Sentenças Anônimas Dos Padres Do Deserto PDF
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Sentenças Anônimas Dos Padres Do Deserto PDF
avia um anacoreta que tinha o poder de expulsar demônios; e ele lhes perguntou:
"O que os faz irem embora? É o jejum?" Eles replicaram: "Não comemos nem
bebemos". "São as vigílias?"
Eles responderam: "Nunca dormimos". "É a separação
do mundo?" "Vivemos nos desertos". "Qual poder os expulsa então?" Eles
disseram: "Nada nos pode vencer, além da humildade" "Vocês vêem como a
humildade é vitoriosa sobre os demônios?"
Disse um ancião: "Nunca dei um passo sem saber onde colocar os pés. Parava para
refletir, sem ceder, até que Deus me tomasse pela mão".
Disse um ancião:
"Deus habita naquele no qual nada penetra de estranho".
Dizia um ancião: "Suporta o opróbrio e a aflição pelo nome de Jesus com humildade
e coração contrito. Revela diante dele a tua fraqueza e ele será tua força".
Disse um ancião: "Se o homem faz a vontade do Senhor, jamais deixa de ouvir a
voz interior".
Alguns irmãos foram visitar um santo ancião que habitava num local deserto.
Encontraram, na vizinhança, crianças que apascentavam as ovelhas e falavam
entre si de modo enervante. Os irmãos viram o ancião, abriramlhe seus
sentimentos e tiveram proveito com suas respostas. Depois lhe disseram: "Pai,
porque aceitas ao teu derredor estas crianças e não lhes ordenas de parar com
esse barulho?" O ancião respondeu: "Irmãos, acreditai, há dias em que gostaria de
fazer isso, mas me controlo, dizendo: Se não suporto esses gritos, como poderei
suportar uma grande provação, se Deus permitir que se me apresente? Deste
modo, não digo nada, para habituarme a suportar tudo aquilo que acontece".
Um irmão perguntou a um ancião: "Qual é a cultura da alma que produz frutos?"
Respondeu o ancião: "Nisto consiste a cultura da alma: a paz do corpo, muitas
preces corporais, não prestar atenção nos erros dos outros, mas nos seus. Se o
homem persevera nisso tudo, sua alma não demorará a produzir frutos".
Num dia, um noviço resolveu renunciar ao mundo. Disse ao ancião: "Quero ser
monge". O ancião respondeu: "Não conseguirás". E o outro: "Conseguirei". O ancião
disse:
"Se realmente queres, vai, renuncia ao mundo e depois vem morar em tua
cela".
Ele foi, doou o que possuía, guardou para si cem moedas e retornou ao
ancião. O ancião lhe disse: "Vai morar em tua cela". Ele foi. Enquanto lá estava,
seus pensamentos lhe disseram: "A porta está velha e deve ser trocada". Foi, e
disse ao ancião: "Meus pensamentos me dizem: A porta está velha e deve ser
trocada". O ancião lhe respondeu: "Ainda não renunciaste ao mundo; vai, renuncia
ao mundo e depois volta aqui". Ele foi, doou noventa moedas, guardou dez e disse
ao ancião: "Eis, renunciei ao mundo". Disselhe o ancião: "Vai, habita tua cela". Ele
foi. Enquanto lá estava, seus pensamentos lhe disseram: "O teto é velho e deve ser
refeito".
Dirigiuse ao ancião:
"Meus pensamentos me dizem: o teto é velho e deve
ser refeito". "Vai, renuncia ao mundo".
Disselhe o ancião: O irmão foi, doou as dez
moedas e retornou ao ancião: "Eis: renunciei ao mundo". Enquanto estava em sua
cela, seus pensamentos lhe disseram: "Tudo é muito velho, virá um leão e me
devorará". Expôs esses pensamentos ao ancião, que lhe disse: "Eu gostaria que
tudo caísse encima de mim e que um leão viesse devorarme, para ser libertado
desta vida. Vai, habita tua cela e reza a Deus".
Perguntouse a um velho: "Que significa prestar contas de uma palavra inútil?"
Respondeu: "Toda palavra dita a respeito de um objeto material é coisa inútil, pois
somente as palavras ditas a respeito da salvação da alma não são inúteis. Por outro
lado, é melhor escolher o silêncio total, porque, enquanto dizes o bem, junto vem o
mal".
