Resumo - Sermão Da Sexagésima

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SERMÃO DA SEXAGÉSIMA

AUTOR
• ANTONIO VIEIRA RAVASCO – Padre, teólogo, orador,
missionário, político e diplomata.
• Nasceu em Lisboa – 1608 – Faleceu em 1697 na Bahia.
• Defendeu índios, judeus, criticou sacerdotes dominicanos e a
inquisição.

CARACTERÍSTICAS DO ESTILO BARROCO

• Barroco: pedra irregular – sugere o homem em conflito – século XVII –


Seiscentismo.
• Reforma Protestante, liderada por Lutero (na Alemanha) e Calvino (na França) e
o Movimento Católico de Contra-Reforma marcam o contexto histórico do
período.
• Principais características: dualismo (antítese), fugacidade, pessimismo, feísmo,
religiosidade, tensão (teocentrismo X antropocentrismo).
• Cultismo – Gongorismo (jogo de palavras e de imagens – exagero de figuras);
conceptismo – Quevedismo (jogo de idéias).

CARACTERÍSTICAS DO BARROCO CONCEPTISTA DO AUTOR

• Os Sermões de Vieira visam a convencer o ouvinte por meio


tanto da emoção como da razão.
• Apesar da índole e da linguagem barrocas (a captação da
realidade por meio dos sentidos, as contradições e
associações inesperadas, apelos ao feísmo – belo horrendo),
a estrutura dos sermões é clássica, apoiada na lógica e nos
princípios de Aristóteles.

A PRESENÇA CLÁSSICA FICA EVIDENTE:

• Na unidade do assunto: cada sermão se concentra apenas em um tema e


procura examiná-lo sob todos os aspectos – no caso do Sermão da
Sexagésima o tema é semen est verbum Dei (a semente é a palavra de Deus).
• Na circularidade do desenvolvimento: por meio da retomada constante das
premissas iniciais que se repetem à exaustão até o fim do sermão (texto
cebola).

A DIVISÃO DO SERMÃO EM CINCO PARTES:

• Primeira: Tema – Vieira abre os sermões


evocando uma passagem bíblica que ilustre o
assunto sobre o qual vai pregar. Essa citação
bíblica será retomada insistentemente em toda a
peça oratória e serve para despertar e manter a
atenção do leitor ou ouvinte. Funciona como um enunciado da tese.
• Segunda: Intróito – O orador expõe o plano geral do sermão antecipando
os elementos que serão desenvolvidos e definindo os termos essenciais à
compreensão do argumento.
• Terceira: Invocação – O sermonista invoca a proteção divina ou da Virgem
Maria, para que inspirem a pregação.
• Quarta: Argumentação – O pregador propõe a tese, sustentando-a com
exemplos bíblicos, encíclicas papais, obras teológicas dos doutores da Igreja.
Vale-se de todo o arsenal da lógica e da estilística (silogismos, sofismas,
associações inesperadas, paradoxos, trocadilhos). Utiliza o método
parenético que consiste em lançar o argumento e pensar todas as
possibilidades de contestação do ouvinte/leitor, antecipando-se às
conclusões do auditório e desarmando as possíveis objeções.
• Quinta: Peroração ou Epílogo – O orador apresenta a conclusão e exorta
(aconselha) a observância das verdades morais pregadas.

CONDENAÇÃO DO CULTISMO OU GONGORISMO

• Vieira via nos exageros do Barroco, no


abuso da ornamentação e das figuras de
estilo e no rebuscamento estéril de alguns
sermões cultistas uma das causas da pouca
eficácia da pregação.
• Condenava os pregadores que se valiam da
manipulação das palavras em detrimento
da mensagem, do conteúdo.
• Criticava os que pregavam palavras de Deus, mas não a palavra divina. Esse
é o tema do Sermão da Sexagésima.

