Metodologia Da Ciência Do Direito - Karl Larenz

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Metodologia da ciência do Direito - Karl Larenz

O presente estudo visa apresentar uma análise acerca da obra Metodologia da


Ciência do Direito, de Jarl Larenz, 3ª edição, traduzido por José Lamego.
Serão destacadas as Partes Histórico-Crítica e a Parte Sistemática.
No capítulo I, será compreendida a metodologia de Savigny. Já no capítulo IV,
será discorrido o abandono do positivismo na filosofia do Direito na primeira metade do
século XX. Nesta parte, o Autor abordou a teoria da ciência do Direito de Stammler e a
sua doutrina denominada como Direito Justo; Neokantismo e a teoria dos valores; o
Idealismo objetivo e dialético e a teoria fenomenológica do Direito.

Parte Histórico- Crítica

Capítulo I – A metodologia de Savigny

Savigny usa o termo filosófico nas suas lições, como sinônimo de sistemático;
mas o elemento sistemático também desempenha um papel considerável na teoria do
método do Sistema. Savigny aponta um sentido que equipara nos seus primeiros escritos
os termos sistemáticos e filosóficos, que vem a transparecer nas palavras seguintes:
Todo o sistema conduz à filosofia. A exposição de um simples sistema histórico conduz
a uma unidade, a um ideal, em que aquela se baseia.
Distingue o autor a teoria filosófica do Direito em si mesmo, ou o Direito
natural, do elemento filosófico ou sistemático da ciência do Direito. A última pode ser
estudada tanto com o Direito ou sem ele.
A filosofia não é necessária, mesmo como simples conhecimento prévio. Ela
não deve subentender-se a aceitação de quaisquer princípios jusnaturalistas, mas apenas
a orientação, característica da própria ciência do Direito, no sentido de uma unidade
pressuposta, já que é a ciência do Direito e à filosofia.
O equipara ainda no seu curso o Direito positivo ao Direito legislado. A
legislação acontece no tempo e conduz a concepção de uma história do Direito que
estreitamente se conjuga com a história do Estado e a história dos povos, visto que a
legislação é uma atividade do Estado.
Nota-se para a distinção de uma elaboração interpretativa de uma elaboração
histórica e de uma elaboração filosófica do Direito.
Como objeto da interpretação, aponta a reconstrução do pensamento que é
expresso na lei. O intérprete precisa se colocar na posição do legislador e deixar que se
formem, por esse artifício, os respectivos ditames.
A interpretação necessita de três elementos: lógico, gramatical e um elemento
histórico.
Cada um desses elementos serve de base a uma especial elaboração da ciência
do Direito. A elaboração histórica deve tomar o sistema no seu todo e pensá-lo como
algo progressivo, isto é, como história do sistema da Jurisprudência no seu conjunto.
A elaboração sistemática compete olhar o múltiplo na sua articulação,
interessando-lhe quer o desenvolvimento de conceitos, quer a exposição das regras
jurídicas, quer, por fim, o preenchimento das lacunas da lei na expressão que não se
encontra ainda por intermédio da analogia.
Quando o legislador indicou a razão da lei, não o fez para a constituir numa
regra comum, mas para que a regra constituída se esclarecesse por esse elo, ai não deve
ser utilizada como uma regra autêntica.
O juiz deve atender não ao que o legislador busca atingir, mas só ao que na
realidade preceituou; ou da lei, segundo o seu sentido lógico, gramatical e a extrair da
conexão sistemática, verdadeiramente, já que se encontrou uma expressão como
conteúdo da sua determinação.
O juiz não tem que aperfeiçoar a lei, de modo criador, mas tem apenas que
executá-la.
O autor aponta que para a interpretação das regras contidas na lei, significa que
essas regras não podem compreender-se só por si, mas apenas pela intuição do instituto
jurídico, pela qual, de resto, também se norteou o legislador ao formulá-las.
Assim, entre essa intuição e a forma abstrata de cada regra que diz respeito
sempre a um único aspecto, artificialmente isolado, do conjunto da relação, existe um
desajustamento, cuja superação constantemente se impõe à ciência do Direito.
Ele ainda aponta um conceito abstrato de relação jurídica como um poder de
vontade, procedendo depois, e de acordo com os possíveis objetos do poder de vontade,
a uma divisão lógico-formal das relações jusprivatísticas que o leva à aceitação de três
categorias fundamentais de direitos.
O que estrutura o sistema é o nexo lógico dos conceitos.
O elemento sistemático refere-se ao nexo interno que liga em uma grande
unidade todos os institutos e regras jurídicas, dependendo o êxito da interpretação de
que, primeiro, tomemos vivamente presente aos nossos olhos a atividade espiritual de
que proveio a expressão de pensamento que está perante nós e, segundo, de que
tenhamos suficientemente presente à intuição do todo histórico-dogmático, única fonte
de que o particular pode colher alguma luz, para que se venham imediatamente a
apreender as relações desse conjunto no texto que nos é oferecido.
Desde o começo é característica do autor a exigência até uma combinação dos
métodos histórica e sistemática, referindo-se aquele à formação de cada lei dentro de
certa situação histórica e propondo-se este compreender a totalidade das normas e dos
institutos jurídicos subjacentes como um todo englobaste. Ao passo, porém, que o
escrito de juventude entende o sistema jurídico exclusivamente como um sistema de
regras jurídicas - que se encontram entre si numa tal ligação lógica que as regras
especiais se vêem como brotando de certas regras gerais, às quais podem ser
reconduzidas.
As regras jurídicas particulares vêm extrair-se através de uma abstração; por
isso, têm aqueles de estar, na intuição, constantemente presentes ao intérprete, para que
este possa compreender com justeza o sentido da norma particular.
Assim, falta de clareza que não deve ter pesado pouco no fato de as sugestões
metodológicas da obra de maturidade não terem merecido a atenção que se poderia
esperar da grande influência de que gozou o autor.