Disse um ancião: "Fugi do amor que as coisas perecíveis inspiram, porque esse
amor passa e morre com elas".
Disse um ancião: "Quando deixo o fuso cair, penso primeiro na morte para depois
apanhálo novamente".
Perguntouse a um ancião: "Por que tenho medo quando caminho no deserto?".
"Porquer ainda estás vivo", respondeu.
Diziam os anciãos:
"A oração é o espelho da alma".
Um irmão foi visitar um dos abades da laura de Suca, nas colinas de Jericó e lhe
disse: "Então, Pai, como estás?". O ancião respondeu: "Mal".
Disse o irmão:
"Por
que, Pai?". Respondeu o ancião: "Porque há trinta anos me conservo de pé diante
de Deus durante a minha oração, e agora me amaldiçoo a mim mesmo, dizendo a
Deus: 'Não tenhas piedade de todos aqueles que fazem o mal e sejam malditos
aqueles que se afastam de teus mandamentos'. E eu, que sou um mentiroso, todo o
dia grito a Deus: 'Condena a todos aqueles que mentem'. E eu, que vivo pensando
em comer, digo: 'No meio da noite acordeime para louvarte'. Não tenho,
absolutamente, compunção alguma e digo: 'Sofri no meu pranto e minhas lágrimas
noite e dia substituíram meu pão'. Eu, que tenho no coração pensamentos
perversos, digo a Deus: 'A meditação de meu coração está sempre diante de ti'. E
eu, que nunca jejuo, digo: 'Meus joelhos estão enfraquecidos por causa de meus
jejuns'. E cheio de orgulho e de prazer da carne sintome ridículo salmodiando:
'Olha minha humildade e meu sofrimento e perdoame todos os meus pecados'. E
eu, que ainda não estou pronto, digo: 'Meu coração está pronto, ó Deus'. E, numa
palavra, todo o meu Ofício e a minha oração retornam a mim como reprovação e
vergonha". O irmão disse ao ancião: "Penso, Pai, que Davi disse tudo isso por si
mesmo". Então o ancião disse, chorando:
"Que dizes, irmão? Certamente, se nós
não observamos aquilo que salmodiamos diante de Deus, seremos condenados".
Se fazes teu trabalho manual na cela e chega a hora da oração, não digas:
"Terminarei de trançar meu cesto e depois me levantarei" , mas levantate logo e
paga a Deus a dívida da oração; do contrário, pouco a pouco cairás no costume de
relaxar na oração e o teu Ofício e a tua alma se tornarão desertos de todo trabalho
espiritual e corporal. Pois é desde o amanhecer que se mostra a tua vontade.
Dizia um ancião:
"Nada faças sem rezar e nunca te arrependerás".
Dizia um ancião:
"Assim como uma só boca não pode ao mesmo tempo pronunciar
duas palavras que possam ser reconhecidas e entendidas, do mesmo modo
acontece com a oração impura que o homem proclama diante de Deus".
"A que serve agradar aos homens, se ofendo ao Senhor meu Deus? Testemunha
disso é o divino Apóstolo que disse: 'Se eu ainda agradar aos homens, não serei o
servo de Cristo'. Rezemos, portanto, ao Senhor, dizendo: Jesus, nosso Deus,
protegenos de seus louvores e de suas críticas. E nada façamos para agradarlhes,
pois seus louvores não nos podem fazer entrar no Reino dos Céus, nem suas
críticas têm o poder de impedirnos de entrar na vida eterna, pois eles não possuem
aquilo que nos faz nela entrar. Sabei, portanto, ó amados, que devemos prestar
contas de toda palavra inútil; fujamos dela como se foge de uma serpente".
Disse um ancião: "Para um irmão, é a mesma coisa querer brigar com um
adversário ou com o diabo".
Num dia, o arcebispo Teófilo dirigiuse ao Monte de Nítria e o abade do Monte
veiolhe ao encontro.
"Pai", perguntoulhe o arcebispo, "o que encontraste de mais
vantajoso neste caminho?" Respondeu o ancião: "Acusarme e repreenderme sem
trégua". "De fato, não existe outro caminho", replicou o arcebispo.
