Avaliação e Diagnóstico Do TDAH
Avaliação e Diagnóstico Do TDAH
Avaliação e Diagnóstico Do TDAH
ISSN: 0103-6564
revpsico@usp.br
Instituto de Psicologia
Brasil
Resumo: O objetivo desse artigo é efetuar um estudo teórico sobre alguns dos
recursos mais utilizados em termos de avaliação e diagnóstico do Transtorno de Déficit de Atenção
e Hiperatividade (TDAH). O TDAH é uma patologia de alta prevalência na infância e adolescência. A
prática clínica aponta uma alta incidência de crianças que procuram atendimento com diagnóstico
prévio de TDAH, que muitas vezes não é correto. Os próprios estudos de prevalência mostram
achados que se diferem bastante, alertando para a necessidade de se refletir sobre o processo
de avaliação e diagnóstico. Este artigo visa a apontar algumas das técnicas mais utilizadas para a
avaliação da criança e do adolescente, abordando o processo como um todo, tendo em vista maior
confiabilidade no diagnóstico e no tratamento.
Palavras-chave: Psicopatologia. TDAH. Diagnóstico. Avaliação psicológica.
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TDAH
Características gerais
O TDAH é um transtorno no desenvolvimento do autocontrole, mar-
cado por déficits referentes aos períodos de atenção, ao manejo dos im-
pulsos e ao nível de atividade (Barkley, 2002). A patologia é essencialmente
caracterizada pela dificuldade de manter atenção, pela agitação e inquie-
tude, o que muitas vezes pode configurar em hiperatividade e impulsivida-
de. Esses sintomas seguem um padrão persistente e são mais freqüentes e
severos do que manifestações similares presentes em crianças da mesma
idade e nível desenvolvimental (Benczik, 2000), tendo em vista ser bastante
comum as crianças apresentarem um comportamento mais ativo, desaten-
to e impulsivo que os adultos (Barkley, 2002).
As crianças com TDAH são comumente descritas como desligadas,
aborrecidas e desmotivadas frente às tarefas, sem força de vontade, ba-
gunceiras e desorganizadas. São crianças agitadas, como se estivessem a
“mil por hora” ou “com bicho carpinteiro”, são barulhentas e tendem a fazer
coisas fora de hora (Barbosa, 2001). Além dessas características, é comum
que crianças com TDAH apresentem outros sintomas, como baixa tolerân-
cia à frustração, troca contínua de atividades, dificuldade de organização e
presença de sonhos diurnos. A essa patologia podem estar relacionados os
fracassos escolares, as dificuldades emocionais e dificuldades de relaciona-
mento em crianças e adolescentes (Wilens, Biedermann, & Spencer, 2002).
Nos dias de hoje, uma grande parte dos profissionais clínicos acredita
que o TDAH está calcado sobre 3 problemas primários: a dificuldade em
manter a atenção, o controle ou inibição de impulsos e a atividade excessi-
va. É possível identificar sintomas adicionais, como dificuldade para seguir
regras e instruções e variabilidade em suas reações frente às mais variadas
situações (Barkley, 2002). A patologia foi caracterizada no DSM-IV TR (2002)
por sintomas agrupados em 3 clusters: Desatenção, Hiperatividade e Im-
pulsividade.
Desatenção
A história do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade reme-
te a um período que ultrapassa 1 século. O primeiro trabalho sobre o tema,
escrito pelo médico escocês Alexander Crichton, descreveu, em 1798, as-
pectos de desatenção encontrados em jovens que são muito semelhantes
aos critérios propostos pelo DSM-IV para o tipo desatento do TDAH (Pal-
mer & Finger, 2001). Sua inclusão na Segunda edição do Manual de Diag-
nóstico e Estatística dos Distúrbios Mentais – DSM-II (American Psychiatric
Associacion, 1968), como Distúrbio de Reação Hipercinética da Criança,
Hiperatividade
Hiperatividade pode ser entendida como inquietação motora e
agressiva, não apenas leves espasmos, passando a sensação de que as
crianças estão “ligadas na tomada”,por estarem quase que constantemente
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em atividade (Phelan, 2005). Ela é caracterizada por inquietação ou dificul-
dade de manter-se quieto na carteira escolar, por não permanecer sentado
quando era esperada tal conduta, por correr, escalar ou mostrar conduta
motora inadequada em situações inapropriadas, por apresentar dificulda-
de em brincar ou realizar atividades de lazer em silêncio ou por falar exces-
sivamente (APA, 2002).
