14disst2014cap PDF
14disst2014cap PDF
14disst2014cap PDF
Mestrado Profissional em Matemática - PROFMAT, Universidade Federal de São João Del-Rei - UFSJ
Sociedade Brasileira de Matemática - SBM
2 Conceitos básicos
No decorrer do texto vamos utilizar alguns conceitos da mecânica clássica como as leis de
Newton, energia cinética e trabalho. Vamos começar apresentando um resumo de alguns
conceitos fı́sicos e matemáticos necessários ao desenvolvimento da teoria. Não vamos
delongar nas definições, mas o leitor que desejar mais detalhes é encorajado a recorrer
à referência [2] ou algum outro material de mecânica clássica. Segue abaixo a definição
desses conceitos:
−
→ → −
1a Lei de Newton: Se nenhuma força resultante atua sobre um corpo (FR = 0 ), sua
velocidade não pode mudar, ou seja, o corpo não pode sofrer uma acelaração.
2
2a Lei de Newton: A força resultante que age sobre um corpo é igual ao produto da
massa do corpo pela sua aceleração.
−
→
FR = m→
−
a.
3a Lei de Newton: Quando dois corpos interagem, as forças que cada corpo exerce
sobre o outro são sempre iguais em módulo e têm sentidos opostos.
~
onde θ é o ângulo constante entre F~ e d.
Figura 1: Trabalho.
3
Um livro texto que aborda este assunto em mais detalhes é apresentado na referência [5].
Seguem abaixo algumas regras importantes.
Se f é uma função de duas variáveis, vamos denotar suas derivadas parciais de fx e fy .
Como fx e fy são funções de duas variáveis, podemos considerar novamente suas derivadas
parciais, onde denotaremos (fx )x , (fx )y , (fy )x e (fy )y derivadas parciais de segunda ordem
de f . Por exemplo se z = f (x, y), temos:
∂ 2f ∂ 2f
∂ ∂f ∂ ∂f
(fx )x = fxx = = , (f x ) y = f xy = = ,
∂x ∂x ∂x2 ∂y ∂x ∂y∂x
∂ 2f ∂ 2f
∂ ∂f ∂ ∂f
(fy )x = fyx = = , e (fy )y = fyy = = .
∂x ∂y ∂x∂y ∂y ∂y ∂y 2
Teorema 2.1 Teorema de Clairaut Suponha que f seja definida em uma bola aberta
D que contenha o ponto (a, b). Se as funções fxy e fyx forem ambas contı́nuas em D,
então
fxy (a, b) = fyx (a, b).
∂z ∂z ∂x ∂z ∂y ∂z ∂z ∂x ∂z ∂y
= + = + .
∂s ∂x ∂s ∂y ∂s ∂t ∂x ∂t ∂y ∂t
Se f é uma função de duas variáveis x e y, então o gradiente de f é a função vetorial
∇f definida por
∂f ∂f
∇f (x, y) = (x, y)ı̂ + (x, y)̂.
∂x ∂y
Uma vantagem do formalismo de d’Alembert sobre as leis de Newton é a utilização do
conceito de vı́nculos, o que simplifica substancialmente o problema a ser resolvido. Como
consequência das equações de vı́nculo o número de coordenadas originais do sistema pode
ser reduzido a um conjunto com o mı́nimo de variáveis, chamadas de coordenadas gene-
ralizadas, necessárias para a descrição do sistema. O formalismo de Lagrange, que será
apresentado mais a frente, explora os vı́nculos para obter as coordenadas generalizadas.
Para isto, apresentamos agora os conceitos de vı́nculo e coordenadas generalizadas.
4
Vı́nculos e Coordenadas Generalizadas
O objetivo deste trabalho é encontrar e aplicar o princı́pio de d’Alembert e as equações de
Lagrange que são particularmente convenientes para descrever as equações de movimento
de sistemas que podem estar sujeitos a certas restrições ou vı́nculos. Para isso devemos
saber o que são vı́nculos e coordenadas generalizadas. Nesta seção apresentamos os con-
ceitos de vı́nculos e coordenadas generalizadas citando o exemplo do pêndulo duplo, um
exemplo clássicos da mecânica.
