons. Com tantas
dificuldades e sem apoio pedagógico, didático, nosso sujeito encontrava muitas barreiras
atitudinais, por isso não sentia vontade de ir à escola.
O reencontro com a Escola Municipal Joaquim da Silveira Borges permitiu a José
olhar para a instituição com um olhar que talvez nunca tenha tido. Enxergou que o local fez
parte de sua vida e não hesitou em falar: “eu estudei aqui, mas não era assim não. Hoje essa
escola é Escola da Arte.”
Também visitamos a Escola Estadual Jeronimo Rosado, onde José cursou o ensino
médio. Nessa época, buscou sozinho o estudo e começou a ver que tinha que fazer algo para
si. Queria vencer na vida e empoderar-se, tornando-se capaz de romper os obstáculos e chegar
à universidade. Começou, então, a sonhar e a colocar em prática seus projetos.
As vivências solitárias de José lhe deram força para a caminhada e para, a cada
instante, escrever sua história. Ao terminar seu ensino médio, começou, então, a despertar
para prestar o exame vestibular e para a conquista de emprego, mas, com o passar do tempo,
não conseguiu bom desempenho nos estudos.
Preocupado com sua dificuldade de aprendizado, o jovem procurou um médico para
tirar suas dúvidas. Pela dificuldade de aprendizado, não conseguiu fazer o exame, porque o
médico deixou de atender. Ficou muito triste com a informação dada pelo SUS (Sistema
Único de Saúde) em Mossoró e, decepcionado, ao pedirem para ir para Natal. Sem condição
financeira, resolveu procurar, em fevereiro, a prática jurídica local, para conseguir realizar os
exames pelos meios judiciais.
Quando falei que tinha necessidade especial, não queriam deixar eu entrar.
Não me davam atenção. E diziam que não tinha como fazer adequações só
para mim. No vestibular de 2013, vi minha necessidade em solicitar uma
sala especial, e um fiscal e uma banca de avaliação especial, mesmo assim
não consegui ser aprovado, os critérios foram os mesmos utilizados
anteriormente. Com muita tristeza, desisti dessa instituição. (Narrativas de
José. Mossoró/RN, julho de 2018)
126
Diante desse relato, é mister um olhar apurado para as adequações necessárias a cada
tipo de deficiência, a fim de possibilitar aprendizagens e a permanência de todos dentro do
estabelecimento de Ensino. Graças a esse olhar por parte da DAIN, o sonho de cursar a
faculdade começou aquecer o coração de José. Nesse mesmo período, arrumou um emprego
como corretor de imóveis por dois anos, mas teve que dar uma pausa para estudar. Diante das
dificuldades para estudar, apontadas por José em suas narrativas, deve ser ressaltado o apoio
recebido por alguns professores. Assim disse: “Tinha ajuda de alguns professores que se
dedicavam muito e davam uma atenção especial”.
Como Mantoan (2006, p.7) alerta, “[...] esses ambientes educativos desafiam as
possibilidades de aprendizagem de todos os alunos e as estratégias de trabalho pedagógico são
adequadas às habilidades e necessidades de todos.” Sim, é necessário que as instituições de
ensino, seja em nível básico ou superior, estejam aptas a atender as necessidades de todos os
alunos, oferecendo-lhes condições adequadas de aprendizado.
A faculdade, para José, era, novamente, o sonho de todos os dias. Sua rotina era
intensa. Acordava cedo, cuidava de sua higiene pessoal e alimentação e partia em busca do
seu sonho. Estudava no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), mas também
frequentava o Centro Regional de Educação Especial (CREE-MOS) e muitos outros lugares.
Na tentativa de compreensão do caminho percorrido e do seu cotidiano escolar, com as
suas dificuldades e possibilidades, José lembrou-se de Rosa22, uma de suas professoras nos
seus primeiros anos no ensino fundamental e, depois, no médio. A educadora lhe serviu como
uma âncora, quando, apesar de todas as decepções, resolveu mudar suas ideias e prosseguir
com a certeza de que sem estudo não ia conseguir chegar onde queria.
Sobre o estudante José, a professora Rosa proferiu as seguintes palavras:
22
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
127
A professora Rosa mostrou a José o caminho para ascensão social através do estudo,
dando-lhe a oportunidade de prosseguir, galgando seu espaço e o encorajando através dos
aprendizados que ela mesma estava tendo através do ensino a ele direcionado. Pelo caminho
da superação e da perseverança, José cursou o ensino básico e médio até chegar à UERN. Em
seu percurso foi acompanhado e assistido por vários profissionais, alguns presentes em sua
memória até hoje. Outros não se fizeram notar, devido à falta de conhecimento de uma
educação continuada voltada para a inclusão. Estes deixaram de ser contemplados com a
oportunidade de fazer parte da luta em favor da igualdade de direitos aos que almejam
estudar, mas que possuem alguma limitação.
Com efeito, ainda é preciso um grande exercício reflexivo da sociedade para se obter
um olhar inclusivo. Por essa perspectiva: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as
possibilidades para a sua própria construção” (FREIRE, 2010, p.47). Essa é uma das frases de
Paulo Freire, entre tantas outras, que utiliza para apregoar uma educação para todos.
Precisamos não só escrever ou ler essa frase, mas colocá-la em prática para oportunizar aos
alunos com deficiência experiências exitosas no seu percurso educacional.
