Fingimento Artístico - E

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Fingimento artístico - Explicação

“Autopsicografia” pág. 32

O ato de fingir a dor sentida em imagens poéticas atinge grau de perfeição estética de tal
ordem “Finge tão completamente” que a dor fingida (a da escrita) se a figura mais real ao sujeito
poético do que a que sentiu (na realidade) e intelectualizou.

O processo de criação poética na perspetiva de Fernando Pessoa implica o ato de fingir de


intelectualizar e é de tal modo intenso e completo que a primeira dor (a dor sentida) deixa de o ser
para se transformar numa dor elaborada intelectualmente (a dor fingida). Em suma, o poeta
transmuta as emoções e as experiências vividas no real para o plano do intelecto e das ideias,
transformando-as em imagens poéticas, disponibilizadas para a fruição e interpretação dos leitores.

O sujeito poético introduz a partir da perífrase (v.5) os leitores como elementos


fundamentais no processo literário. A poesia só faz sentido se for lida e interpretada pelos leitores.
Note-se que a fruição da obra de arte dá-se pela intelectualização da dor fingida pelo sujeito poético,
isto é, a “dor lida” cuja intensidade é expressa pelo adverbio “bem” (v.6), é fruto da interpretação
do leito.

Na terceira estrofe encontramos uma sistematização da teoria da criação poética, a partir de


uma sucessão de metáforas. “O coração” ligado à emoção é um “comboio de corda”, um brinquedo
sem autonomia que alimenta a razão, fornecendo-lhe a matéria prima para a criação. A razão
condiciona o movimento desse “ comboio” mantendo-o entretido e ao mesmo tempo, disciplinado
“nas calhas de roda”. Deste modo, o fingimento poético, a criação artística, é a transformação
intelectual da razão, matéria prima do intelecto em imagens poéticas, logo o poema é um produto
da intelectualização.

“Isto” pág. 33

Na composição poética “Isto” parece termos uma resposta a possíveis reações à teoria da
criação poética apresentada em “Autopsicografia”. As leituras dos dois primeiros versos confirmam
esta hipótese, o sujeito nulo indeterminado (“Dizem”, v.1) sugere que houve reações negativas, à
teoria poética apresentada. A essas críticas o sujeito poético responde incisivamente “Não” (v.2),
passando de seguida, a esclarecer o motivo por que “fingir” no seu enquadramento teórico não é
“mentir”.

Na perspetiva do sujeito poético a sinceridade e a espontaneidade do ato de criação poética


“simplesmente” ao sentir “com imaginação” não usando “o coração”. Desta forma reforça a ideia de
que a criação poética implica apenas a emoção intelectualizada, a que foi filtrada pela inteligência,
ou seja, as emoções e as sensações são somente matéria poética em bruto, que devem ser primeiro
fixionadas, imaginadas e só, posteriormente, materializadas em poesia.

O sujeito poético compara as suas emoções (os seus anseios, vivencias, insucessos), isto é, a
realidade que vive e experiencia num terraço, uma espécie de capa “sobre outra cousa ainda” (v.9),
sobre aquilo que considera ser perfeito e que, na verdade, o fascina referimo-nos à poesia – o
produto da intelectualização das suas emoções.
Há o cuidado por parte do sujeito poético em referir a necessidade de se distanciar da
realidade, isto é, liberta-se do que “ está ao pé” (v.12), pois está ciente que o processo de criação,
aquilo que é verdadeiramente “Belo” só se pode concretizar a partir do distanciamento.

A semelhança da composição poética anterior o sujeito poético faz referência ao leito, a este
reserva-lhe as emoções suscitadas pela leitura do poema, como se pode verificar no verso quinze.

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