Exemplo 2.1 Um pêndulo duplo oscila num plano vertical fixo, conforme a figura abaixo.
Este pêndulo é constituı́do por um pêndulo rı́gido de comprimento l1 e de massa m1 , ao
qual está ligado um segundo pêndulo rı́gido de comprimento l2 e de massa m2 . Os ângulos
θ1 e θ2 representam os ângulos que as hastes l1 e l2 formam com a vertical.
Por outro lado as coordenadas x2 e y2 também não são independentes entre si, a
distância entre m1 e m2 tem que ser igual a l2 (dm1 ,m2 = l2 ), ou seja
5
No caso do pêndulo duplo plano há duas equações de vı́nculo (3) e (4). Elas refletem
que a distância d0,m1 e dm1 ,m2 são fixas.
Vı́nculos Holônomos. Sejam ξ1 , ξ2 , ..., ξM coordenadas arbitrárias para descrever
um sistema mecânico (podem representar posições, ângulos, etc). Se os vı́nculos forem
todos da forma:
f (ξ1 , ξ2 , ..., ξM , t) = 0,
eles são ditos holônomos 3 . Um exemplo de vı́nculos holônomos são o do exemplo anterior
que podem ser escrito na forma:
6
Temos que as duas coordenadas angulares θ1 e θ2 atendem os requisitos que definem
coordenadas generalizadas. De fato:
(x2 − x1 )2 + (y2 − y1 )2 = (l1 sen θ1 + l2 sen θ2 − l1 sen θ1 )2 + (l1 cos θ1 + l2 cos θ2 − l1 cos θ1 )
= l22 sen2 θ2 + l22 cos2 θ2
= l22 (sen2 θ2 + cos2 θ2 ) = l22 ,
Vamos supor que todos os vı́nculos sejam holônomos, ou seja, para um sistema de N
partı́culas as equações de vı́nculo só dependem das coordenadas das partı́culas e possi-
velmente do tempo. Desta forma os vı́nculos podem ser representados por expressões do
tipo
f1 (~r1 , . . . , ~rN , t) = 0,
..
.
fp (~r1 , . . . , ~rN , t) = 0.
em que p é o número de vı́nculos.
Para descrever completamente um sistema de N partı́culas no espaço tridimensio-
nal a princı́pio são necessárias 3N coordenadas (x1 , y1 , z1 ) . . . (xN , yN , zN ). No entanto,
como existem p vı́nculos holônomos, o número de coordenadas indispensáveis se reduz a
7
n = 3N − p. Para um sistema de N partı́culas no espaço com dimensão d, temos dN
coordenadas, onde apenas n = dN − p podem ser tomadas como independentes entre si,
e diz-se que o sistema possui n graus de liberdade.
Essas n coordenadas indispensáveis são as coordenadas generalizadas e as represen-
taremos por q1 , · · · , qn . O número n é chamado de número de graus de liberdade. Em
termos das coordenadas generalizadas, a posição de cada partı́cula do sistema pode ser
escrita na forma
~ri = ~ri (q1 , . . . , qn , t), i = 1, . . . , N. (5)
Princı́pio de d’Alembert
Nesta seção determinamos o princı́pio do trabalho virtual e o princı́pio de d?Alembert,
que usa a noção de coordenadas generalizadas e o conceito dos deslocamentos virtuais
para eliminar as forças de vı́nculo da descrição do problema. Em seguida encontramos as
equações de movimento da máquina de Atwood, um exemplo clássico da mecânica e no
exemplo final, as equações de um pêndulo de comprimento fixo e com dissipação.
Deslocamentos Virtuais. Representamos deslocamento virtual por δ~r que é um
deslocamento infinitesimal de um ponto a outro ponto da curva (ou superfı́cie) no mesmo
instante t, o vetor formado por esses pontos é tangente à curva (ou superfı́cie). Ou
seja, dado um sistema de N partı́culas os deslocamentos virtuais δ~ri , i = 1, 2, ..., N são
deslocamentos infinitesimais das posições ~r1 , ~r2 , ..., ~rN realizados instantaneamente.
Suponha um vı́nculo, por exemplo uma curva, que dependa do tempo, ao qual o
movimento da partı́cula está restrito. A equação de vı́nculo, neste caso, é dada por
f (x, y, t) = 0.