Foi por uma iniciativa inclusiva de alguns profissionais e instituições, mesmo que
embrionária, bem como pela sua persistência e propósito, que José superou obstáculos e
conquistou o êxito em seus estudos. Após identificar sua dificuldade de aprendizado,
começou a buscar recursos para realizar o sonho de entrar na Universidade, pessoas que
poderiam contribuir de alguma forma para o seu crescimento educacional. Com planejamento
e organização vislumbrou que se fazia necessário disponibilizar mais tempo para trabalhar
suas dificuldades no Português, principalmente a escrita e interpretação e organização de
textos. Procurou, então, um professor de Redação, o qual o ajudou incansavelmente para que
pudesse fazer a redação do tão sonhado vestibular.
Hoje, José é muito grato ao professor Salvador23 pela atenção e carinho. Alguém que,
pela primeira vez, teve sensibilidade e um olhar inclusivo na vida de José. Com essas aulas
particulares, juntamente, é claro, com todos os atendimentos do CREE-MOS, ele cresceu em
aprendizados. Tornou-se dono de uma força e determinação inquestionáveis. Sua ascensão
social através dos estudos era ele mesmo quem buscava, por meio de um processo de
transformação do sujeito, do seu pensar, aprender, fazer e buscar.
Ao partir em busca de uma educação continuada, de um professor particular para
atender seus anseios em aprender, de conhecimentos, ao não desistir, José tornou-se exemplo
23
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade do entrevistado.
128
a ser seguido por todos. Não esperou que alguém fosse até ele. Mesmo possuindo deficiência
múltipla e sendo de camada popular, mesmo sem apoio da família está sempre a superar
barreiras para alcançar seu êxito. A esperança que possui o mantem alegre e muda seus
sofrimentos em coragem, amor, além de lhe proporcionar as expectativas da busca de ser
feliz.
A vida de José é como uma câmera, tem foco no que almeja para o futuro. O que lhe
importa são os estudos e a busca por boas experiências através dos seus estudos. As coisas
negativas, as trata como as fotos queimadas, que, há um tempo não podiam ser vistas, por isso
não tínhamos como sentir sua falta. Para o estudante, as circunstâncias melhores são aquelas
que ficam na memória e as coisas que não fazem sentido não se prende. Não tem medo de
trocar o roteiro e desvendar vários horizontes.
Sua mente só tem pensamentos para o futuro, o passado ficou para traz. Não há quem
possa cortar as suas asas, pois sua mente voa para a aprendizagem. Escolheu estudar e ir ao
encontro da sua ascensão social através dos estudos. Os tropeços o ajudam a crescer a cada
dia e com maturidade vai descobrindo a sua autonomia e seu empoderamento.
Quando José chegou em minha casa, me falou que tinha muita dificuldade
em redação e que precisava passar no Enem. Eu disse que ia ver a
possibilidade. A primeira coisa que fiz foi ir no local onde ele era atendido,
no CREE-MOS, para buscar informações. Lá me informei do que precisava
e resolvi dar aulas de redação para ele. A necessidade dele me deu motivos
para ajudá-lo. Ele é uma pessoa esforçada, um exemplo bonito para todos
nós. O esforço, a luta é tudo que nós precisamos nesse Brasil. Nunca se dar
por vencido, sempre indo à luta. São esses tipos de pessoas que são
129
essenciais para nós. Esse rapaz é um exemplo para ser mostrado aos nossos
filhos. Ele nunca desistiu de lutar. Não vê obstáculos que ele não possa
transpor. Que coisa bonita! Isso enche a alma da gente de orgulho, saber que
existe pessoa assim e que temos a esperança de que o mundo tem jeito. Fui
buscar um método de ensino para ele. Ele teria que praticar parágrafo por
parágrafo, sem repetir a frase. Nós não podemos ver apenas um pedaço das
pessoas, temos que ver um todo. (Narrativa do professor Salvador,
Mossoró/RN, setembro de 2018).
José ingressou na universidade no ano de 2014, após ter prestado o vestibular através
do sistema de cotas para pessoas com deficiências. Durante a realização das avaliações, com
130
uma hora a mais e em sala especial, contou com ajuda de uma ledora e de um transcritor24.
Uma vez aprovado, passou pela Junta Multiprofissional25, prevista no regulamento dos cursos
de graduação e útil para analisar a situação de alunos com deficiência, para saber se estão
enquadrados na lei de cotas durante a seleção de graduandos, e para os alunos regulares que
precisam ampliar o prazo de conclusão de curso por necessidade educacional especial.
Também são analisados pela junta os pedidos de prorrogação do regime domiciliar para
alunos doentes e alunas com licença maternidade. A Junta Multiprofissional faz a perícia do aluno
uma equipe com médicos de várias áreas, pedagogos e assistente social, psicólogo e a Diretora da
DAIN a Profª Drª Ana Lúcia Oliveira Aguiar, competentes para avaliar o aluno com deficiência
nas suas especificidades dando o parecer deferido ou indeferido. A primeira portaria da Junta
Multiprofissional foi expedida nº 128/2014 - GR/UERN em cumprimento aos arts. 74, § 1º e 152
do Regulamento dos Cursos de Graduação da UERN e foi aprovada recentemente pelo Conselho
Superior de Ensino Pesquisa e Extensão da UERN - CONSEPE. (UERN, 2018).
O aluno para passar por essa Junta Multiprofissional tem que solicitar. Ao passar por
essa equipe José foi diagnosticado como pessoa com deficiência múltipla, o que exigiu da
instituição um aparato para o seu acompanhamento, de modo que pudesse dar continuidade
aos estudos com adequações para um aprendizado continuado.