Um ancião disse: "Por qualquer provação que te afligir, culpate somente a ti
mesmo, dizendo: 'Aconteceume por minha culpa, por causa de meus pecados'".
Um irmão perguntou a um ancião: "Indicame somente uma coisa para eu guardar,
para que eu viva fazendo isso!"
. Disselhe o ancião:
"Se puderes ser injuriado e
suportar as injúrias, é algo grandioso, que supera todas as virtudes".
Um ancião disse:
"A terra na qual o Senhor mandou cultivar é a humildade".
Um irmão disse a um ancião: "Se um irmão me dirige palavras profanas, tu me
permites, Pai, de dizêlo para não fazer mais?". Disselhe o ancião: "Não".
E o irmão
disse:
"Por que?". Respondeu o ancião: "Porque nem nós somos capazes de
observar isso e é de se temer que, dizendo ao próximo para não fazêlo, estejamos
nós no perigo de fazêlo". Disse o irmão: "O que, então, se deve fazer?". Disselhe o
ancião: "Se soubermos calar, ao próximo basta o nosso exemplo".
Dizia sempre um ancião que morava no Egito:
"Não há caminho mais curto do que o
caminho da humildade".
Contavase que um ancião vivia no hesicasmo nas partes planas do país e tinha um
leigo cristão a seu serviço. Aconteceu que o filho deste adoeceu. Por muito tempo o
pai suplicou ao ancião de ir rezar por seu filho e o ancião partiu com ele. Correndo à
frente, o leigo entrou em sua casa e gritou: "Vinde ao encontro do anacoreta".
Quando o ancião percebeuos vindo ao seu encontro com as tochas, teve a idéia de
tirar a roupa, entrar no rio e porse a lavála ficando nú. Quando o servidor o viu.
cheio de vergonha disse ao povo: "Ide embora, pois o ancião perdeu o juízo".
Depois, dirigiuse a ele e perguntou: "Pai, por que fizeste isso? Todos dizem: 'O
ancião está com o demônio no corpo'". Respondeulhe o ancião: "Era exatamente
isso que eu queria".
Um irmão interrogou um dos pais a respeito de um pensamento blasfemo: "Pai,
minha alma está oprimida sob um pensamento blasfemo, tem piedade de mim e
dizme de onde vem e o que devo fazer". O ancião respondeu: "Este pensamento
nos vem porque falamos, desprezamos e criticamos; ele é sobretudo uma
conseqüência do orgulho, da vontade própria, da negligência na oração, da cólera e
da fúria, coisas todas que são, precisamente, os sinais do orgulho. Realmente, o
orgulho faznos entrar nas paixões que enumerei, e delas nasce o pensamento
blasfemo. E se esse pensamento ganha espaço na alma, o demônio da blasfêmia o
entrega ao demônio da impureza. Muitas vezes o leva até à perda dos sentidos, e
se o homem não o reencontra, está perdido".
Disse um ancião: "Por acaso acreditais que Satanás quer introduzir em vós todos os
pensamentos? Não. É por meio de um únicop pensamento que vence a alma e
espera conduzila à perdição. Planta nela esse único pensamento, não necessita de
outro. Portanto, ficai atentos para não demonstrar agrado por um único mau
pensamento".
Disse um ancião:
"Missão do monge é afastar para longe os próprios pensamentos".
Contase que nas Celas vivia um ancião de dura ascese. Num dia em que recitava o
Ofício, um santo homem veio à sua cela e de fora notou que ele lutava contra os
próprios pensamentos. "Até quando", dizia, "por uma única palavra perderei todo o
resto?".
O que estava fora imaginou que estivesse discutindo com alguém: bateu,
para entrar e conseguir um acordo entre eles. Entrando, porém, viu que não havia
ninguém além do velho. E como tinha liberdade de falar com ele, perguntou: "Pai,
com quem discutias?" "Com os meus pensamentos", repondeu. "Veja: decorei
quatorze livros e não ouvi mais nenhuma palavra fora daqui. Quando fui cumprir a
obra de Deus, tinha esquecido tudo: somente aquela única, pobre palavra, estava
em minha mente no momento de rezar o Ofício. Eis a razão pela qual brigava com
meus pensamentos".