O vı́nculo pode também ser uma superfı́cie, neste caso a equação de vı́nculo é f (x, y, z, t) =
0.
A figura abaixo ilustra a diferença entre deslocamento virtual e real para uma partı́cula
restrita a uma superfı́cie onde a velocidade no instante t é u.
Deslocamento real, representado por d~r é um deslocamento que cada partı́cula do
sistema sofre no intervalo de tempo dt de acordo com as equações de movimento do
8
Figura 4: Deslocamentos em superfı́cie móvel.
sistema. O vetor d~r em geral não é tangente à curva. Se a curva(ou superfı́cie) estiver
fixa, ou seja não possui dependência do tempo, então d~r e δ~r são ambos tangentes à
superfı́cie.
Se a superfı́cie à qual o movimento da partı́cula está condicionado é idealmente lisa
(É uma superfı́cie considerada ideal, em que o coeficiente de atrito é igual a zero), logo, a
força de contato entre a partı́cula e a superfı́cie não contém componente tangencial, mas
apenas normal à superfı́cie.
Como a força de vı́nculo f~ é perpendicular à superfı́cie no instante t e deslocamento
virtual δ~r é tangente à superfı́cie , temos que
W = f~ · δ~r = 0,
ou seja, o trabalho é zero.
9
Nesse formalismo, a distinção entre forças de vı́nculo e outras forças, que chamaremos
de forças aplicadas, é fundamental. Escrevemos a força resultante na i-ésima partı́cula
como
(a)
F~i = F~i + f~i (7)
(a)
onde f~i é a força de vı́nculo e F~i é a força aplicada, ou força ativa.
A força peso é a que chamamos de força aplicada e a força T~ , tensão no fio, é a força
de vı́nculo pois é a tração no fio que mantém a massa m sempre a uma distância fixa do
ponto de suspensão. Então a força responsável pelo vı́nculo é tensão no fio.
Vı́nculos cujas forças associadas não realizam trabalho durante deslocamentos virtuais
são chamados de vı́nculos ideais, ou seja
N
X
f~i · δ~ri = 0. (8)
i=1
Para um sistema em equilı́brio a força resultante sobre cada partı́cula é zero, ou seja,
N
X
F~i · δ~ri = 0 pois cada F~i = ~0. (9)
i=1
Como o trabalho virtual das forças de vı́nculo é zero, temos o princı́pio dos trabalhos
virtuais
XN
(a)
F~i · δ~ri = 0. (11)
i=1
10
Este princı́pio é valido para qualquer sistema em equilı́brio, com uma condição que só
envolve as forças aplicadas, ou forças ativas, onde as forças de vı́nculo não fazem mais
parte.
A segunda lei de Newton, declara que
F~i = mi~r¨.
p~i = mi r~˙i ,
Usando o fato de que a força resultante F~i sobre a i-ésima partı́cula pode ser decom-
posta como uma soma de forças de vı́nculo com forças aplicadas, equação (7), reescrevemos
a equação acima como:
p~˙i − F~i = f~i ·
(a)
(14)
Multiplicando escalarmente ambos os lados pelo deslocamento virtual δ~
ri temos para
um sistema de N partı́culas.
N
X N
X
˙ ~ (a)
(p~i − Fi ) · δ~ri = f~i · δ~ri . (15)
i=1 i=1
Supondo que os vı́nculos sejam ideais, o lado direito da equação acima é nulo, equação
(8), e temos o Princı́pio de d’Alembert:
N
X
(p~˙i − F~i ) · δ~ri = 0.
(a)
(16)
i=1
11
Exemplo 2.4 A máquina de Atwood consiste em dois corpos de massas m1 e m2 que
estão suspensos por uma corda inextensı́vel, de modo que esta corda esteja apoiada sobre
uma polia de massa desprezı́vel e presa num suporte rı́gido.
Utilizando o princı́pio de d’Alembert, vamos encontrar as equações de movimento para
o sistema mecânico da figura abaixo, conhecido como máquina de Atwood.
x1 + x2 = l. (17)
Tendo o vı́nculo x1 +x2 = l, os deslocamentos virtuais δ~r1 e δ~r2 não são independentes.