É importante salientar a visão inclusiva da UERN, preocupada em garantir o direito de
educação a todos, postura que deveria ser assumida por toda e qualquer instituição
educacional, principalmente as de base. Mesmo com o apoio da DAIN, Diretoria de Políticas
e Ações Inclusivas da UERN, os desafios no primeiro semestre foram grandes, mas, a cada
semestre, essas dificuldades (ampliações das provas ou ajuda da ledora, conteúdos a serem
explicados por professores que se dispõem a dar aulas extras após o horário para uma melhor
aprendizagem e explanação dos conteúdos) estão sendo superadas. Com o comprometimento
e seriedade da DAIN, que une forças com os professores e a vontade de estudar, José está hoje
no 7º período e faz parte dos grupos de estudo de iniciação científica pelo Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Trata-se de um órgão público que tem
o objetivo de incentivar a pesquisa no Brasil e Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica (PIBIC), financiado pelo CNPq ou pela Universidade. (PIBIC).
24
Ledores são pessoas que emprestam a sua voz para decodificar os livros para os deficientes visuais, visão
monocular, deficiência intelectual, autismo, déficit de atenção, dislexia ou discalculia. Quanto aos transcritores,
são aqueles que auxiliam pessoas com impossibilidades de escrever. Ambos podem atuar sozinhos ou em
conjunto.
25
Equipe com vários profissionais da área de saúde, abrangendo todas as deficiências, psicólogos, pedagogos,
psicopedagogos e assistente social. Cabe a essa juntar verificar o direito dos alunos que solicitam a perícia darem
o parecer do diagnóstico sobre a deficiência ou não.
131
José é orientando da professora Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar, diretora da DAIN, e
já elaborou vários trabalhos científicos Internacionais e Nacionais e Minicursos, III
CINTEDI- Congresso Internacional de Educação Inclusiva – III Jornada Chilena Brasileira de
Educação Inclusiva e Direitos Humanos. IV Seminário Potiguar – Educação, Diversidade e
Diálogos e Práticas Inclusivas, no III Encontro Regional de Narrativas (Auto) Biográficas –
ERNAB, I Seminário Nacional de Pesquisas (Auto) Biográficas e Histórias de Vida -
SENAPAHV. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte - Faculdade de Direito I
Semana Jurídica da Faculdade de Direito – SJFAD/UERN Ministração - Minicurso - Direitos
e Garantias de Estudantes com Deficiência no Ensino Superior: Alcançando a Ascensão
Social nos quais ressalta a importância do conhecimento e aprendizado através do estudo.
Com o intuito de conhecer o cotidiano de José na universidade, debruçamo-nos sobre
as narrativas de uma de suas professoras no curso de Administração de Empresas, a qual nos
concedeu uma entrevista cheia de surpresa. Segue a sua narrativa:
José foi o meu primeiro aluno com deficiência, mesmo tendo muitos
anos já na profissão. No primeiro momento, quando olhei José, eu
fiquei muito preocupada, achei que ele não tinha condição, achei que
seria difícil ele acompanhar. E era curioso que ele me falava que eu
não li o decreto, e sempre me falava isso. Aí, sim, eu fui ver e comecei
a ler. A minha preocupação era pelo próprio curso de Administração,
pela responsabilidade de colocar no mercado um administrador que,
ao sair da faculdade, exerça suas funções com competência. Este
aluno é formado pela UERN, minha preocupação era muito grande.
Depois eu fui vendo o interesse dele, o seu esforço, e fui buscar meios
para ensiná-lo. Graças à DAIN, que me ajudou a compreender a
questão, a cada dia eu via que se eu fizesse as adequações necessárias
ele seria capaz. Inclusive, eu passei uma atividade para todos da sala,
um cronograma. E expliquei para ele como fazia. Para minha surpresa,
que achava que ele ia ter dificuldade, porque é difícil, ele acertou e
outros erraram. Hoje ele não tem inibição, quando passo atividades em
seminário ele vai e fala muito bem. (Narrativas da professora Flor26,
Mossoró/RN, 2018).
26
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
132
Durante a conversa com Flor, observei que sua preocupação com José é que, ao
terminar o curso, seja um profissional competente e que zele pelo nome de sua Instituição de
Ensino. A capacidade e superação de José vêm sendo, a cada dia, uma vitória. Como Charlot
(2005) fala, é difícil o discente de camada popular chegar à universidade, mas, se ele quer
estudar ele consegue. Charlot (2005, p. 41) complementa:
Nas entrevistas com José, nem sempre ele demonstrou gostar das correções da
professora, da maneira que ela pede para que ele faça e refaça, mas ele tem ciência que é para
o seu êxito escolar. Através das experiências e aplicações de métodos didáticos e adaptações
diferenciadas, a professora busca oferecer-lhe uma melhor compreensão da disciplina. A
força, determinação e compromisso de José, um discente de camada popular e com
deficiência múltipla, foram e são fundamentais para que ele siga buscando, através dos
estudos, a sua ascensão social.
Nesse processo também tem sido essencial o acompanhamento da DAIN e sua equipe
multidisciplinar, que oferecem o acompanhamento aos docentes e alunos com deficiências, de
forma que todos que fazem parte da universidade do Rio grande do Norte a UERN estejam
preparados para receber esses alunos. De fato, o companheirismo dos colegas de turma tem
ajudado José a superar os desafios de cada dia, fazendo-o sentir acolhido e em condições de
realizar as atividades assim como os demais.
A família tem um papel em destaque para que esse aluno tenha um apoio pautado no
amor e confiança. José, por exemplo, teve algumas pessoas como espelho e prosseguiu em
frente a buscar escrever uma nova história para sua vida. E a cada dia vem adentrando em
suas trajetórias cheias de desafios e superações. Em meio a todas as dificuldades as relações
sociais o têm ajudado a conviver e crescer com as experiências vividas com o outro.
