As Variedades Regionais de Pereiras
As Variedades Regionais de Pereiras
As Variedades Regionais de Pereiras
FRUTICULTURA
Quem esteve ou está ligado ao meio rural em Alcobaça, tem um campo de variedades quenas hortas, quintais e agricultura urba-
recorda com saudosismo algumas varie- regionais de pereiras que conta atualmente na. Outras existem que consideramos serem
dades de peras antigas, ditas tradicionais com 52 proveniências diferentes. importantes em termos de preservação e
portuguesas, cujos frutos eram saborosos, melhoramento genético, mas que não serão
aromáticos e suculentos, que quando as Variedades regionais abordadas neste artigo.
consumiam o sumo escorria pelas mãos. As variedades consideradas regionais são
Atualmente, essas peras, algumas de pe- aquelas que devido ao seu cultivo, ao lon- Época de floração
queno calibre, não estão disponíveis no go de décadas, em determinada região e A fase crucial na produção de frutos é a fase
mercado, principalmente nas grandes su- em condições edafoclimáticas específicas, da floração, na qual fica definido a produ-
perfícies. Quem tem o privilégio de visitar eram utilizadas pelos agricultores nas suas ção que vamos obter. Assim, consideramos
os mercados locais, por vezes, ainda conse- hortas e quintais e, mais tarde, em peque- importante o conhecimento desta fase nas
gue adquirir algumas dessas peras que são nos pomares, para a produção de fruta. diferentes variedades de pereiras regionais
produzidas por alguns fruticultores apeli- É nossa intensão, neste artigo, dar a co- com potencial interesse para a produção.
dados de tradicionalistas ou pouco evoluí- nhecer algumas das variedades de pereiras No Quadro 1 apresentamos a escala de flo-
dos, como se a evolução tivesse a ver com o regionais que ainda têm potencial para a ração média de 27 variedades observadas
que se produz. produção de peras diferenciadas pela época entre 2002 e 2015 (14 anos de observações),
No futuro, cada vez se vão encontrando me- de maturação, forma, sabor e aroma, em pe- nas condições edafoclimáticas de Alcoba-
nos frutos tradicionais portugueses, devido a ça. Nestas observações, não se considerou o
que quem produz árvores para plantar (vivei- ano de 2016 devido às condições climáticas
ristas) não multiplica essas variedades que são particulares (atraso na floração e maturação
pouco procuradas para grandes plantações. de cerca de um mês). Neste quadro conside-
Certamente que o leitor se está a questio- ramos o início da floração o estado 61 (10%
nar: qual a razão para que essas variedades de flores abertas) da escala internacional de
estejam a ser abandonadas? A razão é que floração BBCH, a plena floração o estado 65
estas variedades são menos produtivas, os (mais de 50% de flores abertas) e final da flo-
frutos têm um poder de conservação muito ração o estado 69 (todas as pétalas caídas).
curto e assim a oportunidade de venda des- O conhecimento das diferentes fases da flo-
ses frutos também é curta, pelo que é difícil ração também é muito importante, devido a
escoar grandes quantidades em tempo útil. que a maioria das pereiras necessita de po-
Recordo que a pera mais cultivada em Por- linização cruzada para formar frutos, pelo
tugal, é a variedade ‘Rocha’ que é uma va- que é necessário existir coincidência par-
riedade regional que se foi expandindo de- cial das épocas de floração e compatibilida-
vido às suas características produtivas, à Figura 1 – Pera ‘Bonita’ de genética para que ocorra a fecundação,
resistência ao manuseamento e à colheita isto na presença de insetos polinizadores.
e ao elevado poder de conservação. Muitos Como podemos verificar no Quadro 1, a va-
trabalhos de investigação e experimentação riedade ‘Carapinheira’ é, na média dos 14
(I&E) se têm feito com esta variedade e na- anos de observações, a primeira a entrar em
da nos indica que não existam outras varie- floração, seguindo-se a variedade ‘Pérola’.
dades de peras regionais que, sendo objeto As variedades ‘Cristo’ e ‘S. Bartolomeu’ são
futuro de trabalhos de I&E, não sejam tam- as que iniciam a fase da floração mais tar-
bém interessantes. de. A variedade com a floração média mais
Tendo presente que devemos preservar o escalonada é a ‘Bonita’ (Figura 1), em que a
material genético que herdamos e, se pos- fase de floração decorre durante 34 dias. As
sível, utilizá-lo para criar outro material variedades ‘S. Crispim’ (Figura 2) e ‘Amên-
genético mais adaptado às condições cli- doa’ são as que têm a fase de floração mais
máticas, que estão em mudança, o Institu- curta (18 dias). A variedade ‘Carapinheira’,
to Nacional de Investigação Agrária e Ve- que normalmente é utilizada como polini-
terinária (INIAV, I.P.) através da Estação zadora para a variedade ‘Rocha’, tem uma
Nacional de Fruticultura Vieira Natividade, Figura 2 – Pera ‘S. Crispim’ fase de floração de 23 dias.