Capítulo IV - O Abandono do Positivismo na filosofia do Direito da primeira


metade do séc. XX

Discorre o autor que as pessoas não têm consciência da sua origem num
determinado contexto filosófico-jurídico e, portanto, do significado específico de muitas
afirmações. Para a compreensão da atual situação da metodologia é, por isso,
indispensável expor, ao menos nas suas linhas de força, o movimento jus filosófico, na
medida em que é relevante para a metodologia.
Na Theorie der Rechtswissenschaft (Teoria da Ciência do Direito) busca
STAMMLER, tomar a Jurisprudência compreensível como ciência e afastar dela em
absoluto a objeção da sua falta de valor científico.
Os conceitos fundamentais do Direito, sendo, por isso, o esclarecimento desses
conceitos fundamentais de um modo seguro e exaustivo uma tarefa decisiva para quem
se preocupa com o Direito e com a ciência do Direito.
A relação entre forma e matéria de um pensamento é a mesma que entre
logicamente condicionante e condicionado.
As ideias jurídicas surgem na consciência como algo já ordenado, formado, de
determinada maneira. Assim deve haver formas puras do pensamento jurídico, que, no
que têm de característico, de nenhum modo dependem das particularidades de uma
matéria mutável e alterável, que não são outra coisa senão formas que determinam a
ordenação unitária
Quanto ao conceito de ciência, segundo STAMMLER, é o da ordenação
basicamente unitária do nosso mundo de ideias. A ciência da natureza ordena
unitariamente todos os fenômenos percebidos no espaço e no tempo sob a categoria da
causalidade.
A relação de meio e fim é tão necessária ao homem que não tem apenas a
capacidade de perceber, mas também a de querer, como é a relação de causa e efeito.
Daí que, a par da ciência da natureza e independentemente dela, haja que promover e
construir uma ciência dos fins humanos. Trata-se de orientar unitariamente os fins,
tomados no seu conteúdo, de acordo com um plano constante e entendido com clareza
no que tem de característico. Ao lado da lógica em geral e da lógica que preside ao
conhecimento científico-natural, há que promover uma lógica da ciência de fins. Dela
decorre a autonomia metódica da ciência do Direito.
Ihering designava o fim como o criador do Direito.
Todos os conceitos condicionados pressupõem, para o autor, uma determinada
matéria que tem de oferecer-se no Direito positivo, ainda antes que a ciência jurídica
possa, pela via da abstração, construindo um conceito. A escolha das notas essenciais à
construção de um conceito ocorre tendo sempre em atenção o conceito de Direito e os
conceitos fundamentais deduzidos daquele conceito, a que hão-se subsumir-se os
conceitos condicionados.
A teoria de Stammler sobre o conceito de Direito e a formação dos conceitos
jurídicos é insuficiente, pois o Autor só conhece o conceito de gênero geral abstrato, não
o conceito individual histórico, nem o conceito geral concreto, nem o que se denomina
como conceito determinado pela função.
Há que se apontar ainda acerca do Neokantismo alemão e teoria dos valores.
Com exceção da lógica e da matemática, o conceito positivista de ciência só
admite como científicas as disciplinas que se servem dos métodos das ciências da
natureza, ou seja, de uma pesquisa causal que assente na observação, na experimentação
e na recolha de fatos.
A essência da construção científico-natural dos conceitos, melhor, do
conhecimento conceptual do mundo dos corpos, é vista simplificação da realidade
existente, através da construção de conceitos gerais que apreendam unitariamente o
maior número possível de fenômenos mediante poucas notas comuns a todos eles. Esses
conceitos devem construir-se de maneira a que permitam reconhecer as leis de validade
geral que a natureza. Quanto mais as ciências da natureza avançam por esse caminho,
isto é, quanto mais gerais e englobastes se tornam os seus conceitos, tanto mais têm de
distanciar-se do particular e individual que se oferece na intuição.
Para compreender a proposição jurídica singular não somente a partir dela
