A Posse e Devto Da Terra em Moçamb

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AGRICULTURA: A POSSE E DESENVOLVIMENTO DA TERRA EM

MOÇAMBIQUE
Por José Chichava, PhD

1. ÁFRICA PRÉ-COLONIAL

- Existência de sistemas indígenas de posse de terra com base em: linhagens,


tribos, comunidades, etc. Estes sistemas regulavam os direitos e obrigações
das pessoas em relação às outras, com referência à terra.

- Existência de DISPUTAS, REGRAS DE SUCESSÃO, integradas no


chamado DIREITO COSTUMEIRO ou CONSUETUDINÁRIO.

2. ÁFRICA COLONIAL

- Institucionalização da propriedade privada da terra;


- Discriminação e segregação com base nos direitos sobre a terra;
- “Abolição” do Direito Costumeiro da terra.

3. ÁFRICA INDEPENDENTE

- Institucionalização da propriedade estatal da terra, que trouxe a


inalienabilidade da terra;
- Existência da propriedade privada da terra, com um Mercado (às vezes
especulativo) de terras;
- Falta de clareza e segurança no sistema de posse de terra, caracterizados
pela ausência de mecanismos transparentes de acesso à terra;
- Nacionalização da terra e inexistência do valor comercial da terra.

4. MOÇAMBIQUE INDEPENDENTE

Nacionalização da terra no dia 24 de Julho de 1975, cerca de um mês após a declaração


da independência nacional de Moçambique.

A consagração na Lei Fundamental (Constituição da República) de aspectos ligados à


terra, quer na primeira Constituição, aprovada em 1975; quer na segunda Constituição,
aprovada em 1990, quer na actual Constituição aprovada a 16 de Novembro de 2004:

ARTIGO 109
1. A terra é propriedade do Estado.
2. A terra não pode ser vendida, ou por qualquer outra forma alienada,
nem hipotecada ou penhorada.

Agricultura: A posse e Desenvolvimento da Terra em Moçambique 1


3. Como meio universal de criação da riqueza e do bem-estar social, o
uso e aproveitamento da terra é direito de todo o povo
moçambicano.

ARTIGO 110
1. O Estado determina as condições de uso e aproveitamento da terra.
2. ……..

ARTIGO 111
Na titularização do direito de uso e aproveitamento da terra o Estado
reconhece e protégé os direitos adquiridos por herança ou ocupação,
salvo havendo reserva legal ou se a terra tiver sido legalmente atribuída
a outra pessoa ou entidade.

Quatro anos após a independência nacional foi aprovada a Lei de Terras, que viria apenas
a ser regulamentada oito anos depois.

(Lei de Terras – Lei 6/79 e Lei 1/86); Regulamento da Lei de Terra – Decreto 16/87)

A lei 6/79, definia no seu Artigo 11 que a terra para fins agrícolas tinha os seguintes tipos
de utilização: Agrícola; Pecuário e Silvícola. Por outro lado, o Artigo 19 explicitava que os
objectivos do uso e aproveitamento da terra para fins não agrícolas eram os seguintes:
Habitação; Indústria; Comércio; Mercados, feiras, parques e jardins; e Instalações para fins
culturais, desportivos e outras actividades sociais.

Desenvolvimento Agrário Rural e Conflitos

As inconsistências tanto do sistema formal assim como o sistema consuetudinario de


posse de terra originaram conflitos e disputas de terra. Os conflitos tomaram e tomam
diversas configurações mas que podem ser resumidos no seguinte:

i) Conflitos entre o Estado e os pequenos proprietários (e,


nalguns casos, interesses comerciais de maior envergadura),
devidos à expropriação de terras por parte do Estado;
ii) Conflitos entre o Estado e pequenos proprietários sobre terras
das explorações agrícolas estatais que pequenos proprietários
ocuparam ilegalmente (como zonas residenciais também) ou
ocuparam como trabalhadores antigos ou antigos donos;
iii) Conflitos entre o Estado e produtores comerciais sobre terras
alienadas pelo Estado mais de uma vez, por exemplo: a) por
diferentes ministérios; b) pelos governos provinciais e central;
c) pelo mesmo ministério ou província a mais do que uma
pessoa;
iv) Conflitos entre o Estado e produtores comerciais, por causa de
terras de explorações agrícolas estatais;
Agricultura: A posse e Desenvolvimento da Terra em Moçambique 2
v) Conflitos entre produtores comerciais privados;
vi) Conflitos entre o Estado e produtores comerciais, por causa de
arrendamentos à curto prazo;
vii) Conflitos entre novos produtores comerciais e interesses
portugueses regressados, ou entre novos interesses
comerciais (tanto estrangeiros como nacionais) e antigo capital
moçambicano do período colonial;
viii) Conflitos entre empresas mistas e interesses comerciais
privados, e entre empresas mistas e pequenos proprietários;
ix) Conflitos entre interesses comerciais e pequenos proprietários;
x) Conflitos entre pequenos proprietários, especialmente entre
populaces deslocadas ou em reintegração e populações locais
(indígenas);
xi) Conflitos entre o Governo e a Renamo, por causa da
distribuição de concessões de terras fora do âmbito da lei nas
suas respectivas zonas de influência.

Tal como no resto da África, Moçambique tem numerosos regimes consuetudinários de


posse de terra, os quais no seu conjunto formam o sector consuetudinário da posse da
terra. Estes regimes diferem notavelmente de localidade para localidade conforme uma
variedade de factores, incluindo a densidade populacional, a organização do grau de
parentesco, os padrões de herança (matrilinear ou patrilinear), a qualidade da terra, os
mercados e a experiência histórica. Em Moçambique os regimes de posse consuetudinária
diferem grandemente como resultado de muitos factores, incluindo a sua inter-acção
específica e peculiar com as autoridades coloniais e com a economia colonial, antes da
independência, a Guerra civil dpois da independência (acompanhada de migração forçada
de mais de 6 mil pessoas), as cheias e as secas, a política governamental e as recentes
mudanças económicas.