A hiperatividade não é constante nas crianças portadoras do TDAH,
pois, algumas vezes, elas podem ficar quietas em situações novas, fascinan-
tes, um pouco assustadoras ou quando estão a sós com alguém (Phelan,
2005). Essa quietude pode dificultar a identificação dos sintomas numa
avaliação clínica, pois existe uma tendência de a criança não manifestar a
hiperatividade no consultório clínico. Sendo assim, a avaliação desses sin-
tomas deve abarcar situações em que as manifestações dos sintomas são
mais prováveis: a escola, o trabalho e em situações sociais de grupo (Cale-
garo, 2002). Além disso, deve ser levado em conta o aspecto desenvolvi-
mental da hiperatividade, o qual prevê uma diminuição natural da mesma
na mediada em que a idade avança.
Impulsividade
A impulsividade é um fator importante no panorama do TDAH, pois
pode causar desde um prejuízo significativo na interação social da criança
a ações que promovam um risco físico real. Phelan (2005) postula que a im-
pulsividade na criança com TDAH é caracterizada pela ação sem o controle
racional, ou seja, a criança faz o que quer, o que lhe vem à cabeça, sem me-
dir ou se preocupar com as conseqüências. Dessa forma, elas podem se en-
volver em brincadeiras perigosas, se ferirem, ou agredirem outras crianças
quando frustradas, para atingirem aquele desejo que lhes veio à mente.
Os portadores do TDAH apresentam dificuldades consideráveis em
conter suas respostas frente a uma situação e pensarem antes de agir, pois
realizam atos que dificilmente fariam se refletissem antes. Acabam, dessa
forma, verbalizando coisas de forma impulsiva, muitas vezes carregadas
de uma carga emocional muito forte, apresentando um comportamento
rude e insensível. Tendem a agir com rapidez quando uma idéia lhes vem
à mente, sem levar em conta se estão no meio de uma outra tarefa ou em
um ambiente inadequado (Barkley, 2002).
Essas características repercutem negativamente tanto no meio social
como no da aprendizagem. Na sala de aula, as crianças com TDAH costu-
mam interromper a aula, fazer comentários sem pensar e sem autorização,
responder a perguntas antes que sejam terminadas, iniciar tarefas ou testes
sem ler as instruções por completo ou com cuidado e mostrar dificuldade
em aguardar a sua vez (Barkley, 2002). Essas crianças podem se envolver
em alguma espécie de roubo, mobilizadas apenas pelo impulso, sem crítica
O processo diagnóstico
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dos sintomas em vários locais ao longo do tempo seja minuciosamente
investigada. O profissional deve estar atento para a possibilidade de que
os sintomas sejam fruto de outros quadros, reação a um fator psicossocial
desencadeante, produto de uma situação familiar caótica ou de um siste-
ma de ensino inadequado (Rohde et al., 2004).
Em muitos casos, o distúrbio é percebido quando a criança ingres-
sa na escola, momento em que as dificuldades de atenção e inquietude
se evidenciam, tendo em vista que, normalmente, é quando o sujeito com
TDAH passa a ser alvo de comparação com outras crianças da mesma ida-
de e ambiente (Poeta & Neto, 2004). Muitas vezes, os sintomas só são per-
cebidos quando a criança se encontra em um ponto mais avançado do
ensino fundamental, como terceira ou quarta série, quando o uso das fun-
ções executivas como planejamento, organização e persistência de foco
atencional são mais necessárias (Rohde et al., 2004). Tendo em vista que o
critério referente à idade do início dos sintomas, causando prejuízo (antes
dos 7 anos), proposto pelos manuais da CID-10 (1993) e DSM-IV TR (2002),
não se baseia em evidências científicas (Barkley & Biederman, 1997), é su-
gerido que o clínico não descarte a possibilidade de fechar o diagnóstico
em pacientes que apresentarem os sintomas após os 7 anos de idade (Ro-
hde et al., 2004).
Estão sendo apresentados, na tabela 1, os critérios do DSM-IV TR
(2002) para o diagnóstico de TDAH.