mesma, mas também do nexo significativo da ordem jurídica no seu todo, requere-se, de
par com a interpretação, a construção jurídica. Por construção entende-se como a
reconstituição de um todo com base nas suas partes, que antes foram artificialmente
divididas, reconstituição que tem por fim tornar-nos conscientes da necessária conexão
entre essas partes, das suas interdependências recíprocas ou comuns.
O juízo jurídico é emitido sobre um fato da vida concreto, embora típico
(juridicamente relevante), de acordo co normas gerais (social-estaduais), para a maior
realização possível da lei fundamental do bem-comum, em direção à justiça.
O conceito central de Binder no período do seu labor que aqui nos interessa, é,
portanto, a ideia de Direito. O Autor concebeu esta ideia, por um lado, na acepção
kantiana, como um postulado ético, uma tarefa sempre nova a realizar; mas, por outro
lado, viu nela também o princípio fundamental constitutivo o sentido a priori do Direito
positivo ou histórico.
Assim entendida, a ideia de Direito não se limita a ser um princípio formal do
pensamento, porque tem necessariamente um conteúdo; ela é, nas suas emanações ou
momentos, valendo-se da linguagem kantiana, a multiplicidade de sentido ético-jurídico
e filosófico-social que o Direito positivo realiza mais ou menos perfeitamente.
A ideia de Direito aproxima-se pois do conceito geral concreto da filosofia
hegeliana, no último estádio da sua evolução, a substituir o que pode ser mal entendido,
pela maioria dos leitores o termo ideia pelo termo conceito.
O Direito subsiste no tempo, como algo que se dá historicamente e que no
decurso da história se transforma; mas nem por isso pode ser considerado como uma
realidade física ou psíquica.
Enquanto a interpretação filológica se contenta com explorar o pensamento que
o autor quis exprimir, percebe-se que o fim com que empreende a interpretação é a
aplicação prática da lei. Por sua vez, porém, esta aplicação prática da lei visa em última
instância a realização da ideia de Direito, que assim se converte.
Se o Direito, como um todo, é um processo histórico e se a unidade da ordem
jurídica não é a unidade lógico-formal do sistema dos conceitos abstratos, mas sim uma
unidade teleológica, que consiste na harmonia dos fins em perpétua renovação, aferida
pelos valores e princípios fundamentais, harmonia essa que não nos é dada, apenas nos
incumbe como tarefa, resulta que o Direito positivo, o Direito formado, de cada época
não pode ser nunca acabado e sem lacunas.
O neokantismo considera a realidade como produto de um processo de
transformação, cujas condições fundamentais estão inscritas na estrutura do nosso
pensamento.
Esta doutrina afigurou-se acertada, porque o fato juridicamente relevante, se
posto em conflito com o acontecimento total, não é na realidade senão o resultado de
uma transformação intelectual, a saber: a sua apreciação à luz de critérios jurídicos.
A norma jurídica insere-se no tempo histórico. O tempo não está imóvel, e a
norma jurídica acompanha-o por assim dizer no seu movimento.
Daqui resulta o seguinte para a interpretação jurídica: a norma jurídica começa
por ser criada numa época histórica determinada, e na perspectiva de determinado
legislador.
A sua visão dos problemas e a concomitante tomada de posição são os
elementos constituintes daquilo que chamamos a 'vontade do legislador.
O movimento jus filosófico trouxe à metodologia jurídica, abstração feita de
todos os antagonismos de escolas, um contributo importante.
Fez descobrir que o conceito positivista da ciência, que tão grande influência
exerceu em certo período sobre a compreensão que a ciência jurídica tem de si própria,
não pode considerar-se satisfatório pelo menos para todo um grupo de ciências, o das
ciências históricas e das ciências do espírito.
A causa profunda dessa insuficiência, que ainda passou despercebida ao
neokantismo, é que o conceito positivista de realidade é demasiado acanhado.
Parte Sistemática