5. NOVA POLÍTICA DE TERRAS E O DESENVOLVIMENTO

“Salvaguardar os direitos dos moçambicanos sobre a terra e outros recursos naturais,


enquanto promovendo o investimento e o uso sustentável e equilibrado dos recursos”.

As prioridades da política nacional de terras são:


 Aumentar a produção de comida;
 Criar condições para o desenvolvimento e crescimento da agricultura
familiar;
 Promover um investimento privado sustentável;
 Conservar as areas de interesse ecológico;
 Introduzir um sistema de taxas baseado na ocupação e uso do solo.
(Conselho de Ministros, Setembro de 1995)

Os princípios fundamentais da nova Política de Terras são:

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1. Manter a terra como propriedade do Estado;
2. Garantir que tanto a população assim como investidores tenham acesso à terra;
3. Garantir que a mulher tem acesso à terra;
4. Promover o investimento nacional e estrangeiro sem prejudicar a população
residente;
5. Participação activa dos nacionais como parceiros em empresas privadas de
capital estrangeiro e/ou misto;
6. Definir os princípios básicos para a transferência dos direitos de usos e
aproveitamento da terra;
7. Usar os recursos naturais de uma maneira sustentável de modo a garantir uma
qualidade de vida às populações.

6. A NOVA LEI DE TERRAS E SEU REGULAMENTO

A nova lei de terras, Lei nº. 19/97, de 1 de Outubro, reitera o princípio geral
consagrado na Constituição da República de que “A terra é propriedade do Estado e
não pode ser vendida ou, por qualquer outra forma, alienada, hipotecada ou
penhorada” (Artigo 3).

Esta lei cria o Fundo Estatal de Terras e considera as Zonas de Protecção Total e
Parcial como do domínio público. Define-se um prazo máximo de 50 anos, renovável
por igual período, ao direito de uso e aproveitamento da terra para fins de actividades
económicas. No entanto, não está sujeito a nenhum prazo o direito de uso e
aproveitamento da terra:

- adquirido por ocupação pelas comunidades;


- destinado à habitação própria;
- destinado à exploração familiar exercida por pessoas singulares
nacionais.

O Regulamento da nova lei de terras foi aprovado através do Decreto nº. 66/98, de 8
de Dezembro, do Conselho de Ministros.

O Artigo 13 do Regulamento da Lei de Terras define os Direitos dos Titulares do


direito de uso e aproveitamento da terra, seja adquirido por ocupação, seja por
autorização de um pedido, nomeadamente:

- defender-se contra qualquer intrusão de uma segunda parte, nos


termos da lei;
- Ter acesso à sua parcela e aos recursos hídricos de uso público
através das parcelas vizinhas, constituindo para o efeito as necessárias
servidões.

Agricultura: A posse e Desenvolvimento da Terra em Moçambique 4


7. POLÍTICA AGRÁRIA

“Desenvolver a actividade com vista a alcançar a segurança alimentar através da


produção diversificada de produtos para o consumo, fornecimento à indústria nacional e
para a exportação, tendo como base a utilização sustentável de recursos naturais e a
garantia da equidade social”.

A segurança alimentar pressupõe:


- a disponibilidade (oferta) de produtos
- o acesso (procura) aos produtos
- a estabilidade permanente da população
- alimentos em qualidade e quantidade
- saúde e robustez física.

Os objectivos de desenvolvimento económico do país dão ênfase à necessidade da


segurança alimentar que conduza à:
- Desenvolvimento económico sustentável
- Redução de taxas de desemprego
- Redução dos níveis de pobreza absoluta.

8. CARACTERÍSTICAS ESPECÍFICAS DA AGRICULTURA

O país tem aproximadamente uma área de 80 milhões de hectares dos quais:

- 36 milhões de hectares de terra arável sendo:


i. 20 milhões de hectares agricultáveis e apenas 5 milhões cultivados
ii. 3 milhões de hectares irrigáveis, dos quais 125.000 hectares
infraestruturados e 50.000 actualmente irrigados
- 44 milhões de hectares de formações florestais com mais de 22 milhões de
m3 de madeira.

O País tem mais de 3 milhões de explorações agrícolas correspondentes a 3.866.806


hectares cultivados, ou seja, 6.923.646 parcelas.

A agricultura no país tem as seguintes características específicas:

1. Factores biológicos
2. Factores Climáticos que às vezes podem ser adversos
3. Condições fisiográficas (topografia e solos)
4. Terra e outros recursos naturais (solo e subsolo)
5. Dispersão
6. Subsistência versus integração na economia monetária

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7. Aspectos sócio-económicos (tamanho e composição das
famílias, valores culturais, attitudes, crenças, tradições, género,
etc.)
8. Actividade de risco.

9. IMPORTÂNCIA DO SECTOR AGRÁRIO

- A agricultura é tomada como a base do desenvolvimento nacional (Artigo 39


da Constituição da República);
- 80% da população moçambicana tem ocupação nas zonas rurais;
- 40% do Produto Interno Bruto (PIB) provém da agricultura;
- 60% das receitas de exportação são geradas pelo sector agrário;
- Sector complementado pelas Florestas e Fauna Bravia, Pecuária, Pesca e
outras riquezas minerais.
Nota Importante: Recomenda-se o estudo da Legislação sobre a Terra em Moçambique,
nomeadamente, Lei nº. 19/97, de 1 de Outubro, e seu respectivo Regulamento, Decreto nº.
66/98 de 8 de Dezembro.

Maputo, Março 2005

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