Logo de (17) decorre:
Isto é, os deslocamentos das massas m1 e m2 consistentes com os vı́nculos são deslo-
camentos em que se m1 sobe (ou desce) δx1 e m2 tem que descer (ou subir) −δx1 . Com
isso os deslocamentos virtuais são dados por
12
Como há duas partı́culas no sistema, temos, a partir do princı́pio de d’Alembert
2
X
0= ˙ ~
p~i − Fi
(a) ˙ ~
· δ~ri = p~1 − F1
(a) ˙ ~
· δ~r1 + p~2 − F2
(a)
· δ~r2 , (19)
i=1
(a) (a)
vamos substituir (12), (18) e as forças aplicadas F~1 e F~2 em (19) logo:
(m1 r~¨1 − m1 gı̂) · δx1 ı̂ + (m2 r~¨2 − m2 gı̂) · (−δx1 ı̂) = 0. (20)
Como ~r1 = x1 ı̂ e ~r2 = x2 ı̂ temos:
(m1 x¨1 ı̂ − m1 gı̂) · δx1 ı̂ + (m2 (−x¨1 ı̂) − m2 gı̂) · (−δx1 ı̂) = 0
logo
(m1 + m2 )x¨1 = (m1 − m2 )g.
Portanto a aceleração da massa m1 é
m1 − m2
x¨1 = g,
m1 + m2
e a aceleração de m2 é x¨2 = −x¨1 .
Neste caso, temos que a aceleração x¨1 e x¨2 são constantes, onde facilmente obtemos a
velocidade e a posição de m1 e m2 .
13
Exemplo 2.5 Considerando um pêndulo de comprimento fixo e com dissipação, vamos
encontrar suas equações de movimento, analisando seu comportamento.
Para o nosso exemplo temos uma única partı́cula, logo do princı́pio de d’Alembert ou
seja de (16) temos que:
N
X (a)
(p~˙i − F~i ) · δ~
ri = (p~˙ − F~ ) · δ~r = 0,
i=1
ou seja,
p~˙ · δ~r = F~ · δ~r.
De (12) em que p~˙i = mi r~¨i temos a seguinte equação do movimento (d’Alembert)
como
~r = ~r(θ) = x(θ)ı̂ + y(θ)̂, (24)
derivando r em relação ao tempo temos
dx dy
~v = ~r˙ = θ̇ı̂ + θ̇̂, (25)
dθ dθ
derivando ~r˙ em relação ao tempo novamente:
d2 x 2 dx d2 y 2 dy
~r¨ = 2
θ̇ ı̂ + θ̈ı̂ + 2
θ̇ ̂ + θ̈̂
dθ dθ dθ dθ
d2 x 2 dx d2 y 2 dy
= θ̇ + θ̈ ı̂ + θ̇ + θ̈ ̂. (26)
dθ2 dθ dθ2 dθ
Considerando l o comprimento do pêndulo, temos:
14
O nosso objeto é reescrer a equação (23). Para isso vamos trabalhar primeiramente
com o lado esquerdo da equação, ou seja, com m~r¨ · δ~r. Substituindo (28) , (29) e (30) em
(26) temos
¨ 2 2
~r = − sen(θ)lθ̇ + cos(θ)lθ̈ ı̂ + − cos(θ)lθ̇ − sen(θ)lθ̈ ̂.
então :
" #
m~r¨ = m − sen(θ)lθ̇2 + cos(θ)lθ̈ ı̂ + − cos(θ)lθ̇2 − sen(θ)lθ̈ ̂ . (31)
Para obter a nova equação do lado esquerdo da equação de (23), vamos fazer o produto
escalar de (31) por (34)
¨ 2 2
m~r · δ~r = mδθ − sen(θ)lθ̇ + cos(θ)lθ̈ · cos(θ)l + mδθ − cos(θ)lθ̇ − sen(θ)lθ̈ · (− sen(θ)l)
" #
= mδθ − sen(θ) cos(θ)l2 θ̇2 + cos2 (θ)l2 θ̈ + sen(θ) cos(θ)l2 θ̇2 + sen2 (θ)l2 θ̈ .