Capítulo 1: Introdução: Caracterização geral da jurisprudência

No capítulo I, da parte Sistemática, será abordado ainda, os modos de


manifestações do Direito e ciências correspondentes, jurisprudência como ciência
normativa e como ciência e o pensamento orientado e valores na jurisprudência.
É certo que o direito apresenta uma relação estreita com a existência social do
homem, onde de acordo com a opinião geral, um conjunto de regras, em conformidade
às quais os homens ordenam entre si a conduta, e que pode ser avaliada de acordo com
essas regras. É condição de todas as formas mais desenvolvidas de sociabilidade, na
medida em que possibilita a prevenção de conflitos ou o seu arbitramento pacífico.
Estes objetivos são conseguidos sobretudo pela instituição de vias jurisdicionais e pelas
possibilidades de execução.
O Direito apresenta-se nos sob outro aspecto, quando o consideramos como um
fenômeno histórico. E é o porquê precisamente pertence ao mundo criado pelo homem,
ao seu mundo próprio.
A Jurisprudência e a história do Direito consideram de per si o Direito sob uma
perspectiva diferente, tal não significa uma justaposição desprovida de nexos de relação.
Toda a norma jurídica pertencem, como pano de fundo indispensável para a sua
compreensão, a realidade social em resposta à qual foi concebida, a realidade jurídica a
quando do seu surgimento, e a realidade social atual face à qual deve operar.
Enquanto que as outras ciências se ocupam do Direito em geral, ou também em
princípio de todos ordenamentos jurídicos surgidos ao longo da História, a
Jurisprudência tem em vista sempre um ordenamento jurídico determinado, ao qual os
seus enunciados, referem o seu sentido imediato. De modo indireto, podem expressar
algo que verse sobre problemas jurídicos que não são somente de este ordenamento
jurídico.
A possibilidade e utilidade das indagações juscomparatísticas assentam em que
as soluções de um ordenamento positivo são, com freqüência, respostas a problemas
jurídicos gerais, que assumem posicionamento idêntico ou comparável na totalidade ou
na maioria dos ordenamentos jurídicos. O confinar-se, como princípio, ao quadro
previamente dado de um determinado Direito positivo.
No que tange a jurisprudência, o autor também tratou de discorrer acerca da
metodologia.
Caracteriza a Jurisprudência como a ciência sobre o Direito que dele se ocupa
antes de tudo sob o seu aspecto normativo e, assim, que se ocupa do sentido das normas.
Trata-se nela da validade normativa e do conteúdo de sentido das normas do Direito
positivo, incluindo as máximas de decisão contidas nas sentenças judiciais. Se a
Jurisprudência se compreende a si própria como ciência normativa, tal não pretende
significar que ela mesma dê normas, que ponha em vigor normas jurídicas. Antes,
que se compreende a si própria em princípio como um sistema de enunciados
sobre o Direito vigente.
A resposta esta na questão não é o resultado de uma observação fáticas, mas o
de uma comprovação normativa, na qual o evento compreendido no sentido
intencionado (o sentido do ato) há de ser avaliado em consonância com o sentido das
normas competentes para o efeito e que, por sua vez, são pressupostas como válidas, e,
nesta conformidade, julgado.
Atente-se nas palavras qualquer que seja a razão; para o conceito de
legitimação de Luhmann não releva o fato de se os destinatários aceitam a decisão
porque a consideram justificada ou, pelo menos, porque consideram que existe a
competência da entidade decisória para tomar aquela decisão e, assim, consideram
justificada a exigência de obediência, ou por quaisquer outros motivos.
A Jurisprudência é precisamente composta da objeção dos partidários de um
conceito de ciência, porque problematiza por princípio textos jurídicos, quer dizer,
questiona-os em relação com as diferentes possibilidades de interpretação. Os textos
jurídicos são problematizáveis deste modo porque estão redigidos em linguagem
corrente, ou então numa linguagem especializada a eles apropriada, cujas expressões,
com ressalva de números, nomes próprios e determinados termos técnicos apresentam
uma margem de variabilidade de significação que torna possível inúmeros cambiantes
de significação.
É precisamente na profusão de tais cambiantes que se estriba a riqueza
expressiva da linguagem e a sua susceptibilidade de adequação a cada situação.
Ninguém é imune a estes prejuízos como também seria errôneo ver neles uma