Dentro da Universidade tem alcançado êxito por meio do caminhar juntamente com
toda equipe da DAIN e Discentes. Mas ainda são grandes os desafios para cada necessidade
que surge a cada semestre. É preciso entender que família, educação, relações sociais são
destaques em harmonia para um processo de aprendizagem e para que uma pessoa com
deficiência não perceptível alcance a ascensão social através dos estudos. José superou suas
133
dificuldades e tem consolidado suas metas de reflexão para despertar suas potencialidades e
empoderamento.
27
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
135
outras especialidades. Também atua como sua parceira a Secretaria de Educação Especial
(SUESP) que oferece o apoio técnico e profissionais da educação especial. O horário de
atendimento é sempre no turno em que o aluno não estiver estudando no ensino regular. O
atendimento é preferencialmente para alunos que residem em Mossoró e cidades vizinhas, na
zona rural e urbana, como Serra do Mel, Baraúnas, Grossos, Tibal, Governador Dix Rosado,
essas cidades ficam no Estado do Rio Grande do Norte, entre outras. Portanto, só atende
alunos de escolas particulares se houver vaga.
O ideal é que o trabalho com esse público seja realizado conforme o que está
sendo desenvolvido na sala de AEEE, na escola em que o aluno está
matriculado, com o acompanhamento dos professores auxiliares. O público
alvo são pessoas de baixa renda, por isso há muita ausência nas aulas, pois
nem sempre são disponibilizados os transporte. Muitos até mesmo deixam de
frequentar o espaço, fazendo com que venham a optar pela escola regular
‘vulnerabilidade financeira’. O centro funciona no período matutino e
vespertino, tendo matriculados no período matutino 51 alunos e no
vespertino 61 alunos. Os alunos podem ser atendidos duas vezes por semana.
Esse atendimento pode ser individual ou coletivo, sempre considerando a
especificidade do aluno. O progresso dos alunos é individual, uns
conseguem melhor desenvolvimento outros não. O horário de atendimento é
de 07h00min às 11h30min e de 13h00minh às 17h30minh. Quando
solicitado pelas instituições regulares de ensino, a equipe do CREE-MOS faz
visitas a esses locais para promover palestras e minicursos ou para dar cursos
de capacitação para os professores. O centro tem orientação para familiares
professores e alunos. Em sua estrutura pedagógica possui o núcleo de apoio
pedagógico (NAP), composto por salas de recurso para produção de material
de arte e educação, informática educativa, brinquedoteca e sala de recurso
multifuncional. (Narrativas da professora Sonhadora, do CREE-MOS,
Mossoró/RN, 2018).
28
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
136
faculdade e conseguiu. Nós sempre dávamos muita força para ele. Quando
ele foi aprovado na UERN foi uma alegria para todos nós. Depois de tentar
para uma faculdade 4 vezes, particular, nós insistimos para ele ir para a
UERN, que teria o apoio para ele. O processo da Universidade particular as
vezes não tem apoio nem os meios para fazer a avalição dele. Quando eu
encontro com ele, pergunto: ‘Como está?’ Ele fala: ‘É um pouco difícil, às
vezes tenho que chegar até o professor para fazer valer meus direitos.’ José é
um estudante educado, respeitador, inteligente, disciplinado, esforçado e vai
muito longe. (Narrativas da professora Esperança, do CREE-MOS,
Mossoró/RN, 2018).
Outra instituição que contribuiu para ascensão social de José através do estudo foi o
Centro de Apoio ao Deficiente Visual (CADV), R. Ferreira Itajubá - Santo Antônio, Mossoró
- RN, 59611-070, local para onde me dirigi para ver de perto suas contribuições para com
José. Desde 1987, o local oferece atendimento a esse público, visando habilitá-los ou
reabilitá-los, facilitando, assim, seu processo de inclusão social, que requer: orientação e
mobilidade, atividade da vida autônoma, soroban, escrita cursiva, ensino do sistema braile,
137
29
Nome fictício para preservar a verdadeira identidade da entrevistada.
138
Com suas tecnologias assistivas para alunos, professores e técnicos, a DAIN tem
proporcionado um relacionamento sem barreiras entre todos que compõem a universidade.
Desse modo, os discentes com deficiências têm tido acesso garantido à informação e ao
conhecimento, bem como seus direitos respeitados. Através dos estudos e do
acompanhamento adequado proporcionado pela DAIN, os estudantes com deficiência da
UERN têm alcançando êxito acadêmico e profissional.
No anseio de conhecer mais de perto o acompanhamento oferecido pela diretoria a
José, fui até a DAIN para entrevistar sua orientadora. A entrevista com a Prof.ª Dr.ª e PhD
em Educação, também diretora da DAIN, Ana Lúcia Oliveira Aguiar, aconteceu no dia 13 de
setembro de 2018. Foi um momento de muito aprendizado.
Ao ouvir suas palavras sabias e amorosas, a todo instante me vinha à memória a frase
de José: “Ah se eu tivesse uma Ana antes! Eu estaria muito longe.” E eu faço das palavras
dele as minhas: “Na minha vida e na de muitos, a professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar tem
sido referência de possibilidades e autonomia, oferecendo-nos, com amor, zelo e
compreensão, o aprendizado de um mundo novo, cheio de experiências e saberes exitosos.”
Sobre o atendimento direcionado a José pela DAIN desde a seleção no vestibular até o
momento atual, em que cursa o 7º período do curso de Administração de Empresas, a
professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar teceu este comentário:
José é atendido pela DAIN desde 2014. Entrou na UERN ainda no sistema
PSV - Vestibular. Para o vestibular teve atendimento dos técnicos da DAIN,
para que tivesse as adequações no sentido da efetivação dos seus direitos.