A. Ou (1) ou (2)
(1) seis (ou mais) dos seguintes sintomas de desatenção persistiram
por pelo menos 6 meses, em grau mal-adaptativo e inconsistente com o nível de
desenvolvimento:
Desatenção:
(a) freqüentemente deixa de prestar atenção a detalhes ou comete erros
por descuido em atividades escolares, de trabalho ou outras
(b) com freqüência tem dificuldades para manter a atenção em tarefas
ou atividades lúdicas
(c) com freqüência parece não escutar quando lhe dirigem a palavra
(d) com freqüência não segue instruções e não termina seus
deveres escolares, tarefas domésticas ou deveres profissionais (não devido a
comportamento de oposição ou incapacidade de compreender instruções)
(e) com freqüência tem dificuldade para organizar tarefas e atividades
(f ) com freqüência evita, antipatiza ou reluta a envolver-se em tarefas
que exijam esforço mental constante (como tarefas escolares ou deveres de casa)
(g) com freqüência perde coisas necessárias para tarefas ou atividades
(por ex., brinquedos, tarefas escolares, lápis, livros ou outros materiais)
(h) é facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa
(i) com freqüência apresenta esquecimento em atividades diárias
Impulsividade:
(g) freqüentemente dá respostas precipitadas antes de as perguntas
terem sido completadas
(h) com freqüência tem dificuldade para aguardar sua vez
(i) freqüentemente interrompe ou se mete em assuntos de outros
(por ex., intromete-se em conversas ou brincadeiras)
B. Alguns sintomas de hiperatividade-impulsividade ou desatenção
que causaram prejuízo estavam presentes antes dos 7 anos de idade.
C. Algum prejuízo causado pelos sintomas está presente em dois ou
mais contextos (por ex., na escola [ou trabalho] e em casa).
D. Deve haver claras evidências de prejuízo clinicamente significativo
no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional.
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como o potencial cognitivo da criança/adolescente, uma vez que jovens
com elevados potenciais podem compensar parcialmente os sintomas,
funcionando dentro da média esperada para a idade. O prejuízo funcional
não engloba apenas o desempenho na escola, logo, o profissional deve fa-
zer uma avaliação do sujeito em amplo espectro (social, familiar, físico, na
história de vida). A análise do prejuízo funcional passa também pela avalia-
ção de comorbidades associadas ao TDAH (Rohde et al., 2004).
Um outro ponto imprescindível para uma avaliação adequada envol-
ve a identificação de quadros associados ao TDAH. Há um grande número
de comorbidades associadas a ele, de modo que nos é possível afirmar que,
em grande parte dos casos, o TDAH não é encontrado na sua forma pura,
tendo em vista índices que apontam que até 65% dos casos encaminhados
para tratamento podem apresentar algum transtorno associado (Anasto-
poulos, 1999). Souza et al. (2001) observaram em dados preliminares a signi-
ficante ocorrência de transtornos co-mórbidos em 87% das crianças e ado-
lescentes com TDAH com idades entre 6 e 16 anos, sendo que 39,2% dessas
crianças possuíam transtorno de conduta associado, e 20,6% transtorno
desafiador opositivo, ainda que esse índice possa atingir de 35 a 65% (Souza
e Pinheiro, 2003). Foram encontrados transtornos de ansiedade (11,7%) e de
depressão (11,7%) em um número razoável de casos. Frente a esses dados, a
análise das implicações de comorbidades sobre o funcionamento das crian-
ças com TDAH é de extrema importância para que se possa firmar o prog-
nóstico e traçar o plano de tratamento desses sujeitos (Calegaro, 2002).
Frente aos aspectos mencionados, fica evidente a importância de
uma avaliação abrangente sobre o funcionamento da criança. Para que
isso seja realizado, existe uma gama de técnicas e instrumentos que po-
dem ser utilizados a fim de enriquecer o processo avaliativo e diagnóstico,
como entrevistas clínicas, uso de escalas, testes psicológicos e neuropsi-
cológicos. O intercâmbio multidisciplinar é de extremo valor, pois a troca
de informações entre profissionais de diversas áreas, como psiquiatras e
psicólogos, por exemplo, pode ser muito útil para um entendimento mais
global de um caso.