barreira absoluta e intransponível. Mas a sua superação não é de todo em todo possível
senão mediante um processo permanente de auto-exame e a preocupação constante com
a questão em si mesma.
As normas jurídicas são interpretadas para, por regra, serem aplicadas a casos
concretos.
Na interpretação das normas jurídicas, só aparentemente se trata de um
processo em que a norma aplicável se coloca, à semelhança de um metro articulado,
sobre a situação de fato a julgar e esta é por ele mensurada.
Ao interpretar as leis (com vista à solução de casos jurídicos), não pode
descurar-se que nelas não se trata de um qualquer tipo de enunciados, mas de preceitos
que hajam de ser seguidos, de bitolas de julgamento prescritas.
O legislador que estatui uma norma, ou, mais precisamente, que intenta regular
um determinado setor da vida por meio de normas, deixa-se nesse plano guiar por certas
intenções de regulação e por considerações de justiça ou de oportunidade.
No que diz respeito a peculiaridade do pensamento, deve ser classificado como
a distinção entre conceito e tipo.
O caráter valorativo de toda a aplicação do Direito passa a segundo plano
quando a previsão da norma aplicável foi conformada por via conceitual, de modo que a
situação de fato constatada necessita apenas de ser subsumida à previsão da norma.
No entanto, isto é muito menos freqüente do que a maioria dos juristas supõe e
inclusivamente do que muitos partidários da Jurisprudência de valoração estão dispostos
a admitir.
Só se pode falar de um conceito em sentido estrito quando for possível defini-
lo claramente, mediante a indicação exaustiva de todas as notas distintivas que o
caracterizam. O sentido de uma tal definição é o de que só quando e sempre que todas
as notas distintivas do conceito se apresentam em algum objeto poderá ser esse objeto
subsumido ao conceito, pertencendo à classe de objetos designados.
Percebe-se que o legislador que empreende a regulação de um fato da vida tem
em regra a opção de delimitar a situação fática tida em vista ou mediante a fixação de
notas características delineadas de modo tão nítido quanto possível, e vistas como
imprescindíveis e acabadas.
Portanto, ou por meio da designação de um tipo, que ele pode esclarecer
mediante a indicação dos traços distintivos tidos por paradigmáticos com exemplos.
Se o pensamento orientado a valores é imprescindível no âmbito da
denominada aplicação do Direito, na medida em que aí não se trata de uma mera
subsunção, mas de coordenação valorativa e de concretização, já parece que as coisas
não se passam assim no âmbito da teoria jurisprudencial que não está diretamente
referida à prática.
A dogmática suscita ainda hoje a injustificada pretensão de uma autoridade
completamente auto-subsistente das suas doutrinas e de domínio de cada novo conflito
social, sem que de cada vez exista um novo consenso, mas somente com base no acervo
das normas e da técnica dogmática.
A função positiva da dogmática poderia consistir em que, por via do modo do
arranjo das interdições de negação, se eleva ao nível requerido a flexibilidade na
interpretação de textos e experiências.
O sentido da dogmática não consiste em fixar o que está simplesmente
estabelecido, mas em possibilitar a distância crítica, em organizar estratos de reflexões,
de motivos, de ponderações de proporção, meios pelos quais o material jurídico é
controlado para além do que é imediatamente dado e é preparado para a sua utilização.
A Jurisprudência, ou mais precisamente, a sua expressão não referida de modo
imediata ao caso, na chamada dogmática jurídica, é suscetível de proporcionar um
contributo cognoscitivo é algo que é posto em causa, por um lado, por todos aqueles que
só esperam tal contributo das ciências cientificistas, e por outro, também, pela maioria
dos juristas existentes que vê a missão da Jurisprudência exclusivamente na sua
utilidade para a prática.
No que diz respeito a metodologia, de qualquer ciência é, antes do mais e em
primeiro lugar, a reflexão desta ciência sobre o seu próprio proceder, sobre os modos de
pensamento e meios de conhecimento de que lança mão. Toda a ciência desenvolve tais
modos de pensamento e para, além disso, determinados procedimentos para se certificar
da sua matéria e para verificar os seus enunciados. A reflexão sobre este procedimento
não ocorre em separado da sua aplicação, mas acompanha-a ou segue-a de imediato e
está na mais estrita conexão com a ciência em causa.