139
Mossoró é o local onde ele sempre morou, pequena em tamanho, mas grande em
recepção aos que chegam de outros lugares, como eu. Uma cidade cujas riquezas de produção
são o sal e o melão. Neste lugar, ele viveu todas as suas exitosas experiências como um aluno
141
com deficiência, superando e saltando todas as barreiras encontradas em sua trajetória de vida,
buscando sempre alcançar a ascensão social através do estudo. Seguem suas palavras:
Falar da minha vida não é fácil, passei muitas dificuldades para chegar até
aqui. Comecei a estudar cedo, quando criança, mas não tinha muitos amigos.
Tive minha mãe e meu pai e dois irmãos já falecidos. Hoje tenho um irmão,
minha cunhada e duas sobrinhas. Repeti várias vezes nos primeiros anos e na
educação fundamental, não conseguia aprender, tinha muita dificuldade e os
professores não se interessavam muito para me ensinar. Não lembro muito
dos meus professores. (Narrativas de José. Mossoró/RN, junho de 2018).
A narrativa de José me remete ao passado, quando também não me lembro dos meus
professores e culpava minha memória. Até que no dia 07 de maio de 2018 a prof.ª, Dr.ª Lia
Matos Brito de Albuquerque me disse, na qualificação de minha dissertação de mestrado, que
eu não me culpasse, porque foram os meus professores que não marcaram minha vida. Na
narrativa de si, na reflexão retroagida no tempo, José descreve a decepção com a falta de
pessoas que poderiam tê-lo ajudado em estudos até o ensino médio. A falta de apoio dessas
pessoas e dos professores está presente em toda a vida escolar de José desde a educação
infantil até o ensino médio. Mas, como teve uma vida abençoada por DEUS, ele conseguiu
muitas pessoas em sua vida que substituíram essa falta e lhe proporcionaram oportunidades de
realizações e muitas conquistas. O personagem fala dessa parte da vida como se fosse uma
página virada, não devendo as lembranças serem relembradas. Sua atitude ressalta o que
afirma Halbwachs (1945, p. 49):
[...] as lembranças que nos são mais difíceis de evocar são aquelas que não
concernem a não ser a nós, que constituem nosso bem mais exclusivo, como
se elas não pudessem escapar aos outros senão na condição de escapar
também a nós próprios.
necessárias para mim. Ela me falou: ‘Porque você não vai para UERN?’ E
me explicou sobre a DAIN. Resolvi fazer o vestibular na UERN, procurei o
professor Salvador para me ajudar na redação e fui aprovado no vestibular
para Administração de Empresas. Já teve pessoas que me falaram que o meu
curso não tem futuro. Mas o mercado está aí para todo mundo, basta você ter
disciplina, objetivo e compromisso. (Narrativas de José. Mossoró/RN, junho
de 2018).
Apesar das dificuldades, algo notório na vida de José, que prosseguiu sozinho, com
muita persistência e determinação conseguiu ser aprovado no vestibular da UERN. Ele
desbravou caminhos com a esperança de alcançar o êxito através dos estudos e a ascensão
social. Conquistou essa vitória. Hoje, com a ajuda de amigos e profissionais qualificados está
a buscar novos horizontes. Sempre a desenvolver bons relacionamentos, inclusive com
pessoas que alcançaram a ascensão social através dos estudos, como advogados, engenheiros,
procura aprender cada vez mais, com o cuidado de, a cada dia, ser: prudente, independente,
autoconfiante, corajoso, otimista, carinhoso, atencioso, compreensivo, responsável,
determinado e persistente.
A política de ação inclusiva da UERN/DAIN vem disponibilizando para todos os
alunos com deficiência as tecnologias assistidas, com equipamentos especiais, softwares bem
como ajudas técnicas e profissionais multidisciplinares. É visível o crescimento dos alunos
assistidos pela DAIN, que contribui também com a sociedade, ao oferecer cursos e
profissionais capacitados para uma educação continuada.
Como se pode ver, José percorreu um longo e difícil caminho para chegar onde está.
Em uma de nossas conversas, revelou que as maiores barreiras enfrentadas por ele para a
conquista de seu sonho de ingressar na universidade foram as atitudinais, principalmente de
pessoas mais chegadas, que não acreditava nele. Já na universidade, enfrentou e continua a
enfrentar dificuldades com alguns professores, que, não acreditam que ele é capaz ou
dificultam seu aprendizado, não fazendo as adequações necessárias. Ele disse:
cumprir todas elas, como: fazer todas as tarefas ir a DAIN pedir ajuda a
LEDORA, tenho os horários da ajuda com a assistente social, psicóloga e
procuro não faltar a nenhum horário marcado. Já que eu cumpro meus
deveres e obrigações fazendo minha parte, preciso que os professores façam
as deles também que são minhas adaptações. As vezes preciso de horário
extra com o professor para uma explicação devagar. Quando eles marcam eu
estou lá sempre. (Narrativas de José. Mossoró/RN, junho de 2018).
Assim, graças a iniciativa da DAIN e do trabalho de conscientização que tem realizado entre
os que compõem a UERN, José tem alcançado médias melhores na universidade e recebido
um conteúdo programático normal.
Auditoria I 7,5/AP
Iniciação ao Processamento de Dados 8,3/AP
Teoria Geral da Administração 7,7/AP
Ano/Semestre/2016.2 Média/Situação
da equipe multidisciplinar, tem gerado o êxito dos alunos com deficiência. Ao fazer uma
análise do quadro de notas de José, é possível verificar que, apesar de todas as dificuldades
enfrentadas ao chegar à Universidade, ele tem vencido. Mesmo com suas deficiências
múltiplas, tem mostrado mudanças e alcançado o aprendizado sempre. Segundo ele:
Mesmo com problemas encontrados com as adequações, José está a cada dia
alcançando êxito a cada dia. A seguir, no quadro 11, trago algumas das produções de José,
resultado de uma educação com visão inclusiva e da determinação de um sujeito que busca a
ascensão social por meio dos estudos. Os artigos foram apresentados em eventos científicos
acadêmicos.