Vamos agora analisar o lado direito da equação de d’Alembert, F~ · δ~r, em que a nossa
equação inclui dissipação. Uma boa forma de modelar a dissipação é considerar que a
força de arraste aerodinâmico é proporcional ao quadrado da velocidade. O módulo da
força de dissipação, neste caso, é A = γv 2 , em que γ é a constante de dissipação.
A força dissipativa é contrária ao movimento conforme a figura abaixo. Sendo assim
o vetor força de arraste aponta na direção oposta ao vetor velocidade e é dado por A ~=
~v
−γv 2 , em que v é o módulo da velocidade.
v
15
Figura 7: Dissipação do pêndulo.
~v
F~ = mĝ − γv 2 , ⇒ F~ = mĝ − γv~v . (36)
v
Substituindo (28) em (25):
onde o módulo de ~v é q
v = (cos(θ)l)2 θ̇2 + (− sen(θ)l)2 θ̇2 ,
simplificando a expressão acima utilizando a identidade trigonometrica sen2 θ +cos2 θ = 1,
chegamos em:
v = |θ̇|l, (38)
e que
v 2 = θ̇2 l2 . (39)
Substituindo (38) e (37) em (36), temos
Vamos tirar o módulo de θ̇, tomando cuidado com o sinal ou seja |θ̇| = sinal(θ̇)θ̇ e
reescrever (40) como: 4
h i
~ 2 2 2 2
F = −γsinal(θ̇)θ̇ l cos(θ)ı̂ + mg + γsinal(θ̇)θ̇ l sen(θ) ̂. (41)
Fazendo o produto escalar de (41) por (34) vamos obter uma nova equação para o lado
direito de (23):
h i
F~ · δ~r = −γsinal(θ̇)θ̇2 l2 cos(θ)ı̂ + mg + γsinal(θ̇)θ̇2 l2 sen(θ) ̂
· (cos(θ)lı̂ − sen(θ)l̂) δθ,
4
Por exemplo, se x = −π então αsinal(x) = −α.
16
ou seja,
cancelando os δθ, colocando θ̇2 em evidência e dividindo todos os termos por m, chegamos
na seguinte equação diferencial não linear:
γ 3 2
l2 θ̈ + sinal(θ̇) l θ̇ + g sen(θ)l = 0. (43)
m
que é a equação de movimento do pêndulo de comprimento fixo e com dissipação.
Equações de Lagrange
Nesta seção determinamos as equações de Lagrange, reduzindo o princı́pio de d’Alembert
(que ainda exige trabalhar com mais coordenadas do que o necessário) a uma soma de
produtos de expressões por deslocamentos virtuais em que todos esses deslocamentos
virtuais sejam independentes. Como exemplo encontramos as equações de movimento do
pêndulo de comprimento fixo e com dissipação, visto na seção anterior. Para alguns casos
do exemplo e com o auxı́lio do geogebra 5 , analisamos graficamente o comportamento das
equações.
Partindo do Princı́pio de d’Alembert
N
(a)
X
˙ ~
mi v~i − Fi · δ~ri = 0, (44)
i=1
onde p~˙i = mi v~˙i , vamos reformular cada termo de (44) separadamente e chegar nas equações
de Lagrange.
5
O GeoGebra é um software de matemática dinâmica que reúne recursos de geometria, álgebra e
cálculo. Link : www.geogebra.org
17
Primeiramente vamos relacionar os deslocamentos virtuais (δ~ri ) das posições das partı́culas
com os deslocamentos virtuais das coordenadas generalizadas, onde os ~ri são funções dos
qs e possivelmente do tempo, equação (5), e como os deslocamentos virtuais são feitos a
t fixo então: n
X ∂~
ri
δ~ri = δqk . (45)
k=1
∂q k
ou seja,
N X
n N n
X ∂~ri X X (a) ∂~ri
mi v~˙i · δqk = F~i · δqk . (46)
i=1 k=1
∂q k i=1 k=1
∂q k
Além disso, como cada vetor posição é função das coordenadas generalizadas e possi-
velmente do tempo temos, de (5) em que ~ri = ~ri (q1 , . . . , qn , t), i = 1, . . . , N, e pela regra
da cadeia que:
n
d~ri X ∂~ri ∂~ri
= q˙j + = v~i , (50)
dt j=1
∂q j ∂t
18
dqj
onde q˙j = . Portanto,
dt
∂ v~i ∂~ri
= , (51)
∂ q˙j ∂qj
∂~ri
pois é função das coordenadas generalizadas e do tempo. De fato
∂qj
n
!