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dade dos sintomas estarem presentes em mais de um ambiente, a escola,
como local onde a criança/adolescente passa boa parte de seu dia, é fon-
te rica de informação. A coleta de informações (atuais e passadas) junto
à escola, como anotações, resultados em testes, testes de desempenho e
observações do comportamento, configura uma forma muito rica de ob-
termos uma noção geral do funcionamento da criança (Phelan, 2005). A
maioria das crianças com TDAH apresenta problemas com desempenho
e comportamento na escola. Nesse sentido, detalhes devem ser investiga-
dos junto a coordenadores e professores, visando esclarecer esse funciona-
mento e investigar possíveis comorbidades (Calegaro, 2002).
Ainda que seja uma fonte excelente de informações, a entrevista
junto aos professores nem sempre é viável, sendo mais comum o contato
telefônico (Calegaro, 2002). Uma alternativa apontada por alguns autores
(Calegaro, 2002; Martins, Tramontina & Rohde, 2002; Benczik, 2000; Phelan,
2005) é enviar à escola escalas objetivas para avaliação de desatenção, hi-
peratividade e impulsividade que possam ser preenchidas de forma sim-
ples e fácil pelos professores.
A percepção do professor sobre a capacidade da criança/adolescen-
te em seguir as regras e respeitar a autoridade na sala de aula auxilia o
entendimento do clínico sobre como a criança está lidando com suas difi-
culdades (Benczik, 2000). Martins, Tramontina e Rohde (2002) mencionam
estudos que alertam para a possibilidade de os professores maximizarem
os sintomas apresentados pelas crianças com TDAH, principalmente quan-
do existe comorbidade com um transtorno disruptivo do comportamento.
Ainda assim, a escola é uma fonte muito valiosa de informação, tanto no
processo diagnóstico como na avaliação do tratamento. Quando em tra-
tamento, a evolução do paciente é percebida pelos professores de forma
tão eficiente quanto pelos pais (Biederman et al., 2004), fato que reforça a
importância de um contato contínuo com ambos.
O uso de escalas
Além das entrevistas, o uso de escalas e questionários para pais e
professores é procedimento consagrado na literatura internacional, prin-
cipalmente por terem mostrado sensibilidade e confiabilidade para uso
profissional (Benczik, 2000). Esses instrumentos podem fornecer dados
sistematizados, que permitem uma visão mais objetiva, com dados quanti-
tativos dos sintomas. Ainda que possam ser muito úteis, existem algumas
limitações e cuidados que devem ser levados em conta ao se utilizar esses
instrumentos, como, por exemplo, a possibilidade da escala apontar como
significativos comportamentos que não ocorrem com muita freqüência, ou
não abarcar de forma completa a real condição do quadro (Barkley, 1999).
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SADS-E busca verificar a presença de transtornos de ansiedade, transtorno
bipolar, transtorno depressivo, uso/abuso de substância, transtornos dis-
ruptivos do comportamento (T. Conduta e T. Desafiador Opositivo) e TDAH.
Esse instrumento ainda está em processo de validação, porém tem mostra-
do eficácia em ambientes de pesquisa.
Testagem psicológica
Ao mesmo tempo em que não são decisivos para o diagnóstico, os
testes psicológicos acabam sendo de grande ajuda para o profissional. Sua
dificuldade em serem instrumentos confiáveis para diagnóstico reside no
fato de que muitas crianças obtêm resultados que não revelam suas difi-
culdades, pelo fato de o teste ser vivenciado como novidade ou por se be-
neficiarem da relação um a um com o aplicador (Hallowell & Ratey, 1999).
Um outro aspecto que dificulta atualmente o uso de testes psicológicos no
processo diagnóstico é que muitos deles ainda não estão aprovados pelo
Conselho Federal de Psicologia (CFP), o que restringe seu uso quase que
exclusivamente para a pesquisa.
Os testes utilizados na avaliação neuropsicológica, embora demons-
trem em alguns estudos resultados significativos na discriminação do
TDAH, devem ser ponderados ante a entrevista clínica detalhada e outros
procedimentos já mencionados, tendo em vista a discrepância entre os
resultados encontrados nas diversas pesquisas (Mattos et al., 2003). Esses
resultados variáveis tendem a estarem ligados com o processo de sele-
ção da amostra e o método utilizado nas mais diversas pesquisas, o que
sem dúvida interfere nos achados desses estudos. Ainda assim, a avalia-
ção neuropsicológica pode trazer benefícios significativos para o processo
diagnóstico, pois permite auxiliar o clínico em três questões principais: se o
diagnóstico de TDAH é indicado para o caso; se o diagnóstico não procede,
que explicações alternativas podem existir para os sintomas; se o diagnós-
tico se justifica e existem co-morbidades associadas que devem ser diag-
nosticadas e tratadas.