José tem sido um exemplo de aluno bem sucedido, o que pode ser comprovado por
meio de suas publicações, artigos e também um capítulo do livro intitulado A iniciação
cientifica como prática de reflexão crítica no ensino superior: construções e superações,
contribuindo para uma sociedade inclusiva. Tais conquistas têm dado a José e aos outros a
oportunidade de conhecer e efetivar os direitos da pessoa com deficiência. Seguem exemplos
de publicações de José:
30
Disponível em: http://lattes.cnpq.br/6001240326756040. Acesso em: 12 set. 2018.
147
Fonte: Elaborado pela autora com base em informações retiradas do currículo lattes de José
O exemplo de José me faz refletir sobre como temos que aprender com esse discente,
com seu esforço, determinação e persistência. Permitir as mudanças e praticá-las em nossas
vidas é uma alternativa para adquirir significativo espaço para exercitarmos, no nosso
cotidiano, o processo de aprendizagem. Como diz Mantoan (2005 p. 91): “A escola prepara o
futuro e, de certo que, se aprenderem a valorizar e a conviver com as diferenças nas salas de
aula, serão adultos bem diferentes de nós, que temos de nos empenhar tanto para atender e
viver a experiência da inclusão.”
José, apesar das suas dificuldades, tanto pelas suas deficiências como pela sociedade
preconceituosa, está desbravando seus estudos. Mediante sua narrativa, entendi que para
148
construir a ascensão social através dos estudos e uma educação continuada e consistente é
preciso desenvolver um coração grato, destruir a semente dos preconceitos e viver com
sabedoria. O sucesso do discente com deficiência depende de visão inclusiva, clareza e
planejamento com as adequações de um plano detalhado e concretizado. São necessárias
ainda a esperança e a definição de metas a serem alcançadas, bem como agir com dedicação,
zelo e comprometimento.
Ter muita atenção com as palavras proferidas é um cuidado indispensável na relação
com pessoas com deficiência, pois as palavras têm o poder de incentivar ou destruir sonhos e
conquistas. Conselhos, ensinamentos e críticas são necessários, mas devem ser repassados
com amor e respeito. Dessa forma os alunos alcançam seus objetivos e o relacionamento entre
discente e docente melhora, aumentando a capacidade de comunicação, conquista e
independência da pessoa com deficiência.
Durante toda a pesquisa José ressalta sua orientadora, a Professora Ana Lucia Oliveira
Aguiar, como uma mãe. Diz que "[...] se não fosse ela, não teria tido força para permanecer na
faculdade”. Para reforçar seu carinho e admiração pela profissional a chama de mãe.
As vitórias e desilusões mostram o caminho da experiência de vida, nos tornando
fortes, mas compartilhar, ser solidário com os outros sempre traz um grande crescimento para
ambos. Este é o sentido de incluir, a vontade de promover a acessibilidade humana, com
barreiras a serem superadas a cada minuto e com prontidão a servir o outro. A pessoa sensível
às necessidades do próximo desenvolve elevado senso de valorização do outro,
comprometendo-se em empenhar sua vida na realização do melhor para a inclusão. Essas
qualidades José enxergou na diretora do DAIN, também sua orientadora. Sobre ela teceu as
seguintes palavras:
Em especial, falar da professora Ana Lúcia é assim. Eu nem sei o que vou
dizer de Ana. As qualidades que ela tem eu não tenho palavras (se
emociona) para o que eu quero dizer. Eu conheço uma amiga minha que eu
tenho que levar ela para conhecer a professora Ana Lúcia, ela faz direito,
disse que tem interesse em fazer artigo, e eu disse: ‘Eu vou arrumar para
você uma pessoa que chama MÃE.’E eu disse: ‘Uma MÃE que chama Ana
Lúcia, Ana é uma orientadora, Ana é uma mãe.’ E ela falou: ‘Você fala tanto
que Ana Lúcia é uma mãe.’ E eu falei, ‘é minha orientadora MÃE’. Quem
tem Ana não precisa de ninguém, é uma pessoa que tem várias qualidades.
Não tenho palavras para dizer, descrever. Se eu tivesse tido uma Ana
antigamente eu tinha evoluído muito e voado muito alto. Ana é tudo.
(Narrativas de José. Mossoró/RN, jun. de 2018).
149
Com a arte do saber, a professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar, militante da inclusão,
não só de teoria, mas de prática de vida e espelho que reflete para todos que estão a sua volta,
mostra a necessidade de o professor, a cada instante, buscar a formação continuada para
compreender o que é incluir. A “pureza” dessa palavra representa e acrescenta um valor
moral, social e ético, por isso é preciso aprender a amar de todas as formas e com todas as
forças. As características que possuímos são diferentes, fazem parte da condição humana.
Temos características, habilidades e práticas de aprendizagem diferentes. É a natureza do ser
humano.
Embora a inclusão seja citada a todo instante no meio educacional, ainda falta muito
para que essa proposta seja de fato efetivada. Assim, temos que ter a sabedoria de a estar
sempre divulgando, para todas as pessoas, a fim de que haja um conhecimento social.
Devemos conscientizar a sociedade quanto à riqueza da inclusão, mostrando-lhes alguns dos
princípios constitucionais que a regem, como direito à vida, à educação, entre outros que estão
acima de todo preconceito, que é um crime instituído em nosso código penal e esclarecido
também na lei de inclusão.