∂ v~i ∂ X ∂~ri ∂~ri
= q˙j +
∂ q˙k ∂ q˙k j=1 ∂qj ∂t
n
X ∂~ri ∂ q˙j ∂ ∂~ri
= +
j=1
∂qj ∂ q˙k ∂ q˙k ∂t
n
X ∂~ri ∂ q˙j
= em que
j=1
∂qj ∂ q˙k
(
∂ q˙j 0, j 6= k
= .
∂ q˙k 1, j = k
Supondo que as funções ~ri = ~ri (q1 , . . . , qn , t) sejam diferenciáveis o número necessário
de vezes, podemos reescrever (52) como:
n
d ∂~ ri X ∂ ∂~ri ∂ ∂~ri
= q˙l + (53)
dt ∂qk l=1
∂q k ∂q l ∂q k ∂t
n
!
∂ X ∂~ri ∂~ri ∂ v~i
= q˙l + = , (54)
∂qk l=1 ∂ql ∂t ∂qk
19
Semelhantemente temos que
∂ v~i ∂ mi 2
mi v~i · = v~i . (56)
∂qk ∂qk 2
PN mi 2
Seja T = i=1 v~i a energia cinética do sistema. Então
2
n
X d ∂T ∂T
− − Qk δqk = 0. (60)
k=1
dt ∂ q˙k ∂q k
Como todos os δqs são independentes e arbitrários, esta última igualdade só pode ser
satisfeita se o coeficiente de cada δqk for zero, ou seja
d ∂T ∂T
− = Qk , k = 1, . . . , n. (61)
dt ∂ q˙k ∂qk
As equações acima às vezes são chamadas de equações de Lagrange. Note que as equações
acima foram derivadas sem restringir os tipos de forças aplicadas.
Vejamos que podemos utilizar tanto o princı́pio de d’Alambert quanto as equações de
Lagrange para resolver o mesmo exemplo.
20
Lembrando que o exemplo dado apresenta uma partı́cula, e que no lugar das coorde-
nadas generalizadas qs temos o ângulo θ, a energia cinética que vamos usar na equação
acima é dada por:
1
T = mv 2 . (63)
2
Na equação (39) do exemplo 2.5, temos v 2 = l2 θ̇2 . Logo
1
T = ml2 θ̇2 . (64)
2
A derivada parcial de T em relação a θ̇ é:
∂T
= ml2 θ̇,
∂ θ̇
logo
d∂T
= ml2 θ̈. (65)
dt
∂ θ̇
Observando que a energia cinética não depende da coordenada θ, temos que a derivada
parcial de T em relação a θ é:
∂T
= 0. (66)
∂θ
Portanto o lado esquerdo da igualdade de (62) é dada por
d ∂T ∂T
− = ml2 θ̈. (67)
dt ∂ θ̇ ∂θ
Para reescrever o lado direito da igualdade de (62), ou seja, de Q que por definição é
∂~r
Q = F~ · , (68)
∂θ
∂~r
basta encontrar , pois F~ ja foi calculado no exemplo 2.5. Lembrando que:
∂θ
~r = ~r(θ) = x(θ)ı̂ + y(θ)̂,
dx dy
= cos(θ)l e = − sen(θ)l
dθ dθ
em (69) temos:
21
∂~r
= cos(θ)lı̂ − sen(θ)l̂. (70)
∂θ
∂~r
Para fazermos o produto escalar F~ · , vamos substituir (41) que é:
∂θ
h i
F~ = −γsinal(θ̇)θ̇2 l2 cos(θ)ı̂ + mg + γsinal(θ̇)θ̇2 l2 sen(θ) ̂
∂~r
Q = F~ ·
∂θ
2 2 2 2
= −γsinal(θ̇)θ̇ l cos(θ)ı̂ + mg + γsinal(θ̇)θ̇ l sen(θ) ̂
· cos(θ)lı̂ − sen(θ)l̂
γ
l2 θ̈ + sinal(θ̇)l3 θ̇2 + g sen(θ)l = 0 (72)
m
obtendo a mesma equação diferencial (43) não linear do exemplo 2.5.