Capítulo V – Método de desenvolvimento judicial do Direito

A interpretação da lei é a tarefa imediata de uma Jurisprudência dirigida à


prática jurídica, a Jurisprudência, contudo nunca se esgotou nisso.
Sempre se reconheceu que mesmo uma lei muito cuidadosamente pensada não
pode conter uma solução para cada caso necessitado de regulação que seja atribuível ao
âmbito de regulação da lei; por outras palavras.
Toda a lei contém lacunas. Igualmente se reconheceu desde há muito a
competência dos tribunais para colmatar as lacunas da lei.
O desenvolvimento do Direito superador da lei só deva ter lugar em
consonância com os princípios diretivos da ordem jurídica no seu conjunto; mais:
muitas vezes será
motivado precisamente pela aspiração a fazer valer estes princípios em maior
escala do que aconteceu na lei.
Neste esteio, uma interpretação modificada pela jurisprudência dos tribunais
não significa objetivamente senão um desenvolvimento do Direito.
Tal fato ocorre sempre que se possa admitir que a nova interpretação será
mantida no futuro pela jurisprudência dos tribunais e, por isso, observada no tráfego
jurídica.
Quanto ao desenvolvimento judicial do Direito, este precisa de uma
fundamentação levada a cabo metodicamente se se quiser que o seu resultado haja de
justificar-se como Direito, no sentido da ordem jurídica vigente.
Precisa de uma justificação, porque sem ela os tribunais só usurpariam de facto
um poder que não lhes compete. Por isso têm entre si uma estreita relação as questões
relativas aos limites da competência dos tribunais nos termos da Constituição em ordem
a desenvolver o Direito ultrapassando os limites da verdadeira interpretação e,
inclusivamente, da integração de lacunas imanentes à lei, e a questão relativa à
possibilidade de fundamentação de um tal desenvolvimento do Direito.
A faculdade de desenvolver o Direito cabe indiscutivelmente aos tribunais,
sempre que a lei mais precisamente: o conjunto das normas jurídicas conformadas em
leis e no Direito consuetudinário,
assim como na jurisprudência constante, que sejam apropriadas para a
aplicação imediata.
A analogia, as resoluções com base num princípio achado pela via da
generalização de uma regra e a redução teleológica representam uma correção do, em
parte demasiado estrito, em parte demasiado amplo, teor literal da lei, conforme à ratio
legis e à teleologia própria da lei; representam, por conseguinte, um desenvolvimento do
Direito imanente à lei.
De vez em quando, tal correção do teor literal da lei ocorre ainda de outro
modo. Os casos em que o teor literal demasiado estrito é ampliado, sem que por isso se
trate de uma analogia, podem denominar-se, casos de extensão teleológica. A seu lado
há de colocarem-se aqueles casos em que o teor literal, em si contraditório, de uma
disposição é retificado pela jurisprudência de acordo com o seu escopo.
A constatação da lacuna e a sua integração fundam-se nas mesmas
considerações de quando achamos omitida na lei uma regra para um determinado grupo
de casos que se relaciona com uma regra dada na lei para um grupo de casos que hão-de
ser considerados valorativamente idênticos ou quando uma regra legal permite omitir
uma restrição, exigida pelo seu sentido e fim, por uma norma de grau superior ou por
um princípio imanente à lei.
A regra omitida na lei é então, por sua vez, a que se há de acrescentar para
integrar a lacuna, a não ser que a ela se contraponha uma proibição de analogia ou de
redução. A analogia e a redução teleológica são, portanto, operações do pensamento que
não só servem para a integração de lacunas, mas também para a constatação de lacunas.
As circunstâncias concretas do fato em questão, faz com que as diferença de
opinião dos juízes começa por surgir na valoração dos fatores incluídos na ponderação.
Metade dos juízes sublinha muito intensamente que uma obra artística como
um romance, que se orienta como aqui, até certo ponto, a acontecimentos reais
desencadeia os seus efeitos não só no plano estético, mas também no plano social e,
nomeadamente pelo fato de muitos leitores equipararem a figura do romance, sem
atender ao seu significado no âmbito da obra artística, com a personagem histórica
tomada mais ou menos como modelo pelo autor.
Qualquer que seja a posição que em concreto se tome sobre estes problemas,