Relatar todo trajeto formador de potencialidade e o uso de seus direitos, ressaltando
diferentes espaços de saberes, aprendizados e conhecimentos, tem como objetivo ajudar o
sujeito a transpor os obstáculos na trajetória de estudo e a alcançar a recuperação das suas
potencialidades. Como aponta Freire (1996), através das narrativas sobre todo o percurso feito
durante toda a trajetória vivida, o aluno tem a possibilidade de alcançar o empoderamento e
autonomia. Afinal, aquele que quer aprender deve tornar-se capaz de não ceder, mas de
recuperar sua autoestima e sua confiança, valorizando as suas experiências e as dos outros
com muito respeito (FREIRE, 1996). É necessária uma conscientização de que é possível
mudar o mundo a partir si, de que é sim possível vencer e superar desafios, o atraso, através
do estudo, aprendizado e educação e gerar mudanças e (re)significação de vida.
Concluo este capítulo resgatando de minha memória uma aula da professora Dr.ª Ana
Lúcia Oliveira Aguiar, ministrada à turma do mestrado, na qual cada aluno tinha que levar
uma pessoa da terceira idade. A professora falou sobre Eclea Bosi, que incentiva à “[...]
leitura de mundo dos outros de forma leve, com suavidade e respeito”. Dessa forma a
professora Ana Lúcia Oliveira Aguiar olha para José, com seus limites e ações de
empoderamento, mas com potencialidade, viabilizando uma educação inclusiva, com percurso
cheio de expectativa para uma ascensão social através do estudo.
150
No final do semestre, tive a oportunidade de, junto com José, redigir uma carta para a
professora Ana Lúcia. No tempo de convivência com essa profissional maravilhosa, pude
perceber que ela é como mãe de todos nós, que tem orado e pedido a Deus força. Lembrei-me
disso porque no dia dessa aula a pessoa de terceira idade que levei foi a minha mãe. Ela falou
uma frase que jamais irei esquecer: “Mãe de joelho, filhos de pé.”
A experiência que podemos adquirir com a vida de José é de lutar sempre, apesar das
dificuldades. Como diz Ana Lúcia Aguiar: “Em meio a todos os impedimentos temos que
viver todos os dias como se fosse único.” Devemos vivenciar alteridade e expressão da
qualidade do que é do outro ou do que é diferente, um dos princípios fundamentais do homem
na sua vertente social. Essa é a relação de interação e dependência com o outro.
151
Foram tantos sonhos realizados e trajetórias percorridas. Tudo com luta, mas
transformado em muita alegria. Viveria tudo novamente. Percorrer o caminho da inclusão,
mediante o resgate da história de experiências de vida de José, uma pessoa com deficiência
não aparente, foi, certamente, uma oportunidade ímpar de proporcionar esperança de êxito
social e profissional por meio dos estudos para as pessoas com esse perfil.
As histórias do seu cotidiano de vida revelam a importância de múltiplos olhares para
o outro e suas necessidades, bem como para uma educação transformadora, capaz de alinhar
teoria e prática e de romper barreiras. Por essa razão, apaixonei-me por essa joia de trabalho
que DEUS e minha orientadora, Dr.ª Ana Lúcia Oliveira Aguiar, colocaram em minhas mãos.
Este trabalho me permitiu falar dessas experiências de José, mas também me permitiu
a oportunidade de conscientizar a sociedade em geral de que é preciso a emancipação de
alguns pensamentos e verdades absolutas. Devemos procurar ver as pessoas com deficiência
com potencialidades, sendo elas autoras de uma nova história, de um olhar visionário de
quebra de paradigmas. Nesse sentido, lembro que ainda é preciso percorrer caminhos para
chegar a uma educação de fato inclusiva, que coopere para a construção de políticas públicas
efetivas e afirmativas, cujas propostas contribuam para que as pessoas com deficiência
consigam alcançar, através dos estudos, a ascensão social.
Este trabalho dissertativo mostra que ainda há muitos obstáculos e preconceitos a
serem vencidos para a inclusão verdadeira. Nesse sentido, retomo as palavras de Sassaki
(1997), quando diz que a inclusão social é um processo pelo qual a sociedade se adapta para
poder incluir em seus sistemas sociais gerais pessoas com necessidades especiais.
Simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade.
Para que a inclusão ocorra é necessária uma sociedade mais justa e consciente sobre o
que vem a ser incluir e ser incluído. Soma-se a isso a oportunidade de aprender a cada dia
com o outro, de sermos o outro e de estarmos com o outro para um novo entendimento. O
resultado desta pesquisa traz, portanto, grandes aprendizados para a sociedade. Com efeito, a
cada dia precisamos adornar os propósitos que temos com a inclusão.
No percurso do texto dissertativo palmilhei as trilhas da minha infância, adolescência
e juventude, tempos nada fáceis, visto que o meu processo educativo foi sempre conciliado ao
trabalho e estudo. Entretanto, tal situação me estimulou a prosseguir. Filha de pessoas de
classe popular, morando em um lugar onde todos eram praticamente iguais socialmente,
152
busquei a ascensão social através do estudo. Fiz minha primeira graduação em Pedagogia e
uma segunda em Direito. No curso das leis, aprendi que temos de buscar a efetivação dos
nossos direitos através da Constituição Federal, aquela que garante os direitos fundamentais.
É através da Carta Magna que nascem as leis, como a LBI 13.146/2015, cujo propósito é
ajudar a fundamentar todas as necessidades da pessoa com deficiência, lutando pela inclusão,
o que implica uma amplitude maior para as necessidades de cada tipo de deficiência.