Um irmão perguntou a um dos pais: "Ficamos contaminados se pensamos coisas
reprováveis?". Após ter examinado a questão entre si, alguns pais disseram: "Sim,
certamente que nos contaminamos". Outros, pelo contrário, disseram: "Não, pois se
nos contaminasse seria impossível a salvação, porque nós somos frágeis; pelo
contrário, é possível salvarse desde que não realizemos corporalmente aquilo que
pensamos". O irmão que tinha feito a pergunta julgou insatisfatórias as respostas
dadas pelos pais, pois eram discordantes. Dirigiuse a um ancião mais
experimentado e o consultou sobre este ponto. Respondeulhe o ancião: "Pedese
de cada pessoa que faça aquilo que lhe é possível". O irmão insistiu:
"Em nome do
Senhor, peçote que me expliques esta palavra". Disse o velhinho:
"Suponhamos
que aqui se encontre um vaso e que é impossível vêlo sem desejálo. Entram dois
irmãos; um alcançou grandes virtudes com a ascese da vida e o outro, poucas. Se o
espírito do monge perfeito fica perturbado ao ver este vaso e se diz: Quero têlo
imediatamente, mas afasta o desejo, não fica contaminado. Quanto àquele que
ainda não atingiu um alto grau de virtude, se deseja esse vaso e por muito tempo
rumina esse pensamento porque o desejo o consome, mas de fato não o rouba,
também ele não se contamina".
Um irmão interrogou um ancião: "O que fazer? Uma multidão de pensamentos me
ataca e não sei como resistir". Disse o ancião: "Nunca lutes contra todos, mas
contra um só. Porque todos os pensamentos dos monges têm apenas uma cabeça.
Portanto, é necessário examinar qual seja realmente esse único pensamento e qual
a sua natureza, para depois lutar contra ele. Então todos os outros pensamentos
perderão sua força".
Disse um ancião:
"O esquecimento é a raiz de todos os males".
Um irmão atormentado pelos maus pensamentos sofria muito e, pela sua grande
humildade, dizia: "Eu, com tais pensamentos, não posso alcançar a salvação".
Dirigiuse então a um grande ancião e recomendouse a suas orações para que se
livrasse desses pensamentos. Disselhe o ancião: "Isso não te serve, meu filho".
Mas ele insistia com veemência. E como o ancião rezou, Deus livrou o irmão do
combate; e imediatamente ele caiu na presunção e no orgulho. E dirigiuse ao
ancião para pedirlhe que retornassem os pensamentos e a humildade que possuía.
Se és atacado por pensamentos impuros, não os escondas, mas contaos logo ao
teu diretor espiritual e assim os dominarás. Pois, na medida em que escondemos os
próprios pensamentos, eles se multiplicam e ganham força. Do mesmo modo que
uma serpente sai de sua toca e foge correndo, assim os maus pensamentos, uma
vez denunciados, desaparecem. Como um verme a madeira, assim os maus
pensamentos corroem o coração. Quem manifesta seus pensamentos logo fica
curado; quem os esconde, comete o pecado do orgulho. Pois, se não tens confiança
suficiente em alguém para revelarlhe tuas lutas, essa é a prova de que não tens
humildade. A quem é humilde todos parecem santos e bons, enquanto que a si
mesmo se considera o único pecador. Por outro lado, se alguém invoca a Deus com
todo o coração e interroga um homem a respeito de seus pensamentos, o homem
lhe responde ou, mais ainda, é Deus que responde como se deve pela mediação do
homem, ele que abriu a boca da burrinha de Balaão, mesmo se o interrogado for
indigno e pecador.
Um irmão perguntou a um ancião: "Que devo fazer, Pai, para combater os
pensamentos que vêm das paixões?".
Ele respondeu: "Invoca o Senhor, para que
os olhos de tua alma enxerguem os socorros que Deus envia ao homem para serem
sua defesa e protegêlo".
Um irmão perguntou a um ancião: "Que devo fazer quando meus pensamentos me
perturbam?". Ele respondeu: "Dizlhes: 'Me dizem respeito? Que devo fazer com
vocês?'. E terás o descanso. Não contes contigo para nada, joga tua vontade fora,
não tenhas nenhuma preocupação, e os pensamentos fugirão para longe de ti".