Com o auxı́lio do geogebra, que resolve a EDO numericamente, geramos a figura 8.
Nesta figura a dissipação é diferente de zero e utilizamos várias condições iniciais.
Tomando as condições iniciais CI8 e CI7 onde a velocidade angular é maior, o pêndulo
fica girando até começar a oscilar e depois tende a parar. Para CI8 o pêndulo fica girando
em sentido anti-horário, sua velocidade angular diminui e por final o pêndulo começa a
oscilar até parar. A diferença da CI7 para CI8 é o sentido que os pêndulos começam a
girar, no caso da CI7 o pêndulo gira em sentido horário.
22
Figura 8: Gráfico do pêndulo com dissipação e de comprimento fixo. Fonte própria
l2 θ̈ − g(− sen(θ)l) = 0
6
Inúmeros avanços tecnológicos só se tornaram possı́veis através do estudo dos pêndulos na fı́sica,
visto que são descritos como objetos de fácil previsão de movimentos.
23
Figura 9: Gráfico do pêndulo simples sem dissipação e de comprimento fixo. Fonte própria
24
logo podemos escrever as forças generalizadas Qk como:
N N
X
~ ∂~
ri X ∂xi ∂yi ∂zi
Qk = Fi · = Fix + Fiy + Fiz
i=1
∂qk i=1
∂qk ∂qk ∂qk
N
X ∂V ∂xi ∂V ∂yi ∂V ∂zi
= − + + .
i=1
∂xi ∂qk ∂yi ∂qk ∂zi ∂qk
25
A lagrangiana em geral é uma função
26
Logo a lagrangiana é
(m1 + m2 )x˙1 2
L=T −V = − (m2 − m1 )gx1 + m2 gl.
2
Temos que
∂L ∂L d ∂L
= −(m2 − m1 )g, = (m1 + m2 )x˙1 , e = (m1 + m2 )x¨1 .
∂x1 ∂ x˙1 dt ∂ x˙1
Com base na figura acima, temos (x1 , y1 ) e (x2 , y2 ) como coordenadas cartesianas das
massas m1 e m2 , respectivamente. Os ângulos θ1 e θ2 são as coordenadas generalizadas.
Em termos das coordenadas generalizadas temos
27
de onde obtemos
m1 v12 m2 v22
T = + ,
2 2
ou seja,
m1 2 m2 2
T = (x˙1 + y˙1 2 ) + (x˙2 + y˙2 2 ).
2 2
Substituindo os valores de x˙1 , y˙1 , x˙2 , y˙2 na equação acima temos
" #
m1
T = (l1 θ˙1 cos θ1 )2 + (−l1 θ˙1 sen θ1 )2
2
" #
m2
+ (l1 θ˙1 cos θ1 + l2 θ˙2 cos θ2 )2 + (−l1 θ˙1 sen θ1 − l2 θ˙2 sen θ2 )2
2
m1 2 2 ˙ 2 2 2 ˙ 2
= l1 cos θ1 θ1 + l1 sen θ1 θ1
2
m2 2 ˙ 2 2
+ l1 θ1 cos2 θ1 + 2l1 l2 θ˙1 θ˙2 cos θ1 cos θ2 + l22 θ˙2 cos2 θ2
2
2 ˙ 2 2
+ l1 θ1 sen θ1 + 2l1 l2 θ˙1 θ˙2 sen θ1 sen θ2 + l2 θ˙2 sen θ2
2 2 2
m1 2 ˙ 2
T = l θ1 (sen2 θ1 + cos2 θ1 )
2 1
m2 2 ˙ 2 2
+ l1 θ1 (sen2 θ1 + cos2 θ1 ) + l22 θ˙2 (sen2 θ2 + cos2 θ2 )
2
+ 2l1 l2 θ˙1 θ˙2 (cos θ1 cos θ2 + sen θ1 sen θ2 )
28
Adotando o nı́vel zero do potencial gravitacional no plano horizontal que contém o
ponto de suspensão de m1 , temos
Substituindo agora
∂L
= m2 l22 θ˙2 + m2 l1 l2 θ˙1 cos(θ1 − θ2 ),
˙
∂ θ2
d ∂L
= m2 l22 θ¨2 + m2 l1 l2 θ¨1 cos(θ1 − θ2 )
dt ∂ θ˙2
2
− m2 l1 l2 θ˙1 sen(θ1 − θ2 ) + m2 l1 l2 θ˙1 θ˙2 sen(θ1 − θ2 ),
∂L
= m2 l1 l2 θ˙1 θ˙2 sen(θ1 − θ2 ) − m2 gl2 sen θ2 .