Detalhar o percurso traçado desde a educação básica à universidade, principalmente as
conquistas e desafios, bem como quem me incentivou ao estudo e à trajetória em busca da
formação continuada para alcançar meus objetivos e amadurecimento acadêmico, foi me
despertando para novos desafios e dando-me uma satisfação enorme em escrever. Saliento
nesse processo a importância da Diretoria de políticas e ações inclusivas - DAIN/UERN, que
tem adaptado os meios e materiais necessários para ajudar as pessoas com deficiências em
seus estudos, disponibilizando, por exemplo, a LEDORA para pessoa com deficiência visuais
ou cegos. O auxílio dessa profissional proporciona provas ampliadas e a integração entre
docente e discente. A DAIN também oferece Intérpretes da Lei brasileira de Sinais LIBRAS
para pessoa com deficiência auditiva ou o surdo. Nas divisões de atendimento também há
pedagoga, psicóloga clínica e educacional.
As informações de todas as ações da DAIN e sua equipe estão fundamentadas por
documentos que dão o norte para todos os alunos com deficiências efetivarem seus direitos.
Alguns desses documentos são indispensáveis, como a ficha de observação do docente, a
iniciativa do discente, política de inclusão da UERN, Relatórios da DAIN, documentos da
junta multiprofissional.
A UERN é uma das primeiras Universidades a se preocupar com o direito religioso,
através da Resolução Sabática nº 01/2017/ CONSEPE. Com o apoio da DAIN, o município de
Mossoró, entre outros próximos a ele, e até mesmo para além das nossas fronteiras, ou seja,
em outros países, a inclusão tem sido conhecida pela força dos estudos da LBI, realizados pela
DAIN e sua equipe. O projeto faz reuniões itinerantes e congressos com trabalhos
internacionais, a fim de apresentar a LBI.
Para a realização do diagnóstico da pessoa com deficiência ou doença, a DAIN/UERN
conta com a Junta Multiprofissional, sobre seu cuidado, mas sujeita à reitoria da UERN. O
aluno é quem faz o requerimento da perícia, pois ele tem que ter autonomia para isso. O
parecer é dado e avaliado para cada especificação.
Os projetos de extensão da DAIN são muitos, com destaque aqui para o de Libras, de
ledor, de orientação e mobilidade, que ajudam os alunos a se manterem na universidade, sem
153
desistir, buscando alcançar meios para que haja um aprendizado e para que cheguem à
ascensão social através dos estudos. Todos os que fazem a universidade têm se espelhando
nesse trabalhando, o que tem contribuído para o rompimento das barreiras atitudinais, as mais
recorrentes para aqueles que esperam uma ajuda.
Por meio de projetos de seminários, como o Seminário Potiguar, já na quinta versão,
as Rodas de Estudos - LBI e as reuniões com as famílias, a DAIN mostra que a família é a
base do apoio, compreensão e amor para alunos com deficiências. Busquei relatar essas ações
na tentativa de compreender os espaços frequentados pelo estudante de graduação da
Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN). Falei especificamente de José, de
origem popular e com deficiência não perceptível, atendido pela DAIN/UERN e que alcançou
êxito social e profissional por meio dos estudos. Sua trajetória serviu como um referencial
para a conscientização da importância dos estudos para o aprendizado, o êxito e a satisfação.
As narrativas de José revelam a não desistência do aluno com deficiência da sua
caminhada e da profunda necessidade de uma junta multiprofissional e de técnicos
qualificados que desenvolvam um trabalho de divulgação da inclusão através das atividades
realizadas em Mossoró, no estado do RN, em todo Brasil e em outros países. Com capacitação
e planejamentos, a DAIN realiza um trabalho de ponta com os alunos com deficiência
matriculados na UERN, no total 187 alunos.
O estudo mostra, pois, como são eficazes e necessárias políticas públicas locais, bem
como no estado, no país e no mundo. Ao mesmo tempo, revela os grandes esforços da UERN
e da DAIN em contribuir com essas políticas, realizando e participando de congressos em
vários países, a fim de divulgar o que é a verdadeira inclusão, sem medir esforços em lutar
pela causa do aluno e pessoa com deficiência.
Descrever a essência da DAIN é falar da inclusão, a mola mestra que transforma a
vida da pessoa com deficiência em aprendizado e conhecimento, com apoio a todo instante,
desenvolvendo o seu potencial. De fato, temos que estar atentos e ter um olhar mais amplo
para a inclusão, além de divulgar para a sociedade que, independente do curso, as pessoas
com deficiência podem e devem enfrentar o desafio de estudar. Isso exige a ampliação das
ações que divulgam novas leis, as quais amparam esses alunos em diálogo não só com as
famílias, mas com a comunidade.
Vemos, portanto, que o objetivo da DAIN é apresentar a proposta pertinente para
viabilizar meios que conduzam esses alunos ao alcance do êxito na universidade. Seus planos
estratégicos são de ações de realização e efetivação de obras, aquisição de equipamentos,
contratação de recursos humanos, cursos, minicursos, ciclo de palestras, oficinas, aquisição de
154
Notei ainda que alguns professores não estão preparados para lidar com as adequações
necessárias a cada especificidade. Será esse o motivo da desistência do aluno com deficiência
das Universidades de forma geral?
Enfim, essas são questões para serem respondidas em outros estudos, realizados por
mim, quem sabe, ou por outros pesquisadores que se interessem pelo tema. O certo é que os
caminhos e reflexões realizadas nesta dissertação são de grande valia e contribuição para a
sociedade, pois revelam que, a partir da equidade, deve prevalecer sempre a humanização.
Este sentimento deve ser proporcional e implica em humildade, gentileza, amor e serviço ao
próximo. Em outras palavras, é preciso enxergar o outro com potencialidade. Devemos nutrir
a alma e o corpo de conhecimento e aprendizado para transformar e tornar a inclusão
realmente possível, garantindo, assim, os direitos e deveres de todos.
158
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