Poemas de Eurico Alves
Poemas de Eurico Alves
Poemas de Eurico Alves
EURICO ALVES
nestes solares que os séculos escondem nos cabelos desnastrados das noites eternas
Em carta não datada a Aline Olivais (possivelmente de 1931) o poeta conta a história do seu
poema escrito para Manuel Bandeira: "Li a Elegia Para Manuel Bandeira a Carvalho. Uma das
melhores coisas que você já fez - disse-me. Não creio. Palavras ocas, ouvidos moucos.
Arrebatou-me a cópia e mandou-a para o Rio. disse-me, para Manuel Bandeira. Eu não queria.
Poderia parecer demonstração de cabotinismo".
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ESCUSA
Sou poeta da cidade. Meus pulmões viraram máquinas inumanas e aprenderam a respirar o
gás carbônico das salas de cinema.
Há anos que não vejo romper o sol, que não lavo os olhos nas cores das madrugadas.
Eurico Alves, poeta baiano, Não sou mais digno de respirar o ar puro dos currais da roça.
Manuel Bandeira
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MADRIGAL
Dentro da noite...
Pela tua boca invisível -- e o teu hálito cheira a distâncias nuas de estradas abandonadas,
sentirei viravolteio e requebrados das ancas firmes das louras americanas nos cabarés da
Broadway
e o tumultuar das cotações nos bancos de New York, de Londres e Rio de Janeiro,
o alarido das tragédias anônimas nos bairros apavorantes de Paris, de Berlim, de Oklahoma…
Serei então o pensamento de mil almas aflitas,
O uivar lascivo das fábricas mórbidas e delirantes edificando uma nova ordem de coisas
desordenadas...
a música das suas curvas, o ardor dos seus desejos na volúpia das festas joviais...
na tua voz aturdida, nos teus olhos embriagados de uma alucinação de infinito,
de morrer,
e de pontos metálicos!
e os meus nervos que hão de ser as agudas agulhas dos pára-raios inalcançáveis,
sangrando as estrelas;
E há de ser estupendo, ó homem que virás depois da minha vez, o teu espanto,
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Existem duas versões deste poema, corrigidos pelo Autor e com ligeiras variantes
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ZABIAPUNGA
A madrugada bocejou,
De repente,
uma zoadeira
E um grupo
de pretos retintos,
que dançam,
que bailam,
surge enfeitado
irisado:
branco,
vermelho,
amarelo
e sangue de boi.
E guizos,
enxadas e pás,
E os máscaras cabindas,
cheirando a cabritos,
E cabindas festeiros,
TABULEIRO! TABULEIRO!
Lá bem longe.
que pinotam.
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1929
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A Jorge de Lima
preto e branco,
vermelho e amarelo.
És faceira,
apetitosa,
e dengosa,
o dia inteiro
Eu gosto de ti,
tu te remexes devagarinho,
ou ligeirinho,
numa tontura,
numa luxúria,
desesperada.
estrangeirinho
de bangalô.
E mais me encantas,
quando te encontro
lá na cozinha,
encarvoada,
lambuzada
Bahia,
um vatapá baiano.
comendo
e chorando
com o ardor
da pimenta de cheiro
e da malagueta.
E todo sulista
quer provar,
É um pomo de ouro,
amarelinho,
redondinho,
delicioso,
Ai! Bahia!
as tuas
frutas,
alaranja,
o araçá,
o caju,
morena fértil que tem filhas bonitas, como o Brasil de Álvaro Moreyra!
Feira de Santana,
(minha terra)!
Cachoeira,
Santo Amaro
Ilhéus,
e arminho,
Bahia!
Lá o sino tocou:
lá na Sé,
na Catedral-Basilica,
em São Francisco
e no Bonfim.
E o convento da Piedade
e o de São Bento
"Dlindão!... dlão!...
dilindlão! dilindlão!..."
A Bahia é religiosa,
da roça.
Bahia!
pelo rio
e pelo mar.
os romeiros
Mãe
de Deus.
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