∂θ2
na equação de Lagrange
∂L d ∂L
− = 0,
∂ θ˙2
dt ∂θ2
temos a segunda equação do movimento do pêndulo duplo
2
m2 l22 θ¨2 + m2 l1 l2 θ¨1 cos(θ1 − θ2 ) − m2 l1 l2 θ˙1 sen(θ1 − θ2 ) + m2 gl2 sen θ2 = 0. (80)
29
As equações (79) e (80) formam um sistema de EDOs não lineares acopladas cuja
solução fornece os valores de θ1 e θ2 ( ou θ˙1 e θ˙2 ) em função do tempo.
Todas as interações fundamentais da fı́sica são tipicamente representadas por forças
conservativas ou mesmo que não sejam conservativas, por exemplo, no caso da força
eletromagnética ainda sim é possı́vel dar uma forma Lagrangiana para as equações de
movimento para uma partı́cula no campo eletromagnético. O fato é que todas as forças
fundamentais da natureza conduzem a equações de movimento que podem ser colocadas
na forma Lagrangiana.
Considerações Finais
A Matemática é uma ciência bela por si só em sua formulação e desenvolvimento.
Porém ela vai além disso. A Matemática é uma ferramenta universal no sentido de que ela
é usada para quantificar, descrever e fornecer previsões nas diversas áreas do conhecimento
como biologia, quı́mica, engenharias em geral e fı́sica, entre outras.
A proposta deste trabalho é apresentar o princı́pio de d’Alembert e as equações de
Lagrange de forma que o professor do ensino básico ou até mesmo alunos graduação
possam aprofundar seus conhecimentos e tomar o texto como parte introdutória para o
estudo da mecânica analı́tica.
Agradecimentos
Agradeço a Deus, que me possibilitou oportunidades de estudar e me dedicar à Ma-
temática.
Agradeço minha dignı́ssima, Ludmila Alves Rioga, que tem uma grande participação
em cada uma das minhas vitórias. Você me fortaleceu e tranquilizou nos momentos em
que mais precisei, me deu conselhos e ajuda em momentos difı́ceis. Obrigado por tudo!
À minha mãe Solange, avó Maria Francisca, que sempre acreditaram em minha ca-
pacidade e me inspiraram a fazer o melhor de mim. Meus irmãos, tias, primos e amigos
pela parceria, amizade e força que deram ao longo dos anos.
Aos meus sogros, em especial a minha sogra que não está mais entre nós mas que
sempre torceu por mim.
Aos colegas de curso que sempre contribuı́ram nos momentos em que as dificulda-
des surgiam. Aos professores do PROFMAT/UFSJ, mediadores importantes nessa ca-
30
minhada, em especial ao meu orientador Denis Gouvêa Ladeira que acreditou no meu
trabalho, tendo muita paciência e ao meu coorientador Marcelo Veloso pela ajuda e dis-
ponibilidade.
À UFOP e os professores pelo apoio e também por serem a porta de entrada para o
PROFMAT.
Finalmente agradeço à CAPES pelo apoio financeiro.
Referências
[1] Goldstein, Herbert; Poole, Charles; Safko, John. Classical Mechanics, 3rd edition,
Addison Wesley, 2002.
[2] Halliday, David and Resnick, Robert. Fı́sica I, volume 1 . Livros Técnicos e ci-
entı́ficos, Rio de Janeiro, 2008.
[3] Henrique Alves Monteiro, Luiz. Sistemas dinâmicos , Editora Livraria da Fisica,
2006.
[5] Stewart, James. Cálculo, Vol. 2, 7a edição. Editora Cengage Learning, 2013.
31