SERMÃO DA SEXAGÉSIMA

• Pregado na Capela Real de


Lisboa, em 1655, o Sermão da
Sexagésima, também conhecido
como Sermão da Palavra de Deus,
é uma teorização sobre a arte de
pregar – sermão metalingüístico,
portanto.
• Sermão é um texto em prosa que
tem como objetivo a edificação
religiosa, a discussão de dogmas e
o convencimento dos fiéis.
• Na liturgia católica, Sexagésima é
o segundo domingo do período que antecede a Quaresma, aproximadamente
sessenta dias antes da Páscoa: “Estamos às portas da Quaresma, que é o tempo
em que principalmente se semeia a palavra de Deus na Igreja, e em que ela se
arma contra os vícios” (Cap. X)
• Vieira inicia a pregação citando o Novo Testamento: o Tema é Semen est
verbum Dei (Lucas, VIII, II).
E se quisesse Deus que este tão ilustre e tão numeroso auditório saísse hoje tão
desenganado da pregação, como vem enganado com o pregador! Ouçamos o
Evangelho, e ouçamo-lo todo, que todo é do caso que me levou e trouxe de tão longe.
Ecce exiit qui seminat, seminare. Diz Cristo que «saiu o pregador evangélico a
semear» a palavra divina. Bem parece este texto dos livros de Deus. Não só faz menção
do semear, mas também faz caso do sair: Exiit, porque no dia da messe hão-nos de
medir a semeadura e hão-nos de contar os passos. O Mundo, aos que lavrais com ele,
nem vos satisfaz o que dispendeis, nem vos paga o que andais. Deus não é assim. Para
quem lavra com Deus até o sair é semear, porque também das passadas colhe fruto.
Entre os semeadores do Evangelho há uns que saem a semear, há outros que semeiam
sem sair. Os que saem a semear são os que vão pregar à Índia, à China, ao Japão; os que
semeiam sem sair são os que se contentam com pregar na Pátria. Todos terão sua razão,
mas tudo tem sua conta. Aos que têm a seara em casa, pagar-lhes-ão a semeadura; aos
que vão buscar a seara tão longe, hão-lhes de medir a semeadura e hão-lhes de contar os
passos. Ah Dia do Juízo! Ah pregadores! Os de cá, achar-vos-eis com mais paço; os de
lá, com mais passos: Exiit seminare.

• Metáforas: a semente é a palavra de Deus;


pregar é semear; o pregador é o semeador; o
solo é o coração e o entendimento do
ouvinte.
• Ecce exiit qui seminat, seminare: saiu o
semeador a semear a sua semente. Crítica
aos religiosos – especialmente Dominicanos
– que não viajam para pregar.
• Os semeadores da época de Jesus não
preparavam a terra, jogavam as sementes
que caíam em todos os lugares (pedra, espinhos, estrada e solo bom).
• Uso do quiasmo: figura em X.

SAEM A SEMEAR

SEMEIAM SEM SAIR

• Uso do trocadilho (paronomásia): paço (palácio) e passos (modo de andar).


• Vieira quer saber o motivo de a pregação católica estar surtindo pouco efeito
entre os cristãos. Sendo a palavra de Deus tão eficaz e tão poderosa,
pergunta ele, como vemos tão pouco fruto da palavra de Deus?
• A culpa é de Deus? Dos homens? Ou dos padres? Depois de muito
argumentar, Vieira conclui que a culpa não pode ser de Deus – Ele sempre
contribui com sua Graça; nem dos homens – os fiéis comparecem às Igrejas.
• Então, porque há tanto pecado no mundo? A culpa é dos próprios padres.
Eles pregam palavras de Deus, mas não pregam a palavra de Deus, afirma.
Dito de outra maneira, o jesuíta reclama daqueles que torcem o texto da
Bíblia para defender interesses mundanos. No sermão proferido, o Padre
também procura criticar a outra facção do Barroco, logo a utilizar o púlpito
como tribuna política.
• No Intróito, Vieira começa a diagnosticar as causas da pouca eficácia da
palavra de Deus:

Fazer pouco fruto a palavra de Deus no Mundo, pode proceder de um de três


princípios: ou da parte do pregador, ou da parte do ouvinte, ou da parte de Deus. Para
uma alma se converter por meio de um sermão, há-de haver três concursos: há-de
concorrer o pregador com a doutrina, persuadindo; há-de concorrer o ouvinte com o
entendimento, percebendo; há-de concorrer Deus com a graça, alumiando. Para um
homem se ver a si mesmo, são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem
espelho e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de noite,
não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister
olhos. Que coisa é a conversão de uma alma, senão entrar um homem dentro em si e
ver-se a si mesmo? Para esta vista são necessários olhos, e necessária luz e é necessário
espelho. O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina; Deus concorre com a
luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento. Ora suposto
que a conversão das almas por meio da pregação depende destes três concursos: de
Deus, do pregador e do ouvinte, por qual deles devemos entender que falta? Por parte
do ouvinte, ou por parte do pregador, ou por parte de Deus?
Primeiramente, por parte de Deus, não falta nem pode faltar. Esta proposição é
de fé, definida no Concílio Tridentino, e no nosso Evangelho a temos.

• Construção paralelística:

Pregador Doutrina (persuadindo) Espelho

Ouvinte Entendimento (percebendo) Olhos

Deus Graça (alumiando) Luz

• Uso da anáfora – repetição intencional de palavras: há-de... há-de... há-de...