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FRUTICULTURA
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CABEÇA
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QUADRO 2 – DATA DE MATURAÇÃO MÉDIA, NDAPF, CALIBRE, FORMA E COR DA EPIDERME DE ALGUMAS VARIEDADES REGIONAIS DE PEREIRAS
Características dos Frutos
Variedades Data de Maturação Forma Cor da
NDAPF Calibre
Junho Julho Agosto Setembro Outubro do Fruto Epiderme
Água ou Aguinha 21 79 Pequeno Arredondada Verde
Amêndoa 6 124 Pequeno Achatada Verde
Amêndoa da Guia 26 136 Médio Arredondada Verde c/ carepa
Bela Feia 3 147 Médio Arredondada Verde
Bojarda 16 125 Pequeno Piriforme Verde
Bonita 15 97 Pequeno Piriforme Verde Manchada
Cabeça Pequena 24 78 Pequeno Piriforme Verde Manchada
Carapinheira 24 105 Pequeno Achatada Verde
Carvalhal ou Cornicabra 7 93 Pequeno Alongada Verde
Coxa de Freira ou Carapinheira Roxa 4 115 Médio Achatada Verde Manchada
Cristo 14 151 Médio Achatada Verde Manchada
Dona Joaquina 16 93 Pequeno Arredondada Verde Manchada
De Cozer 15 193 Grande Achatada Castanha
Formosa 10 182 Grande Piriforme Verde
Lambe os Dedos 23 137 Pequeno Achatada Verde Manchada
Marmela 18 129 Grande Arredondada Verde
Marquesa ou Marquesinha 25 132 Grande Achatada Verde Manchada
Melão 18 162 Grande Arredondada Verde
Pão 17 135 Pequeno Achatada Verde Manchada
Pérola 7 98 Médio Alongada Verde Manchada
Rabiça 5 92 Médio Piriforme Verde
Rocha 19 133 Médio Piriforme Verde
São Bartolomeu 5 110 Médio Piriforme Verde Manchada
São Bento de Chaves 9 186 Grande Arredondada Verde
São Crispim 8 92 Pequeno Alongada Verde Manchada
Sete Cotovelos 15 164 Grande Piriforme Verde Manchada
Vindima 23 169 Grande Achatada Verde c/ carepa
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quando está compreendido entre os 56 mm e os 65 mm e grande
quando o diâmetro é superior a 66 mm.
Os frutos mais pequenos são os da variedade ‘Bonita’ e os frutos
maiores são os da variedade ‘Melão’ (Figura 4).
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Cor da epiderme
Um fruto é mais ou menos atrativo consoante a sua forma e
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coloração, pelo que julgamos importante fazer referência à
coloração da epiderme dos frutos, uma vez que pode ajudar
a distinguir/conhecer algumas das variedades de pereiras
regionais portuguesas. No Quadro 2 consideramos a cor da
epiderme, verde, sempre que os frutos têm a cor de fundo ver-
de com pequenas manchas, ou não, de carepa (cor acastanha-
da), como, por exemplo, a variedade ‘Carapinheira’ (Figura
7). Consideramos a cor da epiderme verde manchada, sempre
que os frutos têm a cor de fundo verde, mas têm uma colo-
ração rosada-avermelhada do lado exposto ao Sol, como, por
exemplo, a variedade ‘Pérola’ (Figura 5). Da mesma forma,
consideramos verde c/ carepa, sempre que os frutos têm a cor
de fundo verde, mas predomina a carepa, como, por exemplo,
a variedade ‘Vindima’ (Figura 8). Consideramos epiderme
castanha, sempre que o fruto tem a cor de fundo completa-
mente coberta pela carepa, como, por exemplo, a variedade
‘De Cozer’.
Notas finais
Não pretendemos, neste artigo, caracterizar exaustivamente
as variedades regionais de pereiras mas sim dar a conhecer as
características mais interessantes de algumas delas, que fomos
registando ao longo de 14 anos. Também não pretendemos in-
centivar a produção com escala destas variedades, devido aos
problemas de comercialização, algumas delas devido ao ca-
libre pequeno, outras pelo curto período de conservação dos
frutos. No entanto, pretendemos “abrir” o apetite a alguns lei-
tores, que têm um espaço junto das suas habitações, para pro-
duzir para si e para os amigos frutos de qualidade ímpar, com
forma, cor e sabor diferentes que não encontram facilmente
nas frutarias.
Produzir frutos iguais aos que encontramos no mercado, não
nos diferencia nem contribui para a nossa qualidade de vida.
Consumir uma pera que atingiu a maturação na pereira, dá-nos
uma sensação única, em que ficamos todos lambuzados devido
ao sumo que contém e à macieza da sua polpa. Desta forma, é
possível contribuir para a preservação das variedades de pe-
reiras regionais, mantendo a nossa soberania e contribuir para
que as gerações vindouras tenham à sua disposição aquilo que
herdámos dos nossos antepassados.