ficará claro que a propriedade da garantia, como tipo jurídico novo não previsto como
tal ao nível da regulação legal, se situa mais ou menos no ponto intermédio entre a
propriedade normal de uma coisa e o direito de penhora sobre uma coisa móvel.
Pode, certamente, incorporar-se na regulação legal, se bem que não sem
algumas dificuldades, mas não estava já contida nela ou pelo menos, não era por ela
reclamada.
Tão-pouco a autorização para a cobrança está prevista, ao menos
expressamente, na regulação legal. Isto não implica ainda, porém, nenhuma decisão
valorativa negativa do legislador.
Quanto aos princípios ético-jurídica são pautas orientadoras da normação
jurídica que, em virtude da sua própria força de convicção, podem justificar decisões
jurídicas.
Distinguem-se dos princípios técnico-jurídicos, que se fundam em razões de
oportunidade, pelo seu conteúdo material de justiça; por este motivo, podem ser
entendidos como manifestações e especificações especiais da ideia de Direito, tal como
esta se revela na consciência jurídica geral, neste estádio de evolução histórica.
Enquanto princípios não são regras imediatamente aplicáveis aos casos
concretos, mas ideias diretrizes, cuja transformação em regras que possibilitem uma
resolução tem lugar em parte pela legislação, em parte pela jurisprudência, segundo o
processo anteriormente descrito da concretização e do aperfeiçoamento de princípios
mais especiais mediante a formação de grupos de casos.
Alguns deles têm o escalão de normas constitucionais; outros, como o princípio
da boa-fé, estão expressos nas leis ou inferem-se delas, recorrendo à ratio legis, o
fundamento justificante de uma regulação legal. Enquanto critérios teleológicos
objetivos são coadjuvantes para a interpretação, bem como para a integração de lacunas;
aqui constituem o fundamento para uma analogia global e, por vezes, também para uma
redução teleológica.
Trata-se de um desenvolvimento do Direito superador da lei de acordo com um
princípio ético-jurídico, sempre que um tal princípio, ou também um novo âmbito de
aplicação de tal princípio, é conhecido pela primeira vez e expresso de modo
convincente.
Percebe-se que os tribunais resolvem casos concretos, onde uma opinião
jurídica expressa por um tribunal quer se apresente como interpretação, como
desenvolvimento do Direito imanente à lei ou superador da lei tem, por isso, unicamente
importância direta para o caso concreto a resolver. Mas o tribunal pretende que a sua
resolução esteja de acordo com o Direito vigente.
Deste modo, a interpretação por ele realizada é adequada, que é necessário
integrar as lacunas, que está justificado, pelos motivos por ele indicados, um
desenvolvimento do Direito superador da lei.
No futuro, todo o caso semelhante há de ser resolvido de acordo com a máxima
assim estabelecida.
A fundamentação jurídica da resolução de um caso concreto formula uma
máxima que pretende validade para todos os casos análogos.
Por isso, o tribunal há de perguntar se esta norma é adequada também para
outros casos semelhantes.
Algo diferente se passa, contudo, quando um tribunal formula regras que, em
parte, não eram em absoluto necessárias para a resolução deste caso e declara, a
propósito, que no futuro procederá em todos os casos segundo esta regra.
Não se trata já para o tribunal, de todo em todo, do caso concreto a resolver,
mas somente da regra geral.
Um tal procedimento contradiz claramente a repartição de funções entre os
órgãos da legislação e os da administração da justiça.
Não obstante, se em casos excepcionais este procedimento deve ser admissível,
então só o será sob duas condições, quais sejam a ausência de uma regulamentação
legislativa pormenorizada do correspondente âmbito de questões tem necessariamente
como consequência uma insegurança jurídica que é inconfortável para os círculos em
causa; e não se pode contar com uma rápida intervenção do legislador.
As relações têm que ser tais que o tribunal possa divisar claramente as
repercussões econômicas, sociopolíticas e outras da sua regra; os dados empíricos para
tal necessários têm que estar à sua disposição.
Mesmo quando estas condições estão preenchidas, este procedimento não deixa
de ter inconvenientes, pelas razões expostas.

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