É comum que profissionais solicitem um exame neuropsicológico
para consolidar ou excluir a hipótese de TDAH, assim como para obter
novos dados que ampliem a avaliação. Além disso, uma avaliação ampla e
bem conduzida pode esclarecer sintomas, eliminar falsos positivos e signi-
ficar sintomas que podem ser considerados variantes da normalidade ou
oriundos de outros quadros que não o TDAH. Mesmo que o diagnóstico
já esteja confirmado, uma avaliação neuropsicológica pode prover dados
que auxiliarão no estabelecimento de uma estratégia terapêutica adequa-
da, mais abrangente e eficaz (Mattos et al., 2003).
Alguns estudos têm apontado a importância da avaliação neurop-
sicológica no processo diagnóstico do TDAH (Amaral & Guerreiro, 2001;
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TDAH como uma síndrome que envolve muitos aspectos do funcionamen-
to do sujeito permite a integração dos achados neuropsicológicos, neu-
rofisiológicos e clínicos, fornecendo um panorama mais profícuo para um
plano de tratamento.
No que diz respeito às técnicas projetivas, em específico ao Rorscha-
ch e ao TAT, Calegaro (2002) menciona que Gordon e Barkley referem exis-
tir fracas evidências de diferença encontrada entre a população normal e
crianças com TDAH. Entretanto, em algumas pesquisas envolvendo crian-
ças com TDAH (Cotugno,1995; Graeff & Vaz, 2004; Osório, Bianchi, & Lourei-
ro, 2000), em que foi utilizado o Rorschach como instrumento, os resultados
divergem das conclusões de Gordon e Barkley. Cotugno (1995), utilizando
a Técnica Projetiva de Rorschach de acordo com o Sistema Compreensivo
de Exner, encontrou diferenças significativas entre crianças norte-america-
nas com TDAH e crianças sem esse transtorno. O grupo clínico apresentou
diferenças interpretadas como baixa auto-estima, dificuldade e receio nos
relacionamentos interpessoais, tendência a viver uma maior quantidade
de experiências introspectivas/depressivas, tendência a simplificar os estí-
mulos (dificuldade de percepção concreta da realidade), maior dificuldade
quanto ao controle do estresse (tendendo à desorganização) e tendência
à desorganização do pensamento.
O estudo realizado por Osório, Bianchi e Loureiro (2000) enfocou os
aspectos qualitativos das manchas, baseados nos fenômenos especiais e
no significado simbólico. Os aspectos quantitativos, que foram compara-
dos com os dados normativos de Jacquemin (1977), indicaram que crianças
com TDAH apresentam maior impulsividade, alteração na capacidade de
estabelecer um pensamento coerente e ansiedade interferindo na capaci-
dade de percepção e concentração, o que indica dificuldade na percepção
objetiva da realidade. Ainda que os dados levantados pelas pesquisadoras
sejam interessantes, até por serem uns dos poucos registros em população
brasileira, seus resultados não podem ser considerados significativos em
virtude do tamanho reduzido da amostra (5 sujeitos) e da amostra norma-
tiva que é parte de uma pesquisa realizada há mais de 20 anos.
No Rio Grande do Sul foi realizado um estudo semelhante (Graeff
& Vaz, 2004) utilizando os mesmos dados que Osório, Bianchi e Loureiro
(2000) como padrão para comparação. As crianças (n=8) com TDAH apre-
sentaram menor capacidade de produção, dificuldades em lidar com a rea-
lidade, dificuldades de percepção objetiva da realidade, de sistematização
e de focar a tarefa, tendência a realizar as tarefas de forma rápida e superfi-
cial e um índice de ansiedade situacional um tanto elevado. Os indicadores
de impulsividade atingiram superioridade de quase 4 vezes em compara-
ção com os dados normativos da pesquisa de Jacquemin (1977).
Dentre todos os instrumentos aqui descritos, apenas o WISC-III e o
Rorschach estão aprovados pelo Conselho Federal de Psicologia. Isso não
significa, porém, que outros instrumentos não possam ser utilizados com
Considerações finais
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Evaluation and Diagnosis of Attention Deficit Hyperactivity
Disorder (ADHD)
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