• No quarto capítulo, Vieira começa a articular sua aula sobre a eficácia da
oratória (arte de convencer) e seus pré-requisitos:

Mas como em um pregador há tantas qualidades, e em uma pregação tantas leis,


e os pregadores podem ser culpados em todas, em qual consistirá esta culpa? No
pregador podem-se considerar cinco circunstâncias: a pessoa, a ciência, a matéria, o
estilo, a voz. A pessoa que é, e ciência que tem, a matéria que trata, o estilo que segue, a
voz com que fala. Todas estas circunstâncias temos no Evangelho. Vamo-las
examinando uma por uma e buscando esta causa.

• As cinco circunstâncias enumeradas: a pessoa, a ciência, a matéria, o estilo


e a voz serão distribuídas nos capítulos seguintes. No IV trata da pessoa; no
V, do estilo; no VI, da matéria; no VII, da ciência; no VIII, da voz.
• Essa estrutura corresponde às divisões tradicionais dos trabalhos de retórica
clássica (Aristóteles, Quintiliano, Cícero).
• No quinto capítulo, Vieira explicita sua crítica aos exageros verbais do
Barroco. Critica o cultismo e toma como alvo (não declarado) o
Dominicano Frei Domingos de São Tomás, pregador de sucesso na corte.

Será porventura o estilo que hoje se usa nos púlpitos? Um estilo tão empeçado
(transtornado), um estilo tão dificultoso, um estilo tão afetado, um estilo tão encontrado
(contrário) a toda a arte e a toda a natureza? Boa razão é também esta. O estilo há-de
ser muito fácil e muito natural. Por isso Cristo comparou o pregar ao semear.
Este desventurado estilo que se usa hoje, os que querem honrar chamam-lhe
culto, os que condenam chamam-lhe escuro, mas ainda lhe fazem muita honra. O estilo
culto não é escuro, é negro (...) A motivar desvelos, a acreditar empenhos, a requintar
finezas, a lisonjear precipícios, a brilhar auroras, a derreter cristais, a desmaiar jasmins,
a toucar primaveras e outras mil indignidades destas.
(...) Não fez Deus o céu em xadrez de estrelas, como os pregadores fazem o
sermão em xadrez de palavras. Se de uma parte há-de estar branco, da outra há-de estar
negro; se de uma parte dizem luz, da outra hão-de dizer sombra; se de uma parte dizem
desceu, da outra hão-de dizer subiu. Basta que não havemos de ver num sermão duas
palavras em paz? Todas hão-de estar sempre em fronteira com o seu contrário? (...)
Como hão de ser as palavras? Como as estrelas. As estrelas são muito distintas e muito
claras. Assim há de ser o estilo da pregação, muito distinto e muito claro.

• A sucessão de imagens é uma referência à falta de conteúdo e de abuso


de imagens vazias, desgastadas, vícios que Vieira critica no estilo
cultista.
• Vieira critica o estilo cultista que exagera nas antítese, por exemplo,
usando ele próprio essa linguagem (a metáfora do xadrez).
• Após demolir o estilo cultista, Vieira inicia o capítulo VI com a defesa
do conceptismo:

Há-de tomar o pregador uma só matéria; há-de


defini-la, para que se conheça; há-de dividi-la, para que
se distinga; há-de prová-la com a Escritura; há-de
declará-la com a razão; há-de confirmá-la com o
exemplo; há-de amplificá-la com as causas, com os
efeitos, com as circunstâncias, com as conveniências que
se hão-de seguir, com os inconvenientes que se devem
evitar; há-de responder às dúvidas, há-de satisfazer às
dificuldades; há-de impugnar e refutar com toda a força
da eloquência os argumentos contrários; e depois disto
há-de colher, há-de apertar, há-de concluir, há-de
persuadir, há-de acabar. Isto é sermão, isto é pregar; e o que não é isto, é falar de mais
alto.
(...) As razões não hão-de ser enxertadas, hão-de ser nascidas. O pregar não é
recitar. As razões próprias nascem do entendimento, as alheias vão pegadas à memória,
e os homens não se convencem pela memória, senão pelo entendimento.

• Encaminhando-se para a peroração ou epílogo, o pregador reitera suas


advertências:
Semeadores do Evangelho, eis aqui o que devemos pretender nos nossos sermões, não
que os homens saiam contentes de nós, senão que saiam muito descontentes de si; não
que lhes pareçam bem os nossos conceitos, mas que lhes pareçam mal os seus costumes,
as suas vidas, os seus passatempos, as suas ambições, e enfim, todos os seus pecados.

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